Adivaldo Alves Teixeira e outros x Adivaldo Alves Teixeira e outros
ID: 339871395
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1026026-89.2024.8.11.0003
Data de Disponibilização:
31/07/2025
Advogados:
ALMIR MARCELO GIMENEZ GONCALVES
OAB/MT XXXXXX
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JOAO RICARDO FILIPAK
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1026026-89.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1026026-89.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [ADIVALDO ALVES TEIXEIRA - CPF: 318.183.401-78 (APELADO), JOAO RICARDO FILIPAK - CPF: 565.021.849-87 (ADVOGADO), AMOROSO METALICOS E TRANSPORTES LTDA - ME - CNPJ: 12.009.143/0001-43 (APELANTE), ALMIR MARCELO GIMENEZ GONCALVES - CPF: 830.494.361-15 (ADVOGADO), ADIVALDO ALVES TEIXEIRA - CPF: 318.183.401-78 (APELANTE), JOAO RICARDO FILIPAK - CPF: 565.021.849-87 (ADVOGADO), AMOROSO METALICOS E TRANSPORTES LTDA - ME - CNPJ: 12.009.143/0001-43 (APELADO), ALMIR MARCELO GIMENEZ GONCALVES - CPF: 830.494.361-15 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE AMBOS OS RECURSOS E M E N T A APELANTE(S): AMOROSO METALICOS E TRANSPORTES LTDA – ME e ADIVALDO ALVES TEIXEIRA APELADO(S): ADIVALDO ALVES TEIXEIRA e AMOROSO METALICOS E TRANSPORTES LTDA – ME EMENTA. DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. COBRANÇA EM DUPLICIDADE EM CARTÃO DE CRÉDITO. LEGITIMIDADE PASSIVA. INEQUÍVOCA. CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO REDUZIDO. CONSECTÁRIOS LEGAIS ADEQUADOS. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. I. CASO EM EXAME Apelações cíveis interpostas por ambas as partes contra sentença que julgou procedente ação de devolução de valores, cumulada com indenização por danos morais, ajuizada por consumidor em face de empresa fornecedora, em razão de cobrança em duplicidade de compra no valor de R$1.376,04 realizada por cartão de crédito, com pedidos de (i) pela ré: nulidade da sentença por cerceamento de defesa, reconhecimento de ilegitimidade passiva, exclusão ou redução do dano moral; (ii) pelo autor: majoração da indenização e fixação do termo inicial de juros e correção monetária desde os desembolsos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há quatro questões em discussão: (i) definir se houve cerceamento de defesa pelo indeferimento de expedição de ofício à operadora de cartão; (ii) estabelecer se a ré possui legitimidade passiva para responder pela cobrança em duplicidade; (iii) determinar a responsabilidade civil pela cobrança indevida e a existência de dano moral indenizável; (iv) fixar o termo inicial da correção monetária e dos juros de mora, bem como adequar o valor da indenização. III. RAZÕES DE DECIDIR O indeferimento de diligências probatórias que o juiz considera desnecessárias ou protelatórias, à luz dos arts. 370 e 371 do CPC, não configura cerceamento de defesa quando os autos estão suficientemente instruídos. Pela teoria da asserção, a legitimidade passiva é aferida com base na narrativa inicial, sendo parte legítima a empresa que realizou a venda cuja cobrança duplicada motivou a demanda. A cobrança em duplicidade, devidamente comprovada por faturas, caracteriza falha na prestação de serviço e atrai a responsabilidade objetiva e solidária dos fornecedores, nos termos dos arts. 7º, parágrafo único, 14 e 25, §1º, do CDC. A cobrança indevida que persiste, mesmo após tentativa administrativa de resolução, extrapola mero dissabor e configura dano moral indenizável, especialmente quando compromete parcela significativa da renda mensal do consumidor. A indenização por danos morais deve ser fixada segundo critérios de razoabilidade e proporcionalidade, reduzindo-se no caso o valor arbitrado de R$10.000,00 para R$5.000,00. Em caso de cobrança indevida, os juros moratórios e a correção monetária sobre os danos materiais incidem desde a data do efetivo prejuízo (lançamento das parcelas), conforme art. 398 do CC e Súmula 43 do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE Recursos parcialmente providos. Tese de julgamento: A ausência de diligência probatória indeferida pelo juiz, devidamente fundamentada, não configura cerceamento de defesa. A legitimidade passiva se aferida pela teoria da asserção inclui o fornecedor envolvido na relação de consumo narrada. O fornecedor responde objetivamente por cobrança em duplicidade, ainda que o erro tenha origem em administradora de cartão. A cobrança indevida reiterada configura dano moral indenizável. Juros de mora e correção monetária sobre a restituição de valores indevidamente pagos incidem a partir da data do prejuízo. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LV; CC, arts. 398 e 405; CPC, arts. 17, 240, 370 e 371; CDC, arts. 7º, parágrafo único, 14 e 25, §1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1678681/SP, AgInt no REsp 1967220/SP; TJMT, 1004733-38.2025.8.11.0000, 1001488-20.2019.8.11.0003, 1045539-31.2021.8.11.0041, 1034289-47.2023.8.11.0003; TJMG, 10000200009215001. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de apelação interpostos por ambas as partes contra sentença que julgou procedente ação de devolução de valores cumulada com indenização por danos morais, nos autos da demanda ajuizada por ADIVALDO ALVES TEIXEIRA em face de AMOROSO METÁLICOS E TRANSPORTES LTDA., nos seguintes termos: Vistos etc. ADIVALDO ALVES TEIXEIRA, qualificado nos autos, ingressou com AÇÃO DEVOLUÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS contra AMOROSO METÁLICOS E TRANSPORTES LTDA, também qualificada no processo, visando obter o ressarcimento dos danos descritos na inicial. O autor aduz que em janeiro/2023, realizou uma compra de telhas na empresa da requerida, totalizando o valor de R$ 1.376,04 (mil, trezentos e setenta e seis reais e quatro centavos), sendo dividido em 03 (três) parcelas de R$ 458,68, no cartão de crédito. Argumenta que ao verificar a fatura mensal do referido cartão percebeu a cobrança em duplicidade. Salienta que tentou solucionar a questão administrativamente, contudo restou inexitosa. Requer o ressarcimento dos danos morais e materiais descritos na inicial. Juntou documentos. Citada, a requerida apresentou defesa (Id. 174533797). Em preliminar, argui a ilegitimidade passiva. No mérito em apertada síntese, aduz a inexistência de comprovação do dano moral sofrido, visto que não agiu com negligência e sim no exercício regular de seu direito. Requer a improcedência do pedido inicial. Juntou documentos. Tréplica (Id. 178906076). Intimados para especificarem as provas que pretendiam produzir, a parte autora pugnou pelo julgamento antecipado da lide (Id. 181761226). A ré pleiteou pela produção de prova documental (Id. 180987451). Vieram-me os autos conclusos. É O RELATÓRIO. EXAMINADOS. DECIDO. Julgo o processo no estado em que se encontra. Conheço diretamente do pedido uma vez que a questão é unicamente de direito e prescinde da produção de outras provas, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. O entendimento jurisprudencial uníssono neste sentido: "Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é dever do juiz, e não mera faculdade, assim proceder" (STJ, 4ª T., REsp 2.832-RJ, rel.. Min. Sálvio de Figueiredo). "Nosso Direito Processual autoriza o julgamento antecipado da lide, quando não houver necessidade de prova - vale dizer - quando já se encontrarem nos autos todos os elementos necessários ao seguro entendimento da controvérsia" (STJ, REsp. 38.931-3). Moacir Amaral Santos (Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 15. ed., Saraiva: São Paulo, v. 2, 1993) nos ensina que "a prova tem por finalidade convencer o juiz quanto à existência ou inexistência dos fatos sobre que versa a lide". "A necessidade da produção de prova em audiência há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique cerceamento de defesa. A antecipação é legítima se os aspectos decisivos estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do magistrado" (RTJ 115/789). Impende destacar, ainda, que a produção probatória, conquanto seja uma garantia do princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa, não elide o poder-dever inerente ao julgador de evitar que, sob tal pretexto, se transforme o processo em infindáveis diligências inúteis. Passo à análise da preliminar vindicada. Alusivo a preliminar vindicada, não merece prosperar, dado que o estabelecimento comercial, ainda que se admita não possuir ingerência sobre a recusa do cartão de crédito utilizado pelo autor para pagar as compras realizadas nas suas dependências e a sua posterior cobrança, não há como negar que foi beneficiado com o pagamento em duplicidade, o que por si só evidencia a sua pertinência subjetiva para responder a presente demanda. Outrossim, há responsabilidade objetiva e solidária de todos os integrantes da cadeia de fornecimento do serviço, a teor do quanto dispõe o parágrafo único do art. 7º do CDC. Portanto, rejeito a preliminar arguida. Adentro ao mérito. Primeiramente, no caso em questão, estamos diante de uma típica relação de consumo, pois as partes se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor constantes nos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. Por outro lado, inaplicável a inversão do ônus da prova, previsto no art.6º,VIII, doCDC, pela franca ausência de verossimilhança das alegações. Incontroverso nos autos a compra realizada pelo autor junto à requerida e a utilização do cartão de crédito para o pagamento. Por outro lado, ocorreram três lançamentos inerentes à mesma compra, de forma duplicada. A empresa assumiu a existência do primeiro lançamento, o qual foi estornado (Id. 171616811). Já os extratos juntados aos Ids. 171616811 e seguintes, demonstram a ocorrência de três lançamentos, todos na mesma data e no mesmo valor. Do conjunto probatório inserido aos autos, verifica-se que a parte ré efetuou cobranças em duplicidade, sendo que as faturas dos meses de fevereiro a abril/2023 (Ids. 171616811 e seguintes), indicam que houve lançamentos de débitos indevidos nos valores de R$ 458,68, totalizando o importe de R$ 1.376,04 e pelo presente feito, a parte autora não obteve as restituições das referidas quantias. Dessa forma, resta incontroverso a falha na prestação de serviço. Contudo, entendo como não configurada a má-fé da requerida, razão pela qual, deve a devolução ocorrer de forma simples. A empresa demandada, por seu turno, não apresentou provas ou argumentos capazes de desconstituir o direito alegado pela parte autora ou romper o nexo de causalidade, ônus que lhes competia (artigo333, inciso II doCPC e artigo14,§ 3ºda Lei8.078/90). Assim, estando ausente prova ou argumento capaz de ilidir os fatos relatados na inicial, conclui-se ser defeituoso o serviço prestado pela empresa demandada, impondo-se sua responsabilização civil. Reconheço, outrossim, que restou caracterizado o dano moral. A toda evidência, a desídia da ré e sua desorganização administrativa na prestação do serviço foi a causa determinante da violação da dignidade da pessoa humana, no caso, do consumidor, tendo em vista os transtornos psíquico-emocionais, constrangimentos, sensação de impotência, humilhação experimentados, sentimentos esses que transcendem ao mero dissabor ou aborrecimento rotineiro. Perda de tempo útil para tentar resolver o problema na seara administrativa, sendo certo que o autor foi compelido a buscar a prestação judicial para resolver o impasse gerado pela ré, situação que extrapola o mero aborrecimento. Ao passo que afasto o valor pleiteado pelo autor e arbitro os danos morais em R$ 10.000,00 (dez mil reais). Ex positis, JULGO PROCEDENTE o pedido da inicial. Condeno a requerida a restituir ao autor o valor de R$ 1.376,04 (mil, trezentos e setenta e seis reais e quatro centavos), na forma simples. Nos termos da Súmula n° 362 do c. STJ, a contagem da correção monetária deve incidir desde a data do arbitramento. Observando o critério de razoabilidade, condições econômicas da requerida, bem como do requerente, evitando-se o enriquecimento sem causa, condeno a ré a pagar ao autor, a título de ressarcimento pelo dano moral que lhe causou, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A correção monetária incide a partir do arbitramento (STJ, Súm. 362) e os juros de mora, por se tratar de dano moral decorrente de relação contratual, desde a citação. Condeno-a, ainda, nos pagamentos das custas processuais e honorários advocatícios, estes a favor do patrono do autor, em verba que fixo em 15% (quinze por cento) do valor atualizado da condenação, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC. Transitada em julgado, ao arquivo com baixa e anotações. A Ré, em suas razões recursais (ID 297733350), invoca os seguintes argumentos fático-jurídicos: 1. Cerceamento de defesa; 2. Ilegitimidade passiva; 3. Inexistência de falha na prestação de serviço; 4. Inexistência de dano moral ou minoração do quantum indenizatório; Com isso, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso para anular a sentença em razão do cerceamento de defesa e, alternativamente, reformar a decisão para reconhecer sua ilegitimidade passiva ou julgar improcedentes os pedidos iniciais, subsidiariamente requerendo a redução da indenização por danos morais para R$ 3.000,00. Recurso tempestivo (Aba Expedientes - Sentença (39725391) – PJE 1º Grau) e preparo recolhido (ID 299373356). Contrarrazões do Autor (ID 297733357), pelo desprovimento do recurso da ré. Por sua vez, o Autor (ID 297733354) em seu recurso destaca os seguintes argumentos fático-jurídicos: 1. Fixação do termo inicial da correção monetária e juros de mora dos danos materiais desde o desembolso; 2. Majoração do quantum indenizatório por danos morais. Ao fim, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso para fixar o termo inicial dos juros e correção monetária dos danos materiais desde a data do evento danoso e majorar o quantum indenizatório por danos morais para o mínimo de R$ 15.000,00. Recurso tempestivo (Aba Expedientes - Sentença (39725390) – PJE 1º Grau) e preparo dispensado ao Autor ante o deferimento da justiça gratuita (ID 299419355). Contrarrazões da Ré (ID 297733355), pelo desprovimento do recurso do autor. Não houve manifestação da Procuradoria de Justiça em razão da matéria. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R APELANTE(S): AMOROSO METALICOS E TRANSPORTES LTDA – ME e ADIVALDO ALVES TEIXEIRA APELADO(S): ADIVALDO ALVES TEIXEIRA e AMOROSO METALICOS E TRANSPORTES LTDA – ME VOTO – PRELIMINAR EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: 1. Cerceamento de defesa A ré sustenta nulidade da sentença por cerceamento de defesa, sob o argumento de que, durante a fase instrutória, requereu a expedição de ofício à operadora do cartão de crédito para obtenção de informações sobre os repasses financeiros realizados, o que teria sido indeferido pelo juízo a quo. Alega que tais dados seriam imprescindíveis para comprovar que não recebeu valores em duplicidade, e que a ausência dessa prova a teria levado a ser condenada injustamente. Como cediço, a condução da instrução probatória está submetida ao princípio do livre convencimento motivado, previsto no artigo 371 do Código de Processo Civil, cabendo ao magistrado, na condição de destinatário da prova (artigo 370 do CPC), avaliar a pertinência, a utilidade e a necessidade das provas requeridas. A lei confere ao juiz o poder-dever de indeferir aquelas diligências que reputar impertinentes, desnecessárias ou meramente protelatórias. No caso concreto, a parte recorrente sustenta nulidade sob o argumento de que lhe foi negada a oportunidade de produzir prova consistente na expedição de ofício à operadora de cartão de crédito, a fim de que esta apresentasse informações sobre repasses realizados. Todavia, da análise detida dos autos, constata-se que o juízo de primeiro grau fundamentou adequadamente a desnecessidade da diligência, considerando já suficientes os elementos documentais existentes para a formação de seu convencimento. A decisão, portanto, não foi arbitrária, mas sim respaldada no poder instrutório conferido pelos arts. 370 e 371 do CPC, notadamente pela ação da ré que, em verdade, pretende transferir a terceiros estranhos à lide a incumbência de apresentar dados que ela mesma poderia ter produzido. É importante registrar que o simples indeferimento de diligência não configura, por si só, cerceamento de defesa. A nulidade só se caracteriza quando a prova indeferida revela-se efetivamente indispensável ao deslinde da controvérsia e a parte demonstra impossibilidade de obtê-la por outros meios. No presente caso, não há prova de que as informações pretendidas pela apelante estejam inacessíveis por iniciativa própria, tampouco se vislumbra que a ausência do ofício inviabilizou o exercício do contraditório e da ampla defesa. É sabido que, em havendo dúvidas ou problemas com transações em máquinas de cartão, as operadoras quando provocadas pelo fornecedor de serviços encaminham carta de desfazimento ou de esclarecimento, situação que poderia muito bem ter sido realizada pela ré. A jurisprudência é firme no sentido de que, estando os autos suficientemente instruídos e tendo sido oportunizado o contraditório, não há falar em cerceamento pelo indeferimento de diligências cuja utilidade ou necessidade não restou demonstrada: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INDEFERIMENTO DE PROVA ORAL E DOCUMENTAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. PODER DISCRICIONÁRIO DO MAGISTRADO. DECISÃO FUNDAMENTADA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto por HDI Seguros S.A. contra decisão do juízo da Vara Única da Comarca de Itaúba que, nos autos de ação de indenização ajuizada por menor representado por sua genitora, indeferiu a produção de prova oral referente ao depoimento do réu e a expedição de ofício ao INSS. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se o indeferimento da produção de provas requeridas pela parte agravante — depoimento pessoal e expedição de ofício ao INSS — configura cerceamento de defesa e viola o direito à ampla produção de provas. III. Razões de decidir 3. A produção probatória é regida pelo princípio do livre convencimento motivado, sendo o juiz o destinatário das provas, com poder para indeferir diligências que considere impertinentes, inúteis ou protelatórias, conforme art. 370 do CPC. 4. O indeferimento das provas foi devidamente fundamentado, com base na suficiência do conjunto probatório já constante dos autos, não havendo demonstração de prejuízo processual. 5. A oitiva do réu encontra limitação no princípio da não autoincriminação e, quanto à informação do INSS, tal diligência pode ser realizada oportunamente em sede de liquidação de sentença. 6. Ausência de ilegalidade, teratologia ou abuso que justifique a reforma da decisão por meio do presente agravo. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de agravo de instrumento desprovido. Tese de julgamento: "1. Não configura cerceamento de defesa o indeferimento fundamentado de provas reputadas impertinentes ou protelatórias, nos termos do art. 370 do CPC. 2. O juiz é o destinatário das provas, cabendo-lhe avaliar a necessidade de sua produção conforme o caso concreto." Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 370, 371 e 282, § 1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp 636.461/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 03.03.2015, DJe 10.03.2015; TJMT, AI nº 1002578-96.2024.8.11.0000, Rel. Des. Antonia Siqueira Gonçalves, j. 10.04.2024. (N.U 1004733-38.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 20/05/2025, Publicado no DJE 20/05/2025) No caso vertente, a matéria fática restou esclarecida com o conjunto documental já carreado, inexistindo ponto controvertido que justificasse a intervenção de terceiro estranho à relação processual. Não se pode confundir o direito constitucional à ampla defesa e ao contraditório (art.5º, LV, da CF) com a pretensão de transferir ao Estado o encargo de buscar, em favor da parte, provas que esta mesma poderia ter providenciado. Assim, ausente a demonstração de prejuízo concreto e sendo suficiente a prova produzida para formar o convencimento do juízo, não se reconhece a nulidade invocada. Com isso, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa. 2. Ilegitimidade passiva A ré sustenta que é parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda, argumentando que não recebeu qualquer valor a maior e que se isso ocorreu, deveria ser acionada a operadora de cartão de crédito. Pois bem. Ressai dos autos de origem que o autor ajuizou a ação em exame por ter constatado a existência de lançamento em duplicidade de uma compra efetuada junto a AMOROSO METALICOS E TRANSPORTES LTDA – ME na data de 05 de janeiro de 2023. Como é cediço, pela teoria da asserção, a legitimidade de parte deve ser aferida com base nas alegações formuladas na petição inicial, observando-se a narrativa dos fatos apresentados pelo autor. Conforme disposto no artigo 17 do Código de Processo Civil, são legitimados a propor ação aqueles que possuem interesse processual e legitimidade para tanto. Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça sedimentou a “teoria da asserção ou da prospettazione (em contraposição à teoria da apresentação ou da exposição). Sob essa ótica, o exame da legitimidade ad causam e do interesse processual deve ser realizado in statu assertionis, ou seja, à luz das afirmações do autor constantes na petição inicial, sem qualquer inferência sobre a veracidade das alegações ou a probabilidade de êxito da pretensão deduzida.” (REsp 1678681/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. em 07/12/2017, DJe 06/02/2018) Deste modo, é de se reconhecer que quando narrativa inicial houver a inequívoca inserção da ré, deve ser rejeitada a preliminar de ilegitimidade passiva com aplicação da teoria da asserção. Em igual sentido, a jurisprudência: EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS - REPARAÇÃO CIVIL - COMPRA E VENDA - CARTÃO DE CRÉDITO - COBRANÇA EM DUPLICIDADE - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA - DESCASO - LEGITIMIDADE PASSIVA - DEVOLUÇÃO DOS VALORES COBRADOS - CONSECTÁRIO LÓGICO - ILÍCITO MORAL - CONFIGURAÇÃO - QUANTIA INDENIZATÓRIA - QUANTIFICAÇÃO RAZOÁVEL E PROPORCIONAL - JUROS DE MORA - MARCO INICIAL. Por força da teoria da asserção, a legitimidade passiva para a causa deve ser aferida em abstrato a partir da narrativa deduzida na petição inicial. Cobrança em duplicidade de operação comercial paga por meio de cartão de crédito reflete falha na prestação do serviço e atrai, para todos os integrantes da cadeia de fornecimento, o dever de responder pelos efeitos dessa má conduta. Constatada duplicidade da cobrança, a devolução do numerário indevidamente solvido constitui consectário lógico e medida impeditiva de enriquecimento ilícito . A desídia e o descaso empresário exacerbados na solução administrativa da falha existente no serviço não denota mero dissabor, mas vulneração ao patrimônio ideal do consumidor atingido. A indenização extrapatrimonial deve ser mantida quando quantificada com razoabilidade e proporcionalidade. Tratando-se de ilícito contratual, os juros de mora incidentes sobre a indenização contam-se da citação. (TJ-MG - AC: 10000200009215001 MG, Relator.: Octávio de Almeida Neves, Data de Julgamento: 17/09/2020, Data de Publicação: 24/09/2020) (grifo nosso) No caso em tela, conforme a teoria da asserção, não há que se falar em manifesta ilegitimidade passiva, pois, verifica-se, in status assertionis, que a ré e o autor firmaram transação comercial e que houve o lançamento da mesma na fatura do cartão de crédito do último. Preliminar rejeitada. É como voto. VOTO – MÉRITO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Na origem, cuida-se de ação de devolução de valores cumulada com indenização por danos morais ajuizada pelo consumidor contra empresa do ramo de metálicos, em razão de alegada cobrança em duplicidade de compra realizada mediante cartão de crédito no valor de R$ 1.376,04, parcelada em três vezes de R$ 458,68, sendo que o autor sustentou ter sido cobrado duplamente nas faturas dos meses de março e abril de 2023, totalizando prejuízo de R$ 917,36. Reitero, então, se tratar de recursos de apelação interpostos por ambas as partes contra sentença que julgou procedente ação de devolução de valores cumulada com indenização por danos morais, nos autos da demanda ajuizada por ADIVALDO ALVES TEIXEIRA em face de AMOROSO METÁLICOS E TRANSPORTES LTDA. O Autor assevera que a correção monetária e os juros de mora dos danos materiais devem incidir desde a data do efetivo desembolso, não desde o arbitramento, com fundamento no artigo 398 do Código Civil e Súmula 54 do STJ. Além disso, sustenta ser insuficiente o valor arbitrado a título de danos morais, postulando majoração para R$ 15.000,00 sob argumento de que o quantum fixado não atende ao caráter pedagógico e compensatório da indenização. A Ré, em contrarrazões ao recurso de apelação, contesta a pretensão de alteração do termo inicial da correção monetária, invocando a Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual a correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento. Quanto ao pleito de majoração do quantum indenizatório, argumenta que o valor de R$ 10.000,00 se revela excessivo e muito acima do aplicado pelo Tribunal em circunstâncias similares. Sustenta que a própria sentença reconheceu a ausência de má-fé por parte da empresa ré, o que afastaria valores exacerbados com intuito sancionatório, pedindo, ao final, o desprovimento integral do recurso do autor ou, subsidiariamente, a redução da indenização por danos morais. Em seu recurso de Apelação, a Ré argumenta pela inexistência de falha na prestação de serviço e de dano moral, requerendo subsidiariamente a minoração do quantum indenizatório. Alega que apenas a operadora do cartão se beneficiou dos valores cobrados em duplicidade, sendo esta a verdadeira responsável pelos danos. O Autor apresenta contrarrazões ao recurso da ré dizendo que a ré está inserida na cadeia de consumo como responsável pela escolha do administrador do cartão de crédito, devendo responder solidariamente pelos danos e que restou demonstrada a falha na prestação de serviço pela cobrança em duplicidade, configurando responsabilidade objetiva da fornecedora. Ao final, pede o desprovimento integral do recurso da ré. Passo à análise das teses recursais. Das razões recursais de AMOROSO METALICOS E TRANSPORTES LTDA - ME 3. Inexistência de falha na prestação de serviço; A empresa recorrente alega que não houve falha na prestação de serviço, apontando que o erro se deu exclusivamente por uma falha da administradora do cartão de crédito, visto se tratar de empresa responsável pelo processamento das transações. A insurgência da ré, no entanto, no sentido de afastar sua responsabilidade não encontra respaldo na prova produzida nos autos. Resta incontroverso que houve cobrança em duplicidade do valor da compra realizada pelo autor, fato comprovado mediante apresentação das faturas do cartão de crédito, nas quais constam os lançamentos repetidos e idênticos nos meses de março e abril de 2023. Em que pese o esforço argumentativo da apelante, ao atribuir a falha exclusivamente à administradora do cartão de crédito, tal alegação não se sustenta diante do regime jurídico protetivo do Código de Defesa do Consumidor. Nos termos dos arts. 7º, parágrafo único, e 25, §1º, do CDC, a solidariedade entre todos os participantes da cadeia de fornecimento é a regra, cabendo ao consumidor acionar qualquer um deles para ver reparado o dano sofrido. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme ao reconhecer que, havendo defeito no serviço, todos os integrantes da cadeia de consumo respondem solidariamente pelos prejuízos, ainda que um deles tenha dado causa direta ao evento: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC . AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. CADEIA DE PRESTADORES DE SERVIÇOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N .º 568 DO STJ. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 7 DO STJ . DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Aplica-se o NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo n .º 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que todos os integrantes da cadeia de consumo respondem solidariamente pelos danos causados ao consumidor. 3 . No caso dos autos, houve falha na prestação do serviço prestado pela agência intermediadora da venda de passagens aéreas, que vendeu voo inexistente. Incidência da Súmula n.º 7 do STJ. 4 . Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos. 5. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no REsp: 1967220 SP 2021/0324237-1, Relator.: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 09/10/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/10/2023) Esse entendimento decorre do princípio da confiança e da teoria do risco do empreendimento (art. 14 do CDC), segundo os quais o fornecedor assume o risco inerente à sua atividade e não pode transferir ao consumidor o ônus de suportar os prejuízos decorrentes de falhas internas de gestão ou de terceiros por ele contratados. A esse respeito, julgado deste Tribunal: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALOR PAGO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA – COBRANÇA EM DUPLICIDADE – FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO – DEVOLUÇÃO DEVIDA – AUSÊNCIA DE NEGATIVAÇÃO – DANO MORAL AFASTADO – SENTENÇA MODIFICADA NO PONTO – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. A empresa Decolar.com foi a responsável pela comercialização das passagens aéreas através do seu site www.decolar.com, e não apenas mera intermediadora, razão pela qual detém ela legitimidade para responder pela demanda, que aponta fraude ocorrida na compra realizada em seu sitio, bem como pela respectiva cobrança indevida de valores e indenização pelos danos decorrentes, mesmo porque a responsabilidade daqueles que integram a cadeia de consumo é solidária, de modo que, em sendo ocasionado dano ao consumidor, todos os envolvidos devem responder por isso, conforme artigos 13 e 14, c/c 7º, parágrafo único, e art. 25, § 1º, todos do CDC. Preliminar rejeitada (TJRS - AC: 70081632416 RS). Se há prova da cobrança em duplicidade, o dever de reparar somente será afastado caso o prestador do serviço comprove a existência de uma das excludentes previstas no § 3º do aludido diploma normativo, a saber, inexistência do defeito, culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. O dano moral diz respeito ao prejuízo decorrente da dor imputada a uma pessoa, em razão de atos que, indevidamente, ofendem seus sentimentos de honra e dignidade, que provocam mágoa e atribulações na esfera interna pertinente à sensibilidade moral, o que não se vislumbra no caso dos autos, ainda que a cobrança em duplicidade de valores tenha lhe ocasionado transtornos que ultrapassam os meros dissabores cotidianos. (N.U 1001488-20.2019.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/06/2023, Publicado no DJE 13/06/2023) No caso em apreço, a cobrança duplicada não apenas está demonstrada documentalmente, como também é incontroversa, motivo pelo qual a falha na prestação do serviço está caracterizada, impondo-se a manutenção da responsabilidade objetiva da empresa ré. 4. Inexistência de dano moral ou minoração do quantum indenizatório; Superada a análise da responsabilidade, passa-se ao exame da insurgência da ré voltada à exclusão ou, subsidiariamente, à redução da indenização por danos morais. De início, não prospera a tese de inexistência de dano moral. É que a cobrança em duplicidade, tal como comprovada nos autos, não se resume a um simples incômodo trivial da vida em sociedade, notadamente pela demonstração de que, de fato, o Autor buscou tentar resolução administrativa, considerando o estorno realizado da primeira parcela em fevereiro de 2023. Em verdade, trata-se de conduta que impõe ao consumidor constrangimento e desequilíbrio financeiro, pois o obriga a despender tempo e recursos para solucionar situação gerada exclusivamente pela fornecedora, atingindo a esfera da tranquilidade e gerando aborrecimento que extrapola o mero dissabor. Do mesmo modo, é de se destacar que o valor descontado indevidamente de aproximadamente R$917,32, representa grande parte da remuneração do autor, o qual fez prova que percebe mensalmente a quantia de R$1.455,15 de forma líquida, situação que corrobora com a ocorrência do dano moral no presente caso. A jurisprudência consolidada deste Tribunal de Justiça tem reconhecido, reiteradamente, que em hipóteses de cobrança indevida – especialmente quando não corrigida de pronto e levando o consumidor à via judicial – está configurado o dano moral indenizável: Direito do Consumidor e Processual Civil. Apelação Cível. Preliminar de Ilegitimidade Passiva. Rejeitada. Erro em Fatura de Cartão de Crédito. Antecipação das Parcelas. Cobrança Indevida. Danos Morais. Revisão de Faturas. Sentença Mantida. Recurso Desprovido. I. Caso em Exame 1. Recurso de Apelação interposto em virtude de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais Emergentes c/c Repetição de Indébito, condenou a instituição financeira ao pagamento de R$ 3.000,00 de indenização por dano moral e determinou a revisão de faturas de cartão de crédito para excluir valores pagos e parcelas antecipadas, com rateio do ônus sucumbencial. II. Questão em Discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a instituição financeira é parte legítima para figurar no polo passivo da demanda; (ii) estabelecer se houve falha na prestação do serviço bancário, apta a ensejar indenização por dano moral e a revisão das faturas. III. Razões de Decidir 3. A instituição financeira que administra o cartão de crédito e lança diretamente as cobranças impugnadas, integra a cadeia de fornecimento e responde objetivamente pelos defeitos na prestação do serviço, conforme o Código de Defesa do Consumidor. 4. O lançamento cumulativo de parcelas vencidas e vincendas, e a repetição de valores já quitados, caracteriza falha grave na prestação do serviço, que causa dano relevante à esfera pessoal e financeira da consumidora. 5. A responsabilidade civil da instituição é objetiva, prescinde de prova de culpa, pois basta a demonstração do defeito no serviço e do nexo de causalidade com o dano experimentado. 6. A manutenção do valor fixado a título de dano moral (R$ 3.000,00) observa os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, atende às funções compensatória e pedagógica da indenização. IV. Dispositivo e Tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A instituição financeira que gerencia a emissão de faturas de cartão de crédito responde objetivamente por falhas no lançamento de valores, inclusive quando decorrentes de erro na cobrança de parcelas. 2. A cobrança indevida de valores já pagos ou de parcelas vincendas em fatura de cartão de crédito configura defeito na prestação do serviço e enseja indenização por dano moral. 3. A revisão das faturas deve excluir os valores pagos em duplicidade e corrigir o débito do consumidor para refletir apenas o montante efetivamente devido.” _______________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, V e X; CDC, arts. 6º, VI, 14 e 20; CPC, art. 85, §11. Jurisprudência relevante citada: TJPR, Recurso Inominado nº 0038271-93.2023.8.16.0182, Rel. Des. Maria Fernanda Scheidemantel Nogara Ferreira da Costa, 1ª Turma Recursal, j. 05.08.2024; TJSP, Recurso Inominado nº 0002426-96.2024.8.26.0081, Rel. Des. Marcio Bonetti, 6ª Turma Recursal Cível, j. 07.04.2025. (N.U 1045539-31.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CLARICE CLAUDINO DA SILVA, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 15/05/2025, Publicado no DJE 15/05/2025) Cumpre enfatizar que, nas relações de consumo, a reparação do dano moral independe da verificação de dolo ou culpa, uma vez que a responsabilidade do fornecedor é objetiva, conforme previsto no art.14 do CDC. Ainda que a empresa não tenha agido com intenção de lesar, persiste o dever de reparar, bastando a comprovação do defeito do serviço e do nexo causal, ambos evidenciados na presente demanda. Definida a subsistência do dano moral, passo à análise do quantum indenizatório. A indenização por dano moral possui dupla finalidade: compensar a vítima e exercer função pedagógica sobre o ofensor. Todavia, deve ser arbitrada com prudência, de modo a não ensejar enriquecimento sem causa nem se mostrar irrisória a ponto de não cumprir sua função sancionatória. Para tanto, o julgador deve considerar a gravidade do fato, a repercussão do dano, a capacidade econômica das partes e os padrões usualmente adotados pela jurisprudência em casos semelhantes. No caso em exame, embora a conduta da ré tenha efetivamente causado transtornos relevantes ao autor, o valor fixado na sentença (R$10.000,00) revela-se ligeiramente superior aos parâmetros médios desta Câmara em hipóteses análogas, sobretudo porque restou reconhecido que não houve má-fé na conduta da empresa, na medida em que houve o estorno da primeira parcela. Este elemento recomenda ajuste do valor arbitrado para que a indenização seja proporcional à extensão do dano. Diante desse contexto, acolho parcialmente o pedido recursal da ré apenas para reduzir o quantum indenizatório para R$5.000,00 (cinco mil reais), montante que, ao meu sentir, melhor atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, cumprindo adequadamente a função compensatória e pedagógica da indenização, sem destoar dos precedentes desta Corte. Das razões recursais de ADIVALDO ALVES TEIXEIRA 1. Fixação do termo inicial da correção monetária e juros de mora dos danos materiais Os apelantes insurgem-se especificamente contra o termo inicial fixado na sentença para a incidência da correção monetária sobre a indenização por danos materiais. Sustentam que, por se tratar de restituição de valores pagos indevidamente, a atualização monetária não deve correr a partir do arbitramento, mas sim desde cada desembolso efetuado, em respeito ao princípio da reparação integral. No que tange aos consectários legais incidentes sobre a condenação imposta, é necessário tecer considerações acerca do termo inicial da correção monetária e dos juros de mora. Em relação aos juros, a jurisprudência pátria é uniforme no sentido de que, tratando-se de responsabilidade contratual, o marco inicial da mora é a citação válida. Tal diretriz decorre da literalidade do art. 405 do Código Civil, que expressamente dispõe que “contam-se os juros de mora desde a citação inicial”, norma que se harmoniza com o art. 240 do CPC. A partir desse ato processual, o devedor é formalmente cientificado da pretensão e constituído em mora, fazendo nascer o dever de pagar os juros compensatórios pela resistência ao adimplemento da obrigação. Ocorre que no caso em tela, trata-se de cobrança em duplicidade referente a pagamento parcelado de transação comercial efetuada em 05 de janeiro de 2023 referente a aquisição de produtos pelo autor junto à ré. Ou seja, embora exista relação contratual entre as partes referente a compra realizada, o dano decorreu de ato ilícito caracterizado pela cobrança indevida em valor superior ao contratado, configurando responsabilidade extracontratual. Nesse sentido, entendimento deste Tribunal: DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO INDEVIDA DE NEGATIVAÇÃO APÓS QUITAÇÃO DA DÍVIDA. QUANTUM INDENIZATÓRIO INSUFICIENTE. TERMO INICIAL DOS JUROS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame: 1. Recurso de Apelação interposto contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos em ação declaratória de inexistência de débito c/c indenização por danos morais, condenando a ré ao pagamento de R$ 3.000,00 a título de indenização, estabelecendo juros de mora a partir da citação. II. Questão em discussão: 2. A questão em discussão consiste em saber se: (i) o valor da indenização por danos morais fixado em R$ 3.000,00 é suficiente para compensar os danos decorrentes da manutenção indevida de negativação após quitação da dívida; e (ii) qual o termo inicial correto para incidência dos juros de mora no caso concreto. III. Razões de decidir: 3. A manutenção indevida do nome do consumidor em cadastros de inadimplentes, mesmo após a quitação da dívida, configura dano moral in re ipsa, ou seja, presumido, dispensando a comprovação do efetivo prejuízo. 4. O valor da indenização por danos morais deve atender à função compensatória e desempenhar caráter pedagógico-punitivo, tendo como parâmetros a extensão do dano, a condição econômica das partes, a reprovabilidade da conduta do ofensor e a proporcionalidade. 5. No caso concreto, a quantia de R$ 3.000,00 mostra-se insuficiente diante da conduta negligente da instituição de ensino, que manteve a negativação por período significativo (18 dias) mesmo após a quitação comprovada da dívida e as tentativas infrutíferas da autora em solucionar administrativamente a questão. 6. Em relação aos juros moratórios, aplica-se a Súmula nº 54 do STJ, que estabelece seu início a partir do evento danoso, por se tratar de responsabilidade extracontratual, ainda que exista relação contratual entre as partes. IV. Dispositivo e tese: 7. Recurso parcialmente provido para majorar o valor da indenização por danos morais para R$ 6.000,00 e alterar o termo inicial dos juros moratórios para a data do evento danoso. Tese de julgamento: "1. Em casos de manutenção indevida de negativação após quitação de dívida, o valor da indenização por danos morais deve ser fixado considerando a conduta negligente da instituição, as tentativas infrutíferas de resolução administrativa e o porte econômico do ofensor. 2. Ainda que exista relação contratual entre as partes, os juros moratórios fluem a partir do evento danoso quando o dano decorre de ato ilícito caracterizado pela manutenção indevida da negativação após a quitação da dívida, por configurar responsabilidade extracontratual." (N.U 1034289-47.2023.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 22/07/2025, Publicado no DJE 22/07/2025) (grifo nosso) Dessa forma, os juros de mora devem incidir a partir da data do evento danoso, que, no caso em análise, corresponde ao momento em que foram lançados os débitos indevidos em nome do Autor. Considerando que da primeira parcela houve o devido estorno (ID. 297732916), os juros de mora devem incidir do lançamento indevido das parcelas efetivamente foram cobradas em duplicidade. Por outro lado, a correção monetária tem natureza e finalidade distintas dos juros. Enquanto estes constituem penalidade pelo atraso, aquela visa recompor a expressão econômica da moeda, preservando o valor real da obrigação frente ao fenômeno inflacionário. Por isso mesmo, o Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula 43, consolidou o entendimento de que a atualização monetária deve incidir desde o momento do efetivo prejuízo, sendo, no caso de danos materiais decorrentes de desembolsos realizados pela parte lesada, a data do pagamento ou saída dos valores do patrimônio do credor. Deve-se lembrar que a fixação do termo inicial da correção monetária a partir do prejuízo decorre de imperativo lógico: o dano material representa a diminuição imediata do patrimônio da vítima, e a recomposição plena desse patrimônio só se faz possível mediante a atualização da quantia despendida desde o exato momento em que ela foi retirada do seu acervo. A fixação da atualização apenas a partir do arbitramento, conforme feito pela sentença recorrida, importaria em enriquecimento ilícito do devedor, que se beneficiaria da desvalorização monetária ocorrida entre o evento danoso e o julgamento. Com essas considerações, reputo necessária a reforma parcial do julgado para adequar os consectários legais aos parâmetros legais e jurisprudenciais: os juros moratórios e a correção monetária incidirão desde a data do efetivo prejuízo, ou seja, 18/03/2023 (ID. 297732917) e 18/04/2023 (ID. 297732918). 2. Majoração do quantum indenizatório por danos morais No que se refere ao pedido de majoração da indenização por danos morais, consigno que a questão já foi examinada de forma expressa no item 4 (Inexistência de dano moral ou minoração do quantum indenizatório), ocasião em que, considerando a natureza da ofensa e os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, acolhi parcialmente a insurgência para reduzir o montante fixado na sentença de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Dessa forma, resta prejudicada qualquer análise adicional sobre a matéria, mantendo-se a condenação nos moldes já ajustados naquele tópico. Conclusão. Por essas razões, conheço dos recursos de Apelação, rejeitando suas preliminares, e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de AMOROSO METALICOS E TRANSPORTES LTDA – ME para reduzir a indenização por danos morais para R$5.000,00 (cinco mil reais) e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de ADIVALDO ALVES TEIXEIRA para retificar os consectários legais da sentença e fixando como termo inicial dos juros moratórios e da correção monetária desde a data do efetivo prejuízo, conforme já mencionado na fundamentação deste voto, mantendo inalterados os demais termos da r. sentença fustigada. Por fim, ante o resultado do julgamento, deixo de majorar os honorários sucumbenciais (art. 85, §11, do CPC), em observância à tese firmada no Tema 1059 do STJ: “A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação.” (STJ, Tema n. 1.059, REsp n. 1.864.633/RS, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Corte Especial, j. 09/11/2023, DJe 21/12/2023) É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 29/07/2025
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