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Franciela Carla Galiardi e outros x Adauto Jose Sabino e outros

ID: 337232797

Tribunal: TRT15 Órgão: 11ª Câmara Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0010679-93.2024.5.15.0028

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

FRANCIELA CARLA GALIARDI VALENTIM ZOCARATO

Polo Passivo:

ADAUTO JOSE SABINO ANTONIO JOSE SABINO AZENETH MARIA SABINO FRANCISCO JOSE SABINO GISELLE MARIA SABINO JUDITH BUENO SABINO TANIA MARIA SABINO

Acórdão

Advogados:

CAIO CESAR DOSUALDO

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CARLOS ADALBERTO RODRIGUES

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GUILHERME STEFFEN DE AZEVEDO FIGUEIREDO

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO 11ª CÂMARA Relator: ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA ROT 0010679-93.2024.5.15.0028 RECORRENTE: VALENTIM ZOCARATO RE… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO 11ª CÂMARA Relator: ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA ROT 0010679-93.2024.5.15.0028 RECORRENTE: VALENTIM ZOCARATO RECORRIDO: JUDITH BUENO SABINO E OUTROS (6) PROCESSO nº 0010679-93.2024.5.15.0028 (ROT) RECORRENTE: VALENTIM ZOCARATO RECORRIDO: JUDITH BUENO SABINO, ADAUTO JOSE SABINO, ANTONIO JOSE SABINO , AZENETH MARIA SABINO, FRANCISCO JOSE SABINO, GISELLE MARIA SABINO, TANIA MARIA SABINO ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE CATANDUVA JUIZ SENTENCIANTE: CAUE BRAMBILLA DA SILVA RELATOR: ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA ams LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO. 1. A indicação de valores na petição inicial, nos termos do art. 840, §1º, da CLT, na redação dada pela Lei nº 13.467/2017, configura mera estimativa, não limitando a condenação ao valor ali estipulado. 2. A apuração definitiva dos valores devidos ocorrerá na fase de liquidação. 3. Sentença reformada. Inconformado com a r. sentença (ID. Cf93640), complementada pela decisão de embargos (ID 34753f0), que julgou parcialmente procedentes os pedidos, recorre o reclamante. O autor pleiteia o afastamento da limitação da condenação e o deferimento de adicional de insalubridade e horas extras, o reconhecimento da responsabilidade solidária dos réus e a majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais (ID b91be83). Não houve a apresentação de contrarrazões. Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, a teor dos artigos 110 e 111 do Regimento Interno deste E. Regional. É o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE Atendidos os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do recurso ordinário interposto pelo reclamante. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO O autor pede a reforma da sentença neste ponto. Com razão. No caso em apreço, a ação foi proposta na vigência da Lei 13.467/2017, que conferiu nova redação ao art. 840, §1º, da CLT, instituindo a necessidade de indicação dos valores aos pedidos, in verbis: "§ 1º Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)" Como se vislumbra, o art. 840 da CLT impôs à parte, tão somente, a indicação do valor de cada pedido, não sendo exigida efetiva liquidação. Sobre o tema, o Tribunal Superior do Trabalho tem, iterativamente, entendido consoante a tese recursal obreira. Em inúmeros julgamentos no sentido de que o montante condenatório não está adstrito aos valores estimados na inicial, a exemplo: ''III - RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE - REGÊNCIA PELA LEI Nº 13.467/2017 - LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO INICIAL. RITO ORDINÁRIO. MERA ESTIMATIVA. RECLAMAÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. A respeito do tema, o entendimento desta Corte Superior firmou-se no sentido de que, quando constar expressamente da exordial que os valores ali indicados são meramente estimativos, não há falar em limitação da condenação ao valor atribuído à causa. Julgados. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RRAg-1001161-03.2021.5.02.0716, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 13/05/2025). ''RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.467/2017. LIMITAÇÃO DO VALOR DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS EXPRESSAMENTE NA PETIÇÃO INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. REGISTRO DA MERA ESTIMATIVA QUANTO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA E SISTEMÁTICA DO ARTIGO 840, §1º, DA CLT. OBSERVÂNCIA DOS ARTIGOS 322, 324 E 492 DO CPC. PRINCÍPIOS DA INFORMALIDADE E SIMPLICIDADE QUE REGEM O PROCESSO DO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA DA CAUSA RECONHECIDA. Da interpretação do artigo 840, §1º, da CLT, de modo consentâneo com os princípios que regem o Processo do Trabalho - em especial o da informalidade e simplicidade - e em conjunto com os demais preceitos constantes do ordenamento jurídico pátrio, a exemplo dos artigos 322, 324 e 492 do CPC, resulta que a indicação dos valores dos pedidos na inicial equivale à mera estimativa. É a conclusão que também se depreende do artigo 12, §3º, da Instrução Normativa nº 41/2018 do TST. Tese reafirmada pela SDI-1 desta Corte Superior, no precedente Emb-RR-555-36.2021.5.09.0024, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 07/12/2023. Logo, merece reforma a decisão regional. Recurso de revista conhecido e provido" (RRAg-0000585-69.2022.5.06.0008, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 12/05/2025). Com efeito, é na liquidação da sentença que serão efetivamente apurados os valores devidos acerca das parcelas da condenação, sendo que aqueles apontados na petição inicial, requisito do art. 840, §1º, da CLT, apenas indicam uma estimativa, não podendo ser mantida a limitação da condenação aos valores ali informados. Reformo a sentença. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE Insurge-se o reclamante contra o indeferimento do adicional de insalubridade, sob o argumento de que a prova pericial comprovou a exposição à radiação não ionizante e concluiu pela caracterização de insalubridade. Vejamos. Sobre o tema, a perícia técnica realizada nos autos pela sra. Franciela Carla Galiardi (ID 72b5894), constatou que: ''3.2. Avaliação da exposição do reclamante ao agente físico radiações não ionizantes O anexo 7 da NR 15 estabelece que serão consideradas insalubres as atividades ou operações que exponham sem proteção adequada o trabalhador às radiações não ionizantes, em decorrência de laudo de inspeção realizada no local de trabalho. Enquadram-se nesta categoria as radiações ultravioletas oriundas do sol. No presente caso, o reclamante desenvolveu trabalho rural a céu aberto, com sujeição ao sol, de maneira que esteve, ao longo de todo o contrato de trabalho, dependente de proteção adequada para o exercício pleno e seguro de suas atividades. 3.2.1. Proteção contra radiações não ionizantes A proteção adequada contra os raios solares se faz por meio do uso de equipamentos de proteção individual que cubram todas as partes do corpo, bloqueando a incidência da luz solar sobre a pele do trabalhador, incluindo rosto, tronco, membros superiores e membros inferiores. São adequados a esta finalidade, os equipamentos identificados como: luvas, calçados de segurança, blusas de manga longa, calças compridas, capacetes, toucas árabes, chapéus e/ou bonés. Quanto aos cremes bloqueadores ou protetores solares, cumpre esclarecer que não possuem certificado de aprovação (CA) emitido pelo Ministério do Trabalho, razão pela qual não são considerados equipamentos de proteção individual. O uso desses cremes, portanto, é opcional - não obrigatório - e insuficiente para neutralizar ou eliminar a insalubridade por exposição a radiações não ionizantes, servindo apenas como proteção suplementar ou reforço, sem a dispensa do uso dos equipamentos de proteção individual acima mencionados. 3.2.2. Frequência da entrega dos EPIs e neutralização do risco de exposição a radiações não ionizantes Compulsando os autos, NÃO se observa o registro de entrega de nenhum EPI ao reclamante. Pode-se afirmar, portanto, que o autor, na condição de trabalhador rural, esteve exposto de maneira desprotegida ao agente físico radiações não ionizantes durante todo o período analisado, de 01/07/2020 a 03/04/2024.'' Nesse contexto, concluiu a expert: ''4.2. Radiações não ionizantes As atividades desenvolvidas pelo reclamante na reclamada enquadram-se como atividades ou operações insalubres em grau médio (20%) por exposição desprotegida ao agente físico radiações não ionizantes, com fundamento no anexo 7 da NR 15, durante todo o contrato de trabalho, de 01/07/2020 a 03/04/2024.'' Sabe-se que, nos termos do art. 479 do CPC, o Juízo não está vinculado às conclusões do laudo pericial, atuando o perito como profissional técnico apto a auxiliar o julgador no exame de matéria que exija conhecimentos específicos. Porém, a teor do citado artigo, o Juízo decidirá contrariamente à manifestação do expert se forem constatados outros elementos e fatos que fundamentem tal entendimento. À sua falta, aplica-se o art. 195 da CLT, prestigiando-se o conteúdo da prova técnica produzida. In casu, entretanto, não acolheria a conclusão do laudo pericial, uma vez que a questão já se encontra pacificada na jurisprudência do C. TST, conforme se depreende da OJ 173, I, de sua SDI-I, in verbis: "ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. ATIVIDADE A CÉU ABERTO. EXPOSIÇÃO AO SOL E AO CALOR (redação alterada na sessão do tribunal pleno realizada em 14.09.2012) - Res. 186/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 I - Ausente previsão legal, indevido o adicional de insalubridade ao trabalhador em atividade a céu aberto, por sujeição à radiação solar (art. 195 da CLT e Anexo 7 da NR 15 da Portaria Nº 3214/78 do MTE).'' Todavia, consoante o entendimento dos demais julgadores nesta sessão, o laudo deve ser acolhido pelas seguintes razões apresentadas pela Exma. Juíza Dra. LAURA BITTENCOURT FERREIRA RODRIGUES: "No tocante ao calor, todos sabemos dos malefícios causados pelos raios solares à saúde, sendo que a exposição excessiva a que se submetem alguns trabalhadores, somada a longas jornadas de labor a céu aberto expostos ao calor, somente agravam tais malefícios. Negar a tais trabalhadores o direito ao percebimento do adicional de insalubridade significa desvalorizar o trabalho humano e ignorar a dignidade da pessoa humana. Notadamente, o trabalhador rural é aquele que mais sofre com o trabalho a céu aberto. É bastante equivocada a ideia de que estar exposto ao sol é condição natural e inócua ao ser humano. O homem em seu estado natural e não tendo razão específica para isto não se expõe à radiação solar por oito, dez ou doze horas/dia, diariamente. É pública e notória a noção segundo a qual a excessiva exposição a raios solares é grave fator de risco tendente ao desenvolvimento de câncer de pele, assim como é público e notório ser cumulativo o efeito da ação solar sobre o tecido epitelial. O exacerbado apelo ao legalismo induz a distorções. Qualquer bom tratado de medicina indicará que a exposição sistemática a radiações solares ao longo do dia, incluindo aí os chamados horários de risco, constitui condição insalutífera e agressiva ao arcabouço biológico. Ora, atuando em área rural é evidente que o reclamante laborava em condições insalubres sob a exposição ao sol e calor, ao menos nas épocas em que as temperaturas atingem picos maiores. Isso porque, nos meses mais quentes do ano a condição insalubre (exposição ao calor) é agravada pela taxa de gasto metabólico decorrente da atividade penosa e pelo uso de vestuário e de materiais que dificultam a troca de calor com o ambiente, acentuando a situação de estresse térmico do trabalhador. O reclamante trabalhava em lavouras, atividade de natureza pesada (conforme refere a perícia) com gasto metabólico elevado, cujo limite de tolerância é de 25 ºC. Nesse ínterim, é evidente que houve exposição ao calor acima dos limites de tolerância. Veja-se a Súmula 88 do TRT-15, que menciona especificamente o trabalhador rural: "ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. TRABALHADOR RURAL. TRABALHO A CÉU ABERTO. EXPOSIÇÃO A CALOR. Comprovada a exposição do trabalhador rural ao calor excessivo, nas condições previstas no Anexo 3 da NR-15 da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho, é devido o pagamento do adicional de insalubridade." (RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA Nº 01/2017, de 24 de janeiro de 2017 - Divulgada no D.E.J.T. de 26/01/2017, págs. 04-05; D.E.J.T. de 27/01/2017, págs. 01-02; no D.E.J.T. de 30/01/2017, págs. 04-05) Também a leitura dos precedentes do item II da OJ 173 da SDI-1 do TST permite maior esclarecimento sobre a configuração da insalubridade por exposição a calor decorrente do trabalho a céu aberto: "ADICIONAL DE INSALUBRIDADE - EXPOSIÇÃO AO CALOR DO SOL - ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 173 DA SBDI-1 - INAPLICABILIDADE. O Anexo 7 da NR 15 do Ministério do Trabalho, ao qual a Orientação Jurisprudencial nº 173 da SBDI-1 faz referência, trata das radiações não-ionizantes. Inegável, portanto, que o intuito desta Corte, quando de sua edição, foi de vedar o pagamento de adicional de insalubridade em razão do fator radiação solar, ante a inexistência de previsão legal neste sentido. Entretanto, o mesmo entendimento não pode ser aplicado às hipóteses em que o laudo pericial constata a submissão do trabalhador ao agente insalubre calor, o qual encontra previsão no anexo nº 3 da mesma norma regulamentar, na qual não há qualquer diferenciação a respeito da necessidade de exposição ao mencionado fator em ambiente fechado ou aberto. Aliás, conforme se verifica do item 1 do referido anexo, há expressa menção a Ambientes externos com carga solar. Dessa forma, havendo comprovação, mediante perícia técnica, da submissão do reclamante a trabalho insalubre decorrente da exposição ao fator calor, nos termos da NR 15, Anexo 3, do Ministério do Trabalho, deve ser mantida a condenação ao pagamento de adicional de insalubridade, sendo irrelevante o fato da alta temperatura decorrer do contato com a luz solar. Recurso de embargos conhecido e desprovido" (E-ARR-153200-96.2008.5.15.0133, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT 31/08/2012). Nesse sentido, considera-se devido o adicional de insalubridade por exposição ao calor excessivo nas atividades realizadas a céu aberto que exponham os trabalhadores ao calor com mesma ou maior intensidade (temperatura) que a enfrentada por aqueles que atuam em ambientes fechados ou com fonte artificial de calor em condições que ensejam o pagamento da parcela, mesmo após a entrada em vigor da Portaria nº 1.359 de 09.12.2019." Assim, com ressalva de entendimento em sentido contrário, condena-se a reclamada no pagamento de adicional de insalubridade no percentual de 20%, a incidir sobre o salário mínimo regional do Estado de São Paulo, exceto no interregno entre junho e julho de cada ano, com reflexos em décimos terceiros salários, férias acrescidas de um terço, FGTS e verbas rescisórias. Em decorrência, deverá a reclamada arcar com os honorários do perito, ora arbitrados em R$3.000,00, autorizado o abatimento de valores eventualmente já pagos adiantadamente. HORAS EXTRAS Argumenta o autor que as reclamadas não impugnaram a jornada de trabalho alegada na exordial e não relataram qual seria o horário de trabalho do obreiro, o que implica confissão. Postula, assim, o deferimento de horas extras e de pausas como descrito na exordial. Analiso. Afirmou o reclamante, na prefacial, que laborava de segunda à sexta-feira das 06h00 às 17h00, com uma hora de intervalo intrajornada. A reclamada, em contestação, afirmou que o autor tinha total liberdade para estabelecer seus horários de trabalho, o que era viabilizado pela baixa quantia de serviço e pela ausência da ré nas dependências da fazenda. A pretensão de horas extras caracteriza-se como direito extraordinário, devendo o empregado provar o fato constitutivo de seu direito, com fulcro nos artigos 818 da CLT e 373, I, do CPC. Por sua vez, incumbe ao empregador, que conta com mais de 20 empregados, o controle da jornada através de registros de ponto, nos termos do art. 74, §2º da CLT da CLT. A não apresentação em Juízo desses documentos gera presunção relativa de veracidade dos horários declinados na inicial, segundo entendimento consubstanciado na Súmula nº 338 do C. TST. No caso dos autos, contudo, verifica-se, pelo depoimento da testemunha arrolada pela ré, que o reclamante era o único funcionário da fazenda, o que, por si, afasta a disposição celetista do art. 74. Nesse sentido, incumbia ao reclamante demonstrar a jornada alegada na inicial, encargo do qual não se desincumbiu, ante a completa ausência de provas. Destaca-se, nesse sentido, que a testemunha arrolada pela ré, embora não estivesse presente no local de trabalho do obreiro, confirma, ante sua proximidade com a reclamada advinda da função de empregada doméstica, que não havia pacto com o autor acerca da jornada laboral a ser cumprida. Outrossim, corroboro com o entendimento do magistrado no sentido de que, em se tratando de empregado residente no local de trabalho rural, sem ingerência pessoal e cotidiana de seus serviços, é crível que exista liberdade para o estabelecimento da jornada laboral. Também não houve comprovação da prática de tarefas que demandassem jornada extraordinária permanente, na forma descrita na exordial. Destarte, do conjunto probatório dos autos entendo que o reclamante não estava submetido a qualquer controle de horário e que não houve a realização de trabalho extraordinário. Mantenho a sentença de improcedência. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA Afirma o reclamante que a 1ª ré é proprietária da fazenda e possui o usufruto da mesma com seus filhos, demais recorridos, os quais sempre deram ordens, contribuíram para o pagamento dos salários e determinaram as condições de funcionamento do contrato de trabalho do reclamante. Nesse sentido pleiteia o reconhecimento da responsabilidade solidária de todos os réus. Sem razão. Não há respaldo legal para o reconhecimento da responsabilidade solidária dos parentes do empregador doméstico ou rural, que frequentam o local de trabalho eventualmente, notadamente no caso de idosos, que muitas vezes necessitam de auxílio para o pagamento das despesas dos empregados. E esse foi o teor do depoimento da testemunha arrolada pela ré, no sentido de que um dos filhos da reclamada, Adauto, apenas acompanhava a mãe em dias de pagamento para lhe auxiliar. Outrossim, inexistem provas nos autos de que os filhos da reclamada se beneficiaram com a prestação de serviços do autor. Não há o que se falar, pois, em responsabilidade solidária dos réus. Mantenho. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS Pleiteia o reclamante a majoração da condenação da reclamada ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais. Entendo que o montante fixado na Origem a título de honorários advocatícios devidos pela reclamada (5%), comporta reparo. Com efeito, dispõe o §2º do art. 791-A da CLT que os honorários serão fixados pelo juiz, considerando-se o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. Trata-se, portanto, de verba a ser fixada pelo julgador em face de critérios legalmente previstos, verificando-se no presente caso desproporção entre o trabalho dos procuradores das partes e o valor fixado aos honorários. Assim, reformo parcialmente o item para majorar para 10% o percentual relativo aos honorários advocatícios sucumbenciais devidos pela parte ré. Parcial procedência. Diante do exposto, decido CONHECER do recurso ordinário do reclamante, VALENTIM ZOCARATO, e DAR-LHE PARCIAL PROCEDÊNCIA para condenar a parte reclamada ao pagamento de adicional de insalubridade, exceto nos meses de junho e julho, com reflexos; afastar a limitação da condenação, majorar os honorários devidos a seu patrono para 10% sobre o valor da condenação, e, por inversão da sucumbências, condená-la ao pagamento de honorários periciais de R$ 3.000,00, tudo, nos termos da fundamentação. Rearbitro à condenação o valor de R$20.000,00; custas pela parte reclamada no valor de R$400,00. Em sessão virtual realizada em 27/06/2025, conforme os termos da Portaria GP nº 05/2023 deste E. TRT, A C O R D A M os Magistrados da 11ª Câmara (Sexta Turma) do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Quinta Região em julgar o processo nos termos do voto proposto pelo Exmo. Sr. Relator. Votação unânime. Composição: Exmos. Srs. Desembargadores ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA (Relator e Presidente Regimental), LUIZ FELIPE PAIM DA LUZ BRUNO LOBO e Exma. Sra. Juíza LAURA BITTENCOURT FERREIRA RODRIGUES. Ministério Público do Trabalho: Exmo.(a) Sr.(a) Procurador(a) Ciente. Sessão realizada em 27 de junho de 2025. ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA Desembargador Relator Votos Revisores CAMPINAS/SP, 28 de julho de 2025. CARLOS RODRIGUES DA SILVA Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - FRANCISCO JOSE SABINO

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Franciela Carla Galiardi e outros x Adauto Jose Sabino e outros

ID: 337232826

Tribunal: TRT15 Órgão: 11ª Câmara Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0010679-93.2024.5.15.0028

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

FRANCIELA CARLA GALIARDI VALENTIM ZOCARATO

Polo Passivo:

ADAUTO JOSE SABINO ANTONIO JOSE SABINO AZENETH MARIA SABINO FRANCISCO JOSE SABINO GISELLE MARIA SABINO JUDITH BUENO SABINO TANIA MARIA SABINO

Acórdão

Advogados:

CAIO CESAR DOSUALDO

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CARLOS ADALBERTO RODRIGUES

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GUILHERME STEFFEN DE AZEVEDO FIGUEIREDO

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO 11ª CÂMARA Relator: ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA ROT 0010679-93.2024.5.15.0028 RECORRENTE: VALENTIM ZOCARATO RE… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO 11ª CÂMARA Relator: ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA ROT 0010679-93.2024.5.15.0028 RECORRENTE: VALENTIM ZOCARATO RECORRIDO: JUDITH BUENO SABINO E OUTROS (6) PROCESSO nº 0010679-93.2024.5.15.0028 (ROT) RECORRENTE: VALENTIM ZOCARATO RECORRIDO: JUDITH BUENO SABINO, ADAUTO JOSE SABINO, ANTONIO JOSE SABINO , AZENETH MARIA SABINO, FRANCISCO JOSE SABINO, GISELLE MARIA SABINO, TANIA MARIA SABINO ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE CATANDUVA JUIZ SENTENCIANTE: CAUE BRAMBILLA DA SILVA RELATOR: ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA ams LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO. 1. A indicação de valores na petição inicial, nos termos do art. 840, §1º, da CLT, na redação dada pela Lei nº 13.467/2017, configura mera estimativa, não limitando a condenação ao valor ali estipulado. 2. A apuração definitiva dos valores devidos ocorrerá na fase de liquidação. 3. Sentença reformada. Inconformado com a r. sentença (ID. Cf93640), complementada pela decisão de embargos (ID 34753f0), que julgou parcialmente procedentes os pedidos, recorre o reclamante. O autor pleiteia o afastamento da limitação da condenação e o deferimento de adicional de insalubridade e horas extras, o reconhecimento da responsabilidade solidária dos réus e a majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais (ID b91be83). Não houve a apresentação de contrarrazões. Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, a teor dos artigos 110 e 111 do Regimento Interno deste E. Regional. É o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE Atendidos os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do recurso ordinário interposto pelo reclamante. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO O autor pede a reforma da sentença neste ponto. Com razão. No caso em apreço, a ação foi proposta na vigência da Lei 13.467/2017, que conferiu nova redação ao art. 840, §1º, da CLT, instituindo a necessidade de indicação dos valores aos pedidos, in verbis: "§ 1º Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)" Como se vislumbra, o art. 840 da CLT impôs à parte, tão somente, a indicação do valor de cada pedido, não sendo exigida efetiva liquidação. Sobre o tema, o Tribunal Superior do Trabalho tem, iterativamente, entendido consoante a tese recursal obreira. Em inúmeros julgamentos no sentido de que o montante condenatório não está adstrito aos valores estimados na inicial, a exemplo: ''III - RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE - REGÊNCIA PELA LEI Nº 13.467/2017 - LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO INICIAL. RITO ORDINÁRIO. MERA ESTIMATIVA. RECLAMAÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. A respeito do tema, o entendimento desta Corte Superior firmou-se no sentido de que, quando constar expressamente da exordial que os valores ali indicados são meramente estimativos, não há falar em limitação da condenação ao valor atribuído à causa. Julgados. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RRAg-1001161-03.2021.5.02.0716, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 13/05/2025). ''RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.467/2017. LIMITAÇÃO DO VALOR DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS EXPRESSAMENTE NA PETIÇÃO INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. REGISTRO DA MERA ESTIMATIVA QUANTO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA E SISTEMÁTICA DO ARTIGO 840, §1º, DA CLT. OBSERVÂNCIA DOS ARTIGOS 322, 324 E 492 DO CPC. PRINCÍPIOS DA INFORMALIDADE E SIMPLICIDADE QUE REGEM O PROCESSO DO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA DA CAUSA RECONHECIDA. Da interpretação do artigo 840, §1º, da CLT, de modo consentâneo com os princípios que regem o Processo do Trabalho - em especial o da informalidade e simplicidade - e em conjunto com os demais preceitos constantes do ordenamento jurídico pátrio, a exemplo dos artigos 322, 324 e 492 do CPC, resulta que a indicação dos valores dos pedidos na inicial equivale à mera estimativa. É a conclusão que também se depreende do artigo 12, §3º, da Instrução Normativa nº 41/2018 do TST. Tese reafirmada pela SDI-1 desta Corte Superior, no precedente Emb-RR-555-36.2021.5.09.0024, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 07/12/2023. Logo, merece reforma a decisão regional. Recurso de revista conhecido e provido" (RRAg-0000585-69.2022.5.06.0008, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 12/05/2025). Com efeito, é na liquidação da sentença que serão efetivamente apurados os valores devidos acerca das parcelas da condenação, sendo que aqueles apontados na petição inicial, requisito do art. 840, §1º, da CLT, apenas indicam uma estimativa, não podendo ser mantida a limitação da condenação aos valores ali informados. Reformo a sentença. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE Insurge-se o reclamante contra o indeferimento do adicional de insalubridade, sob o argumento de que a prova pericial comprovou a exposição à radiação não ionizante e concluiu pela caracterização de insalubridade. Vejamos. Sobre o tema, a perícia técnica realizada nos autos pela sra. Franciela Carla Galiardi (ID 72b5894), constatou que: ''3.2. Avaliação da exposição do reclamante ao agente físico radiações não ionizantes O anexo 7 da NR 15 estabelece que serão consideradas insalubres as atividades ou operações que exponham sem proteção adequada o trabalhador às radiações não ionizantes, em decorrência de laudo de inspeção realizada no local de trabalho. Enquadram-se nesta categoria as radiações ultravioletas oriundas do sol. No presente caso, o reclamante desenvolveu trabalho rural a céu aberto, com sujeição ao sol, de maneira que esteve, ao longo de todo o contrato de trabalho, dependente de proteção adequada para o exercício pleno e seguro de suas atividades. 3.2.1. Proteção contra radiações não ionizantes A proteção adequada contra os raios solares se faz por meio do uso de equipamentos de proteção individual que cubram todas as partes do corpo, bloqueando a incidência da luz solar sobre a pele do trabalhador, incluindo rosto, tronco, membros superiores e membros inferiores. São adequados a esta finalidade, os equipamentos identificados como: luvas, calçados de segurança, blusas de manga longa, calças compridas, capacetes, toucas árabes, chapéus e/ou bonés. Quanto aos cremes bloqueadores ou protetores solares, cumpre esclarecer que não possuem certificado de aprovação (CA) emitido pelo Ministério do Trabalho, razão pela qual não são considerados equipamentos de proteção individual. O uso desses cremes, portanto, é opcional - não obrigatório - e insuficiente para neutralizar ou eliminar a insalubridade por exposição a radiações não ionizantes, servindo apenas como proteção suplementar ou reforço, sem a dispensa do uso dos equipamentos de proteção individual acima mencionados. 3.2.2. Frequência da entrega dos EPIs e neutralização do risco de exposição a radiações não ionizantes Compulsando os autos, NÃO se observa o registro de entrega de nenhum EPI ao reclamante. Pode-se afirmar, portanto, que o autor, na condição de trabalhador rural, esteve exposto de maneira desprotegida ao agente físico radiações não ionizantes durante todo o período analisado, de 01/07/2020 a 03/04/2024.'' Nesse contexto, concluiu a expert: ''4.2. Radiações não ionizantes As atividades desenvolvidas pelo reclamante na reclamada enquadram-se como atividades ou operações insalubres em grau médio (20%) por exposição desprotegida ao agente físico radiações não ionizantes, com fundamento no anexo 7 da NR 15, durante todo o contrato de trabalho, de 01/07/2020 a 03/04/2024.'' Sabe-se que, nos termos do art. 479 do CPC, o Juízo não está vinculado às conclusões do laudo pericial, atuando o perito como profissional técnico apto a auxiliar o julgador no exame de matéria que exija conhecimentos específicos. Porém, a teor do citado artigo, o Juízo decidirá contrariamente à manifestação do expert se forem constatados outros elementos e fatos que fundamentem tal entendimento. À sua falta, aplica-se o art. 195 da CLT, prestigiando-se o conteúdo da prova técnica produzida. In casu, entretanto, não acolheria a conclusão do laudo pericial, uma vez que a questão já se encontra pacificada na jurisprudência do C. TST, conforme se depreende da OJ 173, I, de sua SDI-I, in verbis: "ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. ATIVIDADE A CÉU ABERTO. EXPOSIÇÃO AO SOL E AO CALOR (redação alterada na sessão do tribunal pleno realizada em 14.09.2012) - Res. 186/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 I - Ausente previsão legal, indevido o adicional de insalubridade ao trabalhador em atividade a céu aberto, por sujeição à radiação solar (art. 195 da CLT e Anexo 7 da NR 15 da Portaria Nº 3214/78 do MTE).'' Todavia, consoante o entendimento dos demais julgadores nesta sessão, o laudo deve ser acolhido pelas seguintes razões apresentadas pela Exma. Juíza Dra. LAURA BITTENCOURT FERREIRA RODRIGUES: "No tocante ao calor, todos sabemos dos malefícios causados pelos raios solares à saúde, sendo que a exposição excessiva a que se submetem alguns trabalhadores, somada a longas jornadas de labor a céu aberto expostos ao calor, somente agravam tais malefícios. Negar a tais trabalhadores o direito ao percebimento do adicional de insalubridade significa desvalorizar o trabalho humano e ignorar a dignidade da pessoa humana. Notadamente, o trabalhador rural é aquele que mais sofre com o trabalho a céu aberto. É bastante equivocada a ideia de que estar exposto ao sol é condição natural e inócua ao ser humano. O homem em seu estado natural e não tendo razão específica para isto não se expõe à radiação solar por oito, dez ou doze horas/dia, diariamente. É pública e notória a noção segundo a qual a excessiva exposição a raios solares é grave fator de risco tendente ao desenvolvimento de câncer de pele, assim como é público e notório ser cumulativo o efeito da ação solar sobre o tecido epitelial. O exacerbado apelo ao legalismo induz a distorções. Qualquer bom tratado de medicina indicará que a exposição sistemática a radiações solares ao longo do dia, incluindo aí os chamados horários de risco, constitui condição insalutífera e agressiva ao arcabouço biológico. Ora, atuando em área rural é evidente que o reclamante laborava em condições insalubres sob a exposição ao sol e calor, ao menos nas épocas em que as temperaturas atingem picos maiores. Isso porque, nos meses mais quentes do ano a condição insalubre (exposição ao calor) é agravada pela taxa de gasto metabólico decorrente da atividade penosa e pelo uso de vestuário e de materiais que dificultam a troca de calor com o ambiente, acentuando a situação de estresse térmico do trabalhador. O reclamante trabalhava em lavouras, atividade de natureza pesada (conforme refere a perícia) com gasto metabólico elevado, cujo limite de tolerância é de 25 ºC. Nesse ínterim, é evidente que houve exposição ao calor acima dos limites de tolerância. Veja-se a Súmula 88 do TRT-15, que menciona especificamente o trabalhador rural: "ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. TRABALHADOR RURAL. TRABALHO A CÉU ABERTO. EXPOSIÇÃO A CALOR. Comprovada a exposição do trabalhador rural ao calor excessivo, nas condições previstas no Anexo 3 da NR-15 da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho, é devido o pagamento do adicional de insalubridade." (RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA Nº 01/2017, de 24 de janeiro de 2017 - Divulgada no D.E.J.T. de 26/01/2017, págs. 04-05; D.E.J.T. de 27/01/2017, págs. 01-02; no D.E.J.T. de 30/01/2017, págs. 04-05) Também a leitura dos precedentes do item II da OJ 173 da SDI-1 do TST permite maior esclarecimento sobre a configuração da insalubridade por exposição a calor decorrente do trabalho a céu aberto: "ADICIONAL DE INSALUBRIDADE - EXPOSIÇÃO AO CALOR DO SOL - ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 173 DA SBDI-1 - INAPLICABILIDADE. O Anexo 7 da NR 15 do Ministério do Trabalho, ao qual a Orientação Jurisprudencial nº 173 da SBDI-1 faz referência, trata das radiações não-ionizantes. Inegável, portanto, que o intuito desta Corte, quando de sua edição, foi de vedar o pagamento de adicional de insalubridade em razão do fator radiação solar, ante a inexistência de previsão legal neste sentido. Entretanto, o mesmo entendimento não pode ser aplicado às hipóteses em que o laudo pericial constata a submissão do trabalhador ao agente insalubre calor, o qual encontra previsão no anexo nº 3 da mesma norma regulamentar, na qual não há qualquer diferenciação a respeito da necessidade de exposição ao mencionado fator em ambiente fechado ou aberto. Aliás, conforme se verifica do item 1 do referido anexo, há expressa menção a Ambientes externos com carga solar. Dessa forma, havendo comprovação, mediante perícia técnica, da submissão do reclamante a trabalho insalubre decorrente da exposição ao fator calor, nos termos da NR 15, Anexo 3, do Ministério do Trabalho, deve ser mantida a condenação ao pagamento de adicional de insalubridade, sendo irrelevante o fato da alta temperatura decorrer do contato com a luz solar. Recurso de embargos conhecido e desprovido" (E-ARR-153200-96.2008.5.15.0133, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT 31/08/2012). Nesse sentido, considera-se devido o adicional de insalubridade por exposição ao calor excessivo nas atividades realizadas a céu aberto que exponham os trabalhadores ao calor com mesma ou maior intensidade (temperatura) que a enfrentada por aqueles que atuam em ambientes fechados ou com fonte artificial de calor em condições que ensejam o pagamento da parcela, mesmo após a entrada em vigor da Portaria nº 1.359 de 09.12.2019." Assim, com ressalva de entendimento em sentido contrário, condena-se a reclamada no pagamento de adicional de insalubridade no percentual de 20%, a incidir sobre o salário mínimo regional do Estado de São Paulo, exceto no interregno entre junho e julho de cada ano, com reflexos em décimos terceiros salários, férias acrescidas de um terço, FGTS e verbas rescisórias. Em decorrência, deverá a reclamada arcar com os honorários do perito, ora arbitrados em R$3.000,00, autorizado o abatimento de valores eventualmente já pagos adiantadamente. HORAS EXTRAS Argumenta o autor que as reclamadas não impugnaram a jornada de trabalho alegada na exordial e não relataram qual seria o horário de trabalho do obreiro, o que implica confissão. Postula, assim, o deferimento de horas extras e de pausas como descrito na exordial. Analiso. Afirmou o reclamante, na prefacial, que laborava de segunda à sexta-feira das 06h00 às 17h00, com uma hora de intervalo intrajornada. A reclamada, em contestação, afirmou que o autor tinha total liberdade para estabelecer seus horários de trabalho, o que era viabilizado pela baixa quantia de serviço e pela ausência da ré nas dependências da fazenda. A pretensão de horas extras caracteriza-se como direito extraordinário, devendo o empregado provar o fato constitutivo de seu direito, com fulcro nos artigos 818 da CLT e 373, I, do CPC. Por sua vez, incumbe ao empregador, que conta com mais de 20 empregados, o controle da jornada através de registros de ponto, nos termos do art. 74, §2º da CLT da CLT. A não apresentação em Juízo desses documentos gera presunção relativa de veracidade dos horários declinados na inicial, segundo entendimento consubstanciado na Súmula nº 338 do C. TST. No caso dos autos, contudo, verifica-se, pelo depoimento da testemunha arrolada pela ré, que o reclamante era o único funcionário da fazenda, o que, por si, afasta a disposição celetista do art. 74. Nesse sentido, incumbia ao reclamante demonstrar a jornada alegada na inicial, encargo do qual não se desincumbiu, ante a completa ausência de provas. Destaca-se, nesse sentido, que a testemunha arrolada pela ré, embora não estivesse presente no local de trabalho do obreiro, confirma, ante sua proximidade com a reclamada advinda da função de empregada doméstica, que não havia pacto com o autor acerca da jornada laboral a ser cumprida. Outrossim, corroboro com o entendimento do magistrado no sentido de que, em se tratando de empregado residente no local de trabalho rural, sem ingerência pessoal e cotidiana de seus serviços, é crível que exista liberdade para o estabelecimento da jornada laboral. Também não houve comprovação da prática de tarefas que demandassem jornada extraordinária permanente, na forma descrita na exordial. Destarte, do conjunto probatório dos autos entendo que o reclamante não estava submetido a qualquer controle de horário e que não houve a realização de trabalho extraordinário. Mantenho a sentença de improcedência. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA Afirma o reclamante que a 1ª ré é proprietária da fazenda e possui o usufruto da mesma com seus filhos, demais recorridos, os quais sempre deram ordens, contribuíram para o pagamento dos salários e determinaram as condições de funcionamento do contrato de trabalho do reclamante. Nesse sentido pleiteia o reconhecimento da responsabilidade solidária de todos os réus. Sem razão. Não há respaldo legal para o reconhecimento da responsabilidade solidária dos parentes do empregador doméstico ou rural, que frequentam o local de trabalho eventualmente, notadamente no caso de idosos, que muitas vezes necessitam de auxílio para o pagamento das despesas dos empregados. E esse foi o teor do depoimento da testemunha arrolada pela ré, no sentido de que um dos filhos da reclamada, Adauto, apenas acompanhava a mãe em dias de pagamento para lhe auxiliar. Outrossim, inexistem provas nos autos de que os filhos da reclamada se beneficiaram com a prestação de serviços do autor. Não há o que se falar, pois, em responsabilidade solidária dos réus. Mantenho. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS Pleiteia o reclamante a majoração da condenação da reclamada ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais. Entendo que o montante fixado na Origem a título de honorários advocatícios devidos pela reclamada (5%), comporta reparo. Com efeito, dispõe o §2º do art. 791-A da CLT que os honorários serão fixados pelo juiz, considerando-se o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. Trata-se, portanto, de verba a ser fixada pelo julgador em face de critérios legalmente previstos, verificando-se no presente caso desproporção entre o trabalho dos procuradores das partes e o valor fixado aos honorários. Assim, reformo parcialmente o item para majorar para 10% o percentual relativo aos honorários advocatícios sucumbenciais devidos pela parte ré. Parcial procedência. Diante do exposto, decido CONHECER do recurso ordinário do reclamante, VALENTIM ZOCARATO, e DAR-LHE PARCIAL PROCEDÊNCIA para condenar a parte reclamada ao pagamento de adicional de insalubridade, exceto nos meses de junho e julho, com reflexos; afastar a limitação da condenação, majorar os honorários devidos a seu patrono para 10% sobre o valor da condenação, e, por inversão da sucumbências, condená-la ao pagamento de honorários periciais de R$ 3.000,00, tudo, nos termos da fundamentação. Rearbitro à condenação o valor de R$20.000,00; custas pela parte reclamada no valor de R$400,00. Em sessão virtual realizada em 27/06/2025, conforme os termos da Portaria GP nº 05/2023 deste E. TRT, A C O R D A M os Magistrados da 11ª Câmara (Sexta Turma) do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Quinta Região em julgar o processo nos termos do voto proposto pelo Exmo. Sr. Relator. Votação unânime. Composição: Exmos. Srs. Desembargadores ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA (Relator e Presidente Regimental), LUIZ FELIPE PAIM DA LUZ BRUNO LOBO e Exma. Sra. Juíza LAURA BITTENCOURT FERREIRA RODRIGUES. Ministério Público do Trabalho: Exmo.(a) Sr.(a) Procurador(a) Ciente. Sessão realizada em 27 de junho de 2025. ANTONIO FRANCISCO MONTANAGNA Desembargador Relator Votos Revisores CAMPINAS/SP, 28 de julho de 2025. CARLOS RODRIGUES DA SILVA Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - GISELLE MARIA SABINO

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Processo nº 1012167-37.2023.8.11.0004

ID: 311694324

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1012167-37.2023.8.11.0004

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

BANCO DAYCOVAL S/A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1012167-37.2023.8.11.0004 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Contratos Bancários, Emprés… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1012167-37.2023.8.11.0004 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Contratos Bancários, Empréstimo consignado] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [MARIA DAS GRACAS PEDROSO DA SILVA - CPF: 460.214.341-53 (APELADO), GUILHERME CORREIA EVARISTO - CPF: 016.586.011-14 (ADVOGADO), BANCO DAYCOVAL S/A - CNPJ: 62.232.889/0001-90 (APELANTE), DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA - CPF: 568.962.041-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO – PRELIMINARES DE DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DAS FATURAS – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de vários saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1012167-37.2023.8.11.0004 APELANTE: BANCO DAYCOVAL S/A APELADA: MARIA DAS GRACAS PEDROSO DA SILVA RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo BANCO DAYCOVAL S/A, contra sentença proferida pela MMª. Juíza da Segunda Vara Cível da Comarca de Barra do Garças/MT, Dra. Augusta Prutchansky Martins Gomes, lançada nos autos da ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais c/c repetição de indébito, ajuizada por MARIA DAS GRACAS PEDROSO DA SILVA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para: “1. DETERMINAR a conversão da modalidade do contrato de cartão de crédito para a modalidade de crédito pessoal consignado em folha de pagamento; 2. DETERMINAR a revisão do débito, desde o início do empréstimo e verificada a existência de saldo a favor da autora, deverá, em primeiro lugar, proceder à compensação e posteriormente a repetição de indébito, na forma simples, incidindo juros moratórios pela taxa SELIC, a contar da data da citação e correção monetária pelo IPCA, a contar da data do pagamento, devendo-se observar, contudo, as deduções entre as taxas SELIC e o IPCA, em conformidade com as alterações promovidas no Código Civil pela Lei 14.905/2024; 3. CONDENAR a demandada no pagamento do valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização pelos danos morais, correção monetária pelo IPCA a partir da data do arbitramento, in casu, a data da sentença, nos termos da Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça e juros de mora pela taxa SELIC, a partir da citação, devendo-se observar, contudo, as deduções entre as taxas SELIC e o IPCA, em conformidade com as alterações promovidas no Código Civil pela Lei 14.905/2024. Uma vez que a autora decaiu de parte mínima dos pedidos, CONDENO a demandada ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.” (sic). Inconformado, o banco apelante suscita, que a contratação do cartão de crédito consignado foi realizada de forma consciente pela parte autora e os saques foram creditados em conta, sendo a utilização do limite do cartão inequívoca. Aduz que a recorrida realizou pagamentos das faturas para além do mínimo, inclusive em datas precisas, de modo que não há configuração de danos morais, pois inexistente qualquer falha na prestação de informação. Assevera que é incabível a repetição de valores em dobro, conforme o entendimento do EREsp 1.413.542/RS, pois o contrato está em conformidade com o IRDR 0005217-75.2019.8.04.0000, bem como não houve induzimento em erro, tampouco omissão de informações essenciais, pois o contrato é claro e transparente. Denota que o consumidor se beneficiou do serviço por mais de nove anos, sendo incabível a declaração de nulidade do contrato, devendo a sentença observar a prescrição quinquenal e a compensação com os valores creditados em conta da autora. Consigna que restou caracterizada a litigância de má-fé da parte autora, ao alterar deliberadamente a realidade dos fatos e que o ajuizamento da demanda constitui abuso do direito de ação, devendo ser aplicada multa punitiva nos moldes do art. 81 do CPC. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos iniciais, com condenação da autora ao pagamento das verbas sucumbenciais e multa por litigância de má-fé; o reconhecimento da validade e regularidade do contrato de cartão de crédito consignado, com o afastamento de qualquer nulidade ou vício de consentimento, a observância da prescrição quinquenal e a compensação com os valores efetivamente creditados na conta da autora; o afastamento da condenação por danos morais; subsidiariamente, a redução do valor arbitrado a título de indenização moral para R$ 1.000,00. Contrarrazões ofertadas no Id 288634424, postulando pelo desprovimento do recurso. O preparo foi recolhido (Id 290404888). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Verifica-se que o recurso está preparado, é tempestivo e adequado, de modo que CONHEÇO o apelo, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Antes de adentrar ao mérito, pertinente enfrentar as preliminares suscitadas pelo apelante. No caso, não há falar em prescrição, ainda que parcial, pois, apesar da contratação realizada, as prestações continuam a ser debitadas diretamente da folha de pagamento do apelante até os dias atuais, de modo que rejeito a preliminar suscitada. Nesse sentido é o entendimento desta C. Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO REJEITADA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A PARTE AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que a parte autora se utiliza do cartão para realização de saques, inclusive efetuando pagamento parcial da fatura, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados”. (N.U 1032612-28.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/11/2024, Publicado no DJE 29/11/2024) Quanto à preliminar de decadência, da mesma forma resta afastada, posto que, tratando-se de obrigação de trato sucessivo, há renovação automática do pacto ao longo do tempo por meio dos descontos mensais, o que afasta a incidência da decadência do direito de discutir o contrato bancário. Dessa forma, merece ser afastada a referida preliminar. Quanto ao cerne, cinge-se dos autos que MARIA DAS GRACAS PEDROSO DA SILVA ajuizou a presente ação em desfavor do BANCO DAYCOVAL S/A alegando, em suma, realizou Empréstimo Consignado junto à parte Requerida, sendo informado que o pagamento seria realizado por meio de descontos mensais diretamente de seu benefício previdenciário, no valor de R$ 81,29 (Oitenta e um reais e vinte e nove centavos) em 24 meses, a partir de 11/2020. Diz que tomou conhecimento recentemente que o valor descontado trata-se de mútuo consignado em folha de pagamento na modalidade de cartão de crédito, no importe mensal de R$ 81,29 (Oitenta e um reais e vinte e nove centavos) o qual continua a ser descontado até os dias contemporâneos, sem previsão de término. Alega ainda nunca ter contratado ou solicitado cartão de crédito junto ao banco réu. Após regular processamento do feito, a Magistrada de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial com resolução do mérito, nos seguintes termos: ““1. DETERMINAR a conversão da modalidade do contrato de cartão de crédito para a modalidade de crédito pessoal consignado em folha de pagamento; 2. DETERMINAR a revisão do débito, desde o início do empréstimo e verificada a existência de saldo a favor da autora, deverá, em primeiro lugar, proceder à compensação e posteriormente a repetição de indébito, na forma simples, incidindo juros moratórios pela taxa SELIC, a contar da data da citação e correção monetária pelo IPCA, a contar da data do pagamento, devendo-se observar, contudo, as deduções entre as taxas SELIC e o IPCA, em conformidade com as alterações promovidas no Código Civil pela Lei 14.905/2024; 3. CONDENAR a demandada no pagamento do valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização pelos danos morais, correção monetária pelo IPCA a partir da data do arbitramento, in casu, a data da sentença, nos termos da Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça e juros de mora pela taxa SELIC, a partir da citação, devendo-se observar, contudo, as deduções entre as taxas SELIC e o IPCA, em conformidade com as alterações promovidas no Código Civil pela Lei 14.905/2024. Uma vez que a autora decaiu de parte mínima dos pedidos, CONDENO a demandada ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.” (sic). Contra tal sentença se insurge o apelante, afirmando, em suma, que a parte autora tinha plena ciência da modalidade contratada, estando devidamente descritas as características da operação no instrumento contratual, bem como demonstrada a realização de diversos saques por iniciativa do próprio contratante, motivo pelo qual não há falar em limitação dos juros contratados e a devolução dos valores ou conversão do contrato para a modalidade de empréstimo consignado. Argumenta sobre a legalidade e validade do negócio jurídico da operação de crédito que não se confunde com outra modalidade, bem como a ausência de vício de consentimento, pleiteando, ao final, o provimento do apelo para julgar improcedente a pretensão inicial. Pois bem. Inicialmente, cabe ressaltar que a hipótese é de relação de consumo, regulada pela Lei nº. 8.078/90, norma de ordem pública que tem por objetivo a proteção e a defesa do consumidor. Nesse sentido, o enunciado nº. 297, da Súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Assim, nos termos do artigo 14, parágrafo terceiro, do CDC, a responsabilidade civil dos bancos é objetiva, respondendo, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos seus clientes pelos defeitos dos serviços prestados, só havendo exclusão do nexo causal quando o fornecedor comprovar a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. No caso em comento, restou incontroversa a relação jurídica entre as partes, todavia, a autora alega não ter celebrado, ao menos de forma consciente, o contrato de empréstimo na modalidade de cartão de crédito com o banco réu. Entretanto, verifica-se que a instituição financeira, por meio dos documentos que acompanharam sua peça defensiva, juntou aos autos: termo de adesão as condições gerais de emissão e utilização do cartão de crédito consignado do Banco Daycoval, autorização para desconto em folha, solicitação e autorização de saque via cartão de crédito consignado, solicitação e autorização de saque via cartão de crédito consignado (Ids. 288634370 e 288634374), bem como comprovou que autor se utilizou da modalidade contratada, uma vez que realizou vários saques complementares conforme faz prova as faturas acostadas nos Id. 288634375 - págs. 09, 35 e 59; fato que inviabiliza declarar a nulidade/conversão do contrato. Portanto, restou demonstrado que o consumidor estava ciente de que se tratava de contratação de cartão de crédito, com pagamento do valor mínimo da fatura por meio de consignação em folha de pagamento, justificando-se a continuidade dos descontos. Dessa forma, mostra-se legítima a cobrança dos valores oriundos do cartão de crédito contratado consignado na folha de pagamento, não havendo falar em dano material, repetição do indébito, adequação dos juros e a devolução dos valores, motivo pelo qual a sentença merece reforma. No mesmo sentido se orienta a jurisprudência deste Sodalício, confira: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL C/C PEDIDO DE CONVERSÃO DE CONTRATO, DANOS MATERIAIS E MORAIS – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial”. (N.U 1009949-93.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/06/2025, Publicado no DJE 08/06/2025) DIREITO CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. COMPROVAÇÃO DE CONTRATAÇÃO REGULAR. REALIZAÇÃO DE SAQUES REITERADOS. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que determinou a conversão de contrato de cartão de crédito consignado para a modalidade de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de juros do mercado e restituição dos valores descontados em excesso. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se o contrato celebrado entre as partes configura efetivamente cartão de crédito consignado com Reserva de Margem Consignável, como sustenta o apelante, ou se deve ser convertido em empréstimo consignado tradicional conforme decidido na sentença, considerando a alegação de vício de consentimento pela parte apelada. III. Razões de decidir 3. O banco apelante demonstrou de forma inequívoca a existência da relação contratual mediante robusto dossiê comprobatório, evidenciando que a apelada contratou expressamente cartão de crédito consignado, com clara identificação do produto como "CARTÃO BMG MASTER / BMG CARD" nos instrumentos contratuais firmados. 4. A realização de quatro saques distintos pela apelada ao longo de aproximadamente 10 anos (em 2009, 2014, 2016 e 2019), e não apenas um como mencionado na sentença, evidencia não apenas conhecimento do produto contratado, mas sua efetiva utilização de acordo com as características próprias do cartão de crédito consignado. 5. Não há que se presumir vício de consentimento considerando que a apelada é professora da rede estadual de ensino, possuindo elevado grau de instrução e plena capacidade para compreender a natureza do negócio jurídico celebrado, tendo inclusive utilizado o cartão para múltiplos saques ao longo de uma década. 6. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem se firmado no sentido de reconhecer a validade da contratação de cartão de crédito consignado quando comprovada por meio idôneo, não havendo que se falar em conversão para empréstimo consignado tradicional quando demonstrada a regularidade da contratação. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso provido para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos formulados na inicial. Tese de julgamento: "1. Comprovada a contratação regular de cartão de crédito consignado, com documentação contratual clara e inequívoca, não há que se falar em vício de consentimento. 2. A utilização reiterada do produto mediante múltiplos saques ao longo de anos evidencia conhecimento e concordância com os termos contratuais, impossibilitando a conversão judicial para modalidade diversa de contrato. 3. O nível de instrução do consumidor constitui elemento relevante na análise da compreensão das cláusulas contratuais e da existência de eventual vício de consentimento." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, VIII; Súmula 297/STJ. Jurisprudência relevante citada: TJMT, 1000116-60.2024.8.11.0100, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 15/04/2025; TJMT, 1001161-37.2022.8.11.0014, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025; TJMT, 1016938-78.2022.8.11.0041, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Povoas, Segunda Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025”. (N.U 1008905-39.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC). CONTRATAÇÃO COMPROVADA. SAQUES REALIZADOS. UTILIZAÇÃO DO CARTÃO. INÉRCIA DO CONSUMIDOR POR MAIS DE UMA DÉCADA. VEDAÇÃO AO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. JUROS REMUNERATÓRIOS EM CONFORMIDADE COM A TAXA MÉDIA DE MERCADO. REVISÃO CONTRATUAL INVIÁVEL. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que declarou a inexistência de débito e reconheceu nulidade contratual, condenando-a à restituição de valores descontados e indenização por danos morais, sob a alegação de contratação não reconhecida de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC). II. Questão em discussão 2. As questões em debate consistem em: (i) verificar se houve contratação válida de cartão de crédito consignado; (ii) avaliar a legalidade dos descontos realizados; e (iii) analisar eventual abusividade das taxas de juros aplicadas ao contrato. III. Razões de decidir 3. A contratação foi comprovada por diversos meios documentais, incluindo contrato assinado, autorizações de saque, comprovantes de TED em favor do consumidor e faturas do cartão de crédito, além de imagem (selfie) do contratante no ato do negócio. 4. A utilização contínua do cartão e a ausência de qualquer impugnação por mais de 12 anos demonstram a anuência tácita do consumidor, afastando a alegação de vício de consentimento. 5. Aplica-se o princípio da vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), vedando-se que o consumidor se beneficie do contrato por longo período e, somente após anos, alegue sua nulidade. 6. Os juros remuneratórios contratados (4,70% a.m.), embora superiores à média, não extrapolam patamar que configure desvantagem exagerada ou abuso, sendo compatíveis com a jurisprudência do STJ e as taxas de mercado divulgadas pelo BACEN. 7. Inexistindo ilicitude ou vício contratual, não há que se falar em restituição de valores nem em danos morais. Impõe-se a reforma da sentença. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos iniciais, com inversão dos ônus sucumbenciais. Tese de julgamento: "1. A contratação do cartão de crédito consignado (RMC) é válida quando demonstrada por documentos e comprovada sua utilização pelo consumidor ao longo dos anos. 2. A ausência de impugnação da avença por mais de uma década atrai a incidência do princípio da vedação ao comportamento contraditório, afastando a tese de vício de consentimento. 3. Os juros remuneratórios somente são considerados abusivos quando superiores, de forma significativa, à taxa média de mercado, o que não se verifica no caso concreto." (N.U 1034480-75.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/06/2025, Publicado no DJE 17/06/2025) Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso, para reformar a sentença singular e julgar improcedentes os pedidos da inicial, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, condenando a parte autora/recorrida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com arrimo no art. 85, §2º, do mesmo Códex, cuja exigibilidade deve ser suspensa pelo prazo legal, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Processo nº 1012167-37.2023.8.11.0004

ID: 311694325

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1012167-37.2023.8.11.0004

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MARIA DAS GRACAS PEDROSO DA SILVA

Acórdão

Advogados:

GUILHERME CORREIA EVARISTO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1012167-37.2023.8.11.0004 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Contratos Bancários, Emprés… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1012167-37.2023.8.11.0004 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Contratos Bancários, Empréstimo consignado] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [MARIA DAS GRACAS PEDROSO DA SILVA - CPF: 460.214.341-53 (APELADO), GUILHERME CORREIA EVARISTO - CPF: 016.586.011-14 (ADVOGADO), BANCO DAYCOVAL S/A - CNPJ: 62.232.889/0001-90 (APELANTE), DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA - CPF: 568.962.041-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO – PRELIMINARES DE DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DAS FATURAS – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de vários saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1012167-37.2023.8.11.0004 APELANTE: BANCO DAYCOVAL S/A APELADA: MARIA DAS GRACAS PEDROSO DA SILVA RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo BANCO DAYCOVAL S/A, contra sentença proferida pela MMª. Juíza da Segunda Vara Cível da Comarca de Barra do Garças/MT, Dra. Augusta Prutchansky Martins Gomes, lançada nos autos da ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais c/c repetição de indébito, ajuizada por MARIA DAS GRACAS PEDROSO DA SILVA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para: “1. DETERMINAR a conversão da modalidade do contrato de cartão de crédito para a modalidade de crédito pessoal consignado em folha de pagamento; 2. DETERMINAR a revisão do débito, desde o início do empréstimo e verificada a existência de saldo a favor da autora, deverá, em primeiro lugar, proceder à compensação e posteriormente a repetição de indébito, na forma simples, incidindo juros moratórios pela taxa SELIC, a contar da data da citação e correção monetária pelo IPCA, a contar da data do pagamento, devendo-se observar, contudo, as deduções entre as taxas SELIC e o IPCA, em conformidade com as alterações promovidas no Código Civil pela Lei 14.905/2024; 3. CONDENAR a demandada no pagamento do valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização pelos danos morais, correção monetária pelo IPCA a partir da data do arbitramento, in casu, a data da sentença, nos termos da Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça e juros de mora pela taxa SELIC, a partir da citação, devendo-se observar, contudo, as deduções entre as taxas SELIC e o IPCA, em conformidade com as alterações promovidas no Código Civil pela Lei 14.905/2024. Uma vez que a autora decaiu de parte mínima dos pedidos, CONDENO a demandada ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.” (sic). Inconformado, o banco apelante suscita, que a contratação do cartão de crédito consignado foi realizada de forma consciente pela parte autora e os saques foram creditados em conta, sendo a utilização do limite do cartão inequívoca. Aduz que a recorrida realizou pagamentos das faturas para além do mínimo, inclusive em datas precisas, de modo que não há configuração de danos morais, pois inexistente qualquer falha na prestação de informação. Assevera que é incabível a repetição de valores em dobro, conforme o entendimento do EREsp 1.413.542/RS, pois o contrato está em conformidade com o IRDR 0005217-75.2019.8.04.0000, bem como não houve induzimento em erro, tampouco omissão de informações essenciais, pois o contrato é claro e transparente. Denota que o consumidor se beneficiou do serviço por mais de nove anos, sendo incabível a declaração de nulidade do contrato, devendo a sentença observar a prescrição quinquenal e a compensação com os valores creditados em conta da autora. Consigna que restou caracterizada a litigância de má-fé da parte autora, ao alterar deliberadamente a realidade dos fatos e que o ajuizamento da demanda constitui abuso do direito de ação, devendo ser aplicada multa punitiva nos moldes do art. 81 do CPC. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos iniciais, com condenação da autora ao pagamento das verbas sucumbenciais e multa por litigância de má-fé; o reconhecimento da validade e regularidade do contrato de cartão de crédito consignado, com o afastamento de qualquer nulidade ou vício de consentimento, a observância da prescrição quinquenal e a compensação com os valores efetivamente creditados na conta da autora; o afastamento da condenação por danos morais; subsidiariamente, a redução do valor arbitrado a título de indenização moral para R$ 1.000,00. Contrarrazões ofertadas no Id 288634424, postulando pelo desprovimento do recurso. O preparo foi recolhido (Id 290404888). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Verifica-se que o recurso está preparado, é tempestivo e adequado, de modo que CONHEÇO o apelo, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Antes de adentrar ao mérito, pertinente enfrentar as preliminares suscitadas pelo apelante. No caso, não há falar em prescrição, ainda que parcial, pois, apesar da contratação realizada, as prestações continuam a ser debitadas diretamente da folha de pagamento do apelante até os dias atuais, de modo que rejeito a preliminar suscitada. Nesse sentido é o entendimento desta C. Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO REJEITADA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A PARTE AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que a parte autora se utiliza do cartão para realização de saques, inclusive efetuando pagamento parcial da fatura, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados”. (N.U 1032612-28.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/11/2024, Publicado no DJE 29/11/2024) Quanto à preliminar de decadência, da mesma forma resta afastada, posto que, tratando-se de obrigação de trato sucessivo, há renovação automática do pacto ao longo do tempo por meio dos descontos mensais, o que afasta a incidência da decadência do direito de discutir o contrato bancário. Dessa forma, merece ser afastada a referida preliminar. Quanto ao cerne, cinge-se dos autos que MARIA DAS GRACAS PEDROSO DA SILVA ajuizou a presente ação em desfavor do BANCO DAYCOVAL S/A alegando, em suma, realizou Empréstimo Consignado junto à parte Requerida, sendo informado que o pagamento seria realizado por meio de descontos mensais diretamente de seu benefício previdenciário, no valor de R$ 81,29 (Oitenta e um reais e vinte e nove centavos) em 24 meses, a partir de 11/2020. Diz que tomou conhecimento recentemente que o valor descontado trata-se de mútuo consignado em folha de pagamento na modalidade de cartão de crédito, no importe mensal de R$ 81,29 (Oitenta e um reais e vinte e nove centavos) o qual continua a ser descontado até os dias contemporâneos, sem previsão de término. Alega ainda nunca ter contratado ou solicitado cartão de crédito junto ao banco réu. Após regular processamento do feito, a Magistrada de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial com resolução do mérito, nos seguintes termos: ““1. DETERMINAR a conversão da modalidade do contrato de cartão de crédito para a modalidade de crédito pessoal consignado em folha de pagamento; 2. DETERMINAR a revisão do débito, desde o início do empréstimo e verificada a existência de saldo a favor da autora, deverá, em primeiro lugar, proceder à compensação e posteriormente a repetição de indébito, na forma simples, incidindo juros moratórios pela taxa SELIC, a contar da data da citação e correção monetária pelo IPCA, a contar da data do pagamento, devendo-se observar, contudo, as deduções entre as taxas SELIC e o IPCA, em conformidade com as alterações promovidas no Código Civil pela Lei 14.905/2024; 3. CONDENAR a demandada no pagamento do valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização pelos danos morais, correção monetária pelo IPCA a partir da data do arbitramento, in casu, a data da sentença, nos termos da Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça e juros de mora pela taxa SELIC, a partir da citação, devendo-se observar, contudo, as deduções entre as taxas SELIC e o IPCA, em conformidade com as alterações promovidas no Código Civil pela Lei 14.905/2024. Uma vez que a autora decaiu de parte mínima dos pedidos, CONDENO a demandada ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.” (sic). Contra tal sentença se insurge o apelante, afirmando, em suma, que a parte autora tinha plena ciência da modalidade contratada, estando devidamente descritas as características da operação no instrumento contratual, bem como demonstrada a realização de diversos saques por iniciativa do próprio contratante, motivo pelo qual não há falar em limitação dos juros contratados e a devolução dos valores ou conversão do contrato para a modalidade de empréstimo consignado. Argumenta sobre a legalidade e validade do negócio jurídico da operação de crédito que não se confunde com outra modalidade, bem como a ausência de vício de consentimento, pleiteando, ao final, o provimento do apelo para julgar improcedente a pretensão inicial. Pois bem. Inicialmente, cabe ressaltar que a hipótese é de relação de consumo, regulada pela Lei nº. 8.078/90, norma de ordem pública que tem por objetivo a proteção e a defesa do consumidor. Nesse sentido, o enunciado nº. 297, da Súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Assim, nos termos do artigo 14, parágrafo terceiro, do CDC, a responsabilidade civil dos bancos é objetiva, respondendo, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos seus clientes pelos defeitos dos serviços prestados, só havendo exclusão do nexo causal quando o fornecedor comprovar a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. No caso em comento, restou incontroversa a relação jurídica entre as partes, todavia, a autora alega não ter celebrado, ao menos de forma consciente, o contrato de empréstimo na modalidade de cartão de crédito com o banco réu. Entretanto, verifica-se que a instituição financeira, por meio dos documentos que acompanharam sua peça defensiva, juntou aos autos: termo de adesão as condições gerais de emissão e utilização do cartão de crédito consignado do Banco Daycoval, autorização para desconto em folha, solicitação e autorização de saque via cartão de crédito consignado, solicitação e autorização de saque via cartão de crédito consignado (Ids. 288634370 e 288634374), bem como comprovou que autor se utilizou da modalidade contratada, uma vez que realizou vários saques complementares conforme faz prova as faturas acostadas nos Id. 288634375 - págs. 09, 35 e 59; fato que inviabiliza declarar a nulidade/conversão do contrato. Portanto, restou demonstrado que o consumidor estava ciente de que se tratava de contratação de cartão de crédito, com pagamento do valor mínimo da fatura por meio de consignação em folha de pagamento, justificando-se a continuidade dos descontos. Dessa forma, mostra-se legítima a cobrança dos valores oriundos do cartão de crédito contratado consignado na folha de pagamento, não havendo falar em dano material, repetição do indébito, adequação dos juros e a devolução dos valores, motivo pelo qual a sentença merece reforma. No mesmo sentido se orienta a jurisprudência deste Sodalício, confira: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL C/C PEDIDO DE CONVERSÃO DE CONTRATO, DANOS MATERIAIS E MORAIS – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial”. (N.U 1009949-93.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/06/2025, Publicado no DJE 08/06/2025) DIREITO CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. COMPROVAÇÃO DE CONTRATAÇÃO REGULAR. REALIZAÇÃO DE SAQUES REITERADOS. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que determinou a conversão de contrato de cartão de crédito consignado para a modalidade de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de juros do mercado e restituição dos valores descontados em excesso. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se o contrato celebrado entre as partes configura efetivamente cartão de crédito consignado com Reserva de Margem Consignável, como sustenta o apelante, ou se deve ser convertido em empréstimo consignado tradicional conforme decidido na sentença, considerando a alegação de vício de consentimento pela parte apelada. III. Razões de decidir 3. O banco apelante demonstrou de forma inequívoca a existência da relação contratual mediante robusto dossiê comprobatório, evidenciando que a apelada contratou expressamente cartão de crédito consignado, com clara identificação do produto como "CARTÃO BMG MASTER / BMG CARD" nos instrumentos contratuais firmados. 4. A realização de quatro saques distintos pela apelada ao longo de aproximadamente 10 anos (em 2009, 2014, 2016 e 2019), e não apenas um como mencionado na sentença, evidencia não apenas conhecimento do produto contratado, mas sua efetiva utilização de acordo com as características próprias do cartão de crédito consignado. 5. Não há que se presumir vício de consentimento considerando que a apelada é professora da rede estadual de ensino, possuindo elevado grau de instrução e plena capacidade para compreender a natureza do negócio jurídico celebrado, tendo inclusive utilizado o cartão para múltiplos saques ao longo de uma década. 6. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem se firmado no sentido de reconhecer a validade da contratação de cartão de crédito consignado quando comprovada por meio idôneo, não havendo que se falar em conversão para empréstimo consignado tradicional quando demonstrada a regularidade da contratação. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso provido para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos formulados na inicial. Tese de julgamento: "1. Comprovada a contratação regular de cartão de crédito consignado, com documentação contratual clara e inequívoca, não há que se falar em vício de consentimento. 2. A utilização reiterada do produto mediante múltiplos saques ao longo de anos evidencia conhecimento e concordância com os termos contratuais, impossibilitando a conversão judicial para modalidade diversa de contrato. 3. O nível de instrução do consumidor constitui elemento relevante na análise da compreensão das cláusulas contratuais e da existência de eventual vício de consentimento." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, VIII; Súmula 297/STJ. Jurisprudência relevante citada: TJMT, 1000116-60.2024.8.11.0100, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 15/04/2025; TJMT, 1001161-37.2022.8.11.0014, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025; TJMT, 1016938-78.2022.8.11.0041, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Povoas, Segunda Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025”. (N.U 1008905-39.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC). CONTRATAÇÃO COMPROVADA. SAQUES REALIZADOS. UTILIZAÇÃO DO CARTÃO. INÉRCIA DO CONSUMIDOR POR MAIS DE UMA DÉCADA. VEDAÇÃO AO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. JUROS REMUNERATÓRIOS EM CONFORMIDADE COM A TAXA MÉDIA DE MERCADO. REVISÃO CONTRATUAL INVIÁVEL. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que declarou a inexistência de débito e reconheceu nulidade contratual, condenando-a à restituição de valores descontados e indenização por danos morais, sob a alegação de contratação não reconhecida de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC). II. Questão em discussão 2. As questões em debate consistem em: (i) verificar se houve contratação válida de cartão de crédito consignado; (ii) avaliar a legalidade dos descontos realizados; e (iii) analisar eventual abusividade das taxas de juros aplicadas ao contrato. III. Razões de decidir 3. A contratação foi comprovada por diversos meios documentais, incluindo contrato assinado, autorizações de saque, comprovantes de TED em favor do consumidor e faturas do cartão de crédito, além de imagem (selfie) do contratante no ato do negócio. 4. A utilização contínua do cartão e a ausência de qualquer impugnação por mais de 12 anos demonstram a anuência tácita do consumidor, afastando a alegação de vício de consentimento. 5. Aplica-se o princípio da vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), vedando-se que o consumidor se beneficie do contrato por longo período e, somente após anos, alegue sua nulidade. 6. Os juros remuneratórios contratados (4,70% a.m.), embora superiores à média, não extrapolam patamar que configure desvantagem exagerada ou abuso, sendo compatíveis com a jurisprudência do STJ e as taxas de mercado divulgadas pelo BACEN. 7. Inexistindo ilicitude ou vício contratual, não há que se falar em restituição de valores nem em danos morais. Impõe-se a reforma da sentença. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos iniciais, com inversão dos ônus sucumbenciais. Tese de julgamento: "1. A contratação do cartão de crédito consignado (RMC) é válida quando demonstrada por documentos e comprovada sua utilização pelo consumidor ao longo dos anos. 2. A ausência de impugnação da avença por mais de uma década atrai a incidência do princípio da vedação ao comportamento contraditório, afastando a tese de vício de consentimento. 3. Os juros remuneratórios somente são considerados abusivos quando superiores, de forma significativa, à taxa média de mercado, o que não se verifica no caso concreto." (N.U 1034480-75.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/06/2025, Publicado no DJE 17/06/2025) Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso, para reformar a sentença singular e julgar improcedentes os pedidos da inicial, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, condenando a parte autora/recorrida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com arrimo no art. 85, §2º, do mesmo Códex, cuja exigibilidade deve ser suspensa pelo prazo legal, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Processo nº 1000154-86.2022.8.11.0021

ID: 311694580

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000154-86.2022.8.11.0021

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

BANCO BMG SA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

BREINER RICARDO DINIZ RESENDE MACHADO

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

ANDRE RENNO LIMA GUIMARAES DE ANDRADE

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000154-86.2022.8.11.0021 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Desconto em folha de pagamento, Indenização po… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000154-86.2022.8.11.0021 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Desconto em folha de pagamento, Indenização por Dano Material, Indenização por Dano Moral, Bancários, Liminar] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [NILSON DOS SANTOS PENTEADO - CPF: 052.348.046-66 (APELADO), MACIRLENE PEREIRA DOS SANTOS - CPF: 864.725.691-34 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), BREINER RICARDO DINIZ RESENDE MACHADO - CPF: 037.193.746-96 (ADVOGADO), ANDRE RENNO LIMA GUIMARAES DE ANDRADE - CPF: 002.000.166-52 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) E INEXISTÊNCIA DE DÉBITO – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA DIVERSOS SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1000154-86.2022.8.11.0021 APELANTE: BANCO BMG S/A APELADO: NILSON DOS SANTOS PENTEADO RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo BANCO BMG S/A, contra sentença proferida pelo MM. Juízo da Segunda Vara Cível da Comarca de Água Boa/MT, Dr. Luis Otávio Tonello dos Santos, lançada nos autos da ação declaratória de Nulidade de Contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC) e Inexistência de Débito, cumulada com Pedido de Tutela de Urgência Antecipada, Restituição de Valores em Dobro e Indenização por Dano Moral, ajuizada por NILSON DOS SANTOS PENTEADO, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para: “DETERMINAR a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em contrato de empréstimo consignado, com a aplicação das taxas de juros e das condições de pagamento praticadas nessa modalidade de crédito, bem como CONDENAR o réu a proceder a devolução dos valores excedentes cobrados anteriormente da autora, correspondentes à diferença entre as taxas efetivamente aplicadas na modalidade de cartão de crédito consignado e as taxas que deveriam ter sido aplicadas caso o contrato fosse desde o início um empréstimo consignado tradicional, devendo este montante ser apurado em fase de liquidação de sentença, mediante a apresentação de cálculos detalhados e documentos comprobatórios por ambas as partes, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa. CONDENO, ainda, em razão da sua sucumbência, o requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, conforme disposição do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil.” (sic). Inconformado, o banco apelante suscita preliminarmente a ocorrência da de prescrição quinquenal com base no art. 27 do CDC, bem como da decadência, com fundamento no art. 178 do Código Civil, requerendo, por conseguinte, a extinção do processo com resolução de mérito, subsidiariamente, pugna pela prescrição das parcelas anteriores a 23/01/2019. No mérito propriamente dito, defende a validade da contratação do cartão de crédito consignado, argumentando que o autor possuía pleno conhecimento das condições pactuadas, estando devidamente descritas as características da operação no instrumento contratual, bem como demonstrada a realização de diversos saques por iniciativa do próprio contratante entre 2013 e 2018, mediante TEDs comprovadas nos autos. Ressalta que a parte autora tinha pleno conhecimento da modalidade contratada e da reserva de margem consignável, nos termos da cláusula 1.3.1 do contrato firmado, afirma ainda, a impossibilidade de conversão do contrato, por ausência dos requisitos legais do art. 170 do Código Civil. Alega que o contrato celebrado é válido, celebrado por agente capaz, com objeto lícito e forma prescrita em lei. Aduz a legalidade da cobrança dos juros pactuados, sendo inaplicáveis as normas da Lei de Usura às instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, conforme súmulas 596 do STF e 382 do STJ. Pontua que a revisão contratual não se aplica ao caso, por ausência de onerosidade excessiva, vício de consentimento ou violação à boa-fé objetiva, por fim, afirma que os descontos foram realizados nos termos do contrato e da legislação vigente, sem abusividade ou desrespeito ao CDC. Ao final, pugna pelo provimento do apelo para julgar improcedente a pretensão inicial. (Id 290271417). Contrarrazões ofertadas no Id 290271421, postulando pelo desprovimento do recurso. O preparo foi recolhido (Id 291824885). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Verifica-se que o recurso está preparado, é tempestivo e adequado, de modo que CONHEÇO o apelo, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Antes de adentrar ao mérito, pertinente enfrentar as preliminares suscitadas pelo apelante. No caso, não há falar em prescrição, ainda que parcial, pois, apesar da contratação realizada ainda em 2013, as prestações continuam a ser debitadas diretamente da folha de pagamento do apelante até os dias atuais, de modo que rejeito a preliminar suscitada. Nesse sentido é o entendimento desta C. Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO REJEITADA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A PARTE AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que a parte autora se utiliza do cartão para realização de saques, inclusive efetuando pagamento parcial da fatura, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados”. (N.U 1032612-28.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/11/2024, Publicado no DJE 29/11/2024) Quanto à preliminar de decadência, da mesma forma resta afastada, posto que, tratando-se de obrigação de trato sucessivo, há renovação automática do pacto ao longo do tempo por meio dos descontos mensais, o que afasta a incidência da decadência do direito de discutir o contrato bancário. Dessa forma, merece ser afastada a referida preliminar. Quanto ao cerne, cinge-se, cinge-se dos autos que NILSON DOS SANTOS PENTEADO ajuizou a presente ação em desfavor do BANCO BMG S/A alegando, em suma, alegando, em suma, que é servidor público e no mês de janeiro de 2013, foi procurado por funcionários do banco requerido e informado que, de acordo com a margem disponível, lhe ofertariam empréstimo consignado e que o pagamento deste valor deveria ser realizado de forma parcelada com descontos direto na folha de pagamento cujos pagamentos resultariam no adimplemento do empréstimo contraído. Diz que em fevereiro de 2013, teve creditado em sua conta corrente do Banco do Brasil via TED- valores que somando perfaz um total de R$ 7.247,73 (sete mil e duzentos e quarenta e sete reais e setenta e três centavos), consoante informação da BANCO BMG. Narra que percebeu que os descontos mensais provenientes do empréstimo não encerravam nunca e estavam aumentando, comprometendo demais a sua renda, e pior, estava sendo descontado diretamente de sua remuneração sob a rubrica cartão crédito. Diante da situação entrou em contato com o Banco Requerido para saber por que as parcelas não haviam acabado e estavam sendo descontadas sob a rubrica de cartão de crédito. Alega ainda nunca ter contratado ou solicitado cartão de crédito junto ao banco réu. Após regular processamento do feito, o Magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial com resolução do mérito, para: “DETERMINAR a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em contrato de empréstimo consignado, com a aplicação das taxas de juros e das condições de pagamento praticadas nessa modalidade de crédito, bem como CONDENAR o réu a proceder a devolução dos valores excedentes cobrados anteriormente da autora, correspondentes à diferença entre as taxas efetivamente aplicadas na modalidade de cartão de crédito consignado e as taxas que deveriam ter sido aplicadas caso o contrato fosse desde o início um empréstimo consignado tradicional, devendo este montante ser apurado em fase de liquidação de sentença, mediante a apresentação de cálculos detalhados e documentos comprobatórios por ambas as partes, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa. CONDENO, ainda, em razão da sua sucumbência, o requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, conforme disposição do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil” (sic). Contra tal sentença se insurge o apelante, afirmando, em suma, que o autor possuía pleno conhecimento das condições pactuadas, estando devidamente descritas as características da operação no instrumento contratual, bem como demonstrada a realização de diversos saques por iniciativa do próprio contratante entre 2013 e 2018, mediante TEDs. Argumenta sobre a legalidade e validade do negócio jurídico da operação de crédito que não se confunde com outra modalidade, bem como a ausência de vício de consentimento, pleiteando, ao final, o provimento do apelo para julgar improcedente a pretensão inicial. Pois bem. Inicialmente, cabe ressaltar que a hipótese é de relação de consumo, regulada pela Lei nº. 8.078/90, norma de ordem pública que tem por objetivo a proteção e a defesa do consumidor. Nesse sentido, o enunciado nº. 297, da Súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Assim, nos termos do artigo 14, parágrafo terceiro, do CDC, a responsabilidade civil dos bancos é objetiva, respondendo, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos seus clientes pelos defeitos dos serviços prestados, só havendo exclusão do nexo causal quando o fornecedor comprovar a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. No caso em comento, restou incontroversa a relação jurídica entre as partes, todavia, o autor alega não ter celebrado, ao menos de forma consciente, o contrato de empréstimo na modalidade de cartão de crédito com o banco réu. Entretanto, verifica-se que a instituição financeira, por meio dos documentos que acompanharam sua peça defensiva, juntou aos autos: termo de adesão cartão de crédito BMG Card - autorização para desconto em folha de pagamento, autorização de saque no valor de R$ 932,00, autorização de saque no valor de R$ 144,00, autorização de saque no valor de R$ 1.721,00, autorização de saque no valor de R$ 373,00, proposta de contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado emitido pelo BMG, cédula de crédito bancário (CCB) contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado emitido pelo BMG (Ids. 290271385, 290271386, 290271387, 290271388, 290271389, 290271390), bem como comprovou que autor se utilizou da modalidade contratada, uma vez que realizou saque autorizado e saques complementares conforme faz prova as faturas acostadas nos Id. 290271391 - págs. 01, 02, 07, 14, 20, 51; fato que inviabiliza declarar a nulidade/conversão do contrato. Portanto, restou demonstrado que o consumidor estava ciente de que se tratava de contratação de cartão de crédito, com pagamento do valor mínimo da fatura por meio de consignação em folha de pagamento, justificando-se a continuidade dos descontos. Dessa forma, mostra-se legítima a cobrança dos valores oriundos do cartão de crédito contratado consignado na folha de pagamento, não havendo falar em dano material, repetição do indébito, adequação dos juros e a devolução dos valores, motivo pelo qual a sentença merece reforma. No mesmo sentido se orienta a jurisprudência deste Sodalício, confira: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL C/C PEDIDO DE CONVERSÃO DE CONTRATO, DANOS MATERIAIS E MORAIS – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial”. (N.U 1009949-93.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/06/2025, Publicado no DJE 08/06/2025) DIREITO CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. COMPROVAÇÃO DE CONTRATAÇÃO REGULAR. REALIZAÇÃO DE SAQUES REITERADOS. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que determinou a conversão de contrato de cartão de crédito consignado para a modalidade de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de juros do mercado e restituição dos valores descontados em excesso. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se o contrato celebrado entre as partes configura efetivamente cartão de crédito consignado com Reserva de Margem Consignável, como sustenta o apelante, ou se deve ser convertido em empréstimo consignado tradicional conforme decidido na sentença, considerando a alegação de vício de consentimento pela parte apelada. III. Razões de decidir 3. O banco apelante demonstrou de forma inequívoca a existência da relação contratual mediante robusto dossiê comprobatório, evidenciando que a apelada contratou expressamente cartão de crédito consignado, com clara identificação do produto como "CARTÃO BMG MASTER / BMG CARD" nos instrumentos contratuais firmados. 4. A realização de quatro saques distintos pela apelada ao longo de aproximadamente 10 anos (em 2009, 2014, 2016 e 2019), e não apenas um como mencionado na sentença, evidencia não apenas conhecimento do produto contratado, mas sua efetiva utilização de acordo com as características próprias do cartão de crédito consignado. 5. Não há que se presumir vício de consentimento considerando que a apelada é professora da rede estadual de ensino, possuindo elevado grau de instrução e plena capacidade para compreender a natureza do negócio jurídico celebrado, tendo inclusive utilizado o cartão para múltiplos saques ao longo de uma década. 6. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem se firmado no sentido de reconhecer a validade da contratação de cartão de crédito consignado quando comprovada por meio idôneo, não havendo que se falar em conversão para empréstimo consignado tradicional quando demonstrada a regularidade da contratação. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso provido para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos formulados na inicial. Tese de julgamento: "1. Comprovada a contratação regular de cartão de crédito consignado, com documentação contratual clara e inequívoca, não há que se falar em vício de consentimento. 2. A utilização reiterada do produto mediante múltiplos saques ao longo de anos evidencia conhecimento e concordância com os termos contratuais, impossibilitando a conversão judicial para modalidade diversa de contrato. 3. O nível de instrução do consumidor constitui elemento relevante na análise da compreensão das cláusulas contratuais e da existência de eventual vício de consentimento." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, VIII; Súmula 297/STJ. Jurisprudência relevante citada: TJMT, 1000116-60.2024.8.11.0100, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 15/04/2025; TJMT, 1001161-37.2022.8.11.0014, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025; TJMT, 1016938-78.2022.8.11.0041, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Povoas, Segunda Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025”. (N.U 1008905-39.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC). CONTRATAÇÃO COMPROVADA. SAQUES REALIZADOS. UTILIZAÇÃO DO CARTÃO. INÉRCIA DO CONSUMIDOR POR MAIS DE UMA DÉCADA. VEDAÇÃO AO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. JUROS REMUNERATÓRIOS EM CONFORMIDADE COM A TAXA MÉDIA DE MERCADO. REVISÃO CONTRATUAL INVIÁVEL. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que declarou a inexistência de débito e reconheceu nulidade contratual, condenando-a à restituição de valores descontados e indenização por danos morais, sob a alegação de contratação não reconhecida de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC). II. Questão em discussão 2. As questões em debate consistem em: (i) verificar se houve contratação válida de cartão de crédito consignado; (ii) avaliar a legalidade dos descontos realizados; e (iii) analisar eventual abusividade das taxas de juros aplicadas ao contrato. III. Razões de decidir 3. A contratação foi comprovada por diversos meios documentais, incluindo contrato assinado, autorizações de saque, comprovantes de TED em favor do consumidor e faturas do cartão de crédito, além de imagem (selfie) do contratante no ato do negócio. 4. A utilização contínua do cartão e a ausência de qualquer impugnação por mais de 12 anos demonstram a anuência tácita do consumidor, afastando a alegação de vício de consentimento. 5. Aplica-se o princípio da vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), vedando-se que o consumidor se beneficie do contrato por longo período e, somente após anos, alegue sua nulidade. 6. Os juros remuneratórios contratados (4,70% a.m.), embora superiores à média, não extrapolam patamar que configure desvantagem exagerada ou abuso, sendo compatíveis com a jurisprudência do STJ e as taxas de mercado divulgadas pelo BACEN. 7. Inexistindo ilicitude ou vício contratual, não há que se falar em restituição de valores nem em danos morais. Impõe-se a reforma da sentença. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos iniciais, com inversão dos ônus sucumbenciais. Tese de julgamento: "1. A contratação do cartão de crédito consignado (RMC) é válida quando demonstrada por documentos e comprovada sua utilização pelo consumidor ao longo dos anos. 2. A ausência de impugnação da avença por mais de uma década atrai a incidência do princípio da vedação ao comportamento contraditório, afastando a tese de vício de consentimento. 3. Os juros remuneratórios somente são considerados abusivos quando superiores, de forma significativa, à taxa média de mercado, o que não se verifica no caso concreto." (N.U 1034480-75.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/06/2025, Publicado no DJE 17/06/2025) Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso, para reformar a sentença singular e julgar improcedentes os pedidos da inicial, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, condenando a parte autora/recorrida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com arrimo no art. 85, §2º, do mesmo Códex, cuja exigibilidade deve ser suspensa pelo prazo legal, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Processo nº 1000154-86.2022.8.11.0021

ID: 311694582

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000154-86.2022.8.11.0021

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

NILSON DOS SANTOS PENTEADO

Acórdão

Advogados:

MACIRLENE PEREIRA DOS SANTOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000154-86.2022.8.11.0021 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Desconto em folha de pagamento, Indenização po… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000154-86.2022.8.11.0021 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Desconto em folha de pagamento, Indenização por Dano Material, Indenização por Dano Moral, Bancários, Liminar] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [NILSON DOS SANTOS PENTEADO - CPF: 052.348.046-66 (APELADO), MACIRLENE PEREIRA DOS SANTOS - CPF: 864.725.691-34 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), BREINER RICARDO DINIZ RESENDE MACHADO - CPF: 037.193.746-96 (ADVOGADO), ANDRE RENNO LIMA GUIMARAES DE ANDRADE - CPF: 002.000.166-52 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) E INEXISTÊNCIA DE DÉBITO – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA DIVERSOS SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1000154-86.2022.8.11.0021 APELANTE: BANCO BMG S/A APELADO: NILSON DOS SANTOS PENTEADO RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo BANCO BMG S/A, contra sentença proferida pelo MM. Juízo da Segunda Vara Cível da Comarca de Água Boa/MT, Dr. Luis Otávio Tonello dos Santos, lançada nos autos da ação declaratória de Nulidade de Contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC) e Inexistência de Débito, cumulada com Pedido de Tutela de Urgência Antecipada, Restituição de Valores em Dobro e Indenização por Dano Moral, ajuizada por NILSON DOS SANTOS PENTEADO, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para: “DETERMINAR a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em contrato de empréstimo consignado, com a aplicação das taxas de juros e das condições de pagamento praticadas nessa modalidade de crédito, bem como CONDENAR o réu a proceder a devolução dos valores excedentes cobrados anteriormente da autora, correspondentes à diferença entre as taxas efetivamente aplicadas na modalidade de cartão de crédito consignado e as taxas que deveriam ter sido aplicadas caso o contrato fosse desde o início um empréstimo consignado tradicional, devendo este montante ser apurado em fase de liquidação de sentença, mediante a apresentação de cálculos detalhados e documentos comprobatórios por ambas as partes, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa. CONDENO, ainda, em razão da sua sucumbência, o requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, conforme disposição do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil.” (sic). Inconformado, o banco apelante suscita preliminarmente a ocorrência da de prescrição quinquenal com base no art. 27 do CDC, bem como da decadência, com fundamento no art. 178 do Código Civil, requerendo, por conseguinte, a extinção do processo com resolução de mérito, subsidiariamente, pugna pela prescrição das parcelas anteriores a 23/01/2019. No mérito propriamente dito, defende a validade da contratação do cartão de crédito consignado, argumentando que o autor possuía pleno conhecimento das condições pactuadas, estando devidamente descritas as características da operação no instrumento contratual, bem como demonstrada a realização de diversos saques por iniciativa do próprio contratante entre 2013 e 2018, mediante TEDs comprovadas nos autos. Ressalta que a parte autora tinha pleno conhecimento da modalidade contratada e da reserva de margem consignável, nos termos da cláusula 1.3.1 do contrato firmado, afirma ainda, a impossibilidade de conversão do contrato, por ausência dos requisitos legais do art. 170 do Código Civil. Alega que o contrato celebrado é válido, celebrado por agente capaz, com objeto lícito e forma prescrita em lei. Aduz a legalidade da cobrança dos juros pactuados, sendo inaplicáveis as normas da Lei de Usura às instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, conforme súmulas 596 do STF e 382 do STJ. Pontua que a revisão contratual não se aplica ao caso, por ausência de onerosidade excessiva, vício de consentimento ou violação à boa-fé objetiva, por fim, afirma que os descontos foram realizados nos termos do contrato e da legislação vigente, sem abusividade ou desrespeito ao CDC. Ao final, pugna pelo provimento do apelo para julgar improcedente a pretensão inicial. (Id 290271417). Contrarrazões ofertadas no Id 290271421, postulando pelo desprovimento do recurso. O preparo foi recolhido (Id 291824885). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Verifica-se que o recurso está preparado, é tempestivo e adequado, de modo que CONHEÇO o apelo, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Antes de adentrar ao mérito, pertinente enfrentar as preliminares suscitadas pelo apelante. No caso, não há falar em prescrição, ainda que parcial, pois, apesar da contratação realizada ainda em 2013, as prestações continuam a ser debitadas diretamente da folha de pagamento do apelante até os dias atuais, de modo que rejeito a preliminar suscitada. Nesse sentido é o entendimento desta C. Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO REJEITADA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A PARTE AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que a parte autora se utiliza do cartão para realização de saques, inclusive efetuando pagamento parcial da fatura, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados”. (N.U 1032612-28.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/11/2024, Publicado no DJE 29/11/2024) Quanto à preliminar de decadência, da mesma forma resta afastada, posto que, tratando-se de obrigação de trato sucessivo, há renovação automática do pacto ao longo do tempo por meio dos descontos mensais, o que afasta a incidência da decadência do direito de discutir o contrato bancário. Dessa forma, merece ser afastada a referida preliminar. Quanto ao cerne, cinge-se, cinge-se dos autos que NILSON DOS SANTOS PENTEADO ajuizou a presente ação em desfavor do BANCO BMG S/A alegando, em suma, alegando, em suma, que é servidor público e no mês de janeiro de 2013, foi procurado por funcionários do banco requerido e informado que, de acordo com a margem disponível, lhe ofertariam empréstimo consignado e que o pagamento deste valor deveria ser realizado de forma parcelada com descontos direto na folha de pagamento cujos pagamentos resultariam no adimplemento do empréstimo contraído. Diz que em fevereiro de 2013, teve creditado em sua conta corrente do Banco do Brasil via TED- valores que somando perfaz um total de R$ 7.247,73 (sete mil e duzentos e quarenta e sete reais e setenta e três centavos), consoante informação da BANCO BMG. Narra que percebeu que os descontos mensais provenientes do empréstimo não encerravam nunca e estavam aumentando, comprometendo demais a sua renda, e pior, estava sendo descontado diretamente de sua remuneração sob a rubrica cartão crédito. Diante da situação entrou em contato com o Banco Requerido para saber por que as parcelas não haviam acabado e estavam sendo descontadas sob a rubrica de cartão de crédito. Alega ainda nunca ter contratado ou solicitado cartão de crédito junto ao banco réu. Após regular processamento do feito, o Magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial com resolução do mérito, para: “DETERMINAR a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em contrato de empréstimo consignado, com a aplicação das taxas de juros e das condições de pagamento praticadas nessa modalidade de crédito, bem como CONDENAR o réu a proceder a devolução dos valores excedentes cobrados anteriormente da autora, correspondentes à diferença entre as taxas efetivamente aplicadas na modalidade de cartão de crédito consignado e as taxas que deveriam ter sido aplicadas caso o contrato fosse desde o início um empréstimo consignado tradicional, devendo este montante ser apurado em fase de liquidação de sentença, mediante a apresentação de cálculos detalhados e documentos comprobatórios por ambas as partes, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa. CONDENO, ainda, em razão da sua sucumbência, o requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, conforme disposição do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil” (sic). Contra tal sentença se insurge o apelante, afirmando, em suma, que o autor possuía pleno conhecimento das condições pactuadas, estando devidamente descritas as características da operação no instrumento contratual, bem como demonstrada a realização de diversos saques por iniciativa do próprio contratante entre 2013 e 2018, mediante TEDs. Argumenta sobre a legalidade e validade do negócio jurídico da operação de crédito que não se confunde com outra modalidade, bem como a ausência de vício de consentimento, pleiteando, ao final, o provimento do apelo para julgar improcedente a pretensão inicial. Pois bem. Inicialmente, cabe ressaltar que a hipótese é de relação de consumo, regulada pela Lei nº. 8.078/90, norma de ordem pública que tem por objetivo a proteção e a defesa do consumidor. Nesse sentido, o enunciado nº. 297, da Súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Assim, nos termos do artigo 14, parágrafo terceiro, do CDC, a responsabilidade civil dos bancos é objetiva, respondendo, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos seus clientes pelos defeitos dos serviços prestados, só havendo exclusão do nexo causal quando o fornecedor comprovar a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. No caso em comento, restou incontroversa a relação jurídica entre as partes, todavia, o autor alega não ter celebrado, ao menos de forma consciente, o contrato de empréstimo na modalidade de cartão de crédito com o banco réu. Entretanto, verifica-se que a instituição financeira, por meio dos documentos que acompanharam sua peça defensiva, juntou aos autos: termo de adesão cartão de crédito BMG Card - autorização para desconto em folha de pagamento, autorização de saque no valor de R$ 932,00, autorização de saque no valor de R$ 144,00, autorização de saque no valor de R$ 1.721,00, autorização de saque no valor de R$ 373,00, proposta de contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado emitido pelo BMG, cédula de crédito bancário (CCB) contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado emitido pelo BMG (Ids. 290271385, 290271386, 290271387, 290271388, 290271389, 290271390), bem como comprovou que autor se utilizou da modalidade contratada, uma vez que realizou saque autorizado e saques complementares conforme faz prova as faturas acostadas nos Id. 290271391 - págs. 01, 02, 07, 14, 20, 51; fato que inviabiliza declarar a nulidade/conversão do contrato. Portanto, restou demonstrado que o consumidor estava ciente de que se tratava de contratação de cartão de crédito, com pagamento do valor mínimo da fatura por meio de consignação em folha de pagamento, justificando-se a continuidade dos descontos. Dessa forma, mostra-se legítima a cobrança dos valores oriundos do cartão de crédito contratado consignado na folha de pagamento, não havendo falar em dano material, repetição do indébito, adequação dos juros e a devolução dos valores, motivo pelo qual a sentença merece reforma. No mesmo sentido se orienta a jurisprudência deste Sodalício, confira: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL C/C PEDIDO DE CONVERSÃO DE CONTRATO, DANOS MATERIAIS E MORAIS – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial”. (N.U 1009949-93.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/06/2025, Publicado no DJE 08/06/2025) DIREITO CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. COMPROVAÇÃO DE CONTRATAÇÃO REGULAR. REALIZAÇÃO DE SAQUES REITERADOS. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que determinou a conversão de contrato de cartão de crédito consignado para a modalidade de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de juros do mercado e restituição dos valores descontados em excesso. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se o contrato celebrado entre as partes configura efetivamente cartão de crédito consignado com Reserva de Margem Consignável, como sustenta o apelante, ou se deve ser convertido em empréstimo consignado tradicional conforme decidido na sentença, considerando a alegação de vício de consentimento pela parte apelada. III. Razões de decidir 3. O banco apelante demonstrou de forma inequívoca a existência da relação contratual mediante robusto dossiê comprobatório, evidenciando que a apelada contratou expressamente cartão de crédito consignado, com clara identificação do produto como "CARTÃO BMG MASTER / BMG CARD" nos instrumentos contratuais firmados. 4. A realização de quatro saques distintos pela apelada ao longo de aproximadamente 10 anos (em 2009, 2014, 2016 e 2019), e não apenas um como mencionado na sentença, evidencia não apenas conhecimento do produto contratado, mas sua efetiva utilização de acordo com as características próprias do cartão de crédito consignado. 5. Não há que se presumir vício de consentimento considerando que a apelada é professora da rede estadual de ensino, possuindo elevado grau de instrução e plena capacidade para compreender a natureza do negócio jurídico celebrado, tendo inclusive utilizado o cartão para múltiplos saques ao longo de uma década. 6. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem se firmado no sentido de reconhecer a validade da contratação de cartão de crédito consignado quando comprovada por meio idôneo, não havendo que se falar em conversão para empréstimo consignado tradicional quando demonstrada a regularidade da contratação. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso provido para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos formulados na inicial. Tese de julgamento: "1. Comprovada a contratação regular de cartão de crédito consignado, com documentação contratual clara e inequívoca, não há que se falar em vício de consentimento. 2. A utilização reiterada do produto mediante múltiplos saques ao longo de anos evidencia conhecimento e concordância com os termos contratuais, impossibilitando a conversão judicial para modalidade diversa de contrato. 3. O nível de instrução do consumidor constitui elemento relevante na análise da compreensão das cláusulas contratuais e da existência de eventual vício de consentimento." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, VIII; Súmula 297/STJ. Jurisprudência relevante citada: TJMT, 1000116-60.2024.8.11.0100, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 15/04/2025; TJMT, 1001161-37.2022.8.11.0014, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025; TJMT, 1016938-78.2022.8.11.0041, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Povoas, Segunda Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025”. (N.U 1008905-39.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC). CONTRATAÇÃO COMPROVADA. SAQUES REALIZADOS. UTILIZAÇÃO DO CARTÃO. INÉRCIA DO CONSUMIDOR POR MAIS DE UMA DÉCADA. VEDAÇÃO AO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. JUROS REMUNERATÓRIOS EM CONFORMIDADE COM A TAXA MÉDIA DE MERCADO. REVISÃO CONTRATUAL INVIÁVEL. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que declarou a inexistência de débito e reconheceu nulidade contratual, condenando-a à restituição de valores descontados e indenização por danos morais, sob a alegação de contratação não reconhecida de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC). II. Questão em discussão 2. As questões em debate consistem em: (i) verificar se houve contratação válida de cartão de crédito consignado; (ii) avaliar a legalidade dos descontos realizados; e (iii) analisar eventual abusividade das taxas de juros aplicadas ao contrato. III. Razões de decidir 3. A contratação foi comprovada por diversos meios documentais, incluindo contrato assinado, autorizações de saque, comprovantes de TED em favor do consumidor e faturas do cartão de crédito, além de imagem (selfie) do contratante no ato do negócio. 4. A utilização contínua do cartão e a ausência de qualquer impugnação por mais de 12 anos demonstram a anuência tácita do consumidor, afastando a alegação de vício de consentimento. 5. Aplica-se o princípio da vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), vedando-se que o consumidor se beneficie do contrato por longo período e, somente após anos, alegue sua nulidade. 6. Os juros remuneratórios contratados (4,70% a.m.), embora superiores à média, não extrapolam patamar que configure desvantagem exagerada ou abuso, sendo compatíveis com a jurisprudência do STJ e as taxas de mercado divulgadas pelo BACEN. 7. Inexistindo ilicitude ou vício contratual, não há que se falar em restituição de valores nem em danos morais. Impõe-se a reforma da sentença. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos iniciais, com inversão dos ônus sucumbenciais. Tese de julgamento: "1. A contratação do cartão de crédito consignado (RMC) é válida quando demonstrada por documentos e comprovada sua utilização pelo consumidor ao longo dos anos. 2. A ausência de impugnação da avença por mais de uma década atrai a incidência do princípio da vedação ao comportamento contraditório, afastando a tese de vício de consentimento. 3. Os juros remuneratórios somente são considerados abusivos quando superiores, de forma significativa, à taxa média de mercado, o que não se verifica no caso concreto." (N.U 1034480-75.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/06/2025, Publicado no DJE 17/06/2025) Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso, para reformar a sentença singular e julgar improcedentes os pedidos da inicial, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, condenando a parte autora/recorrida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com arrimo no art. 85, §2º, do mesmo Códex, cuja exigibilidade deve ser suspensa pelo prazo legal, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Ministério Público Do Trabalho e outros x Estado De Sao Paulo e outros

ID: 315208237

Tribunal: TST Órgão: 2ª Turma Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA Nº Processo: 0011301-48.2023.5.15.0016

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO ROSA MARIA STEQUER

Polo Passivo:

ESTADO DE SAO PAULO GF SERVICOS DE GESTAO OPERACIONAL EIRELI

DECISÃO MONOCRÁTICA

Advogados:

JORGE RICARDO MORAES BEZERRA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CLAUDIO JESUS DE ALMEIDA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

DANIEL DERANIAN KRASZNY

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 2ª TURMA Relatora: MARIA HELENA MALLMANN AIRR 0011301-48.2023.5.15.0016 AGRAVANTE: ROSA MARIA STEQUER AGRAVADO: GF SERVICOS D… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 2ª TURMA Relatora: MARIA HELENA MALLMANN AIRR 0011301-48.2023.5.15.0016 AGRAVANTE: ROSA MARIA STEQUER AGRAVADO: GF SERVICOS DE GESTAO OPERACIONAL EIRELI E OUTROS (1) Poder Judiciário Justiça do Trabalho Tribunal Superior do Trabalho PROCESSO Nº TST-AIRR - 0011301-48.2023.5.15.0016 AGRAVANTE: ROSA MARIA STEQUER ADVOGADO: Dr. CLAUDIO JESUS DE ALMEIDA AGRAVADO: GF SERVICOS DE GESTAO OPERACIONAL EIRELI ADVOGADO: Dr. DANIEL DERANIAN KRASZNY ADVOGADO: Dr. JORGE RICARDO MORAES BEZERRA AGRAVADO: ESTADO DE SAO PAULO CUSTOS LEGIS: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO GMMHM\als D E C I S Ã O Insurge-se a reclamante em face da decisão do TRT que denegou seguimento ao seu recurso de revista. Sustenta, em síntese, que o seu apelo trancado reúne condições de admissibilidade. O 2º reclamado apresentou contraminuta ao agravo de instrumento e contrarrazões ao recurso de revista. O Ministério Público do Trabalho opina pelo prosseguimento do feito, ressalvando eventual pedido de intervenção por ocasião do julgamento da causa. Examino. Com efeito, as vias recursais extraordinárias para os tribunais superiores são restritas e não traduzem terceiro grau de jurisdição. Busca-se, efetivamente, assegurar a imperatividade da ordem jurídica constitucional e federal, visando à uniformização da jurisprudência no País. Tratando-se de recurso de revista, a admissibilidade do apelo só tem pertinência nas estritas hipóteses jurídicas do art. 896, “a”, “b” e “c”, da CLT, respeitados os limites rigorosos dos parágrafos 2º, 7º e 9º do mesmo artigo. Pertinência das Súmulas 266, 333 e 442 do TST. À análise. AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMANTE Conheço do agravo de instrumento, uma vez que atendidos os pressupostos de admissibilidade. TERCEIRIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. TOMADOR DE SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL. Eis os termos da decisão agravada: (...) PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA /SUBSIDIÁRIA (14034) / TERCEIRIZAÇÃO/TOMADOR DE SERVIÇOS (14040) / ENTE PÚBLICO O v. acórdão afastou a responsabilidade subsidiária do 2.º reclamado por constatar a comprovação da fiscalização do ente público quanto às obrigações trabalhistas por parte da 1ª reclamada. Conforme se verifica, a questão foi solucionada com base na análise dos fatos e provas. Incidência da Súmula 126 do C. TST. Além disso, não há que falar em dissenso da Súmula 331, IV, do C. TST, ante o novo entendimento do C. Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de que o mero inadimplemento não tem o condão de atrair a responsabilidade subsidiária da administração pública (Súmula 331, V, do C. TST). Ademais, também seguiu a diretriz traçada pelo STF no julgamento do leading case RE 760931, que fixou no TEMA 246 a seguinte tese com repercussão geral: "O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do artigo 71, parágrafo 1o da Lei 8.666/93." (26.4.2017). Acrescente-se, que a mesma ratio decidendi foi reiterada pelo STF na ADPF 324, que julgou procedente o pedido e firmou tese nos seguintes termos: "1. É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada. 2. Na terceirização, compete à contratante: I) verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada; e II) responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias, na forma do art. 31 da Lei 8.212/1993". Assim sendo, ante a inexistência dos requisitos exigidos pelo artigo 896 da CLT indefiro o seguimento do recurso de revista. CONCLUSÃO DENEGO seguimento ao recurso de revista. (...) A reclamante pretende a responsabilização subsidiária do ente público tomador de serviços. Analiso. Na fração de interesse, constou do acórdão proferido pelo Tribunal Regional: (...) RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA No mérito, o segundo reclamado não detém interesse recursal pois a r. sentença julgou os pedidos improcedentes em relação ao mesmo e a reclamante não tem razão, senão vejamos. Revendo posicionamento anterior, a r. decisão prolatada nos autos da Reclamação Constitucional nº 40505, não só afastou a responsabilidade subsidiária do ente público (reconhecida com base na falta de pagamento das obrigações pela empregadora), mas também fixou que em outros processos sejam proferidas decisões nos termos da jurisprudência da Mais Alta Corte Judicial. Portanto, de acordo com o entendimento do E. Supremo Tribunal Federal, o mero "...inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93". A mesma r. decisão, ainda, exige, para o reconhecimento da responsabilidade do ente público, a demonstração de que ele não só possuía conhecimento da situação de ilegalidade, mas também, que deixou de adotar as medidas necessárias para combatê-la, ainda que de forma mínima. Portanto, de acordo com a r. decisão referida, o reconhecimento da responsabilidade do ente público, sem a observância dos requisitos por ela exigidos, viola a tese jurídica firmada pela Mais Alta Corte nos autos da ADC 16, Rel. Min. CEZAR PELUSO, DJe de 9/9/2011, bem como a tese fixada no Tema 246-RG, RE 760.931, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe de 12/9/2017, e a Súmula Vinculante 10. na ADC 16, de relatoria do Min. Cezar Peluso. Na hipótese em testilha, apesar da falta de pagamento de verbas trabalhistas por parte da real empregadora, não se encontram presentes as condições exigidas pela citada r. decisão e há comprovação de fiscalização, de modo que não há como reconhecer a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado, tal como bem decidido pela r. sentença recorrida. (destaquei) Ademais, cito nesse sentido a r. decisão proferida na Reclamação n. 66.610/SP ajuizada pelo Município de Jundiaí perante o E. Supremo Tribunal Federal contra o acórdão proferido por este Relator no Processo nº 0012011-90.2021.5.15.0096, cujo dispositivo é o seguinte: "Diante do exposto, com base no art. 161, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, JULGO PROCEDENTE o pedido, deforma que seja cassado o ato reclamado, na parte em que atribui responsabilidade subsidiária à parte Reclamante()". Ante todas as razões expostas, nego provimento ao recurso obreiro e deixo de conhecer do apelo patronal por ausência de interesse recursal, nestes termos fixando as razões de decidir para fins de prequestionamento. (...) Pois bem. Em relação à responsabilidade subsidiária, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos embargos de declaração nos autos do RE-760931/DF, reafirmou sua jurisprudência acerca da possibilidade da condenação da Administração Pública quanto ao pagamento de verbas trabalhistas devidas a empregados que a esta prestam serviços de maneira terceirizada. Na ocasião ratificou a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993, na linha do que já havia decidido na ADC 16 - Tema 246 da Repercussão Geral, definindo que a responsabilidade subsidiária do Poder Público não decorre do mero inadimplemento das obrigações trabalhistas pela empresa prestadora de serviços, mas da conduta culposa do tomador. Todavia, permaneceu a cizânia jurídica quanto à discussão relativa ao ônus da prova de comprovar culpa por parte do poder público, se seria do empregado ou da administração pública, questão essa que foi solucionada no julgamento do RE 1.298.647 (TEMA 1.118), em 13/02/2025, em que o STF proferiu as seguintes teses vinculantes, in verbis: Tema 1118 (RE/STF) - Ônus da prova acerca de eventual conduta culposa na fiscalização das obrigações trabalhistas de prestadora de serviços, para fins de responsabilização subsidiária da Administração Pública, em virtude da tese firmada no RE 760.931 (tema 246) (...) 1. Não há responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviços contratada, se amparada exclusivamente na premissa da inversão do ônus da prova, remanescendo imprescindível a comprovação, pela parte autora, da efetiva existência de comportamento negligente ou nexo de causalidade entre o dano por ela invocado e a conduta comissiva ou omissiva do poder público. 2. Haverá comportamento negligente quando a Administração Pública permanecer inerte após o recebimento de notificação formal de que a empresa contratada está descumprindo suas obrigações trabalhistas, enviada pelo trabalhador, sindicato, Ministério do Trabalho, Ministério Público, Defensoria Pública ou outro meio idôneo. 3. Constitui responsabilidade da Administração Pública garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato, nos termos do art. 5º-A, § 3º, da Lei nº 6.019/1974. 4. Nos contratos de terceirização, a Administração Pública deverá: (i) exigir da contratada a comprovação de capital social integralizado compatível com o número de empregados, na forma do art. 4º-B da Lei nº 6.019/1974; e (ii) adotar medidas para assegurar o cumprimento das obrigações trabalhistas pela contratada, na forma do art. 121, § 3º, da Lei nº 14.133/2021, tais como condicionar o pagamento à comprovação de quitação das obrigações trabalhistas do mês anterior. Dessa forma, a partir das balizas firmadas pela Suprema Corte, prevalece o entendimento de que é vedado ao órgão judicante atribuir a responsabilidade ao ente público, reconhecendo conduta culposa (comissiva ou omissiva), com base tão somente nas regras de julgamento decorrentes da distribuição do ônus da prova, sendo necessário, para o reconhecimento da culpa, que o julgador examine os elementos fáticos acerca da falta de fiscalização contratual a respaldar a condenação subsidiária. No caso em exame, especificamente no que diz respeito à fiscalização contratual, o Tribunal Regional consignou que: (...) A mesma r. decisão, ainda, exige, para o reconhecimento da responsabilidade do ente público, a demonstração de que ele não só possuía conhecimento da situação de ilegalidade, mas também, que deixou de adotar as medidas necessárias para combatê-la, ainda que de forma mínima. Portanto, de acordo com a r. decisão referida, o reconhecimento da responsabilidade do ente público, sem a observância dos requisitos por ela exigidos, viola a tese jurídica firmada pela Mais Alta Corte nos autos da ADC 16, Rel. Min. CEZAR PELUSO, DJe de 9/9/2011, bem como a tese fixada no Tema 246-RG, RE 760.931, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe de 12/9/2017, e a Súmula Vinculante 10. na ADC 16, de relatoria do Min. Cezar Peluso. Na hipótese em testilha, apesar da falta de pagamento de verbas trabalhistas por parte da real empregadora, não se encontram presentes as condições exigidas pela citada r. decisão e há comprovação de fiscalização, de modo que não há como reconhecer a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado, tal como bem decidido pela r. sentença recorrida. (destaquei) Conforme se verifica, TRT concluiu que “há comprovação da fiscalização” e que a reclamante não logrou demonstrar que o tomador de serviços “possuía conhecimento da situação de ilegalidade” e “deixou de adotar as medidas necessárias para combatê-la”. Nesse contexto, constata-se a consonância da conclusão da Corte Regional com a tese vinculante proferida pelo STF no julgamento do RE 1.298.647 (TEMA 1.118). Citam-se os recentes julgados desta Corte quanto ao tema em exame: I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA COMPANHIA DE SANEAMENTO BASICO DO ESTADO DE SAO PAULO - SABESP. RECURSO DE REVISTA. LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. IN 40 DO TST. TERCEIRIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. TOMADOR DE SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL. Em razão de possível violação do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993, dá-se provimento ao agravo de instrumento quanto ao tema em epígrafe, para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido.II - RECURSO DE REVISTA DA COMPANHIA DE SANEAMENTO BASICO DO ESTADO DE SAO PAULO - SABESP. LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. IN 40 DO TST.TERCEIRIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. TOMADOR DE SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL. Com relação ao ônus da prova na responsabilidade subsidiária da Administração Pública pelos encargos trabalhistas oriundos do inadimplemento da prestadora de serviços contratada, o STF, no julgamento do RE 1.298.647 (Tema 1.118), fixou a tese de que “Não há responsabilidade subsidiária da administração pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviços contratada, se amparada exclusivamente na premissa da inversão do ônus da prova, remanescendo imprescindível a comprovação, pela parte autora, da efetiva existência de comportamento negligente”. Portanto, a responsabilidade subsidiária da Administração Pública não pode ser declarada exclusivamente sob a perspectiva da inversão do ônus da prova para o ente público. No presente caso, o Tribunal Regional concluiu pela responsabilidade subsidiária do ente público com fundamento de que era deste o ônus de comprovar a fiscalização do contrato de prestação de serviços terceirizados. Decidiu tão somente a partir das regras de julgamento relativas ao ônus da prova. Nesse contexto, constata-se a dissonância da conclusão da Corte Regional com a tese vinculante proferida pelo STF no julgamento do RE 1.298.647 (Tema 1.118). Precedentes específicos. Recurso de revista conhecido e provid (RR-1001161-80.2023.5.02.0312, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 06/06/2025). I - AGRAVO. RECURSO DE REVISTA COM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ESTADO DO RIO DE JANEIRO. VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 TEMA DO RECURSO DE REVISTA ENTE PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DECISÕES DO PLENO DO STF ATÉ O TEMA 1118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL Na decisão monocrática anterior à conclusão do STF no Tema 1118 da Tabela de Repercussão Geral foi reconhecida a transcendência, mas negado seguimento ao recurso de revista do ente público. Deve ser provido o agravo para reexame do recurso de revista conforme as teses vinculantes do STF. Agravo a que se dá provimento. II - RECURSO DE REVISTA. ESTADO DO RIO DE JANEIRO. VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 ENTE PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DECISÕES DO PLENO DO STF ATÉ O TEMA 1118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL Conforme o Pleno do STF (ADC 16), relativamente às obrigações trabalhistas, é vedada a transferência automática, para o ente público tomador de serviços, da responsabilidade da empresa prestadora de serviços; a responsabilidade subsidiária não decorre do mero inadimplemento da empregadora, mas da culpa do ente público no descumprimento das obrigações previstas na Lei nº 8.666/1993. No voto do Ministro Relator da ADC nº 16, Cezar Peluso, constou a ressalva de que a vedação de transferência consequente e automática de encargos trabalhistas, “não impedirá que a Justiça do Trabalho recorra a outros princípios constitucionais e, invocando fatos da causa, reconheça a responsabilidade da Administração, não pela mera inadimplência, mas por outros fatos" . O Pleno do STF, em repercussão geral, com efeito vinculante, no RE 760931, Redator Designado Ministro Luiz Fux, fixou a seguinte tese: “O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93” . Nos debates do julgamento do RE 760931, o Pleno do STF deixou claro que o art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 veda a transferência automática, objetiva, sistemática, e não a transferência fundada na culpa do ente público. No julgamento de ED no RE 760931, a maioria julgadora no STF concluiu pela não inclusão da questão da distribuição do ônus da prova na tese vinculante. No julgamento do RE 1298647, a maioria julgadora no STF proferiu as seguintes teses vinculantes constantes na certidão de julgamento disponível na página daquela Corte Suprema: "1. Não há responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviços contratada, se amparada exclusivamente na premissa da inversão do ônus da prova, remanescendo imprescindível a comprovação, pela parte autora, da efetiva existência de comportamento negligente ou nexo de causalidade entre o dano por ela invocado e a conduta comissiva ou omissiva do poder público. 2. Haverá comportamento negligente quando a Administração Pública permanecer inerte após o recebimento de notificação formal de que a empresa contratada está descumprindo suas obrigações trabalhistas, enviada pelo trabalhador, sindicato, Ministério do Trabalho, Ministério Público, Defensoria Pública ou outro meio idôneo. 3. Constitui responsabilidade da Administração Pública garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato, nos termos do art. 5º-A, § 3º, da Lei nº 6.019/1974. 4. Nos contratos de terceirização, a Administração Pública deverá: (i) exigir da contratada a comprovação de capital social integralizado compatível com o número de empregados, na forma do art. 4º-B da Lei nº 6.019/1974; e (ii) adotar medidas para assegurar o cumprimento das obrigações trabalhistas pela contratada, na forma do art. 121, § 3º, da Lei nº 14.133/2021, tais como condicionar o pagamento à comprovação de quitação das obrigações trabalhistas do mês anterior." No caso concreto, o TRT decidiu com base na distribuição do ônus da prova em desfavor do ente público. Consignou o seguinte: “ não cabe ao reclamante provar a ausência de fiscalização, incumbindo ao Ente Público o ônus de provar que cumpriu o especificado na Lei de Licitações. Este o entendimento consubstanciado nas Súmulas nº 41 e 43 deste Regional, in verbis: SÚMULA Nº 41 - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ENTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PROVA DA CULPA. (ARTIGOS 29, VII, 58, 67 e 78, VII, DA LEI 8.666/93.) Recai sobre o ente da Administração Pública que se beneficiou da mão de obra terceirizada a prova da efetiva fiscalização do contrato de prestação de serviços. SÚMULA Nº 43 - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. A constitucionalidade do parágrafo primeiro do artigo 71 da Lei 8.666/93, declarada pelo STF no julgamento da ADC nº 16, por si só, não afasta a responsabilidade subsidiária da Administração Pública, quando esta decorre da falta de fiscalização. Ora, o obreiro não tem acesso aos documentos pertinentes à relação jurídica obrigacional estabelecida entre a empresa contratada e o ente administrativo contratante, portanto, imputar o ônus da prova ao trabalhador é o acesso à tutela jurisdicional. (...) Logo, a inversão do ônus probatório é medida que se impõe, na espécie, ainda que o Ente Administrativo entenda de forma diversa. ”. Nesse contexto, tem-se que a Corte de origem decidiu em desconformidade com a tese vinculante do STF. Recurso de revista a que se dá provimento (Ag-RRAg-101390-57.2021.5.01.0411, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 28/02/2025) A) AGRAVO DO SEGUNDO RECLAMADO. MATÉRIA OBJETO DO SEU RECURSO DE REVISTA . RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. FISCALIZAÇÃO DO CONTRATO POR PARTE DO TOMADOR DOS SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA DA PARTE AUTORA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. CULPA IN VIGILANDO NÃO COMPROVADA. CONDENAÇÃO INDEVIDA. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. Diante o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 1.118 da Tabela de Repercussão Geral (RE 1298647), impõe-se o provimento do agravo. Agravo conhecido e provido, no tema. B) RECURSO DE REVISTA DO RECLAMADO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. FISCALIZAÇÃO DO CONTRATO POR PARTE DO TOMADOR DOS SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA DA PARTE AUTORA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. CULPA IN VIGILANDO NÃO COMPROVADA. CONDENAÇÃO INDEVIDA. 1. No julgamento da ADC 16 o STF pronunciou a constitucionalidade do art. 71, caput e § 1º, da Lei 8.666/93, pronúncia dotada de efeito vinculante e eficácia contra todos. 2. Ao julgamento do Tema 246 de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal reafirmou sua jurisprudência, fixando tese no sentido de que " O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93 ". 3. Em 13 de fevereiro de 2025, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.118 da Tabela de Repercussão Geral (RE 1298647), estabeleceu que a responsabilidade de comprovar a falha na fiscalização das obrigações trabalhistas por parte do contratante, quando se busca responsabilizar o poder público, recai sobre a parte autora da ação, seja o trabalhador, sindicato ou Ministério Público. 4. No presente caso, o Tribunal Regional concluiu pela responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços face à ausência de prova da fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais por parte da empresa contratada. 5. Nessa medida, a tomadora dos serviços não deve responder pelos créditos obreiros, porque não demonstrou a fiscalização dos haveres trabalhistas, certo que tal ônus não lhe competia, nos termos da tese fixada no Tema 1.118 da Tabela de Repercussão Geral. 6. Configurada a violação do artigo 71, § 1º, da Lei 8.666/93. Recurso de revista conhecido e provido (Ag-RRAg-101196-78.2019.5.01.0071, 1ª Turma, Relator Ministro Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 17/03/2025) Incólumes, pois, os dispositivos legais e constitucionais invocados. O acórdão proferido pelo Tribunal Regional está em conformidade com a jurisprudência desta Corte Superior (Súmula 331, V) e da Suprema Corte. Incidem, pois, as diretrizes consubstanciadas no art. 896, § 7º, da CLT e nas Súmulas 331, V e 333, do TST. Ademais, restam preclusas as matérias não renovadas no agravo de instrumento. Por fim, registre-se, por oportuno, que a oposição de embargos de declaração ou a interposição de recurso está passível de penalidade, se constatado o caráter manifestamente protelatório da medida, a teor dos arts. 1.026, § 2º, do CPC e 793-B, VII, e 793-C da CLT, respectivamente. CONCLUSÃO: Ante o exposto, com fundamento nos arts. 932, III e IV, c/c 1.011, I, do CPC/2015 e 118, X, do RITST, nego seguimento ao agravo de instrumento. Publique-se. Brasília, 1 de julho de 2025. MARIA HELENA MALLMANN Ministra Relatora Intimado(s) / Citado(s) - ROSA MARIA STEQUER

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Ministério Público Do Trabalho e outros x Estado De Sao Paulo e outros

ID: 315208273

Tribunal: TST Órgão: 2ª Turma Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA Nº Processo: 0011301-48.2023.5.15.0016

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO ROSA MARIA STEQUER

Polo Passivo:

ESTADO DE SAO PAULO GF SERVICOS DE GESTAO OPERACIONAL EIRELI

DECISÃO MONOCRÁTICA

Advogados:

JORGE RICARDO MORAES BEZERRA

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CLAUDIO JESUS DE ALMEIDA

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DANIEL DERANIAN KRASZNY

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 2ª TURMA Relatora: MARIA HELENA MALLMANN AIRR 0011301-48.2023.5.15.0016 AGRAVANTE: ROSA MARIA STEQUER AGRAVADO: GF SERVICOS D… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 2ª TURMA Relatora: MARIA HELENA MALLMANN AIRR 0011301-48.2023.5.15.0016 AGRAVANTE: ROSA MARIA STEQUER AGRAVADO: GF SERVICOS DE GESTAO OPERACIONAL EIRELI E OUTROS (1) Poder Judiciário Justiça do Trabalho Tribunal Superior do Trabalho PROCESSO Nº TST-AIRR - 0011301-48.2023.5.15.0016 AGRAVANTE: ROSA MARIA STEQUER ADVOGADO: Dr. CLAUDIO JESUS DE ALMEIDA AGRAVADO: GF SERVICOS DE GESTAO OPERACIONAL EIRELI ADVOGADO: Dr. DANIEL DERANIAN KRASZNY ADVOGADO: Dr. JORGE RICARDO MORAES BEZERRA AGRAVADO: ESTADO DE SAO PAULO CUSTOS LEGIS: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO GMMHM\als D E C I S Ã O Insurge-se a reclamante em face da decisão do TRT que denegou seguimento ao seu recurso de revista. Sustenta, em síntese, que o seu apelo trancado reúne condições de admissibilidade. O 2º reclamado apresentou contraminuta ao agravo de instrumento e contrarrazões ao recurso de revista. O Ministério Público do Trabalho opina pelo prosseguimento do feito, ressalvando eventual pedido de intervenção por ocasião do julgamento da causa. Examino. Com efeito, as vias recursais extraordinárias para os tribunais superiores são restritas e não traduzem terceiro grau de jurisdição. Busca-se, efetivamente, assegurar a imperatividade da ordem jurídica constitucional e federal, visando à uniformização da jurisprudência no País. Tratando-se de recurso de revista, a admissibilidade do apelo só tem pertinência nas estritas hipóteses jurídicas do art. 896, “a”, “b” e “c”, da CLT, respeitados os limites rigorosos dos parágrafos 2º, 7º e 9º do mesmo artigo. Pertinência das Súmulas 266, 333 e 442 do TST. À análise. AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMANTE Conheço do agravo de instrumento, uma vez que atendidos os pressupostos de admissibilidade. TERCEIRIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. TOMADOR DE SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL. Eis os termos da decisão agravada: (...) PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA /SUBSIDIÁRIA (14034) / TERCEIRIZAÇÃO/TOMADOR DE SERVIÇOS (14040) / ENTE PÚBLICO O v. acórdão afastou a responsabilidade subsidiária do 2.º reclamado por constatar a comprovação da fiscalização do ente público quanto às obrigações trabalhistas por parte da 1ª reclamada. Conforme se verifica, a questão foi solucionada com base na análise dos fatos e provas. Incidência da Súmula 126 do C. TST. Além disso, não há que falar em dissenso da Súmula 331, IV, do C. TST, ante o novo entendimento do C. Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de que o mero inadimplemento não tem o condão de atrair a responsabilidade subsidiária da administração pública (Súmula 331, V, do C. TST). Ademais, também seguiu a diretriz traçada pelo STF no julgamento do leading case RE 760931, que fixou no TEMA 246 a seguinte tese com repercussão geral: "O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do artigo 71, parágrafo 1o da Lei 8.666/93." (26.4.2017). Acrescente-se, que a mesma ratio decidendi foi reiterada pelo STF na ADPF 324, que julgou procedente o pedido e firmou tese nos seguintes termos: "1. É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada. 2. Na terceirização, compete à contratante: I) verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada; e II) responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias, na forma do art. 31 da Lei 8.212/1993". Assim sendo, ante a inexistência dos requisitos exigidos pelo artigo 896 da CLT indefiro o seguimento do recurso de revista. CONCLUSÃO DENEGO seguimento ao recurso de revista. (...) A reclamante pretende a responsabilização subsidiária do ente público tomador de serviços. Analiso. Na fração de interesse, constou do acórdão proferido pelo Tribunal Regional: (...) RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA No mérito, o segundo reclamado não detém interesse recursal pois a r. sentença julgou os pedidos improcedentes em relação ao mesmo e a reclamante não tem razão, senão vejamos. Revendo posicionamento anterior, a r. decisão prolatada nos autos da Reclamação Constitucional nº 40505, não só afastou a responsabilidade subsidiária do ente público (reconhecida com base na falta de pagamento das obrigações pela empregadora), mas também fixou que em outros processos sejam proferidas decisões nos termos da jurisprudência da Mais Alta Corte Judicial. Portanto, de acordo com o entendimento do E. Supremo Tribunal Federal, o mero "...inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93". A mesma r. decisão, ainda, exige, para o reconhecimento da responsabilidade do ente público, a demonstração de que ele não só possuía conhecimento da situação de ilegalidade, mas também, que deixou de adotar as medidas necessárias para combatê-la, ainda que de forma mínima. Portanto, de acordo com a r. decisão referida, o reconhecimento da responsabilidade do ente público, sem a observância dos requisitos por ela exigidos, viola a tese jurídica firmada pela Mais Alta Corte nos autos da ADC 16, Rel. Min. CEZAR PELUSO, DJe de 9/9/2011, bem como a tese fixada no Tema 246-RG, RE 760.931, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe de 12/9/2017, e a Súmula Vinculante 10. na ADC 16, de relatoria do Min. Cezar Peluso. Na hipótese em testilha, apesar da falta de pagamento de verbas trabalhistas por parte da real empregadora, não se encontram presentes as condições exigidas pela citada r. decisão e há comprovação de fiscalização, de modo que não há como reconhecer a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado, tal como bem decidido pela r. sentença recorrida. (destaquei) Ademais, cito nesse sentido a r. decisão proferida na Reclamação n. 66.610/SP ajuizada pelo Município de Jundiaí perante o E. Supremo Tribunal Federal contra o acórdão proferido por este Relator no Processo nº 0012011-90.2021.5.15.0096, cujo dispositivo é o seguinte: "Diante do exposto, com base no art. 161, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, JULGO PROCEDENTE o pedido, deforma que seja cassado o ato reclamado, na parte em que atribui responsabilidade subsidiária à parte Reclamante()". Ante todas as razões expostas, nego provimento ao recurso obreiro e deixo de conhecer do apelo patronal por ausência de interesse recursal, nestes termos fixando as razões de decidir para fins de prequestionamento. (...) Pois bem. Em relação à responsabilidade subsidiária, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos embargos de declaração nos autos do RE-760931/DF, reafirmou sua jurisprudência acerca da possibilidade da condenação da Administração Pública quanto ao pagamento de verbas trabalhistas devidas a empregados que a esta prestam serviços de maneira terceirizada. Na ocasião ratificou a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993, na linha do que já havia decidido na ADC 16 - Tema 246 da Repercussão Geral, definindo que a responsabilidade subsidiária do Poder Público não decorre do mero inadimplemento das obrigações trabalhistas pela empresa prestadora de serviços, mas da conduta culposa do tomador. Todavia, permaneceu a cizânia jurídica quanto à discussão relativa ao ônus da prova de comprovar culpa por parte do poder público, se seria do empregado ou da administração pública, questão essa que foi solucionada no julgamento do RE 1.298.647 (TEMA 1.118), em 13/02/2025, em que o STF proferiu as seguintes teses vinculantes, in verbis: Tema 1118 (RE/STF) - Ônus da prova acerca de eventual conduta culposa na fiscalização das obrigações trabalhistas de prestadora de serviços, para fins de responsabilização subsidiária da Administração Pública, em virtude da tese firmada no RE 760.931 (tema 246) (...) 1. Não há responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviços contratada, se amparada exclusivamente na premissa da inversão do ônus da prova, remanescendo imprescindível a comprovação, pela parte autora, da efetiva existência de comportamento negligente ou nexo de causalidade entre o dano por ela invocado e a conduta comissiva ou omissiva do poder público. 2. Haverá comportamento negligente quando a Administração Pública permanecer inerte após o recebimento de notificação formal de que a empresa contratada está descumprindo suas obrigações trabalhistas, enviada pelo trabalhador, sindicato, Ministério do Trabalho, Ministério Público, Defensoria Pública ou outro meio idôneo. 3. Constitui responsabilidade da Administração Pública garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato, nos termos do art. 5º-A, § 3º, da Lei nº 6.019/1974. 4. Nos contratos de terceirização, a Administração Pública deverá: (i) exigir da contratada a comprovação de capital social integralizado compatível com o número de empregados, na forma do art. 4º-B da Lei nº 6.019/1974; e (ii) adotar medidas para assegurar o cumprimento das obrigações trabalhistas pela contratada, na forma do art. 121, § 3º, da Lei nº 14.133/2021, tais como condicionar o pagamento à comprovação de quitação das obrigações trabalhistas do mês anterior. Dessa forma, a partir das balizas firmadas pela Suprema Corte, prevalece o entendimento de que é vedado ao órgão judicante atribuir a responsabilidade ao ente público, reconhecendo conduta culposa (comissiva ou omissiva), com base tão somente nas regras de julgamento decorrentes da distribuição do ônus da prova, sendo necessário, para o reconhecimento da culpa, que o julgador examine os elementos fáticos acerca da falta de fiscalização contratual a respaldar a condenação subsidiária. No caso em exame, especificamente no que diz respeito à fiscalização contratual, o Tribunal Regional consignou que: (...) A mesma r. decisão, ainda, exige, para o reconhecimento da responsabilidade do ente público, a demonstração de que ele não só possuía conhecimento da situação de ilegalidade, mas também, que deixou de adotar as medidas necessárias para combatê-la, ainda que de forma mínima. Portanto, de acordo com a r. decisão referida, o reconhecimento da responsabilidade do ente público, sem a observância dos requisitos por ela exigidos, viola a tese jurídica firmada pela Mais Alta Corte nos autos da ADC 16, Rel. Min. CEZAR PELUSO, DJe de 9/9/2011, bem como a tese fixada no Tema 246-RG, RE 760.931, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe de 12/9/2017, e a Súmula Vinculante 10. na ADC 16, de relatoria do Min. Cezar Peluso. Na hipótese em testilha, apesar da falta de pagamento de verbas trabalhistas por parte da real empregadora, não se encontram presentes as condições exigidas pela citada r. decisão e há comprovação de fiscalização, de modo que não há como reconhecer a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado, tal como bem decidido pela r. sentença recorrida. (destaquei) Conforme se verifica, TRT concluiu que “há comprovação da fiscalização” e que a reclamante não logrou demonstrar que o tomador de serviços “possuía conhecimento da situação de ilegalidade” e “deixou de adotar as medidas necessárias para combatê-la”. Nesse contexto, constata-se a consonância da conclusão da Corte Regional com a tese vinculante proferida pelo STF no julgamento do RE 1.298.647 (TEMA 1.118). Citam-se os recentes julgados desta Corte quanto ao tema em exame: I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA COMPANHIA DE SANEAMENTO BASICO DO ESTADO DE SAO PAULO - SABESP. RECURSO DE REVISTA. LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. IN 40 DO TST. TERCEIRIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. TOMADOR DE SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL. Em razão de possível violação do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993, dá-se provimento ao agravo de instrumento quanto ao tema em epígrafe, para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido.II - RECURSO DE REVISTA DA COMPANHIA DE SANEAMENTO BASICO DO ESTADO DE SAO PAULO - SABESP. LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. IN 40 DO TST.TERCEIRIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. TOMADOR DE SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL. Com relação ao ônus da prova na responsabilidade subsidiária da Administração Pública pelos encargos trabalhistas oriundos do inadimplemento da prestadora de serviços contratada, o STF, no julgamento do RE 1.298.647 (Tema 1.118), fixou a tese de que “Não há responsabilidade subsidiária da administração pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviços contratada, se amparada exclusivamente na premissa da inversão do ônus da prova, remanescendo imprescindível a comprovação, pela parte autora, da efetiva existência de comportamento negligente”. Portanto, a responsabilidade subsidiária da Administração Pública não pode ser declarada exclusivamente sob a perspectiva da inversão do ônus da prova para o ente público. No presente caso, o Tribunal Regional concluiu pela responsabilidade subsidiária do ente público com fundamento de que era deste o ônus de comprovar a fiscalização do contrato de prestação de serviços terceirizados. Decidiu tão somente a partir das regras de julgamento relativas ao ônus da prova. Nesse contexto, constata-se a dissonância da conclusão da Corte Regional com a tese vinculante proferida pelo STF no julgamento do RE 1.298.647 (Tema 1.118). Precedentes específicos. Recurso de revista conhecido e provid (RR-1001161-80.2023.5.02.0312, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 06/06/2025). I - AGRAVO. RECURSO DE REVISTA COM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ESTADO DO RIO DE JANEIRO. VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 TEMA DO RECURSO DE REVISTA ENTE PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DECISÕES DO PLENO DO STF ATÉ O TEMA 1118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL Na decisão monocrática anterior à conclusão do STF no Tema 1118 da Tabela de Repercussão Geral foi reconhecida a transcendência, mas negado seguimento ao recurso de revista do ente público. Deve ser provido o agravo para reexame do recurso de revista conforme as teses vinculantes do STF. Agravo a que se dá provimento. II - RECURSO DE REVISTA. ESTADO DO RIO DE JANEIRO. VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 ENTE PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DECISÕES DO PLENO DO STF ATÉ O TEMA 1118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL Conforme o Pleno do STF (ADC 16), relativamente às obrigações trabalhistas, é vedada a transferência automática, para o ente público tomador de serviços, da responsabilidade da empresa prestadora de serviços; a responsabilidade subsidiária não decorre do mero inadimplemento da empregadora, mas da culpa do ente público no descumprimento das obrigações previstas na Lei nº 8.666/1993. No voto do Ministro Relator da ADC nº 16, Cezar Peluso, constou a ressalva de que a vedação de transferência consequente e automática de encargos trabalhistas, “não impedirá que a Justiça do Trabalho recorra a outros princípios constitucionais e, invocando fatos da causa, reconheça a responsabilidade da Administração, não pela mera inadimplência, mas por outros fatos" . O Pleno do STF, em repercussão geral, com efeito vinculante, no RE 760931, Redator Designado Ministro Luiz Fux, fixou a seguinte tese: “O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93” . Nos debates do julgamento do RE 760931, o Pleno do STF deixou claro que o art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 veda a transferência automática, objetiva, sistemática, e não a transferência fundada na culpa do ente público. No julgamento de ED no RE 760931, a maioria julgadora no STF concluiu pela não inclusão da questão da distribuição do ônus da prova na tese vinculante. No julgamento do RE 1298647, a maioria julgadora no STF proferiu as seguintes teses vinculantes constantes na certidão de julgamento disponível na página daquela Corte Suprema: "1. Não há responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviços contratada, se amparada exclusivamente na premissa da inversão do ônus da prova, remanescendo imprescindível a comprovação, pela parte autora, da efetiva existência de comportamento negligente ou nexo de causalidade entre o dano por ela invocado e a conduta comissiva ou omissiva do poder público. 2. Haverá comportamento negligente quando a Administração Pública permanecer inerte após o recebimento de notificação formal de que a empresa contratada está descumprindo suas obrigações trabalhistas, enviada pelo trabalhador, sindicato, Ministério do Trabalho, Ministério Público, Defensoria Pública ou outro meio idôneo. 3. Constitui responsabilidade da Administração Pública garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato, nos termos do art. 5º-A, § 3º, da Lei nº 6.019/1974. 4. Nos contratos de terceirização, a Administração Pública deverá: (i) exigir da contratada a comprovação de capital social integralizado compatível com o número de empregados, na forma do art. 4º-B da Lei nº 6.019/1974; e (ii) adotar medidas para assegurar o cumprimento das obrigações trabalhistas pela contratada, na forma do art. 121, § 3º, da Lei nº 14.133/2021, tais como condicionar o pagamento à comprovação de quitação das obrigações trabalhistas do mês anterior." No caso concreto, o TRT decidiu com base na distribuição do ônus da prova em desfavor do ente público. Consignou o seguinte: “ não cabe ao reclamante provar a ausência de fiscalização, incumbindo ao Ente Público o ônus de provar que cumpriu o especificado na Lei de Licitações. Este o entendimento consubstanciado nas Súmulas nº 41 e 43 deste Regional, in verbis: SÚMULA Nº 41 - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ENTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PROVA DA CULPA. (ARTIGOS 29, VII, 58, 67 e 78, VII, DA LEI 8.666/93.) Recai sobre o ente da Administração Pública que se beneficiou da mão de obra terceirizada a prova da efetiva fiscalização do contrato de prestação de serviços. SÚMULA Nº 43 - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. A constitucionalidade do parágrafo primeiro do artigo 71 da Lei 8.666/93, declarada pelo STF no julgamento da ADC nº 16, por si só, não afasta a responsabilidade subsidiária da Administração Pública, quando esta decorre da falta de fiscalização. Ora, o obreiro não tem acesso aos documentos pertinentes à relação jurídica obrigacional estabelecida entre a empresa contratada e o ente administrativo contratante, portanto, imputar o ônus da prova ao trabalhador é o acesso à tutela jurisdicional. (...) Logo, a inversão do ônus probatório é medida que se impõe, na espécie, ainda que o Ente Administrativo entenda de forma diversa. ”. Nesse contexto, tem-se que a Corte de origem decidiu em desconformidade com a tese vinculante do STF. Recurso de revista a que se dá provimento (Ag-RRAg-101390-57.2021.5.01.0411, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 28/02/2025) A) AGRAVO DO SEGUNDO RECLAMADO. MATÉRIA OBJETO DO SEU RECURSO DE REVISTA . RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. FISCALIZAÇÃO DO CONTRATO POR PARTE DO TOMADOR DOS SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA DA PARTE AUTORA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. CULPA IN VIGILANDO NÃO COMPROVADA. CONDENAÇÃO INDEVIDA. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. Diante o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 1.118 da Tabela de Repercussão Geral (RE 1298647), impõe-se o provimento do agravo. Agravo conhecido e provido, no tema. B) RECURSO DE REVISTA DO RECLAMADO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. FISCALIZAÇÃO DO CONTRATO POR PARTE DO TOMADOR DOS SERVIÇOS. ÔNUS DA PROVA DA PARTE AUTORA. TEMA 1.118 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. CULPA IN VIGILANDO NÃO COMPROVADA. CONDENAÇÃO INDEVIDA. 1. No julgamento da ADC 16 o STF pronunciou a constitucionalidade do art. 71, caput e § 1º, da Lei 8.666/93, pronúncia dotada de efeito vinculante e eficácia contra todos. 2. Ao julgamento do Tema 246 de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal reafirmou sua jurisprudência, fixando tese no sentido de que " O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93 ". 3. Em 13 de fevereiro de 2025, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.118 da Tabela de Repercussão Geral (RE 1298647), estabeleceu que a responsabilidade de comprovar a falha na fiscalização das obrigações trabalhistas por parte do contratante, quando se busca responsabilizar o poder público, recai sobre a parte autora da ação, seja o trabalhador, sindicato ou Ministério Público. 4. No presente caso, o Tribunal Regional concluiu pela responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços face à ausência de prova da fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais por parte da empresa contratada. 5. Nessa medida, a tomadora dos serviços não deve responder pelos créditos obreiros, porque não demonstrou a fiscalização dos haveres trabalhistas, certo que tal ônus não lhe competia, nos termos da tese fixada no Tema 1.118 da Tabela de Repercussão Geral. 6. Configurada a violação do artigo 71, § 1º, da Lei 8.666/93. Recurso de revista conhecido e provido (Ag-RRAg-101196-78.2019.5.01.0071, 1ª Turma, Relator Ministro Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 17/03/2025) Incólumes, pois, os dispositivos legais e constitucionais invocados. O acórdão proferido pelo Tribunal Regional está em conformidade com a jurisprudência desta Corte Superior (Súmula 331, V) e da Suprema Corte. Incidem, pois, as diretrizes consubstanciadas no art. 896, § 7º, da CLT e nas Súmulas 331, V e 333, do TST. Ademais, restam preclusas as matérias não renovadas no agravo de instrumento. Por fim, registre-se, por oportuno, que a oposição de embargos de declaração ou a interposição de recurso está passível de penalidade, se constatado o caráter manifestamente protelatório da medida, a teor dos arts. 1.026, § 2º, do CPC e 793-B, VII, e 793-C da CLT, respectivamente. CONCLUSÃO: Ante o exposto, com fundamento nos arts. 932, III e IV, c/c 1.011, I, do CPC/2015 e 118, X, do RITST, nego seguimento ao agravo de instrumento. Publique-se. Brasília, 1 de julho de 2025. MARIA HELENA MALLMANN Ministra Relatora Intimado(s) / Citado(s) - GF SERVICOS DE GESTAO OPERACIONAL EIRELI

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Processo nº 1077937-26.2024.8.11.0041

ID: 325490052

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1077937-26.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

BANCO BMG SA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

SERGIO GONINI BENICIO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1077937-26.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Defeito, nulidade ou anulaç… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1077937-26.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Defeito, nulidade ou anulação, Direito de Imagem, Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Empréstimo consignado] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), SERGIO GONINI BENICIO - CPF: 177.915.568-98 (ADVOGADO), ILDA GOTALDO RAMOS - CPF: 276.120.079-91 (APELADO), GUSTAVO PINHEIRO DAVI - CPF: 022.445.561-31 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) E INEXISTÊNCIA DE DÉBITO – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA DIVERSOS SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1077937-26.2024.8.11.0041 APELANTE: BANCO BMG S/A APELADA: ILDA GOTALDO RAMOS RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo BANCO BMG S/A, contra sentença proferida pelo MM. Juízo da Terceira Vara Especializada em Direito Bancário de Cuiabá/MT, Dr. Alex Nunes de Figueiredo, lançada nos autos da ação declaratória de Nulidade de Contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC), cumulada com Pedido de Tutela de Urgência Antecipada, ajuizada por ILDA GOTALDO RAMOS, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial e converteu o contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de mercado do BCB da data da contratação, com a devolução dos valores ilegalmente descontados, se houver, será de forma simples, com a compensação do crédito eventualmente existente em favor do Banco. Manteve a tutela de urgência para determinar que até que ocorra liquidação do contrato, seja suspensa a cobrança do débito na folha de pagamento da parte autora. Ao final, havendo saldo em favor do requerido, deverá dar continuidade aos referidos descontos com a atualização a ser feita. Ainda, condenou a parte requerida BANCO BMG S.A., ao pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), sobre o qual incidirá correção monetária pelos índices do INPC, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, incidentes desde a citação; a correção monetária a partir da data de lançamento desta decisão no sistema eletrônico. Por fim, condenou a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios, estes, considerando que a sentença tem parte ilíquida e parte líquida, arbitrados em 15% (quinze por cento), do proveito econômico obtido (art. 85, § 2º do CPC). Inconformado, o banco apelante suscita preliminarmente a ocorrência da de prescrição e decadência das pretensões autorais, sustentando que entre o primeiro desconto em 2016 e a propositura da ação em 2024 decorreu prazo superior a três anos para repetição de indébito e mais de quatro anos para reconhecimento de eventual nulidade, pleiteando a extinção do processo com resolução do mérito. No mérito propriamente dito, defende a inexistência de falha na prestação de serviços, argumentando que a parte autora contratou regularmente o cartão de crédito consignado, realizou saques, autorizou descontos e tinha ciência dos termos pactuados, juntando aos autos o contrato e documentos comprobatórios. Sustenta que o contrato de cartão de crédito consignado é produto distinto do empréstimo consignado e que inexiste fundamento jurídico para conversão por interesse unilateral do devedor, destacando a impossibilidade técnica e jurídica da migração para outra margem consignável. Dessa forma, pugna pelo afastamento da condenação em danos morais, por ausência de ilícito e por entender que eventual valor fixado foi excessivo e desproporcional; requer, subsidiariamente, a redução do montante arbitrado a título de indenização, com o afastamento da condenação à restituição material por inexistência de ato ilícito e enriquecimento ilícito da autora, defende que os honorários advocatícios deveriam ser fixados sobre o valor da condenação e não sobre o proveito econômico obtido. Ao final, requer a reforma integral da sentença, para julgar improcedentes os pedidos iniciais, condenar a parte autora ao pagamento dos consectários legais e honorários de sucumbência, ou, subsidiariamente, a redução do quantum indenizatório arbitrado. (Id 292944867). Contrarrazões ofertadas no Id 292944870, postulando pelo desprovimento do recurso. O preparo foi recolhido (Id 294520371). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Verifica-se que o recurso está preparado, é tempestivo e adequado, de modo que CONHEÇO o apelo, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Antes de adentrar ao mérito, pertinente enfrentar as preliminares suscitadas pelo apelante. No caso, não há falar em prescrição, ainda que parcial, pois, apesar da contratação realizada ainda em 2016, as prestações continuam a ser debitadas diretamente da folha de pagamento do apelante até os dias atuais, de modo que rejeito a preliminar suscitada. Nesse sentido é o entendimento desta C. Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO REJEITADA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A PARTE AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que a parte autora se utiliza do cartão para realização de saques, inclusive efetuando pagamento parcial da fatura, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados”. (N.U 1032612-28.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/11/2024, Publicado no DJE 29/11/2024) Quanto à preliminar de decadência, da mesma forma resta afastada, posto que, tratando-se de obrigação de trato sucessivo, há renovação automática do pacto ao longo do tempo por meio dos descontos mensais, o que afasta a incidência da decadência do direito de discutir o contrato bancário. Dessa forma, merece ser afastada a referida preliminar. Quanto ao cerne, cinge-se dos autos que ILDA GOTALDO RAMOS ajuizou a presente ação em desfavor do BANCO BMG S/A alegando, em suma, que está sendo descontado do seu benefício previdenciário, desde fevereiro de 2017, um valor referente a um empréstimo de RMC - empréstimo consignado pela modalidade cartão de crédito, oriundo de um contrato que está ativo com o número 12356965. Diz que, conforme o documento citado a autora teria feito uma contratação de cartão com limite de R$ 2.086,00 (dois mil e oitenta e seis reais). Sustenta que os empréstimos sobre RMC são empréstimos eivados de vícios e considerados abusivos pelo direito do consumidor, uma vez que seria um empréstimo que seria considerado impagável. Defende que foi induzida em erro pelo banco Requerido, uma vez que a modalidade firmada é diversa da prática costumeira, isto é, houve a celebração de um contrato para Reserva de Margem Consignável (RMC), no qual houve a liberação do crédito contratado, mas sem a indicação de um número de parcelas fixas para pagamento mensal, tratando-se de uma modalidade de cartão de crédito. Defende que, em nenhum momento houve informações claras pelo Banco Requerido a respeito dessa modalidade, inclusive sobre o percentual a ser averbado, o qual vem sendo descontado diretamente de sua remuneração sob a rubrica cartão crédito. Alega ainda nunca ter contratado ou solicitado cartão de crédito junto ao banco réu. Após regular processamento do feito, o Magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial com resolução do mérito, para converter o contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de mercado do BCB da data da contratação, com a devolução dos valores ilegalmente descontados, se houver, será de forma simples, com a compensação do crédito eventualmente existente em favor do Banco. Manteve a tutela de urgência para determinar que até que ocorra liquidação do contrato, seja suspensa a cobrança do débito na folha de pagamento da parte autora. Ao final, havendo saldo em favor do requerido, deverá dar continuidade aos referidos descontos com a atualização a ser feita. Ainda, condenou a parte requerida BANCO BMG S.A., ao pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), sobre o qual incidirá correção monetária pelos índices do INPC, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, incidentes desde a citação; a correção monetária a partir da data de lançamento desta decisão no sistema eletrônico. Contra tal sentença se insurge o apelante, afirmando, em suma, que a autora possuía pleno conhecimento das condições pactuadas, estando devidamente descritas as características da operação no instrumento contratual, bem como demonstrada a realização de diversos saques por iniciativa da própria, mediante TEDs. Argumenta sobre a legalidade e validade do negócio jurídico da operação de crédito que não se confunde com outra modalidade, bem como a ausência de vício de consentimento, pleiteando, ao final, o provimento do apelo para julgar improcedente a pretensão inicial. Pois bem. Inicialmente, cabe ressaltar que a hipótese é de relação de consumo, regulada pela Lei nº. 8.078/90, norma de ordem pública que tem por objetivo a proteção e a defesa do consumidor. Nesse sentido, o enunciado nº. 297, da Súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Assim, nos termos do artigo 14, parágrafo terceiro, do CDC, a responsabilidade civil dos bancos é objetiva, respondendo, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos seus clientes pelos defeitos dos serviços prestados, só havendo exclusão do nexo causal quando o fornecedor comprovar a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. No caso em comento, restou incontroversa a relação jurídica entre as partes, todavia, a autora alega não ter celebrado, ao menos de forma consciente, o contrato de empréstimo na modalidade de cartão de crédito com o banco réu. Entretanto, após análise minuciosa das provas produzidas nos autos, verifico que o banco requerido apelante juntou o contrato devidamente assinado pela parte autora recorrida intitulado “Termo de Adesão Cartão de Crédito BMG S/A e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento e Cédula de Crédito Bancário – Saque Mediante a Utilização do Cartão de Crédito Consignado” (Ids. 292944850 e 292944851), munidos com cópia de documento pessoal, o que comprova a relação consumerista firmada entre as partes. Ademais, a instituição financeira ainda comprovou que a parte autora, ora apelada, utilizava-se do plástico com frequência, uma vez que realizou saque autorizado e vários saques complementares (Id. 292944850 – págs. págs. 01 e 11) e (Id. 292944851 - págs. 22, 29, 31. 40, 41, 44, 45, 51 e 53) fato que inviabiliza declarar a nulidade/conversão do contrato. Portanto, restou demonstrado que a consumidora estava ciente de que se tratava de contratação de cartão de crédito, com pagamento do valor mínimo da fatura por meio de consignação em folha de pagamento, justificando-se a continuidade dos descontos. Dessa forma, mostra-se legítima a cobrança dos valores oriundos do cartão de crédito contratado consignado na folha de pagamento, não havendo falar em dano material, repetição do indébito, adequação dos juros e a devolução dos valores, motivo pelo qual a sentença merece reforma. No mesmo sentido se orienta a jurisprudência deste Sodalício, confira: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL C/C PEDIDO DE CONVERSÃO DE CONTRATO, DANOS MATERIAIS E MORAIS – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial”. (N.U 1009949-93.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/06/2025, Publicado no DJE 08/06/2025) DIREITO CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. COMPROVAÇÃO DE CONTRATAÇÃO REGULAR. REALIZAÇÃO DE SAQUES REITERADOS. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que determinou a conversão de contrato de cartão de crédito consignado para a modalidade de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de juros do mercado e restituição dos valores descontados em excesso. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se o contrato celebrado entre as partes configura efetivamente cartão de crédito consignado com Reserva de Margem Consignável, como sustenta o apelante, ou se deve ser convertido em empréstimo consignado tradicional conforme decidido na sentença, considerando a alegação de vício de consentimento pela parte apelada. III. Razões de decidir 3. O banco apelante demonstrou de forma inequívoca a existência da relação contratual mediante robusto dossiê comprobatório, evidenciando que a apelada contratou expressamente cartão de crédito consignado, com clara identificação do produto como "CARTÃO BMG MASTER / BMG CARD" nos instrumentos contratuais firmados. 4. A realização de quatro saques distintos pela apelada ao longo de aproximadamente 10 anos (em 2009, 2014, 2016 e 2019), e não apenas um como mencionado na sentença, evidencia não apenas conhecimento do produto contratado, mas sua efetiva utilização de acordo com as características próprias do cartão de crédito consignado. 5. Não há que se presumir vício de consentimento considerando que a apelada é professora da rede estadual de ensino, possuindo elevado grau de instrução e plena capacidade para compreender a natureza do negócio jurídico celebrado, tendo inclusive utilizado o cartão para múltiplos saques ao longo de uma década. 6. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem se firmado no sentido de reconhecer a validade da contratação de cartão de crédito consignado quando comprovada por meio idôneo, não havendo que se falar em conversão para empréstimo consignado tradicional quando demonstrada a regularidade da contratação. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso provido para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos formulados na inicial. Tese de julgamento: "1. Comprovada a contratação regular de cartão de crédito consignado, com documentação contratual clara e inequívoca, não há que se falar em vício de consentimento. 2. A utilização reiterada do produto mediante múltiplos saques ao longo de anos evidencia conhecimento e concordância com os termos contratuais, impossibilitando a conversão judicial para modalidade diversa de contrato. 3. O nível de instrução do consumidor constitui elemento relevante na análise da compreensão das cláusulas contratuais e da existência de eventual vício de consentimento." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, VIII; Súmula 297/STJ. Jurisprudência relevante citada: TJMT, 1000116-60.2024.8.11.0100, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 15/04/2025; TJMT, 1001161-37.2022.8.11.0014, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025; TJMT, 1016938-78.2022.8.11.0041, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Povoas, Segunda Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025”. (N.U 1008905-39.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC). CONTRATAÇÃO COMPROVADA. SAQUES REALIZADOS. UTILIZAÇÃO DO CARTÃO. INÉRCIA DO CONSUMIDOR POR MAIS DE UMA DÉCADA. VEDAÇÃO AO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. JUROS REMUNERATÓRIOS EM CONFORMIDADE COM A TAXA MÉDIA DE MERCADO. REVISÃO CONTRATUAL INVIÁVEL. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que declarou a inexistência de débito e reconheceu nulidade contratual, condenando-a à restituição de valores descontados e indenização por danos morais, sob a alegação de contratação não reconhecida de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC). II. Questão em discussão 2. As questões em debate consistem em: (i) verificar se houve contratação válida de cartão de crédito consignado; (ii) avaliar a legalidade dos descontos realizados; e (iii) analisar eventual abusividade das taxas de juros aplicadas ao contrato. III. Razões de decidir 3. A contratação foi comprovada por diversos meios documentais, incluindo contrato assinado, autorizações de saque, comprovantes de TED em favor do consumidor e faturas do cartão de crédito, além de imagem (selfie) do contratante no ato do negócio. 4. A utilização contínua do cartão e a ausência de qualquer impugnação por mais de 12 anos demonstram a anuência tácita do consumidor, afastando a alegação de vício de consentimento. 5. Aplica-se o princípio da vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), vedando-se que o consumidor se beneficie do contrato por longo período e, somente após anos, alegue sua nulidade. 6. Os juros remuneratórios contratados (4,70% a.m.), embora superiores à média, não extrapolam patamar que configure desvantagem exagerada ou abuso, sendo compatíveis com a jurisprudência do STJ e as taxas de mercado divulgadas pelo BACEN. 7. Inexistindo ilicitude ou vício contratual, não há que se falar em restituição de valores nem em danos morais. Impõe-se a reforma da sentença. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos iniciais, com inversão dos ônus sucumbenciais. Tese de julgamento: "1. A contratação do cartão de crédito consignado (RMC) é válida quando demonstrada por documentos e comprovada sua utilização pelo consumidor ao longo dos anos. 2. A ausência de impugnação da avença por mais de uma década atrai a incidência do princípio da vedação ao comportamento contraditório, afastando a tese de vício de consentimento. 3. Os juros remuneratórios somente são considerados abusivos quando superiores, de forma significativa, à taxa média de mercado, o que não se verifica no caso concreto." (N.U 1034480-75.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/06/2025, Publicado no DJE 17/06/2025) Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso, para reformar a sentença singular e julgar improcedentes os pedidos da inicial, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, condenando a parte autora/recorrida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com arrimo no art. 85, §2º, do mesmo Códex, cuja exigibilidade deve ser suspensa pelo prazo legal, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Processo nº 1077937-26.2024.8.11.0041

ID: 325490057

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1077937-26.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ILDA GOTALDO RAMOS

Acórdão

Advogados:

GUSTAVO PINHEIRO DAVI

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1077937-26.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Defeito, nulidade ou anulaç… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1077937-26.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Defeito, nulidade ou anulação, Direito de Imagem, Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Empréstimo consignado] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), SERGIO GONINI BENICIO - CPF: 177.915.568-98 (ADVOGADO), ILDA GOTALDO RAMOS - CPF: 276.120.079-91 (APELADO), GUSTAVO PINHEIRO DAVI - CPF: 022.445.561-31 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) E INEXISTÊNCIA DE DÉBITO – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA DIVERSOS SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1077937-26.2024.8.11.0041 APELANTE: BANCO BMG S/A APELADA: ILDA GOTALDO RAMOS RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo BANCO BMG S/A, contra sentença proferida pelo MM. Juízo da Terceira Vara Especializada em Direito Bancário de Cuiabá/MT, Dr. Alex Nunes de Figueiredo, lançada nos autos da ação declaratória de Nulidade de Contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC), cumulada com Pedido de Tutela de Urgência Antecipada, ajuizada por ILDA GOTALDO RAMOS, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial e converteu o contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de mercado do BCB da data da contratação, com a devolução dos valores ilegalmente descontados, se houver, será de forma simples, com a compensação do crédito eventualmente existente em favor do Banco. Manteve a tutela de urgência para determinar que até que ocorra liquidação do contrato, seja suspensa a cobrança do débito na folha de pagamento da parte autora. Ao final, havendo saldo em favor do requerido, deverá dar continuidade aos referidos descontos com a atualização a ser feita. Ainda, condenou a parte requerida BANCO BMG S.A., ao pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), sobre o qual incidirá correção monetária pelos índices do INPC, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, incidentes desde a citação; a correção monetária a partir da data de lançamento desta decisão no sistema eletrônico. Por fim, condenou a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios, estes, considerando que a sentença tem parte ilíquida e parte líquida, arbitrados em 15% (quinze por cento), do proveito econômico obtido (art. 85, § 2º do CPC). Inconformado, o banco apelante suscita preliminarmente a ocorrência da de prescrição e decadência das pretensões autorais, sustentando que entre o primeiro desconto em 2016 e a propositura da ação em 2024 decorreu prazo superior a três anos para repetição de indébito e mais de quatro anos para reconhecimento de eventual nulidade, pleiteando a extinção do processo com resolução do mérito. No mérito propriamente dito, defende a inexistência de falha na prestação de serviços, argumentando que a parte autora contratou regularmente o cartão de crédito consignado, realizou saques, autorizou descontos e tinha ciência dos termos pactuados, juntando aos autos o contrato e documentos comprobatórios. Sustenta que o contrato de cartão de crédito consignado é produto distinto do empréstimo consignado e que inexiste fundamento jurídico para conversão por interesse unilateral do devedor, destacando a impossibilidade técnica e jurídica da migração para outra margem consignável. Dessa forma, pugna pelo afastamento da condenação em danos morais, por ausência de ilícito e por entender que eventual valor fixado foi excessivo e desproporcional; requer, subsidiariamente, a redução do montante arbitrado a título de indenização, com o afastamento da condenação à restituição material por inexistência de ato ilícito e enriquecimento ilícito da autora, defende que os honorários advocatícios deveriam ser fixados sobre o valor da condenação e não sobre o proveito econômico obtido. Ao final, requer a reforma integral da sentença, para julgar improcedentes os pedidos iniciais, condenar a parte autora ao pagamento dos consectários legais e honorários de sucumbência, ou, subsidiariamente, a redução do quantum indenizatório arbitrado. (Id 292944867). Contrarrazões ofertadas no Id 292944870, postulando pelo desprovimento do recurso. O preparo foi recolhido (Id 294520371). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Verifica-se que o recurso está preparado, é tempestivo e adequado, de modo que CONHEÇO o apelo, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Antes de adentrar ao mérito, pertinente enfrentar as preliminares suscitadas pelo apelante. No caso, não há falar em prescrição, ainda que parcial, pois, apesar da contratação realizada ainda em 2016, as prestações continuam a ser debitadas diretamente da folha de pagamento do apelante até os dias atuais, de modo que rejeito a preliminar suscitada. Nesse sentido é o entendimento desta C. Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO REJEITADA – MÉRITO – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A PARTE AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que a parte autora se utiliza do cartão para realização de saques, inclusive efetuando pagamento parcial da fatura, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados”. (N.U 1032612-28.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/11/2024, Publicado no DJE 29/11/2024) Quanto à preliminar de decadência, da mesma forma resta afastada, posto que, tratando-se de obrigação de trato sucessivo, há renovação automática do pacto ao longo do tempo por meio dos descontos mensais, o que afasta a incidência da decadência do direito de discutir o contrato bancário. Dessa forma, merece ser afastada a referida preliminar. Quanto ao cerne, cinge-se dos autos que ILDA GOTALDO RAMOS ajuizou a presente ação em desfavor do BANCO BMG S/A alegando, em suma, que está sendo descontado do seu benefício previdenciário, desde fevereiro de 2017, um valor referente a um empréstimo de RMC - empréstimo consignado pela modalidade cartão de crédito, oriundo de um contrato que está ativo com o número 12356965. Diz que, conforme o documento citado a autora teria feito uma contratação de cartão com limite de R$ 2.086,00 (dois mil e oitenta e seis reais). Sustenta que os empréstimos sobre RMC são empréstimos eivados de vícios e considerados abusivos pelo direito do consumidor, uma vez que seria um empréstimo que seria considerado impagável. Defende que foi induzida em erro pelo banco Requerido, uma vez que a modalidade firmada é diversa da prática costumeira, isto é, houve a celebração de um contrato para Reserva de Margem Consignável (RMC), no qual houve a liberação do crédito contratado, mas sem a indicação de um número de parcelas fixas para pagamento mensal, tratando-se de uma modalidade de cartão de crédito. Defende que, em nenhum momento houve informações claras pelo Banco Requerido a respeito dessa modalidade, inclusive sobre o percentual a ser averbado, o qual vem sendo descontado diretamente de sua remuneração sob a rubrica cartão crédito. Alega ainda nunca ter contratado ou solicitado cartão de crédito junto ao banco réu. Após regular processamento do feito, o Magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial com resolução do mérito, para converter o contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de mercado do BCB da data da contratação, com a devolução dos valores ilegalmente descontados, se houver, será de forma simples, com a compensação do crédito eventualmente existente em favor do Banco. Manteve a tutela de urgência para determinar que até que ocorra liquidação do contrato, seja suspensa a cobrança do débito na folha de pagamento da parte autora. Ao final, havendo saldo em favor do requerido, deverá dar continuidade aos referidos descontos com a atualização a ser feita. Ainda, condenou a parte requerida BANCO BMG S.A., ao pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), sobre o qual incidirá correção monetária pelos índices do INPC, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, incidentes desde a citação; a correção monetária a partir da data de lançamento desta decisão no sistema eletrônico. Contra tal sentença se insurge o apelante, afirmando, em suma, que a autora possuía pleno conhecimento das condições pactuadas, estando devidamente descritas as características da operação no instrumento contratual, bem como demonstrada a realização de diversos saques por iniciativa da própria, mediante TEDs. Argumenta sobre a legalidade e validade do negócio jurídico da operação de crédito que não se confunde com outra modalidade, bem como a ausência de vício de consentimento, pleiteando, ao final, o provimento do apelo para julgar improcedente a pretensão inicial. Pois bem. Inicialmente, cabe ressaltar que a hipótese é de relação de consumo, regulada pela Lei nº. 8.078/90, norma de ordem pública que tem por objetivo a proteção e a defesa do consumidor. Nesse sentido, o enunciado nº. 297, da Súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Assim, nos termos do artigo 14, parágrafo terceiro, do CDC, a responsabilidade civil dos bancos é objetiva, respondendo, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos seus clientes pelos defeitos dos serviços prestados, só havendo exclusão do nexo causal quando o fornecedor comprovar a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. No caso em comento, restou incontroversa a relação jurídica entre as partes, todavia, a autora alega não ter celebrado, ao menos de forma consciente, o contrato de empréstimo na modalidade de cartão de crédito com o banco réu. Entretanto, após análise minuciosa das provas produzidas nos autos, verifico que o banco requerido apelante juntou o contrato devidamente assinado pela parte autora recorrida intitulado “Termo de Adesão Cartão de Crédito BMG S/A e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento e Cédula de Crédito Bancário – Saque Mediante a Utilização do Cartão de Crédito Consignado” (Ids. 292944850 e 292944851), munidos com cópia de documento pessoal, o que comprova a relação consumerista firmada entre as partes. Ademais, a instituição financeira ainda comprovou que a parte autora, ora apelada, utilizava-se do plástico com frequência, uma vez que realizou saque autorizado e vários saques complementares (Id. 292944850 – págs. págs. 01 e 11) e (Id. 292944851 - págs. 22, 29, 31. 40, 41, 44, 45, 51 e 53) fato que inviabiliza declarar a nulidade/conversão do contrato. Portanto, restou demonstrado que a consumidora estava ciente de que se tratava de contratação de cartão de crédito, com pagamento do valor mínimo da fatura por meio de consignação em folha de pagamento, justificando-se a continuidade dos descontos. Dessa forma, mostra-se legítima a cobrança dos valores oriundos do cartão de crédito contratado consignado na folha de pagamento, não havendo falar em dano material, repetição do indébito, adequação dos juros e a devolução dos valores, motivo pelo qual a sentença merece reforma. No mesmo sentido se orienta a jurisprudência deste Sodalício, confira: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL C/C PEDIDO DE CONVERSÃO DE CONTRATO, DANOS MATERIAIS E MORAIS – PRELIMINARES DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS - MÉRITO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA SAQUES, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDO E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, o termo inicial dos prazos decadencial e prescricional tem início apenas após o vencimento da última parcela do contrato. Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento da parte consumidora, e não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que demonstrada à utilização do cartão para realização de saques, inviável falar-se na conversão e aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados Recurso provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos inaugurais, com inversão do ônus sucumbencial”. (N.U 1009949-93.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/06/2025, Publicado no DJE 08/06/2025) DIREITO CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. COMPROVAÇÃO DE CONTRATAÇÃO REGULAR. REALIZAÇÃO DE SAQUES REITERADOS. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que determinou a conversão de contrato de cartão de crédito consignado para a modalidade de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de juros do mercado e restituição dos valores descontados em excesso. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se o contrato celebrado entre as partes configura efetivamente cartão de crédito consignado com Reserva de Margem Consignável, como sustenta o apelante, ou se deve ser convertido em empréstimo consignado tradicional conforme decidido na sentença, considerando a alegação de vício de consentimento pela parte apelada. III. Razões de decidir 3. O banco apelante demonstrou de forma inequívoca a existência da relação contratual mediante robusto dossiê comprobatório, evidenciando que a apelada contratou expressamente cartão de crédito consignado, com clara identificação do produto como "CARTÃO BMG MASTER / BMG CARD" nos instrumentos contratuais firmados. 4. A realização de quatro saques distintos pela apelada ao longo de aproximadamente 10 anos (em 2009, 2014, 2016 e 2019), e não apenas um como mencionado na sentença, evidencia não apenas conhecimento do produto contratado, mas sua efetiva utilização de acordo com as características próprias do cartão de crédito consignado. 5. Não há que se presumir vício de consentimento considerando que a apelada é professora da rede estadual de ensino, possuindo elevado grau de instrução e plena capacidade para compreender a natureza do negócio jurídico celebrado, tendo inclusive utilizado o cartão para múltiplos saques ao longo de uma década. 6. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem se firmado no sentido de reconhecer a validade da contratação de cartão de crédito consignado quando comprovada por meio idôneo, não havendo que se falar em conversão para empréstimo consignado tradicional quando demonstrada a regularidade da contratação. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso provido para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos formulados na inicial. Tese de julgamento: "1. Comprovada a contratação regular de cartão de crédito consignado, com documentação contratual clara e inequívoca, não há que se falar em vício de consentimento. 2. A utilização reiterada do produto mediante múltiplos saques ao longo de anos evidencia conhecimento e concordância com os termos contratuais, impossibilitando a conversão judicial para modalidade diversa de contrato. 3. O nível de instrução do consumidor constitui elemento relevante na análise da compreensão das cláusulas contratuais e da existência de eventual vício de consentimento." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, VIII; Súmula 297/STJ. Jurisprudência relevante citada: TJMT, 1000116-60.2024.8.11.0100, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 15/04/2025; TJMT, 1001161-37.2022.8.11.0014, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025; TJMT, 1016938-78.2022.8.11.0041, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Povoas, Segunda Câmara de Direito Privado, j. 02/04/2025”. (N.U 1008905-39.2024.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC). CONTRATAÇÃO COMPROVADA. SAQUES REALIZADOS. UTILIZAÇÃO DO CARTÃO. INÉRCIA DO CONSUMIDOR POR MAIS DE UMA DÉCADA. VEDAÇÃO AO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. JUROS REMUNERATÓRIOS EM CONFORMIDADE COM A TAXA MÉDIA DE MERCADO. REVISÃO CONTRATUAL INVIÁVEL. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que declarou a inexistência de débito e reconheceu nulidade contratual, condenando-a à restituição de valores descontados e indenização por danos morais, sob a alegação de contratação não reconhecida de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC). II. Questão em discussão 2. As questões em debate consistem em: (i) verificar se houve contratação válida de cartão de crédito consignado; (ii) avaliar a legalidade dos descontos realizados; e (iii) analisar eventual abusividade das taxas de juros aplicadas ao contrato. III. Razões de decidir 3. A contratação foi comprovada por diversos meios documentais, incluindo contrato assinado, autorizações de saque, comprovantes de TED em favor do consumidor e faturas do cartão de crédito, além de imagem (selfie) do contratante no ato do negócio. 4. A utilização contínua do cartão e a ausência de qualquer impugnação por mais de 12 anos demonstram a anuência tácita do consumidor, afastando a alegação de vício de consentimento. 5. Aplica-se o princípio da vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), vedando-se que o consumidor se beneficie do contrato por longo período e, somente após anos, alegue sua nulidade. 6. Os juros remuneratórios contratados (4,70% a.m.), embora superiores à média, não extrapolam patamar que configure desvantagem exagerada ou abuso, sendo compatíveis com a jurisprudência do STJ e as taxas de mercado divulgadas pelo BACEN. 7. Inexistindo ilicitude ou vício contratual, não há que se falar em restituição de valores nem em danos morais. Impõe-se a reforma da sentença. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada para julgar improcedentes os pedidos iniciais, com inversão dos ônus sucumbenciais. Tese de julgamento: "1. A contratação do cartão de crédito consignado (RMC) é válida quando demonstrada por documentos e comprovada sua utilização pelo consumidor ao longo dos anos. 2. A ausência de impugnação da avença por mais de uma década atrai a incidência do princípio da vedação ao comportamento contraditório, afastando a tese de vício de consentimento. 3. Os juros remuneratórios somente são considerados abusivos quando superiores, de forma significativa, à taxa média de mercado, o que não se verifica no caso concreto." (N.U 1034480-75.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/06/2025, Publicado no DJE 17/06/2025) Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso, para reformar a sentença singular e julgar improcedentes os pedidos da inicial, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, condenando a parte autora/recorrida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com arrimo no art. 85, §2º, do mesmo Códex, cuja exigibilidade deve ser suspensa pelo prazo legal, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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