Processo nº 0125132-93.2024.8.17.2001
ID: 257280170
Tribunal: TJPE
Órgão: Seção B da 7ª Vara Cível da Capital
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0125132-93.2024.8.17.2001
Data de Disponibilização:
16/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
NEIL MONTGOMERY
OAB/SP XXXXXX
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MARIO BANDEIRA GUIMARÃES NETO
OAB/PE XXXXXX
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Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Seção B da 7ª Vara Cível da Capital Avenida Desembargador Guerra Barreto - Fórum do Recife, S/N, Ilha Joana Bezerra, RECIFE - PE - CEP: 50080-900 - …
Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Seção B da 7ª Vara Cível da Capital Avenida Desembargador Guerra Barreto - Fórum do Recife, S/N, Ilha Joana Bezerra, RECIFE - PE - CEP: 50080-900 - F:(81) 31810373 Processo nº 0125132-93.2024.8.17.2001 AUTOR(A): ROBERTA LINHARES MENDONCA, LUCIANO LIMA DO MONTE RÉU: FLYBONDI BRASIL LTDA SENTENÇA EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DA JURISDIÇÃO BRASILEIRA AFASTADA. CONTRATO CELEBRADO POR MEIO DIGITAL. PRESTAÇÃO PARCIALMENTE EXECUTADA NO EXTERIOR. RÉ COM FILIAL NO BRASIL. COMPETÊNCIA INTERNACIONAL CONCORRENTE. APLICABILIDADE DA LEI 8.078/1990. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ALTERAÇÃO UNILATERAL DE HORÁRIO DE DECOLAGEM E AEROPORTO DE CHEGADA QUE FEZ PERMITIR POR CONSEGUINTE A PERDA DE CONEXÃO. AUSÊNCIA DE ASSISTÊNCIA MATERIAL. PASSAGEIRA GESTANTE EM ESTADO CLÍNICO DE RISCO. DANO MORAL CONFIGURADO. PROCEDÊNCIA. 1. Preliminar de incompetência absoluta da jurisdição brasileira rejeitada, à luz do art. 21, I e parágrafo único, do CPC, diante da existência de filial da ré no Brasil e da projeção dos efeitos do contrato sobre consumidores domiciliados no território nacional. Aplicação do art. 22, II, do CPC e dos princípios da proteção e da efetividade jurisdicional ao consumidor. 2. Incidência plena do Código de Defesa do Consumidor (arts. 2º, 3º e 14) em contratos de transporte aéreo internacional firmados por consumidores brasileiros, ainda que parte da prestação se dê no exterior, especialmente quando a empresa ré está autorizada a operar no mercado nacional (Decisão ANAC nº 22/2019). 3. Alteração unilateral do horário e do aeroporto de chegada do voo operado pela ré, que impossibilitou o cumprimento da conexão contratada pelos autores, com perda do voo seguinte e necessidade de aquisição de novas passagens. Ausência de comprovação da prestação de assistência material, violando os deveres contratuais e regulamentares (Resolução ANAC nº 400/2016, arts. 21 e 27). 4. Condição de gestação de alto risco da autora devidamente comprovada, com agravamento do quadro clínico em razão da demora e da falta de suporte, circunstância que agrava a lesividade da conduta da ré. 5. Inaplicabilidade da excludente de força maior, configurando-se fortuito interno, inerente à atividade econômica explorada, segundo jurisprudência consolidada do STJ (REsp 1.099.253/RJ). 6. Dano moral configurado, superando o mero aborrecimento, dada a frustração da legítima expectativa contratual e os reflexos à integridade física e emocional dos autores. Fixação em valor proporcional e razoável, com caráter compensatório e pedagógico. 7. Pedido julgado procedente. Vistos etc.. Trata-se de ação de indenização por danos morais ajuizada por Roberta Linhares Mendonça e Luciano Lima do Monte em face de Flybondi Brasil Ltda., na qual os autores alegam haver sido submetidos a falha grave na prestação do serviço de transporte aéreo internacional, contratado com a demandada. Conforme narrado, os autores adquiriram passagens aéreas junto à ré para o trajeto de retorno de viagem com origem em Bariloche/AR e destino final em Recife/PE, incluindo conexão em Buenos Aires (Ezeiza) e em São Paulo (GRU), parte da qual seria operada por outra companhia aérea (LATAM). A parte do trecho sob responsabilidade da demandada consistia no voo de Bariloche a Buenos Aires. No entanto, no dia da viagem de retorno, a ré, sem aviso prévio adequado e sem oferecer alternativa eficaz, enviou e-mail aos autores informando que o voo FO5281, anteriormente previsto para as 23h25 do dia 06/06/2024, com chegada prevista às 01h25 em Ezeiza, seria remarcado para as 02h00 do dia 07/06/2024, com chegada prevista às 04h30, e não mais em Ezeiza, mas no Aeroporto Jorge Newbery (Aeroparque) – situado a cerca de 49 km do terminal originalmente contratado. Em razão dessa alteração unilateral e inesperada, os autores afirmam ter perdido a conexão que os levaria de Buenos Aires (Ezeiza) a São Paulo (GRU), marcada para as 06h10 do dia 07/06/2024, conforme comprovantes de reserva anexados. Alegam que não lhes foi prestada qualquer assistência material pela companhia aérea, e que, em virtude do ocorrido, foram compelidos a adquirir novas passagens aéreas para prosseguir viagem, arcando com o desembolso de R$ 3.195,30, valor integralmente suportado por seus próprios meios (docs. 04 e 05). Além do transtorno financeiro, os autores enfatizam que a primeira demandante encontrava-se gestante de 34 semanas, com quadro clínico de alto risco, conforme atestam os laudos médicos acostados aos autos (docs. 06 e 07). Argumentam que a exposição da autora a horas de espera prolongada, em aeroporto sem estrutura, acarretou risco médico concreto, inclusive com incremento de risco trombótico e agravamento de dores pélvicas e lombares, o que é detalhado em laudo médico subscrito por profissional que a acompanha clinicamente. A petição inicial sustenta que a conduta da ré configura falha na prestação do serviço (art. 14 do CDC), com violação à boa-fé objetiva e aos deveres de lealdade contratual, transparência e segurança, notadamente por alterar unilateralmente o destino do voo, remarcá-lo para horário incompatível com a conexão subsequente e não disponibilizar transporte ou assistência material, como exige a Resolução nº 400/2016 da ANAC, sobretudo diante da condição peculiar da autora gestante. Invocam ainda o art. 5º, V e X, da Constituição Federal, bem como os arts. 186, 187 e 927 do Código Civil, para embasar o pedido de indenização por danos morais, os quais seriam presumidos diante da natureza do fato e da gravidade da lesão sofrida. Mencionam precedentes jurisprudenciais em apoio à tese de que o atraso significativo e a perda de conexão, com ausência de apoio da companhia, ensejam reparação extrapatrimonial. Ao final, requerem a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada um dos autores, acrescida de juros e correção monetária, formulando os pedidos acessórios de praxe Juntaram documentação e comprovaram o preparo do feito. Regularmente citada, a ré Flybondi Brasil Ltda. apresenta contestação (ID nº 190072066) na qual, em sede preliminar, sustenta a incompetência absoluta da jurisdição brasileira para o julgamento da demanda, ao argumento de que os fatos narrados ocorreram integralmente em território argentino, envolvendo voo doméstico entre Bariloche e Buenos Aires, adquirido por meio de site estrangeiro. Alega que a operação e a execução do contrato de transporte se deram sob égide da legislação argentina, razão pela qual defende a competência exclusiva da jurisdição daquele país, invocando os arts. 21, III, e 53, IV, “a”, do CPC, bem como dispositivos da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e do Código Aeronáutico Argentino, cuja aplicação requer subsidiariamente. No mérito, aduz que o voo contratado sofreu pequena reprogramação por motivos operacionais e técnicos, com alteração do horário (atraso inferior a três horas) e mudança do aeroporto de chegada (de Ezeiza para Aeroparque), sem qualquer ilicitude. Afirma que a empresa não opera voos em regime de conexão, não havendo responsabilidade pelo planejamento individual dos passageiros. Alega ainda ter oferecido alternativas de reacomodação gratuita, voucher ou reembolso integral, além de transporte entre os aeroportos, conforme comunicado eletrônico previamente enviado. Argumenta que eventuais transtornos enfrentados pelos autores decorreram de decisões pessoais relativas ao encadeamento de voos operados por outras companhias, afastando-se o nexo causal entre a atuação da ré e os danos alegados. Sustenta que a empresa agiu com boa-fé, dentro dos limites de sua responsabilidade, não havendo falha apta a ensejar reparação. Quanto à pretensão indenizatória, nega a existência de dano moral indenizável. Alega que a situação configura, no máximo, mero aborrecimento cotidiano, que não extrapola os limites do razoável. Em relação ao estado gestacional da autora, contesta o nexo entre o atraso e qualquer agravamento clínico, ressaltando a ausência de laudo contemporâneo aos fatos e a falta de comunicação prévia sobre a gravidez de risco. Reforça que a passageira não apresentou atestado médico exigido para embarque em tais condições, conforme previsto nas próprias normas da ré e nas práticas do setor aéreo. Por fim, destaca que a Flybondi é companhia de perfil “ultra low cost”, com estrutura enxuta e foco na democratização do transporte aéreo por meio da oferta de tarifas reduzidas, motivo pelo qual eventual condenação deve observar a proporcionalidade e razoabilidade, à luz do art. 944 do Código Civil, de modo a evitar enriquecimento sem causa e comprometer a continuidade da atividade empresarial. Requer, ao final: (a) acolhimento da preliminar de incompetência absoluta da jurisdição brasileira ou, alternativamente, a aplicação da legislação argentina ao caso concreto; (b) total improcedência dos pedidos autorais, por ausência de responsabilidade civil; (c) subsidiariamente, a fixação de eventual indenização em valor módico, condizente com os parâmetros jurisprudenciais e a natureza da companhia ré. Sob ID nº 191271721, em sede de réplica, os autores impugnam a preliminar de incompetência absoluta da jurisdição brasileira, alegando que a ré possui filial constituída em território nacional, conforme documentos juntados pela própria companhia, o que, à luz dos arts. 21, I, do CPC e 75, §§ 1º e 2º, do Código Civil, atrai a competência da Justiça Brasileira para processar e julgar a demanda. Ressaltam ainda que a autorização de funcionamento da Flybondi no Brasil foi reconhecida por decisão da ANAC, nos termos da Decisão nº 22/2019. No mérito, rebatem a tese de que, por operar em regime “low cost”, a ré estaria isenta das normas que regem o transporte aéreo, destacando que tal classificação não exclui a obrigação de observar os deveres de segurança, pontualidade e informação, especialmente em contratos de natureza obrigacional de resultado. Afirmam que a alteração unilateral do horário e do aeroporto de chegada comprometeu o cumprimento do contrato e gerou a perda da conexão subsequente, o que constitui evidente falha na prestação do serviço. Impugnam com veemência a tentativa da ré de descredibilizar o laudo médico atestando agravamento do estado clínico da autora gestante, asseverando que apenas o profissional assistente possui qualificação para avaliar as repercussões da situação vivenciada. Enfatizam que a imobilidade prolongada e o estresse resultantes do atraso e da perda de conexão agravaram o risco obstétrico, conforme parecer médico constante dos autos. Ao final, reiteram os pedidos formulados na petição inicial, com ênfase na procedência integral da ação, inclusive com condenação da ré à indenização por danos morais. Seguiu-se despacho de ID nº 191273652 indagando os contendores sobre interesse na autocomposição ou na dilação probatória; ainda, foi invertido o ônus da prova em favor da postulante. Em que pesem intimadas, as partes quedaram-se silentes (ID nº 196555242). Houve alegações finais reiterativas apenas dos autores (ID nº 197538021). Nestes termos, vieram-me os autos conclusos para julgamento. Eis o relato, no que importa. Decido. De início, denoto que a ré Flybondi Brasil Ltda. argui, em sede preliminar, a incompetência absoluta da jurisdição brasileira para apreciar a presente demanda, sustentando que os fatos narrados decorreram de operação de voo doméstico em território argentino, regido por legislação estrangeira, cuja contratação e execução teriam ocorrido exclusivamente sob a égide do ordenamento jurídico daquele país. Alega, ainda, que o contrato teria sido firmado em plataforma digital sediada na Argentina, com precificação em moeda estrangeira, o que afastaria a incidência da jurisdição nacional. A preliminar, contudo, não merece acolhimento. Nos termos do Código de Processo Civil, assim se acha definida a competência. Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que: I - o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; II - no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; III - o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil. Parágrafo único. Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal. Art. 22. Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações: I - de alimentos, quando: a) o credor tiver domicílio ou residência no Brasil; b) o réu mantiver vínculos no Brasil, tais como posse ou propriedade de bens, recebimento de renda ou obtenção de benefícios econômicos; II - decorrentes de relações de consumo, quando o consumidor tiver domicílio ou residência no Brasil; No caso concreto, restou incontroverso que a ré possui filial constituída no território nacional, conforme documentação acostada aos autos, inclusive por ela própria, e autorização de funcionamento concedida pela Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, por meio da Decisão nº 22, de 13 de fevereiro de 2019, a qual lhe conferiu permissão formal para atuar no transporte aéreo público internacional regular de passageiros no Brasil. Além disso, o próprio objeto da relação contratual envolve consumidores domiciliados no Brasil, cujos efeitos se projetam sobre território nacional, pois o trecho operado pela ré integra um itinerário internacional cujo destino final era a cidade do Recife/PE. A jurisprudência é firme no sentido de que, mesmo diante de contrato parcialmente executado no exterior, a existência de filial no Brasil e o impacto da prestação do serviço sobre consumidores aqui domiciliados são suficientes para atrair a competência da jurisdição nacional. Ainda que o contrato tenha sido celebrado por meio eletrônico, com cobrança em moeda estrangeira, tal circunstância não tem o condão de afastar a aplicação da legislação brasileira, pois o serviço foi oferecido e direcionado a consumidores residentes no Brasil, caracterizando-se relação de consumo transnacional, sujeita à proteção conferida pelo Código de Defesa do Consumidor e à jurisdição brasileira, com fundamento no princípio da vulnerabilidade e na tutela efetiva do jurisdicionado. Ademais, a contratação de passagens aéreas por meio de sítios eletrônicos com operação transnacional não configura, por si só, exclusão da competência dos tribunais pátrios, sobretudo quando se está diante de empresa que opera regularmente em território nacional, com presença institucional e comercial estável e contínua. Dessa forma, sendo incontroversa a existência de filial da ré no Brasil, e tendo o contrato gerado efeitos no território nacional em detrimento de consumidores domiciliados no país, impõe-se o reconhecimento da competência da jurisdição brasileira para o processamento e julgamento da presente demanda. Apoiando este pensar, vide: Apelação – Transporte aéreo internacional – Ação indenizatória – Sentença de acolhimento parcial dos pedidos – Irresignação, da ré, procedente. 1. Competência concorrente da Justiça brasileira para apreciar a causa, por aplicação da regra dos arts. 21, I e parágrafo único, e 22, II, do CPC. Consideração, ainda a respeito, de que a empresa ré possui filial no Brasil e, é tida, portanto, como extensão da empresa estrangeira, por isso legitimada para a causa. 2. Legislação aplicável. Contrato de transporte aéreo celebrado em território estrangeiro, local em que a obrigação haveria de ser cumprida. Negócio se submetendo à lei do país em que constituída a obrigação. Art. 9º da LINDB e arts. 164, 169, 182 e 185 do chamado Código de Bustamante. Consequente impossibilidade de análise da questão em face do CDC. Autores que não invocaram o direito estrangeiro ou produziram prova a respeito, nem mesmo após a questão ser levantada na peça de defesa. Quadro impondo a rejeição dos pedidos. 3. Consequente reforma da sentença, para proclamar a improcedência da ação, com a inversão da responsabilidade pelas verbas da sucumbência. Afastaram as questões preliminares e deram provimento à apelação. (TJSP; Apelação Cível 1004442-46.2024.8.26.0100; Relator (a): Ricardo Pessoa de Mello Belli; Órgão Julgador: 19ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 04/11/2024; Data de Registro: 06/11/2024) RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA RECURSAL DE AMBAS AS PARTES. TRANSPORTE AÉREO. VOO DOMÉSTICO ENTRE CIDADES DA ARGENTINA (BUENOS AIRES E PUERTO IGUAZÚ). COMPETÊNCIA DA JURISDIÇÃO BRASILEIRA (ART. 22, II, DO CPC). OPERAÇÃO NO MERCADO DE AVIAÇÃO ULTRA LOW COST QUE NÃO AFASTA A RESPONSABILIDADE DA RÉ. APLICAÇÃO DA LEI BRASILEIRA (ART. 9º, CAPUT E §2º, DA LINDB). COMPRA DA PASSAGEM AÉREA EM TERRITÓRIO NACIONAL. WEBSITE DA RÉ “FLYBONDI” QUE POSSUI FILIAL NO BRASIL. AUTORA QUE RESIDE NO BRASIL. ALTERAÇÃO UNILATERAL DE VOO NO DIA DO EMBARQUE. POSTERIOR CANCELAMENTO. FORTUITO EXTERNO. ASSISTÊNCIA MATERIAL DEFICITÁRIA. REACOMODAÇÃO EM NOVO VOO APÓS TRÊS DIAS. AUTORA QUE ADQUIRIU NOVAS PASSAGENS AÉREAS E DESPENDEU VALORES COM HOSPEDAGEM. ATRASO DE 46 HORAS ATÉ O DESTINO FINAL. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS EVIDENCIADA. DANOS MATERIAIS COMPROVADOS. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM ARBITRADO EM R$ 2.500,00 DOIS MIL E QUINHENTOS REAIS) QUE DEVE SER MAJORADO PARA R$ 4.000,00 (QUATRO MIL REAIS). PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPROCIONALIDADE. PARÂMETROS DESTA TURMA RECURSAL. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. Recurso da autora conhecido e provido.Recurso da ré conhecido e desprovido. (TJPR - 1ª Turma Recursal - 0037272-41.2023.8.16.0021 - Cascavel - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO FERNANDO ANDREONI VASCONCELLOS - J. 05.08.2024) Rejeita-se, portanto, a preliminar de incompetência da jurisdição brasileira suscitada pela ré. Estando o feito e ordem, adentro do meritum causae. O cerne da controvérsia reside em apurar a responsabilidade da companhia ré pela alteração do horário e do terminal de desembarque do voo FO5281, originalmente contratado pelos autores, o que teria resultado na perda de conexão aérea, ensejando despesas adicionais, prolongamento da viagem e agravamento da condição clínica da autora gestante. Por sua vez, a ré, Flybondi Brasil Ltda., suscita implicitamente a inaplicabilidade da legislação consumerista brasileira, sugerindo que a matéria seria regida exclusivamente por normas internacionais ou pelo ordenamento jurídico argentino. De início, destaco que a lide em exame envolve contrato de transporte aéreo internacional, celebrado entre as partes por meio de plataforma eletrônica, cuja prestação foi parcialmente executada em território estrangeiro. O contrato em questão configura típica relação de consumo, tal como definida nos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. Os autores, pessoas físicas, adquiriram passagens aéreas como destinatários finais do serviço; a ré, por sua vez, é fornecedora de serviços de transporte aéreo remunerado, ainda que estrangeira, atuando em regime regular de mercado e se valendo de canal digital acessível a consumidores brasileiros, com suporte em língua portuguesa e operação voltada à clientela nacional. Ademais, restou documentalmente comprovado nos autos que a ré possui filial constituída e operante no Brasil, com autorização formal emitida pela Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, conforme Decisão nº 22/2019, para exercer o transporte aéreo internacional regular de passageiros com embarques e desembarques em território nacional. Tal circunstância, por si só, atrai a competência da jurisdição brasileira (CPC, art. 21, I e parágrafo único) e impõe a incidência plena do ordenamento consumerista. Vale salientar que a controvérsia apascentada pela Corte Suprema no RE 636.331/RJ (Tema 210) envolve os limites de indenização por danos materiais em decorrência de extravio de bagagem em voo internacional. Por outra banda, o resultado do ARE 766.618/SP diz respeito ao prazo prescricional para fins de ajuizamento de ação de responsabilidade civil por atraso em voo internacional. O objeto da presente demanda, todavia, junge-se aos efeitos extrapatrimoniais do atraso no voo internacional, fato este não albergado em nenhuma das mencionadas convenções (Montreal ou Varsóvia). Em casos que tais, prevalece a legislação brasileira protetiva do passageiro, e desse entendimento a jurisprudência pátria não dissona. Se não, confira-se: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO INDENIZATÓRIA. TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. EXTRAVIO DE BAGAGEM. PEDIDO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. NORMAS E TRATADOS INTERNACIONAIS. CONVENÇÃO DE MONTREAL. LIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DA TRANSPORTADORA APENAS QUANTO AOS DANOS MATERIAIS. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR EM RELAÇÃO AOS DANOS MORAIS. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 1. Aplica-se o NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. O STF, no julgamento do RE nº 636.331/RJ, com repercussão geral reconhecida, fixou a seguinte tese jurídica: Nos termos do artigo 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor. 3. Referido entendimento tem aplicação apenas aos pedidos de reparação por danos materiais. 4. As indenizações por danos morais decorrentes de extravio de bagagem e de atraso de voo não estão submetidas à tarifação prevista na Convenção de Montreal, devendo-se observar, nesses casos, a efetiva reparação do consumidor preceituada pelo CDC. 5. Recurso especial não provido. (REsp 1842066/RS, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/06/2020, DJe 15/06/2020) Destarte, não resta dúvida da relação de consumo caracterizada entre as partes, na qual a empresa aérea demandada atua como prestadora de serviços, enquanto a parte autora figura como consumidor. Prossigo. A tese de que a natureza “low cost” da companhia aérea excluiria a incidência do CDC é absolutamente insustentável. O modelo de negócios adotado não exime a empresa do dever de observar os princípios da boa-fé objetiva, da informação clara, da previsibilidade contratual e da segurança, todos consagrados nos arts. 4º e 6º do CDC. Nenhuma flexibilização tarifária pode justificar a supressão de garantias essenciais à dignidade e à proteção do consumidor. A responsabilidade da ré, como fornecedora de serviços, é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, bastando a comprovação da falha na prestação do serviço e do dano suportado pelo consumidor, não sendo exigível a demonstração de culpa. Eventuais falhas operacionais ou alterações técnicas que causem prejuízo ao consumidor configuram fortuito interno, previsível e inerente à atividade desenvolvida, não sendo aptas a eximir o fornecedor da responsabilidade civil. Por todo o exposto, aplica-se integralmente o Código de Defesa do Consumidor ao caso em análise, com todos os efeitos decorrentes, inclusive quanto ao regime de responsabilidade civil, ao dever de assistência, à interpretação pró-consumidor (art. 6º, VIII) e à reparação integral dos danos causados pela falha na prestação do serviço. Neste contexto, a partir da leitura dos autos, restou incontroverso que os autores adquiriram passagens junto à ré Flybondi para o voo FO5281, com embarque previsto às 23h25 do dia 06/06/2024, de Bariloche para Buenos Aires – Aeroporto Internacional de Ezeiza, onde embarcariam, poucas horas depois, em voo da LATAM às 06h10, com destino a São Paulo e, posteriormente, Recife. Contudo, no próprio dia do voo, a ré enviou comunicação eletrônica informando a reprogramação da partida para as 02h00 do dia 07/06/2024, com novo destino no Aeroporto Jorge Newbery (Aeroparque), localizado a aproximadamente 49 km de Ezeiza. Essa alteração impactou diretamente o itinerário dos autores, os quais desembarcaram às 04h30 e, sem tempo hábil para deslocamento, perderam o voo subsequente previamente contratado. A companhia aérea alegou ter disponibilizado transporte entre os aeroportos, o que não restou provado nos autos, sendo certo que a parte autora não recebeu assistência material, tampouco alternativa de reacomodação, conforme impõe a Resolução nº 400/2016 da ANAC, em especial os artigos 21 e 27, aplicáveis aos casos de reprogramação superior a quatro horas. Importa ressaltar que a demandada não nega a reprogramação e alteração do terminal aeroportuário, limitando-se a justificar o ato por "questões operacionais", sem, no entanto, demonstrar o cumprimento dos deveres decorrentes da relação de consumo. Acrescente-se que o caso apresenta agravantes sensíveis, como a gestação de alto risco da autora Roberta Linhares Mendonça, comprovada por laudo médico idôneo acostado aos autos. O documento técnico atesta que o atraso e a permanência prolongada em ambiente inóspito, sem acomodação adequada, agravaram o risco de trombose venosa profunda, além de intensificarem dores pélvicas e lombares, comuns a seu estado clínico. Trata-se, pois, de falha contratual grave, manifestada não apenas pelo inadimplemento do tempo e local previamente pactuados, mas também pela absoluta ausência de suporte, comunicação clara, mitigação de danos e sensibilidade frente à condição peculiar da passageira. É assente na jurisprudência que o contrato de transporte aéreo impõe ao transportador obrigação de resultado, sendo certo que o consumidor espera ser conduzido ao destino ajustado, no tempo acordado e com segurança. A violação a essas expectativas, quando não motivada por caso fortuito externo, é juridicamente irrelevante para eximir o fornecedor do dever de indenizar. A argumentação da ré, de que não se responsabiliza por voos subsequentes operados por terceiros, não merece prosperar. Embora a LATAM tenha operado a conexão, é fato que a perda desta decorreu diretamente do inadimplemento da ré, e não de qualquer evento autônomo. O nexo de causalidade é objetivo, sendo irrelevante a existência de bilhetes distintos, ante a previsibilidade da conexão como etapa essencial da viagem dos consumidores. Ademais, a autora demonstrou haver arcado, junto com seu cônjuge, com a aquisição de novas passagens no valor de R$ 3.195,30, para continuar a viagem até o destino final, prejuízo financeiro direto e emergente da falha no serviço. A situação extrapola o mero aborrecimento cotidiano, notadamente diante do risco gestacional, da perda de conexão internacional e da omissão total de suporte. Configura-se, assim, abalo moral indenizável, por violar os direitos à segurança, ao conforto e à dignidade do consumidor, bens protegidos constitucional e infraconstitucionalmente. Dessa forma, reconhece-se a existência de falha na prestação do serviço, nos termos do art. 14 do CDC, e o consequente dever de indenizar os autores pelos danos materiais comprovadamente suportados e pelos danos morais advindos da situação vivenciada. A ré, em sua contestação, sustenta que o voo contratado sofreu pequena reprogramação por motivos operacionais e técnicos, com alteração do horário (atraso inferior a três horas) e mudança do aeroporto de chegada (de Ezeiza para Aeroparque), sem qualquer ilicitude, invocando excludente de responsabilidade fundada em força maior, nos termos do art. 256, §1º, do Código Brasileiro de Aeronáutica. Ocorre que tal alegação não restou cabalmente demonstrada. A ausência de provas robustas por parte da ré - quanto à inevitabilidade do evento e à adoção de medidas efetivas para minimizar os prejuízos - fragiliza a tese defensiva. Ainda que se admitisse a existência de instabilidade climática, é entendimento consolidado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça que tais eventos integram o risco da atividade econômica, especialmente no setor de transporte aéreo, não eximindo, por si só, o fornecedor de sua obrigação de bem prestar o serviço contratado. O tema do caso fortuito e força maior não é questão pacífica na doutrina, pois há vários conceitos para cada um deles ou para os dois quando considerados expressões sinônimas. Na força maior, por ser um fato da natureza, pode-se conhecer o motivo ou a causa que deu origem ao acontecimento, como um raio que provoca um incêndio, inundação que danifica produtos ou intercepta as vias de comunicação, impedindo a entrega da mercadoria prometida ou um terremoto que ocasiona grandes prejuízos, etc. Por outro lado o caso fortuito tem origem em causa desconhecida, como um cabo elétrico aéreo que sem saber o motivo se rompe e cai sobre fios telefônicos causando incêndio explosão de caldeira de usina, provocando morte. Não obstante ilustres doutrinadores contribuírem com diversos conceitos, conclui-se que não há interesse público na distinção dos conceitos, até porque o Código Civil Brasileiro não fez essa distinção conforme a redação abaixo transcrita: Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. Neste rumo de pensar, percebe-se, todavia, que inexistem razões de plausibilidade no apontamento de ausência de responsabilização da parte ré pelo atraso no embarque e no desembarque, com os efeitos em cascata daí configurados, sendo de rigor imputar-lhe os efeitos deletérios que sua desídia no escoadouro causou aos compradores/consumidores. Destarte, o “caso fortuito” ou “força maior” invocado pela empresa operadora de transporte aéreo internacional - para justificar o atraso de voo - poderá estar relacionado com fatos diretamente ligados com a atividade que ela exerce (como a questão ligada ao reajuste da malha aérea em virtude de supostas condições climáticas), pois é totalmente previsível por ela, mormente porque, como empresa mercantil, assumiu os riscos do negócio. Neste viés, insta salientar que sequer houve comprovação de que as intempéries realmente provocaram fechamento de pista ou de qualquer forma influenciaram no desvio do trajeto a ponto de configurar a aventada força maior como excludente de responsabilidade do prestador do serviço, em razão do art. 14, CDC. Em boa verdade, a logística das operações constitui evento incluído no risco empresarial das empresas de transporte, seja aéreo seja marítimo, razão pela qual caracterizam fortuito interno, não excluindo a responsabilidade. Decerto, a singela alegação de contratempo meteorológico, à luz da carga fixada pelo art. 373, II, do CPC/2015, c/c art. 6º, VIII, CDC, não se presta a demonstrar, à míngua de qualquer elemento probatório idôneo, a ocorrência de circunstâncias impeditivas ou incontornáveis nos trajetos programados, de modo a afastar a responsabilidade da empresa pelo substancial atraso da viagem, o que acarretou a perda de muitas horas de passeio e gastos com alimentação. Dispensa-se a perquirição de dolo ou culpa, posto que, à luz do que estatui o art. 14 do CDC, as fornecedoras de bens e serviços, em razão da teoria do risco do negócio ou da atividade, são responsáveis pelos danos causados ao consumidor, independentemente da existência do elemento subjetivo. Ademais, a prática do atraso é vedada pelo ordenamento jurídico e reiteradamente reconhecida pela jurisprudência pátria como hipótese de falha objetiva na prestação do serviço, apta a ensejar indenização por danos morais, dada a ofensa à dignidade do consumidor, ao frustrar a legítima expectativa de embarque após contratação regular do serviço. Seguindo neste contexto, a ré sustenta que prestou a assistência devida à autora, nos moldes da Resolução nº 400/2016 da ANAC, com fornecimento de hospedagem e alimentação. Temática importante para a solução lide também está em que não houve qualquer indício sequer de que a companhia aérea prestou a assistência material integral (traslado terrestre, alimentação, hospedagem) preconizada nos arts. 26 e 27 da Resolução ANAC 400/2016, os quais rezam: Art. 26. A assistência material ao passageiro deve ser oferecida nos seguintes casos: I - atraso do voo; II - cancelamento do voo; III - interrupção de serviço; ou IV - preterição de passageiro. Art. 27. A assistência material consiste em satisfazer as necessidades do passageiro e deverá ser oferecida gratuitamente pelo transportador, conforme o tempo de espera, ainda que os passageiros estejam a bordo da aeronave com portas abertas, nos seguintes termos: I - superior a 1 (uma) hora: facilidades de comunicação; II - superior a 2 (duas) horas: alimentação, de acordo com o horário, por meio do fornecimento de refeição ou de voucher individual; e III - superior a 4 (quatro) horas: serviço de hospedagem, em caso de pernoite, e traslado de ida e volta. Com a aplicabilidade do CDC ao caso concreto, além de tornar controverso os fatos narrados pela parte autora, através da simples alegação de que a parte autora sofreu diversos abalos e constrangimentos tanto na idade como na volta do percurso contratado, ensejando mesmo a perda de reserva de hotel e outros gastos de mesmo jaez, tornando, portanto, tais fatos objeto de prova, caberia ao réu, para obter a almejada improcedência da ação, provar que não há fato capaz de constituir o direito da autora, ou seja, a permanência da efetiva prestação do serviço, afastando-se portanto a informação falseada de que haveria justa causa para o retardo, para o fim de comprovar que, como fornecedora da cadeia negocial, houve-se a contento com o dever de informação que lhe é direcionado pelo art. 6º, III, c/c art. 14, ambos da Lei nº 8.078/1990. Consequentemente, cumpria à companhia litigada evidenciar nos autos que tal fato não ocorrera ou que ocorrera com fundamento legal e/ou contratual, além do que, de alguma forma, prestou a informação solicitada e o auxílio imprescindível ao cliente, para bem prestar o serviço e resguardar-lhe a boa-fé objetiva (art. 422, CC/2002) e a confiança, contemporaneizando-a, pois, ao entorno das vicissitudes que circundariam toda a relação negocial. Não tendo logrado desmunir-se, ao longo da instrução da querela, do onus probandi que lhe era recitadamente exigível, tem-se por inelutável consequência que as empresas demandadas malferiram o dever de informação, com seu correspondente poder atribuído ao consumidor na relação jurídica, preconizado na Le Na espécie, a autora demonstrou nos autos que arcou, por conta própria, com despesas adicionais no total de R$ 3.195,30, conforme comprovantes de pagamento colacionados. No tocante aos danos morais, o contexto fático revela situação que extrapola o mero aborrecimento cotidiano, pois envolveu atraso relevante, pernoite não programado no exterior, assistência deficiente e, sobretudo, a prática de overbooking, que configura dano moral presumido (in re ipsa). Nesse sentido, não há necessidade de comprovação específica do abalo, sendo suficiente a demonstração do fato lesivo e sua repercussão na esfera de dignidade da consumidora, o que está suficientemente evidenciado nos autos. Em virtude do ato ilícito, a parte autora suportou graves prejuízos, já que perdeu muito tempo de viagem, devido aos contratempos ocorridos com o cancelamento do voo, e ainda não teve um voo regular para o seu destino final, como inicialmente contratado. Ademais, importa frisar que, ao adquirir um serviço de tão elevado custo, a parte querelante, por meio dos seus familiares, certamente empreendeu esforços e renúncias para fazer frente ao custeio das despesas dele decorrentes, tudo isso no intuito de ter um passeio que lhe deixasse experiências agradáveis e memoráveis, em vez de frustrações e angústias como as experimentadas na situação ocorrida. A indenização deve ser fixada seguindo os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, guardando, ao mesmo tempo, um caráter reparatório e pedagógico, a fim de punir a Demandada pela falta de diligência, evitando que tais situações ocorram novamente. A temática referente à fixação do valor para reparabilidade do dano moral sempre foi ponto polêmico e controvertido tanto em doutrina como em jurisprudência, sendo que o motivo disso reside no fato de que os critérios empregados para a delimitação do quantum a ser pago, em razão, de um dano material, não se adequam para o caso de dano moral. No presente caso, adoto os seguintes parâmetros, para fixar a reparação do dano moral: a) A condição econômica da ofensora: verifica-se que transportadora demandada é uma companhia aérea internacional de médio porte; b) A gravidade da lesão e sua repercussão: a falha na prestação de serviços aéreos, por macular o direito da parte autora a ter um serviço bem prestado e por causar uma sensação de aflição, angústia, aborrecimento, dissabor, desconforto e preocupação, constitui ofensa grave ao patrimônio moral da parte promovente, mormente em face da gestante; c) As circunstâncias fáticas do caso: a maneira pela qual a ofensa foi feita indica falhas graves na prestação de serviços da ré, principalmente, se for considerado que toda a expectativa de embarque para cidade destino, inclusiva com perda de conexão, restou frustrada por longo tempo em razão da demandada ter feito suposta reprogramação sem maiores explicações, provavelmente em face de sua desídia técnica e logística. Além disso, não houve prova da assistência integral em termos de alimentação, transporte ou hospedagem, agravando ainda mais a sensação de frustração e abandono. Destarte, com base nos critérios retromencionados e considerando-se que o valor da reparação do dano moral deve alcançar um adequado sancionamento para a lesante e uma justa compensação para os lesados, fixo o valor da indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para cada autor, arrimado nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Por fim, ressalto que a condenação por danos morais em montante inferior ao pretendido na peça escoteira não importa sucumbência recíproca, consoante clara diretriz da Súmula 326, STJ. Postas todas estas razões, tenho por imperativo julgar PROCEDENTES os pedidos que compõem o núcleo desta ação, nos termos suso alinhavados, para CONDENAR a companhia aérea no dever de indenizar que, forte no art. 944, CC, arbitro no quantum de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), em favor de cada demandante, a título de compensação financeira pelos danos morais experimentados, valor este a ser corrigido monetariamente pela Taxa SELIC a partir deste arbitramento (Súmula 362 do STJ). Ao ensejo, resolvo meritoriamente o processo, arrimado no art. 487, I, CPC/2015, atribuindo à companhia demandada o ônus sucumbencial representado pelas custas processuais e taxa judiciária, além de honorários que arbitro em 15% (quinze por cento) do valor total da condenação, forte nos arts. 82, §2º, e 85, §2º, CPC. Intimem-se. Cumpra-se. Recife-PE, data digitalmente certificada. Robinson José de Albuquerque Lima Juiz de Direito bfsma
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