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"1001217-07.2023.8.26.0309" - Resultados da Busca – Página 166 de 173

Alessandro Henrique De Oliveira e outros x Fundacao Antonio Prudente e outros

ID: 257223141

Tribunal: TRT2 Órgão: 74ª Vara do Trabalho de São Paulo Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO Nº Processo: 1001564-50.2024.5.02.0074

Data de Disponibilização: 15/04/2025

Polo Ativo:

ALESSANDRO HENRIQUE DE OLIVEIRA EMIDIO JOSE FILHO

Polo Passivo:

FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE SODEXO DO BRASIL COMERCIAL S.A.

Notificação

Advogados:

AMANDA SILVA PACCA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

FABIO RIVELLI

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EDUARDO TOFOLI

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ANA KARINA RODRIGUES PUCCI

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 74ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO 1001564-50.2024.5.02.0074 : EMIDIO JOSE FILHO : SODEXO DO BRASIL COMERCIAL S.A… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 74ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO 1001564-50.2024.5.02.0074 : EMIDIO JOSE FILHO : SODEXO DO BRASIL COMERCIAL S.A. E OUTROS (1) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 4615ebd proferida nos autos, cujo dispositivo consta a seguir: Pelo MM. Juiz do Trabalho, Dr. FÁBIO MOTERANI, à análise a presente ação, prolatou-se a seguinte sentença: I. RELATÓRIO. O reclamante postula rescisão indireta e seus consectários, diferenças e guia para saque de FGTS, verbas rescisórias em dobro adicional de insalubridade em grau máximo e reflexos, horas extraordinárias e reflexos, domingos e feriados em dobro e reflexos, PPR, danos morais, multa normativa, multas dos artigos 467 e 477 da CLT, além de condenação subsidiária da correclamada. A defesa da primeira reclamada impugna as pretensões. A defesa da segunda reclamada alega ilegitimidade passiva e impugna as pretensões e sua responsabilidade. Réplica (fls. 799). Laudo pericial ambiental às fls. 168. Instrução com depoimentos das partes e testemunhas (fls. 860). Razões finais escritas. Nova proposta de conciliação rejeitada. II. FUNDAMENTAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. A pertinência subjetiva da ação mostra-se presente pela simples imputação de relação jurídica contida na peça inicial, concernente à tomação dos serviços. Essa aferição ocorre no plano abstrato, relegando para o mérito a pertinência do direito material vindicado, no tocante à sua responsabilidade. Rejeito. RESCISÃO INDIRETA Inicialmente, evidente que não se trata de abandono de emprego, como propugnado pela defesa. Para a configuração, necessário o elemento objetivo e subjetivo. O ânimo de abandonar não ficou evidenciado, inclusive com o ajuizamento da presente ação cerca de duas semanas após a interrupção da prestação de serviços, período precedente à emissão do comunicado de dispensa por justo motivo apresentado e, em grande parte, à emissão dos telegramas solicitando o retorno à função. A rescisão indireta se impõe quando a conduta ensejadora revestir-se de relevante gravidade, a ponto de comprometer a continuidade do liame empregatício. Deve ser robustamente provada, porque o ordenamento protege o emprego, fonte de dignidade e sustento material. A inicial indica descumprimento contratual atinente a alteração contratual atinente a mudança de escala, bem como o inadimplemento de horas extraordinárias e adicional de insalubridade. Troca de turno. De início, incontroverso a mudança de escala de trabalho, a alteração revela-se intrínsecas ao contrato, que conta com expressa previsão nesse sentido (vide Cláusula 3ª do contrato de trabalho de fls. 318). Afasta-se a alegação de alteração unilateral lesiva ao empregado, uma vez que o próprio contrato de trabalho entre as partes possui expressa previsão acerca das alterações adotadas. Adicional de insalubridade. A inicial alegou trabalho insalubre por contato a produtos nocivos, pleiteando o grau máximo. Todavia, o laudo de fl. 769 concluiu pelo direito ao recebimento de insalubridade em grau médio, adimplido pela reclamada. Sobre a prova técnica apresentada, a diligência foi realizada por perito de confiança do juízo, contando com o mapeamento das condições de trabalho para o qual foi oportunizada a participação das partes Foram relatados os produtos, EPIs e rotina de trabalho, assim como eventuais agentes de contato e o correto alcance interpretativo sobre produtos químicos e biológicos. A conclusão do perito atende ao convencimento do Juízo considerando a subsunção à NR 15. Em destaque: Foram encontradas fontes e exposição aos agentes biológicos constantes no anexo XIV da NR 15 da Portaria 3.214/78 do Ministério do Trabalho. O autor esteve exposto aos agentes biológicos de forma permanente, pois fazia parte de suas atividades habituais retirar o lixo infectante da farmácia e das salas de exames, além da limpeza dos banheiros dos colaboradores do hospital. Estas atividades foram confirmadas pelo paradigma e pelos representantes da Reclamada. O autor não realizava a limpeza dos leitos de internação e nem leitos para pacientes em isolamento. (...) O Reclamante utilizava produtos de limpeza domissanitários diluídos em água pela líder da limpeza. Os produtos de limpeza utilizados pelo Reclamante eram o desinfetante Peroxy Hospitalar. As substâncias químicas que compõem os produtos não são mencionadas no anexo XIII A da NR-15 como insalubres e os produtos de limpeza eram diluídos em água por diluidor mecânico. A diluição diminui a concentração dos produtos, reduzindo a nocividade do agente agressor ao trabalhador. Assim, não houve exposição aos agentes químicos avaliados, conforme anexo XIII A da NR-15. A dicção da NR 15, anexo 14, é explicita ao elencar o manuseio de material infectante como atividade exposta a insalubridade em grau médio: Trabalhos e operações em contato permanente com pacientes, animais ou com material infecto-contagiante, em: - hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana (aplica-se unicamente ao pessoal que tenha contato com os pacientes, bem como aos que manuseiam objetos de uso desses pacientes, não previamente esterilizados); Não há falar, contudo, em exposição a agente que enseje a percepção do adicional em grau máximo. Essa majoração exige necessariamente o ingresso em unidade de isolamento para atendimento de pacientes com doenças infectocontagiosas, conforme anexo 14 da NR 15. Qualquer outra unidade do hospital, mesmo que haja ocasional contato com pacientes com doenças infectocontagiosas, não autoriza o enquadramento pretendido. A majoração decorre necessariamente de trabalho em unidade de isolamento para atendimento de pacientes com doenças infectocontagiosas e não da conjectura de exposição. No mais, a dicção da NR 15, anexo 14, é explicita ao elencar como atividade exposta a insalubridade em grau máximo a coleta e industrialização de lixo urbano (coleta e industrialização) e o contato permanente com esgoto (galerias e tanques), o que não é o caso dos autos. Como se nota pelos grifos, ao enquadramento está fora do contexto da norma, a considerar que a limpeza de banheiro de uso exclusivo dos funcionários, que não representam ambientes de uso público e não se equiparam àquelas que se enquadram no disposto na NR-15, conforme entendimento cristalizado no item II da Súmula 448 do C. TST. Sobre o tema, segue a jurisprudência do C. TST: "RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.015/2014. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. LIMPEZA DE BANHEIROS DE USO RESTRITO E COLETA DE LIXO SANITÁRIO. PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 448, ITEM II, DO TST. I - O artigo 190 da CLT estabelece incumbir ao Ministério do Trabalho a aprovação do "quadro das atividades e operações insalubres", bem assim a definição dos limites de tolerância aos agentes agressivos, meios de proteção e tempo máximo de exposição do empregado a esses agentes. II - O contato com agentes biológicos está previsto no Anexo 14 da Norma Regulamentar 15 da Portaria 3.214/78 do MTE, no qual se insere a "coleta de lixo urbano". III - A atividade da recorrida, limpeza de banheiros de uso privativo de funcionários, não pode ser comparada à coleta urbana de dejetos, pois o lixo produzido em ambiente restrito, por universo reduzido de usuários, atrai o enquadramento como "lixo doméstico", próprio da limpeza de residências e escritórios e, por isso mesmo, incompatível com a previsão contida no aludido anexo. Inteligência do item II da Súmula 448 do TST. (...)" (RR-20615-57.2014.5.04.0010, 5ª Turma, Relator Desembargador Convocado Valdir Florindo, DEJT 07/04/2016). Diante disso, atendendo-se aos fins da norma, ao livre convencimento do juiz e à interpretação da NR 15, indefiro a majoração do adicional pretendida, pois o contrário resultaria monetizar risco inexistente. Prejudicados os pedidos correlatos. Contudo, incontroversa a exposição à agente insalubre a conferir ao empregado o direito a percepção do adicional em grau médio, deverá a reclamada fornecer cópia do perfil profissiográfico previdenciário atinente às condições de trabalho conforme as condições insalubres apuradas no laudo, em 30 dias após o trânsito em julgado, sob pena de multa diária de R$ 300,00, até o efetivo cumprimento, a ser executada a cada 15 dias. O Perfil Profissiográfico previdenciário registra as informações do meio ambiente de trabalho e as atividades desenvolvidas e deve ser preenchido pelas empresas que exercem atividades que exponham os empregados a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física. Jornada. A reclamada trouxe aos autos a integralidade dos espelhos de ponto às fls. 358 do pdf. Em seu depoimento, o reclamante confirmou que a realizava a marcação de forma biométrica, mediante recibo. Os controles de horários apresentados são provas documentais que demonstram variações de apontamentos, inclusive com anotação de sobrejornada. A controvérsia recai sobre os minutos antecedentes e posteriores ao registro. A parte autora alega imposição a troca de vestimenta e organização de carrinho em momento precedente ao registro no início da jornada, procedimento realizado ao final, quando já registrado o encerramento do turno. Em que pese reconhecida a obrigatoriedade de troca de vestimenta no local, não há elementos capazes de corroborar que o procedimento seria realizado sem o cômputo na jornada de trabalho. A única testemunha ouvida negou que a organização do carrinho e troca de vestimenta fosse realizada sem o computo do tempo para tanto despendido na jornada de trabalho. Não há como atribuir os minutos residuais todos os dias para efeito de troca de vestimenta e reposição de carrinho diante do depoimento prestado pela única testemunha ouvida. Ademais, o tempo está superestimado e em descompasso com a possibilidade de o fazer na própria jornada ou os minutos residuais conforme registrado nos espelhos. Não comprovada a prestação habitual de horas extraordinárias, não reconheço a nulidade do regime 12x36. Os minutos sobressalentes registrados nos espelhos refletem variação de jornada condizente com o que ordinariamente ocorre, sem capacidade para macular o regime de jornada especial, consagrada na área de atuação da parte autora, com expressa previsão normativa. No mais, ainda que se trate de funcionário que ao longo da integralidade do vínculo prestou serviços em ambiente insalubre, auferindo o correspondente adicional, há autorização prevista na norma coletiva aplicável à categoria, que conta com expressa menção a dispensa de realização de inspeção prévia autoridade competente na área de higiene do Trabalho. Com relação aos domingos em que tenha se ativado enquanto vinculado a escala 6 x 1, o domingo não se confunde com DSR. O reclamante trabalhava em regime que favorecia uma folga na semana, coincidente com um domingo no mês, conforme espelhos de ponto apresentados, nos termos do art. 6º da Lei 10101/2000. Indefiro. No tocante aos feriados, os demonstrativos de pagamento contemplam a quitação em dobro dos dias em que tenha se ativado. Não foram indicadas diferenças porventura devidas a justificar a postulação. No período em que cumprida a escala 12 x 36, forçoso lembrar que, com o advento da Lei 13.417/17, que inseriu nova redação no texto celetista (art. 59-A), o direcionamento do legislador é no sentido de compensação de eventual trabalho em feriados e domingos na escala doze por trinta e seis. Essa redação confronta a orientação jurisprudencial sobre o tema, que resulta de uma exegese anterior a essa alteração legislativa, logo, exigindo reanálise. Na Sessão Virtual de 23.6.2023 a 30.6.2023, o STF, por maioria, julgou improcedente a ADI 5994, nos termos do voto do Ministro Gilmar Mendes, vencidos os Ministros Marco Aurélio (Relator), Edson Fachin e Rosa Weber (Presidente). Portanto, ficou reconhecida a constitucionalidade do art. 59-A, da CLT, e do seu parágrafo único. Não reconheço a invalidade dos controles, tampouco o direito às horas extraordinárias, feriados e domingos tal como postulado na inicial. Prejudicado os pedidos correlatos. Rescisão. No caso dos autos, não foi comprovada falta patronal a justificar o enquadramento dentre os motivos elencados no art. 483 da CLT. Considerando que o reclamante manifestou seu desinteresse em permanecer em atividade, dou por rompido o contrato de trabalho em 30.08.2024, por sua iniciativa. O último dia trabalhado pode ser extraído da narrativa exposta na exordial e na peça defensória. Na condição de demissionário, defiro saldo de salário (30 dias), férias proporcionais (7/12), com o terço constitucional e 13º salário (8/12). Sobre os recolhimentos de FGTS e multa de 40%, a importância do tema quanto a seu regular recolhimento não tira o ônus da parte postulante em indicar as diferenças devidas, detendo aptidão para tanto, com a juntada do extrato analítico da CEF. Importa acrescentar que a postulação de direito exige – ainda que de forma abstrata – a demonstração da lesão a justificar a tutela pretendida. A reclamada deverá proceder à anotação da CTPS digital e, subsidiariamente, em caso de comprovada impossibilidade, no documento físico correspondente. Para tanto, deverá observar o prazo de 10 (dez) dias, independentemente do trânsito em julgado, sob pena de multa de R$ 200,00 por dia de descumprimento, até o limite de 30 (trinta) dias, após os quais será aplicado o art. 39/CLT, ante o lapso. Diretamente ou por meio de seus procuradores constituídos nos autos, as partes deverão agir com mútua cooperação a esse fim, atendendo à diretriz do art. 6º/CPC. Prejudicados os pedidos de multas e guias, uma vez demissionário. PLR Os demonstrativos de pagamento apresentados comprovam o adimplemento de valores a título de PLR nos meses de julho de 2023 e janeiro de 2024, pelo período de apuração de janeiro a junho de 2023 e junho a dezembro de 2023; bem como no mês de julho de 2024, concernente ao período de apuração seguinte. A parte autora não apresentou diferenças porventura devidas, ônus que lhe competia conforme os meses trabalhados no período e os valores previstos consignados nas normas coletivas. Importa acrescentar que a postulação de direito exige – ainda que de forma abstrata – a demonstração da lesão a justificar a tutela pretendida. Nada a tutelar. Com relação ao período seguinte, contudo, a tese da reclamada de inelegibilidade ao recebimento da parcela remanescente em vista a modalidade da rescisão contratual não se sustenta diante dos elementos anteriormente analisados. Defiro PLR proporcional de 2024, observando-se os meses trabalhados no período e os valores previstos consignados nas normas coletivas, abatendo-se importâncias já pagas sob mesmo título, conforme fichas financeiras apresentadas. MULTA NORMATIVA Prejudicado o pedido de multa embasado no descumprimento de cláusula correlata a insalubridade postulada. No que se refere ao pagamento da PPR, seu cumprimento foi comprovado pela reclamada, restando devidas eventuais diferenças exclusivamente em razão do encerramento do vínculo em momento precedente a apuração, por ato do próprio autor. Não há mora imputável ao empregador. Indefiro. RESPONSABILIDADE. CORRECLAMADA. A responsabilidade subsidiária da tomadora de serviços se impõe como forma de se assegurar que esta cuide da idoneidade da empregadora. Há que se partir da ideia de que a terceirização de serviços não resulta em terceirização da responsabilidade. Nesse sentido alinha-se a Súmula n. 331 do C. TST. A tomadora permanece no polo passivo e, na inidoneidade ou na exaustão do patrimônio da prestadora, responderá subsidiariamente pelas verbas devidas, sem exceção. Significa que, embora não lhe seja devida a obrigação de fazer, responderá pelas punições dela decorrentes, por se tratar de conduta culposa do devedor principal, que se transfere ao tomador devido a seu ônus pela má escolha do prestador. Por oportuno, não há espaço à responsabilidade em terceiro grau. A responsabilidade subsidiária pressupõe o acionamento do devedor secundário diante do inadimplemento do principal. A responsabilidade na pessoa de seus sócios é exceção, depois da tentativa, sem êxito, de satisfação do crédito junto aos devedores estabelecidos no título executivo. JUSTIÇA GRATUITA Em se tratando de trabalhador que vive-do-trabalho e sem elemento presuntivo de hiperssuficiência a justificar o pagamento de custas e de emolumentos, concede-se o pedido de gratuidade processual, por entender existente a impossibilidade de demandar sem o prejuízo da subsistência própria ou de sua família. Interpretação sistemática e teleológica do artigo 4º, 7.115/83, artigo 1º, 5.584/70, artigo 14º, art. 790/CLT e art. 5º, incisos XXXV e LXXV, da Constituição Federal. De efeito imediato e vinculante (art. 102, § 2º, da CFR; art. 28, § único, da Lei 9.868/99), conforme decisão em ADI 5766, proferida pelo STF em 20.10.2021, a gratuidade não se compatibiliza com a condenação de honorários de sucumbência e honorários periciais nos moldes retratados pela Lei 13.467/2017. Na ADI 2028, apresentada pela CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE - HOSPITAIS, ESTABELECIMENTOS E SERVIÇOS – CNS, ao tratar de imunidade tributária, o STF promoveu sensível distinção entre entidades beneficentes de assistência social. Estabelece que a entidade prevista no art. 195, § 7º, da CRF não é equiparável ao conceito de entidade social sem fins lucrativos, retratada no art. 150, VI, também da CRF. O texto celetista, renovado pela Lei 13.417/17, em seus artigos 844, § 6º, e 899, § 10, versam literalmente sobre “entidades filantrópicas”. Para isso, está equiparando tais entidades àqueles sem condição de arcar com despesas processuais e preparo para interposição de recurso, o que equivaleria ao art. 150, IV, de abrangência mais restritiva. A concessão de CEBAS não a torna necessariamente filantrópica, isso porque a LC 187 permite atividades que não apenas a universalidade de atendimento (art. 5º) e exige requisitos alternativos contidos no art. 7º da mesma lei. A entidade filantrópica atua de forma inteiramente gratuita no interesse da sociedade e é mantida por doações. Vale destacar o seguinte acórdão desse Regional: AGRAVO DE PETIÇÃO. DISPENSA DE GARANTIA DA EXECUÇÃO ÀS ENTIDADES FILANTRÓPICAS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 884, § 6.º, DA CLT. ENTIDADE BENEFICENTE E ENTIDADE FILANTRÓPICA. DISTINÇÃO. AUSÊNCIA DE GARANTIA DO JUÍZO PELA EXECUTADA ENTIDADE BENEFICENTE. DESERÇÃO. O art. 884, § 6.º, da CLT, que dispensa da garantia da execução as entidades filantrópicas, deve ser interpretado restritivamente, porque sendo a execução animada pelo princípio da primazia do credor trabalhista, todos os atos executivos devem voltar-se à satisfação do crédito trabalhista, por meio de um processo célere e efetivo, em virtude de sua natureza alimentar. No aspecto, entidade beneficente e entidade filantrópica distinguem-se juridicamente, conforme reconhecido no âmbito da ADI 2.028, porque enquanto aquela atua em favor de terceiros distintos de seus gestores ou instituidores, com possibilidade de remuneração do seu serviço, a entidade filantrópica atua de forma inteiramente gratuita no interesse da sociedade, sendo mantida exclusivamente por meio de doações. Com efeito, o atendimento aos requisitos legais da Lei Complementar n.º 187/2021, mediante a renovação do CEBAS à agravante, revela, tão só, tratar-se de entidade beneficente, para fins de imunidade tributária, nos termos do art. 195, § 7.º, da CF, mas não faz dela - ré - uma entidade filantrópica. Para tanto, seria necessário demonstrar que os serviços que presta o são de forma totalmente gratuita, algo que não ocorre, notadamente por se tratar de instituição de ensino que, como bem ressaltou o MM. Juízo a quo, cobra pela prestação de seus serviços, inclusive na forma de mensalidade de seus alunos. Sendo entidade sem fins lucrativos, mas não filantrópica, deveria garantir o juízo e, por não fazê-lo, seu recurso é deserto. Agravo de Petição de que não se conhece. (TRT da 2ª Região; Processo: 1001217-37.2019.5.02.0706; Data: 30-05-2022; Órgão Julgador: 16ª Turma - Cadeira 3 - 16ª Turma; Relator(a): MARCIO MENDES GRANCONATO) No caso da segunda reclamada, existe nítida finalidade econômica, sem traço de exclusivo atendimento gratuito, afastando-se do conceito de filantropia. Age parcialmente em colaboração com o serviço público de saúde, a resultar imunidade tributária prevista na Constituição e lei, mas não tem o condão de afastar seu dever de recolher despesas processuais e eventual preparo em caso de interposição de recurso. Não reconheço o enquadramento da ré-executada no rol previsto no art. 884, § 5º, e 899, § 10, da CLT. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA Na forma do art. 791-A/CLT, a parte ré arcará com os honorários de sucumbência à razão de 10% sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, a ser apurada em fase própria na forma do art. 879/CLT. Foi declarada a inconstitucionalidade do trecho do art. 791-A, § 4º, da CLT, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, (ADI 5766 – STF, julgamento 20.10.2021 e Embargos Declaratórios de 21.6.2022, prevalecendo o voto do Ministro Alexandre de Moraes). Dessa forma, em se tratando de sucumbência recíproca (§ 3º, art. 791-A, CLT), a parte autora beneficiária de justiça gratuita responderá pelos honorários sucumbenciais de 10% sobre os valores atribuídos aos pedidos indeferidos ou extintos sem resolução do mérito depois de saneado o feito, a ser apurado em regular liquidação, que ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário (art. 791-B, §4º, da CLT, com supressão do trecho considerado inconstitucional). HONORÁRIOS PERICIAIS Fixo os honorários periciais em R$ 1.000,00, a cargo da parte autora, sucumbente na pretensão objeto da perícia. Declarada a inconstitucionalidade do art. 790-B, caput e § 4º, da CLT, (ADI 5766 – STF, julgamento 20.10.2021), oficie-se ao E. TRT para pagamento dos valores atinentes ao perito, na forma do artigo 141 do CNC, encaminhando as peças necessárias. Descontos Previdenciários Nos termos do art. 832, § 3º, da CLT, a contribuição previdenciária incidirá sobre verbas de natureza salarial, conforme art. 28 da Lei 8.212/91 e Decreto 3048/99. A indenização decorrente de garantia provisória de emprego, nos termos do art. 832, § 3º, da CLT e art. 28 da Lei 8.212/91, assim como do art. 214, § 9º, V, “h”, do Decreto 3.048/99, não há contribuição previdenciária. Assim, com base no artigo 43 da Lei 8.212/91, a reclamada deverá efetuar os recolhimentos previdenciários, mas autorizada a dedução dos valores cabíveis ao reclamante, porque o art. 33, § 5º, da Lei 8.212/91 não repassa ao empregador a responsabilidade pelo pagamento do valor relativo ao empregado, mas tão somente a responsabilidade pelo recolhimento (Súmula 368 do TST e OJ 363 da SDI-1). Por oportuno, eventual imunidade conforme a condição jurídica de entidade pública ou equiparada, ou isenção tributária decorrente de política fiscal (p.ex., SIMPLES), em fase própria, a parte ré deverá comprovar os parâmetros legais a lhe conferir tratamento diferenciado para os fins de recolhimento previdenciário, em todo o caso, alcançando exclusivamente a sua cota-parte. DESCONTOS FISCAIS O art. 12-A da Lei n. 7.713/88 dispõe sobre a obrigatoriedade de retenção do imposto sobre o montante dos rendimentos pagos, fazendo uso de tabela progressiva. Portanto, trata da tributação de rendimentos do trabalho e proventos de aposentadoria recebidos acumuladamente. Em caso de indenização decorrente de garantia provisória de emprego, nos termos do artigo 6°, V, da Lei n. 7.713/88 e artigo 39, XX, do Decreto 3000/99, não há incidência de imposto de renda. A Secretaria da Receita Federal do Brasil regulamentou citado dispositivo legal (Instrução Normativa n.º nº 1127/2011). Reforçou sua redação, por força do que dispôs em seu art. 3º. Estabelece a tributação pelo regime de competência (mês a mês), observando-se a tabela progressiva do imposto de renda. Assim, o cálculo do imposto de renda observa o regime de competência. Quanto à base de cálculo, deve ser observado o disposto no artigo 46, § 2°, da Lei 8.541/92, combinado com artigo 6° da Lei n. 7.713/88, no qual se excluem verbas indenizatórias e previdenciárias, assim como valores relativos ao FGTS. Não há tributação sobre as férias indenizadas, conforme entendimento sedimentado na S. 125 do C. STJ. O mesmo no tocante à sua incidência sobre os juros, tendo em vista sua natureza jurídica indenizatória, ainda que oriundos de condenação em pecúnia deferida em sentença (OJ nº 400 da SDI-1). JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA O julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) n.º 58, em 18.12.2020, estabeleceu uniformidade acerca do tema atinente à correção e recomposição do valor, adotando interpretação vinculante envolvendo os artigos 879, §7º e 899, §4º da CLT. Assim composta pela correção monetária e pelos juros de mora, a atualização dos créditos trabalhistas reconhecidos observará o índice IPCA-e do vencimento da obrigação (adotando-se entendimento contido na Súmula 381 do TST) até o ajuizamento da ação (fase pré-judicial) e, a partir de então, será observada a taxa SELIC (art. 13 da lei 9.065/95), nos termos do voto vencedor do relator Min. Gilmar Mendes (decisão de embargos de declaração). O entendimento exarado pelo STF aplica-se de forma imediata aos processos em curso, em fase de conhecimento. Para ente de natureza pública ou equivalente na qualidade de empregador - não se aplicando na condição de tomador de serviços com responsabilidade subsidiária -, o critério a ser adotado deve corresponder ao disposto na Emenda Constitucional 113, de 8 de dezembro de 2021, que em seu artigo 3º dispõe a aplicação do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC), acumulado mensalmente, para efeito de atualização monetária, remuneração do capital e compensação de mora. Logo, a SELIC será aplicada sobre toda a obrigação, superando o entendimento do STF a respeito da aplicação de IPCA na fase pré-processual. Em se tratando de indenização por dano moral, para a aferição do termo inicial da correção monetária, não há falar-se em época própria senão o momento do arbitramento, em decisão judicial, momento em que constituiu em mora o devedor, aplicando-se o índice correspondente. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA E PROCEDIMENTO EXECUTÓRIO Vigente, aplica-se o disposto no art. 879 da CLT no tocante à liquidação de sentença, de forma a (1) atender à grande demanda processual em fase de conhecimento deste Regional, (2) evitar equívocos no cálculo, ou na liquidação com base nos valores indicados pela inicial e (3) permitir o contraditório específico sobre o tema. Por oportuno, o valor atribuído à causa ou aos pedidos constitui apenas estimativa a partir da qual serão gerados efeitos para o fim de custas ou honorários sucumbenciais, não podendo ser confundido com o valor real a ser alcançado que somente poderá ser aferido em liquidação. A aplicação dos trâmites processuais atinentes à execução (p.ex.: art. 523 do CPC ou art. 880 da CLT) não é pertinente em fase de conhecimento. Trata-se de entendimento jurídico do Juízo, na ocasião de ingresso do feito na fase de execução. Entendo indevido conferir força de coisa julgada a procedimento processual. EMBARGOS DECLARATÓRIOS Importa observar que: (1) não há prequestionamento em primeira instância; (2) os embargos declaratórios não se prestam a rebater argumentos ou servem de instrumento de dialeticidade da sentença. Para o controle de eventual injustiça que entende sofrer há recurso próprio; (3) o magistrado não fica adstrito aos fundamentos declinados pelas partes. III. CONCLUSÃO. Pelo exposto, rejeito a preliminar arguida e, no mais, julgo PROCEDENTES EM PARTE as pretensões de EMIDIO JOSE FILHO contra SODEXO DO BRASIL COMERCIAL S.A.; FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, para: - reconhecer a ruptura contratual por iniciativa da parte autora, na condição de demissionária, em 30.08.2024. A reclamada deverá proceder à anotação da CTPS digital e, subsidiariamente, em caso de comprovada impossibilidade, no documento físico correspondente. Para tanto, deverá observar o prazo de 10 (dez) dias, independentemente do trânsito em julgado, sob pena de multa de R$ 200,00 por dia de descumprimento, até o limite de 30 (trinta) dias, após os quais será aplicado o art. 39/CLT, ante o lapso. Diretamente ou por meio de seus procuradores constituídos nos autos, as partes deverão agir com mútua cooperação a esse fim, atendendo à diretriz do art. 6º/CPC; – conceder justiça gratuita ao reclamante nos termos do artigo 790, § 3º, da CLT. De efeito imediato e vinculante (art. 102, § 2º, da CFR; art. 28, § único, da Lei 9.868/99), conforme decisão em ADI 5766, proferida pelo STF em 20.10.2021, a gratuidade não se compatibiliza com a condenação de honorários de sucumbência e honorários periciais nos moldes retratados pela Lei 13.467/2017; - a cargo da parte autora, sucumbente na pretensão objeto da perícia, fixo os honorários periciais em R$ 1.000,00, Declarada a inconstitucionalidade do art. 790-B, caput e § 4º, da CLT, (ADI 5766 – STF, julgamento 20.10.2021), oficie-se ao E. TRT para pagamento dos valores atinentes ao perito, na forma do artigo 141 do CNC, encaminhando as peças necessárias; – condenar a primeira reclamada e, subsidiariamente, a segunda reclamada no pagamento dos seguintes créditos: a) saldo de salário (30 dias), férias proporcionais (7/12), com o terço constitucional e 13º salário (8/12); b) PLR proporcional; Na forma do art. 791-A/CLT, a parte ré arcará com os honorários de sucumbência à razão de 10% sobre o valor da condenação, a ser apurada em regular liquidação de sentença na forma do art. 879/CLT. A parte autora beneficiária de justiça gratuita responderá pelos honorários sucumbenciais de 10% sobre os valores atribuídos aos pedidos indeferidos ou extintos sem resolução do mérito depois de saneado o feito, a ser apurado em regular liquidação, que ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade, conforme fundamentação. Os valores serão apurados em regular liquidação de sentença (art. 879/CLT), conforme fundamentação, autorizando o abatimento das importâncias pagas sob o mesmo título das verbas ora deferidas, desde que comprovadas nos autos na fase de conhecimento. Em caso de condenação de horas extraordinárias, adota-se o entendimento contido na OJ 415 da SDI-1. Assim composta pela correção monetária e pelos juros de mora, a atualização dos créditos trabalhistas reconhecidos observará o índice IPCA-e do vencimento da obrigação (adotando-se entendimento contido na Súmula 381 do TST) até o ajuizamento da ação (fase pré-judicial) e, a partir de então, será observada a taxa SELIC (art. 13 da lei 9.065/95), remetendo-se, no mais, aos termos da fundamentação, sobretudo em caso de Ente de Natureza Pública, com critério diferenciado a esse fim. O desconto previdenciário respeitará a cota do trabalhador, o salário de contribuição e o teto (Súmula 368, III, do TST e OJ n. 363 da SDI-1), observando-se o regime de competência, conforme fundamentação. Nos termos do art. 832, § 3º, da CLT, a contribuição previdenciária incidirá sobre verbas de natureza salarial, conforme art. 28 da Lei 8.212/91 e Decreto 3048/99. Autoriza-se a retenção do Imposto de Renda. A tributação observará o regime de competência (mês a mês), observando-se a tabela progressiva do imposto de renda, conforme fundamentação. Base de cálculo de acordo com artigo 46, § 2°, da Lei 8.541/92, combinado com artigo 6° da Lei n. 7.713/88, e entendimentos sedimentados nas Súmulas 125/STJ e OJ 400 da SDI-1. A correclamada responderá subsidiariamente, no caso de inidoneidade ou insuficiência patrimonial da primeira reclamada, além dos créditos trabalhistas, pelos recolhimentos legais e despesas processuais. Custas a cargo da reclamada, sobre R$ 5.000,00, no importe de R$ 100,00. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. Data supra. FABIO MOTERANI Juiz do Trabalho Substituto Intimado(s) / Citado(s) - FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE - SODEXO DO BRASIL COMERCIAL S.A.

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Alvaro Somensi Raimundo e outros x Edmilson Brito Rodrigues

ID: 343270072

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0011179-85.2009.4.01.3900

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

ALVARO SOMENSI RAIMUNDO E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI

Polo Passivo:

EDMILSON BRITO RODRIGUES

Acórdão

Advogados:

SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

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LUCAS MARTINS SALES

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

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SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

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LUCAS MARTINS SALES

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BRUNO BRASIL DE CARVALHO

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VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS

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PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMER… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314, VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A, BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A e ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A POLO PASSIVO:EDMILSON BRITO RODRIGUES e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A e SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recursos de apelação interpostos por Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.), por Alvaro Somensi Raimundo, por Edmilson Brito Rodrigues, por Luciene das Graças Miranda Medeiros, por Eliana Medeiros de Miranda, por Maria Zuila Bezerra Somensi e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará que, nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo MPF, julgou parcialmente procedente o pedido de condenação pela prática dos atos capitulados no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da Lei 8.429/1992, aplicando as sanções previstas no art. 12, II, da mesma Lei, em relação aos réus Futura Comércio e Representação Ltda., Alvaro Somensi Raimundo, Edmilson Brito Rodrigues, Luciene das Graças Miranda Medeiros, Eliana Medeiros de Miranda e Maria Zuila Bezerra Somensi e improcedente o pedido em relação à ré Francisca Guiomar Cruz da Silva (ID. 21017008, fls. 13/35). Sustentam os apelantes Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.) e Alvaro Somensi Raimundo, em síntese, a regularidade do procedimento de inexigibilidade da licitação, não havendo comprovação de indução, concorrência e locupletamento dos recorrentes na prática de atos de improbidade. Afirma ainda a ausência de provas robustas a evidenciar as irregularidades na execução do contrato realizado com a pessoa jurídica, baseando-se a acusação tão somente no depoimento de uma única testemunha. Diante da inexistência de dano ao erário e de dolo específico em suas condutas, pleiteiam a não configuração do ato imputado, com a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido, e, caso assim não se entenda, aponta que as sanções aplicadas são desproporcionais e desarrazoadas, devendo ser reduzida a sanção de ressarcimento ao erário (ID. 21017008, fls. 54/79). O apelante Edmilson Brito Rodrigues argumenta que a condenação por improbidade administrativa, nos termos do art. 10 da Lei 8.429/1992, exige a comprovação de dolo ou culpa do agente, caracterizando a responsabilidade como subjetiva, o que não ocorreu na espécie. Afirma que não agiu com dolo ou culpa na dispensa de licitação, pois como gestor municípal a sua conduta foi pautada nos elementos que lhe foram apresentados (solicitação da Secretária de Educação, parecer jurídico, atestado de exclusividade), todos com aparência de legalidade. Invoca jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a Lei de Improbidade visa punir o administrador desonesto, e não o inábil ou o que comete irregularidades sem a intenção de lesar o erário ou violar princípios administrativos (ID. 21017008, fls. 87/110). As apelantes Luciene das Graças Miranda Medeiros e Eliana Medeiros de Miranda apontam que o caso de dispensa de licitação se enquadra perfeitamente na hipótese do art. 25, inciso I, da Lei 8.666/1993, tendo em vista que se trata da aquisição de materiais de fornecedor exclusivo, que não se confunde com notória especialização. Arguem que não há prova do dano ao erário, requisito essencial para a condenação, pois que a acusação não se desincumbiu do ônus de provar que os livros não foram entregues. Sustentam por fim que a conduta das apelantes não se reveste de dolo, má-fé ou culpa grave, elementos subjetivos indispensáveis para a caracterização do ato de improbidade administrativa e que as contas do programa, incluindo a aquisição dos livros, foram apreciadas pelo FNDE sem que fossem encontradas irregularidades (ID. 21017008, fls. 114/129). A apelante Maria Zuila Bezerra Somensi sustenta a inexistência de provas, documentos ou depoimentos que comprovem sua participação, ainda que mínima, nos atos imputados, no processo licitatório ou em qualquer conluio. Alega, ainda, que a empresa Futura sofreu prejuízo, pois não recebeu o pagamento integral pelo material fornecido, o que motivou o ajuizamento de uma ação de cobrança contra a Prefeitura Municipal de Belém. Por fim, argumenta que não se materializaram os elementos objetivo (lesão ao erário) e subjetivo (dolo ou culpa) do ato de improbidade, uma vez que os livros foram devidamente entregues (ID. 21017008, fls. 134/139). Já o FNDE, em suas razões recursais, aduz que Francisca Guiomar Cruz da Silva foi indevidamente excluída da lide, muito embora tenha sido a responsável pela assinatura do contrato eivado de ilegalidade, ainda que respondendo pelo cargo de secretária de educação em substituição à titular. Afirma que a não decretação da indisponibilidade dos bens dos requeridos durante o curso da marcha processual possibilitará que estes promovam a dilapidação de seu patrimônio, a fim de evitar a aplicação da lei (ID. 21017008, fls. 154/165). Com contrarrazões (ID. 21017008, fls. 177/195, fls. 198/201, fls. 211/217 e fls. 220/228). O Ministério Público Federal (PRR1) opina pelo não provimento das apelações (ID. 21017008, fls. 234/243). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: 1. MÉRITO Consta na petição inicial, em síntese, a realização de compra de materiais didáticos com dispensa indevida do procedimento licitatório, considerando a suposta exclusividade absoluta da empresa contratada e a preferência indevida das marcas editoriais por ela representadas, configurando atos que possuem tipificação nos arts. 10, VIII, IX e XI, e XII, da Lei 8.429/1992. Na sentença, o Juízo a quo asseverou que: (…) No caso sub judice, verifico pelo que consta do acervo probatório carreado aos autos, mormente do Procedimento Administrativo n° 1.23.000.000113/2004-97, documentos que corroboram a tese ministerial de prática de atos de improbidade administrativa praticados por parte dos requeridos, notadamente na pessoa do ex-gestor municipal, ora demandado Edmilson Brito Rodrigues, sendo que se apuraram diversas irregularidades após regular investigação e diligências empreendidas pelo Órgão Ministerial, tanto no que se refere à declaração de inexigibilidade indevida de licitação para aquisição de material didático - livros, destinados à execução do Projeto Recomeço/MEC/FNDE -, quanto durante a execução do contrato celebrado com a Empresa requerida Futura Comercio e Representação Ltda., inclusive com o pagamento do objeto contratado sem o adimplemento da respectiva obrigação em sua totalidade. Quanto à conduta dos gestores, verifico dos autos que em 09/11/2004, por meio do Oficio n° 1451/04-GABS/SEMEC (fl. 187), a então Secretária Municipal de Educação, requerida Luciene das Graças Miranda Medeiros, solicitou diretamente ao então Prefeito, requerido Edmilson Brito Rodrigues, autorização para que fossem adquiridos livros didáticos para o Projeto Recomeço junto à Empresa demandada, sem a exigibilidade de processo licitatório, sob a evasiva de que a referida Empresa era representante exclusiva das Editoras Quinteto Editorial, FTD e Edjovem, solicitação esta que foi prontamente deferida pelo então Prefeito Municipal, numa decisão de apenas uma lauda, sem qualquer motivação, justificativa ou fundamentação plausível para que se declarasse a inexigibilidade licitatória tomada no mesmo dia do recebimento do oficio (Cf. processo n° 2900/2004, fl. 187, 188, 217, 220/224, 305/306). Quanto à requerida Francisca Guiomar Cruz da Silva, observo que não obstante tenha sido a representante do município quando da assinatura do contrato, fls. 220/224, sua condição de Secretária Municipal de Educação em exercício, portanto em caráter precário, por si só não permite concluir pela presença de adesão à conduta dos outros gestores, que de fato deram início ao processo de aquisição do material em desacordo com as normas licitatórias vigentes. Nesse sentido, a simples assinatura do contrato no contexto de um procedimento já em curso, inclusive com autorização do Prefeito, não se revela suficiente, por si só, para lhe imputar adesão ao ato irregular ante a ausência da demonstração da presença do elemento subjetivo de sua conduta. Assim, a partir do pedido expresso de contratação direta feito pela Secretária Municipal e autorizada expressamente e diretamente pelo Prefeito, e em completa inobservância aos ditames legais, o contrato fora celebrado entre a empresa demandada - representada pelos requeridos Alvaro Somensi Raimundo e Maria Zuila Bezerra Somensi - e a Secretaria Municipal de Educação - SEMEC objetivando a aquisição de 62.944 exemplares no quantitativo de 44.850 unidades da Editora FTD, 15.706 unidades da Editora EDjovem e 2.450 unidades da Editora Quinteto Editorial, sendo que esses valores deveriam ser pagos em três parcelas, a saber, uma entrada de R$ 336.210,5 até 15/12/2004, outra no valor de R$ 374.659,50 e até 22/12/2004 a última do quantum de R$ 538.301,40, perfazendo um montante total de R$ 1.249.171,45 (um milhão, duzentos e quarenta e nove mil, cento e setenta e um reais e quarenta e cinco centavos - Cf. Cláusula Terceira, item 3.1.4 e Cláusula Sexta, item 6.2 do Contrato. Anexo 1 de fls. 220/224 e Cf. Memorando n°095/2003, fls. 217 e 225). (...) No que diz respeito à alegada exclusividade da empresa ré, observo que de fato consta dos autos Cartas de Exclusividade Editorial emitidas pelas editoras das quais a Empresa demandada era representante (Cf. fls. 308/317) que, no entanto, revelam-se inserviveis a justificar a condição de exclusividade exigida legalmente - mormente para fins da inexigibilidade licitatória -, que obrigatoriamente deve ser efetuada mediante atestado idôneo fornecido pelo respectivo órgão de registro do comércio do local - no caso, a JUCEPA -, devendo estar vinculada à notória especialização e exclusividade do prestador de serviço contratado, nos termos como dispõe o art. 25, I da Lei n° 8.666/93. (...) Ressalte-se, ainda, que a lei, no que pese permitir a inexigibilidade licitatória - o que no caso não se comprovou -, veda expressamente a preferência por marcas, sejam elas quais forem, e mesmo que se pretendesse emprestar - o que não se pode - um mínimo de razoabilidade à escolha do gestor, tal juízo restaria prejudicado, vez que não se verificou nenhuma justificativa quanto à escolha das 'marcas' dos livros destinados a atender o Projeto, tampouco se registrara os motivos que levaram o Chefe do Executivo Municipal a ter sua preferência ou escolha por tais marcas e Empresa em detrimento das demais, ou o porquê de os livros escolhidos, se são melhores que os das demais editoras, ou se as outras empresas não tinham a plena capacidade de empreender a concorrência legal necessária a beneficiar o menor custo, qualidade e eficiência almejados pela Administração Pública. (...) Desse modo, escorreito se faz asseverar que a contratação empreendida pela Prefeitura Municipal de Belém/PA, na gestão do ex-Prefeito Edmilson Brito Rodrigues, sem a observância de um regular processo licitatório, violou de forma flagrante a Lei de Licitações Públicas, ofendendo-se, outrossim, os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insculpidos nos arts. 37, caput, da Carta Republicana, pois não se observou, em momento algum, a ocorrências das hipóteses elencadas nos arts. 25 e 26, III da Lei 8.666/93, visto que não restou demonstrada a inviabilidade de competição, a singularidade e exclusividade do serviço, a justificativa do preço ou o saldo orçamentário regular, tampouco que o trabalho da Empresa escolhida era o mais adequado à plena satisfação do objeto contratado, assim como comprovou-se de forma nítida a preferência pelas marcas editoriais, condutas expressamente vedadas pelas normas de regência. (...) Doutro modo, verifico que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, mediante o Oficio n° 111/2012-PROFE/FNDE (fl. 684-v), malgrado ter atestado que a situação do EJA/2003 no SISPCO estava regular (Cf. parecer de fl. 700/772), expressamente consignou que a execução e prestação de constas do PEJA/2004 constavam como inadimplente, e que houve comprovação de diversas irregularidades de gestão e administração em sua execução (Cf. comunicado de fls. 773/798). Além disso, comprovou-se a aquisição de produtos e serviços não permitidos pelo Programa e completamente dissociados de sua finalidade, tais como, camisetas, bonés, produção de CD's, DVD's, apresentações culturais, etc, sendo que o ex-Prefeito, quando instado, não atendeu às solicitações das auditorias realizadas pelo FNDE para sanar as irregularidades por ele apuradas, tendo inclusive continuado a empreender de forma indevida e ilegal a utilização dos recursos do Programa governamental, contrariando todas as normas de regência, inclusive, a do art. 5º da Resolução/CD/FNDE/2004, causando prejuízo - além das irregularidades contratuais quanto aos valores repassados -, na ordem de R$ 61.245,60, que até 30/04/2008 encontrava-se na órbita de R$ 72.902,07 (Cf. demonstrativo de débito, fls. 790/794), no que diz respeito, especificamente à prestação de contas do PEJA/2004, sendo, inclusive, solicitada a Tomada de Constas Especiais (Cf. fls. 814/815) ante as irregularidades apontadas. (…). Analisando a questão, verifico que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; (...). Do que se extrai, pois, do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. No entanto, essa revogação não alcançará ações, iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a questão alusiva à revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Não obstante, pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. 2.1. Art. 10 da LIA Os apelantes foram condenados pela prática das condutas previstas no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, que, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, se encontrava expresso nos seguintes termos: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). Com a redação dada pela nova lei, o dispositivo ficou assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). A imputação se funda na dispensa de licitação para contratações públicas, sem o devido procedimento de dispensa, se baseando o parquet na ocorrência de dano presumido. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação ou o indevido fracionamento do objeto deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. Deste modo, a despeito das irregularidades formais narradas, consistentes na ausência de realização de licitação para a aquisição de matérial didático pelo Município, sem o devido procedimento de dispensa ou de inexigibilidade, sob o fundamento de impossibilidade jurídica da competição em razão da exclusividade do representante comercial, não restou comprovado o intuito dos agentes em lesar o erário. Cumpre frisar que, inexiste nos autos evidências de que a escolha dos títulos não foi de natureza pedagógica, visando dar continuidade a um projeto educacional já em andamento, tendo em vista que grande parte dos títulos já vinha sendo utilizada anteriormente no programa. De outro lado, a comprovação da exclusividade foi feita por meio de documentos hábeis, como declarações da Câmara Brasileira do Livro e das próprias editoras, discutindo o órgão julgador apenas a questão da exigência da exclusividade de forma absoluta sob o aspecto da regionalidade. A análise dos autos revela que a condenação se baseou na presunção de dano decorrente da inobservância das normas legais referentes à licitação, sem comprovação efetiva do prejuízo material concreto. Além disso, não há nos autos prova robusta da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ação de improbidade administrativa, por sua natureza sancionatória, exige um padrão probatório elevado para a condenação, sendo o ônus de provar o fato constitutivo do direito - no caso, a prática do ato ímprobo e o efetivo prejuízo ao erário – do Ministério Público Federal. No caso dos autos, a prova documental apresentada pelos apelantes (notas fiscais e de empenho) goza de presunção de veracidade e legitimidade. A liquidação da despesa pública, atestada pela emissão das notas de empenho, pressupõe a verificação do cumprimento da obrigação pelo credor e, para que seja desconstituída tal presunção, seria necessária uma prova robusta, clara e inequívoca em sentido contrário, o que não ocorreu na espécie. Após a expedição do Memorando/DRM/SEMEC 0032/2005, realizado em 24/02/2005, há relatório da comissão processante no Processo Administrativo 2.900/2004 indicando a entrega pela editora de 200 caixas de livros ainda não submetidos a auditoria física do material, o que fragiliza sobremaneira a conclusão de que houve falha na entrega, não se constatando que, de fato, o material não foi entregue. A ausência de oitiva das pessoas que efetivamente receberam os livros também milita em desfavor da tese da acusação. Ressalte-se, ainda, que o relatório de Auditoria 43/2006 do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE não indica qualquer irregularidade na aquisição de material didático no Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para atendimento à Educação de Jovens e Adultos - PEJA/2004, do qual faz parte o Projeto Recomeço, mas tão somente irregularidade na aquisição de outros produtos e serviços não permitidos pelo programa, indicando os produtos e serviços indevidos bem como o prejuízo causado ao erário. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, já que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). Porém o parquet não se desincumbiu do ônus de comprovar a perda patrimonial concreta. O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) Assim como a jurisprudência desta Corte. Confira-se: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in re ipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) Dessa forma, a ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. Ante o exposto, dou provimento às apelações dos réus para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido; e nego provimento à apelação do FNDE. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 APELANTES: EDMILSON BRITO RODRIGUES, ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA, ALVARO SOMENSI RAIMUNDO, E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO, MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI, LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS Advogado do(a) APELANTE: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314 Advogados do(a) APELANTE: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A Advogado do(a) APELANTE: BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A APELADOS: EDMILSON BRITO RODRIGUES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL Advogados do(a) APELADO: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ART. 10 DA LIA. DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. ATOS ÍMPROBOS NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO IMPROCEDENTE. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. APELAÇÃO DO FNDE NÃO PROVIDA. 1. Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na ação civil pública por ato de improbidade administrativa, condenando os réus pela prática dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, em razão de suposto favorecimento decorrente de dispensa indevida de licitação no Município de Belém/PA. 2. A questão em discussão: saber se houve dano efetivo ao erário apto a configurar ato de improbidade nos termos da Lei 8.429/1992, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021. 3. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (dano in re ipsa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 4. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. 5. Não há nos autos provas robustas da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. 6. A responsabilização por improbidade administrativa não pode se fundar em presunções ou meras irregularidades formais, sob pena de banalização do instituto. A propósito, os precedentes desta Corte têm sinalizado, de forma clara, que “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova”. 7. Apelações dos réus providas. Apelação do FNDE não provida. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações dos réus e negar provimento à apelação do FNDE. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 29/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado

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Alvaro Somensi Raimundo e outros x Edmilson Brito Rodrigues

ID: 343270107

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0011179-85.2009.4.01.3900

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

ALVARO SOMENSI RAIMUNDO E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI

Polo Passivo:

EDMILSON BRITO RODRIGUES

Acórdão

Advogados:

SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

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LUCAS MARTINS SALES

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

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SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

LUCAS MARTINS SALES

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BRUNO BRASIL DE CARVALHO

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VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS

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PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMER… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314, VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A, BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A e ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A POLO PASSIVO:EDMILSON BRITO RODRIGUES e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A e SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recursos de apelação interpostos por Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.), por Alvaro Somensi Raimundo, por Edmilson Brito Rodrigues, por Luciene das Graças Miranda Medeiros, por Eliana Medeiros de Miranda, por Maria Zuila Bezerra Somensi e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará que, nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo MPF, julgou parcialmente procedente o pedido de condenação pela prática dos atos capitulados no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da Lei 8.429/1992, aplicando as sanções previstas no art. 12, II, da mesma Lei, em relação aos réus Futura Comércio e Representação Ltda., Alvaro Somensi Raimundo, Edmilson Brito Rodrigues, Luciene das Graças Miranda Medeiros, Eliana Medeiros de Miranda e Maria Zuila Bezerra Somensi e improcedente o pedido em relação à ré Francisca Guiomar Cruz da Silva (ID. 21017008, fls. 13/35). Sustentam os apelantes Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.) e Alvaro Somensi Raimundo, em síntese, a regularidade do procedimento de inexigibilidade da licitação, não havendo comprovação de indução, concorrência e locupletamento dos recorrentes na prática de atos de improbidade. Afirma ainda a ausência de provas robustas a evidenciar as irregularidades na execução do contrato realizado com a pessoa jurídica, baseando-se a acusação tão somente no depoimento de uma única testemunha. Diante da inexistência de dano ao erário e de dolo específico em suas condutas, pleiteiam a não configuração do ato imputado, com a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido, e, caso assim não se entenda, aponta que as sanções aplicadas são desproporcionais e desarrazoadas, devendo ser reduzida a sanção de ressarcimento ao erário (ID. 21017008, fls. 54/79). O apelante Edmilson Brito Rodrigues argumenta que a condenação por improbidade administrativa, nos termos do art. 10 da Lei 8.429/1992, exige a comprovação de dolo ou culpa do agente, caracterizando a responsabilidade como subjetiva, o que não ocorreu na espécie. Afirma que não agiu com dolo ou culpa na dispensa de licitação, pois como gestor municípal a sua conduta foi pautada nos elementos que lhe foram apresentados (solicitação da Secretária de Educação, parecer jurídico, atestado de exclusividade), todos com aparência de legalidade. Invoca jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a Lei de Improbidade visa punir o administrador desonesto, e não o inábil ou o que comete irregularidades sem a intenção de lesar o erário ou violar princípios administrativos (ID. 21017008, fls. 87/110). As apelantes Luciene das Graças Miranda Medeiros e Eliana Medeiros de Miranda apontam que o caso de dispensa de licitação se enquadra perfeitamente na hipótese do art. 25, inciso I, da Lei 8.666/1993, tendo em vista que se trata da aquisição de materiais de fornecedor exclusivo, que não se confunde com notória especialização. Arguem que não há prova do dano ao erário, requisito essencial para a condenação, pois que a acusação não se desincumbiu do ônus de provar que os livros não foram entregues. Sustentam por fim que a conduta das apelantes não se reveste de dolo, má-fé ou culpa grave, elementos subjetivos indispensáveis para a caracterização do ato de improbidade administrativa e que as contas do programa, incluindo a aquisição dos livros, foram apreciadas pelo FNDE sem que fossem encontradas irregularidades (ID. 21017008, fls. 114/129). A apelante Maria Zuila Bezerra Somensi sustenta a inexistência de provas, documentos ou depoimentos que comprovem sua participação, ainda que mínima, nos atos imputados, no processo licitatório ou em qualquer conluio. Alega, ainda, que a empresa Futura sofreu prejuízo, pois não recebeu o pagamento integral pelo material fornecido, o que motivou o ajuizamento de uma ação de cobrança contra a Prefeitura Municipal de Belém. Por fim, argumenta que não se materializaram os elementos objetivo (lesão ao erário) e subjetivo (dolo ou culpa) do ato de improbidade, uma vez que os livros foram devidamente entregues (ID. 21017008, fls. 134/139). Já o FNDE, em suas razões recursais, aduz que Francisca Guiomar Cruz da Silva foi indevidamente excluída da lide, muito embora tenha sido a responsável pela assinatura do contrato eivado de ilegalidade, ainda que respondendo pelo cargo de secretária de educação em substituição à titular. Afirma que a não decretação da indisponibilidade dos bens dos requeridos durante o curso da marcha processual possibilitará que estes promovam a dilapidação de seu patrimônio, a fim de evitar a aplicação da lei (ID. 21017008, fls. 154/165). Com contrarrazões (ID. 21017008, fls. 177/195, fls. 198/201, fls. 211/217 e fls. 220/228). O Ministério Público Federal (PRR1) opina pelo não provimento das apelações (ID. 21017008, fls. 234/243). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: 1. MÉRITO Consta na petição inicial, em síntese, a realização de compra de materiais didáticos com dispensa indevida do procedimento licitatório, considerando a suposta exclusividade absoluta da empresa contratada e a preferência indevida das marcas editoriais por ela representadas, configurando atos que possuem tipificação nos arts. 10, VIII, IX e XI, e XII, da Lei 8.429/1992. Na sentença, o Juízo a quo asseverou que: (…) No caso sub judice, verifico pelo que consta do acervo probatório carreado aos autos, mormente do Procedimento Administrativo n° 1.23.000.000113/2004-97, documentos que corroboram a tese ministerial de prática de atos de improbidade administrativa praticados por parte dos requeridos, notadamente na pessoa do ex-gestor municipal, ora demandado Edmilson Brito Rodrigues, sendo que se apuraram diversas irregularidades após regular investigação e diligências empreendidas pelo Órgão Ministerial, tanto no que se refere à declaração de inexigibilidade indevida de licitação para aquisição de material didático - livros, destinados à execução do Projeto Recomeço/MEC/FNDE -, quanto durante a execução do contrato celebrado com a Empresa requerida Futura Comercio e Representação Ltda., inclusive com o pagamento do objeto contratado sem o adimplemento da respectiva obrigação em sua totalidade. Quanto à conduta dos gestores, verifico dos autos que em 09/11/2004, por meio do Oficio n° 1451/04-GABS/SEMEC (fl. 187), a então Secretária Municipal de Educação, requerida Luciene das Graças Miranda Medeiros, solicitou diretamente ao então Prefeito, requerido Edmilson Brito Rodrigues, autorização para que fossem adquiridos livros didáticos para o Projeto Recomeço junto à Empresa demandada, sem a exigibilidade de processo licitatório, sob a evasiva de que a referida Empresa era representante exclusiva das Editoras Quinteto Editorial, FTD e Edjovem, solicitação esta que foi prontamente deferida pelo então Prefeito Municipal, numa decisão de apenas uma lauda, sem qualquer motivação, justificativa ou fundamentação plausível para que se declarasse a inexigibilidade licitatória tomada no mesmo dia do recebimento do oficio (Cf. processo n° 2900/2004, fl. 187, 188, 217, 220/224, 305/306). Quanto à requerida Francisca Guiomar Cruz da Silva, observo que não obstante tenha sido a representante do município quando da assinatura do contrato, fls. 220/224, sua condição de Secretária Municipal de Educação em exercício, portanto em caráter precário, por si só não permite concluir pela presença de adesão à conduta dos outros gestores, que de fato deram início ao processo de aquisição do material em desacordo com as normas licitatórias vigentes. Nesse sentido, a simples assinatura do contrato no contexto de um procedimento já em curso, inclusive com autorização do Prefeito, não se revela suficiente, por si só, para lhe imputar adesão ao ato irregular ante a ausência da demonstração da presença do elemento subjetivo de sua conduta. Assim, a partir do pedido expresso de contratação direta feito pela Secretária Municipal e autorizada expressamente e diretamente pelo Prefeito, e em completa inobservância aos ditames legais, o contrato fora celebrado entre a empresa demandada - representada pelos requeridos Alvaro Somensi Raimundo e Maria Zuila Bezerra Somensi - e a Secretaria Municipal de Educação - SEMEC objetivando a aquisição de 62.944 exemplares no quantitativo de 44.850 unidades da Editora FTD, 15.706 unidades da Editora EDjovem e 2.450 unidades da Editora Quinteto Editorial, sendo que esses valores deveriam ser pagos em três parcelas, a saber, uma entrada de R$ 336.210,5 até 15/12/2004, outra no valor de R$ 374.659,50 e até 22/12/2004 a última do quantum de R$ 538.301,40, perfazendo um montante total de R$ 1.249.171,45 (um milhão, duzentos e quarenta e nove mil, cento e setenta e um reais e quarenta e cinco centavos - Cf. Cláusula Terceira, item 3.1.4 e Cláusula Sexta, item 6.2 do Contrato. Anexo 1 de fls. 220/224 e Cf. Memorando n°095/2003, fls. 217 e 225). (...) No que diz respeito à alegada exclusividade da empresa ré, observo que de fato consta dos autos Cartas de Exclusividade Editorial emitidas pelas editoras das quais a Empresa demandada era representante (Cf. fls. 308/317) que, no entanto, revelam-se inserviveis a justificar a condição de exclusividade exigida legalmente - mormente para fins da inexigibilidade licitatória -, que obrigatoriamente deve ser efetuada mediante atestado idôneo fornecido pelo respectivo órgão de registro do comércio do local - no caso, a JUCEPA -, devendo estar vinculada à notória especialização e exclusividade do prestador de serviço contratado, nos termos como dispõe o art. 25, I da Lei n° 8.666/93. (...) Ressalte-se, ainda, que a lei, no que pese permitir a inexigibilidade licitatória - o que no caso não se comprovou -, veda expressamente a preferência por marcas, sejam elas quais forem, e mesmo que se pretendesse emprestar - o que não se pode - um mínimo de razoabilidade à escolha do gestor, tal juízo restaria prejudicado, vez que não se verificou nenhuma justificativa quanto à escolha das 'marcas' dos livros destinados a atender o Projeto, tampouco se registrara os motivos que levaram o Chefe do Executivo Municipal a ter sua preferência ou escolha por tais marcas e Empresa em detrimento das demais, ou o porquê de os livros escolhidos, se são melhores que os das demais editoras, ou se as outras empresas não tinham a plena capacidade de empreender a concorrência legal necessária a beneficiar o menor custo, qualidade e eficiência almejados pela Administração Pública. (...) Desse modo, escorreito se faz asseverar que a contratação empreendida pela Prefeitura Municipal de Belém/PA, na gestão do ex-Prefeito Edmilson Brito Rodrigues, sem a observância de um regular processo licitatório, violou de forma flagrante a Lei de Licitações Públicas, ofendendo-se, outrossim, os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insculpidos nos arts. 37, caput, da Carta Republicana, pois não se observou, em momento algum, a ocorrências das hipóteses elencadas nos arts. 25 e 26, III da Lei 8.666/93, visto que não restou demonstrada a inviabilidade de competição, a singularidade e exclusividade do serviço, a justificativa do preço ou o saldo orçamentário regular, tampouco que o trabalho da Empresa escolhida era o mais adequado à plena satisfação do objeto contratado, assim como comprovou-se de forma nítida a preferência pelas marcas editoriais, condutas expressamente vedadas pelas normas de regência. (...) Doutro modo, verifico que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, mediante o Oficio n° 111/2012-PROFE/FNDE (fl. 684-v), malgrado ter atestado que a situação do EJA/2003 no SISPCO estava regular (Cf. parecer de fl. 700/772), expressamente consignou que a execução e prestação de constas do PEJA/2004 constavam como inadimplente, e que houve comprovação de diversas irregularidades de gestão e administração em sua execução (Cf. comunicado de fls. 773/798). Além disso, comprovou-se a aquisição de produtos e serviços não permitidos pelo Programa e completamente dissociados de sua finalidade, tais como, camisetas, bonés, produção de CD's, DVD's, apresentações culturais, etc, sendo que o ex-Prefeito, quando instado, não atendeu às solicitações das auditorias realizadas pelo FNDE para sanar as irregularidades por ele apuradas, tendo inclusive continuado a empreender de forma indevida e ilegal a utilização dos recursos do Programa governamental, contrariando todas as normas de regência, inclusive, a do art. 5º da Resolução/CD/FNDE/2004, causando prejuízo - além das irregularidades contratuais quanto aos valores repassados -, na ordem de R$ 61.245,60, que até 30/04/2008 encontrava-se na órbita de R$ 72.902,07 (Cf. demonstrativo de débito, fls. 790/794), no que diz respeito, especificamente à prestação de contas do PEJA/2004, sendo, inclusive, solicitada a Tomada de Constas Especiais (Cf. fls. 814/815) ante as irregularidades apontadas. (…). Analisando a questão, verifico que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; (...). Do que se extrai, pois, do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. No entanto, essa revogação não alcançará ações, iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a questão alusiva à revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Não obstante, pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. 2.1. Art. 10 da LIA Os apelantes foram condenados pela prática das condutas previstas no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, que, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, se encontrava expresso nos seguintes termos: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). Com a redação dada pela nova lei, o dispositivo ficou assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). A imputação se funda na dispensa de licitação para contratações públicas, sem o devido procedimento de dispensa, se baseando o parquet na ocorrência de dano presumido. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação ou o indevido fracionamento do objeto deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. Deste modo, a despeito das irregularidades formais narradas, consistentes na ausência de realização de licitação para a aquisição de matérial didático pelo Município, sem o devido procedimento de dispensa ou de inexigibilidade, sob o fundamento de impossibilidade jurídica da competição em razão da exclusividade do representante comercial, não restou comprovado o intuito dos agentes em lesar o erário. Cumpre frisar que, inexiste nos autos evidências de que a escolha dos títulos não foi de natureza pedagógica, visando dar continuidade a um projeto educacional já em andamento, tendo em vista que grande parte dos títulos já vinha sendo utilizada anteriormente no programa. De outro lado, a comprovação da exclusividade foi feita por meio de documentos hábeis, como declarações da Câmara Brasileira do Livro e das próprias editoras, discutindo o órgão julgador apenas a questão da exigência da exclusividade de forma absoluta sob o aspecto da regionalidade. A análise dos autos revela que a condenação se baseou na presunção de dano decorrente da inobservância das normas legais referentes à licitação, sem comprovação efetiva do prejuízo material concreto. Além disso, não há nos autos prova robusta da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ação de improbidade administrativa, por sua natureza sancionatória, exige um padrão probatório elevado para a condenação, sendo o ônus de provar o fato constitutivo do direito - no caso, a prática do ato ímprobo e o efetivo prejuízo ao erário – do Ministério Público Federal. No caso dos autos, a prova documental apresentada pelos apelantes (notas fiscais e de empenho) goza de presunção de veracidade e legitimidade. A liquidação da despesa pública, atestada pela emissão das notas de empenho, pressupõe a verificação do cumprimento da obrigação pelo credor e, para que seja desconstituída tal presunção, seria necessária uma prova robusta, clara e inequívoca em sentido contrário, o que não ocorreu na espécie. Após a expedição do Memorando/DRM/SEMEC 0032/2005, realizado em 24/02/2005, há relatório da comissão processante no Processo Administrativo 2.900/2004 indicando a entrega pela editora de 200 caixas de livros ainda não submetidos a auditoria física do material, o que fragiliza sobremaneira a conclusão de que houve falha na entrega, não se constatando que, de fato, o material não foi entregue. A ausência de oitiva das pessoas que efetivamente receberam os livros também milita em desfavor da tese da acusação. Ressalte-se, ainda, que o relatório de Auditoria 43/2006 do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE não indica qualquer irregularidade na aquisição de material didático no Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para atendimento à Educação de Jovens e Adultos - PEJA/2004, do qual faz parte o Projeto Recomeço, mas tão somente irregularidade na aquisição de outros produtos e serviços não permitidos pelo programa, indicando os produtos e serviços indevidos bem como o prejuízo causado ao erário. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, já que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). Porém o parquet não se desincumbiu do ônus de comprovar a perda patrimonial concreta. O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) Assim como a jurisprudência desta Corte. Confira-se: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in re ipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) Dessa forma, a ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. Ante o exposto, dou provimento às apelações dos réus para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido; e nego provimento à apelação do FNDE. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 APELANTES: EDMILSON BRITO RODRIGUES, ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA, ALVARO SOMENSI RAIMUNDO, E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO, MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI, LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS Advogado do(a) APELANTE: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314 Advogados do(a) APELANTE: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A Advogado do(a) APELANTE: BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A APELADOS: EDMILSON BRITO RODRIGUES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL Advogados do(a) APELADO: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ART. 10 DA LIA. DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. ATOS ÍMPROBOS NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO IMPROCEDENTE. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. APELAÇÃO DO FNDE NÃO PROVIDA. 1. Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na ação civil pública por ato de improbidade administrativa, condenando os réus pela prática dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, em razão de suposto favorecimento decorrente de dispensa indevida de licitação no Município de Belém/PA. 2. A questão em discussão: saber se houve dano efetivo ao erário apto a configurar ato de improbidade nos termos da Lei 8.429/1992, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021. 3. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (dano in re ipsa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 4. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. 5. Não há nos autos provas robustas da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. 6. A responsabilização por improbidade administrativa não pode se fundar em presunções ou meras irregularidades formais, sob pena de banalização do instituto. A propósito, os precedentes desta Corte têm sinalizado, de forma clara, que “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova”. 7. Apelações dos réus providas. Apelação do FNDE não provida. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações dos réus e negar provimento à apelação do FNDE. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 29/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado

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Alvaro Somensi Raimundo e outros x Edmilson Brito Rodrigues

ID: 343270115

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0011179-85.2009.4.01.3900

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

ALVARO SOMENSI RAIMUNDO E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI

Polo Passivo:

EDMILSON BRITO RODRIGUES

Acórdão

Advogados:

SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

LUCAS MARTINS SALES

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

LUCAS MARTINS SALES

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

BRUNO BRASIL DE CARVALHO

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMER… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314, VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A, BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A e ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A POLO PASSIVO:EDMILSON BRITO RODRIGUES e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A e SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recursos de apelação interpostos por Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.), por Alvaro Somensi Raimundo, por Edmilson Brito Rodrigues, por Luciene das Graças Miranda Medeiros, por Eliana Medeiros de Miranda, por Maria Zuila Bezerra Somensi e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará que, nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo MPF, julgou parcialmente procedente o pedido de condenação pela prática dos atos capitulados no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da Lei 8.429/1992, aplicando as sanções previstas no art. 12, II, da mesma Lei, em relação aos réus Futura Comércio e Representação Ltda., Alvaro Somensi Raimundo, Edmilson Brito Rodrigues, Luciene das Graças Miranda Medeiros, Eliana Medeiros de Miranda e Maria Zuila Bezerra Somensi e improcedente o pedido em relação à ré Francisca Guiomar Cruz da Silva (ID. 21017008, fls. 13/35). Sustentam os apelantes Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.) e Alvaro Somensi Raimundo, em síntese, a regularidade do procedimento de inexigibilidade da licitação, não havendo comprovação de indução, concorrência e locupletamento dos recorrentes na prática de atos de improbidade. Afirma ainda a ausência de provas robustas a evidenciar as irregularidades na execução do contrato realizado com a pessoa jurídica, baseando-se a acusação tão somente no depoimento de uma única testemunha. Diante da inexistência de dano ao erário e de dolo específico em suas condutas, pleiteiam a não configuração do ato imputado, com a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido, e, caso assim não se entenda, aponta que as sanções aplicadas são desproporcionais e desarrazoadas, devendo ser reduzida a sanção de ressarcimento ao erário (ID. 21017008, fls. 54/79). O apelante Edmilson Brito Rodrigues argumenta que a condenação por improbidade administrativa, nos termos do art. 10 da Lei 8.429/1992, exige a comprovação de dolo ou culpa do agente, caracterizando a responsabilidade como subjetiva, o que não ocorreu na espécie. Afirma que não agiu com dolo ou culpa na dispensa de licitação, pois como gestor municípal a sua conduta foi pautada nos elementos que lhe foram apresentados (solicitação da Secretária de Educação, parecer jurídico, atestado de exclusividade), todos com aparência de legalidade. Invoca jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a Lei de Improbidade visa punir o administrador desonesto, e não o inábil ou o que comete irregularidades sem a intenção de lesar o erário ou violar princípios administrativos (ID. 21017008, fls. 87/110). As apelantes Luciene das Graças Miranda Medeiros e Eliana Medeiros de Miranda apontam que o caso de dispensa de licitação se enquadra perfeitamente na hipótese do art. 25, inciso I, da Lei 8.666/1993, tendo em vista que se trata da aquisição de materiais de fornecedor exclusivo, que não se confunde com notória especialização. Arguem que não há prova do dano ao erário, requisito essencial para a condenação, pois que a acusação não se desincumbiu do ônus de provar que os livros não foram entregues. Sustentam por fim que a conduta das apelantes não se reveste de dolo, má-fé ou culpa grave, elementos subjetivos indispensáveis para a caracterização do ato de improbidade administrativa e que as contas do programa, incluindo a aquisição dos livros, foram apreciadas pelo FNDE sem que fossem encontradas irregularidades (ID. 21017008, fls. 114/129). A apelante Maria Zuila Bezerra Somensi sustenta a inexistência de provas, documentos ou depoimentos que comprovem sua participação, ainda que mínima, nos atos imputados, no processo licitatório ou em qualquer conluio. Alega, ainda, que a empresa Futura sofreu prejuízo, pois não recebeu o pagamento integral pelo material fornecido, o que motivou o ajuizamento de uma ação de cobrança contra a Prefeitura Municipal de Belém. Por fim, argumenta que não se materializaram os elementos objetivo (lesão ao erário) e subjetivo (dolo ou culpa) do ato de improbidade, uma vez que os livros foram devidamente entregues (ID. 21017008, fls. 134/139). Já o FNDE, em suas razões recursais, aduz que Francisca Guiomar Cruz da Silva foi indevidamente excluída da lide, muito embora tenha sido a responsável pela assinatura do contrato eivado de ilegalidade, ainda que respondendo pelo cargo de secretária de educação em substituição à titular. Afirma que a não decretação da indisponibilidade dos bens dos requeridos durante o curso da marcha processual possibilitará que estes promovam a dilapidação de seu patrimônio, a fim de evitar a aplicação da lei (ID. 21017008, fls. 154/165). Com contrarrazões (ID. 21017008, fls. 177/195, fls. 198/201, fls. 211/217 e fls. 220/228). O Ministério Público Federal (PRR1) opina pelo não provimento das apelações (ID. 21017008, fls. 234/243). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: 1. MÉRITO Consta na petição inicial, em síntese, a realização de compra de materiais didáticos com dispensa indevida do procedimento licitatório, considerando a suposta exclusividade absoluta da empresa contratada e a preferência indevida das marcas editoriais por ela representadas, configurando atos que possuem tipificação nos arts. 10, VIII, IX e XI, e XII, da Lei 8.429/1992. Na sentença, o Juízo a quo asseverou que: (…) No caso sub judice, verifico pelo que consta do acervo probatório carreado aos autos, mormente do Procedimento Administrativo n° 1.23.000.000113/2004-97, documentos que corroboram a tese ministerial de prática de atos de improbidade administrativa praticados por parte dos requeridos, notadamente na pessoa do ex-gestor municipal, ora demandado Edmilson Brito Rodrigues, sendo que se apuraram diversas irregularidades após regular investigação e diligências empreendidas pelo Órgão Ministerial, tanto no que se refere à declaração de inexigibilidade indevida de licitação para aquisição de material didático - livros, destinados à execução do Projeto Recomeço/MEC/FNDE -, quanto durante a execução do contrato celebrado com a Empresa requerida Futura Comercio e Representação Ltda., inclusive com o pagamento do objeto contratado sem o adimplemento da respectiva obrigação em sua totalidade. Quanto à conduta dos gestores, verifico dos autos que em 09/11/2004, por meio do Oficio n° 1451/04-GABS/SEMEC (fl. 187), a então Secretária Municipal de Educação, requerida Luciene das Graças Miranda Medeiros, solicitou diretamente ao então Prefeito, requerido Edmilson Brito Rodrigues, autorização para que fossem adquiridos livros didáticos para o Projeto Recomeço junto à Empresa demandada, sem a exigibilidade de processo licitatório, sob a evasiva de que a referida Empresa era representante exclusiva das Editoras Quinteto Editorial, FTD e Edjovem, solicitação esta que foi prontamente deferida pelo então Prefeito Municipal, numa decisão de apenas uma lauda, sem qualquer motivação, justificativa ou fundamentação plausível para que se declarasse a inexigibilidade licitatória tomada no mesmo dia do recebimento do oficio (Cf. processo n° 2900/2004, fl. 187, 188, 217, 220/224, 305/306). Quanto à requerida Francisca Guiomar Cruz da Silva, observo que não obstante tenha sido a representante do município quando da assinatura do contrato, fls. 220/224, sua condição de Secretária Municipal de Educação em exercício, portanto em caráter precário, por si só não permite concluir pela presença de adesão à conduta dos outros gestores, que de fato deram início ao processo de aquisição do material em desacordo com as normas licitatórias vigentes. Nesse sentido, a simples assinatura do contrato no contexto de um procedimento já em curso, inclusive com autorização do Prefeito, não se revela suficiente, por si só, para lhe imputar adesão ao ato irregular ante a ausência da demonstração da presença do elemento subjetivo de sua conduta. Assim, a partir do pedido expresso de contratação direta feito pela Secretária Municipal e autorizada expressamente e diretamente pelo Prefeito, e em completa inobservância aos ditames legais, o contrato fora celebrado entre a empresa demandada - representada pelos requeridos Alvaro Somensi Raimundo e Maria Zuila Bezerra Somensi - e a Secretaria Municipal de Educação - SEMEC objetivando a aquisição de 62.944 exemplares no quantitativo de 44.850 unidades da Editora FTD, 15.706 unidades da Editora EDjovem e 2.450 unidades da Editora Quinteto Editorial, sendo que esses valores deveriam ser pagos em três parcelas, a saber, uma entrada de R$ 336.210,5 até 15/12/2004, outra no valor de R$ 374.659,50 e até 22/12/2004 a última do quantum de R$ 538.301,40, perfazendo um montante total de R$ 1.249.171,45 (um milhão, duzentos e quarenta e nove mil, cento e setenta e um reais e quarenta e cinco centavos - Cf. Cláusula Terceira, item 3.1.4 e Cláusula Sexta, item 6.2 do Contrato. Anexo 1 de fls. 220/224 e Cf. Memorando n°095/2003, fls. 217 e 225). (...) No que diz respeito à alegada exclusividade da empresa ré, observo que de fato consta dos autos Cartas de Exclusividade Editorial emitidas pelas editoras das quais a Empresa demandada era representante (Cf. fls. 308/317) que, no entanto, revelam-se inserviveis a justificar a condição de exclusividade exigida legalmente - mormente para fins da inexigibilidade licitatória -, que obrigatoriamente deve ser efetuada mediante atestado idôneo fornecido pelo respectivo órgão de registro do comércio do local - no caso, a JUCEPA -, devendo estar vinculada à notória especialização e exclusividade do prestador de serviço contratado, nos termos como dispõe o art. 25, I da Lei n° 8.666/93. (...) Ressalte-se, ainda, que a lei, no que pese permitir a inexigibilidade licitatória - o que no caso não se comprovou -, veda expressamente a preferência por marcas, sejam elas quais forem, e mesmo que se pretendesse emprestar - o que não se pode - um mínimo de razoabilidade à escolha do gestor, tal juízo restaria prejudicado, vez que não se verificou nenhuma justificativa quanto à escolha das 'marcas' dos livros destinados a atender o Projeto, tampouco se registrara os motivos que levaram o Chefe do Executivo Municipal a ter sua preferência ou escolha por tais marcas e Empresa em detrimento das demais, ou o porquê de os livros escolhidos, se são melhores que os das demais editoras, ou se as outras empresas não tinham a plena capacidade de empreender a concorrência legal necessária a beneficiar o menor custo, qualidade e eficiência almejados pela Administração Pública. (...) Desse modo, escorreito se faz asseverar que a contratação empreendida pela Prefeitura Municipal de Belém/PA, na gestão do ex-Prefeito Edmilson Brito Rodrigues, sem a observância de um regular processo licitatório, violou de forma flagrante a Lei de Licitações Públicas, ofendendo-se, outrossim, os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insculpidos nos arts. 37, caput, da Carta Republicana, pois não se observou, em momento algum, a ocorrências das hipóteses elencadas nos arts. 25 e 26, III da Lei 8.666/93, visto que não restou demonstrada a inviabilidade de competição, a singularidade e exclusividade do serviço, a justificativa do preço ou o saldo orçamentário regular, tampouco que o trabalho da Empresa escolhida era o mais adequado à plena satisfação do objeto contratado, assim como comprovou-se de forma nítida a preferência pelas marcas editoriais, condutas expressamente vedadas pelas normas de regência. (...) Doutro modo, verifico que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, mediante o Oficio n° 111/2012-PROFE/FNDE (fl. 684-v), malgrado ter atestado que a situação do EJA/2003 no SISPCO estava regular (Cf. parecer de fl. 700/772), expressamente consignou que a execução e prestação de constas do PEJA/2004 constavam como inadimplente, e que houve comprovação de diversas irregularidades de gestão e administração em sua execução (Cf. comunicado de fls. 773/798). Além disso, comprovou-se a aquisição de produtos e serviços não permitidos pelo Programa e completamente dissociados de sua finalidade, tais como, camisetas, bonés, produção de CD's, DVD's, apresentações culturais, etc, sendo que o ex-Prefeito, quando instado, não atendeu às solicitações das auditorias realizadas pelo FNDE para sanar as irregularidades por ele apuradas, tendo inclusive continuado a empreender de forma indevida e ilegal a utilização dos recursos do Programa governamental, contrariando todas as normas de regência, inclusive, a do art. 5º da Resolução/CD/FNDE/2004, causando prejuízo - além das irregularidades contratuais quanto aos valores repassados -, na ordem de R$ 61.245,60, que até 30/04/2008 encontrava-se na órbita de R$ 72.902,07 (Cf. demonstrativo de débito, fls. 790/794), no que diz respeito, especificamente à prestação de contas do PEJA/2004, sendo, inclusive, solicitada a Tomada de Constas Especiais (Cf. fls. 814/815) ante as irregularidades apontadas. (…). Analisando a questão, verifico que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; (...). Do que se extrai, pois, do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. No entanto, essa revogação não alcançará ações, iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a questão alusiva à revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Não obstante, pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. 2.1. Art. 10 da LIA Os apelantes foram condenados pela prática das condutas previstas no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, que, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, se encontrava expresso nos seguintes termos: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). Com a redação dada pela nova lei, o dispositivo ficou assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). A imputação se funda na dispensa de licitação para contratações públicas, sem o devido procedimento de dispensa, se baseando o parquet na ocorrência de dano presumido. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação ou o indevido fracionamento do objeto deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. Deste modo, a despeito das irregularidades formais narradas, consistentes na ausência de realização de licitação para a aquisição de matérial didático pelo Município, sem o devido procedimento de dispensa ou de inexigibilidade, sob o fundamento de impossibilidade jurídica da competição em razão da exclusividade do representante comercial, não restou comprovado o intuito dos agentes em lesar o erário. Cumpre frisar que, inexiste nos autos evidências de que a escolha dos títulos não foi de natureza pedagógica, visando dar continuidade a um projeto educacional já em andamento, tendo em vista que grande parte dos títulos já vinha sendo utilizada anteriormente no programa. De outro lado, a comprovação da exclusividade foi feita por meio de documentos hábeis, como declarações da Câmara Brasileira do Livro e das próprias editoras, discutindo o órgão julgador apenas a questão da exigência da exclusividade de forma absoluta sob o aspecto da regionalidade. A análise dos autos revela que a condenação se baseou na presunção de dano decorrente da inobservância das normas legais referentes à licitação, sem comprovação efetiva do prejuízo material concreto. Além disso, não há nos autos prova robusta da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ação de improbidade administrativa, por sua natureza sancionatória, exige um padrão probatório elevado para a condenação, sendo o ônus de provar o fato constitutivo do direito - no caso, a prática do ato ímprobo e o efetivo prejuízo ao erário – do Ministério Público Federal. No caso dos autos, a prova documental apresentada pelos apelantes (notas fiscais e de empenho) goza de presunção de veracidade e legitimidade. A liquidação da despesa pública, atestada pela emissão das notas de empenho, pressupõe a verificação do cumprimento da obrigação pelo credor e, para que seja desconstituída tal presunção, seria necessária uma prova robusta, clara e inequívoca em sentido contrário, o que não ocorreu na espécie. Após a expedição do Memorando/DRM/SEMEC 0032/2005, realizado em 24/02/2005, há relatório da comissão processante no Processo Administrativo 2.900/2004 indicando a entrega pela editora de 200 caixas de livros ainda não submetidos a auditoria física do material, o que fragiliza sobremaneira a conclusão de que houve falha na entrega, não se constatando que, de fato, o material não foi entregue. A ausência de oitiva das pessoas que efetivamente receberam os livros também milita em desfavor da tese da acusação. Ressalte-se, ainda, que o relatório de Auditoria 43/2006 do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE não indica qualquer irregularidade na aquisição de material didático no Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para atendimento à Educação de Jovens e Adultos - PEJA/2004, do qual faz parte o Projeto Recomeço, mas tão somente irregularidade na aquisição de outros produtos e serviços não permitidos pelo programa, indicando os produtos e serviços indevidos bem como o prejuízo causado ao erário. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, já que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). Porém o parquet não se desincumbiu do ônus de comprovar a perda patrimonial concreta. O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) Assim como a jurisprudência desta Corte. Confira-se: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in re ipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) Dessa forma, a ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. Ante o exposto, dou provimento às apelações dos réus para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido; e nego provimento à apelação do FNDE. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 APELANTES: EDMILSON BRITO RODRIGUES, ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA, ALVARO SOMENSI RAIMUNDO, E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO, MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI, LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS Advogado do(a) APELANTE: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314 Advogados do(a) APELANTE: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A Advogado do(a) APELANTE: BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A APELADOS: EDMILSON BRITO RODRIGUES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL Advogados do(a) APELADO: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ART. 10 DA LIA. DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. ATOS ÍMPROBOS NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO IMPROCEDENTE. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. APELAÇÃO DO FNDE NÃO PROVIDA. 1. Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na ação civil pública por ato de improbidade administrativa, condenando os réus pela prática dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, em razão de suposto favorecimento decorrente de dispensa indevida de licitação no Município de Belém/PA. 2. A questão em discussão: saber se houve dano efetivo ao erário apto a configurar ato de improbidade nos termos da Lei 8.429/1992, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021. 3. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (dano in re ipsa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 4. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. 5. Não há nos autos provas robustas da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. 6. A responsabilização por improbidade administrativa não pode se fundar em presunções ou meras irregularidades formais, sob pena de banalização do instituto. A propósito, os precedentes desta Corte têm sinalizado, de forma clara, que “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova”. 7. Apelações dos réus providas. Apelação do FNDE não provida. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações dos réus e negar provimento à apelação do FNDE. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 29/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado

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Alvaro Somensi Raimundo e outros x Edmilson Brito Rodrigues

ID: 343270151

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0011179-85.2009.4.01.3900

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

ALVARO SOMENSI RAIMUNDO E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI

Polo Passivo:

EDMILSON BRITO RODRIGUES

Acórdão

Advogados:

SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

LUCAS MARTINS SALES

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

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SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

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LUCAS MARTINS SALES

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BRUNO BRASIL DE CARVALHO

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VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS

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PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMER… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314, VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A, BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A e ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A POLO PASSIVO:EDMILSON BRITO RODRIGUES e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A e SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recursos de apelação interpostos por Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.), por Alvaro Somensi Raimundo, por Edmilson Brito Rodrigues, por Luciene das Graças Miranda Medeiros, por Eliana Medeiros de Miranda, por Maria Zuila Bezerra Somensi e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará que, nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo MPF, julgou parcialmente procedente o pedido de condenação pela prática dos atos capitulados no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da Lei 8.429/1992, aplicando as sanções previstas no art. 12, II, da mesma Lei, em relação aos réus Futura Comércio e Representação Ltda., Alvaro Somensi Raimundo, Edmilson Brito Rodrigues, Luciene das Graças Miranda Medeiros, Eliana Medeiros de Miranda e Maria Zuila Bezerra Somensi e improcedente o pedido em relação à ré Francisca Guiomar Cruz da Silva (ID. 21017008, fls. 13/35). Sustentam os apelantes Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.) e Alvaro Somensi Raimundo, em síntese, a regularidade do procedimento de inexigibilidade da licitação, não havendo comprovação de indução, concorrência e locupletamento dos recorrentes na prática de atos de improbidade. Afirma ainda a ausência de provas robustas a evidenciar as irregularidades na execução do contrato realizado com a pessoa jurídica, baseando-se a acusação tão somente no depoimento de uma única testemunha. Diante da inexistência de dano ao erário e de dolo específico em suas condutas, pleiteiam a não configuração do ato imputado, com a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido, e, caso assim não se entenda, aponta que as sanções aplicadas são desproporcionais e desarrazoadas, devendo ser reduzida a sanção de ressarcimento ao erário (ID. 21017008, fls. 54/79). O apelante Edmilson Brito Rodrigues argumenta que a condenação por improbidade administrativa, nos termos do art. 10 da Lei 8.429/1992, exige a comprovação de dolo ou culpa do agente, caracterizando a responsabilidade como subjetiva, o que não ocorreu na espécie. Afirma que não agiu com dolo ou culpa na dispensa de licitação, pois como gestor municípal a sua conduta foi pautada nos elementos que lhe foram apresentados (solicitação da Secretária de Educação, parecer jurídico, atestado de exclusividade), todos com aparência de legalidade. Invoca jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a Lei de Improbidade visa punir o administrador desonesto, e não o inábil ou o que comete irregularidades sem a intenção de lesar o erário ou violar princípios administrativos (ID. 21017008, fls. 87/110). As apelantes Luciene das Graças Miranda Medeiros e Eliana Medeiros de Miranda apontam que o caso de dispensa de licitação se enquadra perfeitamente na hipótese do art. 25, inciso I, da Lei 8.666/1993, tendo em vista que se trata da aquisição de materiais de fornecedor exclusivo, que não se confunde com notória especialização. Arguem que não há prova do dano ao erário, requisito essencial para a condenação, pois que a acusação não se desincumbiu do ônus de provar que os livros não foram entregues. Sustentam por fim que a conduta das apelantes não se reveste de dolo, má-fé ou culpa grave, elementos subjetivos indispensáveis para a caracterização do ato de improbidade administrativa e que as contas do programa, incluindo a aquisição dos livros, foram apreciadas pelo FNDE sem que fossem encontradas irregularidades (ID. 21017008, fls. 114/129). A apelante Maria Zuila Bezerra Somensi sustenta a inexistência de provas, documentos ou depoimentos que comprovem sua participação, ainda que mínima, nos atos imputados, no processo licitatório ou em qualquer conluio. Alega, ainda, que a empresa Futura sofreu prejuízo, pois não recebeu o pagamento integral pelo material fornecido, o que motivou o ajuizamento de uma ação de cobrança contra a Prefeitura Municipal de Belém. Por fim, argumenta que não se materializaram os elementos objetivo (lesão ao erário) e subjetivo (dolo ou culpa) do ato de improbidade, uma vez que os livros foram devidamente entregues (ID. 21017008, fls. 134/139). Já o FNDE, em suas razões recursais, aduz que Francisca Guiomar Cruz da Silva foi indevidamente excluída da lide, muito embora tenha sido a responsável pela assinatura do contrato eivado de ilegalidade, ainda que respondendo pelo cargo de secretária de educação em substituição à titular. Afirma que a não decretação da indisponibilidade dos bens dos requeridos durante o curso da marcha processual possibilitará que estes promovam a dilapidação de seu patrimônio, a fim de evitar a aplicação da lei (ID. 21017008, fls. 154/165). Com contrarrazões (ID. 21017008, fls. 177/195, fls. 198/201, fls. 211/217 e fls. 220/228). O Ministério Público Federal (PRR1) opina pelo não provimento das apelações (ID. 21017008, fls. 234/243). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: 1. MÉRITO Consta na petição inicial, em síntese, a realização de compra de materiais didáticos com dispensa indevida do procedimento licitatório, considerando a suposta exclusividade absoluta da empresa contratada e a preferência indevida das marcas editoriais por ela representadas, configurando atos que possuem tipificação nos arts. 10, VIII, IX e XI, e XII, da Lei 8.429/1992. Na sentença, o Juízo a quo asseverou que: (…) No caso sub judice, verifico pelo que consta do acervo probatório carreado aos autos, mormente do Procedimento Administrativo n° 1.23.000.000113/2004-97, documentos que corroboram a tese ministerial de prática de atos de improbidade administrativa praticados por parte dos requeridos, notadamente na pessoa do ex-gestor municipal, ora demandado Edmilson Brito Rodrigues, sendo que se apuraram diversas irregularidades após regular investigação e diligências empreendidas pelo Órgão Ministerial, tanto no que se refere à declaração de inexigibilidade indevida de licitação para aquisição de material didático - livros, destinados à execução do Projeto Recomeço/MEC/FNDE -, quanto durante a execução do contrato celebrado com a Empresa requerida Futura Comercio e Representação Ltda., inclusive com o pagamento do objeto contratado sem o adimplemento da respectiva obrigação em sua totalidade. Quanto à conduta dos gestores, verifico dos autos que em 09/11/2004, por meio do Oficio n° 1451/04-GABS/SEMEC (fl. 187), a então Secretária Municipal de Educação, requerida Luciene das Graças Miranda Medeiros, solicitou diretamente ao então Prefeito, requerido Edmilson Brito Rodrigues, autorização para que fossem adquiridos livros didáticos para o Projeto Recomeço junto à Empresa demandada, sem a exigibilidade de processo licitatório, sob a evasiva de que a referida Empresa era representante exclusiva das Editoras Quinteto Editorial, FTD e Edjovem, solicitação esta que foi prontamente deferida pelo então Prefeito Municipal, numa decisão de apenas uma lauda, sem qualquer motivação, justificativa ou fundamentação plausível para que se declarasse a inexigibilidade licitatória tomada no mesmo dia do recebimento do oficio (Cf. processo n° 2900/2004, fl. 187, 188, 217, 220/224, 305/306). Quanto à requerida Francisca Guiomar Cruz da Silva, observo que não obstante tenha sido a representante do município quando da assinatura do contrato, fls. 220/224, sua condição de Secretária Municipal de Educação em exercício, portanto em caráter precário, por si só não permite concluir pela presença de adesão à conduta dos outros gestores, que de fato deram início ao processo de aquisição do material em desacordo com as normas licitatórias vigentes. Nesse sentido, a simples assinatura do contrato no contexto de um procedimento já em curso, inclusive com autorização do Prefeito, não se revela suficiente, por si só, para lhe imputar adesão ao ato irregular ante a ausência da demonstração da presença do elemento subjetivo de sua conduta. Assim, a partir do pedido expresso de contratação direta feito pela Secretária Municipal e autorizada expressamente e diretamente pelo Prefeito, e em completa inobservância aos ditames legais, o contrato fora celebrado entre a empresa demandada - representada pelos requeridos Alvaro Somensi Raimundo e Maria Zuila Bezerra Somensi - e a Secretaria Municipal de Educação - SEMEC objetivando a aquisição de 62.944 exemplares no quantitativo de 44.850 unidades da Editora FTD, 15.706 unidades da Editora EDjovem e 2.450 unidades da Editora Quinteto Editorial, sendo que esses valores deveriam ser pagos em três parcelas, a saber, uma entrada de R$ 336.210,5 até 15/12/2004, outra no valor de R$ 374.659,50 e até 22/12/2004 a última do quantum de R$ 538.301,40, perfazendo um montante total de R$ 1.249.171,45 (um milhão, duzentos e quarenta e nove mil, cento e setenta e um reais e quarenta e cinco centavos - Cf. Cláusula Terceira, item 3.1.4 e Cláusula Sexta, item 6.2 do Contrato. Anexo 1 de fls. 220/224 e Cf. Memorando n°095/2003, fls. 217 e 225). (...) No que diz respeito à alegada exclusividade da empresa ré, observo que de fato consta dos autos Cartas de Exclusividade Editorial emitidas pelas editoras das quais a Empresa demandada era representante (Cf. fls. 308/317) que, no entanto, revelam-se inserviveis a justificar a condição de exclusividade exigida legalmente - mormente para fins da inexigibilidade licitatória -, que obrigatoriamente deve ser efetuada mediante atestado idôneo fornecido pelo respectivo órgão de registro do comércio do local - no caso, a JUCEPA -, devendo estar vinculada à notória especialização e exclusividade do prestador de serviço contratado, nos termos como dispõe o art. 25, I da Lei n° 8.666/93. (...) Ressalte-se, ainda, que a lei, no que pese permitir a inexigibilidade licitatória - o que no caso não se comprovou -, veda expressamente a preferência por marcas, sejam elas quais forem, e mesmo que se pretendesse emprestar - o que não se pode - um mínimo de razoabilidade à escolha do gestor, tal juízo restaria prejudicado, vez que não se verificou nenhuma justificativa quanto à escolha das 'marcas' dos livros destinados a atender o Projeto, tampouco se registrara os motivos que levaram o Chefe do Executivo Municipal a ter sua preferência ou escolha por tais marcas e Empresa em detrimento das demais, ou o porquê de os livros escolhidos, se são melhores que os das demais editoras, ou se as outras empresas não tinham a plena capacidade de empreender a concorrência legal necessária a beneficiar o menor custo, qualidade e eficiência almejados pela Administração Pública. (...) Desse modo, escorreito se faz asseverar que a contratação empreendida pela Prefeitura Municipal de Belém/PA, na gestão do ex-Prefeito Edmilson Brito Rodrigues, sem a observância de um regular processo licitatório, violou de forma flagrante a Lei de Licitações Públicas, ofendendo-se, outrossim, os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insculpidos nos arts. 37, caput, da Carta Republicana, pois não se observou, em momento algum, a ocorrências das hipóteses elencadas nos arts. 25 e 26, III da Lei 8.666/93, visto que não restou demonstrada a inviabilidade de competição, a singularidade e exclusividade do serviço, a justificativa do preço ou o saldo orçamentário regular, tampouco que o trabalho da Empresa escolhida era o mais adequado à plena satisfação do objeto contratado, assim como comprovou-se de forma nítida a preferência pelas marcas editoriais, condutas expressamente vedadas pelas normas de regência. (...) Doutro modo, verifico que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, mediante o Oficio n° 111/2012-PROFE/FNDE (fl. 684-v), malgrado ter atestado que a situação do EJA/2003 no SISPCO estava regular (Cf. parecer de fl. 700/772), expressamente consignou que a execução e prestação de constas do PEJA/2004 constavam como inadimplente, e que houve comprovação de diversas irregularidades de gestão e administração em sua execução (Cf. comunicado de fls. 773/798). Além disso, comprovou-se a aquisição de produtos e serviços não permitidos pelo Programa e completamente dissociados de sua finalidade, tais como, camisetas, bonés, produção de CD's, DVD's, apresentações culturais, etc, sendo que o ex-Prefeito, quando instado, não atendeu às solicitações das auditorias realizadas pelo FNDE para sanar as irregularidades por ele apuradas, tendo inclusive continuado a empreender de forma indevida e ilegal a utilização dos recursos do Programa governamental, contrariando todas as normas de regência, inclusive, a do art. 5º da Resolução/CD/FNDE/2004, causando prejuízo - além das irregularidades contratuais quanto aos valores repassados -, na ordem de R$ 61.245,60, que até 30/04/2008 encontrava-se na órbita de R$ 72.902,07 (Cf. demonstrativo de débito, fls. 790/794), no que diz respeito, especificamente à prestação de contas do PEJA/2004, sendo, inclusive, solicitada a Tomada de Constas Especiais (Cf. fls. 814/815) ante as irregularidades apontadas. (…). Analisando a questão, verifico que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; (...). Do que se extrai, pois, do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. No entanto, essa revogação não alcançará ações, iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a questão alusiva à revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Não obstante, pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. 2.1. Art. 10 da LIA Os apelantes foram condenados pela prática das condutas previstas no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, que, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, se encontrava expresso nos seguintes termos: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). Com a redação dada pela nova lei, o dispositivo ficou assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). A imputação se funda na dispensa de licitação para contratações públicas, sem o devido procedimento de dispensa, se baseando o parquet na ocorrência de dano presumido. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação ou o indevido fracionamento do objeto deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. Deste modo, a despeito das irregularidades formais narradas, consistentes na ausência de realização de licitação para a aquisição de matérial didático pelo Município, sem o devido procedimento de dispensa ou de inexigibilidade, sob o fundamento de impossibilidade jurídica da competição em razão da exclusividade do representante comercial, não restou comprovado o intuito dos agentes em lesar o erário. Cumpre frisar que, inexiste nos autos evidências de que a escolha dos títulos não foi de natureza pedagógica, visando dar continuidade a um projeto educacional já em andamento, tendo em vista que grande parte dos títulos já vinha sendo utilizada anteriormente no programa. De outro lado, a comprovação da exclusividade foi feita por meio de documentos hábeis, como declarações da Câmara Brasileira do Livro e das próprias editoras, discutindo o órgão julgador apenas a questão da exigência da exclusividade de forma absoluta sob o aspecto da regionalidade. A análise dos autos revela que a condenação se baseou na presunção de dano decorrente da inobservância das normas legais referentes à licitação, sem comprovação efetiva do prejuízo material concreto. Além disso, não há nos autos prova robusta da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ação de improbidade administrativa, por sua natureza sancionatória, exige um padrão probatório elevado para a condenação, sendo o ônus de provar o fato constitutivo do direito - no caso, a prática do ato ímprobo e o efetivo prejuízo ao erário – do Ministério Público Federal. No caso dos autos, a prova documental apresentada pelos apelantes (notas fiscais e de empenho) goza de presunção de veracidade e legitimidade. A liquidação da despesa pública, atestada pela emissão das notas de empenho, pressupõe a verificação do cumprimento da obrigação pelo credor e, para que seja desconstituída tal presunção, seria necessária uma prova robusta, clara e inequívoca em sentido contrário, o que não ocorreu na espécie. Após a expedição do Memorando/DRM/SEMEC 0032/2005, realizado em 24/02/2005, há relatório da comissão processante no Processo Administrativo 2.900/2004 indicando a entrega pela editora de 200 caixas de livros ainda não submetidos a auditoria física do material, o que fragiliza sobremaneira a conclusão de que houve falha na entrega, não se constatando que, de fato, o material não foi entregue. A ausência de oitiva das pessoas que efetivamente receberam os livros também milita em desfavor da tese da acusação. Ressalte-se, ainda, que o relatório de Auditoria 43/2006 do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE não indica qualquer irregularidade na aquisição de material didático no Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para atendimento à Educação de Jovens e Adultos - PEJA/2004, do qual faz parte o Projeto Recomeço, mas tão somente irregularidade na aquisição de outros produtos e serviços não permitidos pelo programa, indicando os produtos e serviços indevidos bem como o prejuízo causado ao erário. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, já que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). Porém o parquet não se desincumbiu do ônus de comprovar a perda patrimonial concreta. O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) Assim como a jurisprudência desta Corte. Confira-se: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in re ipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) Dessa forma, a ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. Ante o exposto, dou provimento às apelações dos réus para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido; e nego provimento à apelação do FNDE. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 APELANTES: EDMILSON BRITO RODRIGUES, ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA, ALVARO SOMENSI RAIMUNDO, E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO, MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI, LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS Advogado do(a) APELANTE: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314 Advogados do(a) APELANTE: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A Advogado do(a) APELANTE: BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A APELADOS: EDMILSON BRITO RODRIGUES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL Advogados do(a) APELADO: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ART. 10 DA LIA. DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. ATOS ÍMPROBOS NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO IMPROCEDENTE. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. APELAÇÃO DO FNDE NÃO PROVIDA. 1. Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na ação civil pública por ato de improbidade administrativa, condenando os réus pela prática dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, em razão de suposto favorecimento decorrente de dispensa indevida de licitação no Município de Belém/PA. 2. A questão em discussão: saber se houve dano efetivo ao erário apto a configurar ato de improbidade nos termos da Lei 8.429/1992, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021. 3. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (dano in re ipsa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 4. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. 5. Não há nos autos provas robustas da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. 6. A responsabilização por improbidade administrativa não pode se fundar em presunções ou meras irregularidades formais, sob pena de banalização do instituto. A propósito, os precedentes desta Corte têm sinalizado, de forma clara, que “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova”. 7. Apelações dos réus providas. Apelação do FNDE não provida. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações dos réus e negar provimento à apelação do FNDE. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 29/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado

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Alvaro Somensi Raimundo e outros x Edmilson Brito Rodrigues

ID: 343270161

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0011179-85.2009.4.01.3900

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

ALVARO SOMENSI RAIMUNDO E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI

Polo Passivo:

EDMILSON BRITO RODRIGUES

Acórdão

Advogados:

SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

LUCAS MARTINS SALES

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

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SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

LUCAS MARTINS SALES

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BRUNO BRASIL DE CARVALHO

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VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS

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PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMER… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314, VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A, BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A e ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A POLO PASSIVO:EDMILSON BRITO RODRIGUES e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A e SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recursos de apelação interpostos por Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.), por Alvaro Somensi Raimundo, por Edmilson Brito Rodrigues, por Luciene das Graças Miranda Medeiros, por Eliana Medeiros de Miranda, por Maria Zuila Bezerra Somensi e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará que, nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo MPF, julgou parcialmente procedente o pedido de condenação pela prática dos atos capitulados no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da Lei 8.429/1992, aplicando as sanções previstas no art. 12, II, da mesma Lei, em relação aos réus Futura Comércio e Representação Ltda., Alvaro Somensi Raimundo, Edmilson Brito Rodrigues, Luciene das Graças Miranda Medeiros, Eliana Medeiros de Miranda e Maria Zuila Bezerra Somensi e improcedente o pedido em relação à ré Francisca Guiomar Cruz da Silva (ID. 21017008, fls. 13/35). Sustentam os apelantes Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.) e Alvaro Somensi Raimundo, em síntese, a regularidade do procedimento de inexigibilidade da licitação, não havendo comprovação de indução, concorrência e locupletamento dos recorrentes na prática de atos de improbidade. Afirma ainda a ausência de provas robustas a evidenciar as irregularidades na execução do contrato realizado com a pessoa jurídica, baseando-se a acusação tão somente no depoimento de uma única testemunha. Diante da inexistência de dano ao erário e de dolo específico em suas condutas, pleiteiam a não configuração do ato imputado, com a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido, e, caso assim não se entenda, aponta que as sanções aplicadas são desproporcionais e desarrazoadas, devendo ser reduzida a sanção de ressarcimento ao erário (ID. 21017008, fls. 54/79). O apelante Edmilson Brito Rodrigues argumenta que a condenação por improbidade administrativa, nos termos do art. 10 da Lei 8.429/1992, exige a comprovação de dolo ou culpa do agente, caracterizando a responsabilidade como subjetiva, o que não ocorreu na espécie. Afirma que não agiu com dolo ou culpa na dispensa de licitação, pois como gestor municípal a sua conduta foi pautada nos elementos que lhe foram apresentados (solicitação da Secretária de Educação, parecer jurídico, atestado de exclusividade), todos com aparência de legalidade. Invoca jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a Lei de Improbidade visa punir o administrador desonesto, e não o inábil ou o que comete irregularidades sem a intenção de lesar o erário ou violar princípios administrativos (ID. 21017008, fls. 87/110). As apelantes Luciene das Graças Miranda Medeiros e Eliana Medeiros de Miranda apontam que o caso de dispensa de licitação se enquadra perfeitamente na hipótese do art. 25, inciso I, da Lei 8.666/1993, tendo em vista que se trata da aquisição de materiais de fornecedor exclusivo, que não se confunde com notória especialização. Arguem que não há prova do dano ao erário, requisito essencial para a condenação, pois que a acusação não se desincumbiu do ônus de provar que os livros não foram entregues. Sustentam por fim que a conduta das apelantes não se reveste de dolo, má-fé ou culpa grave, elementos subjetivos indispensáveis para a caracterização do ato de improbidade administrativa e que as contas do programa, incluindo a aquisição dos livros, foram apreciadas pelo FNDE sem que fossem encontradas irregularidades (ID. 21017008, fls. 114/129). A apelante Maria Zuila Bezerra Somensi sustenta a inexistência de provas, documentos ou depoimentos que comprovem sua participação, ainda que mínima, nos atos imputados, no processo licitatório ou em qualquer conluio. Alega, ainda, que a empresa Futura sofreu prejuízo, pois não recebeu o pagamento integral pelo material fornecido, o que motivou o ajuizamento de uma ação de cobrança contra a Prefeitura Municipal de Belém. Por fim, argumenta que não se materializaram os elementos objetivo (lesão ao erário) e subjetivo (dolo ou culpa) do ato de improbidade, uma vez que os livros foram devidamente entregues (ID. 21017008, fls. 134/139). Já o FNDE, em suas razões recursais, aduz que Francisca Guiomar Cruz da Silva foi indevidamente excluída da lide, muito embora tenha sido a responsável pela assinatura do contrato eivado de ilegalidade, ainda que respondendo pelo cargo de secretária de educação em substituição à titular. Afirma que a não decretação da indisponibilidade dos bens dos requeridos durante o curso da marcha processual possibilitará que estes promovam a dilapidação de seu patrimônio, a fim de evitar a aplicação da lei (ID. 21017008, fls. 154/165). Com contrarrazões (ID. 21017008, fls. 177/195, fls. 198/201, fls. 211/217 e fls. 220/228). O Ministério Público Federal (PRR1) opina pelo não provimento das apelações (ID. 21017008, fls. 234/243). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: 1. MÉRITO Consta na petição inicial, em síntese, a realização de compra de materiais didáticos com dispensa indevida do procedimento licitatório, considerando a suposta exclusividade absoluta da empresa contratada e a preferência indevida das marcas editoriais por ela representadas, configurando atos que possuem tipificação nos arts. 10, VIII, IX e XI, e XII, da Lei 8.429/1992. Na sentença, o Juízo a quo asseverou que: (…) No caso sub judice, verifico pelo que consta do acervo probatório carreado aos autos, mormente do Procedimento Administrativo n° 1.23.000.000113/2004-97, documentos que corroboram a tese ministerial de prática de atos de improbidade administrativa praticados por parte dos requeridos, notadamente na pessoa do ex-gestor municipal, ora demandado Edmilson Brito Rodrigues, sendo que se apuraram diversas irregularidades após regular investigação e diligências empreendidas pelo Órgão Ministerial, tanto no que se refere à declaração de inexigibilidade indevida de licitação para aquisição de material didático - livros, destinados à execução do Projeto Recomeço/MEC/FNDE -, quanto durante a execução do contrato celebrado com a Empresa requerida Futura Comercio e Representação Ltda., inclusive com o pagamento do objeto contratado sem o adimplemento da respectiva obrigação em sua totalidade. Quanto à conduta dos gestores, verifico dos autos que em 09/11/2004, por meio do Oficio n° 1451/04-GABS/SEMEC (fl. 187), a então Secretária Municipal de Educação, requerida Luciene das Graças Miranda Medeiros, solicitou diretamente ao então Prefeito, requerido Edmilson Brito Rodrigues, autorização para que fossem adquiridos livros didáticos para o Projeto Recomeço junto à Empresa demandada, sem a exigibilidade de processo licitatório, sob a evasiva de que a referida Empresa era representante exclusiva das Editoras Quinteto Editorial, FTD e Edjovem, solicitação esta que foi prontamente deferida pelo então Prefeito Municipal, numa decisão de apenas uma lauda, sem qualquer motivação, justificativa ou fundamentação plausível para que se declarasse a inexigibilidade licitatória tomada no mesmo dia do recebimento do oficio (Cf. processo n° 2900/2004, fl. 187, 188, 217, 220/224, 305/306). Quanto à requerida Francisca Guiomar Cruz da Silva, observo que não obstante tenha sido a representante do município quando da assinatura do contrato, fls. 220/224, sua condição de Secretária Municipal de Educação em exercício, portanto em caráter precário, por si só não permite concluir pela presença de adesão à conduta dos outros gestores, que de fato deram início ao processo de aquisição do material em desacordo com as normas licitatórias vigentes. Nesse sentido, a simples assinatura do contrato no contexto de um procedimento já em curso, inclusive com autorização do Prefeito, não se revela suficiente, por si só, para lhe imputar adesão ao ato irregular ante a ausência da demonstração da presença do elemento subjetivo de sua conduta. Assim, a partir do pedido expresso de contratação direta feito pela Secretária Municipal e autorizada expressamente e diretamente pelo Prefeito, e em completa inobservância aos ditames legais, o contrato fora celebrado entre a empresa demandada - representada pelos requeridos Alvaro Somensi Raimundo e Maria Zuila Bezerra Somensi - e a Secretaria Municipal de Educação - SEMEC objetivando a aquisição de 62.944 exemplares no quantitativo de 44.850 unidades da Editora FTD, 15.706 unidades da Editora EDjovem e 2.450 unidades da Editora Quinteto Editorial, sendo que esses valores deveriam ser pagos em três parcelas, a saber, uma entrada de R$ 336.210,5 até 15/12/2004, outra no valor de R$ 374.659,50 e até 22/12/2004 a última do quantum de R$ 538.301,40, perfazendo um montante total de R$ 1.249.171,45 (um milhão, duzentos e quarenta e nove mil, cento e setenta e um reais e quarenta e cinco centavos - Cf. Cláusula Terceira, item 3.1.4 e Cláusula Sexta, item 6.2 do Contrato. Anexo 1 de fls. 220/224 e Cf. Memorando n°095/2003, fls. 217 e 225). (...) No que diz respeito à alegada exclusividade da empresa ré, observo que de fato consta dos autos Cartas de Exclusividade Editorial emitidas pelas editoras das quais a Empresa demandada era representante (Cf. fls. 308/317) que, no entanto, revelam-se inserviveis a justificar a condição de exclusividade exigida legalmente - mormente para fins da inexigibilidade licitatória -, que obrigatoriamente deve ser efetuada mediante atestado idôneo fornecido pelo respectivo órgão de registro do comércio do local - no caso, a JUCEPA -, devendo estar vinculada à notória especialização e exclusividade do prestador de serviço contratado, nos termos como dispõe o art. 25, I da Lei n° 8.666/93. (...) Ressalte-se, ainda, que a lei, no que pese permitir a inexigibilidade licitatória - o que no caso não se comprovou -, veda expressamente a preferência por marcas, sejam elas quais forem, e mesmo que se pretendesse emprestar - o que não se pode - um mínimo de razoabilidade à escolha do gestor, tal juízo restaria prejudicado, vez que não se verificou nenhuma justificativa quanto à escolha das 'marcas' dos livros destinados a atender o Projeto, tampouco se registrara os motivos que levaram o Chefe do Executivo Municipal a ter sua preferência ou escolha por tais marcas e Empresa em detrimento das demais, ou o porquê de os livros escolhidos, se são melhores que os das demais editoras, ou se as outras empresas não tinham a plena capacidade de empreender a concorrência legal necessária a beneficiar o menor custo, qualidade e eficiência almejados pela Administração Pública. (...) Desse modo, escorreito se faz asseverar que a contratação empreendida pela Prefeitura Municipal de Belém/PA, na gestão do ex-Prefeito Edmilson Brito Rodrigues, sem a observância de um regular processo licitatório, violou de forma flagrante a Lei de Licitações Públicas, ofendendo-se, outrossim, os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insculpidos nos arts. 37, caput, da Carta Republicana, pois não se observou, em momento algum, a ocorrências das hipóteses elencadas nos arts. 25 e 26, III da Lei 8.666/93, visto que não restou demonstrada a inviabilidade de competição, a singularidade e exclusividade do serviço, a justificativa do preço ou o saldo orçamentário regular, tampouco que o trabalho da Empresa escolhida era o mais adequado à plena satisfação do objeto contratado, assim como comprovou-se de forma nítida a preferência pelas marcas editoriais, condutas expressamente vedadas pelas normas de regência. (...) Doutro modo, verifico que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, mediante o Oficio n° 111/2012-PROFE/FNDE (fl. 684-v), malgrado ter atestado que a situação do EJA/2003 no SISPCO estava regular (Cf. parecer de fl. 700/772), expressamente consignou que a execução e prestação de constas do PEJA/2004 constavam como inadimplente, e que houve comprovação de diversas irregularidades de gestão e administração em sua execução (Cf. comunicado de fls. 773/798). Além disso, comprovou-se a aquisição de produtos e serviços não permitidos pelo Programa e completamente dissociados de sua finalidade, tais como, camisetas, bonés, produção de CD's, DVD's, apresentações culturais, etc, sendo que o ex-Prefeito, quando instado, não atendeu às solicitações das auditorias realizadas pelo FNDE para sanar as irregularidades por ele apuradas, tendo inclusive continuado a empreender de forma indevida e ilegal a utilização dos recursos do Programa governamental, contrariando todas as normas de regência, inclusive, a do art. 5º da Resolução/CD/FNDE/2004, causando prejuízo - além das irregularidades contratuais quanto aos valores repassados -, na ordem de R$ 61.245,60, que até 30/04/2008 encontrava-se na órbita de R$ 72.902,07 (Cf. demonstrativo de débito, fls. 790/794), no que diz respeito, especificamente à prestação de contas do PEJA/2004, sendo, inclusive, solicitada a Tomada de Constas Especiais (Cf. fls. 814/815) ante as irregularidades apontadas. (…). Analisando a questão, verifico que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; (...). Do que se extrai, pois, do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. No entanto, essa revogação não alcançará ações, iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a questão alusiva à revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Não obstante, pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. 2.1. Art. 10 da LIA Os apelantes foram condenados pela prática das condutas previstas no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, que, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, se encontrava expresso nos seguintes termos: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). Com a redação dada pela nova lei, o dispositivo ficou assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). A imputação se funda na dispensa de licitação para contratações públicas, sem o devido procedimento de dispensa, se baseando o parquet na ocorrência de dano presumido. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação ou o indevido fracionamento do objeto deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. Deste modo, a despeito das irregularidades formais narradas, consistentes na ausência de realização de licitação para a aquisição de matérial didático pelo Município, sem o devido procedimento de dispensa ou de inexigibilidade, sob o fundamento de impossibilidade jurídica da competição em razão da exclusividade do representante comercial, não restou comprovado o intuito dos agentes em lesar o erário. Cumpre frisar que, inexiste nos autos evidências de que a escolha dos títulos não foi de natureza pedagógica, visando dar continuidade a um projeto educacional já em andamento, tendo em vista que grande parte dos títulos já vinha sendo utilizada anteriormente no programa. De outro lado, a comprovação da exclusividade foi feita por meio de documentos hábeis, como declarações da Câmara Brasileira do Livro e das próprias editoras, discutindo o órgão julgador apenas a questão da exigência da exclusividade de forma absoluta sob o aspecto da regionalidade. A análise dos autos revela que a condenação se baseou na presunção de dano decorrente da inobservância das normas legais referentes à licitação, sem comprovação efetiva do prejuízo material concreto. Além disso, não há nos autos prova robusta da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ação de improbidade administrativa, por sua natureza sancionatória, exige um padrão probatório elevado para a condenação, sendo o ônus de provar o fato constitutivo do direito - no caso, a prática do ato ímprobo e o efetivo prejuízo ao erário – do Ministério Público Federal. No caso dos autos, a prova documental apresentada pelos apelantes (notas fiscais e de empenho) goza de presunção de veracidade e legitimidade. A liquidação da despesa pública, atestada pela emissão das notas de empenho, pressupõe a verificação do cumprimento da obrigação pelo credor e, para que seja desconstituída tal presunção, seria necessária uma prova robusta, clara e inequívoca em sentido contrário, o que não ocorreu na espécie. Após a expedição do Memorando/DRM/SEMEC 0032/2005, realizado em 24/02/2005, há relatório da comissão processante no Processo Administrativo 2.900/2004 indicando a entrega pela editora de 200 caixas de livros ainda não submetidos a auditoria física do material, o que fragiliza sobremaneira a conclusão de que houve falha na entrega, não se constatando que, de fato, o material não foi entregue. A ausência de oitiva das pessoas que efetivamente receberam os livros também milita em desfavor da tese da acusação. Ressalte-se, ainda, que o relatório de Auditoria 43/2006 do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE não indica qualquer irregularidade na aquisição de material didático no Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para atendimento à Educação de Jovens e Adultos - PEJA/2004, do qual faz parte o Projeto Recomeço, mas tão somente irregularidade na aquisição de outros produtos e serviços não permitidos pelo programa, indicando os produtos e serviços indevidos bem como o prejuízo causado ao erário. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, já que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). Porém o parquet não se desincumbiu do ônus de comprovar a perda patrimonial concreta. O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) Assim como a jurisprudência desta Corte. Confira-se: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in re ipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) Dessa forma, a ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. Ante o exposto, dou provimento às apelações dos réus para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido; e nego provimento à apelação do FNDE. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 APELANTES: EDMILSON BRITO RODRIGUES, ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA, ALVARO SOMENSI RAIMUNDO, E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO, MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI, LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS Advogado do(a) APELANTE: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314 Advogados do(a) APELANTE: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A Advogado do(a) APELANTE: BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A APELADOS: EDMILSON BRITO RODRIGUES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL Advogados do(a) APELADO: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ART. 10 DA LIA. DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. ATOS ÍMPROBOS NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO IMPROCEDENTE. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. APELAÇÃO DO FNDE NÃO PROVIDA. 1. Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na ação civil pública por ato de improbidade administrativa, condenando os réus pela prática dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, em razão de suposto favorecimento decorrente de dispensa indevida de licitação no Município de Belém/PA. 2. A questão em discussão: saber se houve dano efetivo ao erário apto a configurar ato de improbidade nos termos da Lei 8.429/1992, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021. 3. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (dano in re ipsa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 4. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. 5. Não há nos autos provas robustas da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. 6. A responsabilização por improbidade administrativa não pode se fundar em presunções ou meras irregularidades formais, sob pena de banalização do instituto. A propósito, os precedentes desta Corte têm sinalizado, de forma clara, que “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova”. 7. Apelações dos réus providas. Apelação do FNDE não provida. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações dos réus e negar provimento à apelação do FNDE. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 29/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado

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Alvaro Somensi Raimundo e outros x Edmilson Brito Rodrigues

ID: 343270229

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0011179-85.2009.4.01.3900

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

ALVARO SOMENSI RAIMUNDO E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI

Polo Passivo:

EDMILSON BRITO RODRIGUES

Acórdão

Advogados:

SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

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LUCAS MARTINS SALES

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ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI

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SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA

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LUCAS MARTINS SALES

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BRUNO BRASIL DE CARVALHO

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VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS

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PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMER… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0011179-85.2009.4.01.3900 PROCESSO REFERÊNCIA: 0011179-85.2009.4.01.3900 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314, VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A, BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A e ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A POLO PASSIVO:EDMILSON BRITO RODRIGUES e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, ANDRE BRANDAO HENRIQUES MAIMONI - MT7040-A e SYLMARA SYMME LIMA DE ALMEIDA LEITE SILVA - PA11110-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recursos de apelação interpostos por Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.), por Alvaro Somensi Raimundo, por Edmilson Brito Rodrigues, por Luciene das Graças Miranda Medeiros, por Eliana Medeiros de Miranda, por Maria Zuila Bezerra Somensi e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará que, nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo MPF, julgou parcialmente procedente o pedido de condenação pela prática dos atos capitulados no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da Lei 8.429/1992, aplicando as sanções previstas no art. 12, II, da mesma Lei, em relação aos réus Futura Comércio e Representação Ltda., Alvaro Somensi Raimundo, Edmilson Brito Rodrigues, Luciene das Graças Miranda Medeiros, Eliana Medeiros de Miranda e Maria Zuila Bezerra Somensi e improcedente o pedido em relação à ré Francisca Guiomar Cruz da Silva (ID. 21017008, fls. 13/35). Sustentam os apelantes Futura Comércio e Representação Ltda. (denominação atual E & L de Souza Comérico de Livros Ltda.) e Alvaro Somensi Raimundo, em síntese, a regularidade do procedimento de inexigibilidade da licitação, não havendo comprovação de indução, concorrência e locupletamento dos recorrentes na prática de atos de improbidade. Afirma ainda a ausência de provas robustas a evidenciar as irregularidades na execução do contrato realizado com a pessoa jurídica, baseando-se a acusação tão somente no depoimento de uma única testemunha. Diante da inexistência de dano ao erário e de dolo específico em suas condutas, pleiteiam a não configuração do ato imputado, com a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido, e, caso assim não se entenda, aponta que as sanções aplicadas são desproporcionais e desarrazoadas, devendo ser reduzida a sanção de ressarcimento ao erário (ID. 21017008, fls. 54/79). O apelante Edmilson Brito Rodrigues argumenta que a condenação por improbidade administrativa, nos termos do art. 10 da Lei 8.429/1992, exige a comprovação de dolo ou culpa do agente, caracterizando a responsabilidade como subjetiva, o que não ocorreu na espécie. Afirma que não agiu com dolo ou culpa na dispensa de licitação, pois como gestor municípal a sua conduta foi pautada nos elementos que lhe foram apresentados (solicitação da Secretária de Educação, parecer jurídico, atestado de exclusividade), todos com aparência de legalidade. Invoca jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a Lei de Improbidade visa punir o administrador desonesto, e não o inábil ou o que comete irregularidades sem a intenção de lesar o erário ou violar princípios administrativos (ID. 21017008, fls. 87/110). As apelantes Luciene das Graças Miranda Medeiros e Eliana Medeiros de Miranda apontam que o caso de dispensa de licitação se enquadra perfeitamente na hipótese do art. 25, inciso I, da Lei 8.666/1993, tendo em vista que se trata da aquisição de materiais de fornecedor exclusivo, que não se confunde com notória especialização. Arguem que não há prova do dano ao erário, requisito essencial para a condenação, pois que a acusação não se desincumbiu do ônus de provar que os livros não foram entregues. Sustentam por fim que a conduta das apelantes não se reveste de dolo, má-fé ou culpa grave, elementos subjetivos indispensáveis para a caracterização do ato de improbidade administrativa e que as contas do programa, incluindo a aquisição dos livros, foram apreciadas pelo FNDE sem que fossem encontradas irregularidades (ID. 21017008, fls. 114/129). A apelante Maria Zuila Bezerra Somensi sustenta a inexistência de provas, documentos ou depoimentos que comprovem sua participação, ainda que mínima, nos atos imputados, no processo licitatório ou em qualquer conluio. Alega, ainda, que a empresa Futura sofreu prejuízo, pois não recebeu o pagamento integral pelo material fornecido, o que motivou o ajuizamento de uma ação de cobrança contra a Prefeitura Municipal de Belém. Por fim, argumenta que não se materializaram os elementos objetivo (lesão ao erário) e subjetivo (dolo ou culpa) do ato de improbidade, uma vez que os livros foram devidamente entregues (ID. 21017008, fls. 134/139). Já o FNDE, em suas razões recursais, aduz que Francisca Guiomar Cruz da Silva foi indevidamente excluída da lide, muito embora tenha sido a responsável pela assinatura do contrato eivado de ilegalidade, ainda que respondendo pelo cargo de secretária de educação em substituição à titular. Afirma que a não decretação da indisponibilidade dos bens dos requeridos durante o curso da marcha processual possibilitará que estes promovam a dilapidação de seu patrimônio, a fim de evitar a aplicação da lei (ID. 21017008, fls. 154/165). Com contrarrazões (ID. 21017008, fls. 177/195, fls. 198/201, fls. 211/217 e fls. 220/228). O Ministério Público Federal (PRR1) opina pelo não provimento das apelações (ID. 21017008, fls. 234/243). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: 1. MÉRITO Consta na petição inicial, em síntese, a realização de compra de materiais didáticos com dispensa indevida do procedimento licitatório, considerando a suposta exclusividade absoluta da empresa contratada e a preferência indevida das marcas editoriais por ela representadas, configurando atos que possuem tipificação nos arts. 10, VIII, IX e XI, e XII, da Lei 8.429/1992. Na sentença, o Juízo a quo asseverou que: (…) No caso sub judice, verifico pelo que consta do acervo probatório carreado aos autos, mormente do Procedimento Administrativo n° 1.23.000.000113/2004-97, documentos que corroboram a tese ministerial de prática de atos de improbidade administrativa praticados por parte dos requeridos, notadamente na pessoa do ex-gestor municipal, ora demandado Edmilson Brito Rodrigues, sendo que se apuraram diversas irregularidades após regular investigação e diligências empreendidas pelo Órgão Ministerial, tanto no que se refere à declaração de inexigibilidade indevida de licitação para aquisição de material didático - livros, destinados à execução do Projeto Recomeço/MEC/FNDE -, quanto durante a execução do contrato celebrado com a Empresa requerida Futura Comercio e Representação Ltda., inclusive com o pagamento do objeto contratado sem o adimplemento da respectiva obrigação em sua totalidade. Quanto à conduta dos gestores, verifico dos autos que em 09/11/2004, por meio do Oficio n° 1451/04-GABS/SEMEC (fl. 187), a então Secretária Municipal de Educação, requerida Luciene das Graças Miranda Medeiros, solicitou diretamente ao então Prefeito, requerido Edmilson Brito Rodrigues, autorização para que fossem adquiridos livros didáticos para o Projeto Recomeço junto à Empresa demandada, sem a exigibilidade de processo licitatório, sob a evasiva de que a referida Empresa era representante exclusiva das Editoras Quinteto Editorial, FTD e Edjovem, solicitação esta que foi prontamente deferida pelo então Prefeito Municipal, numa decisão de apenas uma lauda, sem qualquer motivação, justificativa ou fundamentação plausível para que se declarasse a inexigibilidade licitatória tomada no mesmo dia do recebimento do oficio (Cf. processo n° 2900/2004, fl. 187, 188, 217, 220/224, 305/306). Quanto à requerida Francisca Guiomar Cruz da Silva, observo que não obstante tenha sido a representante do município quando da assinatura do contrato, fls. 220/224, sua condição de Secretária Municipal de Educação em exercício, portanto em caráter precário, por si só não permite concluir pela presença de adesão à conduta dos outros gestores, que de fato deram início ao processo de aquisição do material em desacordo com as normas licitatórias vigentes. Nesse sentido, a simples assinatura do contrato no contexto de um procedimento já em curso, inclusive com autorização do Prefeito, não se revela suficiente, por si só, para lhe imputar adesão ao ato irregular ante a ausência da demonstração da presença do elemento subjetivo de sua conduta. Assim, a partir do pedido expresso de contratação direta feito pela Secretária Municipal e autorizada expressamente e diretamente pelo Prefeito, e em completa inobservância aos ditames legais, o contrato fora celebrado entre a empresa demandada - representada pelos requeridos Alvaro Somensi Raimundo e Maria Zuila Bezerra Somensi - e a Secretaria Municipal de Educação - SEMEC objetivando a aquisição de 62.944 exemplares no quantitativo de 44.850 unidades da Editora FTD, 15.706 unidades da Editora EDjovem e 2.450 unidades da Editora Quinteto Editorial, sendo que esses valores deveriam ser pagos em três parcelas, a saber, uma entrada de R$ 336.210,5 até 15/12/2004, outra no valor de R$ 374.659,50 e até 22/12/2004 a última do quantum de R$ 538.301,40, perfazendo um montante total de R$ 1.249.171,45 (um milhão, duzentos e quarenta e nove mil, cento e setenta e um reais e quarenta e cinco centavos - Cf. Cláusula Terceira, item 3.1.4 e Cláusula Sexta, item 6.2 do Contrato. Anexo 1 de fls. 220/224 e Cf. Memorando n°095/2003, fls. 217 e 225). (...) No que diz respeito à alegada exclusividade da empresa ré, observo que de fato consta dos autos Cartas de Exclusividade Editorial emitidas pelas editoras das quais a Empresa demandada era representante (Cf. fls. 308/317) que, no entanto, revelam-se inserviveis a justificar a condição de exclusividade exigida legalmente - mormente para fins da inexigibilidade licitatória -, que obrigatoriamente deve ser efetuada mediante atestado idôneo fornecido pelo respectivo órgão de registro do comércio do local - no caso, a JUCEPA -, devendo estar vinculada à notória especialização e exclusividade do prestador de serviço contratado, nos termos como dispõe o art. 25, I da Lei n° 8.666/93. (...) Ressalte-se, ainda, que a lei, no que pese permitir a inexigibilidade licitatória - o que no caso não se comprovou -, veda expressamente a preferência por marcas, sejam elas quais forem, e mesmo que se pretendesse emprestar - o que não se pode - um mínimo de razoabilidade à escolha do gestor, tal juízo restaria prejudicado, vez que não se verificou nenhuma justificativa quanto à escolha das 'marcas' dos livros destinados a atender o Projeto, tampouco se registrara os motivos que levaram o Chefe do Executivo Municipal a ter sua preferência ou escolha por tais marcas e Empresa em detrimento das demais, ou o porquê de os livros escolhidos, se são melhores que os das demais editoras, ou se as outras empresas não tinham a plena capacidade de empreender a concorrência legal necessária a beneficiar o menor custo, qualidade e eficiência almejados pela Administração Pública. (...) Desse modo, escorreito se faz asseverar que a contratação empreendida pela Prefeitura Municipal de Belém/PA, na gestão do ex-Prefeito Edmilson Brito Rodrigues, sem a observância de um regular processo licitatório, violou de forma flagrante a Lei de Licitações Públicas, ofendendo-se, outrossim, os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insculpidos nos arts. 37, caput, da Carta Republicana, pois não se observou, em momento algum, a ocorrências das hipóteses elencadas nos arts. 25 e 26, III da Lei 8.666/93, visto que não restou demonstrada a inviabilidade de competição, a singularidade e exclusividade do serviço, a justificativa do preço ou o saldo orçamentário regular, tampouco que o trabalho da Empresa escolhida era o mais adequado à plena satisfação do objeto contratado, assim como comprovou-se de forma nítida a preferência pelas marcas editoriais, condutas expressamente vedadas pelas normas de regência. (...) Doutro modo, verifico que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, mediante o Oficio n° 111/2012-PROFE/FNDE (fl. 684-v), malgrado ter atestado que a situação do EJA/2003 no SISPCO estava regular (Cf. parecer de fl. 700/772), expressamente consignou que a execução e prestação de constas do PEJA/2004 constavam como inadimplente, e que houve comprovação de diversas irregularidades de gestão e administração em sua execução (Cf. comunicado de fls. 773/798). Além disso, comprovou-se a aquisição de produtos e serviços não permitidos pelo Programa e completamente dissociados de sua finalidade, tais como, camisetas, bonés, produção de CD's, DVD's, apresentações culturais, etc, sendo que o ex-Prefeito, quando instado, não atendeu às solicitações das auditorias realizadas pelo FNDE para sanar as irregularidades por ele apuradas, tendo inclusive continuado a empreender de forma indevida e ilegal a utilização dos recursos do Programa governamental, contrariando todas as normas de regência, inclusive, a do art. 5º da Resolução/CD/FNDE/2004, causando prejuízo - além das irregularidades contratuais quanto aos valores repassados -, na ordem de R$ 61.245,60, que até 30/04/2008 encontrava-se na órbita de R$ 72.902,07 (Cf. demonstrativo de débito, fls. 790/794), no que diz respeito, especificamente à prestação de contas do PEJA/2004, sendo, inclusive, solicitada a Tomada de Constas Especiais (Cf. fls. 814/815) ante as irregularidades apontadas. (…). Analisando a questão, verifico que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; (...). Do que se extrai, pois, do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. No entanto, essa revogação não alcançará ações, iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a questão alusiva à revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Não obstante, pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. 2.1. Art. 10 da LIA Os apelantes foram condenados pela prática das condutas previstas no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, que, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, se encontrava expresso nos seguintes termos: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). Com a redação dada pela nova lei, o dispositivo ficou assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (…) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...). A imputação se funda na dispensa de licitação para contratações públicas, sem o devido procedimento de dispensa, se baseando o parquet na ocorrência de dano presumido. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação ou o indevido fracionamento do objeto deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. Deste modo, a despeito das irregularidades formais narradas, consistentes na ausência de realização de licitação para a aquisição de matérial didático pelo Município, sem o devido procedimento de dispensa ou de inexigibilidade, sob o fundamento de impossibilidade jurídica da competição em razão da exclusividade do representante comercial, não restou comprovado o intuito dos agentes em lesar o erário. Cumpre frisar que, inexiste nos autos evidências de que a escolha dos títulos não foi de natureza pedagógica, visando dar continuidade a um projeto educacional já em andamento, tendo em vista que grande parte dos títulos já vinha sendo utilizada anteriormente no programa. De outro lado, a comprovação da exclusividade foi feita por meio de documentos hábeis, como declarações da Câmara Brasileira do Livro e das próprias editoras, discutindo o órgão julgador apenas a questão da exigência da exclusividade de forma absoluta sob o aspecto da regionalidade. A análise dos autos revela que a condenação se baseou na presunção de dano decorrente da inobservância das normas legais referentes à licitação, sem comprovação efetiva do prejuízo material concreto. Além disso, não há nos autos prova robusta da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ação de improbidade administrativa, por sua natureza sancionatória, exige um padrão probatório elevado para a condenação, sendo o ônus de provar o fato constitutivo do direito - no caso, a prática do ato ímprobo e o efetivo prejuízo ao erário – do Ministério Público Federal. No caso dos autos, a prova documental apresentada pelos apelantes (notas fiscais e de empenho) goza de presunção de veracidade e legitimidade. A liquidação da despesa pública, atestada pela emissão das notas de empenho, pressupõe a verificação do cumprimento da obrigação pelo credor e, para que seja desconstituída tal presunção, seria necessária uma prova robusta, clara e inequívoca em sentido contrário, o que não ocorreu na espécie. Após a expedição do Memorando/DRM/SEMEC 0032/2005, realizado em 24/02/2005, há relatório da comissão processante no Processo Administrativo 2.900/2004 indicando a entrega pela editora de 200 caixas de livros ainda não submetidos a auditoria física do material, o que fragiliza sobremaneira a conclusão de que houve falha na entrega, não se constatando que, de fato, o material não foi entregue. A ausência de oitiva das pessoas que efetivamente receberam os livros também milita em desfavor da tese da acusação. Ressalte-se, ainda, que o relatório de Auditoria 43/2006 do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE não indica qualquer irregularidade na aquisição de material didático no Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para atendimento à Educação de Jovens e Adultos - PEJA/2004, do qual faz parte o Projeto Recomeço, mas tão somente irregularidade na aquisição de outros produtos e serviços não permitidos pelo programa, indicando os produtos e serviços indevidos bem como o prejuízo causado ao erário. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, já que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). Porém o parquet não se desincumbiu do ônus de comprovar a perda patrimonial concreta. O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) Assim como a jurisprudência desta Corte. Confira-se: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in re ipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) Dessa forma, a ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. Ante o exposto, dou provimento às apelações dos réus para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido; e nego provimento à apelação do FNDE. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0011179-85.2009.4.01.3900 APELANTES: EDMILSON BRITO RODRIGUES, ELIANA MEDEIROS DE MIRANDA, ALVARO SOMENSI RAIMUNDO, E & L DE SOUZA COMERCIO DE LIVROS LTDA - ME, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO, MARIA ZUILA BEZERRA SOMENSI, LUCIENE DAS GRACAS MIRANDA MEDEIROS Advogado do(a) APELANTE: PAULA CAROLINA MACEDO CARDOSO - PA016314 Advogados do(a) APELANTE: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A Advogado do(a) APELANTE: BRUNO BRASIL DE CARVALHO - PA9665-A Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE NAZARE SANTANA FIDELLIS - PA6848-A APELADOS: EDMILSON BRITO RODRIGUES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL Advogados do(a) APELADO: EGIDIO MACHADO SALES FILHO - PA1416-A, LUCAS MARTINS SALES - PA15580-A, MARILIA NASCIMENTO DE CASTRO - PA29809-A EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ART. 10 DA LIA. DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. ATOS ÍMPROBOS NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO IMPROCEDENTE. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. APELAÇÃO DO FNDE NÃO PROVIDA. 1. Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na ação civil pública por ato de improbidade administrativa, condenando os réus pela prática dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, VIII, IX, XI e XII, da LIA, em razão de suposto favorecimento decorrente de dispensa indevida de licitação no Município de Belém/PA. 2. A questão em discussão: saber se houve dano efetivo ao erário apto a configurar ato de improbidade nos termos da Lei 8.429/1992, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021. 3. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (dano in re ipsa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 4. Conforme consolidada jurisprudência desta Corte, para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário a dispensa indevida de licitação deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. De igual modo, está pacificado o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais para a contratação pública, conquanto reprovável sob o prisma da legalidade estrita, não autoriza, isoladamente, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. 5. Não há nos autos provas robustas da inexecução contratual, tampouco indícios de superfaturamento, sobrepreço ou desvio de recursos públicos para finalidades alheias ao interesse público. A ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização de dano material efetivo, pressuposto indispensável à tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992. 6. A responsabilização por improbidade administrativa não pode se fundar em presunções ou meras irregularidades formais, sob pena de banalização do instituto. A propósito, os precedentes desta Corte têm sinalizado, de forma clara, que “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova”. 7. Apelações dos réus providas. Apelação do FNDE não provida. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações dos réus e negar provimento à apelação do FNDE. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 29/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado

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Processo nº 0002271-51.2005.4.01.4200

ID: 343357411

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0002271-51.2005.4.01.4200

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

NEUDO RIBEIRO CAMPOS OLIVIA PAIVA DE MOURA ROSILENE NOGUEIRA DE ARAUJO CARVALHO SUELEN DAYANA MOURA REOLON VAGNA ISAIAS GOMES

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA

OAB/RR XXXXXX Desbloquear

MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0002271-51.2005.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002271-51.2005.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: NEUDO RIBEIRO CAMPOS… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0002271-51.2005.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002271-51.2005.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: NEUDO RIBEIRO CAMPOS e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS - PA13717-A e ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A POLO PASSIVO:DIVA DA SILVA BRIGLIA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MAMEDE ABRAO NETTO - RR223-A, ELLEN EURIDICE RODRIGUES CARDOSO - RR176-A, MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS - PA13717-A, ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A, CARLOS NEY OLIVEIRA AMARAL - SP92049-A e RAFAEL DE ALMEIDA PIMENTA PEREIRA - RR317-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002271-51.2005.4.01.4200 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo MPF, União Federal, Neudo Ribeiro Campos, Suelen Dayana Moura Reolon, Rosilene Nogueira de Araújo Carvalho, Vagna Isaias Gomes e Olívia Paiva de Moura, em face da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Roraima, que nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedente o pedido e condenou os apelantes, além de Nádia Maria Santos Cunha, pela prática de atos de improbidade previstos no art. 10, I, XI e XII, da Lei 8.429/1992, aplicando as sanções previstas no art. 12 daquele Códex (ID. 24253455, fls. 180/197). Os embargos de declaração opostos por Neudo Ribeiro (ID. 24253455, fl. 249/252), foram rejeitados (ID. 24253458, fl. 13). O MPF requer a condenação de Carlos Levischi e Diva Briglia nas sanções do art. 12 da LIA, por considerar inaplicável o instituto da colaboração ou delação premiada em ações de improbidade administrativa, diante da vedação expressa do art. 17 da LIA. Destaca que a benesse somente pode ser aplicada na seara penal, consoante previsão disposta no art. 13 da Lei 9.807/1999. Destaca que a responsabilidade dos recorridos está devidamente comprovada nos autos, inclusive pela confissão de ambos (ID. 24253455, fls. 208/222). A União ratifica integralmente as razões da apelação do MPF, para requerer a condenação de Carlos Levischi e Diva da Silva Briglia nas sanções do art. 12 da LIA (ID. 24253455, fls. 232/241). Suelen Dayana, Rosilene Nogueira, Vagna Isaias e Olívia Paiva, em razões de apelação conjuntas, arguem a incompetência da Justiça Federal para apurar os fatos. No mérito, pedem a absolvição, por ausência de dolo ou de comprovação de que foram beneficiadas pelos valores supostamente desviados. Em alternativo, pedem a revisão das penalidades (ID. 24253458, fls. 17/27). Nas razões de apelação, Neudo Ribeiro arguiu preliminares de incompetência da Justiça Federal e nulidade por cerceamento de defesa. No mérito, sustenta a inexistência de prova da autoria de atos de improbidade administrativa e, alternativamente, insurge-se contra as sanções impostas, pugnando pelo afastamento da obrigação de pagar multa civil (ID. 24253458, fls. 121/ 237 a ID. 24253430, fls. 3/73). Contrarrazões (ID. 24253458, fls. 52/68, fls. 81/93, ID. 24253430, fls. 121/139, fl. 142). O Ministério Público Federal (PRR1) oficia pelo provimento das apelações do MPF e da União e pelo não provimento dos recursos de apelação defensivos (ID. 24253430, fls. 146/158). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002271-51.2005.4.01.4200 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Afasto a preliminar de incompetência da Justiça Federal, considerando a existência de recursos federais objeto dos supostos desvios, bem como a autonomia entre as esferas penal, civil e administrativa, de modo que o fato de os réus também responderem ação penal em relação às mesmas condutas não obsta eventual responsabilização civil. Rejeito também a preliminar de cerceamento de defesa arguida pelo apelante Neudo Ribeiro Campos, uma vez que ao magistrado é facultado o indeferimento da produção de provas que julgar inúteis ou protelatórias (art. 370 do CPC). Nos termos dos princípios do livre convencimento motivado e da livre apreciação das provas, quando o julgador entender que o acervo dos autos é suficiente para formar sua convicção, não há qualquer irregularidade na negativa de produção de prova requerida. Quanto ao mérito, consta que os réus participaram/concorreram para o desvio de recursos públicos federais no episódio que ficou conhecido como “Escândalo dos Gafanhotos”, que consistia na inclusão de pessoas humildes na folha de pagamento do estado de Roraima, pagas com recursos federais supostamente desviados de convênios, as quais recebiam salários por meio de um ou mais procuradores de confiança, os quais, por sua vez, repassavam os recursos para autoridades. Pois bem. Verifica-se que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente. Do que se extrai do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. A revogação não alcançará ações iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Nada obstante, por interpretação lógico-sistemática, pode-se inferir que é possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da Constituição Federal, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. Feitas tais considerações, extrai-se que os réus foram condenados pela prática da conduta prevista no art. 10 da LIA, que, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, estava assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; Com a redação dada pela nova lei, o caput e o inciso I do dispositivo passaram a prever o que segue: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, de rendas, de verbas ou de valores integrantes do acervo patrimonial das entidades referidas no art. 1º desta Lei; Verifica-se que a nova redação do art. 10, caput, da LIA prevê expressamente que para a configuração de ato de improbidade, a conduta deve determinar “perda patrimonial efetiva”, ou seja, deve ficar comprovado prejuízo ao erário. A reiterada jurisprudência desta Corte orienta, nesse sentido, que para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário, deverá ser comprovado o dolo dirigido para a prática da conduta que, por seu turno, deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. Outrossim, a efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, posto que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (in reipsa). O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in reipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) No mesmo sentido a jurisprudência desta Corte: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in reipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) A atenta análise da sentença demonstra que a condenação se baseou em dolo genérico e na presunção de dano decorrente do suposto desvio de verbas públicas, sem a comprovação, entretanto, da intenção de causar dano ao erário, tampouco do efetivo prejuízo. Importa destacar que o denominado “Escândalo dos Gafanhotos” determinou a interposição de diversas ações de improbidade administrativa, bem como ações penais, uma vez que o Juízo a quo entendeu ter ficado demonstrado que o citado esquema era realizado por diversos grupos autônomos, que não tinha conhecimento da atuação ou do benefício dos demais, o que fundamentou o indeferimento do pedido de reunião de processos (ID. 242534443, fls. 17/25). Ressalte-se que no exame de apelação interposta pela defesa na Ação de Improbidade Administrativa 0002225-62.2005.4.01.4200, a Terceira Turma desta Corte deu provimento ao recurso para julgar improcedentes os pedidos e absolver, dentre outros, os também réus nestes autos Diva da Silva Bríglia e Neudo Ribeiro Campos. Os recursos aos Tribunais Superiores interpostos pelo MPF e pela União não tiveram seguimento. Ademais, segundo se verifica das cópias de decisões acostadas ao presente feito, Angelo Paiva, Olívia Paiva, Rosilene Nogueira e Suelen Dayana foram absolvidas nas ações penais que apuravam os mesmos fatos (ID. 24253443, fls. 7/15 e ID. 24253458, fls. 30/37). Nada obstante a independência das esferas penal, cível e administrativa, a absolvição nos autos da ação penal instala dúvida razoável sobre o cenário fático e, consequentemente, sobre o elemento subjetivo da conduta e o dano ao erário. Nos termos dos precedentes desta Corte, “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova” (AC 0001413-80.2015.4.01.4002). Ademais, é de conhecimento geral que o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa visa proteger a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de garantir a integridade do patrimônio público e social, nos termos da lei. A jurisprudência também é firme no sentido de que a improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. A propósito: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISPENSA DE LICITAÇÃO. PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA. SUPERFATURAMENTO NÃO EVIDENCIADO. PROGRAMA PAB FIXO. APLICAÇÃO DE RECURSOS EM PROCEDIMENTOS DE MÉDIA E ALTA COMPLEXIDADE. IRREGULARIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO. DOLO NÃO DEMONSTRADO. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO AFASTADA. PROVIMENTO DAS APELAÇÕES. SENTENÇA REFORMADA. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. 1. A ação foi proposta pelo Ministério Público Federal em face dos apelantes (ex-prefeito de Araguaiana/MT e particular), em razão de suposta dispensa indevida de licitação para a aquisição de medicamentos (Programa de Assistência Farmacêutica), com indicativo de superfaturamento de preços; e em face apenas do ex-prefeito, por desvio de finalidade na aplicação dos recursos da Atenção Básica (Programa PAB Fixo), utilizados em procedimentos de média e alta complexidades. 2. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando ambos os apelantes nas seguintes sanções (art. 12, II, da lei n. 8.429/92): (i) ressarcimento ao erário, no valor de R$ 20.857,57, relativo ao Programa de Assistência Farmacêutica, a ser corrigido; (ii) suspensão dos direitos políticos, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e (iii) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos. Aplicou, ainda, ao ex-prefeito as sanções de ressarcimento do valor de R$ 71.127,59, relativo ao Programa PAB Fixo, a ser corrigido; e pagamento de multa civil no valor de 3 (três) remunerações do cargo de prefeito, relativo à época dos fatos. (…) 5. O art. 10, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação dada pela Lei n. 14.230/21, estabelece que "Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei: [...]", referindo-se em seu inciso VIII à conduta de "frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva". 6. A despeito da impropriedade apontada pela CGU - dispensa de licitação para aquisição de medicamentos em único estabelecimento farmacêutico no município -, o fato é que a frustração à licitação, presente no inciso VIII do art. 10 da Lei n. 8.429/92, está atrelada à existência de conduta dolosa, apta a ensejar perda patrimonial efetiva, não se configurando com ilações ou eventuais inconformidades formais no procedimento licitatório. 7. Não há nos autos demonstração de inexecução do objeto do Programa, ou de danos efetivos aos cofres públicos. Os fatos expressam meras desconformidades formais licitatórias, sem propósitos malsãos, o que configura uma atipicidade administrativa que não teve, nas circunstâncias do caso, o condão de assumir o qualificativo de ato de improbidade administrativa, que pressupõe má-fé e desonestidade do agente no trato da coisa pública, o que não ficou comprovado. 8. O fato de terem sido apurados, pela CGU, em relação a alguns itens confrontados, valores menores do que os praticados pela farmácia contratada, não comprova ipso facto a existência de superfaturamento: não há evidências de fraude na coleta de preços, mediante combinação e/ou ajuste entre os demandados, com o dolo de causar enriquecimento ilícito, desvio de verbas ou perda patrimonial efetiva. 9. Ao autor competia, em prova pericial, demonstrar que os preços oficiais, nos quais se baseou a Controladoria, deveriam ser amplamente utilizados e, ainda, que os valores orçados pelo estabelecimento farmacêutico teriam sido inadequados ou incompatíveis com os preços praticados no mercado (levando-se em conta o fato de o município estar localizado fora da região metropolitana). 10. No que diz com a imputação de conduta ímproba ao ex-prefeito em razão da aplicação das verbas do Programa de Atendimento Básico - PAB em despesas não elegíveis (serviços de média e alta complexidade), embora o fato seja indicativo de irregularidade formal, não comprova a existência de improbidade, à míngua de demonstração de dano. Não obstante a impropriedade vê-se que restou mantida a destinação pública de tais recursos, uma vez que aplicados em benefício da população. 11. A ausência de registro do nome dos pacientes e dos exames efetuados nas notas fiscais expedidas e nos respectivos empenhos afeiçoa-se à mera irregularidade, que não se eleva à categoria de atos de improbidade administrativa, mormente porque não evidenciada a prática de conduta dolosa. 12. Não se pode confundir meras faltas administrativas com as graves faltas sujeitas às severas sanções da Lei n. 8.429/92, aplicadas apenas quando a atuação do administrador destoe nitidamente dos princípios que regem a Administração Pública, em especial, a legalidade e a moralidade, transgredindo os deveres de retidão e lealdade ao interesse público. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ato ilícito ou irregular constitui ato de improbidade. 13. Os relatórios da CGU têm muita importância como início de prova, para dar base à propositura da ação, mas, documentos unilaterais elaborados sem os auspícios do contraditório, por si só, não são aptos (em princípio) a conduzir a uma condenação por atos de improbidade, devendo, mesmo como peças administrativas revestidas de presunção juris tantum de legitimidade, receber o apoio de outros meios de prova, que não foram produzidos. 14. Tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII - CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova. 15. Preliminar de prescrição afastada. Apelações providas. Sentença reformada. Improcedência (in totum) da ação. (AC 0027450-02.2009.4.01.3600, TRF1, Quarta Turma, Rel. Des. Fed. Olindo Menezes, e-DJF1 20/04/2023). Dessa forma, não comprovada a existência de dano, tampouco o dolo específico, deve ser afastada a condenação dos apelantes Neudo Ribeiro Campos, Olívia Paiva de Moura, Vagna Isaías Gomes de Lima, Rosilene Nogueira de Araujo e Suelen Dayana Moura Reolon, bem como de Angelo Paiva de Moura e Nádia Maria Santos Cunha, estes com base no efeito extensivo previsto no art. 1.005 do CPC e no art. 17, § 11, da Lei 8.249/1992. No que diz respeito aos recursos do MPF e da União, ausentes elementos probatórios suficientes para demonstrar o dolo específico ou o dano material efetivo, pressupostos indispensáveis para a tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992, consoante argumentos já expostos, não há como condenar os apelados Carlos Eduardo Levischi e Diva da Silva Briglia. Ante o exposto, rejeito as preliminares e dou provimento às apelações defensivas, para julgar improcedente o pedido deduzido na ação de improbidade administrativa com relação aos apelantes e, de ofício, por extensão, no que diz respeito aos corréus. Nego provimento aos recursos do MPF e da União. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002271-51.2005.4.01.4200 APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, UNIÃO FEDERAL, OLIVIA PAIVA DE MOURA, NEUDO RIBEIRO CAMPOS, ROSILENE NOGUEIRA DE ARAUJO CARVALHO, VAGNA ISAIAS GOMES, SUELEN DAYANA MOURA REOLON Advogado do(a) APELANTE: ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A Advogado do(a) APELANTE: MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS - PA13717-A APELADO: UNIÃO FEDERAL, SUELEN DAYANA MOURA REOLON, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA), NEUDO RIBEIRO CAMPOS, CARLOS EDUARDO LEVISCHI, ROSILENE NOGUEIRA DE ARAUJO CARVALHO, OLIVIA PAIVA DE MOURA REOLON, VANDERLEI LIMA SANTANA, DIVA DA SILVA BRIGLIA, ANGELO PAIVA DE MOURA, NADIA MARIA SANTOS CUNHA, VAGNA ISAIAS GOMES Advogado do(a) APELADO: ELLEN EURIDICE RODRIGUES CARDOSO - RR176-A Advogado do(a) APELADO: CARLOS NEY OLIVEIRA AMARAL - SP92049-A Advogado do(a) APELADO: MAMEDE ABRAO NETTO - RR223-A Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A Advogado do(a) APELADO: RAFAEL DE ALMEIDA PIMENTA PEREIRA - RR317-A EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. “ESCÂNDALO DOS GAFANHOTOS”. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL E CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADAS. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. ART. 10, I, XI E XII DA LIA. EFETIVO DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. DOLO ESPECÍFICO NÃO DEMONSTRADO. ATO ÍMPROBO NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSOS DE APELAÇÃO DA DEFESA PROVIDOS. RECURSOS DO MPF E DA UNIÃO NÃO PROVIDOS. 1. Ação de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF em razão de desvios de recursos públicos federais no caso conhecido como “Escândalo dos Gafanhotos”, que consistia na inclusão de pessoas humildes na folha de pagamento do estado de Roraima para posterior apropriação indevida dos valores por terceiros. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para condenar os denunciados com base no art. 10, I, XI e XII, da Lei 8.429/1992. O MPF e a União apelaram para requerer a condenação dos denunciados em relação aos quais foi aplicado perdão por força de colaboração premiada. A defesa interpôs recursos, alegando preliminares e no mérito, ausência de dolo e ou dano ao erário. 2. Há três questões centrais em discussão: (i) verificar a competência da Justiça Federal para apurar os fatos; ii) examinar a alegação de cerceamento de defesa; e (iii) verificar se houve prática de ato de improbidade administrativa por dano ao erário decorrente. 3. A jurisprudência do STJ e desta Corte Federal reconhece a competência da Justiça Federal para apurar supostos desvios de verba federal, mesmo após a incorporação pelo município, que continua sujeita à prestação de contas perante órgão federal, caracterizando o interesse mencionado no art. 109, I, da Constituição de 1988 (Súmula 208 do STJ). 4. Ao magistrado é facultado o indeferimento da produção de provas que julgar inúteis ou protelatórias (art. 370 do CPC), nos termos dos princípios do livre convencimento motivado e da livre apreciação das provas. 5. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (in rei psa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 6. O dolo é requisito indispensável para a tipificação de atos de improbidade administrativa, conforme fixado pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR (Tema 1.199) e pelo STJ no REsp 2.107.601/MG. Além disso, o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa visa proteger a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de garantir a integridade do patrimônio público e social, nos termos da lei. 7. No caso concreto, a prova constante nos autos é insuficiente para demonstrar a existência de dolo ou dano patrimonial efetivo decorrente das irregularidades apontadas. 8. A inexistência de prova robusta do dolo específico ou de má-fé dos apelantes, aliada à ausência de demonstração de prejuízo material, inviabiliza a configuração do ato ímprobo previsto no art. 10, I, XI e XII, da LIA. 9. Preliminares rejeitadas. Apelações defensivas providas, com extensão dos efeitos, de ofício, aos réus que não apelaram. Apelação do MPF e da União não providas. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, rejeitar as preliminares, dar provimento às apelações defensivas, com extensão, de ofício, aos réus que não apelaram e negar provimento aos recursos de apelação do MPF e da União. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 29/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado

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Processo nº 0002271-51.2005.4.01.4200

ID: 343357418

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0002271-51.2005.4.01.4200

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

NEUDO RIBEIRO CAMPOS OLIVIA PAIVA DE MOURA ROSILENE NOGUEIRA DE ARAUJO CARVALHO SUELEN DAYANA MOURA REOLON VAGNA ISAIAS GOMES

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA

OAB/RR XXXXXX Desbloquear

MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0002271-51.2005.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002271-51.2005.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: NEUDO RIBEIRO CAMPOS… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0002271-51.2005.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002271-51.2005.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: NEUDO RIBEIRO CAMPOS e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS - PA13717-A e ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A POLO PASSIVO:DIVA DA SILVA BRIGLIA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MAMEDE ABRAO NETTO - RR223-A, ELLEN EURIDICE RODRIGUES CARDOSO - RR176-A, MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS - PA13717-A, ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A, CARLOS NEY OLIVEIRA AMARAL - SP92049-A e RAFAEL DE ALMEIDA PIMENTA PEREIRA - RR317-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002271-51.2005.4.01.4200 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo MPF, União Federal, Neudo Ribeiro Campos, Suelen Dayana Moura Reolon, Rosilene Nogueira de Araújo Carvalho, Vagna Isaias Gomes e Olívia Paiva de Moura, em face da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Roraima, que nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedente o pedido e condenou os apelantes, além de Nádia Maria Santos Cunha, pela prática de atos de improbidade previstos no art. 10, I, XI e XII, da Lei 8.429/1992, aplicando as sanções previstas no art. 12 daquele Códex (ID. 24253455, fls. 180/197). Os embargos de declaração opostos por Neudo Ribeiro (ID. 24253455, fl. 249/252), foram rejeitados (ID. 24253458, fl. 13). O MPF requer a condenação de Carlos Levischi e Diva Briglia nas sanções do art. 12 da LIA, por considerar inaplicável o instituto da colaboração ou delação premiada em ações de improbidade administrativa, diante da vedação expressa do art. 17 da LIA. Destaca que a benesse somente pode ser aplicada na seara penal, consoante previsão disposta no art. 13 da Lei 9.807/1999. Destaca que a responsabilidade dos recorridos está devidamente comprovada nos autos, inclusive pela confissão de ambos (ID. 24253455, fls. 208/222). A União ratifica integralmente as razões da apelação do MPF, para requerer a condenação de Carlos Levischi e Diva da Silva Briglia nas sanções do art. 12 da LIA (ID. 24253455, fls. 232/241). Suelen Dayana, Rosilene Nogueira, Vagna Isaias e Olívia Paiva, em razões de apelação conjuntas, arguem a incompetência da Justiça Federal para apurar os fatos. No mérito, pedem a absolvição, por ausência de dolo ou de comprovação de que foram beneficiadas pelos valores supostamente desviados. Em alternativo, pedem a revisão das penalidades (ID. 24253458, fls. 17/27). Nas razões de apelação, Neudo Ribeiro arguiu preliminares de incompetência da Justiça Federal e nulidade por cerceamento de defesa. No mérito, sustenta a inexistência de prova da autoria de atos de improbidade administrativa e, alternativamente, insurge-se contra as sanções impostas, pugnando pelo afastamento da obrigação de pagar multa civil (ID. 24253458, fls. 121/ 237 a ID. 24253430, fls. 3/73). Contrarrazões (ID. 24253458, fls. 52/68, fls. 81/93, ID. 24253430, fls. 121/139, fl. 142). O Ministério Público Federal (PRR1) oficia pelo provimento das apelações do MPF e da União e pelo não provimento dos recursos de apelação defensivos (ID. 24253430, fls. 146/158). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002271-51.2005.4.01.4200 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Afasto a preliminar de incompetência da Justiça Federal, considerando a existência de recursos federais objeto dos supostos desvios, bem como a autonomia entre as esferas penal, civil e administrativa, de modo que o fato de os réus também responderem ação penal em relação às mesmas condutas não obsta eventual responsabilização civil. Rejeito também a preliminar de cerceamento de defesa arguida pelo apelante Neudo Ribeiro Campos, uma vez que ao magistrado é facultado o indeferimento da produção de provas que julgar inúteis ou protelatórias (art. 370 do CPC). Nos termos dos princípios do livre convencimento motivado e da livre apreciação das provas, quando o julgador entender que o acervo dos autos é suficiente para formar sua convicção, não há qualquer irregularidade na negativa de produção de prova requerida. Quanto ao mérito, consta que os réus participaram/concorreram para o desvio de recursos públicos federais no episódio que ficou conhecido como “Escândalo dos Gafanhotos”, que consistia na inclusão de pessoas humildes na folha de pagamento do estado de Roraima, pagas com recursos federais supostamente desviados de convênios, as quais recebiam salários por meio de um ou mais procuradores de confiança, os quais, por sua vez, repassavam os recursos para autoridades. Pois bem. Verifica-se que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente. Do que se extrai do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. A revogação não alcançará ações iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Nada obstante, por interpretação lógico-sistemática, pode-se inferir que é possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da Constituição Federal, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. Feitas tais considerações, extrai-se que os réus foram condenados pela prática da conduta prevista no art. 10 da LIA, que, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, estava assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; Com a redação dada pela nova lei, o caput e o inciso I do dispositivo passaram a prever o que segue: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, de rendas, de verbas ou de valores integrantes do acervo patrimonial das entidades referidas no art. 1º desta Lei; Verifica-se que a nova redação do art. 10, caput, da LIA prevê expressamente que para a configuração de ato de improbidade, a conduta deve determinar “perda patrimonial efetiva”, ou seja, deve ficar comprovado prejuízo ao erário. A reiterada jurisprudência desta Corte orienta, nesse sentido, que para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário, deverá ser comprovado o dolo dirigido para a prática da conduta que, por seu turno, deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. Outrossim, a efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, posto que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (in reipsa). O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in reipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) No mesmo sentido a jurisprudência desta Corte: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in reipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) A atenta análise da sentença demonstra que a condenação se baseou em dolo genérico e na presunção de dano decorrente do suposto desvio de verbas públicas, sem a comprovação, entretanto, da intenção de causar dano ao erário, tampouco do efetivo prejuízo. Importa destacar que o denominado “Escândalo dos Gafanhotos” determinou a interposição de diversas ações de improbidade administrativa, bem como ações penais, uma vez que o Juízo a quo entendeu ter ficado demonstrado que o citado esquema era realizado por diversos grupos autônomos, que não tinha conhecimento da atuação ou do benefício dos demais, o que fundamentou o indeferimento do pedido de reunião de processos (ID. 242534443, fls. 17/25). Ressalte-se que no exame de apelação interposta pela defesa na Ação de Improbidade Administrativa 0002225-62.2005.4.01.4200, a Terceira Turma desta Corte deu provimento ao recurso para julgar improcedentes os pedidos e absolver, dentre outros, os também réus nestes autos Diva da Silva Bríglia e Neudo Ribeiro Campos. Os recursos aos Tribunais Superiores interpostos pelo MPF e pela União não tiveram seguimento. Ademais, segundo se verifica das cópias de decisões acostadas ao presente feito, Angelo Paiva, Olívia Paiva, Rosilene Nogueira e Suelen Dayana foram absolvidas nas ações penais que apuravam os mesmos fatos (ID. 24253443, fls. 7/15 e ID. 24253458, fls. 30/37). Nada obstante a independência das esferas penal, cível e administrativa, a absolvição nos autos da ação penal instala dúvida razoável sobre o cenário fático e, consequentemente, sobre o elemento subjetivo da conduta e o dano ao erário. Nos termos dos precedentes desta Corte, “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova” (AC 0001413-80.2015.4.01.4002). Ademais, é de conhecimento geral que o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa visa proteger a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de garantir a integridade do patrimônio público e social, nos termos da lei. A jurisprudência também é firme no sentido de que a improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. A propósito: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISPENSA DE LICITAÇÃO. PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA. SUPERFATURAMENTO NÃO EVIDENCIADO. PROGRAMA PAB FIXO. APLICAÇÃO DE RECURSOS EM PROCEDIMENTOS DE MÉDIA E ALTA COMPLEXIDADE. IRREGULARIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO. DOLO NÃO DEMONSTRADO. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO AFASTADA. PROVIMENTO DAS APELAÇÕES. SENTENÇA REFORMADA. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. 1. A ação foi proposta pelo Ministério Público Federal em face dos apelantes (ex-prefeito de Araguaiana/MT e particular), em razão de suposta dispensa indevida de licitação para a aquisição de medicamentos (Programa de Assistência Farmacêutica), com indicativo de superfaturamento de preços; e em face apenas do ex-prefeito, por desvio de finalidade na aplicação dos recursos da Atenção Básica (Programa PAB Fixo), utilizados em procedimentos de média e alta complexidades. 2. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando ambos os apelantes nas seguintes sanções (art. 12, II, da lei n. 8.429/92): (i) ressarcimento ao erário, no valor de R$ 20.857,57, relativo ao Programa de Assistência Farmacêutica, a ser corrigido; (ii) suspensão dos direitos políticos, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e (iii) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos. Aplicou, ainda, ao ex-prefeito as sanções de ressarcimento do valor de R$ 71.127,59, relativo ao Programa PAB Fixo, a ser corrigido; e pagamento de multa civil no valor de 3 (três) remunerações do cargo de prefeito, relativo à época dos fatos. (…) 5. O art. 10, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação dada pela Lei n. 14.230/21, estabelece que "Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei: [...]", referindo-se em seu inciso VIII à conduta de "frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva". 6. A despeito da impropriedade apontada pela CGU - dispensa de licitação para aquisição de medicamentos em único estabelecimento farmacêutico no município -, o fato é que a frustração à licitação, presente no inciso VIII do art. 10 da Lei n. 8.429/92, está atrelada à existência de conduta dolosa, apta a ensejar perda patrimonial efetiva, não se configurando com ilações ou eventuais inconformidades formais no procedimento licitatório. 7. Não há nos autos demonstração de inexecução do objeto do Programa, ou de danos efetivos aos cofres públicos. Os fatos expressam meras desconformidades formais licitatórias, sem propósitos malsãos, o que configura uma atipicidade administrativa que não teve, nas circunstâncias do caso, o condão de assumir o qualificativo de ato de improbidade administrativa, que pressupõe má-fé e desonestidade do agente no trato da coisa pública, o que não ficou comprovado. 8. O fato de terem sido apurados, pela CGU, em relação a alguns itens confrontados, valores menores do que os praticados pela farmácia contratada, não comprova ipso facto a existência de superfaturamento: não há evidências de fraude na coleta de preços, mediante combinação e/ou ajuste entre os demandados, com o dolo de causar enriquecimento ilícito, desvio de verbas ou perda patrimonial efetiva. 9. Ao autor competia, em prova pericial, demonstrar que os preços oficiais, nos quais se baseou a Controladoria, deveriam ser amplamente utilizados e, ainda, que os valores orçados pelo estabelecimento farmacêutico teriam sido inadequados ou incompatíveis com os preços praticados no mercado (levando-se em conta o fato de o município estar localizado fora da região metropolitana). 10. No que diz com a imputação de conduta ímproba ao ex-prefeito em razão da aplicação das verbas do Programa de Atendimento Básico - PAB em despesas não elegíveis (serviços de média e alta complexidade), embora o fato seja indicativo de irregularidade formal, não comprova a existência de improbidade, à míngua de demonstração de dano. Não obstante a impropriedade vê-se que restou mantida a destinação pública de tais recursos, uma vez que aplicados em benefício da população. 11. A ausência de registro do nome dos pacientes e dos exames efetuados nas notas fiscais expedidas e nos respectivos empenhos afeiçoa-se à mera irregularidade, que não se eleva à categoria de atos de improbidade administrativa, mormente porque não evidenciada a prática de conduta dolosa. 12. Não se pode confundir meras faltas administrativas com as graves faltas sujeitas às severas sanções da Lei n. 8.429/92, aplicadas apenas quando a atuação do administrador destoe nitidamente dos princípios que regem a Administração Pública, em especial, a legalidade e a moralidade, transgredindo os deveres de retidão e lealdade ao interesse público. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ato ilícito ou irregular constitui ato de improbidade. 13. Os relatórios da CGU têm muita importância como início de prova, para dar base à propositura da ação, mas, documentos unilaterais elaborados sem os auspícios do contraditório, por si só, não são aptos (em princípio) a conduzir a uma condenação por atos de improbidade, devendo, mesmo como peças administrativas revestidas de presunção juris tantum de legitimidade, receber o apoio de outros meios de prova, que não foram produzidos. 14. Tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII - CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova. 15. Preliminar de prescrição afastada. Apelações providas. Sentença reformada. Improcedência (in totum) da ação. (AC 0027450-02.2009.4.01.3600, TRF1, Quarta Turma, Rel. Des. Fed. Olindo Menezes, e-DJF1 20/04/2023). Dessa forma, não comprovada a existência de dano, tampouco o dolo específico, deve ser afastada a condenação dos apelantes Neudo Ribeiro Campos, Olívia Paiva de Moura, Vagna Isaías Gomes de Lima, Rosilene Nogueira de Araujo e Suelen Dayana Moura Reolon, bem como de Angelo Paiva de Moura e Nádia Maria Santos Cunha, estes com base no efeito extensivo previsto no art. 1.005 do CPC e no art. 17, § 11, da Lei 8.249/1992. No que diz respeito aos recursos do MPF e da União, ausentes elementos probatórios suficientes para demonstrar o dolo específico ou o dano material efetivo, pressupostos indispensáveis para a tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992, consoante argumentos já expostos, não há como condenar os apelados Carlos Eduardo Levischi e Diva da Silva Briglia. Ante o exposto, rejeito as preliminares e dou provimento às apelações defensivas, para julgar improcedente o pedido deduzido na ação de improbidade administrativa com relação aos apelantes e, de ofício, por extensão, no que diz respeito aos corréus. Nego provimento aos recursos do MPF e da União. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002271-51.2005.4.01.4200 APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, UNIÃO FEDERAL, OLIVIA PAIVA DE MOURA, NEUDO RIBEIRO CAMPOS, ROSILENE NOGUEIRA DE ARAUJO CARVALHO, VAGNA ISAIAS GOMES, SUELEN DAYANA MOURA REOLON Advogado do(a) APELANTE: ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A Advogado do(a) APELANTE: MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS - PA13717-A APELADO: UNIÃO FEDERAL, SUELEN DAYANA MOURA REOLON, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA), NEUDO RIBEIRO CAMPOS, CARLOS EDUARDO LEVISCHI, ROSILENE NOGUEIRA DE ARAUJO CARVALHO, OLIVIA PAIVA DE MOURA REOLON, VANDERLEI LIMA SANTANA, DIVA DA SILVA BRIGLIA, ANGELO PAIVA DE MOURA, NADIA MARIA SANTOS CUNHA, VAGNA ISAIAS GOMES Advogado do(a) APELADO: ELLEN EURIDICE RODRIGUES CARDOSO - RR176-A Advogado do(a) APELADO: CARLOS NEY OLIVEIRA AMARAL - SP92049-A Advogado do(a) APELADO: MAMEDE ABRAO NETTO - RR223-A Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A Advogado do(a) APELADO: RAFAEL DE ALMEIDA PIMENTA PEREIRA - RR317-A EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. “ESCÂNDALO DOS GAFANHOTOS”. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL E CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADAS. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. ART. 10, I, XI E XII DA LIA. EFETIVO DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. DOLO ESPECÍFICO NÃO DEMONSTRADO. ATO ÍMPROBO NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSOS DE APELAÇÃO DA DEFESA PROVIDOS. RECURSOS DO MPF E DA UNIÃO NÃO PROVIDOS. 1. Ação de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF em razão de desvios de recursos públicos federais no caso conhecido como “Escândalo dos Gafanhotos”, que consistia na inclusão de pessoas humildes na folha de pagamento do estado de Roraima para posterior apropriação indevida dos valores por terceiros. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para condenar os denunciados com base no art. 10, I, XI e XII, da Lei 8.429/1992. O MPF e a União apelaram para requerer a condenação dos denunciados em relação aos quais foi aplicado perdão por força de colaboração premiada. A defesa interpôs recursos, alegando preliminares e no mérito, ausência de dolo e ou dano ao erário. 2. Há três questões centrais em discussão: (i) verificar a competência da Justiça Federal para apurar os fatos; ii) examinar a alegação de cerceamento de defesa; e (iii) verificar se houve prática de ato de improbidade administrativa por dano ao erário decorrente. 3. A jurisprudência do STJ e desta Corte Federal reconhece a competência da Justiça Federal para apurar supostos desvios de verba federal, mesmo após a incorporação pelo município, que continua sujeita à prestação de contas perante órgão federal, caracterizando o interesse mencionado no art. 109, I, da Constituição de 1988 (Súmula 208 do STJ). 4. Ao magistrado é facultado o indeferimento da produção de provas que julgar inúteis ou protelatórias (art. 370 do CPC), nos termos dos princípios do livre convencimento motivado e da livre apreciação das provas. 5. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (in rei psa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 6. O dolo é requisito indispensável para a tipificação de atos de improbidade administrativa, conforme fixado pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR (Tema 1.199) e pelo STJ no REsp 2.107.601/MG. Além disso, o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa visa proteger a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de garantir a integridade do patrimônio público e social, nos termos da lei. 7. No caso concreto, a prova constante nos autos é insuficiente para demonstrar a existência de dolo ou dano patrimonial efetivo decorrente das irregularidades apontadas. 8. A inexistência de prova robusta do dolo específico ou de má-fé dos apelantes, aliada à ausência de demonstração de prejuízo material, inviabiliza a configuração do ato ímprobo previsto no art. 10, I, XI e XII, da LIA. 9. Preliminares rejeitadas. Apelações defensivas providas, com extensão dos efeitos, de ofício, aos réus que não apelaram. Apelação do MPF e da União não providas. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, rejeitar as preliminares, dar provimento às apelações defensivas, com extensão, de ofício, aos réus que não apelaram e negar provimento aos recursos de apelação do MPF e da União. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 29/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado

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Processo nº 0002271-51.2005.4.01.4200

ID: 343357517

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0002271-51.2005.4.01.4200

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

NEUDO RIBEIRO CAMPOS OLIVIA PAIVA DE MOURA ROSILENE NOGUEIRA DE ARAUJO CARVALHO SUELEN DAYANA MOURA REOLON VAGNA ISAIAS GOMES

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA

OAB/RR XXXXXX Desbloquear

MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0002271-51.2005.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002271-51.2005.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: NEUDO RIBEIRO CAMPOS… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0002271-51.2005.4.01.4200 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002271-51.2005.4.01.4200 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: NEUDO RIBEIRO CAMPOS e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS - PA13717-A e ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A POLO PASSIVO:DIVA DA SILVA BRIGLIA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MAMEDE ABRAO NETTO - RR223-A, ELLEN EURIDICE RODRIGUES CARDOSO - RR176-A, MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS - PA13717-A, ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A, CARLOS NEY OLIVEIRA AMARAL - SP92049-A e RAFAEL DE ALMEIDA PIMENTA PEREIRA - RR317-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002271-51.2005.4.01.4200 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo MPF, União Federal, Neudo Ribeiro Campos, Suelen Dayana Moura Reolon, Rosilene Nogueira de Araújo Carvalho, Vagna Isaias Gomes e Olívia Paiva de Moura, em face da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Roraima, que nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedente o pedido e condenou os apelantes, além de Nádia Maria Santos Cunha, pela prática de atos de improbidade previstos no art. 10, I, XI e XII, da Lei 8.429/1992, aplicando as sanções previstas no art. 12 daquele Códex (ID. 24253455, fls. 180/197). Os embargos de declaração opostos por Neudo Ribeiro (ID. 24253455, fl. 249/252), foram rejeitados (ID. 24253458, fl. 13). O MPF requer a condenação de Carlos Levischi e Diva Briglia nas sanções do art. 12 da LIA, por considerar inaplicável o instituto da colaboração ou delação premiada em ações de improbidade administrativa, diante da vedação expressa do art. 17 da LIA. Destaca que a benesse somente pode ser aplicada na seara penal, consoante previsão disposta no art. 13 da Lei 9.807/1999. Destaca que a responsabilidade dos recorridos está devidamente comprovada nos autos, inclusive pela confissão de ambos (ID. 24253455, fls. 208/222). A União ratifica integralmente as razões da apelação do MPF, para requerer a condenação de Carlos Levischi e Diva da Silva Briglia nas sanções do art. 12 da LIA (ID. 24253455, fls. 232/241). Suelen Dayana, Rosilene Nogueira, Vagna Isaias e Olívia Paiva, em razões de apelação conjuntas, arguem a incompetência da Justiça Federal para apurar os fatos. No mérito, pedem a absolvição, por ausência de dolo ou de comprovação de que foram beneficiadas pelos valores supostamente desviados. Em alternativo, pedem a revisão das penalidades (ID. 24253458, fls. 17/27). Nas razões de apelação, Neudo Ribeiro arguiu preliminares de incompetência da Justiça Federal e nulidade por cerceamento de defesa. No mérito, sustenta a inexistência de prova da autoria de atos de improbidade administrativa e, alternativamente, insurge-se contra as sanções impostas, pugnando pelo afastamento da obrigação de pagar multa civil (ID. 24253458, fls. 121/ 237 a ID. 24253430, fls. 3/73). Contrarrazões (ID. 24253458, fls. 52/68, fls. 81/93, ID. 24253430, fls. 121/139, fl. 142). O Ministério Público Federal (PRR1) oficia pelo provimento das apelações do MPF e da União e pelo não provimento dos recursos de apelação defensivos (ID. 24253430, fls. 146/158). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002271-51.2005.4.01.4200 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Afasto a preliminar de incompetência da Justiça Federal, considerando a existência de recursos federais objeto dos supostos desvios, bem como a autonomia entre as esferas penal, civil e administrativa, de modo que o fato de os réus também responderem ação penal em relação às mesmas condutas não obsta eventual responsabilização civil. Rejeito também a preliminar de cerceamento de defesa arguida pelo apelante Neudo Ribeiro Campos, uma vez que ao magistrado é facultado o indeferimento da produção de provas que julgar inúteis ou protelatórias (art. 370 do CPC). Nos termos dos princípios do livre convencimento motivado e da livre apreciação das provas, quando o julgador entender que o acervo dos autos é suficiente para formar sua convicção, não há qualquer irregularidade na negativa de produção de prova requerida. Quanto ao mérito, consta que os réus participaram/concorreram para o desvio de recursos públicos federais no episódio que ficou conhecido como “Escândalo dos Gafanhotos”, que consistia na inclusão de pessoas humildes na folha de pagamento do estado de Roraima, pagas com recursos federais supostamente desviados de convênios, as quais recebiam salários por meio de um ou mais procuradores de confiança, os quais, por sua vez, repassavam os recursos para autoridades. Pois bem. Verifica-se que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente. Do que se extrai do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. A revogação não alcançará ações iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Nada obstante, por interpretação lógico-sistemática, pode-se inferir que é possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da Constituição Federal, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. Feitas tais considerações, extrai-se que os réus foram condenados pela prática da conduta prevista no art. 10 da LIA, que, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, estava assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; Com a redação dada pela nova lei, o caput e o inciso I do dispositivo passaram a prever o que segue: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, de rendas, de verbas ou de valores integrantes do acervo patrimonial das entidades referidas no art. 1º desta Lei; Verifica-se que a nova redação do art. 10, caput, da LIA prevê expressamente que para a configuração de ato de improbidade, a conduta deve determinar “perda patrimonial efetiva”, ou seja, deve ficar comprovado prejuízo ao erário. A reiterada jurisprudência desta Corte orienta, nesse sentido, que para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário, deverá ser comprovado o dolo dirigido para a prática da conduta que, por seu turno, deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. Outrossim, a efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, posto que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (in reipsa). O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in reipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) No mesmo sentido a jurisprudência desta Corte: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in reipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) A atenta análise da sentença demonstra que a condenação se baseou em dolo genérico e na presunção de dano decorrente do suposto desvio de verbas públicas, sem a comprovação, entretanto, da intenção de causar dano ao erário, tampouco do efetivo prejuízo. Importa destacar que o denominado “Escândalo dos Gafanhotos” determinou a interposição de diversas ações de improbidade administrativa, bem como ações penais, uma vez que o Juízo a quo entendeu ter ficado demonstrado que o citado esquema era realizado por diversos grupos autônomos, que não tinha conhecimento da atuação ou do benefício dos demais, o que fundamentou o indeferimento do pedido de reunião de processos (ID. 242534443, fls. 17/25). Ressalte-se que no exame de apelação interposta pela defesa na Ação de Improbidade Administrativa 0002225-62.2005.4.01.4200, a Terceira Turma desta Corte deu provimento ao recurso para julgar improcedentes os pedidos e absolver, dentre outros, os também réus nestes autos Diva da Silva Bríglia e Neudo Ribeiro Campos. Os recursos aos Tribunais Superiores interpostos pelo MPF e pela União não tiveram seguimento. Ademais, segundo se verifica das cópias de decisões acostadas ao presente feito, Angelo Paiva, Olívia Paiva, Rosilene Nogueira e Suelen Dayana foram absolvidas nas ações penais que apuravam os mesmos fatos (ID. 24253443, fls. 7/15 e ID. 24253458, fls. 30/37). Nada obstante a independência das esferas penal, cível e administrativa, a absolvição nos autos da ação penal instala dúvida razoável sobre o cenário fático e, consequentemente, sobre o elemento subjetivo da conduta e o dano ao erário. Nos termos dos precedentes desta Corte, “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova” (AC 0001413-80.2015.4.01.4002). Ademais, é de conhecimento geral que o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa visa proteger a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de garantir a integridade do patrimônio público e social, nos termos da lei. A jurisprudência também é firme no sentido de que a improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. A propósito: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISPENSA DE LICITAÇÃO. PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA. SUPERFATURAMENTO NÃO EVIDENCIADO. PROGRAMA PAB FIXO. APLICAÇÃO DE RECURSOS EM PROCEDIMENTOS DE MÉDIA E ALTA COMPLEXIDADE. IRREGULARIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO. DOLO NÃO DEMONSTRADO. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO AFASTADA. PROVIMENTO DAS APELAÇÕES. SENTENÇA REFORMADA. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. 1. A ação foi proposta pelo Ministério Público Federal em face dos apelantes (ex-prefeito de Araguaiana/MT e particular), em razão de suposta dispensa indevida de licitação para a aquisição de medicamentos (Programa de Assistência Farmacêutica), com indicativo de superfaturamento de preços; e em face apenas do ex-prefeito, por desvio de finalidade na aplicação dos recursos da Atenção Básica (Programa PAB Fixo), utilizados em procedimentos de média e alta complexidades. 2. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando ambos os apelantes nas seguintes sanções (art. 12, II, da lei n. 8.429/92): (i) ressarcimento ao erário, no valor de R$ 20.857,57, relativo ao Programa de Assistência Farmacêutica, a ser corrigido; (ii) suspensão dos direitos políticos, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e (iii) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos. Aplicou, ainda, ao ex-prefeito as sanções de ressarcimento do valor de R$ 71.127,59, relativo ao Programa PAB Fixo, a ser corrigido; e pagamento de multa civil no valor de 3 (três) remunerações do cargo de prefeito, relativo à época dos fatos. (…) 5. O art. 10, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação dada pela Lei n. 14.230/21, estabelece que "Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei: [...]", referindo-se em seu inciso VIII à conduta de "frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva". 6. A despeito da impropriedade apontada pela CGU - dispensa de licitação para aquisição de medicamentos em único estabelecimento farmacêutico no município -, o fato é que a frustração à licitação, presente no inciso VIII do art. 10 da Lei n. 8.429/92, está atrelada à existência de conduta dolosa, apta a ensejar perda patrimonial efetiva, não se configurando com ilações ou eventuais inconformidades formais no procedimento licitatório. 7. Não há nos autos demonstração de inexecução do objeto do Programa, ou de danos efetivos aos cofres públicos. Os fatos expressam meras desconformidades formais licitatórias, sem propósitos malsãos, o que configura uma atipicidade administrativa que não teve, nas circunstâncias do caso, o condão de assumir o qualificativo de ato de improbidade administrativa, que pressupõe má-fé e desonestidade do agente no trato da coisa pública, o que não ficou comprovado. 8. O fato de terem sido apurados, pela CGU, em relação a alguns itens confrontados, valores menores do que os praticados pela farmácia contratada, não comprova ipso facto a existência de superfaturamento: não há evidências de fraude na coleta de preços, mediante combinação e/ou ajuste entre os demandados, com o dolo de causar enriquecimento ilícito, desvio de verbas ou perda patrimonial efetiva. 9. Ao autor competia, em prova pericial, demonstrar que os preços oficiais, nos quais se baseou a Controladoria, deveriam ser amplamente utilizados e, ainda, que os valores orçados pelo estabelecimento farmacêutico teriam sido inadequados ou incompatíveis com os preços praticados no mercado (levando-se em conta o fato de o município estar localizado fora da região metropolitana). 10. No que diz com a imputação de conduta ímproba ao ex-prefeito em razão da aplicação das verbas do Programa de Atendimento Básico - PAB em despesas não elegíveis (serviços de média e alta complexidade), embora o fato seja indicativo de irregularidade formal, não comprova a existência de improbidade, à míngua de demonstração de dano. Não obstante a impropriedade vê-se que restou mantida a destinação pública de tais recursos, uma vez que aplicados em benefício da população. 11. A ausência de registro do nome dos pacientes e dos exames efetuados nas notas fiscais expedidas e nos respectivos empenhos afeiçoa-se à mera irregularidade, que não se eleva à categoria de atos de improbidade administrativa, mormente porque não evidenciada a prática de conduta dolosa. 12. Não se pode confundir meras faltas administrativas com as graves faltas sujeitas às severas sanções da Lei n. 8.429/92, aplicadas apenas quando a atuação do administrador destoe nitidamente dos princípios que regem a Administração Pública, em especial, a legalidade e a moralidade, transgredindo os deveres de retidão e lealdade ao interesse público. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ato ilícito ou irregular constitui ato de improbidade. 13. Os relatórios da CGU têm muita importância como início de prova, para dar base à propositura da ação, mas, documentos unilaterais elaborados sem os auspícios do contraditório, por si só, não são aptos (em princípio) a conduzir a uma condenação por atos de improbidade, devendo, mesmo como peças administrativas revestidas de presunção juris tantum de legitimidade, receber o apoio de outros meios de prova, que não foram produzidos. 14. Tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII - CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova. 15. Preliminar de prescrição afastada. Apelações providas. Sentença reformada. Improcedência (in totum) da ação. (AC 0027450-02.2009.4.01.3600, TRF1, Quarta Turma, Rel. Des. Fed. Olindo Menezes, e-DJF1 20/04/2023). Dessa forma, não comprovada a existência de dano, tampouco o dolo específico, deve ser afastada a condenação dos apelantes Neudo Ribeiro Campos, Olívia Paiva de Moura, Vagna Isaías Gomes de Lima, Rosilene Nogueira de Araujo e Suelen Dayana Moura Reolon, bem como de Angelo Paiva de Moura e Nádia Maria Santos Cunha, estes com base no efeito extensivo previsto no art. 1.005 do CPC e no art. 17, § 11, da Lei 8.249/1992. No que diz respeito aos recursos do MPF e da União, ausentes elementos probatórios suficientes para demonstrar o dolo específico ou o dano material efetivo, pressupostos indispensáveis para a tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/1992, consoante argumentos já expostos, não há como condenar os apelados Carlos Eduardo Levischi e Diva da Silva Briglia. Ante o exposto, rejeito as preliminares e dou provimento às apelações defensivas, para julgar improcedente o pedido deduzido na ação de improbidade administrativa com relação aos apelantes e, de ofício, por extensão, no que diz respeito aos corréus. Nego provimento aos recursos do MPF e da União. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002271-51.2005.4.01.4200 APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, UNIÃO FEDERAL, OLIVIA PAIVA DE MOURA, NEUDO RIBEIRO CAMPOS, ROSILENE NOGUEIRA DE ARAUJO CARVALHO, VAGNA ISAIAS GOMES, SUELEN DAYANA MOURA REOLON Advogado do(a) APELANTE: ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A Advogado do(a) APELANTE: MARCELO BRUNO GENTIL CAMPOS - PA13717-A APELADO: UNIÃO FEDERAL, SUELEN DAYANA MOURA REOLON, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA), NEUDO RIBEIRO CAMPOS, CARLOS EDUARDO LEVISCHI, ROSILENE NOGUEIRA DE ARAUJO CARVALHO, OLIVIA PAIVA DE MOURA REOLON, VANDERLEI LIMA SANTANA, DIVA DA SILVA BRIGLIA, ANGELO PAIVA DE MOURA, NADIA MARIA SANTOS CUNHA, VAGNA ISAIAS GOMES Advogado do(a) APELADO: ELLEN EURIDICE RODRIGUES CARDOSO - RR176-A Advogado do(a) APELADO: CARLOS NEY OLIVEIRA AMARAL - SP92049-A Advogado do(a) APELADO: MAMEDE ABRAO NETTO - RR223-A Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA DE SOUZA CRUZ SILVA - RR576-A Advogado do(a) APELADO: RAFAEL DE ALMEIDA PIMENTA PEREIRA - RR317-A EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. “ESCÂNDALO DOS GAFANHOTOS”. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL E CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADAS. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. ART. 10, I, XI E XII DA LIA. EFETIVO DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. DOLO ESPECÍFICO NÃO DEMONSTRADO. ATO ÍMPROBO NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSOS DE APELAÇÃO DA DEFESA PROVIDOS. RECURSOS DO MPF E DA UNIÃO NÃO PROVIDOS. 1. Ação de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF em razão de desvios de recursos públicos federais no caso conhecido como “Escândalo dos Gafanhotos”, que consistia na inclusão de pessoas humildes na folha de pagamento do estado de Roraima para posterior apropriação indevida dos valores por terceiros. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para condenar os denunciados com base no art. 10, I, XI e XII, da Lei 8.429/1992. O MPF e a União apelaram para requerer a condenação dos denunciados em relação aos quais foi aplicado perdão por força de colaboração premiada. A defesa interpôs recursos, alegando preliminares e no mérito, ausência de dolo e ou dano ao erário. 2. Há três questões centrais em discussão: (i) verificar a competência da Justiça Federal para apurar os fatos; ii) examinar a alegação de cerceamento de defesa; e (iii) verificar se houve prática de ato de improbidade administrativa por dano ao erário decorrente. 3. A jurisprudência do STJ e desta Corte Federal reconhece a competência da Justiça Federal para apurar supostos desvios de verba federal, mesmo após a incorporação pelo município, que continua sujeita à prestação de contas perante órgão federal, caracterizando o interesse mencionado no art. 109, I, da Constituição de 1988 (Súmula 208 do STJ). 4. Ao magistrado é facultado o indeferimento da produção de provas que julgar inúteis ou protelatórias (art. 370 do CPC), nos termos dos princípios do livre convencimento motivado e da livre apreciação das provas. 5. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (in rei psa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 6. O dolo é requisito indispensável para a tipificação de atos de improbidade administrativa, conforme fixado pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR (Tema 1.199) e pelo STJ no REsp 2.107.601/MG. Além disso, o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa visa proteger a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de garantir a integridade do patrimônio público e social, nos termos da lei. 7. No caso concreto, a prova constante nos autos é insuficiente para demonstrar a existência de dolo ou dano patrimonial efetivo decorrente das irregularidades apontadas. 8. A inexistência de prova robusta do dolo específico ou de má-fé dos apelantes, aliada à ausência de demonstração de prejuízo material, inviabiliza a configuração do ato ímprobo previsto no art. 10, I, XI e XII, da LIA. 9. Preliminares rejeitadas. Apelações defensivas providas, com extensão dos efeitos, de ofício, aos réus que não apelaram. Apelação do MPF e da União não providas. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, rejeitar as preliminares, dar provimento às apelações defensivas, com extensão, de ofício, aos réus que não apelaram e negar provimento aos recursos de apelação do MPF e da União. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 29/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado

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