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Roney Roberto Cunha Medice x Azul Linhas Aereas Brasileiras S.A.

ID: 323447818

Tribunal: TJES Órgão: Vila Velha - Comarca da Capital - 2º Juizado Especial Cível Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 5022767-03.2024.8.08.0035

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

RONEY ROBERTO CUNHA MEDICE

Polo Passivo:

AZUL LINHAS AEREAS BRASILEIRAS S.A.

Sentença - Carta

Advogados:

RAFAEL DOS SANTOS GALERA SCHLICKMANN

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CLARISSE GOMES ROCHA

OAB/ES XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Vila Velha - Comarca da Capital - 2º Juizado Especial Cível Rua Doutor Annor da Silva, 191, FÓRUM DESEMBARGADOR ANNÍBAL DE ATHAYDE LIMA, Boa Vista I… ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Vila Velha - Comarca da Capital - 2º Juizado Especial Cível Rua Doutor Annor da Silva, 191, FÓRUM DESEMBARGADOR ANNÍBAL DE ATHAYDE LIMA, Boa Vista II, VILA VELHA - ES - CEP: 29107-355 Telefone:(27) 31492685 PROCESSO Nº 5022767-03.2024.8.08.0035 PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) REQUERENTE: RONEY ROBERTO CUNHA MEDICE REQUERIDO: AZUL LINHAS AEREAS BRASILEIRAS S.A. Advogado do(a) REQUERENTE: CLARISSE GOMES ROCHA - ES8870 Advogado do(a) REQUERIDO: RAFAEL DOS SANTOS GALERA SCHLICKMANN - SP267258 Sentença (Servindo esta para eventual expedição de carta, mandado e ofício) PROJETO SENTENÇA RELATÓRIO Trata-se de Ação de Indenização por Danos Morais proposta por RONEY ROBERTO CUNHA MEDICE em face de AZUL LINHAS AEREAS BRASILEIRAS S.A., objetivando reparação por danos decorrentes do cancelamento de voo que impediu a viagem pedagógica de sua filha. Em sua petição inicial (ID 46677726), o autor narra que sua filha, de 12 anos, participaria de viagem escolar (Escola São Domingos) ao Sítio Carroção em SP, no período de 03 a 05/04/2024, com voo de ida AD4921 (VIX-VCP) em 03/04 às 05:55h e retorno AD2886 (VCP-VIX) em 05/04 às 18:20h. Relata que a escola/agência exigiu apresentação no aeroporto de Vitória às 03:30h em 03/04, tendo chegado às 03:02h. Menciona que o voo de retorno AD2886 já havia sido cancelado em 01/04, com realocação alunos. Contudo, na data do embarque de ida (03/04), enquanto aguardavam na fila, o voo AD4921 foi cancelado. A Ré ofereceu reacomodação, o que, segundo o autor, inviabilizaria a programação do primeiro dia, Dentre as provas, destaca-se o bilhete aéreo (ID 46678673) e comunicados (ID 46679707); o comprovante (ID 46678677) atestando a chegada do autor ao aeroporto; a foto do painel (ID 46679718) comprovando o cancelamento do voo AD4921; e-mails (ID 46678691, ID 46679167) demonstrando o cancelamento prévio do voo de volta AD2886 (05/04) e realocação para voos em 06/04; o e-mail (ID 46678682) confirmando a perda da OBA; comprovantes da inscrição do autor em evento profissional; WhatsApp (ID 46679185). Audiência de conciliação (ID 64473154). Ausente promovida, apesar de citada eletronicamente. Presente a parte promovente.A parte promovente requereu a decretação da revelia. Em 24/04/25, a ré apresentou petição (ID 67687915) com juntada de procuração. É o relatório, apesar de dispensado. Decido. FUNDAMENTAÇÃO Inicialmente, consigno que da análise da inicial a parte autora possui legitimidade ativa, uma vez que se trata de dano suportado baseado na natureza reflexa. Segundo STJ “o dano moral reflexo, ou préjudice d'affection, é personalíssimo, ou seja, é autônomo em relação ao dano sofrido pela vítima do evento danoso e independente da natureza do evento que causa o dano.” (STJ. REsp nº 1734536. 2019). Além disso, o autor prova o dano direto suportado, já que diante do cancelamento de voo, perdeu evento profissional. Configurado o dano, nexo e culpa (art. 186 e 927, CC; art. 14, CDC). Registra-se que, por segurança jurídica, foram consideradas sentenças sobre o mesmo fato, pedido e causa de pedir (genitores postulam danos morais reflexos; cancelamento do voo em 03.04.24, realocação às 12:50, destino ao Sítio Carroção). (TJES 5028236-63.2024.8.08.0024 ; 5028767-52.2024.8.08.0024 5028863-67.2024.8.08.0024) MÉRITO A controvérsia central reside na verificação da ocorrência de falha na prestação do serviço de transporte aéreo pela empresa ré, em decorrência do cancelamento do voo de ida da filha do autor, e na consequente existência de danos morais indenizáveis, bem como na definição de seu montante. De início, cumpre destacar que a ré, embora devidamente citada (ID 63946385), não compareceu à audiência de conciliação (ID 64473154) nem apresentou contestação, sendo-lhe, portanto, decretada a revelia, nos termos do art. 20 da Lei nº 9.099/95. A revelia acarreta a presunção de veracidade dos fatos alegados na petição inicial, conforme disposto no art. 344, CPC. Contudo, tal presunção é relativa (juris tantum), não isentando a parte autora de produzir prova mínima de seu direito (art. 373, I, CPC) e não implicando, por si só, na procedência automática do pedido, cabendo a este Juízo a análise do conjunto probatório. No caso em tela, o autor logrou êxito em comprovar os fatos constitutivos de seu direito, por meio de vasta prova documental, que confere verossimilhança à sua narrativa. RELAÇÃO DE CONSUMO A relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, enquadrando-se o autor e sua filha na figura de consumidores (art. 2º, CDC) e a ré como fornecedora de serviços (art. 3º, CDC). O contrato de transporte aéreo é o objeto desta relação. A lide deve ser analisada sob a ótica do CDC, que estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, independentemente da existência de culpa, nos termos do seu art. 14. A responsabilidade da companhia aérea somente é afastada se comprovada uma das excludentes de responsabilidade previstas no § 3º do mesmo artigo: (i) que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; ou (ii) a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Ademais, é direito básico do consumidor a inversão do ônus da prova, a critério do juiz, quando for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente (art. 6º, VIII, do CDC). No presente caso, a verossimilhança das alegações autorais, amparada pela prova documental, e a hipossuficiência técnica do consumidor frente à companhia aérea justificam a aplicação da medida. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO O autor demonstrou a contratação do transporte aéreo para sua filha, no voo AD 4921, com partida de Vitória (VIX) para Campinas (VCP) no dia 03/04/2024 (ID 46678673). Demonstrou, ainda, ter comparecido ao aeroporto no horário orientado, chegando às com antecedência, para o embarque que seria o início de uma aguardada viagem pedagógica escolar. O cancelamento abrupto do voo é fato incontroverso, comprovado pela fotografia do painel de embarque do aeroporto (ID 46679718), que exibe a informação: “05:55 Azul 4921 Campinas 05:55 Cancelled”, conforme cartão de embarque, referente ao voo 4921 (ID. 46678673). Ademais, a Autora anexou “Declaração (03/04/24)” emitida pela Azul referente ao voo 4921. Registra-se que “Declaração de Contingência” datada de 31/03/24, a qual demonstra que o voo 2886 com previsão de embarque em 05/04/2024 foi cancelado em razão da manutenção da aeronave, todavia não ficou claramente explicado pela parte Autora. As alegações são confirmadas através dos e-mails (id. 46679703 e sseguintes) da Fluir Turismo demonstram: - Conforme já informado, a nossa excursão pedagógica com os alunos do 7º ano ao Sítio do Carroção, emTatuí-SP, será no período de 03 a 05 de abril de 2024. - CARTA AOS CLIENTES.pdf; DECLARAÇÃO DE CONTINGÊNCIA.pdf - E temos um comunicado importante na cartinha anexa sobre a mudança de nosso voo de retorno do Sítio do Carroção no dia 05/04. - Informo que o voo de retorno do aluno é: DIA 05/04 Assim, tem-se que o cancelamento do voo de ida, no momento do embarque, culminou por frustrar o objetivo principal do contrato: a participação da criança na viagem em sua integralidade. Portanto, a necessidade de manutenção não programada em aeronave é considerada fortuito interno, ou seja, um risco inerente à própria atividade empresarial de transporte aéreo. Não se trata de evento imprevisível ou inevitável que rompa o nexo causal, mas sim de um desdobramento da própria operação, cujas consequências não podem ser transferidas ao consumidor. A ré não se desincumbiu do seu ônus probatório (art. 373, II, CPC c/c art. 14, §3º, CDC), pois poderia facilmente ter anexado aos autos relatórios técnicos, ordens de serviço ou qualquer outro documento idôneo que comprovasse a natureza extraordinária e imprevisível da manutenção, mas não o fez. A Ré ofereceu um voucher de R$ 400,00 (ID 46678694) com validade de 3 meses para novas compras, a qual se mostra irrisória diante da gravidade da falha na prestação do serviço e dos danos causados. Configurada, portanto, a falha na prestação do serviço pela ré. DANOS MORAIS Consoante cediço, o dano moral traduz um conceito jurídico que passou do plano doutrinário para o plano legal, tendo evoluído ao longo do tempo. Assim, com o advento da Constituição Federal a reparabilidade do dano moral não mais se questiona, tendo em vista o previsto no artigo 5º, V e X, que reconhece a possibilidade da indenização desses danos que não atingem o patrimônio material da vítima, estando a noção de dano moral ligada às agressões e danos causados à intimidade, à vida privada, à dignidade e à imagem das pessoas. Embora o mero cancelamento de voo, por si só, possa ser interpretado como mero aborrecimento em alguns contextos, as particularidades do caso em apreço extrapolam, em muito, a esfera do dissabor cotidiano, configurando efetiva lesão a direitos da personalidade do autor. A análise do dano moral, neste caso, deve ser feita sob três perspectivas distintas e cumulativas, todas com amparo fático e probatório nos autos: o dano em ricochete, a perda de uma chance e o desvio produtivo. O autor pleiteia indenização pelo dano sofrido de forma reflexa, ou por ricochete, em razão do sofrimento de sua filha. Tal tese encontra amparo na jurisprudência do STJ, que reconhece a legitimidade de familiares próximos para pleitear reparação por dano moral decorrente de ato ilícito que atingiu diretamente outro membro da família. (STJ REsp nº 1734536. 2019) Os autos demonstram de forma contundente o abalo sofrido pela criança. A viagem ao "Sítio do Carroção" era um evento aguardado. As conversas de WhatsApp (ID 46679185) são prova eloquente da ansiedade e alegria que antecederam o momento do embarque: “Eu tô mto ansiosa”; “Eu não dormi nada”. A abrupta frustração, com o cancelamento do voo no aeroporto, após uma noite em claro, gerou decepção e angústia, também documentadas na mesma conversa. O autor, como pai, vivenciou diretamente: desde os preparativos e a expectativa da filha, passando pela madrugada no aeroporto, até à frustração após o cancelamento. É inegável o sofrimento de um pai ao testemunhar a dor e a impotência de sua filha diante do dano causado por terceiro. Este sofrimento, que atinge a esfera íntima diante do vínculo afetivo autor, constitui dano moral direto, ainda que originado de um ato lesivo a outrem. O quadro é agravado pela constatação de que o ato da ré privou a criança de participar da Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA), evento para o qual estava inscrita, conforme e-mail de 05/04/2024 (ID 46678682). Além do dano reflexo, o autor sofreu DANOS DIRETOS. Restou comprovado que, em razão da viagem da filha, o autor se inscreveu em um evento profissional relevante para sua carreira, o "Open PMIES 2024", que ocorreria em 04/04/2024 e lhe renderia 3 PDUs (Professional Development Units), conforme comprovantes de ID 46678699 e ID 46679156. Com o cancelamento da viagem e a necessidade de permanecer com a filha, o autor foi impedido de comparecer ao evento, perdendo uma oportunidade concreta de networking, aprendizado e qualificação profissional. A data da aquisição do ingresso, anterior a viagem (29/03/24), torna verossímil a alegação. ( id. 46678699). Registra-se que o dano moral reflexo suportado pelo genitor deve ser quantificado em valor diverso do da vítima, uma vez que é em menor proporção. (TJ-ES. 5002396-57.2019.8.08.0014) A jurisprudência entende pela possibilidade de danos morais em casos similares: Menor impúbere que viaja desacompanhada dos pais. Remanejamento da passageira do aeroporto de Orlando para o de Nova Iorque, ao invés do trecho originalmente contratado (Orlando x Miami x Rio de Janeiro) (...) Relação de afetividade entre os genitores e a filha adolescente. In casu, ainda que os pais da menor estivessem no Brasil, eles experimentaram toda a angústia e sofrimento com o fato de a adolescente, viajando em grupo de excursão para a Disney, ao retornar para casa teve seu voo remanejado de Orlando, FL para Nova Iorque, acarretando um atraso de cerca de 24 horas para regresso ao Brasil. Situação que ultrapassou, em muito, o mero aborrecimento cotidiano, interferindo na esfera psicológica dos genitores, diante de toda a confusão provocada pela companhia aérea. Falha na prestação do serviço configurada. (...) Causa excludente de responsabilidade (força maior) não configurada. Teoria do risco do empreendimento ou da atividade. Quantum indenizatório que não merece sofrer qualquer redução, se mostrando adequado e condizente com as mazelas experimentadas (R$10.000,00 para a adolescente e R$5.000,00 para cada um dos genitores). (TJ-RJ: 00135289820208190001, 2021) Para a fixação do valor da indenização por danos morais, deve-se adotar o método bifásico, considerando, em um primeiro momento, um valor básico para casos semelhantes e, em um segundo momento, as circunstâncias do caso concreto para a fixação definitiva. Considerando a dupla finalidade da indenização – compensatória para a vítima e pedagógica para o ofensor – e atentando-se aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, entendo que o valor de R$ 4.000,00, mostra-se justo e adequado para reparar os danos sofridos pelo autor e para desestimular a reiteração da conduta ilícita pela ré. DO DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: CONDENAR a requerida ao pagamento de R$ 4.000,00 ao autor, a título de danos morais, a ser atualizado monetariamente pelo IPCA (art. 398, CC) a partir da data do arbitramento (Súmula n. 362, STJ), com incidência de juros moratórios pela taxa SELIC (art. 406, §1º, CC) a partir da citação, na forma do art. 405 do CC, devendo, a partir da citação, incidir apenas a taxa SELIC, visto que esta já engloba juros e correção monetária. Sem custas e honorários nesta fase processual, razão pela qual deixo de apreciar eventual pedido de justiça gratuita (art. 55, caput, Lei 9.099/95). O pagamento mediante depósito judicial deverá ser realizado obrigatoriamente perante o BANESTES. Submeto o projeto de sentença à análise do Juiz de Direito. (art. 40, caput, Lei 9.099/95) Victor Augusto Moura Castro Juiz Leigo SENTENÇA Homologo o projeto de sentença elaborado pelo Juiz Leigo (art. 40 da Lei9.099/95). VILA VELHA-ES, [Data registrada automaticamente, conforme assinatura eletrônica lançada no sistema]. I. SANTOS RODRIGUES Juiz de Direito Nome: RONEY ROBERTO CUNHA MEDICE Endereço: Avenida Estudante José Júlio de Souza, 1742, Vina Del Mar, Apt 1001, Praia de Itaparica, VILA VELHA - ES - CEP: 29102-010 Nome: AZUL LINHAS AEREAS BRASILEIRAS S.A. Endereço: Avenida Marcos Penteado de Ulhôa Rodrigues, 939, 9 andar Ed. Jatoba, Tamboré, BARUERI - SP - CEP: 06460-040

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