Processo nº 1000341-55.2025.8.11.0000
ID: 323047559
Tribunal: TJMT
Órgão: Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo
Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL
Nº Processo: 1000341-55.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
11/07/2025
Polo Ativo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000341-55.2025.8.11.0000 Classe: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Assunto: [Compet…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000341-55.2025.8.11.0000 Classe: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Assunto: [Competência, Fornecimento de medicamentos] Relator: Des(a). JONES GATTASS DIAS Turma Julgadora: [DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). MARIA EROTIDES KNEIP, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO, DES(A). VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] Parte(s): [JUIZ DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DE RONDONÓPOLIS (IMPETRADO), EDSON VALDO SALOMAO - CPF: 317.971.641-04 (IMPETRANTE), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0001-44 (TERCEIRO INTERESSADO), MUNICIPIO DE RONDONOPOLIS - CNPJ: 03.347.101/0001-21 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (TERCEIRO INTERESSADO), JUÍZO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DE RONDONÓPOLIS (IMPETRADO), JUÍZO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE RONDONÓPOLIS (IMPETRADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A ORDEM, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DES. JONES GATTASS DIAS. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. REMESSA DOS AUTOS AO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DA SAÚDE PÚBLICA (NJDSP). ORTARIA TJMT/CGJ Nº 183/2024. LEGITIMIDADE DO ATO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À COMPETÊNCIA ABSOLUTA. SEGURANÇA DENEGADA. I - CASO EM EXAME 1. Mandado de segurança impetrado contra decisão do Juízo do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis/MT que, com fundamento na Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024, determinou a remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP). 2. O impetrante sustenta a inconstitucionalidade e ilegalidade do ato normativo, alegando afronta ao princípio do juiz natural, à competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública e à tese firmada no IAC n. 10/STJ. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. Verificar se a remessa dos autos ao NJDSP configura alteração indevida da competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública e se a Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024 extrapola os limites da atuação administrativa ao instituir unidade de apoio jurisdicional. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A criação e atuação dos Núcleos de Justiça 4.0, nos termos das Resoluções CNJ n. 385/2021 e n. 398/2021, caracteriza medida de gestão processual voltada à especialização temática, celeridade e eficiência na prestação jurisdicional. 5. Tais núcleos não possuem competência jurisdicional própria e atuam de forma concorrente e complementar às unidades originárias, sem suprimir a competência dos Juizados Especiais regularmente instalados. 6. A Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024 limita-se a regulamentar a redistribuição interna de processos, sem inovar no plano legislativo, razão pela qual não viola o art. 22, I, da CF. 7. A jurisprudência do STJ admite a impetração de mandado de segurança para controle de competência dos Juizados Especiais pelos Tribunais de Justiça, desde que a controvérsia verse sobre normas infralegais que interfiram na jurisdição originária. 8. Ausente demonstração de prejuízo concreto ao impetrante, sendo preservadas as garantias do rito dos Juizados Especiais, não se constata ofensa ao princípio do juiz natural ou a direito líquido e certo. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Segurança denegada. Agravo interno julgado prejudicado. Tese de julgamento: 1. A remessa de autos ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP), instituído como unidade de apoio à jurisdição ordinária, não implica modificação da competência material dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, tampouco afronta o princípio do juiz natural. 2. Portarias e resoluções administrativas que regulamentam a tramitação processual em núcleos digitais, em consonância com as diretrizes do CNJ, constituem medidas legítimas de organização judiciária, compatíveis com os arts. 96, I, “a”, e 103-B, § 4º, da Constituição Federal. 3. A ausência de oposição formal no juízo de origem não obsta o conhecimento do mandado de segurança quando a controvérsia versa sobre controle de competência jurisdicional, matéria de ordem pública. Dispositivos citados: CF, arts. 5º, LIII; 22, I; 96, I, “a”; 103-B, § 4º, I; Leis 12.153/2009 e 9.099/1995; Resoluções CNJ n. 385/2021 e 398/2021; Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024. Jurisprudência relevante: STJ, IAC n. 10, Rel. Min. Herman Benjamin; STJ, RMS 61.323/MG; TJMT, MS 1000332-93.2025.8.11.0000, Rel. Helena Maria Bezerra Ramos, DJE 11/04/2025. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR.DES. JONES GATASS DIAS Egrégia Turma: Trata-se de Mandado de Segurança com pedido liminar, impetrado por Edson Valdo Salomão, representado pela Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso, contra ato do Juízo do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis, praticado nos autos n. 1031076-96.2024.8.11.0003. O impetrante narra que ajuizou demanda com pedido de fornecimento de medicamentos e que, embora o feito tramitasse regularmente, foi proferida decisão pelo Juízo da Fazenda Pública determinando a remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública – NJDSP, com fulcro na Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024. Sustenta, em síntese, que referida Portaria padece de vícios de inconstitucionalidade e ilegalidade, por violar o princípio do juiz natural e por criar regra de competência processual em descompasso com as normas federais, notadamente as que a competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública nos locais em que estejam instalados. Aduz que a Portaria em comento pretende trazer de volta a monopolização das ações de saúde pública, como fez a Resolução n. 09/2019 – OE/TJMT, de forma a ferir uma série de regras de competência material previstas nas Leis 12.153/09 e 9.099/95, criando verdadeira prerrogativa de foro para o Estado de Mato Grosso ao arrepio das previsões legais e constitucionais. Afirma, em conclusão, que não se trata de norma sobre organização judiciária local, mas norma de caráter processual geral, criadora e modificadora de competência, o que é impossível de ser veiculada pelo instrumento normativo em questão. Ressalta que o Superior Tribunal de Justiça ao se manifestar a respeito da Resolução n. 09/2019, por meio do IAC n. 10, sedimentou a competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública. Nesse contexto, requereu a concessão de liminar para suspender os efeitos da decisão declinatória, e, no mérito, a concessão da segurança para determinar a imediata anulação da decisão impugnada, em razão da manifesta inconstitucionalidade e ilegalidade da Portaria TJMT/CGJ n. 183, por ofensa ao art. 5º, LIII, e art. 22, I, ambos da CF, ao art. 2º, § 4º, da Lei 12.153/09 e art. 3º, § 1º, I da Lei 9.099/90, afirmando definitivamente a competência do E. Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis – MT para prosseguir com andamento e julgamento do feito, anulando, por natural consequência todos os atos decisórios proferidos pelo juízo incompetente. O pedido de liminar foi indeferido pelo então relator, Des. Luiz Octávio O. Saboia Ribeiro (Id. 262360756). Contra a referida decisão, o impetrante interpôs agravo interno, sem pedido de efeito suspensivo (Id. 263911781). Contrarrazões ao recurso (Id. 270073372). Em suas informações, a autoridade judicial impetrada esclareceu que a redistribuição ao Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública visa à eficiência e celeridade na tramitação das ações de saúde pública, sem implicar violação de competência (Id. 263829273). O Estado de Mato Grosso, na forma do art. 7º, II, da LMS, suscitou, preliminarmente, a inadequação da via eleita e, no mérito, destacando a natureza jurídica de núcleo de apoio do Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública, por tratar-se de instrumento de cooperação judiciária, defendeu sua regularidade (Id. 264588793). A Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da Procuradora de Justiça Eliana Cícero de Sá Maranhão Ayres Campos, resumiu que a remessa dos autos ao NJDSP configura um ato de gestão processual que busca aprimorar a prestação jurisdicional, sem violar regras de competência ou acarretar prejuízo ao impetrante, manifestando-se pela denegação da segurança (id. 286486385). É o relatório. Cuiabá, data da assinatura digital. JONES GATTASS DIAS Desembargador Relator V O T O R E L A T O R VOTO (Preliminar – Inadequação da Via Eleita) Egrégia Turma: O Estado de Mato Grosso suscita a inadequação da via eleita. Fundamenta sua tese na suposta ausência de oposição formal do impetrante, na origem, à remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública, conforme o previsto nas Resoluções 385/2021 e 398/2021 do CNJ. Adicionalmente, defende que a controvérsia instaurada cinge-se à escolha da unidade jurisdicional (juiz natural da causa), e não propriamente à competência dos Juizados Especiais Fazendários ou à definição do rito processual. Contudo, a preliminar não prospera. Conforme orientação pacificada pelo STJ, é cabível a impetração de mandado de segurança perante os Tribunais de Justiça dos Estados com o objetivo de exercer o controle de competência dos Juizados Especiais, ficando a cargo das Turmas Recursais os mandados de segurança que visam controle de mérito dos atos praticados no âmbito dos Juizados, consoante o teor da Súmula 376/STJ. O Regimento Interno deste Tribunal, em harmonia com tal orientação, dispõe expressamente no art. 17-B, I, alínea "q", que compete à Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo processar e julgar, em matéria de Direito Público, os mandados de segurança impetrados para o exercício do controle de competência dos Juizados Especiais. É precisamente o caso dos autos. A impetração arrima-se na alegada afronta às regras de competência material estabelecidas nas Leis n. 12.153/2009 e n. 9.099/1995, defendendo a competência do Juizado Especial da Fazenda Pública para o processamento da causa. Busca-se, portanto, o controle da competência jurisdicional, e não a revaloração do mérito da decisão proferida no juízo de origem. No que tange ao argumento da ausência de oposição formal à remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública, este também, não se sustenta. A formulação prévia de insurgência no processo originário não constitui condição de procedibilidade do mandado de segurança, notadamente quando visa assegurar o controle da competência jurisdicional, matéria de ordem pública e cognoscível de ofício. Por conseguinte, rejeita-se a preliminar. É como voto. JONES GATTASS DIAS Desembargador Relator VOTO (Mérito) A discussão central cinge-se à legalidade da remessa dos autos originários ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP), determinada pelo Juízo do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis, com base na Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024. O impetrante sustenta, em síntese, que a referida Portaria padece de vícios de inconstitucionalidade e ilegalidade, por violar o princípio do juiz natural e por criar regra de competência processual em descompasso com as normas federais, notadamente a Lei n. 12.153/2009, que estabelece a competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública nos locais em que estejam instalados. No entanto, a remessa administrativa de processos a núcleos digitais especializados, amparada nas Resoluções nº 385/2021 e nº 398/2021 do CNJ, não caracteriza alteração de competência. Estes atos normativos instituíram os chamados Núcleos de Justiça 4.0, voltados à especialização temática e à tramitação digital de processos, com o objetivo de promover celeridade e uniformização da prestação jurisdicional, em consonância com os princípios da eficiência e razoável duração do processo. Tais núcleos não possuem competência jurisdicional própria, mas atuam de modo concorrente com as unidades originárias, como órgãos de cooperação judiciária, sem suprimir a competência dos Juizados Especiais onde regularmente instalados. Em vez de uma mudança de competência legal, que alteraria qual órgão jurisdicional tem a atribuição para julgar determinada matéria, a remessa para os Núcleos de Justiça 4.0 representa uma especialização interna dentro do próprio tribunal. É como se o processo, que já é de competência do Juizado Especial Fazendário, fosse direcionado para um "setor" mais apto e especializado dentro da mesma estrutura para lidar com as complexidades das ações de saúde pública. Essa compreensão é fundamental para afastar a alegação de violação ao princípio do juiz natural (art. 5º, LIII, da CF) e de usurpação da competência legislativa da União para legislar sobre direito processual (art. 22, I, da CF). Isso porque não há, propriamente, uma modificação de competência no sentido técnico-jurídico do termo, mas sim uma medida de gestão judiciária que visa otimizar a prestação jurisdicional em matéria específica. A Resolução CNJ n. 385/2021, que instituiu os Núcleos de Justiça 4.0, estabelece em seu art. 1º que estes são "unidades judiciárias especializadas que atuam com competência territorial e material definidas pelo tribunal, de forma concorrente com as demais unidades jurisdicionais de mesma competência material". Já o art. 2º dispõe que "a instalação dos Núcleos de Justiça 4.0 não implica a exclusão da competência de outras unidades jurisdicionais sobre a mesma matéria". A Resolução n. 5/2024 do Tribunal Pleno e a Portaria 183/2024 da Corregedoria-Geral são expressas nesse sentido, bem como os fundamentos do processo administrativo CIA nº 073898-73.2024.811.0001 – verbis: “Art. 2º Fica criado o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública, na estrutura da organização judiciária do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, com as seguintes características: I - Competência: processar e julgar as ações judiciais relacionadas a Direito de Saúde Pública, distribuídas nas comarcas do Estado de Mato Grosso, bem como as distribuídas nas unidades do Sistema de Juizados Especiais, em que figure como parte o Estado de Mato Grosso, excetuadas as de competência da 1ª Vara da Fazenda Pública de Várzea Grande. [...] Art. 5º O Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública atuará, nos limites da competência prevista no inciso I do art. 2º desta Resolução, em apoio às unidades judiciárias do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, por meio do processo e julgamento de ações já em tramitação.” Portanto, a criação e o funcionamento desses núcleos não afastam a competência das unidades jurisdicionais originais, mas estabelecem uma atuação concorrente e complementar, visando à especialização e à eficiência na prestação jurisdicional. Importante ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Incidente de Assunção de Competência n. 10, fixou tese no sentido de que "os Juizados Especiais da Fazenda Pública, onde instalados, têm competência para o julgamento das ações de fornecimento de medicamentos/tratamentos para saúde, propostas em face dos Estados, Municípios e respectivas autarquias e fundações, até o valor de 60 salários mínimos". Contudo, essa tese não impede a adoção de medidas administrativas que visem à especialização e à otimização da prestação jurisdicional, desde que não impliquem efetiva modificação da competência legalmente estabelecida. Nesse sentido, o Conselho Nacional de Justiça, ao editar as Resoluções n. 385/2021 e n. 398/2021, atuou dentro de sua competência constitucional de zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências (art. 103-B, § 4º, I, da CF). Da mesma forma, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, ao instituir o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública por meio da Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024 e Resolução n. 5/2024/TP, atuou no exercício de sua autonomia administrativa e no cumprimento das diretrizes estabelecidas pelo CNJ, sem usurpar a competência legislativa da União para legislar sobre direito processual. Ressalte-se, por fim, que a especialização na prestação jurisdicional, especialmente em matéria de saúde pública, vai ao encontro das diretrizes estabelecidas pelo CNJ no Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (Resolução CNJ n. 107/2010) e no Manual de Mediação e Conciliação da Saúde, que reconhecem a complexidade e a especificidade das demandas de saúde e a necessidade de tratamento adequado e uniforme. Desse modo, como explanado até com exaustão, a remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública não configura uma modificação de competência no sentido tradicional do termo, mas uma reorganização interna do fluxo processual, mantendo-se a competência material do Juizado Especial da Fazenda Pública. Tanto é assim que o processo continua a tramitar sob o rito da Lei n. 12.153/2009, com todas as garantias e benefícios processuais dela decorrentes. Ademais, não se vislumbra prejuízo concreto ao impetrante com a remessa dos autos ao NJDSP, uma vez que o acesso à justiça permanece garantido, com a possibilidade de prática de atos processuais por meio eletrônico, sem necessidade de deslocamento físico, em consonância com os princípios da celeridade e da eficiência que norteiam o microssistema dos Juizados Especiais. Nesse sentido, a dispensar encômios, ilustram os seguintes julgados desse Tribunal de Justiça, aplicáveis ao caso em estima a coerência da jurisprudência, pois se os fatos e fundamentos que cercam a questão são idênticos, a solução há de ser a mesma: “DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PORTARIA TJMT/CGJ Nº 183/2024. JUÍZO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. DECLINAÇÃO DE COMPETÊNCIA PARA O NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DA SAÚDE PÚBLICA. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS. SEGURANÇA DENEGADA. I. Caso em exame 1. Mandado de segurança impetrado por Neuza Raymundo contra decisão do Juízo do 1º Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis que, com base na Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024, declinou da competência para o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP). 2. A impetrante sustenta que a referida Portaria viola normas constitucionais e infraconstitucionais, afetando o princípio do juiz natural e a competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, conforme a Lei 12.153/09. II. Questão em discussão 3. A controvérsia consiste em determinar se a remessa dos autos ao NJDSP fere a competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública e se a Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024 extrapola sua função normativa. III. Razões de decidir 4. A jurisprudência do STJ admite a impetração de mandado de segurança perante os Tribunais de Justiça para controle da competência dos Juizados Especiais, em situações excepcionais, notadamente quando há questionamento de normas infralegais que impactam a jurisdição. 5. Os Núcleos de Justiça 4.0, disciplinados pelo CNJ, não constituem novos órgãos jurisdicionais, mas mecanismos de apoio, sem modificação da competência originária do juízo natural. 6. A Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024 não viola a competência dos Juizados Especiais, pois não altera a competência material, limitando-se a disciplinar a gestão processual e a cooperação judiciária. 7. O princípio do juiz natural não restou afrontado, pois o NJDSP atua apenas como unidade de apoio, sem transferência de competência decisória. IV. Dispositivo e tese 8. Mandado de segurança denegado. Tese de julgamento: "A remessa de processos aos Núcleos de Justiça Digital não viola a competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, pois trata-se de medida de apoio jurisdicional sem alteração da competência originária." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LIII; Lei 12.153/2009, art. 2º, § 4º; Resolução CNJ nº 385/2021; Resolução CNJ nº 398/2021. Jurisprudência relevante citada: STJ, RMS 17.524/BA, Rel. Min. Nancy Andrighi; STJ, AgInt no RMS 57.649/SP, Rel. Min. Raul Araújo; STJ, AgInt no RMS 57.285/DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves; STJ, RMS 59.378/CE, Rel. Min. Herman Benjamin. (N.U 1036013-61.2024.8.11.0000, CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo, Julgado em 03/04/2025, Publicado no DJE 13/04/2025) “DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DE SAÚDE PÚBLICA . REMESSA DE AUTOS. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. SEGURANÇA DENEGADA. I . Caso em exame: 1. Mandado de segurança impetrado contra ato judicial que determinou a remessa de processo do Juizado Especial da Fazenda Pública ao Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública, sob alegação de violação ao princípio do juiz natural e às disposições da Lei n. 12.153/2009 . II. Questão em discussão: 2. A questão em discussão consiste em determinar: (i) o cabimento do mandado de segurança para controle de competência do Juizado Especial da Fazenda Pública; e (ii) se a remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública viola o princípio do juiz natural. III . Razões de decidir: 3. O mandado de segurança é cabível perante o Tribunal de Justiça para o controle de competência dos Juizados Especiais, conforme jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, especialmente em casos que envolvam discussão sobre incompetência absoluta ou organização judiciária. 4. O Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública não constitui órgão jurisdicional autônomo, mas unidade auxiliar integrada à estrutura administrativa das Varas da Fazenda Pública, com função de apoio e cooperação para otimização da tramitação processual, nos termos da Resolução TJ-MT/TP n . 5/2024. 5. A criação do Núcleo de Justiça Digital encontra fundamento no art. 96, I, a, da Constituição Federal, que confere aos tribunais competência para organizar sua estrutura administrativa, em consonância com os princípios da eficiência (art . 37, caput, CF) e do acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CF). 6. A remessa de autos ao Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública não configura violação ao princípio do juiz natural, uma vez que o ato normativo que regulamenta seu funcionamento (Resolução TJ-MT/TP n . 5/2024,) preserva o direito das partes de oporem-se fundamentadamente à remessa, garantindo o contraditório. IV. Dispositivo e tese: 7. Segurança denegada .” Tese de julgamento: “O Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública, instituído como unidade auxiliar às Varas da Fazenda Pública, não viola o princípio do juiz natural quando prevê mecanismo de oposição das partes à remessa dos autos e preserva as competências legais estabelecidas.” Dispositivos relevantes citados: CF, arts. 5º, XXXV e LXIX; 37, caput; e 96, I, a; Resolução TJ-MT/TP n. 5/2024, arts . 5º e 6º, § 1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no RMS 72398/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j . 10.6.2024; STJ, AgInt no REsp 1753996/DF, Rel. Min . Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, j. 27.5.2024; TJRJ, agravo de instrumento 0013913-44 .2023.8.19.0000, Rela . Desa. Jacqueline Lima Montenegro, Primeira Câmara de Direito Público, j. 30.11 .2023; TJRJ, agravo de instrumento 0043244-37.2024.8.19 .0000, Rela. Desa. Jacqueline Lima Montenegro, Primeira Câmara de Direito Público, j. 2 .7.2024. (TJ-MT - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL: 10025742520258110000, Relator.: RODRIGO ROBERTO CURVO, Data de Julgamento: 03/04/2025, Turma de Câmaras Cíveis Reunidas “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. REDISTRIBUIÇÃO PROCESSUAL. REMESSA DE AUTOS A NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DA SAÚDE PÚBLICA . INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO À COMPETÊNCIA ABSOLUTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS. SEGURANÇA DENEGADA. I. CASO EM EXAME 1 . Mandado de Segurança, com pedido de liminar, impetrado por Danielle Santana Soares Furini, por meio da Defensoria Pública Estadual, contra ato do Juízo do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis/MT, que determinou a remessa dos autos do processo nº 1029081-48.2024.8.11 .0003 ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP), com fundamento na Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024. A impetrante sustenta a ilegalidade e inconstitucionalidade do ato normativo, alegando violação à competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública prevista nas Leis n. 12 .153/2009 e n. 9.099/1995. II . QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública implica indevida modificação da competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública; e (ii) estabelecer se a Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024 viola normas constitucionais e legais ao criar regra de competência processual. III . RAZÕES DE DECIDIR 3. A remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública não altera a competência originária do Juizado Especial da Fazenda Pública, mas constitui medida administrativa voltada à celeridade e eficiência processual, conforme autorizado pela Resolução CNJ n. 385/2021. 4 . O Núcleo de Justiça Digital atua como órgão de apoio, sem usurpar competência jurisdicional, permanecendo o Juizado Especial da Fazenda Pública como o juízo natural do feito. 5. A Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024, ao regulamentar o funcionamento do NJDSP, não cria nova regra de competência, mas apenas operacionaliza a tramitação de processos eletrônicos, em conformidade com as normas do CNJ . 6. O direito das partes à oposição fundamentada à tramitação pelo Núcleo de Justiça Digital, previsto nas Resoluções CNJ n. 385/2021 e n. 398/2021, foi respeitado, não havendo nos autos manifestação válida da impetrante nesse sentido . 7. Jurisprudência do STJ e de tribunais estaduais reconhece a legalidade da remessa de processos a Núcleos de Justiça 4.0 como medida administrativa legítima que não infringe o princípio do juiz natural. IV . DISPOSITIVO E TESE 8. Segurança denegada. Tese de julgamento: 1. A remessa de autos a Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública não implica modificação de competência, tratando-se de medida administrativa legítima que preserva a jurisdição do Juizado Especial da Fazenda Pública . 2. Portarias e resoluções que instituem Núcleos de Justiça 4.0, em conformidade com normativas do CNJ, não violam o princípio do juiz natural nem as normas de competência previstas em lei federal. 3 . A ausência de oposição fundamentada e tempestiva à remessa de autos aos Núcleos de Justiça 4.0 convalida a tramitação do feito nesses núcleos.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, incisos LIV e LV; Lei n . 12.153/2009, art. 3º; Lei n. 9 .099/1995, art. 3º; CPC/2015, art. 190; Resolução CNJ n. 385/2021, arts . 1º e 2º; Resolução CNJ n. 398/2021, art. 2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, RMS n . 61.323/MG, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j . 26.05.2020, DJe 11.09 .2020; STJ, AgInt no RMS n. 63.487/SP, rel. Min . Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 21.09.2020, DJe 28 .09.2020; TJRJ, RAI n. 00130655720238190000, rel. Des (a) . Jacqueline Lima Montenegro, Primeira Câmara de Direito Público, j. 05.09.2023, DJe 12 .09.2023. (TJ-MT - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL: 10003329320258110000, Relator.: HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Data de Julgamento: 03/04/2025, Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 11/04/2025) Desse modo, reconhecida a regularidade da remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP), nos termos da Portaria TJMT/CGJ n. 183/2024, por se tratar de medida administrativa legítima, voltada à especialização e otimização da prestação jurisdicional, sem afronta às regras de competência estabelecidas em lei, não há como reconhecer de violação a direito líquido e certo do impetrante. Ante o exposto, DENEGO A SEGURANÇA e julgo prejudicado o agravo interno. Cuiabá, data da assinatura digital. JONES GATTASS DIAS Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/07/2025
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear