Processo nº 0006430-24.2020.8.08.0048
ID: 331230078
Tribunal: TJES
Órgão: Gabinete Des. ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0006430-24.2020.8.08.0048
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANA MARIA TAMANINI
OAB/ES XXXXXX
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LEIDIANE JESUINO MALINI
OAB/ES XXXXXX
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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO 4ª CÂMARA CÍVEL PROCESSO Nº 0006430-24.2020.8.08.0048 APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: FABRICIO SMIDERLE PEREIRA e outros APELADO: UNIMED VITORIA COOPERATIVA D…
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO 4ª CÂMARA CÍVEL PROCESSO Nº 0006430-24.2020.8.08.0048 APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: FABRICIO SMIDERLE PEREIRA e outros APELADO: UNIMED VITORIA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO e outros (2) RELATOR(A):ROBSON LUIZ ALBANEZ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ EMENTA DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO DE URGÊNCIA. DOENÇA PREEXISTENTE. CLÁUSULA DE CPT. ILICITUDE DA RECUSA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS. LEGITIMIDADE PASSIVA RECONHECIDA. RECURSO DA OPERADORA DESPROVIDO. RECURSO DO CONSUMIDOR PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelações cíveis interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de obrigação de fazer, para impor à operadora UNIMED VITÓRIA a autorização de procedimento cirúrgico de urgência (ureterólise unilateral), afastando a cláusula de carência contratual, e extinguiu o feito, sem resolução do mérito, quanto à BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA., por ilegitimidade passiva, com condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se a negativa de cobertura do procedimento cirúrgico pela operadora de plano de saúde UNIMED VITÓRIA, fundada em cláusula de cobertura parcial temporária (CPT), é válida diante do reconhecimento da urgência do caso; (ii) estabelecer se a administradora de benefícios BENEVIX possui legitimidade passiva e responsabilidade solidária no caso de negativa de cobertura assistencial. III. RAZÕES DE DECIDIR Restou comprovado nos autos, por laudos médicos e solicitação de internação, que o procedimento cirúrgico de ureterólise unilateral possuía caráter de urgência, exigindo intervenção imediata para evitar lesões renais irreversíveis. O art. 35-C, I, da Lei 9.656/98 impõe a cobertura obrigatória de atendimentos de urgência após 24 horas de vigência contratual, não podendo cláusulas limitativas como a CPT prevalecer em tais hipóteses. A recusa de cobertura baseada unicamente na existência de doença preexistente, em contexto de urgência comprovada, configura prática abusiva e contrária ao direito à saúde e à boa-fé objetiva contratual. A administradora de benefícios BENEVIX integra a cadeia de fornecimento de serviços de saúde, na forma dos arts. 3º, 7º, parágrafo único, e 25, §1º do CDC, sendo legítima para figurar no polo passivo da ação. É irrelevante que a negativa tenha partido da operadora, pois, conforme entendimento consolidado do STJ e desta Corte, a responsabilidade dos fornecedores de serviços é objetiva e solidária, e a administradora se beneficia da relação contratual e induz legítima expectativa de cobertura no consumidor. A exclusão da BENEVIX do polo passivo contraria a principiologia consumerista e a teoria da aparência, pois sua atuação intermediadora influencia diretamente a prestação do serviço contratado. Reformada a sentença para reconhecer a legitimidade passiva e a responsabilidade solidária da BENEVIX, com consequente inversão dos honorários sucumbenciais. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso da UNIMED VITÓRIA desprovido. Recurso de FABRÍCIO SMIDERLE PEREIRA provido. Tese de julgamento: A negativa de cobertura de procedimento de urgência sob alegação de doença preexistente e cláusula de cobertura parcial temporária é ilícita, quando comprovada a urgência por profissional habilitado. Administradora de benefícios de plano de saúde é parte legítima e responde solidariamente com a operadora por danos causados ao consumidor, nos termos dos arts. 7º, parágrafo único, e 25, §1º do CDC. A responsabilidade solidária decorre da integração na cadeia de fornecimento e da expectativa legítima gerada no consumidor quanto à cobertura assistencial. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 3º, 6º, 7º, parágrafo único, 14, 25, §1º; Lei 9.656/98, arts. 12, V, "c", e 35-C, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 608; AgInt no AREsp 949.288/CE; AgInt no AREsp 892.340/SP; TJES, Apelação Cível 5017476-89.2023.8.08.0024; TJES, Apelação Cível 0012840-73.2020.8.08.0024. ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ ACÓRDÃO Decisão: À unanimidade, negar provimento ao recurso da Unimed Vitória e, por maioria de votos, dar provimento ao recurso de Fabricio Smiderle Pereira, nos termos do voto do Des. Arthur José Neiva de Almeida, designado para redigir o Acórdão. Órgão julgador vencedor: Gabinete Des. ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA Composição de julgamento: Gabinete Des. ROBSON LUIZ ALBANEZ - ROBSON LUIZ ALBANEZ - Relator / Gabinete Des. ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA - ARTHUR JOSE NEIVA DE ALMEIDA - Vogal / Gabinete Desª. ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA - ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA - Vogal / Gabinete Des. EWERTON SCHWAB PINTO JÚNIOR - EWERTON SCHWAB PINTO JUNIOR - Vogal / Gabinete Des. JÚLIO CESAR COSTA DE OLIVEIRA - JULIO CESAR COSTA DE OLIVEIRA - Vogal VOTOS VOGAIS Gabinete Des. ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA - ARTHUR JOSE NEIVA DE ALMEIDA (Vogal) Proferir voto escrito divergente Gabinete Desª. ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA - ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA (Vogal) Proferir voto escrito para acompanhar Gabinete Des. EWERTON SCHWAB PINTO JÚNIOR - EWERTON SCHWAB PINTO JUNIOR (Vogal) Proferir voto escrito para acompanhar divergência Gabinete Des. JÚLIO CESAR COSTA DE OLIVEIRA - JULIO CESAR COSTA DE OLIVEIRA (Vogal) Proferir voto escrito para acompanhar divergência DESEMBARGADOR(RES) IMPEDIDO(S) Gabinete Des. DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA - DAIR JOSE BREGUNCE DE OLIVEIRA (Vogal) Impedido ou Suspeito ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ RELATÓRIO _______________________________________________________________________________________________________________________________________________ NOTAS TAQUIGRÁFICAS APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006430-24.2020.8.08.0048 DATA DA SESSÃO: 10/06/2025 R E L A T Ó R I O O SR. DESEMBARGADOR SUBSTITUTO LUIZ GUILHERME RISSO (RELATOR):- Trata-se de apelação cível interposta por ambas as partes, eis que irresignado com os termos da r. sentença ID 8223660 que, nos autos de ação de obrigação de fazer, julgou parcialmente procedente o pleito autoral para impor à operadora UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO a obrigação específica de fazer, consistente na autorização do procedimento cirúrgico de ureterólise unilateral indicado ao autor, reconhecendo a natureza de urgência da intervenção e afastando a carência contratual invocada; e, de outro lado, extinguiu o processo sem resolução de mérito em relação à ré BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA., ao acolher a preliminar de ilegitimidade passiva arguida em contestação, condenando o autor ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor dessa parte, no percentual de 15% sobre o valor da causa. Nas suas razões, ID 8223662, FABRÍCIO SMIDERLE PEREIRA pretende a reforma parcial da sentença, ao fundamento de que a empresa Benevix integra a cadeia de fornecimento de serviços de saúde, sendo, portanto, parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, nos termos do Código de Defesa do Consumidor; sustenta a responsabilidade solidária entre todos os fornecedores que participam da relação consumerista, conforme precedentes jurisprudenciais colacionados; e, por fim, requer o afastamento da condenação ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, bem como a inversão dessa verba em favor do autor. Contrarrazões, ID 8223671, pelo desprovimento recursal. Nas suas razões, ID 34660695, UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, pretende a reforma da sentença, ao fundamento de que a negativa de cobertura do procedimento cirúrgico decorreu da cláusula contratual de Cobertura Parcial Temporária (CPT), prevista no art. 11 da Lei 9.656/98, considerando a doença preexistente informada pelo autor à época da contratação; sustenta a legalidade da conduta da operadora, o cumprimento do contrato e a ausência de urgência no procedimento pleiteado; aduz a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor em detrimento da legislação específica de saúde suplementar; e, ao final, requer o provimento do recurso para julgar improcedente o pedido inicial. Contrarrazões, ID 8223670, pelo desprovimento recursal. É o relatório. Inclua-se em pauta de julgamento. * V O T O O SR. DESEMBARGADOR SUBSTITUTO LUIZ GUILHERME RISSO (RELATOR):- Conforme relatado, cinge-se o presente recurso em aferir a juridicidade da sentença que nos autos de ação de obrigação de fazer, julgou parcialmente procedente o pleito autoral para impor à operadora UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO a obrigação específica de fazer, consistente na autorização do procedimento cirúrgico de ureterólise unilateral indicado ao autor, reconhecendo a natureza de urgência da intervenção e afastando a carência contratual invocada; e, de outro lado, extinguiu o processo sem resolução de mérito em relação à ré BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA., ao acolher a preliminar de ilegitimidade passiva arguida em contestação, condenando o autor ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor dessa parte, no percentual de 15% sobre o valor da causa. RECURSO INTERPOSTO POR FABRÍCIO SMIDERLE PEREIRA Nas suas razões, pretende o apelante a reforma parcial da sentença, ao fundamento de que a empresa Benevix integra a cadeia de fornecimento de serviços de saúde, sendo, portanto, parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, nos termos do Código de Defesa do Consumidor; sustenta a responsabilidade solidária entre todos os fornecedores que participam da relação consumerista, conforme precedentes jurisprudenciais colacionados; e, por fim, requer o afastamento da condenação ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, bem como a inversão dessa verba em favor do autor. Pois bem. Consigno inicialmente que as requeridas, Operadora de Saúde e a Administradora de benefícios, enquadram-se no conceito de fornecedor disposto no artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor e, nesses termos, compõem a cadeia de consumo, respondendo solidariamente pelos prejuízos causados aos beneficiários. Ademais, cumpre destacar que muito embora o artigo 14, §3º, inciso II do Código de Defesa do Consumidor estabeleça que o fornecedor apenas não será responsabilizado quando provar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, a adoção da referida excludente apenas é admitida em relação a terceiro que não compõe a relação de consumo, o que não é a hipótese dos autos, haja vista que o recorrido integra a relação existente com o consumidor/ apelado. Nesse sentido ainda, não se descura que a atividade das operadoras de plano de saúde deve se pautar pelos princípios e normas do Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça por meio da Súmula nº 608 que dispõe que "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão". Entretanto, competia à parte autora fazer prova, ainda que indiciária, dos fatos constitutivos de seu direito, in casu, quanto a negativa de liberação dos procedimentos e exames pela operadora do plano de saúde, nos termos relatados na petição inicial, notadamente porque não há como impor à requerida a produção de fato negativo. Ademais, em que pese o pacífico o entendimento jurisprudencial quanto à responsabilidade solidária entre a administradora e a operadora do plano de saúde, inclusive pela determinação do art. 7º, parágrafo único da Lei 8.078/1990, entendo que, no caso, não cabe, porquanto não lhe cabe gerência sobre questões assistenciais, como são as autorizações para exames e cirurgias. O caso dos autos não diz respeito a cancelamento ou negativa de fornecimento de tratamento por erro nos pagamentos do plano de saúde, de modo que não se trata de obrigação da recorrida Benevix Administradora de Benefícios LTDA. As provas dos autos demonstram de forma clara que a negativa da cobertura do procedimento cirúrgico de urgência partiu exclusivamente da operadora do plano de saúde, Unimed Vitória, sendo esta quem detinha a competência legal e contratual para a análise da cobertura, conforme expressamente reconhecido pela própria ré em sua contestação. A Benevix, por sua vez, limitou-se à função de administradora de benefícios, cuja atuação, conforme previsto nos artigos 2º e 3º da Resolução Normativa nº 196/2009 da ANS, restringe-se à gestão administrativa de planos coletivos, não lhe competindo a deliberação sobre autorizações assistenciais. Embora a tese recursal busque apoiar-se em jurisprudência que reconhece a responsabilidade solidária da administradora na cadeia de fornecimento, a aplicação dessa diretriz exige demonstração, ainda que mínima, de que a conduta ou omissão da administradora concorreu para a negativa de cobertura ou para a concretização do dano. No presente caso, tal nexo de imputação não restou configurado. O autor não indicou qualquer ato praticado pela Benevix que tenha influenciado ou determinado a recusa da cirurgia, tampouco trouxe aos autos prova de que a administradora tenha participado de forma relevante na dinâmica decisória relacionada ao atendimento de urgência. Além disso, é de se observar que o pedido inicial concentrou-se exclusivamente na obrigação de fazer, qual seja, a autorização e custeio do procedimento cirúrgico, matéria cuja competência, à luz da regulamentação da ANS e da jurisprudência dominante, recai sobre a operadora do plano, e não sobre a administradora. A própria petição inicial, ao narrar os fatos, direciona sua causa de pedir à atuação da operadora, o que reforça a improcedência da responsabilização da Benevix. Por fim, a sentença recorrida enfrentou adequadamente os argumentos apresentados, fundamentando-se em bases normativas e probatórias coerentes com o arcabouço legal aplicável à espécie, além de estar alinhada ao entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante sobre a matéria. Não há, portanto, vício de julgamento ou omissão que justifique sua reforma. Nesses termos, forçoso a manutenção da sentença que afastou a responsabilidade da recorrida. Portanto, conheço do recurso e nego-lhe provimento. Face ao desprovimento recursal, majoro os honorários sucumbenciais em 2%, nos termos do artigo 85, §11º, do CPC. É como voto. RECURSO INTERPOSTO POR UNIMED VITÓRIA - COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO Nas suas razões, pretende a reforma da sentença, ao fundamento de que a negativa de cobertura do procedimento cirúrgico decorreu da cláusula contratual de Cobertura Parcial Temporária (CPT), prevista no art. 11 da Lei 9.656/98, considerando a doença preexistente informada pelo autor à época da contratação; sustenta a legalidade da conduta da operadora, o cumprimento do contrato e a ausência de urgência no procedimento pleiteado; aduz a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor em detrimento da legislação específica de saúde suplementar; e, ao final, requer o provimento do recurso para julgar improcedente o pedido inicial. Pois bem. A controvérsia devolvida a esta instância recursal cinge-se à legalidade da negativa, por parte da operadora de plano de saúde, da autorização de procedimento cirúrgico prescrito em favor do recorrido, sob o fundamento de que se encontrava em curso cláusula de cobertura parcial temporária (CPT), prevista contratualmente para doenças preexistentes. Sustenta a recorrente que a patologia apresentada — litíase renal — fora informada pelo recorrido no momento da contratação, sendo, portanto, legítima a recusa ao custeio da intervenção enquanto não superado o prazo de carência de 24 (vinte e quatro) meses. Alega, ainda, que não se trata de hipótese de urgência, de modo que a cláusula contratual limitadora não poderia ser afastada com base nas normas protetivas do consumidor. Contudo, tal argumentação não prospera, pois, a sentença prolatada pelo juízo a quo encontra-se rigorosamente alinhada ao arcabouço normativo e jurisprudencial que disciplina a matéria, não merecendo reforma. Com efeito, restou comprovado nos autos, mediante documentação médica inequívoca, que o recorrido apresentou quadro clínico compatível com urgência urológica, consistente em cálculo renal de 10mm, sendo indicada intervenção cirúrgica imediata (ureterólise unilateral) para evitar agravamento do quadro e lesões renais irreversíveis. A solicitação de internação, acompanhada de exames e laudos médicos, comprova não apenas a existência da moléstia, mas a necessidade de resolução cirúrgica célere, o que, à luz da legislação vigente, atrai a obrigatoriedade de cobertura pelo plano, independentemente de cláusulas restritivas. Vale lembrar que, nos termos do art. 12, inciso V, alínea “c”, da Lei nº 9.656/98, o prazo de carência para cobertura de procedimentos de urgência e emergência é de, no máximo, 24 (vinte e quatro) horas a contar da vigência do contrato. Com base nesse dispositivo, o art. 35-C, I, da mesma lei determina que é obrigatória a cobertura do atendimento nos casos de emergência, definidos como aqueles que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, desde que assim caracterizado por declaração do médico assistente. No presente feito, todos os requisitos legais encontram-se preenchidos: a situação de urgência foi atestada por profissional médico vinculado à rede credenciada da própria operadora, o procedimento cirúrgico foi prescrito como imprescindível para a saúde do paciente, e a carência mínima de 24 horas já se encontrava cumprida. Ademais, não se pode perder de vista que a relação jurídica entre as partes é inequivocamente de consumo, conforme reconhecido expressamente pelo Superior Tribunal de Justiça na Súmula nº 608. Nessa perspectiva, incidem os princípios da vulnerabilidade do consumidor e da interpretação mais favorável ao aderente, especialmente em se tratando de contrato de adesão, como é o caso. Assim, mesmo que se reconheça a validade formal da cláusula de CPT prevista contratualmente, ela não pode se sobrepor ao direito à saúde e à vida do paciente, tampouco pode ser utilizada como instrumento de recusa arbitrária e desproporcional em contextos de urgência médica, conforme consolidado pela jurisprudência do STJ (v.g., AgInt no AREsp 949.288/CE e AgInt no AREsp 892.340/SP). Nesse sentido, revela-se ilícita a negativa de cobertura, mesmo diante de cláusula de CPT expressa, quando evidenciado o caráter urgente do procedimento requerido, sobretudo quando demonstrado que a recusa da operadora não decorreu de dúvida razoável sobre a necessidade ou urgência do atendimento, mas exclusivamente da invocação de cláusula contratual cujo alcance deve ser mitigado quando em confronto com situações emergenciais, nos termos da legislação específica. Além disso, a conduta da operadora, ao recusar a autorização para cirurgia de comprovada urgência, sem oferecer alternativa eficaz ou apresentar motivação técnica fundamentada, mostra-se incompatível com o dever de boa-fé objetiva contratual, cuja violação, nos moldes da doutrina moderna, pode caracterizar o exercício abusivo do direito contratual, notadamente nos casos em que há evidente desproporção entre os meios utilizados pela fornecedora de serviços e os fins legítimos da proteção contratual. Portanto, sob qualquer ângulo que se analise a controvérsia, a sentença deve ser mantida. O juízo singular apreciou adequadamente os elementos probatórios constantes dos autos e aplicou corretamente o direito ao caso concreto. A recusa de cobertura, amparada exclusivamente em cláusula de CPT, não se sustenta diante da inequívoca comprovação da situação de urgência, razão pela qual a condenação imposta à operadora para custear o procedimento indicado deve ser integralmente preservada. Diante do exposto, conheço do recurso e nego-lhe provimento, mantendo incólume a r. sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos. Deixo de proceder à majoração dos honorários, porquanto já fixados no percentual máximo pela sentença recorrida. É como voto. * IMPEDIMENTO O SR. DESEMBARGADOR DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA:- Declaro meu impedimento para atuar neste feito. * V I S T A O SR. DESEMBARGADOR ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA:- Respeitosamente, peço vista dos autos. * ts* CONTINUAÇÃO DO JULGAMENTO: 24/06/2025 V O T O (PEDIDO DE VISTA) O SR. DESEMBARGADOR ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA:- Rememorando, trata-se de dois recursos de APELAÇÃO CÍVEL em razão da sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão deduzida na presente Ação de Obrigação de Fazer, para impor à operadora UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO a obrigação específica de fazer, consistente na autorização do procedimento cirúrgico de ureterólise unilateral indicado ao Autor, reconhecendo a natureza de urgência da intervenção e afastando a carência contratual invocada; e, de outro lado, extinguiu o processo sem resolução de mérito em relação à ré BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA, ao acolher a preliminar de ilegitimidade passiva arguida em contestação. O eminente Relator, Desembargador Robson Luiz Albanez, prolatou voto no sentido de negar provimento a ambos os recursos. Com a devida vênia ao ilustre Relator, ouso divergir parcialmente do entendimento por ele esposado quanto à ilegitimidade passiva da empresa Benevix Administradora de Benefícios Ltda., por entender que a mesma deve sim ser considerada parte legítima na presente demanda, na qualidade de integrante da cadeia de fornecimento de serviços na relação de consumo, nos exatos termos do Código de Defesa do Consumidor. A controvérsia reside, especificamente, na análise da responsabilidade da Benevix, administradora do plano de saúde coletivo contratado por FABRICIO SMIDERLE PEREIRA, pela negativa de cobertura de procedimento cirúrgico de urgência, cuja autorização foi recusada, conforme assentado, pela operadora Unimed Vitória. Embora o voto condutor reconheça a atuação da Benevix apenas como mera gestora administrativa, entendo que a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, bem como dos tribunais pátrios, impõe interpretação mais ampla e consentânea com a principiologia protetiva do consumidor. Consoante o art. 3º do Código de Defesa do Consumidor: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.” De igual modo, o parágrafo único do art. 7º do CDC estabelece: “Havendo mais de um responsável pela ofensa aos direitos do consumidor, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.” É incontroverso nos autos que a Benevix foi a administradora responsável pela intermediação e gestão do plano de saúde contratado pelo autor. E como tal, integra a cadeia de fornecimento do serviço de saúde, ainda que sua atuação tenha natureza eminentemente administrativa. Este egrégio Tribunal, embora haja controvérsia, tem entendido que a administradora de benefícios responde solidariamente com a operadora do plano pelos prejuízos causados ao consumidor, porquanto ambas se beneficiam economicamente da contratação e atuam de forma integrada na operacionalização do plano. Neste sentido: DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. RECÉM-NASCIDO. ISENÇÃO DE CARÊNCIA. RESTITUIÇÃO SIMPLES. DANOS MORAIS AFASTADOS. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME Ação de Obrigação de Fazer c/c danos morais ajuizada por C.A.D.A., representada por ANA KARINY DE OLIVEIRA ARAÚJO ABREU, contra QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS S.A. O pedido inicial visava à cobertura de exames médicos e consultas para a filha recém-nascida da autora, alegando negativa indevida de cobertura em razão de carência contratual. O Juízo de primeira instância condenou solidariamente as rés ao pagamento de R$ 750,00, em dobro, a título de danos materiais, e R$ 10.000,00 por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há quatro questões em discussão: (i) definir se a apelante, como administradora de benefícios, possui legitimidade para figurar no polo passivo da demanda; [...] IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: A administradora de benefícios é parte legítima para responder por negativa de cobertura em plano de saúde. [...] (TJES, APELAÇÃO CÍVEL 5017476-89.2023.8.08.0024, Magistrado: MARIANNE JUDICE DE MATTOS, Órgão julgador: 1ª Câmara Cível, Data: 29/11/2024). APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA - REJEITADA – NEGATIVA INJUSTIFICADA DE AUTORIZAR O PROCEDIMENTO – PARECER DO MÉDICO ASSISTENTE – DANO MORAL CONFIGURADO - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1 – A jurisprudência pátria tem o firme entendimento de que a operadora do plano de assistência à saúde e a administradora de benefícios respondem solidariamente pelos prejuízos causados aos beneficiários, pois ambas fazem parte da cadeia de fornecimento de serviço na relação de consumo, em observância aos artigos 7º, parágrafo único, 25, §1º, e 34 do Código de Defesa do Consumidor. Preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada. [...] 6 - Recurso conhecido e desprovido (TJES, APELAÇÃO CÍVEL 0012840-73.2020.8.08.0024, Magistrado: FABIO BRASIL NERY, Órgão julgador: 4ª Câmara Cível, Data: 17/05/2024). Não se pode admitir interpretação restritiva da atuação da administradora de benefícios, sob pena de esvaziar a efetividade do CDC, mormente quando esta figura como canal direto entre o consumidor e a operadora, interferindo na contratação e execução dos serviços. Assim, exigir do consumidor que demonstre ato comissivo ou omissivo específico da Benevix apto a configurar o nexo causal é negar a aplicação da responsabilidade objetiva e solidária que rege as relações de consumo. Ademais, a teoria da aparência justifica a responsabilização da administradora, pois esta apresenta-se ao consumidor como partícipe da prestação de serviços de saúde, ainda que indiretamente. O autor, ao aderir ao plano de saúde, teve como intermediadora a Benevix, a qual, por sua conduta, criou legítima expectativa no consumidor quanto à regularidade e integralidade da cobertura do serviço contratado. Neste contexto, impende reconhecer a legitimidade passiva da Benevix e, por conseguinte, afastar a sua exclusão do polo passivo, reconhecendo, ademais, sua responsabilidade solidária pelos prejuízos causados ao autor, inclusive no que diz respeito à negativa indevida de cobertura de procedimento cirúrgico de urgência, o que, conforme jurisprudência pacífica, configura violação ao direito à saúde e enseja reparação por danos morais. Portanto, sob uma ótica sistemática e integrativa do ordenamento consumerista e jurisprudência dominante, não subsiste fundamento jurídico que justifique a exclusão da Benevix da lide, devendo ser reformada a sentença para reconhecer sua legitimidade e responsabilização solidária. ANTE O EXPOSTO, com a máxima vênia ao eminente Relator, DOU PROVIMENTO AO RECURSO DE FABRÍCIO SMIDERLE PEREIRA para reconhecer a legitimidade passiva da empresa BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA., afastando sua exclusão da lide, bem como para declarar sua responsabilidade solidária pelos danos experimentados pelo autor, inclusive os danos morais já reconhecidos na sentença. Consequentemente, afasto a condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor da Benevix e inverto tal condenação em desfavor desta. É como voto. * V I S T A A SRA. DESEMBARGADORA ELIANA JUNQUEIRA MUNHÓS FERREIRA:- Eminente Presidente, respeitosamente, peço vista dos autos. * jrp* CONTINUAÇÃO DO JULGAMENTO: 01/07/2025 V O T O (PEDIDO DE VISTA) A SRA. DESEMBARGADORA ELIANA JUNQUEIRA MUNHÓS FERREIRA:- Trata-se de recursos de apelações cíveis interpostos por FABRICIO SMIDERLE PEREIRA e pela UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO contra a sentença que julgou procedente o pedido em face da Unimed Vitória, determinando a autorização do procedimento cirúrgico de urgência (ureterólise unilateral), afastando a carência contratual, bem como, extinguiu o processo sem resolução de mérito em relação à Benevix Administradora de Benefícios Ltda., por reconhecer sua ilegitimidade passiva. Muito sinteticamente, esclareço que o apelo de Fabrício Smiderle Pereira busca a reforma da sentença para que a Administradora Benevix seja reconhecida como parte legítima e condenada solidariamente, com base na tese de que integra a cadeia de fornecimento de serviços de saúde, conforme o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Lado outro, o apelo da Unimed Vitória defende a legalidade da recusa, com base na cláusula de Cobertura Parcial Temporária (CPT) para doença preexistente e na ausência de urgência. O eminente Relator, Des. Robson Luiz Albanez, proferiu voto no sentido de negar provimento a ambos os recursos, mantendo integralmente a sentença, fundamentando o voto no fato de que a responsabilidade da administradora de benefícios (Benevix) restringe-se a questões de gestão administrativa, como a intermediação da contratação e a gestão de pagamentos, não obstante, a controvérsia, refere-se a uma negativa de cobertura assistencial (autorização de cirurgia), matéria sobre a qual a administradora não possui qualquer gerência ou poder decisório, sendo que a recusa partiu exclusivamente da operadora Unimed Vitória, não havendo nos autos prova de que a Benevix tenha concorrido para o dano. Em relação ao recurso da operadora de plano de saúde Unimed, afirmou que a negativa de cobertura foi ilícita, pois o caráter de urgência do procedimento, atestado por laudos médicos, prevalece sobre a cláusula de carência (CPT). Em seguida, o nobre Des. Arthur José Neiva de Almeida proferiu voto de divergência parcial, quanto a legitimidade e responsabilidade da administradora Benevix, compreendendo que a administradora de benefícios integra a cadeia de fornecimento de serviços e, portanto, responde solidariamente pelos danos causados ao consumidor, nos termos dos artigos 7º, parágrafo único, e 25, §1º, do CDC. Assim, deu provimento ao recurso de Fabrício Smiderle Pereira para reconhecer a legitimidade passiva da empresa Benevix Administradora de Benefícios Ltda., afastando sua exclusão da lide, bem como para declarar sua responsabilidade solidária pelos danos experimentados pelo autor, inclusive os danos morais já reconhecidos na sentença, afastando a condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor da Benevix e invertendo tal condenação em desfavor desta. Registrado o impedimento do Des. Dair Jose Bregunce de Oliveira, pedi vista dos autos para melhor exame da controvérsia, especialmente no que tange à divergência inaugurada pelo eminente Desembargador Arthur José Neiva de Almeida acerca da responsabilidade da administradora de benefícios. Importa registrar, de início, em total consonância com os votos antecedentes, não remanescem dúvidas quanto à ilicitude da recusa de cobertura perpetrada pela operadora Unimed Vitória, uma vez que o caráter de urgência do procedimento médico foi devidamente comprovado nos autos, sobrepondo-se, portanto, a quaisquer cláusulas contratuais de carência ou de cobertura parcial temporária - CPT, nos termos da legislação aplicável. Não obstante, com a máxima vênia ao eminente Relator, e conquanto minha deliberação final venha a convergir com o resultado prático por Sua Excelência proposto, sinto-me compelida, por dever de ofício e para a escorreita formação de meu convencimento, a trilhar uma fundamentação distinta. Explico: O epicentro da divergência parcial, inaugurada pelo preclaro Desembargador Arthur José Neiva de Almeida, reside, com efeito, na aferição da legitimidade passiva da empresa Benevix Administradora de Benefícios Ltda, porquanto propugna a tese de que a administradora, na qualidade de integrante da cadeia de fornecimento de serviços, ostenta plena pertinência subjetiva para a causa, devendo, por conseguinte, responder de forma solidária pelos prejuízos advindos da negativa de cobertura ao consumidor, na forma da jurisprudência citada. É nesse particular que proponho-me a externar uma linha de raciocínio própria , ainda que se alinhe, ao final, ao desfecho em favor da administradora, como o fez o nobre Relator. Isso porque, em meu sentir, a preliminar de ilegitimidade passiva, acolhida na origem, não mereceria prosperar. Adoto, para a análise das condições da ação, a teoria da asserção (in status assertionis), segundo a qual a pertinência subjetiva da lide é aferida em abstrato, com base na narrativa fática apresentada pelo autor em sua peça de ingresso. Na hipótese, o demandante afirmou em sua petição inicial, à fl. 05, ipsis litteris, que “No momento da negativa, o Primeiro Requerente informou que deveria ser realizado contato com a Segunda Requerida, o que no momento se mostrou impossível, dado o horário da ocasião que já superava o comercial”. Esta simples alegação, ao inserir a administradora na cadeia de eventos que culminaram na suposta lesão ao direito do consumidor, estabelece o nexo de imputação hipotético suficiente para legitimá-la a figurar no polo passivo da demanda. A verificação da efetiva responsabilidade da Benevix pela recusa seria questão que transbordaria os limites da análise prefacial, constituindo, em verdade, o próprio mérito da causa. Por essa razão, a preliminar de ilegitimidade deveria ter sido rejeitada. Não obstante, superada tal questão, ao adentrar o mérito, minha conclusão seria pela improcedência do pedido em face da Administradora do Plano de Saúde Benevix. Isso porque, a instrução dos autos demonstra que o ato de recusa do procedimento cirúrgico foi uma deliberação exclusiva da operadora de saúde (Unimed Vitória), sem qualquer participação ou ingerência da administradora. A função desta, no arranjo contratual, limitou-se à gestão administrativa, não se estendendo à seara assistencial, inexistindo sequer indícios de que houve alguma falha da Administradora a contribuir para a negativa perpetrada pela Unimed ao procedimento cirúrgico necessário. Por sinal, observo dos autos que, após ser indagado sobre a individualização das responsabilidades de cada requerida, o autor (também apelante) se manifestou da seguinte forma às fls. 41/42: “A Segunda Requerida foi incluída no feito, visto que se caracteriza pela administradora de benefícios coletivos em saúde para a entidade de classes profissionais, como a de médicos, como o do Requerente, ou seja, é a intermediária. A inclusão no feito se deu porque a contratação dos serviços da Primeira Requerida se deu justamente através da Segunda Requerida, sendo esta também responsável pela má prestação do serviço”. O CDC, em seu art. 7º, parágrafo único, e art. 25, §1º1, prevê a responsabilidade solidária de todos os integrantes da cadeia de fornecimento pelo dano causado ao consumidor, e a jurisprudência do c. STJ perfilha o entendimento de que “(…) a administradora do plano de saúde possui responsabilidade solidária com a operadora do benefício, em razão do papel de destaque que ocupa na intermediação da contratação” (AgInt no AREsp n. 2.307.944/BA, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 18/9/2023, DJe de 22/9/2023.). Embora não ignore as posições contrárias, penso que a aplicação de tal diretriz não se opera de forma automática ou irrestrita a toda e qualquer controvérsia. A referida responsabilidade solidária tem sido afirmada, com maior veemência, nas hipóteses em que a falha na prestação do serviço se origina na esfera de atuação direta da administradora, notadamente, nas situações como o indevido cancelamento do contrato; na exclusão arbitrária de beneficiários, ou falhas na gestão dos pagamentos e comunicações, ou seja, quando sua atuação ou omissão é a causa direta ou concorrente do dano. Lado outro, quando ocorre negativa de cobertura de tratamento médico ou internações, ato exclusivo da operadora de saúde (art.3º da RN ANS 515/20222), alinho-me à posição que entende inexistir legitimidade (quando sequer abstratamente é atribuído qualquer ato omissivo ou comissivo à administradora) ou responsabilidade da intermediária, se não houver demonstração de concreta participação desta para o resultado lesivo. Vejamos: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C . INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ILEGITIMIDADE PASSIVA ACOLHIDA. RECURSO PROVIDO. I . Caso em Exame Recurso de apelação interposto por Affix Administradora de Benefícios Ltda. contra sentença que julgou procedente ação de obrigação de fazer com tutela antecipada e indenização por danos morais, determinando a liberação de tratamento médico e condenando ao pagamento de R$ 10.000,00 por danos morais. II . Questão em Discussão 2. A questão em discussão consiste em (i) ilegitimidade passiva da administradora de plano de saúde para autorizar procedimentos médicos e (ii) ausência de comprovação dos danos morais sofridos pela autora. III. Razões de Decidir 3 . A Affix Administradora de Benefícios Ltda. não possui legitimidade passiva, pois sua atuação se limita à intermediação contratual, sem ingerência sobre decisões de cobertura médica, conforme Resolução Normativa nº 515/2022 da ANS. 4. A responsabilidade solidária entre fornecedores de serviços não se aplica à administradora, que não autoriza procedimentos médicos . IV. Dispositivo e Tese 5. Recurso provido. Exclusão da Affix Administradora de Benefícios Ltda . do polo passivo e extinção do processo em relação a ela. Tese de julgamento: 1. Administradora de benefícios não possui legitimidade passiva para autorizar procedimentos médicos. 2 . Intermediação contratual não implica responsabilidade por negativa de cobertura. Legislação Citada: Lei nº 8.078/90, art. 3º; Resolução Normativa nº 515/2022 da ANS, art . 3º; CPC, art. 85, § 8º. Jurisprudência Citada: TJSP, Apelação Cível 1000907-80.2022 .8.26.0100, Rel. José Carlos Ferreira Alves, 2ª Câmara de Direito Privado, j . 09.11.2023; TJSP, Apelação Cível 0701607-15.2012 .8.26.0704, Rel. Donegá Morandini, 3ª Câmara de Direito Privado, j . 14.05.2013. (TJ-SP - Apelação Cível: 10161460820218260344 Marília, Relator.: Gilberto Franceschini, Data de Julgamento: 17/12/2024, Núcleo de Justiça 4 .0 em Segundo Grau – Turma III (Direito Privado 1), Data de Publicação: 17/12/2024) Ação de indenização a título de danos material e moral. Contrato de plano de saúde firmado com a 2ª ré - UNIMED RIO, por meio da 1ª ré - QUALICORP. Autor que necessitou de atendimento de urgência. Diagnóstico apontando tromboembolismo, culminando com internação em CTI . Operadora que negou autorização para atendimento de emergência, após 12h de internação no CTI, sendo que a empresa Medise (3ª ré), onde o autor foi atendido vem efetuando cobrança de pagamento de fatura pelo tempo de atendimento não coberto pelo plano de saúde. Sentença de procedência em relação as rés QUALICORP e UNIMED RIO (1ª e 2ª rés) e de improcedência em relação a sociedade MEDISE (3ª ré). Apelo de QUALICORP (1ª ré), reiterando sua ilegitimidade passiva, requerendo a improcedência dos pedidos e, subsidiariamente, a redução da indenização por dano moral. Evidencia-se nos autos, de forma clara, que a empresa QUALICORP (1ª ré) não possui responsabilidade em relação à cobertura de procedimento a que se submeteu o autor, porquanto, na condição de administradora de benefícios, apenas atua na confecção do contrato de plano de saúde coletivo por adesão, entre o consumidor e a operadora de saúde . Entretanto, não delibera ou possui qualquer ingerência sobre a cobertura de procedimentos, uma vez que tal responsabilidade cabe tão somente à operadora do plano de saúde (UNIMED RIO). Manifesta ilegitimidade da parte ré - QUALICORP. Ônus de sucumbência invertidos, observada a gratuidade de justiça deferida ao autor. PROVIMENTO DO RECURSO, extinguindo-se o processo sem apreciação do mérito, reconhecendo-se a ilegitimidade passiva ad causam, a teor do disposto no art . 485, VI da Lei de Ritos. (TJ-RJ - APL: 00234322420208190202 2022001103695, Relator.: Des(a). SIRLEY ABREU BIONDI, Data de Julgamento: 16/03/2023, DÉCIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 20/03/2023) Não havendo nexo de causalidade entre qualquer conduta da Benevix e o dano experimentado pelo autor, a improcedência do pedido em relação a ela seria a medida de rigor. Não obstante o raciocínio acima exposto, que constitui entendimento pessoal sobre a melhor técnica processual a ser aplicada, verifico que a conclusão prática da presente análise – a de que a Benevix Administradora de Benefícios Ltda. não deve ser responsabilizada civilmente no caso concreto – converge com o resultado alcançado pelo voto do eminente Desembargador Relator, o qual negou provimento a ambos os recursos interpostos pela Unimed Vitória e pelo autor Fabrício S. Pereira, mantendo incólume a sentença que julgou procedente o pedido, exclusivamente, em face da Unimed Vitória, determinando a autorização do procedimento cirúrgico de urgência (ureterólise unilateral), afastando a carência contratual. Dessa forma, em homenagem à disciplina judiciária e ao princípio da colegialidade, e com o fito de evitar a dispersão de votos, adiro à conclusão externada pelo ilustre Relator, Des. Robson Luiz Albanez, por negar provimento aos recursos interpostos. É como voto. * V I S T A A SRA. DESEMBARGADORA ELIANA JUNQUEIRA MUNHÓS FERREIRA (NO EXERCÍCIO DA PRESIDÊNCIA):- Convoco os eminentes desembargadores Ewerton Schwab Pinto Júnior e Júlio César Costa de Oliveira para compor quorum neste feito. Os autos vão com vista ao gabinete do eminente Desembargador Ewerton Schwab Pinto Júnior. * jrp* CONTINUAÇÃO DO JULGAMENTO: 08/07/2025 V O T O O SR. DESEMBARGADOR JÚLIO CÉSAR COSTA DE OLIVEIRA:- Eminentes Pares, Vieram-me os autos conclusos em razão da técnica de julgamento escupida no art. 942 do CPC, especialmente diante da divergência inaugurada pelo nobre Desembargador Arthur José Neiva de Almeida em relação ao voto do ilustre Relator, Desembargador Robson Luiz Albanez. A questão central da divergência reside na legitimidade passiva e na responsabilidade solidária da empresa BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA. O eminente Relator votou pela manutenção da sentença, que excluiu a Benevix da lide por ilegitimidade passiva, ao passo que o ilustre Desembargador Arthur José Neiva de Almeida votou pelo provimento do apelo do autor, para reconhecer a legitimidade e a responsabilidade solidária da administradora, com base na teoria da cadeia de fornecimento do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Após detida análise dos autos e dos argumentos lançados, peço vênia ao eminente Relator, bem como à nobre Desembargadora Eliana Junqueira Munhós Ferreira que o acompanhou, para aderir integralmente à divergência inaugurada pelo Desembargador Arthur José Neiva de Almeida. Comungo do entendimento de que a administradora de benefícios, ao atuar na intermediação e gestão do contrato de plano de saúde, integra, para todos os efeitos, a cadeia de fornecimento de serviços perante o consumidor. A relação jurídica em tela é inegavelmente de consumo, atraindo a incidência do microssistema protetivo do CDC, conforme pacificado pela Súmula nº 608 do Superior Tribunal de Justiça. Nesse contexto, a responsabilidade dos fornecedores é objetiva e solidária, nos exatos termos do parágrafo único do artigo 7º e do §1º do artigo 25 do referido diploma legal. A solidariedade, nesse caso, visa a facilitar a reparação integral dos danos sofridos pelo consumidor, que não pode ser onerado com a complexa tarefa de distinguir as atribuições internas de cada empresa que compõe o conglomerado econômico que lhe presta o serviço. Conforme bem pontuado pelo Desembargador Arthur José Neiva de Almeida, a administradora se apresenta ao consumidor como partícipe essencial do negócio, criando uma legítima expectativa de garantia e segurança. A negativa de cobertura, embora operacionalizada pela Unimed Vitória, frustra a expectativa criada por toda a cadeia de fornecedores, da qual a Benevix é peça fundamental. A tese de que a responsabilidade da administradora se restringe a questões administrativas e que não possui gerência sobre a parte assistencial não pode prevalecer para afastar sua legitimidade passiva, notadamente porque ambas as empresas, operadora e administradora, se beneficiam economicamente da relação contratual. Exigir do consumidor a prova de que a administradora concorreu diretamente para a negativa de cobertura seria impor-lhe um ônus probatório excessivo, o que é incompatível com os princípios da vulnerabilidade e da facilitação da defesa de seus direitos em juízo, pilares do CDC. Ante o exposto, e com a renovada vênia ao nobre Relator, acompanho na íntegra os fundamentos e as conclusões do voto divergente e DOU PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO POR FABRÍCIO SMIDERLE PEREIRA, para reformar a r. sentença e reconhecer a legitimidade passiva da empresa BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA., declarando sua responsabilidade solidária pelos danos causados ao autor. Por consequência, afasto a condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios em favor da Benevix e inverto o ônus, condenando esta, solidariamente com a Unimed Vitória, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. No mais, acompanho o eminente Relator quanto ao desprovimento do recurso interposto pela UNIMED VITÓRIA. É como voto. * V I S T A A SRA. DESEMBARGADORA ELIANA JUNQUEIRA MUNHÓS FERREIRA (NO EXERCÍCIO DA PRESIDÊNCIA):- Então o Desembargador Júlio César antecipa seu voto e os autos irão com vista ao gabinete do Desembargador Ewerton Schwab Pinto Júnior. * CONTINUAÇÃO DO JULGAMENTO: 15/07/2025 V O T O PEDIDO DE VISTA O SR. DESEMBARGADOR EWERTON SCHWAB PINTO JÚNIOR:- Eminentes Desembargadores, fui honrosamente convocado para integrar o quorum de julgamento do presente recurso e pude examinar o caso trazido à análise deste órgão julgador. Rememoro tratar-se de recursos de apelação cível interpostos por ambas as partes contra sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão autoral, para impor à operadora UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO a obrigação específica de fazer, consistente na autorização do procedimento cirúrgico; e, de outro lado, extinguiu o processo em relação à ré BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA, ao acolher a preliminar de ilegitimidade passiva. Não obstante o respeitável entendimento do eminente Relator, Des. Subst. Luiz Guilherme Risso, que entendeu por negar provimento a ambos os recursos, coaduno com a conclusão do e. Des. Arthur José Neiva de Almeida Lima, acompanhado pelo e. Des. Julio Cesar Costa de Oliveira, que divergiu para reconhecer a legitimidade passiva da Benevix e, por conseguinte, afastar a sua exclusão do polo passivo, reconhecendo, ademais, sua responsabilidade solidária pelos prejuízos causados ao autor. Assim, na esteira dos judiciosos votos já proferidos, sem mais delongas, ACOMPANHO A DIVERGÊNCIA inaugurada pelo e. Des. Arthur José Neiva de Almeida Lima. É como voto. * ts* 1Art. 7º, parágrafo único, do CDC: “Havendo mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.” Art. 25, §1º, do CDC: “Havendo mais de um responsável pela ofensa ao consumidor, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos.” 2Art. 3º A Administradora de Benefícios não poderá atuar como representante, mandatária ou prestadora de serviço da Operadora de Plano de Assistência à Saúde nem executar quaisquer atividades típicas da operação de planos privados de assistência à saúde.” ________________________________________________________________________________________________________________________________________________ VOTO VENCEDOR VOGAL: DESEMBARGADOR ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA PEDIDO DE VISTA (Continuação de julgamento) Rememorando, trata-se de dois recursos de APELAÇÃO CÍVEL em razão da sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão deduzida na presente Ação de Obrigação de Fazer, para impor à operadora UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO a obrigação específica de fazer, consistente na autorização do procedimento cirúrgico de ureterólise unilateral indicado ao Autor, reconhecendo a natureza de urgência da intervenção e afastando a carência contratual invocada; e, de outro lado, extinguiu o processo sem resolução de mérito em relação à ré BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA, ao acolher a preliminar de ilegitimidade passiva arguida em contestação. O eminente Relator, Desembargador Robson Luiz Albanez, prolatou voto no sentido de negar provimento a ambos os recursos. Com a devida vênia ao ilustre Relator, ouso divergir parcialmente do entendimento por ele esposado quanto à ilegitimidade passiva da empresa Benevix Administradora de Benefícios Ltda., por entender que a mesma deve sim ser considerada parte legítima na presente demanda, na qualidade de integrante da cadeia de fornecimento de serviços na relação de consumo, nos exatos termos do Código de Defesa do Consumidor. A controvérsia reside, especificamente, na análise da responsabilidade da Benevix, administradora do plano de saúde coletivo contratado por FABRICIO SMIDERLE PEREIRA, pela negativa de cobertura de procedimento cirúrgico de urgência, cuja autorização foi recusada, conforme assentado, pela operadora Unimed Vitória. Embora o voto condutor reconheça a atuação da Benevix apenas como mera gestora administrativa, entendo que a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, bem como dos tribunais pátrios, impõe interpretação mais ampla e consentânea com a principiologia protetiva do consumidor. Consoante o art. 3º do Código de Defesa do Consumidor: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.” De igual modo, o parágrafo único do art. 7º do CDC estabelece: “Havendo mais de um responsável pela ofensa aos direitos do consumidor, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.” É incontroverso nos autos que a Benevix foi a administradora responsável pela intermediação e gestão do plano de saúde contratado pelo autor. E como tal, integra a cadeia de fornecimento do serviço de saúde, ainda que sua atuação tenha natureza eminentemente administrativa. Este egrégio Tribunal, embora haja controvérsia, tem entendido que a administradora de benefícios responde solidariamente com a operadora do plano pelos prejuízos causados ao consumidor, porquanto ambas se beneficiam economicamente da contratação e atuam de forma integrada na operacionalização do plano. Neste sentido: DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. RECÉM-NASCIDO. ISENÇÃO DE CARÊNCIA. RESTITUIÇÃO SIMPLES. DANOS MORAIS AFASTADOS. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME Ação de Obrigação de Fazer c/c danos morais ajuizada por C.A.D.A., representada por ANA KARINY DE OLIVEIRA ARAÚJO ABREU, contra QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS S.A. O pedido inicial visava à cobertura de exames médicos e consultas para a filha recém-nascida da autora, alegando negativa indevida de cobertura em razão de carência contratual. O Juízo de primeira instância condenou solidariamente as rés ao pagamento de R$ 750,00, em dobro, a título de danos materiais, e R$ 10.000,00 por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há quatro questões em discussão: (i) definir se a apelante, como administradora de benefícios, possui legitimidade para figurar no polo passivo da demanda; [...] IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: A administradora de benefícios é parte legítima para responder por negativa de cobertura em plano de saúde. [...] (TJES, APELAÇÃO CÍVEL 5017476-89.2023.8.08.0024, Magistrado: MARIANNE JUDICE DE MATTOS, Órgão julgador: 1ª Câmara Cível, Data: 29/11/2024). APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA - REJEITADA – NEGATIVA INJUSTIFICADA DE AUTORIZAR O PROCEDIMENTO – PARECER DO MÉDICO ASSISTENTE – DANO MORAL CONFIGURADO - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1 – A jurisprudência pátria tem o firme entendimento de que a operadora do plano de assistência à saúde e a administradora de benefícios respondem solidariamente pelos prejuízos causados aos beneficiários, pois ambas fazem parte da cadeia de fornecimento de serviço na relação de consumo, em observância aos artigos 7º, parágrafo único, 25, §1º, e 34 do Código de Defesa do Consumidor. Preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada. [...] 6 - Recurso conhecido e desprovido (TJES, APELAÇÃO CÍVEL 0012840-73.2020.8.08.0024, Magistrado: FABIO BRASIL NERY, Órgão julgador: 4ª Câmara Cível, Data: 17/05/2024). Não se pode admitir interpretação restritiva da atuação da administradora de benefícios, sob pena de esvaziar a efetividade do CDC, mormente quando esta figura como canal direto entre o consumidor e a operadora, interferindo na contratação e execução dos serviços. Assim, exigir do consumidor que demonstre ato comissivo ou omissivo específico da Benevix apto a configurar o nexo causal é negar a aplicação da responsabilidade objetiva e solidária que rege as relações de consumo. Ademais, a teoria da aparência justifica a responsabilização da administradora, pois esta apresenta-se ao consumidor como partícipe da prestação de serviços de saúde, ainda que indiretamente. O autor, ao aderir ao plano de saúde, teve como intermediadora a Benevix, a qual, por sua conduta, criou legítima expectativa no consumidor quanto à regularidade e integralidade da cobertura do serviço contratado. Neste contexto, impende reconhecer a legitimidade passiva da Benevix e, por conseguinte, afastar a sua exclusão do polo passivo, reconhecendo, ademais, sua responsabilidade solidária pelos prejuízos causados ao autor, inclusive no que diz respeito à negativa indevida de cobertura de procedimento cirúrgico de urgência, o que, conforme jurisprudência pacífica, configura violação ao direito à saúde e enseja reparação por danos morais. Portanto, sob uma ótica sistemática e integrativa do ordenamento consumerista e jurisprudência dominante, não subsiste fundamento jurídico que justifique a exclusão da Benevix da lide, devendo ser reformada a sentença para reconhecer sua legitimidade e responsabilização solidária. ANTE O EXPOSTO, com a máxima vênia ao eminente Relator, DOU PROVIMENTO AO RECURSO DE FABRÍCIO SMIDERLE PEREIRA para reconhecer a legitimidade passiva da empresa BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA., afastando sua exclusão da lide, bem como para declarar sua responsabilidade solidária pelos danos experimentados pelo autor, inclusive os danos morais já reconhecidos na sentença. Consequentemente, afasto a condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor da Benevix e inverto tal condenação em desfavor desta. É como voto. _________________________________________________________________________________________________________________________________ VOTOS ESCRITOS (EXCETO VOTO VENCEDOR) Declaro minha suspeição para atuar no processo. APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006430-24.2020.8.08.0048 VOTO DE VISTA DESª ELIANA J. MUNHÓS FERREIRA Trata-se de recursos de apelações cíveis interpostos por FABRICIO SMIDERLE PEREIRA e pela UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO contra a sentença que julgou procedente o pedido em face da Unimed Vitória, determinando a autorização do procedimento cirúrgico de urgência (ureterólise unilateral), afastando a carência contratual, bem como, extinguiu o processo sem resolução de mérito em relação à Benevix Administradora de Benefícios Ltda., por reconhecer sua ilegitimidade passiva. Muito sinteticamente, esclareço que o apelo de Fabrício Smiderle Pereira busca a reforma da sentença para que a Administradora Benevix seja reconhecida como parte legítima e condenada solidariamente, com base na tese de que integra a cadeia de fornecimento de serviços de saúde, conforme o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Lado outro, o apelo da Unimed Vitória defende a legalidade da recusa, com base na cláusula de Cobertura Parcial Temporária (CPT) para doença preexistente e na ausência de urgência. O eminente Relator, Des. Robson Luiz Albanez, proferiu voto no sentido de negar provimento a ambos os recursos, mantendo integralmente a sentença, fundamentando o voto no fato de que a responsabilidade da administradora de benefícios (Benevix) restringe-se a questões de gestão administrativa, como a intermediação da contratação e a gestão de pagamentos, não obstante, a controvérsia, refere-se a uma negativa de cobertura assistencial (autorização de cirurgia), matéria sobre a qual a administradora não possui qualquer gerência ou poder decisório, sendo que a recusa partiu exclusivamente da operadora Unimed Vitória, não havendo nos autos prova de que a Benevix tenha concorrido para o dano. Em relação ao recurso da operadora de plano de saúde Unimed, afirmou que a negativa de cobertura foi ilícita, pois o caráter de urgência do procedimento, atestado por laudos médicos, prevalece sobre a cláusula de carência (CPT). Em seguida, o nobre Des. Arthur José Neiva de Almeida proferiu voto de divergência parcial, quanto a legitimidade e responsabilidade da administradora Benevix, compreendendo que a administradora de benefícios integra a cadeia de fornecimento de serviços e, portanto, responde solidariamente pelos danos causados ao consumidor, nos termos dos artigos 7º, parágrafo único, e 25, §1º, do CDC. Assim, deu provimento ao recurso de Fabrício Smiderle Pereira para reconhecer a legitimidade passiva da empresa Benevix Administradora de Benefícios Ltda., afastando sua exclusão da lide, bem como para declarar sua responsabilidade solidária pelos danos experimentados pelo autor, inclusive os danos morais já reconhecidos na sentença, afastando a condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor da Benevix e invertendo tal condenação em desfavor desta. Registrado o impedimento do Des. Dair Jose Bregunce de Oliveira, pedi vista dos autos para melhor exame da controvérsia, especialmente no que tange à divergência inaugurada pelo eminente Desembargador Arthur José Neiva de Almeida acerca da responsabilidade da administradora de benefícios. Importa registrar, de início, em total consonância com os votos antecedentes, não remanescem dúvidas quanto à ilicitude da recusa de cobertura perpetrada pela operadora Unimed Vitória, uma vez que o caráter de urgência do procedimento médico foi devidamente comprovado nos autos, sobrepondo-se, portanto, a quaisquer cláusulas contratuais de carência ou de cobertura parcial temporária - CPT, nos termos da legislação aplicável. Não obstante, com a máxima vênia ao eminente Relator, e conquanto minha deliberação final venha a convergir com o resultado prático por Sua Excelência proposto, sinto-me compelida, por dever de ofício e para a escorreita formação de meu convencimento, a trilhar uma fundamentação distinta. Explico: O epicentro da divergência parcial, inaugurada pelo preclaro Desembargador Arthur José Neiva de Almeida, reside na aferição da legitimidade passiva da empresa Benevix Administradora de Benefícios Ltda, porquanto propugna a tese de que a administradora, na qualidade de integrante da cadeia de fornecimento de serviços, ostenta plena pertinência subjetiva para a causa, devendo, por conseguinte, responder de forma solidária pelos prejuízos advindos da negativa de cobertura ao consumidor, na forma da jurisprudência citada. É nesse particular que proponho-me a externar uma linha de raciocínio própria , ainda que se alinhe, ao final, ao desfecho em favor da administradora, como o fez o nobre Relator. Isso porque, em meu sentir, a preliminar de ilegitimidade passiva, acolhida na origem, não mereceria prosperar. Adoto, para a análise das condições da ação, a teoria da asserção (in status assertionis), segundo a qual a pertinência subjetiva da lide é aferida em abstrato, com base na narrativa fática apresentada pelo autor em sua peça de ingresso. Na hipótese, o demandante afirmou em sua petição inicial, à fl. 05, no momento da negativa, recebeu informação de que deveria ser realizado contato com a Segunda Requerida, o que no momento se mostrou impossível, dado o horário da ocasião que já superava o comercial. Esta simples alegação, ao inserir a administradora na cadeia de eventos que culminaram na suposta lesão ao direito do consumidor, estabelece o nexo de imputação hipotético suficiente para legitimá-la a figurar no polo passivo da demanda. A verificação da efetiva responsabilidade da Benevix pela recusa seria questão que transbordaria os limites da análise prefacial, constituindo, em verdade, o próprio mérito da causa. Por essa razão, tenho que a preliminar de ilegitimidade merecia rejeição. Não obstante ao adentrar o mérito, minha conclusão seria pela improcedência do pedido em face da Administradora do Plano de Saúde Benevix. Isso porque, a instrução dos autos demonstra que o ato de recusa do procedimento cirúrgico foi uma deliberação exclusiva da operadora de saúde (Unimed Vitória), sem qualquer participação ou ingerência da administradora. A função desta, no arranjo contratual, limitou-se à gestão administrativa, não se estendendo à seara assistencial, inexistindo sequer indícios de que houve alguma falha da Administradora a contribuir para a negativa perpetrada pela Unimed ao procedimento cirúrgico necessário. Por sinal, observo dos autos que, após ser indagado sobre a individualização das responsabilidades de cada requerida, o autor (também apelante) se manifestou da seguinte forma às fls. 41/42: “A Segunda Requerida foi incluída no feito, visto que se caracteriza pela administradora de benefícios coletivos em saúde para a entidade de classes profissionais, como a de médicos, como o do Requerente, ou seja, é a intermediária. A inclusão no feito se deu porque a contratação dos serviços da Primeira Requerida se deu justamente através da Segunda Requerida, sendo esta também responsável pela má prestação do serviço”. O CDC, em seu art. 7º, parágrafo único, e art. 25, §1º1, prevê a responsabilidade solidária de todos os integrantes da cadeia de fornecimento pelo dano causado ao consumidor, e a jurisprudência do c. STJ perfilha o entendimento de que “(…) a administradora do plano de saúde possui responsabilidade solidária com a operadora do benefício, em razão do papel de destaque que ocupa na intermediação da contratação” (AgInt no AREsp n. 2.307.944/BA, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 18/9/2023, DJe de 22/9/2023.). Embora não ignore as posições contrárias, penso que a aplicação de tal diretriz não se opera de forma automática ou irrestrita a toda e qualquer controvérsia. A referida responsabilidade solidária tem sido afirmada, com maior veemência, nas hipóteses em que a falha na prestação do serviço se origina na esfera de atuação direta da administradora, notadamente, nas situações como o indevido cancelamento do contrato; na exclusão arbitrária de beneficiários, ou falhas na gestão dos pagamentos e comunicações, ou seja, quando sua atuação ou omissão é a causa direta ou concorrente do dano. Lado outro, quando ocorre negativa de cobertura de tratamento médico ou internações, ato exclusivo da operadora de saúde (art.3º da RN ANS 515/20222), alinho-me à posição que entende inexistir legitimidade (quando sequer abstratamente é atribuído qualquer ato omissivo ou comissivo à administradora) ou responsabilidade da intermediária, se não houver demonstração de concreta participação desta para o resultado lesivo. Vejamos: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C . INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ILEGITIMIDADE PASSIVA ACOLHIDA. RECURSO PROVIDO. I . Caso em Exame Recurso de apelação interposto por Affix Administradora de Benefícios Ltda. contra sentença que julgou procedente ação de obrigação de fazer com tutela antecipada e indenização por danos morais, determinando a liberação de tratamento médico e condenando ao pagamento de R$ 10.000,00 por danos morais. II . Questão em Discussão 2. A questão em discussão consiste em (i) ilegitimidade passiva da administradora de plano de saúde para autorizar procedimentos médicos e (ii) ausência de comprovação dos danos morais sofridos pela autora. III. Razões de Decidir 3 . A Affix Administradora de Benefícios Ltda. não possui legitimidade passiva, pois sua atuação se limita à intermediação contratual, sem ingerência sobre decisões de cobertura médica, conforme Resolução Normativa nº 515/2022 da ANS. 4. A responsabilidade solidária entre fornecedores de serviços não se aplica à administradora, que não autoriza procedimentos médicos . IV. Dispositivo e Tese 5. Recurso provido. Exclusão da Affix Administradora de Benefícios Ltda . do polo passivo e extinção do processo em relação a ela. Tese de julgamento: 1. Administradora de benefícios não possui legitimidade passiva para autorizar procedimentos médicos. 2 . Intermediação contratual não implica responsabilidade por negativa de cobertura. Legislação Citada: Lei nº 8.078/90, art. 3º; Resolução Normativa nº 515/2022 da ANS, art . 3º; CPC, art. 85, § 8º. Jurisprudência Citada: TJSP, Apelação Cível 1000907-80.2022 .8.26.0100, Rel. José Carlos Ferreira Alves, 2ª Câmara de Direito Privado, j . 09.11.2023; TJSP, Apelação Cível 0701607-15.2012 .8.26.0704, Rel. Donegá Morandini, 3ª Câmara de Direito Privado, j . 14.05.2013. (TJ-SP - Apelação Cível: 10161460820218260344 Marília, Relator.: Gilberto Franceschini, Data de Julgamento: 17/12/2024, Núcleo de Justiça 4 .0 em Segundo Grau – Turma III (Direito Privado 1), Data de Publicação: 17/12/2024) Ação de indenização a título de danos material e moral. Contrato de plano de saúde firmado com a 2ª ré - UNIMED RIO, por meio da 1ª ré - QUALICORP. Autor que necessitou de atendimento de urgência. Diagnóstico apontando tromboembolismo, culminando com internação em CTI . Operadora que negou autorização para atendimento de emergência, após 12h de internação no CTI, sendo que a empresa Medise (3ª ré), onde o autor foi atendido vem efetuando cobrança de pagamento de fatura pelo tempo de atendimento não coberto pelo plano de saúde. Sentença de procedência em relação as rés QUALICORP e UNIMED RIO (1ª e 2ª rés) e de improcedência em relação a sociedade MEDISE (3ª ré). Apelo de QUALICORP (1ª ré), reiterando sua ilegitimidade passiva, requerendo a improcedência dos pedidos e, subsidiariamente, a redução da indenização por dano moral. Evidencia-se nos autos, de forma clara, que a empresa QUALICORP (1ª ré) não possui responsabilidade em relação à cobertura de procedimento a que se submeteu o autor, porquanto, na condição de administradora de benefícios, apenas atua na confecção do contrato de plano de saúde coletivo por adesão, entre o consumidor e a operadora de saúde . Entretanto, não delibera ou possui qualquer ingerência sobre a cobertura de procedimentos, uma vez que tal responsabilidade cabe tão somente à operadora do plano de saúde (UNIMED RIO). Manifesta ilegitimidade da parte ré - QUALICORP. Ônus de sucumbência invertidos, observada a gratuidade de justiça deferida ao autor. PROVIMENTO DO RECURSO, extinguindo-se o processo sem apreciação do mérito, reconhecendo-se a ilegitimidade passiva ad causam, a teor do disposto no art . 485, VI da Lei de Ritos. (TJ-RJ - APL: 00234322420208190202 2022001103695, Relator.: Des(a). SIRLEY ABREU BIONDI, Data de Julgamento: 16/03/2023, DÉCIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 20/03/2023) Não havendo nexo de causalidade entre qualquer conduta da Benevix e o dano experimentado pelo autor, a improcedência do pedido em relação a ela seria a medida de rigor. Não obstante o raciocínio acima exposto, que constitui entendimento pessoal sobre a melhor técnica processual a ser aplicada, verifico que a conclusão prática da presente análise – a de que a Benevix Administradora de Benefícios Ltda. não deve ser responsabilizada civilmente no caso concreto – converge com o resultado alcançado pelo voto do eminente Desembargador Relator, o qual negou provimento a ambos os recursos interpostos pela Unimed Vitória e pelo autor Fabrício S. Pereira, mantendo incólume a sentença que julgou procedente o pedido, exclusivamente, em face da Unimed Vitória, determinando a autorização do procedimento cirúrgico de urgência (ureterólise unilateral), afastando a carência contratual. Dessa forma, em homenagem à disciplina judiciária e ao princípio da colegialidade, e com o fito de evitar a dispersão de votos, não vejo razão para divergir do relator unicamente para alterar o comando em relação à administradora e por isso adiro à conclusão externada pelo ilustre Relator, Des. Robson Luiz Albanez, por negar provimento aos recursos interpostos, pedindo vênias ao eminente Desembargador Arthur Neiva que votou em sentido contrário. É como voto. 1Art. 7º, parágrafo único, do CDC: “Havendo mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.” Art. 25, §1º, do CDC: “Havendo mais de um responsável pela ofensa ao consumidor, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos.” 2Art. 3º A Administradora de Benefícios não poderá atuar como representante, mandatária ou prestadora de serviço da Operadora de Plano de Assistência à Saúde nem executar quaisquer atividades típicas da operação de planos privados de assistência à saúde.” APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006430-24.2020.8.08.0048 VOTO-VISTA Desembargador Júlio César Costa de Oliveira Eminentes Pares, Vieram-me os autos conclusos em razão da técnica de julgamento escupida no art. 942 do CPC, especialmente diante da divergência inaugurada pelo nobre Desembargador Arthur José Neiva de Almeida em relação ao voto do ilustre Relator, Desembargador Robson Luiz Albanez. A questão central da divergência reside na legitimidade passiva e na responsabilidade solidária da empresa BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA. O eminente Relator votou pela manutenção da sentença, que excluiu a Benevix da lide por ilegitimidade passiva, ao passo que o ilustre Desembargador Arthur José Neiva de Almeida votou pelo provimento do apelo do autor, para reconhecer a legitimidade e a responsabilidade solidária da administradora, com base na teoria da cadeia de fornecimento do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Após detida análise dos autos e dos argumentos lançados, peço vênia ao eminente Relator, bem como à nobre Desembargadora Eliana Junqueira Munhós Ferreira que o acompanhou, para aderir integralmente à divergência inaugurada pelo Desembargador Arthur José Neiva de Almeida. Comungo do entendimento de que a administradora de benefícios, ao atuar na intermediação e gestão do contrato de plano de saúde, integra, para todos os efeitos, a cadeia de fornecimento de serviços perante o consumidor. A relação jurídica em tela é inegavelmente de consumo, atraindo a incidência do microssistema protetivo do CDC, conforme pacificado pela Súmula nº 608 do Superior Tribunal de Justiça. Nesse contexto, a responsabilidade dos fornecedores é objetiva e solidária, nos exatos termos do parágrafo único do artigo 7º e do §1º do artigo 25 do referido diploma legal. A solidariedade, nesse caso, visa a facilitar a reparação integral dos danos sofridos pelo consumidor, que não pode ser onerado com a complexa tarefa de distinguir as atribuições internas de cada empresa que compõe o conglomerado econômico que lhe presta o serviço. Conforme bem pontuado pelo Desembargador Arthur José Neiva de Almeida, a administradora se apresenta ao consumidor como partícipe essencial do negócio, criando uma legítima expectativa de garantia e segurança. A negativa de cobertura, embora operacionalizada pela Unimed Vitória, frustra a expectativa criada por toda a cadeia de fornecedores, da qual a Benevix é peça fundamental. A tese de que a responsabilidade da administradora se restringe a questões administrativas e que não possui gerência sobre a parte assistencial não pode prevalecer para afastar sua legitimidade passiva, notadamente porque ambas as empresas, operadora e administradora, se beneficiam economicamente da relação contratual. Exigir do consumidor a prova de que a administradora concorreu diretamente para a negativa de cobertura seria impor-lhe um ônus probatório excessivo, o que é incompatível com os princípios da vulnerabilidade e da facilitação da defesa de seus direitos em juízo, pilares do CDC. Ante o exposto, e com a renovada vênia ao nobre Relator, acompanho na íntegra os fundamentos e as conclusões do voto divergente e DOU PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO POR FABRÍCIO SMIDERLE PEREIRA, para reformar a r. sentença e reconhecer a legitimidade passiva da empresa BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA., declarando sua responsabilidade solidária pelos danos causados ao autor. Por consequência, afasto a condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios em favor da Benevix e inverto o ônus, condenando esta, solidariamente com a Unimed Vitória, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. No mais, acompanho o eminente Relator quanto ao desprovimento do recurso interposto pela UNIMED VITÓRIA. É como voto. DES. EWERTON SCHWAB PINTO JUNIOR: Apelação Cível nº 0006430-24.2020.8.08.0048 Apelante/Apelado: Fabricio Smiderle Pereira Apelante/Apelado: Unimed Vitória Cooperativa de Trabalho Médico Apelado: Benevix Administradora de Benefícios Ltda Relator: Desembargador Subst. Luiz Guilherme Risso VOTO VISTA Eminentes Desembargadores, fui honrosamente convocado para integrar o quorum de julgamento do presente recurso e pude examinar o caso trazido à análise deste órgão julgador. Rememoro tratar-se de recursos de apelação cível interpostos por ambas as partes contra sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão autoral, para impor à operadora UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO a obrigação específica de fazer, consistente na autorização do procedimento cirúrgico; e, de outro lado, extinguiu o processo em relação à ré BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA, ao acolher a preliminar de ilegitimidade passiva. Não obstante o respeitável entendimento do eminente Relator, Des. Subst. Luiz Guilherme Risso, que entendeu por negar provimento a ambos os recursos, coaduno com a conclusão do e. Des. Arthur José Neiva de Almeida Lima, acompanhado pelo e. Des. Julio Cesar Costa de Oliveira, que divergiu para reconhecer a legitimidade passiva da Benevix e, por conseguinte, afastar a sua exclusão do polo passivo, reconhecendo, ademais, sua responsabilidade solidária pelos prejuízos causados ao autor. Assim, na esteira dos judiciosos votos já proferidos, sem mais delongas, ACOMPANHO A DIVERGÊNCIA inaugurada pelo e. Des. Arthur José Neiva de Almeida Lima. É como voto. EWERTON SCHWAB PINTO JUNIOR Desembargador Vogal APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006430-24.2020.8.08.0048 APTE/APDO: FABRICIO SMIDERLE PEREIRA APTE/APDO: UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO APDA: BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA RELATOR: DES. SUBSTITUTO LUIZ GUILHERME RISSO V O T O Conforme relatado, cinge-se o presente recurso em aferir a juridicidade da sentença que nos autos de ação de obrigação de fazer, julgou parcialmente procedente o pleito autoral para impor à operadora UNIMED VITÓRIA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO a obrigação específica de fazer, consistente na autorização do procedimento cirúrgico de ureterólise unilateral indicado ao autor, reconhecendo a natureza de urgência da intervenção e afastando a carência contratual invocada; e, de outro lado, extinguiu o processo sem resolução de mérito em relação à ré BENEVIX ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS LTDA., ao acolher a preliminar de ilegitimidade passiva arguida em contestação, condenando o autor ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor dessa parte, no percentual de 15% sobre o valor da causa. RECURSO INTERPOSTO POR FABRÍCIO SMIDERLE PEREIRA Nas suas razões, pretende o apelante a reforma parcial da sentença, ao fundamento de que a empresa Benevix integra a cadeia de fornecimento de serviços de saúde, sendo, portanto, parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, nos termos do Código de Defesa do Consumidor; sustenta a responsabilidade solidária entre todos os fornecedores que participam da relação consumerista, conforme precedentes jurisprudenciais colacionados; e, por fim, requer o afastamento da condenação ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, bem como a inversão dessa verba em favor do autor. Pois bem. Consigno inicialmente que as requeridas, Operadora de Saúde e a Administradora de benefícios, enquadram-se no conceito de fornecedor disposto no artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor e, nesses termos, compõem a cadeia de consumo, respondendo solidariamente pelos prejuízos causados aos beneficiários. Ademais, cumpre destacar que muito embora o artigo 14, §3º, inciso II do Código de Defesa do Consumidor estabeleça que o fornecedor apenas não será responsabilizado quando provar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, a adoção da referida excludente apenas é admitida em relação a terceiro que não compõe a relação de consumo, o que não é a hipótese dos autos, haja vista que o recorrido integra a relação existente com o consumidor/ apelado. Nesse sentido ainda, não se descura que a atividade das operadoras de plano de saúde deve se pautar pelos princípios e normas do Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça por meio da Súmula nº 608 que dispõe que "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão". Entretanto, competia à parte autora fazer prova, ainda que indiciária, dos fatos constitutivos de seu direito, in casu, quanto a negativa de liberação dos procedimentos e exames pela operadora do plano de saúde, nos termos relatados na petição inicial, notadamente porque não há como impor à requerida a produção de fato negativo. Ademais, em que pese o pacífico o entendimento jurisprudencial quanto à responsabilidade solidária entre a administradora e a operadora do plano de saúde, inclusive pela determinação do art. 7º, parágrafo único da Lei 8.078/1990, entendo que, no caso, não cabe, porquanto não lhe cabe gerência sobre questões assistenciais, como são as autorizações para exames e cirurgias. O caso dos autos não diz respeito a cancelamento ou negativa de fornecimento de tratamento por erro nos pagamentos do plano de saúde, de modo que não se trata de obrigação da recorrida Benevix Administradora de Benefícios LTDA. As provas dos autos demonstram de forma clara que a negativa da cobertura do procedimento cirúrgico de urgência partiu exclusivamente da operadora do plano de saúde, Unimed Vitória, sendo esta quem detinha a competência legal e contratual para a análise da cobertura, conforme expressamente reconhecido pela própria ré em sua contestação. A Benevix, por sua vez, limitou-se à função de administradora de benefícios, cuja atuação, conforme previsto nos artigos 2º e 3º da Resolução Normativa nº 196/2009 da ANS, restringe-se à gestão administrativa de planos coletivos, não lhe competindo a deliberação sobre autorizações assistenciais. Embora a tese recursal busque apoiar-se em jurisprudência que reconhece a responsabilidade solidária da administradora na cadeia de fornecimento, a aplicação dessa diretriz exige demonstração, ainda que mínima, de que a conduta ou omissão da administradora concorreu para a negativa de cobertura ou para a concretização do dano. No presente caso, tal nexo de imputação não restou configurado. O autor não indicou qualquer ato praticado pela Benevix que tenha influenciado ou determinado a recusa da cirurgia, tampouco trouxe aos autos prova de que a administradora tenha participado de forma relevante na dinâmica decisória relacionada ao atendimento de urgência. Além disso, é de se observar que o pedido inicial concentrou-se exclusivamente na obrigação de fazer, qual seja, a autorização e custeio do procedimento cirúrgico, matéria cuja competência, à luz da regulamentação da ANS e da jurisprudência dominante, recai sobre a operadora do plano, e não sobre a administradora. A própria petição inicial, ao narrar os fatos, direciona sua causa de pedir à atuação da operadora, o que reforça a improcedência da responsabilização da Benevix. Por fim, a sentença recorrida enfrentou adequadamente os argumentos apresentados, fundamentando-se em bases normativas e probatórias coerentes com o arcabouço legal aplicável à espécie, além de estar alinhada ao entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante sobre a matéria. Não há, portanto, vício de julgamento ou omissão que justifique sua reforma. Nesses termos, forçoso a manutenção da sentença que afastou a responsabilidade da recorrida. Portanto, conheço do recurso e nego-lhe provimento. Face ao desprovimento recursal, majoro os honorários sucumbenciais em 2%, nos termos do artigo 85, §11º, do CPC. É como voto. RECURSO INTERPOSTO POR UNIMED VITÓRIA - COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO Nas suas razões, pretende a reforma da sentença, ao fundamento de que a negativa de cobertura do procedimento cirúrgico decorreu da cláusula contratual de Cobertura Parcial Temporária (CPT), prevista no art. 11 da Lei 9.656/98, considerando a doença preexistente informada pelo autor à época da contratação; sustenta a legalidade da conduta da operadora, o cumprimento do contrato e a ausência de urgência no procedimento pleiteado; aduz a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor em detrimento da legislação específica de saúde suplementar; e, ao final, requer o provimento do recurso para julgar improcedente o pedido inicial. Pois bem. A controvérsia devolvida a esta instância recursal cinge-se à legalidade da negativa, por parte da operadora de plano de saúde, da autorização de procedimento cirúrgico prescrito em favor do recorrido, sob o fundamento de que se encontrava em curso cláusula de cobertura parcial temporária (CPT), prevista contratualmente para doenças preexistentes. Sustenta a recorrente que a patologia apresentada — litíase renal — fora informada pelo recorrido no momento da contratação, sendo, portanto, legítima a recusa ao custeio da intervenção enquanto não superado o prazo de carência de 24 (vinte e quatro) meses. Alega, ainda, que não se trata de hipótese de urgência, de modo que a cláusula contratual limitadora não poderia ser afastada com base nas normas protetivas do consumidor. Contudo, tal argumentação não prospera, pois, a sentença prolatada pelo juízo a quo encontra-se rigorosamente alinhada ao arcabouço normativo e jurisprudencial que disciplina a matéria, não merecendo reforma. Com efeito, restou comprovado nos autos, mediante documentação médica inequívoca, que o recorrido apresentou quadro clínico compatível com urgência urológica, consistente em cálculo renal de 10mm, sendo indicada intervenção cirúrgica imediata (ureterólise unilateral) para evitar agravamento do quadro e lesões renais irreversíveis. A solicitação de internação, acompanhada de exames e laudos médicos, comprova não apenas a existência da moléstia, mas a necessidade de resolução cirúrgica célere, o que, à luz da legislação vigente, atrai a obrigatoriedade de cobertura pelo plano, independentemente de cláusulas restritivas. Vale lembrar que, nos termos do art. 12, inciso V, alínea “c”, da Lei nº 9.656/98, o prazo de carência para cobertura de procedimentos de urgência e emergência é de, no máximo, 24 (vinte e quatro) horas a contar da vigência do contrato. Com base nesse dispositivo, o art. 35-C, I, da mesma lei determina que é obrigatória a cobertura do atendimento nos casos de emergência, definidos como aqueles que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, desde que assim caracterizado por declaração do médico assistente. No presente feito, todos os requisitos legais encontram-se preenchidos: a situação de urgência foi atestada por profissional médico vinculado à rede credenciada da própria operadora, o procedimento cirúrgico foi prescrito como imprescindível para a saúde do paciente, e a carência mínima de 24 horas já se encontrava cumprida. Ademais, não se pode perder de vista que a relação jurídica entre as partes é inequivocamente de consumo, conforme reconhecido expressamente pelo Superior Tribunal de Justiça na Súmula nº 608. Nessa perspectiva, incidem os princípios da vulnerabilidade do consumidor e da interpretação mais favorável ao aderente, especialmente em se tratando de contrato de adesão, como é o caso. Assim, mesmo que se reconheça a validade formal da cláusula de CPT prevista contratualmente, ela não pode se sobrepor ao direito à saúde e à vida do paciente, tampouco pode ser utilizada como instrumento de recusa arbitrária e desproporcional em contextos de urgência médica, conforme consolidado pela jurisprudência do STJ (v.g., AgInt no AREsp 949.288/CE e AgInt no AREsp 892.340/SP). Nesse sentido, revela-se ilícita a negativa de cobertura, mesmo diante de cláusula de CPT expressa, quando evidenciado o caráter urgente do procedimento requerido, sobretudo quando demonstrado que a recusa da operadora não decorreu de dúvida razoável sobre a necessidade ou urgência do atendimento, mas exclusivamente da invocação de cláusula contratual cujo alcance deve ser mitigado quando em confronto com situações emergenciais, nos termos da legislação específica. Além disso, a conduta da operadora, ao recusar a autorização para cirurgia de comprovada urgência, sem oferecer alternativa eficaz ou apresentar motivação técnica fundamentada, mostra-se incompatível com o dever de boa-fé objetiva contratual, cuja violação, nos moldes da doutrina moderna, pode caracterizar o exercício abusivo do direito contratual, notadamente nos casos em que há evidente desproporção entre os meios utilizados pela fornecedora de serviços e os fins legítimos da proteção contratual. Portanto, sob qualquer ângulo que se analise a controvérsia, a sentença deve ser mantida. O juízo singular apreciou adequadamente os elementos probatórios constantes dos autos e aplicou corretamente o direito ao caso concreto. A recusa de cobertura, amparada exclusivamente em cláusula de CPT, não se sustenta diante da inequívoca comprovação da situação de urgência, razão pela qual a condenação imposta à operadora para custear o procedimento indicado deve ser integralmente preservada. Diante do exposto, conheço do recurso e nego-lhe provimento, mantendo incólume a r. sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos. Deixo de proceder à majoração dos honorários, porquanto já fixados no percentual máximo pela sentença recorrida. É como voto. DES. SUBSTITUTO LUIZ GUILHERME RISSO Relator
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