Jerson Oliveira Dos Santos e outros x Uber Do Brasil Tecnologia Ltda. e outros
ID: 259933763
Tribunal: TRT2
Órgão: Vice-Presidência Judicial
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 1001836-28.2023.5.02.0511
Data de Disponibilização:
24/04/2025
Advogados:
IBOTI OLIVEIRA BARCELOS JUNIOR
OAB/RS XXXXXX
Desbloquear
RAFAEL ALFREDI DE MATOS
OAB/SP XXXXXX
Desbloquear
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO ANÁLISE DE RECURSOS Relator: MARCELO FREIRE GONCALVES 1001836-28.2023.5.02.0511 : JERSON OLIVEIRA DOS SANTOS : …
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO ANÁLISE DE RECURSOS Relator: MARCELO FREIRE GONCALVES 1001836-28.2023.5.02.0511 : JERSON OLIVEIRA DOS SANTOS : UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. E OUTROS (2) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID a7ccf62 proferida nos autos. 1001836-28.2023.5.02.0511 - 14ª TurmaRecorrente(s): 1. JERSON OLIVEIRA DOS SANTOS Recorrido(a)(s): 1. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO 2. UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. 3. UBER INTERNATIONAL B.V. 4. UBER INTERNATIONAL HOLDING B.V. RECURSO DE: JERSON OLIVEIRA DOS SANTOS PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Recurso tempestivo (decisão publicada em 24/02/2025 - Id 8ee7689; recurso apresentado em 06/03/2025 - Id 8b5c844). Regular a representação processual (Id 98d232e). Preparo dispensado (Id c4187c0). PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS 1.1 DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO (13707) / RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO Alegação(ões): Sustenta a recorrente que a relação de emprego encontra-se plenamente caracterizada, estando presentes todos os requisitos do vínculo trabalhista. Consta do v. acórdão: "Assevera o reclamante que preenche todos os requisitos de emprego definidos nos artigos 2° e 3° da CLT em sua relação com a reclamada, motivo pelo qual deve ser reconhecida a relação de emprego. Sem razão. Para a configuração da relação de emprego, a doutrina com respaldo no artigo 3º da CLT exige a presença concomitante dos seguintes requisitos: pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade. A ausência de qualquer desses requisitos importa na descaracterização da relação de emprego. Nesse sentido, importante observar que a CLT dispõe, em seu art. 787, que compete ao reclamante instruir a reclamação desde logo acompanhada dos documentos em que se fundar, ou seja, com os documentos destinados a provar-lhe as alegações. A ausência de prova do fato constitutivo do direito tem um efeito devastador na pretensão apresentada em juízo. O artigo 818 da CLT dispõe claramente que a prova das alegações incumbe à parte que as fizer, pelo que obrigado está o empregado a apresentar prova constitutiva do seu direito. O ônus da prova, portanto, via de regra, é do Reclamante. Assim, compete ao trabalhador que reclama o reconhecimento de vínculo empregatício comprovar de forma indene de dúvidas que foi contratado para prestar serviços pessoalmente ao reclamado com habitualidade, onerosidade e subordinação, uma vez que se trata de fato constitutivo do seu direito (art. 818 da CLT c/c inciso I do art. 333 da CPC). Negada a relação de emprego, mas admitida a prestação de serviços, o ônus de prova será invertido e passará a ser das reclamadas, uma vez que alegam fato modificativo ao direito do autor. Assim, a reclamada deve provar a ausência de pessoalidade, eventualidade, onerosidade e a subordinação na eventual relação entre as partes. Contudo, não se pode ignorar que o magistrado ao julgar a demanda deverá atentar para a prova coletada nos autos, independentemente de quem tenha o ônus da prova. No caso em testilha, a ausência do principal requisito caracterizador do liame empregatício, qual seja, a subordinação, bem como a utilização concomitante de plataformas concorrentes, emerge dos fatos da prova testemunhal emprestada trazida aos autos pelas partes. (Id. 6a6f06e- ID - 2011b8d) Os elementos dos autos demonstram a presença de enorme autonomia na prestação de serviços, totalmente incompatível com a existência de vínculo de emprego. Registre-se que a dinâmica da prestação de serviços por meio de aplicativos de transporte de passageiros, tais como UBER, CABIFY e 99TÁXI, amplamente utilizada nos dias atuais, apresenta peculiaridades que não permitem o reconhecimento da existência de relação de emprego nos moldes estabelecidos no art. 3º da CLT. Com efeito, o recorrente não estava sujeito a um efetivo poder diretivo exercido pela reclamada, desempenhando suas atividades com autonomia e conforme sua conveniência. Não bastasse isso, recebia entre 85% a 65% do valor da corrida, o que denota que não se tratava de um mero assalariado, laborando em verdadeira parceria com a referida empresa detentora do aplicativo. Ressalta-se a maciça a recente jurisprudência do C. TST neste sentido: "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017 - UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. - TRABALHO PRESTADO POR MEIO DE PLATAFORMAS DIGITAIS - INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO DE EMPREGO - TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA O trabalho desempenhado por meio de plataformas digitais não cumpre os requisitos dos arts. 2º e 3º da CLT, não havendo vínculo de emprego entre os trabalhadores e a respectiva plataforma. Julgados de Turmas desta Eg. Corte. Agravo de Instrumento a que se nega provimento" (AIRR-0001322-65.2023.5.11.0051, 4ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 22/11/2024). "IGM/ra/as A) AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA. I) INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO - TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA - DESPROVIMENTO. 1. O pedido e a causa de pedir, in casu , denotam pretensão declaratória quanto à existência de relação de emprego entre motorista e plataforma digital . Logo, é esta Justiça Especializada competente para analisar se, no caso concreto, existem, ou não, os elementos caracterizadores da relação empregatícia, nos termos dos arts. 2º e 3° da CLT. 2. Dessa feita, por se tratar de questão jurídica nova, reconheço a transcendência jurídica da matéria, nos termos do art. 896-A, § 1º, IV, da CLT. 3. Contudo, a decisão regional segue em total consonância com o entendimento firmado por esta 4ª Turma, razão pela qual nego provimento ao agravo de instrumento, no tópico, apesar de reconhecida a transcendência jurídica da causa. Agravo de instrumento desprovido, no particular. II) VÍNCULO DE EMPREGO ENTRE MOTORISTA E PLATAFORMA TECNOLÓGICA OU APLICATIVO CAPTADOR DE CLIENTES ("99 TECNOLOGIA LTDA.") - IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DIANTE DA AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA - TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA - PROVIMENTO . 1. Avulta a transcendência jurídica da causa (CLT, art. 896-A, § 1º, IV), na medida em que o pleito de reconhecimento do vínculo de emprego envolvendo os recentes modelos de contratação firmados entre motoristas de aplicativo e empresas provedoras de plataformas de tecnologia por eles utilizadas ainda é nova no âmbito desta Corte, demandando a interpretação da legislação trabalhista em torno da questão. 2. Diante da transcendência jurídica da causa e da possível violação dos art. 1º, IV, da CF, dá-se provimento ao agravo de instrumento da Reclamada, para determinar o processamento de seu recurso de revista. Agravo de instrumento provido, no aspecto. B) RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA - RITO SUMARÍSSIMO - VÍNCULO DE EMPREGO ENTRE MOTORISTA E PLATAFORMA TECNOLÓGICA OU APLICATIVO CAPTADOR DE CLIENTES ("99 TECNOLOGIA LTDA.") - IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DIANTE DA AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA - TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA - PROVIMENTO. 1. Em relação às novas formas de trabalho e à incorporação de tecnologias digitais no trato das relações interpessoais - que estão provocando uma transformação profunda no Direito do Trabalho, mas carentes ainda de regulamentação legislativa específica - deve o Estado-Juiz, atento a essas mudanças, distinguir os novos formatos de trabalho daqueles em que se está diante de uma típica fraude à relação de emprego, de modo a não frear o desenvolvimento socioeconômico do país no afã de aplicar regras protetivas do direito laboral a toda e qualquer forma de trabalho. 2. Nesse contexto, analisando, à luz dos arts. 2º e 3º da CLT, a relação existente entre a "99 Tecnologia LTDA." e os motoristas que se utilizam desse aplicativo para obterem clientes dos seus serviços de transporte, tem-se que: a) quanto à habitualidade, inexiste a obrigação de uma frequência predeterminada ou mínima de labor pelo motorista para o uso do aplicativo, estando a cargo do profissional definir os dias e a constância em que irá trabalhar; b) quanto à subordinação jurídica, a par da ampla autonomia do motorista em escolher os dias, horários e forma de labor, podendo desligar o aplicativo a qualquer momento e pelo tempo que entender necessário, sem nenhuma vinculação a metas determinadas pela Reclamada ou sanções decorrentes de suas escolhas, a necessidade de observância de cláusulas contratuais (valores a serem cobrados, código de conduta, instruções de comportamento, avaliação do motorista pelos clientes), com as correspondentes sanções no caso de descumprimento (para que se preserve a confiabilidade e a manutenção do aplicativo no mercado concorrencial), não significa que haja ingerência no modo de trabalho prestado pelo motorista, reforçando a convicção quanto ao trabalho autônomo a inclusão da categoria de motorista de aplicativo independente, como o motorista da "99Tecnologia Ltda.", no rol de atividades permitidas para inscrição como Microempreendedor Individual - MEI, nos termos da Resolução 148/2019 do Comitê Gestor do Simples Nacional; c) quanto à remuneração, o caráter autônomo da prestação de serviços se caracteriza por arcar, o motorista, com os custos da prestação do serviço (manutenção do carro, combustível, IPVA), caber a ele a responsabilidade por eventuais sinistros, multas, atos ilícitos ocorridos, dentre outros (ainda que a empresa provedora da plataforma possa a vir a ser responsabilizada solidariamente em alguns casos), além de os percentuais fixados pela "99 Tecnologia Ltda.", de cota parte do motorista, serem superiores ao que este Tribunal vem admitindo como suficientes a caracterizar a relação de parceria entre os envolvidos, como no caso de plataformas semelhantes. 3. Já quanto à alegada subordinação estrutural, não cabe ao Poder Judiciário ampliar conceitos jurídicos a fim de reconhecer o vínculo empregatício de profissionais que atuam em novas formas de trabalho, emergentes da dinâmica do mercado concorrencial atual e, principalmente, de desenvolvimentos tecnológicos, nas situações em que não se constata nenhuma fraude, como é o caso das empresas provedoras de aplicativos de tecnologia, que têm como finalidade conectar quem necessita da condução com o motorista credenciado, sendo o serviço prestado de motorista, em si, competência do profissional e apenas uma consequência inerente ao que propõe o dispositivo. 4. Assim sendo, merece reforma o acórdão regional, para afastar o reconhecimento da relação empregatícia entre o Motorista e a Empresa Provedora do aplicativo, julgando-se improcedente a presente ação. Recurso de revista provido" (RRAg-0010190-80.2023.5.03.0107, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 21/11/2024). "A) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA PARTE RECLAMADA. RITO SUMARÍSSIMO. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DAS LEIS Nºs 13.015/2014 E 13.467/2017. 1. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. RELAÇÃO ESTABELECIDA ENTRE MOTORISTA DE APLICATIVO E A EMPRESA DE PLATAFORMA DIGITAL. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO I. A competência material da Justiça Especializada é fixada a partir do pedido e da causa de pedir. II. Na hipótese, a lide se funda no reconhecimento de vínculo de emprego entre o Reclamante, motorista de aplicativo e a Reclamada, empresa de plataforma de tecnologia digital. III. Desse modo, em se tratado de controvérsia acerca da natureza jurídica do vínculo trabalhista, com pedido de reconhecimento de vínculo empregatício, a competência para conhecimento e julgamento da causa é desta Especializada, nos moldes do art. 114, I, da Constituição Federal. IV. Reconhecida a transcendência jurídica da matéria. V. Agravo de instrumento a que se nega provimento. 2. NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. DECISÃO DE MÉRITO EM FAVOR DA PARTE RECORRENTE. APLICAÇÃO DO ART. 282, § 2º, DO CPC/2015. NÃO APRECIAÇÃO. I. Tendo em vista a possibilidade de julgamento do mérito do recurso quanto ao tema "MOTORISTA DE APLICATIVO. TRABALHADOR AUTÔNOMO. AUSÊNCIA DE VÍNCULO DE EMPREGO" em favor da parte ora Recorrente, deixa-se de apreciar a insurgência quanto à alegação de nulidade processual ora em destaque. Aplicação da regra do § 2º do art. 282 do CPC/2015. II. Agravo de instrumento de que se deixa de apreciar, quanto ao tema. 3. MOTORISTA DE APLICATIVO . TRABALHADOR AUTÔNOMO. AUSÊNCIA DE VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. I. Hipótese em que a Corte Regional reconheceu a existência de vínculo de emprego entre o Reclamante e a Reclamada, empresa de plataforma tecnológica de transporte de gestão de oferta de motoristas entregadores-usuários e demanda de clientes-usuários. II. Há transcendência jurídica quando se constata a existência de controvérsia sobre questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista. III. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se dá provimento, para determinar o processamento do recurso de revista, observando-se o disposto no ATO SEGJUD.GP Nº 202/2019 do TST. B) RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA PARTE RECLAMADA. RITO SUMARÍSSIMO. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DAS LEIS Nº 13.015/2014 E 13.467/2017. MOTORISTA DE APLICATIVO . TRABALHADOR AUTÔNOMO. AUSÊNCIA DE VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO . I. A relação de emprego definida pela CLT (1943) tem como padrão a relação clássica de trabalho industrial, comercial e de serviços. As novas formas de trabalho devem ser reguladas por lei própria e, enquanto o legislador não a editar, não pode o julgador aplicar o padrão da relação de emprego para todos os casos. O contrato regido pela CLT exige a convergência de quatro elementos configuradores: pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica. Esta decorre do poder hierárquico da empresa e se desdobra nos poderes diretivo, fiscalizador, regulamentar e disciplinar (punitivo). O enquadramento da relação estabelecida entre o motorista de aplicativo e a respectiva plataforma deve se dar com aquela prevista no ordenamento jurídico com maior afinidade, como é o caso da definida pela Lei nº 11.442/2007, do transportador autônomo , assim configurado aquele que é proprietário do veículo e tem relação de natureza comercial. II . As inovações tecnológicas estão transformando todas e cada parte de nossas vidas. A tecnologia não pede licença, mas sim, desculpa. A capacidade de trocar de forma rápida e barata grandes quantidades de dados e informações permitiu o surgimento da economia digital e do trabalho pelas plataformas digitais. Tanto nos países desenvolvidos quanto nos países em desenvolvimento, os consumidores adotaram essa transformação, pois serviços e bens são entregues de maneiras mais baratas e convenientes. Assim, as empresas se adaptaram para atender essa demanda do mercado consumidor. III . O trabalho pela plataforma tecnológica - e não para ela -, não atende aos critérios definidos nos artigos 2º e 3º da CLT, pois o usuário-motorista pode dispor livremente quando e se disponibilizará seu serviço de transporte para os usuários-clientes, sem qualquer exigência de trabalho mínimo, de número mínimo de viagens por período, de faturamento mínimo. IV. Reconhecida a transcendência jurídica da matéria. V . Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RRAg-0000336-70.2024.5.13.0003, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 21/11/2024). "DIREITO DO TRABALHO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. A questão jurídica que envolve o reconhecimento de vínculo de emprego de motorista de aplicativo tem transcendência jurídica. 2. A tese recursal independe do revolvimento de fatos e provas, na medida em que o vínculo empregatício foi reconhecido com base em subordinação algorítmica ou estrutural, tese que tem sido reiteradamente afastada pelo Supremo Tribunal Federal. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL OU ALGORÍTMICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A questão debatida nos autos diz respeito à natureza da relação jurídica que se forma entre empresas que exploram plataformas digitais e motoristas ou entregadores que se utilizam da tecnologia do aplicativo. 2. O Tribunal Regional reconheceu o vínculo empregatício fundamentado exclusivamente na existência de uma subordinação algorítmica, pois o trabalhador teria sua atividade controlada e fiscalizada por meio de sistemas de inteligência artificial. 3. A relação jurídica que envolve os motoristas de aplicativo e as empresas que gerem as plataformas digitais é fruto da revolução tecnológica que promove novas formas de prestação de serviços e novos formatos contratuais, muitas das quais ainda carecem de uma regulamentação legal específica. 4. A chamada subordinação algorítmica não encontra agasalho na ordem jurídica vigente e esse novo modelo contratual que envolve motoristas de aplicativos e empresas provedoras de plataformas digitais não se enquadra no modelo empregatício regulamentado pela Consolidação das Leis do Trabalho. 5. A observância de regras de conduta é inerente a qualquer modalidade contratual e ínsita a qualquer atividade profissional, seja ela subordinada ou não, de modo que as circunstâncias fáticas registradas no acórdão regional (impossibilidade de o motorista ditar o preço do serviço e a necessidade de observar regras de conduta) não são suficientes para caracterizar a relação empregatícia. 6. Não se desconhece a notória necessidade de proteção jurídica aos motoristas de aplicativo, porém, tal desiderato protetivo deve ser alcançado via legislativa, nada justificando trazê-los ao abrigo de uma relação de emprego que não foi pactuada. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-462-04.2022.5.13.0032, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 19/11/2024). Por fim registra-se que nas Reclamações Constitucionais de números 63.414, 61.267 e 59.404 o Supremo Tribunal Federal cassou acórdãos do TRT3 que reconhecia vínculo de emprego em situação análoga. Irretocável, pois, a sentença na parte em que não reconheceu a existência de vínculo empregatício entre as partes. Mantida a r. sentença de primeiro grau em relação ao vínculo de emprego, prejudicado o exame das demais questões." Discute-se nos presentes autos a existência de vínculo empregatício entre motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa administradora de plataforma digital. O Regional indeferiu a pretensão, por não vislumbrar, no relacionamento que houve entre os litigantes, os requisitos exigidos pelos arts. 2º e 3º da CLT. Trata-se de questão nova, ainda não pacificada nas Cortes Superiores, mas há julgados reconhecendo a existência dos elementos caracterizadores do vínculo empregatício (trabalho por pessoa natural, pessoalidade, não eventualidade, subordinação e onerosidade) na hipótese. Nesse sentido: "RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017. UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. NATUREZA JURÍDICA DA RELAÇÃO MANTIDA ENTRE OS TRABALHADORES PRESTADORES DE SERVIÇOS E EMPRESAS QUE ORGANIZAM, OFERTAM E EFETIVAM A GESTÃO DE PLATAFORMAS DIGITAIS DE DISPONIBILIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE AO PÚBLICO, NO CASO, O TRANSPORTE DE PESSOAS E MERCADORIAS. NOVAS FORMAS DE ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA FORÇA DE TRABALHO HUMANA NO SISTEMA CAPITALISTA E NA LÓGICA DO MERCADO ECONÔMICO. ESSENCIALIDADE DO LABOR DA PESSOA HUMANA PARA A CONCRETIZAÇÃO DOS OBJETIVOS DA EMPRESA. PROJEÇÃO DAS REGRAS CIVILIZATÓRIAS DO DIREITO DO TRABALHO SOBRE O LABOR DAS PESSOAS NATURAIS. INCIDÊNCIA DAS NORMAS QUE REGULAM O TRABALHO SUBORDINADO DESDE QUE NÃO DEMONSTRADA A REAL AUTONOMIA NA OFERTA E UTILIZAÇÃO DA MÃO DE OBRA DO TRABALHADOR (ART. 818, II, DA CLT). CONFLUÊNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS HUMANISTAS E SOCIAIS QUE ORIENTAM A MATÉRIA (PREÂMBULO DA CF/88; ART. 1º, III E IV; ART. 3º, I, II, III E IV; ART. 5º, CAPUT ; ART. 6º; ART. 7º, CAPUT E SEUS INCISOS E PARÁGRAFO ÚNICO; ARTS. 8º ATÉ 11; ART. 170, CAPUT E INCISOS III, VII E VIII; ART. 193, TODOS DA CONSTITUIÇÃO DE 1988). VÍNCULO DE EMPREGO. DADOS FÁTICOS CONSTANTES DO ACÓRDÃO REGIONAL REFERINDO-SE A RELAÇÃO SOCIOECONÔMICA ABRANGENTE DE PERÍODO DE QUASE DOIS MESES. PRESENÇA DOS ELEMENTOS INTEGRANTES DA RELAÇÃO EMPREGATÍCIA. INCIDÊNCIA, ENTRE OUTROS PRECEITOS, TAMBÉM DA REGRA DISPOSTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 6º DA CLT (INSERIDA PELA LEI n. 12.551/2011), A QUAL ESTABELECE QUE 'OS MEIOS TELEMÁTICOS E INFORMATIZADOS DE COMANDO, CONTROLE E SUPERVISÃO SE EQUIPARAM, PARA FINS DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA, AOS MEIOS PESSOAIS E DIRETOS DE COMANDO, CONTROLE E SUPERVISÃO DO TRABALHO ALHEIO'. PRESENÇA, POIS, DOS CINCO ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO, OU SEJA: PESSOA HUMANA PRESTANDO TRABALHO; COM PESSOALIDADE; COM ONEROSIDADE; COM NÃO EVENTUALIDADE; COM SUBORDINAÇÃO. ÔNUS DA PROVA DO TRABALHO AUTÔNOMO NÃO CUMPRIDO, PROCESSUALMENTE (ART 818, CLT), PELA EMPRESA DE PLATAFORMA DIGITAL QUE ARREGIMENTA, ORGANIZA, DIRIGE E FISCALIZA A PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS ESPECIALIZADOS DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE. Cinge-se a controvérsia do presente processo em definir se a relação jurídica havida entre o Reclamante e a Reclamada - Uber do Brasil Tecnologia Ltda. - configurou-se como vínculo de emprego (ou não). A solução da demanda exige o exame e a reflexão sobre as novas e complexas fórmulas de contratação da prestação laborativa, algo distintas do tradicional sistema de pactuação e controle empregatícios, e que ora se desenvolvem por meio da utilização de plataformas e aplicativos digitais, softwares e mecanismos informatizados semelhantes, todos cuidadosamente instituídos, preservados e geridos por sofisticadas (e, às vezes, gigantescas) empresas multinacionais e, até mesmo, nacionais. É importante perceber que tais sistemas e ferramentas computadorizados surgem no contexto do aprofundamento da revolução tecnológica despontada na segunda metade do século XX (ou, um pouco à frente, no início do século XXI), a partir da informática e da internet , propiciando a geração de um sistema empresarial de plataformas digitais, de amplo acesso ao público, as quais permitem um novo meio de arregimentação de mão de obra, diretamente por intermédio desses aplicativos digitais, que têm o condão de organizar, direcionar, fiscalizar e zelar pela hígida prestação de serviços realizada ao cliente final. A modificação tecnológica e organizacional ocorrida nas duas últimas décadas tem sido tão intensa que há, inclusive, autores e correntes de pensamento que falam na existência de uma quarta revolução tecnológica no sistema capitalista. Evidentemente que essa nova estrutura de organização empresarial e de prestação de serviços facilita a aproximação e a comunicação na sociedade e no âmbito da prestação de serviços ao público alvo, seja este formado por pessoas físicas ou por instituições. Porém a lógica de sua estruturação e funcionamento também tem sido apreendida por grandes corporações empresariais como oportunidade ímpar para reduzirem suas estruturas produtivas e, especialmente, o custo do trabalho utilizado e imprescindível para o bom funcionamento econômico da entidade empresarial. De nenhuma valia econômica teria este sistema organizacional e tecnológico, conforme se percebe, se não houvesse, é claro, a prestação laborativa por ele propiciada ao público alvo objetivado - neste caso, se não existissem motoristas e carros organizadamente postos à disposição das pessoas físicas e jurídicas. Realmente, os impactos dessa nova modalidade empresarial e de organização do trabalho têm sido diversos: de um lado, potenciam, fortemente, a um custo mais baixo do que o precedente, a oferta do trabalho de transporte de pessoas e coisas no âmbito da sociedade; de outro lado, propiciam a possibilidade de realização de trabalho por pessoas desempregadas, no contexto de um desemprego agudo criado pelas políticas públicas e por outros fatores inerentes à dinâmica da economia; mas, em terceiro lugar, pela desregulamentação amplamente praticada por este sistema, gerando uma inegável deterioração do trabalho humano, uma lancinante desigualdade no poder de negociação entre as partes, uma ausência de regras de higiene e saúde do trabalho, uma clara falta de proteção contra acidentes ou doenças profissionais, uma impressionante inexistência de quaisquer direitos individuais e sociais trabalhistas, a significativa ausência de proteções sindicais e, se não bastasse, a grave e recorrente exclusão previdenciária. O argumento empresarial, em tal quadro, segue no sentido de ser o novo sistema organizacional e tecnológico tão disruptivo perante a sistemática de contratação anterior que não se fazem presentes, em sua estrutura e dinâmica, os elementos da relação empregatícia. E, efetivamente, é o que cabe examinar, afinal, no presente processo. Passa-se, dessa maneira, ao exame da relação socioeconômica e jurídica entre as partes do presente processo, respeitados os aspectos fáticos lançados pelo próprio acórdão regional, como determina a Súmula 126 do TST. Nesse exame, sem negligenciar a complexidade das questões que envolvem a discussão dos autos, o eventual enquadramento como vínculo empregatício da relação jurídica entre o prestador de serviços e as plataformas digitais, pelo Poder Judiciário Trabalhista no Brasil, vai depender das situações fáticas efetivamente demonstradas, as quais, por sua própria complexidade, podem abarcar inúmeras e múltiplas hipóteses. A propósito, no Direito brasileiro existe sedimentada presunção de ser empregatício o vínculo jurídico formado - regido pela Constituição da República (art. 7º) e pela CLT, portanto - , desde que seja incontroversa a prestação de serviços por uma pessoa natural a alguém (Súmula 212, TST). Essa presunção jurídica relativa (não absoluta, esclareça-se) é clássica ao Direito do Trabalho, em geral, resultando de dois fatores historicamente incontestáveis: a circunstância de ser a relação de emprego a regra geral de conexão dos trabalhadores ao sistema socioeconômico capitalista; a circunstância de a relação de emprego, desde o surgimento do Direito do Trabalho, ter se tornado a fórmula mais favorável e protegida de inserção da pessoa humana trabalhadora na competitiva e excludente economia contemporânea. No Brasil, desponta a singularidade de esta antiga presunção jurídica ter sido incorporada, de certo modo, até mesmo pela Constituição da República de 1988, ao reconhecer, no vínculo empregatício, um dos principais e mais eficazes instrumentos de realização de notável bloco de seus princípios cardeais, tais como o da dignidade do ser humano, o da centralidade da pessoa humana na ordem jurídica e na vida socioeconômica, o da valorização do trabalho e do emprego, o da inviolabilidade física e psíquica da pessoa humana, o da igualdade em sentido substancial, o da justiça social, o do bem-estar individual e social, o da segurança e o da subordinação da propriedade à sua função socioambiental. Com sabedoria, a Constituição percebeu que não se criou, na História do Capitalismo, nessa direção inclusiva, fórmula tão eficaz, larga, abrangente e democrática quanto a estruturada na relação de emprego. Convergindo inúmeros preceitos constitucionais para o estímulo, proteção e elogio à relação de emprego (ilustrativamente: Preâmbulo da CF/88; art. 1º, III e IV; art. 3º, I, II, III e IV; art. 5º, caput ; art. 6º; art. 7º, caput e seus incisos e parágrafo único; arts. 8º até 11; art. 170, caput e incisos III, VII e VIII; art. 193, todos do Texto Máximo de 1988), emerge clara a presunção também constitucional em favor do vínculo empregatício no contexto de existência de incontroversa prestação de trabalho na vida social e econômica. De par com isso, a ordem jurídica não permite a contratação do trabalho por pessoa natural, com os intensos elementos da relação de emprego, sem a incidência do manto mínimo assecuratório da dignidade básica do ser humano nessa seara da vida individual e socioeconômica. Em consequência, possuem caráter manifestamente excetivo fórmulas alternativas de prestação de serviços a alguém, por pessoas naturais, como, ilustrativamente, contratos de estágio, vínculos autônomos ou eventuais, relações cooperativadas e as fórmulas intituladas de 'pejotização' e, mais recentemente, o trabalho de transporte de pessoas e coisas via arregimentação e organização realizadas por empresas de plataformas digitais. Em qualquer desses casos, estando presentes os elementos da relação de emprego, esta prepondera e deve ser reconhecida, uma vez que a verificação desses pressupostos, muitas vezes, demonstra que a adoção de tais práticas se dá, essencialmente, como meio de precarizar as relações empregatícias (art. 9º, da CLT). Nesse aspecto, cumpre enfatizar que o fenômeno sóciojurídico da relação empregatícia emerge quando reunidos os seus cinco elementos fático-jurídicos constitutivos: prestação de trabalho por pessoa física a outrem, com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e sob subordinação. Observe-se que, no âmbito processual, uma vez admitida a prestação de serviços pelo suposto empregador/tomador de serviços, a ele compete demonstrar que o labor se desenvolveu sob modalidade diversa da relação de emprego, considerando a presunção (relativa) do vínculo empregatício sedimentada há várias décadas no Direito do Trabalho, conforme exaustivamente exposto. A análise casual das hipóteses discutidas em Juízo, portanto, deve sempre se pautar no critério do ônus da prova - definido no art. 818 da CLT -, competindo ao obreiro demonstrar a prestação de serviços (inciso I do art. 818 da CLT); e à Reclamada, provar eventual autonomia na relação jurídica (inciso II do art. 818 da CLT). No caso dos autos, a prova coligida no processo e referenciada pelo acórdão recorrido demonstrou que a Reclamada administra um empreendimento relacionado ao transporte de pessoas - e não mera interligação entre usuários do serviço e os motoristas cadastrados no aplicativo - e que o Reclamante lhe prestou serviços como motorista do aplicativo digital. Assim, ficaram firmemente demonstrados os elementos integrantes da relação de emprego, conforme descrito imediatamente a seguir. Em primeiro lugar, é inegável (e fato incontroverso) de que o trabalho de dirigir o veículo e prestar o serviço de transporte, em conformidade com as regras estabelecidas pela empresa de plataforma digital, foi realizado, sim, por uma pessoa humana - no caso, o Reclamante. Em segundo lugar, a pessoalidade também está comprovada, pois o Obreiro precisou efetivar um cadastro individual na Reclamada, fornecendo dados pessoais e bancários, bem como, no decorrer da execução do trabalho, foi submetido a um sistema de avaliação individualizada, a partir de notas atribuídas pelos clientes e pelo qual a Reclamada controlava a qualidade dos serviços prestados. É também incontroverso de que todas as inúmeras e incessantes avaliações feitas pela clientela final referem-se à pessoa física do motorista uberizado, emergindo, assim, a presença óbvia do elemento fático e jurídico da pessoalidade. O caráter oneroso do trabalho executado é também incontroverso, pois a clientela faz o pagamento ao sistema virtual da empresa, em geral por meio de cartão de crédito (podendo haver também, mais raramente, pagamento em dinheiro) e, posteriormente, a empresa gestora do sistema informatizado credita parte do valor apurado na conta corrente do motorista. Ora, o trabalhador somente adere a esse sistema empresarial e de prestação laborativa porque ele lhe assegura retribuição financeira em decorrência de sua prestação de trabalho e em conformidade com um determinado percentual dos valores apurados no exercício desse trabalho. Sobre a não eventualidade, o labor do Reclamante estava inserido na dinâmica intrínseca da atividade econômica da Reclamada e inexistia qualquer traço de transitoriedade na prestação do serviço. Não era eventual, também, sob a perspectiva da teoria do evento, na medida em que não se tratava de labor desempenhado para certa obra ou serviço, decorrente de algum acontecimento fortuito ou casual. De todo modo, é também incontroverso de que se trata de labor inerente à rotina fundamental da empresa digital de transporte de pessoas humanas, sem o qual tal empresa sequer existiria. Por fim, a subordinação jurídica foi efetivamente demonstrada, destacando-se as seguintes premissas que se extraem do acórdão regional, incompatíveis com a suposta autonomia do trabalhador na execução do trabalho: 1) a Reclamada organizava unilateralmente as chamadas dos seus clientes/passageiros e indicava o motorista para prestar o serviço; 2) a empresa exigia a permanência do Reclamante conectado à plataforma digital para prestar os serviços, sob risco de descredenciamento da plataforma digital (perda do trabalho); 3) a empresa avaliava continuamente a performance dos motoristas, por meio de um controle telemático e pulverizado da qualidade dos serviços, a partir da tecnologia da plataforma digital e das notas atribuídas pelos clientes/passageiros ao trabalhador. Tal sistemática servia, inclusive, de parâmetro para o descredenciamento do motorista em face da plataforma digital - perda do trabalho -, caso o obreiro não alcançasse uma média mínima; 4) a prestação de serviços se desenvolvia diariamente, durante o período da relação de trabalho - ou, pelo menos, com significativa intensidade durante os dias das semanas -, com minucioso e telemático controle da Reclamada sobre o trabalho e relativamente à estrita observância de suas diretrizes organizacionais pelo trabalhador, tudo efetivado, aliás, com muita eficiência, por intermédio da plataforma digital (meio telemático) e mediante a ativa e intensa, embora difusa, participação dos seus clientes/passageiros. Saliente-se ser fato notório (art. 337, I, do CPC/15) que a Reclamada é quem estabelece unilateralmente os parâmetros mais essenciais da forma de prestação dos serviços e da dinâmica de funcionamento da atividade econômica, como, por exemplo, a definição do preço da corrida e do quilômetro rodado no âmbito de sua plataforma digital. Desse quadro, se percebe a configuração da subordinação jurídica nas diversas dimensões: a) clássica , em face da existência de incessantes ordens diretas da Reclamada promovidas por meios remotos e digitais (art. 6º, parágrafo primeiro, da CLT), demonstrando a existência da assimetria poder de direção/subordinação e, ainda, os aspectos diretivo, regulamentar, fiscalizatório e disciplinar do poder empregatício; b) objetiva , tendo em vista o trabalho executado estritamente alinhado aos objetivos empresariais; c) estrutural, mediante a inteira inserção do profissional contratado na organização da atividade econômica desempenhada pela Reclamada, em sua dinâmica de funcionamento e na cultura jurídica e organizacional nela preponderante; d) por fim, a subordinação algorítima, que consiste naquela efetivada por intermédio de aferições, acompanhamentos, comandos, diretrizes e avaliações concretizadas pelo computador empresarial, no denominado algoritmo digital típico de tais empresas da Tecnologia 4.0. Saliente-se, por oportuno, que a suposta liberdade do profissional para definir seus horários de trabalho e de folgas, para manter-se ligado, ou não, à plataforma digital, bem como o fato de o Reclamante ser detentor e mantenedor de uma ferramenta de trabalho - no caso, o automóvel utilizado para o transporte de pessoas - são circunstâncias que não têm o condão de definir o trabalho como autônomo e afastar a configuração do vínculo de emprego. Reitere-se: a prestação de serviços ocorria diariamente, com sujeição do Autor às ordens emanadas da Reclamada por meio remoto e telemático (art. 6º, parágrafo único, da CLT); havia risco de sanção disciplinar (exclusão da plataforma) em face da falta de assiduidade na conexão à plataforma e das notas atribuídas pelos clientes/passageiros da Reclamada; inexistia liberdade ou autonomia do Reclamante para definir os preços das corridas e dos seus serviços prestados, bem como escolher os seus passageiros (ou até mesmo criar uma carteira própria de clientes); não se verificou o mínimo de domínio do trabalhador sobre a organização da atividade empresarial, que era centralizada, metodicamente, no algoritmo da empresa digital; ficou incontroversa a incidência das manifestações fiscalizatórias, regulamentares e disciplinares do poder empregatício na relação de trabalho analisada. Enfim, o trabalho foi prestado pelo Reclamante à Reclamada, mediante remuneração, com subordinação, e de forma não eventual. Cabe reiterar que, embora, neste caso concreto, tenham sido comprovados os elementos da relação empregatícia, deve ser considerado que o ônus da prova da autonomia recai sobre a defesa, ou seja, o ente empresarial, já que inequívoca a prestação de trabalho (art. 818, II, da CLT), sendo forçoso reconhecer, também, que a Reclamada não se desvencilhou satisfatoriamente de seu encargo probatório. Dessa forma, deve ser reformado o acórdão regional para se declarar a existência do vínculo de emprego entre as Partes, nos termos da fundamentação. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-100353-02.2017.5.01.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Maurício Godinho Delgado, DEJT 11/04/2022). "I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. SUMARÍSSIMO. LEI Nº 13.467/2017. RECLAMANTE. TRANSCENDÊNCIA. VÍNCULO DE EMPREGO. CARACTERIZAÇÃO. MOTORISTA. TRANSPORTE VIA APLICATIVO. PLATAFORMA DIGITAL. SUBORDINAÇÃO JURÍDICA POR MEIOS TELEMÁTICOS OU INFORMATIZADOS (ALGORITMOS). 1 - Há transcendência jurídica quando se constata em exame preliminar discussão a respeito de questão nova, ou em vias de construção jurisprudencial, na interpretação da legislação trabalhista. 2 - Aconselhável o provimento do agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso de revista, em razão da provável violação dos arts. 1°, III e IV, e 7°, caput, da Constituição Federal. 3 - Agravo de instrumento a que se dá provimento. II - RECURSO DE REVISTA. SUMARÍSSIMO. LEI Nº 13.467/2017. RECLAMANTE. VÍNCULO DE EMPREGO. CARACTERIZAÇÃO. MOTORISTA. TRANSPORTE VIA APLICATIVO. PLATAFORMA DIGITAL. SUBORDINAÇÃO JURÍDICA POR MEIOS TELEMÁTICOS OU INFORMATIZADOS (ALGORITMOS). 1 - Para verificar a configuração de vínculo empregatício deve-se aferir - independentemente da atividade exercida pelo empregador ou pela forma de gestão adotada pela empresa - a presença dos elementos caracterizadores do vínculo de emprego: prestação de trabalho por pessoa física, com pessoalidade pelo trabalhador, não eventualidade (ou habitualidade), com subordinação e onerosidade. 2 - Quando se trata de trabalho efetuado com a intermediação de plataformas digitais, é simples a aferição dos critérios da prestação de trabalho por pessoa física e com onerosidade. No que tange à pessoalidade, faz-se necessário verificar se o trabalhador, em relação à plataforma digital, é infungível ou se há autorização para que se faça substituir livremente por outra pessoa. 3 - Para que o labor por meio de plataformas digitais seja considerado eventual - logo, sem habitualidade - , é imprescindível que o trabalho seja prestado como consequência de circunstâncias incertas ou imprevistas. Se, ao contrário, o trabalho é prestado como resultado de cenários previstos contratualmente pelas partes, que previamente acordaram a prestação do serviço sem expectativa de que ela cesse definitivamente, conclui-se que tal trabalho é exercido de forma não eventual. Afinal, a habitualidade não é definida somente pelo tempo de duração do trabalho ou pela quantidade de dias laborados ao longo da vigência do contrato, mas, sim, pela causa do trabalho, a qual resulta do interesse das partes pactuantes. Nessa linha, o art. 452-A, §§ 1° e 2°, da CLT faculta ao empregador definir os períodos de atividade do empregado intermitente, o que lhe outorga flexibilidade para organizar os fatores de produção de sua atividade empresária, sem que isso lhe enquadre como trabalhador eventual. 4 - Já no que diz respeito à subordinação, a relação de emprego é caracterizada pela contraposição entre o poder de comando do empregador (para organizar, dirigir e disciplinar a prestação dos serviços) e a subordinação do empregado (que deve observar as instruções do empregador quanto à forma como lhe presta serviços). Essa contraposição origina a espécie denominada subordinação jurídica. 5 - Ressalta-se que é irrelevante, para a configuração da subordinação jurídica, que o trabalho realizado seja controlado ou supervisionado pela pessoa física do empregador ou de seus prepostos. Com a evolução tecnológica e a possibilidade de realização do trabalho fora da sede do empregador, a CLT passou a prever expressamente a subordinação jurídica verificada por meio de meios telemáticos ou informatizados de controle e supervisão (art. 6º, parágrafo único, da CLT). 6 - Nessa linha, tem-se o algoritmo, que é um meio informatizado, definido pelo art. 3°, I, da Resolução n. 332/2020 do CNJ , como 'sequência finita de instruções executadas por um programa de computador, com o objetivo de processar informações para um fim específico'. As instruções nas quais se pautam a programação de um algoritmo de aplicativo de transporte não são originalmente criadas pelo próprio modelo de inteligência artificial, mas, sim, pelo sujeito que o elaborou, que determinará as instruções de acordo com sua finalidade. 7 - Como os algoritmos de aplicativos de transporte destinam-se, por natureza e finalidade próprias, a atender a instruções previamente definidas pelo gestor do modelo de inteligência artificial que os processará, é inequívoco o exercício, das empresas que realizam a gestão de trabalho por meio de plataformas digitais, do poder de organização, já que predefine as variáveis relevantes à execução dos serviços de transporte. Em razão da adaptabilidade do algoritmo como elemento operável para o fim da organização e da direção do trabalho alheio, o método adotado pela reclamada origina verdadeiro algoritmo de plataformas de transporte. Trata-se de um mecanismo construído inequivocamente com a finalidade de organizar e dirigir a prestação de serviços de transporte por motoristas, por intermédio de aplicativo acessado por usuários que conhecem a finalidade básica da respectiva plataforma, e nela depositam confiança, exatamente, pelo fato de ser submetida a diretrizes estabelecidas pela empresa que lhe empresta o nome. 8 - Da subordinação jurídica extrai-se o 'poder de comando' do empregador que, em sua integralidade, contemplam o poder de organização, direção e disciplina do trabalho alheio, de maneira a orientar os trabalhadores a prestar os serviços de maneira condizente com os limites regulamentares - e, nas plataformas de trabalho, com os algoritmos orientadores - estipulados unilateralmente pela reclamada e aceitos em contrato de adesão pelo reclamante. 9 - Cabe ressaltar que a subordinação clássica e a 'subordinação algorítmica', embora cumuláveis, não se confundem. Esta última consiste em classificação moderna do instituto da subordinação que não se deve ao fundamento da existência da subordinação (o contrato, na subordinação jurídica; o patrimônio, na econômica; o conhecimento, na técnica), mas, sim, à forma de exercício do poder de comando pelo empregador. 10 - Não afasta a subordinação jurídica a possibilidade de o empregado recusar determinadas corridas, ou cancelar corridas inicialmente aceitar por ele por meio da plataforma digital. Afinal, o ordenamento jurídico vigente contém previsão expressa, direcionada ao trabalho intermitente (que é formalizado mediante relação de emprego), no art. 452-A, § 3°, da CLT, de que a recusa de determinado serviço não descaracteriza, por si só, a subordinação. Logo, se a recusa de uma oferta diretamente oriunda do empregador não é suficiente a descaracterizar o requisito da subordinação, de acordo com a lei, no caso da recusa se direcionar à plataforma digital tampouco afasta a subordinação, especialmente quando os algoritmos programados pelo próprio empregador já admitem e preveem a possibilidade de recusa ou cancelamento de um serviço pelo motorista. 11 - É importante notar, ademais, que a possibilidade do trabalhador se vincular a mais de uma plataforma digital para exercer a mesma atividade ou de realizar outra atividade econômica, paralelamente à prestação de serviços por meio de aplicativos, não afasta a subordinação jurídica, uma vez que a exclusividade não é um requisito da relação de emprego, tampouco da subordinação jurídica. 12 - A controvérsia sobre o vínculo de emprego de trabalhadores que prestação serviços por meio de plataformas digitais não é um debate observado tão somente no Brasil. A Comissão Europeia anunciou, em 9/12/2021, proposta de diretiva destinada a assegurar condições dignas aos trabalhadores que prestam serviços mediante plataformas digitais. 13 - Nessa mesma linha, o Tribunal Distrital de Amsterdã ( Holanda ) manifestou o entendimento de que a liberdade relativa assegurada aos motoristas não impede a configuração de "contrato de trabalho" (naquele ordenamento, equivalente ao contrato empregatício brasileiro). Ainda, a Corte Superior de competência trabalhista da Alemanha também conserva predominante jurisprudência no sentido de que os motoristas de aplicativos são empregados. Na mesma linha, na Bélgica', a Comissão Administrativa de regulamentação da relação de trabalho entendeu que 'tais organizações de trabalho obrigam o motorista a fornecer uma prestação inteiramente padronizada e são incompatíveis com a qualificação de relação de trabalho independente'. No Uruguai , o Tribunal de Apelaciones del Trabajo , em junho de 2020, manteve sentença que reconhecia como empregado motorista de aplicativos. Em relação aos entregadores, há decisões reconhecendo o vínculo empregatício no Tribunal de Apelação do Chile e na Fair Work Comission na Austrália. Além disso, o Exmo. Ministro Mauricio Godinho Delgado, no julgamento do RR-100353-02.2017.5.01.0066 (3ª Turma, DEJT 11/04/2022), cita julgados da Corte de Cassação francesa, Tribunal Superior de Justiça de Madri, Suprema Corte da Califórnia e decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia. 14 - No Tribunal Superior do Trabalho, já há julgados reconhecendo o vínculo de emprego no serviço prestado por meio de plataformas digitais da 3ª, 6ª e 8ª Turmas. 15 - Diante desse contexto - e considerando ser incontroversa a prestação de serviços - cabia à reclamada o ônus de demonstrar que o trabalho tenha sido prestado de maneira não subordinada, ou de forma desacompanhada de algum dos demais elementos fático-jurídicos da relação de emprego, por se tratar de fato impeditivo do direito do reclamante (art. 818, II, CLT). 16 - No caso dos autos, ficou consignado pelo Regional (fl. 911) que o reclamante prestou serviços de forma pessoal. Além disso, não há qualquer registro fático de que o reclamante poderia se fazer substituir por outra pessoa no exercício de seu labor. Logo, é presente o requisito da pessoalidade. 17 - É também incontroverso (art. 374, III, CPC), o fato de o reclamante ter prestado serviços com o intuito de obter pagamento em dinheiro . Afinal, foi consignada pelo Regional (fl. 911) a presença de tal elemento fático-jurídico. Logo, é presente o requisito da onerosidade. 18 - O Regional assentou que o reclamante tinha flexibilidade para determinar os horários de início e término de sua jornada (fl. 912), bem como a duração concernente: a carga horária de cada dia era definida pelo próprio reclamante. Contudo, tal circunstância fática consignada pelo Regional, por si só, não é apta a afastar a presença da habitualidade na prestação dos serviços. 19 - No caso concreto, a causa do trabalho do reclamante é a existência de contrato previamente celebrado entre as partes, a fim de que o reclamante, no momento em que sentir necessário, inicie ou termine a prestação laboral. Ademais, a manutenção de cadastro pela reclamada e sua contínua fiscalização dos serviços prestados (por meio de controle de avaliações lançadas ao aplicativo) viabiliza a conclusão de que tal prestação laboral era permanentemente tutelada pelas partes. Não significa que o labor houvesse de ser contínuo, mas, sim, que a relação jurídica contratual mantida entre as partes era contínua (não há consignação fática de que o termo final era um elemento acidental do negócio jurídico celebrado). Portanto, é presente, também, o requisito da habitualidade (não eventualidade). 20 - É incontroversa (art. 374, III, CPC) a existência de prévia relação contratual entre as partes, formada especificamente para que o reclamante passasse a prestar os serviços como motorista em favor dos clientes que acessavam o aplicativo, administrado e organizado pela reclamada, em busca de transporte para a localidade de seu desejo. Portanto, era factualmente possível a existência de contraposição entre um 'poder de comando' (organização, direção e disciplina do trabalho a cargo do credor da obrigação de fazer) e 'subordinação jurídica' (acatamento da forma de execução da obrigação de fazer pelo seu devedor). 21 - O TRT consignou (fl. 912) que a reclamada estipulou regras procedimentais para que o reclamante, na condição de motorista, prestasse o serviço de transporte aos clientes do aplicativo por ela gerenciado. Ademais, como a reclamada exigia do reclamante, como motorista, a obediência a determinadas diretrizes para a prestação dos serviços de transporte (fl. 912), é caracterizado, de plano, o exercício do poder de direção. Ainda, depreende-se do contexto fático consignado pelo Regional (citação de regras e procedimentos que deveriam ser seguidos para não 'macular a imagem da empresa' - fl. 912) que a ausência de observância das diretrizes e dos procedimentos (regulamentos) estabelecidos pela reclamada acarretava a aplicação de sanções aos motoristas, como o reclamante. Logo, é patente que a reclamada tinha a faculdade contratualmente prevista de aplicar sanções em face do reclamante, o que denota o pleno exercício do poder disciplinar. 22 - Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-1000764-25.2021.5.02.0301, 6ª Turma, Relatora Ministra Kátia Magalhães Arruda, DEJT 15/09/2023). Diante da relevância da matéria, com repercussão geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (tema 1.291), é aconselhável o seguimento do apelo, para melhor análise da alegada ofensa ao art. 3° da CLT. Cumpre salientar que, na Reclamação 72.015, o Ministro Dias Toffoli cassou decisão denegatória proferida nos termos do art. 896, § 1º, da CLT ao fundamento de que não cabe ao Tribunal Regional impor óbice ao processamento do recurso de revista em que se discute vínculo empregatício com prestador de serviço por meio de aplicativo (DJe 24/09/2024). CONCLUSÃO RECEBO o recurso de revista. Intimem-se, dando vista à parte contrária para apresentação de contrarrazões. /cte SAO PAULO/SP, 23 de abril de 2025. FRANCISCO FERREIRA JORGE NETO Desembargador Vice-Presidente Judicial
Intimado(s) / Citado(s)
- JERSON OLIVEIRA DOS SANTOS
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear