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Processo nº 1023226-88.2024.8.11.0003

ID: 336497347

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1023226-88.2024.8.11.0003

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ALMERINDA TEIXEIRA

Acórdão

Advogados:

VOLMAR DE OLIVEIRA JUNIOR

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1023226-88.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Efeitos, Cláusulas Abusi… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1023226-88.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Efeitos, Cláusulas Abusivas] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [ALMERINDA TEIXEIRA - CPF: 485.584.000-91 (APELADO), VOLMAR DE OLIVEIRA JUNIOR - CPF: 018.171.620-80 (ADVOGADO), OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO - CNPJ: 92.228.410/0001-02 (APELANTE), GIULIO ALVARENGA REALE - CPF: 639.139.336-20 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ORDINÁRIA DE REVISÃO CONTRATUAL – PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO - PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL REJEITADA – MÉRITO - JUROS REMUNERATÓRIOS – INOBSERVÂNCIA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO – ABUSIVIDADE CONSTATADA – LIMITAÇÃO DEVIDA – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES –– COMPENSAÇÃO DE VALORES – POSSIBILIDADE – TERMO INICIAL DE INCIDÊNCIA – CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DOS DESCONTOS INDEVIDOS – JUROS A PARTIR DA CITAÇÃO - SENTENÇA REFORMADA NO PONTO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. Se a peça inaugural foi instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação, em total consonância com o disposto nos artigos 319 e 320 do CPC, bem como, se dos fatos decorre logicamente o pedido, não há falar em indeferimento da petição inicial por inépcia. Segundo entendimento pacificado no Superior Tribunal de Justiça, a estipulação de juros remuneratórios acima de 12% (doze por cento) ao ano, por si só, não configura abuso. Todavia, constatando-se sua fixação em percentual excessivo, capaz de colocar o consumidor em desvantagem, é cabível a revisão para limitá-la à média praticada pelo mercado, consoante divulgada pelo Banco Central do Brasil para a mesma espécie contratual. Havendo a demonstração de cobrança de taxa de juros acima da média do Banco Central, é cabível a restituição dos valores cobrados indevidamente na forma simples, como fixado pelo magistrado. No caso de condenação quanto a cobrança de juros abusivos, deve ocorrer a compensação com o crédito eventualmente existente nos autos, como decidido pelo juiz da causa. O marco de incidência da correção monetária deve se dar a partir dos descontos indevidos (desembolso) e o dos juros moratórios a partir da citação. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1023226-88.2024.8.11.0003 APELANTE: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO APELADA: ALMERINDA TEIXEIRA RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Tratase de Apelação Cível interposta por OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, em face de sentença proferida pelo MM. Juiz da 4ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, Dr. Renan Carlos Leão Pereira do Nascimento, lançada nos autos da Ação Revisional, ajuizada por ALMERINDA TEIXEIRA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, e determinou a redução dos juros remuneratórios à taxa média de mercado em 2,00% ao mês e 26,79% ao ano, cuja parcela mensal deverá ser apurada em sede de cumprimento de sentença, já que incide o CET, permanecendo os demais encargos como contratado, devendo a requerida se abster de realizar a cobrança de valores excedentes, indeferindo, portanto, todos os demais pedidos constantes na exordial, condenou a parte demandada à repetição, na forma simples, do valor desembolsado indevidamente pela parte autora (juros abusivos), atualizado monetariamente pelo INPC e com juros de mora de 1% ao mês a partir do efetivo pagamento, cujo valor deverá ser apurado em sede de cumprimento de sentença, permitindo-se, é claro, a compensação com o crédito eventualmente existente em favor do Banco demandado. Condenou, ainda, a parte requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido pela requerente, na forma do §2º do art. 85 do CPC, cujo valor poderá ser mensurado após liquidação de sentença. Inicialmente, a apelante requer que o recurso seja recebido também no seu efeito suspensivo, em razão da presença dos requisitos para tanto (fumus boni iuris e pericullum in mora). Também aponta violação ao artigo 330, §3º do CPC, em razão do indeferimento da inicial por inépcia, vez que, nas hipóteses em que se discuta revisão de obrigação decorrente do empréstimo financiamento ou alienação de bens, o demandante deverá, conjuntamente: a) indicar na petição inicial o valor incontroverso e as obrigações contratuais que pretende rever; e b) manter o pagamento do valor incontroverso no tempo e modo contratados, razão pela qual, requer o não conhecimento do recurso. No mérito, a apelante sustenta a legalidade e proporcionalidade de juros pactuados, requerendo a manutenção integral do contrato, sob o fundamento de que todos os encargos refletem o risco da operação e foram expressamente aceitos pela autora; bem como, requer que não haja a repetição do indébito e, ao final, caso mantida eventual condenação, que os honorários sejam arbitrados no patamar mínimo previsto no art.85, §2º, do CPC, em razão da suposta baixa complexidade da causa, sendo que o marco inicial para aplicação de correção é a partir de cada desembolso e juros de mora a incidir a partir da citação (Id. 286966404). A parte apelada não ofereceu as contrarrazões, conforme certidão acostada no Id. 297659886. A parte apelante efetuou o recolhimento do preparo no Id. 286966405. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Recolhido o preparo, e estando adequado e tempestivo, CONHEÇO o apelo interposto, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Inicialmente, a parte requerida/apelante pleiteia que o apelo seja recebido também pelo efeito suspensivo, em razão da presença do periculum in mora e o fumus boni iuris ensejadores para tanto. Entretanto, quanto ao efetivo pleito de atribuição do efeito suspensivo ao recurso interposto, não vejo como conferir-lhe guarida, considerando o disposto no art. 1.012 do CPC, em seus §§ 1º, III e §3, I e II, preleciona o seguinte: “Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1º Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: (...) § 3º O pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1º poderá ser formulado por requerimento dirigido ao: I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação.” Da leitura do supracitado dispositivo processual, evidencia-se que o pedido de atribuição de efeito suspensivo em recurso de apelação deve ser formulado por petição autônoma, dirigida ao tribunal, ou, quando já distribuído o recurso, ao relator, também por petição própria, e não como preliminar recursal, tal qual o caso em tela, o que obsta seu reconhecimento. Nesse sentido, colaciono entendimentos desta Corte de Justiça e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, in verbis: “TRIBUTÁRIO – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – EXECUÇÃO FISCAL – PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – NÃO CONHECIDO - SISTEMÁTICA PARA CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – TERMO INICIAL DO PRAZO DE SUSPENSÃO – PRIMEIRA INTIMAÇÃO ACERCA DA NÃO LOCALIZAÇÃO DE BENS OU DO DEVEDOR – INTIMAÇÃO OBSERVADA NO FEITO – INÉRCIA DA FAZENDA PÚBLICA POR MAIS DE 5 (CINCO) ANOS APÓS INÍCIO DO RESPECTIVO PRAZO PRESCRICIONAL - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. “O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação depende de procedimento próprio, consubstanciado na formulação de requerimento autônomo dirigido ao tribunal, restando inviável o exame do pedido efetuado no próprio recurso de apelação.” (N.U 1010000-67.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/11/2022, Publicado no DJE 13/12/2022).” (N.U 0016170-29.2009.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Público, Relator: Edson Dias Reis, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, julgado em 14/02/2023, publicado no DJE 24/02/2023) (grifei) “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINARES. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO. ARTIGO 375-A DO TJMG. NÃO CONHECIDO. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DA JUSTIÇA. REJEIÇÃO. MÉRITO. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. DESCONTO DE PRESTAÇÕES SUPERIOR A 30% DOS PROVENTOS DA AUTORA. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS CONSIGNADOS. IMPOSSIBILIDADE. TEMA 1.085 DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. - O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. - O benefício da justiça gratuita somente pode ser revogado se o impugnante demonstrar, de forma cabal, que o beneficiário detém capacidade financeira, o que não ocorreu no presente caso. - Nos termos do que foi decidido no Tema 1.085, do STJ, deve ser obedecido o limite de 30% de descontos dos proventos nos empréstimos consignados. - Deve-se manter a sentença que determinou a limitação dos descontos no benefício previdenciário da apelada em 30% (trinta por cento), diante do caráter alimentar dessa verba.” (TJMG - Apelação Cível 1.0000.23.231925-1/001, Relator(a): Des.(a) Aparecida Grossi, 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 21/02/2024, publicação da súmula em 21/02/2024) (grifei) Desse modo, resta inviável o exame do pedido formulado na própria apelação, razão pelo qual não conheço do pedido, diante da manifesta inadequação da via eleita. Também aponta violação ao artigo 330, §3º do CPC, em razão do indeferimento da inicial por inépcia, vez que, nas hipóteses em que se discuta revisão de obrigação decorrente do empréstimo de financiamento ou alienação de bens, o demandante deverá, conjuntamente: a) indicar na petição inicial o valor incontroverso e as obrigações contratuais que pretende rever; e b) manter o pagamento do valor incontroverso no tempo e modo contratados, razão pela qual, requer o indeferimento da inicial. Todavia, em que pese às alegações da requerida/apelante, razão não lhe assiste isso porque o artigo 330 do CPC prevê o seguinte: “Art. 330. A petição inicial será indeferida quando: I – for inepta; (...) § 1º Considera-se inepta a petição inicial quando: I – lhe faltar pedido ou causa de pedir; II – o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV – contiver pedidos incompatíveis entre si (...)”. Analisando a inicial, não se pode dizer que esta é inepta, pois os pedidos além de certos e juridicamente possíveis, decorrem logicamente dos fatos narrados e causa de pedir. Portanto, apontando na peça inicial os fatos, os fundamentos jurídicos e os pedidos de forma clara e objetiva e, estando instruída com a documentação pertinente, possibilitando o pleno exercício da defesa e satisfazendo as exigências dos artigos 319 e 320 do CPC, não há se falar em inépcia, razão pela qual rejeito a preliminar aviada. Quanto ao mérito, cinge-se dos autos que ALMERINDA TEIXEIRA ajuizou ação revisional cumulada com tutela de urgência, em desfavor de OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, alegando, em síntese, que houve a cobrança de juros elevada, vez que está acima da taxa média de mercado, bem como, requer a descaracterização da mora, em razão da abusividade do contrato, razão pela qual propôs a ação pugnando pela procedência dos pedidos inaugurais. Sobreveio sentença em que o magistrado a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, e determinou a redução dos juros remuneratórios à taxa média de mercado em 2,00% ao mês e 26,79% ao ano, cuja parcela mensal deverá ser apurado em sede de cumprimento de sentença, já que incide o CET, permanecendo os demais encargos como contratado, devendo a requerida se abster de realizar a cobrança de valores excedentes, indeferindo, portanto, todos os demais pedidos constantes na exordial, condenou a parte demandada à repetição, na forma simples, do valor desembolsado indevidamente pela parte autora (juros abusivos), atualizado monetariamente pelo INPC e com juros de mora de 1% ao mês a partir do efetivo pagamento, cujo valor deverá ser apurado em sede de cumprimento de sentença. Inconformada, a parte apelante sustenta a legalidade dos juros pactuados, requerendo a manutenção integral do contrato, sob o fundamento de que todos os encargos refletem o risco da operação e foram expressamente aceitos pela autora; bem como, requer seja afastada a repetição do indébito e, ao final, caso mantida eventual condenação, que haja a compensação dos créditos, os honorários sejam arbitrados no patamar mínimo previsto no art.85, §2º, do CPC, em razão da suposta baixa complexidade da causa e que o marco inicial para aplicação de correção é a partir de cada desembolso e juros de mora devem incidir a partir da citação (Id. 286966404). Pois bem. A hipótese dos autos representa uma relação de consumo e está sujeita à disciplina do Código de Defesa do Consumidor, consubstanciada na prestação de serviços firmada entre a instituição bancária e o consumidor final. O artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor define como serviço “qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”. No mesmo sentido é o posicionamento da Corte Superior, conforme se verifica do Enunciado Sumular nº. 297, do Superior Tribunal de Justiça: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Quanto aos juros remuneratórios, o Superior Tribunal de Justiça já consolidou sua jurisprudência no sentido de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação definida na Lei de Usura, conforme verbete da Súmula 596/STF, bem como que a sua estipulação acima de 12% (doze por cento) ao ano, por si só, não configura abuso (Súmula 382). Todavia, no que diz respeito à revisão dessas taxas, doutrina e jurisprudência são uníssonas em admiti-la em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e demonstrado o excesso capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – o que não significa mera pactuação acima da taxa média do mercado naquele segmento –, justificando sua redução quando evidenciado o abuso. No caso dos autos, tem-se que na data da celebração da avença (28/12/2021), foi firmada a Cédula de Crédito Bancária (Id. 286966396), onde foram cobrados juros de 53,05% a.a e 3,61% a.m, sendo que a taxa de juros apurada pelo BACEN, para operações da mesma espécie, era de 2,00% ao mês e 26,79% ao ano, consoante disposição contida no endereço eletrônico https://www.bcb.gov.br/estatisticas/reporttxjuroshistorico/ Vê-se que as taxas cobradas no referido contrato estavam acima da média do mercado – aliás, mais de uma vez e meia ao valor da taxa de mercado apurada na data da contratação –, e, como tal, claramente reputadas abusivas, logo, merece ser mantida a sentença, para que os juros se limitem à taxa média do BACEN. Nessa mesma linha, é o entendimento deste Sodalício, in verbis: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA – ABUSIVIDADE DE JUROS REMUNERATÓRIOS – RESTITUIÇÃO SIMPLES DO INDÉBITO – IRRESIGNAÇÃO DO BANCO – PRELIMINARES REJEITADAS – APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – POSSIBILIDADE DE REVISÃO CONTRATUAL – JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS – LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. É pacífico o entendimento de que os contratos de natureza bancária se enquadram na categoria de contratos de adesão, o que impõe a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, especialmente considerando que a atividade bancária está expressamente prevista no artigo 3º, § 2º, do referido diploma legal, conforme Súmula 297 do STJ. A estipulação de juros remuneratórios acima de 12% ao ano, por si só, não configura abuso. Todavia, é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto, utilizando-se a taxa média do mercado financeiro divulgada pelo Banco Central como parâmetro. Constatada a abusividade dos juros remuneratórios praticados nos contratos, cuja taxa se mostra superior à média de mercado divulgada pelo BACEN, impõe-se a sua adequação ao percentual utilizado em operações da mesma espécie à época da contratação. A restituição do indébito deve ocorrer na forma simples, e não em dobro, à míngua de prova de má-fé por parte da instituição financeira, aplicando-se a correção monetária pelo IPCA a partir do pagamento e juros de mora pela SELIC desde a citação” (N.U 1010367-23.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 12/07/2025, Publicado no DJE 12/07/2025) Assim, segundo a pacífica jurisprudência desta Corte, deve ocorrer a restituição dos valores na sua forma simples, como bem decidido pelo magistrado de piso. Havendo a condenação quanto à cobrança de juros abusivos, deve ocorrer a compensação com o crédito eventualmente existente nos autos, em sede de cumprimento de sentença, como bem dispôs a bem lançada sentença. Com relação aos juros e correção monetária, a parte apelante alega que o marco inicial para aplicação de correção é a partir de cada desembolso e juros de mora devem incidir a partir da citação, sendo que, no ponto, assiste razão a apelante. Isso porque, a correção monetária deve incidir desde a data dos descontos indevidos (desembolso) e juros moratórios a partir da citação. A propósito, segue jurisprudência deste Tribunal de Justiça: “DIREITO DO CONSUMIDOR E BANCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE DEMONSTRADA. APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DO BACEN. RESTITUIÇÃO SIMPLES DOS VALORES PAGOS A MAIOR. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Trata-se de apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente a ação de revisão contratual ajuizada pelo consumidor, mantendo as taxas de juros pactuadas com a instituição financeira e afastando a repetição de indébito. II. Questão em discussão 2. Discute-se a abusividade da taxa de juros remuneratórios estipulada no contrato de empréstimo pessoal não consignado, em comparação com a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil. III. Razões de decidir 3. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras, nos termos da Súmula 297 do STJ. 4. Admite-se a revisão das cláusulas contratuais quando demonstrada a abusividade, nos termos do artigo 51, §1º, do CDC. 5. Restou comprovado que a taxa de juros estipulada no contrato (7,89% a.m. e 148,76% a.a.) supera significativamente a taxa média do BACEN (2,90% a.m. e 40,93% a.a.), caracterizando onerosidade excessiva ao consumidor. 6. Aplicável o entendimento do STJ firmado no REsp 1.061.530/RS e no Tema 234 dos Recursos Repetitivos, que permitem a revisão dos juros remuneratórios quando comprovada sua abusividade em relação à taxa média de mercado. 7. Determinada a revisão do contrato para que seja aplicada a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN. 8. A devolução dos valores pagos a maior deve ocorrer de forma simples, e não em dobro, ante a ausência de comprovação de má-fé da instituição financeira, nos termos do artigo 42, parágrafo único, do CDC. 9. Correção monetária pelo INPC desde a data dos descontos indevidos e juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação. IV. Dispositivo e tese 10. Recurso de apelação parcialmente provido. Sentença reformada para julgar parcialmente procedente o pedido inicial, determinando a revisão dos juros à taxa média do BACEN e a restituição simples dos valores pagos a maior. Tese de julgamento: “1. É abusiva a taxa de juros remuneratórios que supera significativamente a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN, cabendo sua adequação. 2. A devolução dos valores pagos a maior deve ser realizada de forma simples, salvo comprovação de má-fé da instituição financeira.” Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 42, § único, e 51, §1º; CC, art. 405; CPC, arts. 85 e 86. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.061.530/RS; STJ, Tema 234; STJ, Súmula 297.” (N.U 1047886-66.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/03/2025, Publicado no DJE 13/03/2025) Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, para determinar que sobre o a restituição dos valores desembolsados indevidamente (juros abusivos), incida correção monetária a partir do desembolso (descontos indevidos) e juros de mora a partir da citação, mantida a sentença nos demais termos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 23/07/2025

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Jatabairu Francisco Nunes x Reical Industria E Comercio De Calcario Ltda

ID: 338628127

Tribunal: TJMT Órgão: 11ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1018924-67.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 30/07/2025

Polo Ativo:

JATABAIRU FRANCISCO NUNES

Polo Passivo:

REICAL INDUSTRIA E COMERCIO DE CALCARIO LTDA

Sentença

Advogados:

GEANDRE BUCAIR SANTOS

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JULIA FERNANDA MANOEL SARAIVA

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JATABAIRU FRANCISCO NUNES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 11ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Processo: 1018924-67.2022.8.11.0041. Requerente: JATABAIRU FRANCISCO NUNES Requerido: REICAL INDUSTRIA E COMERCIO DE CALCARIO LTDA SENT… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 11ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Processo: 1018924-67.2022.8.11.0041. Requerente: JATABAIRU FRANCISCO NUNES Requerido: REICAL INDUSTRIA E COMERCIO DE CALCARIO LTDA SENTENÇA Trata-se de ação de arbitramento de honorários advocatícios movida por Jatabairu Francisco Nunes em face de Reical Indústria e Comércio de Calcário LTDA, ambos devidamente qualificados e representados nos autos. O autor alega na inicial que prestou serviços ao réu desde o ano de 2001. Informa que de 2001 a 2003 as partes firmaram contratos escritos, mas a partir de 2003 os contratos foram verbais, no mesmo contexto dos escritos. Argumenta que em 19/10/2006, foi contratado para a execução n°. 0019679-70.2006.8.11.0041, em trâmite junto à 5ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, atuando nos autos até a data da notificação de revogação dos poderes, ocorrido em 08/07/2019. Todavia, afirma que não foi remunerado pelos serviços prestados, tendo em vista que o convencionado foi que os honorários seriam pagos no final do feito ou quando a substituição por outro defensor. Requer o arbitramento de seus honorários entre 10% a 20% sobre o valor da causa, que perfaz o montante de R$ 102.526,25 (cento e dois mil, quinhentos e vinte e seis reais e vinte e cinco centavos). A inicial foi devidamente recebida (ID. 156305809). A ré apresentou contestação (ID. 167397913) alegando que o autor não colacionou as provas dos serviços prestados, com exceção da petição inicial e algumas petições simples, sendo que o referido processo ainda está em trâmite. Aponta que não existem provas de acordo para o pagamento de 10% dos valores envolvidos na ação de execução. Defende que o autor não se desincumbiu do seu ônus de comprovar os fatos constitutivos do seu direito. Todavia, pede, caso não seja esse o entendimento do juízo, que os honorários sejam fixados em valor fixo e não em porcentagem. O autor impugnou a contestação no ID. 168520365. Intimadas, ambas as partes deixaram de especificar provas (IDs. 186712847 e 186724508). É o relatório. Fundamento e decido. Havendo nos autos elementos de convicção suficientes e inexistindo pedido de produção de outras provas, passo ao julgamento antecipado da lide, conforme me permitem o artigo 355, incisos I e II, c/c artigo 12, ambos do Código de Processo Civil (CPC). Verificando a ausência de questões preliminares ou prejudiciais que ainda não foram analisadas, passo ao julgamento do mérito. No caso em análise, observa-se a existência de relação jurídica entre as partes, decorrentes da contratação pela ré dos serviços advocatício prestados pelo autor. A ré não nega que o autor lhe prestou serviços no processo n°. 0019679-70.2006.8.11.0041, em trâmite junto à 5ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, bem como que dispensou os serviços de forma unilateral, como demonstra a notificação de comunicação da revogação dos poderes outorgados acostada no ID. 85579373. Portanto, a controvérsia existente nos autos restringe-se a extensão dos serviços prestados pelo autor e a forma como o advogado deveria ser remunerado pela ré. A distribuição do ônus da prova, por sua vez, segue a regra do art. 373, inc. I e II, do CPC, cabendo à autora a demonstração dos fatos constitutivos de seu direito e ao réu os fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito da autora. Da análise dos autos, verifica-se que o autor logrou êxito em demonstrar a extensão e abrangência dos serviços prestados. Conforme observa-se dos documentos juntados a inicial, em especial a cópia da referida ação de execução, é nítido que o autor atuou como procurador da ré por 13 anos, sendo responsável pelo protocolo da inicial e todos os demais atos necessários ao andamento do feito até o ano de 2019. Registra-se que durante este período de tempo, o autor protocolou nos autos da execução cerca de 13 petições, dentre elas: petição inicial, pedidos de penhora, pedido de conversão para execução por quantia certa, pedidos de impulsionamento, informações, pedidos de suspensão e apresentação de diversos cálculos contábeis. De igual forma, verifica-se que era praxe das partes estabelecerem contrato de forma verbal, condicionando o recebimento dos honorários ao final do processo de execução e obtenção de proveito econômico pela ré. Tal assertiva pode ser observada a partir dos contratos pretéritos entabulados entre as partes, da notificação da ré – na qual requereu a informações sobre eventuais valores devidos e ainda não adimplidos referentes aos honorários – e da contra notificação do autor. Assim, ainda que inexistente previsão expressa sobre o valor que deveria ser pago em favor do autor, o advogado faz jus à remuneração pelo serviço prestado. A prestação de serviços está regulamentada pelos artigos 593 à 609 do Código Civil (CC), sendo que art. 594 dispõe: “Art. 594. Toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratada mediante retribuição.” Sobre o dispositivo supra, Maria Helena Diniz anota: “A prestação de serviço é um contrato pelo qual uma das partes (prestador) se obriga para com a outra (tomador) a prestar-lhe uma atividade lícita, material ou imaterial, mediante remuneração [...]. O objeto da prestação de serviço é uma obrigação de fazer, ou seja, a prestação de uma atividade lícita, não vedada pela lei e pelos bons costumes, oriunda da energia humana aproveitada por outrem, e que pode ser material (limpeza, jardinagem, conserto de TV, digitação, etc.) ou imaterial (p. ex., tratamento médico ou odontológico, consultoria jurídica, etc.).” (in Código civil anotado. 13ª edição, Saraiva. São Paulo, 2008, p. 454/455). Além disso, assim discorre o Ministro Cezar Peluso: “[...] contrato de prestação de serviços é uma atividade humana, manual ou intelectual, doméstica ou externa, cujos exemplos têm o condão de falar por si: a prestação de serviços médicos, odontológicos, arquitetônicos ou advocatícios, além dos serviços comumente contratados de diarista e pintores.” (Código civil comentado: Coordenador Min. Cezar Peluso. 8ª edição, Manole. São Paulo, 2014, p. 600). Como se infere das lições supra, a remuneração é inerente ao contrato de prestação de serviço. E, tratando especialmente da prestação de serviços advocatícios, o Estatuto da Advocacia disciplina em seu art. 22: “22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. § 1º O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado. § 2º Na falta de estipulação ou de acordo, os honorários são fixados por arbitramento judicial, em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, não podendo ser inferiores aos estabelecidos na tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB. § 3º Salvo estipulação em contrário, um terço dos honorários é devido no início do serviço, outro terço até a decisão de primeira instância e o restante no final. § 4º Se o advogado fizer juntar aos autos o seu contrato de honorários antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório, o juiz deve determinar que lhe sejam pagos diretamente, por dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou. § 5º O disposto neste artigo não se aplica quando se tratar de mandato outorgado por advogado para defesa em processo oriundo de ato ou omissão praticada no exercício da profissão.” De igual maneira, o art. 14 do Código de Ética da Advocacia dispõe: “Art. 14. A revogação do mandato judicial por vontade do cliente não o desobriga do pagamento das verbas honorárias contratadas, bem como não retira o direito do advogado de receber o quanto lhe seja devido em eventual verba honorária de sucumbência, calculada proporcionalmente, em face do serviço efetivamente prestado”. Como exposto, a rescisão do contrato de prestação de serviços advocatícios se deu pela parte ré e ainda não houve remuneração pelo serviço prestado pelo autor. Portanto, incabível a contratante, ora ré, se beneficiar do serviço prestado sem qualquer onerosidade. Para a hipótese de rescisão contratual antecipada, tem-se admitido a relativização da regra contratual de sucumbência, a fim de evitar o locupletamento indevido. Se prevalecer a regra originariamente pactuado, haverá afronta aos princípios da boa-fé objetiva, função social do contrato e locupletamento ilícito. Afinal, o contrato foi rescindido unilateralmente pela ré, impedindo o autor de atuar no feito, de modo a alcançar os melhores resultados. Portanto, em que pese o pactuado entre as partes, de que o autor seria remunerado somente ao final da demanda patrocinada por ele, o arbitramento dos honorários aqui não fere o pactuado, haja vista que a rescisão de forma unilateral o impediu do recebimento da remuneração sobre eventuais valores obtidos no processo de execução. Também impediu o autor de atuar para o implemento das condições favoráveis ao bom deslinde das cobranças/execuções, devendo neste caso o cliente assumir o ônus de remunerar o advogado, sob pena de enriquecimento ilícito do contratante. Assim, uma vez prestados os serviços advocatícios e, ainda que pactuado somente o recebimento ao final da execução, a contratante deverá remunerar o profissional contratado de forma proporcional aos serviços prestados até a data da rescisão do contrato, que se deu de forma unilateral pela ré, quando ainda estiver em trâmite o processo patrocinado pelo causídico. Entendimento diverso privilegiaria o enriquecimento sem causa da ré, pois não realizou a contraprestação pelos serviços prestados pelo autor. O Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento pacífico de que o rompimento do contrato de prestação de serviços pelo cliente, impedindo o advogado de patrocinar a causa até o fim, impõe-se o arbitramento de honorários, na proporção dos serviços prestados. Nesse sentido: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. RESOLUÇÃO CULPOSA. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. INDENIZAÇÃO. AÇÃO AUTÔNOMA. EX-CLIENTE. ATUAÇÃO EM PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. REMUNERAÇÃO DEVIDA. DECISÃO MANTIDA. [...] 2. Quando a revogação do mandato ocorre por iniciativa do constituinte (mandante), é facultado ao advogado mandatário propor ação de arbitramento judicial dos honorários advocatícios contratuais, ainda que avençados sob a cláusula ad exitum. Precedentes do STJ. 2.1. É devido o pagamento da remuneração do profissional pela atuação em processo administrativo fiscal, em quantum a ser apurado na fase de liquidação de sentença. 3. "O pedido é aquilo que se pretende com a instauração da demanda e se extrai a partir de uma interpretação lógico-sistemática do afirmado na petição inicial, recolhendo todos os requerimentos feitos em seu corpo, e não só aqueles constantes em capítulo especial ou sob a rubrica 'dos pedidos'" (REsp 120.299/ES, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 25/06/1998, DJ 21/09/1998, p. 173). Precedentes do STJ. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ, AgInt nos EDcl no REsp n. 1.840.754/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 3/5/2022, DJe de 6/5/2022.). “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. JULGAMENTO DA CAUSA POR DECISÃO MONOCRÁTICA. CABIMENTO. 2. SÚMULAS 5 E 7/STJ. NÃO INCIDÊNCIA. 3. APLICAÇÃO DA SÚMULA 284/STF. DESCABIMENTO. 4. CONTRATO COM CLÁUSULA DE ÊXITO. ROMPIMENTO INJUSTIFICADO PELO CONTRATANTE. ARBITRAMENTO JUDICIAL PELO TRABALHO REALIZADO ATÉ A DATA DA RESCISÃO UNILATERAL. POSSIBILIDADE. 5. FIXAÇÃO DO QUANTUM DIRETAMENTE POR ESTA CORTE SUPERIOR. DESCABIMENTO. 6. NECESSIDADE DE RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM COM VISTAS À APURAÇÃO DO VALOR DEVIDO. 7. RECURSO DESPROVIDO. [...] 4. É pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que, revogado imotivadamente o mandato judicial que seria remunerado pela sucumbência da outra parte (contrato de risco), é cabível o ajuizamento da ação de arbitramento para cobrar os honorários, de forma proporcional aos serviços até então prestados. Precedentes. 5. Embora afastada a necessidade de espera do recebimento dos créditos pendentes, e, consequentemente, do êxito em cada ação proposta, como requisito para o pagamento dos honorários contratados, não há nos autos elementos que possam autorizar a fixação do valor devido a esse título diretamente por esta Corte Superior, mormente pela necessidade de interpretação de cláusulas do contrato de prestação de serviços de assessoria jurídica entabulado entre as partes, o qual prevê uma diversidade de situações com critérios distintos para remunerar a atuação dos profissionais, a depender da natureza ou da fase em que se encontra o processo, se de conhecimento ou de liquidação. 6. Por isso, faz-se necessária a cassação do acórdão recorrido, com a determinação de retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que, mediante a análise dos documentos juntados ao processo, arbitre, como entender de direito, os honorários devidos pelo trabalho desempenhado pelos advogados ora recorridos, ou, caso repute indispensável, que determine a produção de provas para viabilizar esse arbitramento. 7. Agravo interno do Unibanco-União de Bancos Brasileiros S.A. desprovido. (STJ, AgInt no AREsp n. 703.889/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 19/10/2020, DJe de 26/10/2020.). O mesmo posicionamento tem o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, conforme ementas que transcrevo: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS – PRELIMINAR –CERCEAMENTO DE DEFESA – REJEITADA – CONTRATO VERBAL – PATROCÍNIO POR 09 ANOS – DESISTÊNCIA DA AÇÃO PARA ADESÃO À PROGRAMA DE REGULARIZAÇÃO TRIBUTÁRIA RURAL – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS INCONTROVERSA – ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS – POSSIBILIDADE – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SOBRE O PROVEITO ECONÔMICO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Quando desnecessária ao deslinde da demanda a não produção de provas requestadas não ensejam cerceamento de defesa, se destacando que cabe ao magistrado dirigir a instrução e deferir a produção probatória que entender necessária à formação do seu convencimento. “No caso, ainda que a formalização do contrato de honorários advocatícios seja nula, o certo é que houve, de forma incontroversa, a efetiva prestação dos serviços pelos causídicos, fazendo jus a remuneração contratada ou, inexistindo contratação, àquela que vier a ser arbitrada. É plenamente possível o arbitramento de honorários advocatícios, sob o fundamento dos princípios da razoabilidade, boa-fé contratual, função social do contrato e da vedação do locupletamento sem causa, em razão do trabalho desempenhado pelo causídico, até o momento de sua destituição, nos casos em que o contrato de remuneração por êxito, ainda que verbal, é rescindido unilateralmente sem justa causa pelo contratante. O valor arbitrado a título de honorários advocatícios deve estar de acordo com o trabalho desempenhado pelo patrono, respeitando o grau de zelo do profissional; o lugar da prestação do serviço; a natureza e importância da causa; o trabalho realizado pelo advogado, bem como o tempo exigido para o seu serviço. No caso de ação de arbitramento de honorários advocatícios, os juros de mora incidem a partir da citação e a correção monetária a contar do arbitramento. (TJ-MT 10142961120178110041 MT, Relator.: CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Data de Julgamento: 17/03/2021, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/03/2021)” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1006977-33.2022 .8.11.0003, Relator: NÃO INFORMADO, Data de Julgamento: 12/03/2024, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/03/2024). “AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL – INÉPCIA DA INICIAL – JULGAMENTO EXTRA PETITA – PRELIMINARES REJEITADAS – RESCISÃO SEM JUSTA CAUSA – PREVISÃO DE REMUNERAÇÃO POR ÊXITO – REDUÇÃO DO VALOR FIXADO DE ACORDO COM O TRABALHO DESEMPENHADO PELO CAUSÍDICO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO E RECURSO PREJUDICADO. Este Tribunal tem entendimento pacífico no sentido de que o interesse processual nasce no momento em que a parte tem necessidade de ir a juízo para atingir a tutela pretendida e, ainda, quando esta tutela jurisdicional lhe traz alguma utilidade do ponto de vista prático. Na espécie, a exordial permitiu a avaliação do pedido e possibilitou a defesa e o contraditório, não devendo ser considerada inepta. In casu, o pedido é certo e determinado, qual seja, o arbitramento dos honorários pelo trabalho desenvolvido, decorrente da rescisão antecipada do contrato de prestação de serviços com previsão de remuneração por êxito, inexistindo na inicial pedido de honorários de sucumbência, tendo a r. sentença se limitado a analisar o pedido constante na inicial. É plenamente possível o arbitramento de honorários advocatícios, sob o fundamento dos princípios da razoabilidade, boa-fé contratual, função social do contrato e da vedação do locupletamento sem causa, em razão do trabalho desempenhado pelo causídico, até o momento de sua destituição, nos casos em que o contrato de remuneração por êxito é rescindido unilateralmente sem justa causa pelo contratante. Nas hipóteses de ação de arbitramento de honorários não se aplica a regra de percentual sobre o valor da causa ou condenação disposta no § 2º, do art. 85, do CPC, devendo o magistrado se ater aos critérios qualitativos do causídico durante a sua participação no feito, a fim de arbitrar os honorários de forma justa, razoável e proporcional, o que não se observou na espécie, razão pela qual a sua redução é medida que se impõe.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10317043920228110041, Relator.: CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Data de Julgamento: 26/06/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/06/2024) Demonstrada a possibilidade de arbitramento de honorários advocatícios, passo a análise do quantum a ser arbitrado. O magistrado não está vinculado a tabela da entidade de classe para o arbitramento dos honorários, devendo se ater à complexidade dos serviços prestados, valor econômico, assim como o zelo dispensado pelo profissional. Nesse sentido: “RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PERÍCIA TÉCNICA. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO DO JUIZ, QUE DEVE PREVALECER. 1. A jurisprudência desta Corte já sinalizou que para efeito de arbitramento de verba honorária contratual, deve o magistrado, em observância aos critérios de apuração da complexidade do trabalho desenvolvido pelo profissional e do valor econômico da questão, fixar remuneração com eles compatível. [...]. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg no Ag 1206781/MG, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 28/09/2010, DJe 14/10/2010). “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TABELA DA OAB. NATUREZA ORIENTADORA, E NÃO VINCULATIVA. ANÁLISE EQUITATIVA DO JUIZ. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. "Conflito aparente de normas em que figura de um lado o princípio do livre convencimento motivado do juiz e de outro, dispositivo da Lei 8.906/94, que vincula o valor da atividade contratada à tabela editada pela seccional da OAB, devendo prevalecer, naturalmente, o princípio que rege a sistemática processual brasileira, também prestigiado na norma que está a merecer modulação." [REsp 799.230/RS, Rel. Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS), Terceira Turma, julgado em 10/11/2009, DJe de 1º/12/2009] 2. O reexame dos critérios fáticos, sopesados de forma equitativa e levados em consideração pelas instâncias ordinárias para fixar os honorários advocatícios, em princípio, é inviável em sede de recurso especial (enunciado sumular n. 7 do STJ), salvo em situações em que o valor arbitrado, a considerar as peculiaridades do caso, encerre flagrante irrisoriedade ou exorbitância, o que não se evidencia no caso concreto. 3. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no REsp 1098034/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 19/11/2013, DJe 26/11/2013). O autor passou a patrocinar a defesa da ré com o protocolo da petição inicial da execução extrajudicial n°. 0019679-70.2006.8.11.0041, em trâmite junto à 5ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, cujo valor da causa era de R$ 102.526,25 (cento e dois mil, quinhentos e vinte e seis reais e vinte e cinco centavos), em 19/10/2006 (ID. 85579366, pág. 06), bem como deu impulsionando no feito sempre que necessário, como se vê dos documentos que acompanham a exordial. Levando-se em consideração os serviços prestados e o lapso de tempo (13 anos), a natureza da ação e o momento em que ocorreu a rescisão, a procedência da ação se impõe, para arbitramento dos honorários em R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Com estes fundamentos, nos termos do art. 487, I do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO esta ação de arbitramento de honorários advocatícios proposta por Jatabairu Francisco Nunes em face de Reical Indústria e Comércio de Calcário LTDA, para condená-la ao pagamento de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), acrescido de juros e correção monetária pela taxa SELIC até a vigência da Lei n°. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e SELIC para juros, abatido desta o valor do IPCA, a partir da citação e do arbitramento, respectivamente. Condeno a ré nas custas e despesas processuais, bem como nos honorários advocatícios em 10% do valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º do CPC. Transitado em julgado, arquive-se com as cautelas legais. P.I. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Ana Paula da Veiga Carlota Miranda Juíza de Direito em substituição legal

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Processo nº 1041622-67.2022.8.11.0041

ID: 300459889

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1041622-67.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1041622-67.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Práticas Abusivas, Obrigação de Fazer / Não Fa… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1041622-67.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Práticas Abusivas, Obrigação de Fazer / Não Fazer, Tratamento médico-hospitalar] Relator: Des(a). DIRCEU DOS SANTOS Turma Julgadora: [DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA] Parte(s): [UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (APELANTE), JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), A. B. A. R. - CPF: 086.685.051-14 (APELADO), ELENE CRISTINA MARTINS DE ALMEIDA - CPF: 029.749.741-39 (ADVOGADO), LUCAS REMES RAMALHO BARBOSA - CPF: 020.288.711-13 (APELADO), LUCAS REMES RAMALHO BARBOSA - CPF: 020.288.711-13 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – TRATAMENTO EM HOME CARE – INCIDÊNCIA DO CDC – DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE E URGÊNCIA – RISCO À SAÚDE – DESDOBRAMENTO DO TRATAMENTO HOSPITALAR – NEGATIVA DE COBERTURA – CLÁUSULA CONTRATUAL ABUSIVA – ART. 51, § 1º, INCISO II, DO CDC – INDICAÇÃO FEITA POR PROFISSIONAL ESPECIALISTA – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM MANTIDO – PRECEDENTES DO STJ – CONFORMIDADE COM PARECER MINISTERIAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Compete ao médico de confiança do paciente, profissional habilitado e civilmente responsável por sua conduta e escolhas, a indicação do melhor tratamento para reabilitação do enfermo, não podendo a operadora de planos de saúde escolher qual tratamento médico dará efetiva cobertura. Registrada a necessidade de continuidade do tratamento em âmbito domiciliar (Home Care), é de direito o seu custeio pela operadora de planos de saúde, na medida em que se constitui em desdobramento do tratamento hospitalar contratualmente previsto, sendo descabida sua limitação. Segundo a jurisprudência do c, STJ, é abusiva a cláusula contratual que importe em vedação da internação domiciliar como alternativa de substituição à hospitalar, visto que se revela incompatível com a boa-fé ou a equidade, colocando o usuário (consumidor) em situação de desvantagem exagerada (art. 51, IV, da Lei nº 8.078/1990). É dever do plano de saúde fornecer o procedimento médico prescrito por médico cooperado e que acompanha o caso da paciente, pois cabe àquele definir qual é o melhor tratamento para o segurado (TJMT. AI 65686/2015). Nas hipóteses em que há recusa indevida de realização de procedimento e/ou fornecimento de medicamento por parte da operadora do plano de saúde para tratamento do segurado, como ocorrido no presente caso, a jurisprudência do STJ é assente quanto à caracterização de dano moral, não se tratando apenas de mero aborrecimento. (STJ - AgRg no REsp 1014906/MA). No que se refere à quantificação dos danos morais, sabe-se que o valor deve ser fixado de acordo com a extensão do dano, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação cível interposta por UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, visando reformar a sentença de proferida pelo Juízo da 11ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização Por Danos Morais nº 041622-67.2022.811.0041, movida por A.B.A.R., representado por seu genitor LUCAS REMES RAMALHO BARBOSA, julgou procedente os pedidos aduzidos na inicial, para: “a. Tornar definitiva a tutela de urgência parcialmente concedida; b. Condenar a parte requerida ao pagamento do valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) à parte autora, a título de indenização por danos morais, acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação, e correção monetária pelo índice INPC, a partir da data desta sentença; c. Condenar o requerido ao pagamento da indenização por danos materiais no valor de R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais) acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da data do evento danoso, (artigo 398 do CC e súmula 54 do STJ), e correção monetária pelo INPC a da data do efetivo prejuízo, in causa, 14/12/2003 (súmula 43 do STJ). d. Condenar a parte requerida ao pagamento de custas e honorários advocatícios, que fixo em 15% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º do Código de Processo Civil.”. Em suas razões de ID 271207426 a apelante aduz que o tratamento reclamado nos autos (Home Care) foi fornecido por sua mera liberalidade, pois não há cobertura contratual das órteses e insumos solicitados. Alega que o CNJ recomenda a obrigatoriedade da observância do rol de procedimentos e eventos em saúde listados pela ANS. Defende a validade das cláusulas contratuais estipuladas entre as partes e que é necessário o equilíbrio atuarial da atividade. Sustenta que inexistem danos morais passíveis de indenização no caso em análise e que o quantum fixado em primeiro grau se deu em quantia exagerada. Requer, ao final, o provimento do seu recurso para ser julgada totalmente improcedente a pretensão da apelada, subsidiariamente pede a redução do quantum indenizatório arbitrados a título de danos morais. Contrarrazões foram devidamente apresentadas (id. 271207430). A douta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer emanado pelo Dr. Marcelo Ferra de Carvalho, opinou pelo desprovimento do recurso (id. 281156890). Eis os relatos necessários. Peço dia para julgamento. Des. DIRCEU DOS SANTOS RELATOR V O T O R E L A T O R Eminentes pares. Conforme os laudos médicos acostados nos ids. 271205994 e 271207355, em especial o assinalado pela Dra. Viviane Cabral Quixabeira (Neurologista Infantil), atestam que o menor recorrido, foi acometida por “paralisia cerebral do tipo tetraplegia espástica e epilepsia, secundária as sequelas de afogamento”, o que vem lhe causando distúrbio do sono, atraso na fala, alterações sensoriais e crises epilépticas, apresentando disfagia grave e fazendo uso de via alternativa de alimentação (gastrostomia). Embora exigente de tratamento multidisciplinar prescrito pelos médicos, bem como diversos medicamentos, plano terapêutico, entre outros tipos de insumos, tais como fraldas, alimentação enteral, os profissionais que a assistem fazem-lhe visitas programadas pela própria equipe. É apontado ainda que o menor “deve ser atendido pelo sistema de home care, pois é totalmente dependente para realizar todas as suas atividades diárias, com necessidade de troca de decúbito de forma constante, auxilio na troca de fralda, higiene e recebe alimentação via gastrostomia.” (id. 271205994). Pois bem. Tem-se que a relação jurídica travada entre as partes, a toda evidência, sujeita-se às regras dispostas pelo Código de Defesa do Consumidor, pois há a figura do consumidor e do fornecedor denominados pelos artigos 2º e 3º da Lei Consumerista. Tem-se, ainda, o teor da Súmula nº 469 do STJ a qual aduz que “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde.”. Por sua vez o artigo 35-G da Lei nº 9.656/98, prevê que “Aplicam-se subsidiariamente aos contratos entre usuários e operadoras de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei as disposições da Lei no 8.078, de 1990.”. Incontroverso nos autos que a parte autora se viu obrigada a buscar o Judiciário para receber o tratamento médico que detém o direito por contrato válido mantido entre as partes. É imperioso recordar que o contrato de plano de saúde se define pela transferência onerosa e contratual de riscos futuros à saúde do contratante e seus dependentes, mediante a prestação de assistência médico-hospitalar por meio de entidades conveniadas, estipulando a administradora um prêmio a ser pago mensalmente pelo beneficiário, que receberá em troca assistência médica de que vier a necessitar. Considerando a relevância do direito constitucional/fundamental envolvido, têm as administradoras de planos de saúde o dever de agir com boa-fé, tanto na elaboração, quanto na execução do contrato, preservando-se a dignidade, a saúde, a segurança e a proteção dos interesses econômicos do beneficiário, em face da presunção legal de sua vulnerabilidade. Por outro lado, a interpretação sobre a cobertura, ou não, de determinado procedimento pela administradora do plano de saúde deve ser realizada à luz do CDC, consoante artigo 3º daquele diploma legal, sendo seus usuários considerados consumidores para todos os fins de direito. Nesse sentido são as lições de Cláudia Lima Marques: “Apesar de a Lei 9.656/98, na sua versão atual, nominar os antigos contratos de seguro-saúde como planos privados de assistência à saúde, indiscutível que tanto os antigos contratos de seguro-saúde, os atuais planos de saúde, como os, também comuns, contratos de assistência médica possuem características e sobretudo uma finalidade em comum: o tratamento e a segurança contra os riscos envolvendo a saúde do consumidor e de sua família ou dependentes. Mencione-se, assim, com o eminente Professor e Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, que: 'dúvida não pode haver quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor sobre os serviços prestados pelas empresas de medicina em grupo, de prestação especializada em seguro-saúde. A forma jurídica que pode revestir esta categoria de serviços ao consumidor, portanto, não desqualifica a incidência do Código do Consumidor. O reconhecimento da aplicação do Código do Consumidor implica subordinar os contratos aos direitos básicos do consumidor, previstos no art. 6º do Código (...)” (Contrato no Código de Defesa do Consumidor - O novo regime das relações contratuais, 4ª ed., Revista dos Tribunais, p. 399) Compulsando os autos verifico o descabimento da tese da recorrente de que o serviço home care estaria expressamente excluído do contrato de seguro de saúde que rege a relação dos litigantes. O serviço home care não é um simples tratamento domiciliar, ele se assemelha à internação hospitalar, pois o paciente recebe todos os cuidados fundamentais à sua recuperação, tal como se naquele ambiente estivesse. Esse tipo de tratamento apresenta-se como uma alternativa para a diminuição dos custos a serem suportados pela cooperativa, se comparado com a internação hospitalar, além de beneficiar o paciente com a diminuição do risco de infecção. Assim, havendo indicação médica de que a internação domiciliar é a mais adequada, deve ser deferida. Dada a particularidade do home care dentre os tipos de tratamento domiciliar, tem-se que, a priori, o dispositivo contratual indicado pela apelante não atende ao comando do art. 54, § 4º, do CDC. Ademais, o c. STJ firmou o entendimento de que o plano de saúde pode especificar a abrangência da cobertura, mas não o tipo de tratamento a ser utilizado, por comprometer a própria essência do negócio jurídico, que é a manutenção da saúde. A propósito: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. (...) TRATAMENTO HOME CARE. RECUSA INDEVIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 3. De acordo com a orientação jurisprudencial do STJ, o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de tratamento utilizado para a cura de cada uma, sendo abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento domiciliar quando essencial para garantir a saúde ou a vida do segurado. 4. Agravo regimental não provido.” (AgRg no Ag nº. 1.325.939/DF, 4ª Turma/STJ, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 03.04.2014, DJe de 09.05.2014) (grifo nosso) Na Corte Superior também é pacífico o entendimento de ser ilegítima a negativa de internação domiciliar em situação de urgência, se o plano de saúde dispõe de equipe especializada para tanto (AREsp nº. 253.329/RS, publicado em 19/09/2014; AREsp nº. 569151/SP, publicado em 12.09.2014; REsp nº 1.402.179/PE, publicado em 11.09.2014; REsp nº. 1.459.549/PB, publicado em 09.09.2014, todos em decisão monocrática). Outrossim, em detida análise, eis de observar que a cláusula invocada pela parte apelante é abusiva. Ocorre que a referida cláusula, desconfigura o contrato firmado entre as partes, pois a obrigação da operadora é prestar assistência médica aos beneficiários, dando-lhe a cobertura de tratamento para eventuais patologias e ferimentos que ocorrer no futuro, sendo abusivo limitar os meios necessários para o restabelecimento da saúde do paciente. Em outras palavras, se há cobertura para patologia do paciente, deverá haver cobertura para o tratamento recomendado pelo médico especialista. Sobre o tema, o c. Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado no sentido de que a limitação de cobertura em contratos de plano de saúde não pode ser arbitrária e alheia ao postulado da boa-fé objetiva. Ainda segundo a jurisprudência do c. STJ, a cláusula contratual que importe em vedação da internação domiciliar como alternativa de substituição à internação hospitalar é incompatível com a boa-fé ou a equidade, enquadrando-se no disposto do art. 51, inciso IV, do CDC, in verbis: “Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...) IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade; Confira-se: “RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. INTERNAÇÃO HOSPITALAR. CONVERSÃO EM ATENDIMENTO MÉDICO DOMICILIAR. POSSIBILIDADE. SERVIÇO DE HOME CARE. CLÁUSULA CONTRATUAL OBSTATIVA. ABUSIVIDADE. SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DO TRATAMENTO. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. AGRAVAMENTO DAS PATOLOGIAS. GRANDE AFLIÇÃO PSICOLÓGICA. 1. Ação ordinária que visa a continuidade e a prestação integral de serviço assistencial médico em domicílio (serviço home care 24 horas), a ser custeado pelo plano de saúde bem como a condenação por danos morais. 2. Apesar de os planos e seguros privados de assistência à saúde serem regidos pela Lei nº 9.656/1998, as operadoras da área que prestam serviços remunerados à população enquadram-se no conceito de fornecedor, existindo, pois, relação de consumo, devendo ser aplicadas também, nesses tipos contratuais, as regras do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Ambos instrumentos normativos incidem conjuntamente, sobretudo porque esses contratos, de longa duração, lidam com bens sensíveis, como a manutenção da vida. Incidência da Súmula nº 469/STJ. 3. Apesar de, na Saúde Suplementar, o tratamento médico em domicílio não ter sido incluído no rol de procedimentos mínimos ou obrigatórios que devem ser oferecidos pelos planos de saúde, é abusiva a cláusula contratual que importe em vedação da internação domiciliar como alternativa de substituição à internação hospitalar, visto que se revela incompatível com a equidade e a boa-fé, colocando o usuário (consumidor) em situação de desvantagem exagerada (art. 51, IV, da Lei nº 8.078/1990). Precedentes. 4. O serviço de saúde domiciliar não só se destaca por atenuar o atual modelo hospitalocêntrico, trazendo mais benefícios ao paciente, pois terá tratamento humanizado junto da família e no lar, aumentando as chances e o tempo de recuperação, sofrendo menores riscos de reinternações e de contrair infecções e doenças hospitalares, mas também, em muitos casos, é mais vantajoso para o plano de saúde, já que há a otimização de leitos hospitalares e a redução de custos: diminuição de gastos com pessoal, alimentação, lavanderia, hospedagem (diárias) e outros. 5. Na ausência de regras contratuais que disciplinem a utilização do serviço, a internação domiciliar pode ser obtida como conversão da internação hospitalar. Assim, para tanto, há a necessidade (i) de haver condições estruturais da residência, (ii) de real necessidade do atendimento domiciliar, com verificação do quadro clínico do paciente, (iii) da indicação do médico assistente, (iv) da solicitação da família, (v) da concordância do paciente e (vi) da não afetação do equilíbrio contratual, como nas hipóteses em que o custo do atendimento domiciliar por dia não supera o custo diário em hospital. 6. A prestação deficiente do serviço de home care ou a sua interrupção sem prévia aprovação ou recomendação médica, ou, ainda, sem a disponibilização da reinternação em hospital, gera dano moral, visto que submete o usuário em condições precárias de saúde à situação de grande aflição psicológica e tormento interior, que ultrapassa o mero dissabor, sendo inidônea a alegação de mera liberalidade em seu fornecimento. 7. Recurso especial não provido.” (Recurso Especial nº 1537301/RJ, relator o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 18/08/2015, DJe de 23/10/2015) (grifo nosso) Certo que o contrato de seguro/saúde está amparado pela boa-fé, presente nos artigos 4°, III, e 51, IV, do CDC e na cláusula geral do art. 422 do CC, tendo ainda, um artigo próprio no Código Civil no qual está explícita a boa-fé exigida nesta espécie contratual. Dispõe o art. 765 do Código Civil: “O segurado e segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.” A boa-fé acima referida é a objetiva, ou seja, a exigência de comportamento legal e honesto entre as partes contratantes, de modo a preservar as legítimas expectativas geradas pelo contrato. Assim, ao firmar um contrato de assistência de saúde, o consumidor visa à tranquilidade e segurança de um bom atendimento, na medida em que Poder Público, infelizmente, deixa a desejar no seu dever de garantir a saúde de seus cidadãos. Note-se, por oportuno, que o objetivo do consumidor é o de se proteger contra certas patologias, independentemente do procedimento médico, enquanto a operadora de plano de saúde se obriga a indenizar o segurado pelos custos com o tratamento. Outrossim, no caso dos autos, o tratamento domiciliar nada mais é que um desdobramento do tratamento hospitalar, cuja cobertura contratual sequer é discutida nos autos. Se a parte autora estivesse internada em um hospital, recebendo idêntico tratamento àquele ministrado em sua residência, viria a operadora de planos de saúde se negar a custeá-lo? De mais a mais, a parte autora teve que recorrer ao judiciário para iniciar e manter o atendimento indicado por médico especialista, desse modo, resta evidenciado o nexo de causalidade entre a conduta da Unimed em recusar a cobertura do tratamento médico especializado e o resultado suportado pela paciente, com transtorno, angústia e abalo psicológico de grande monta, inclusive pela urgência do tratamento. E neste particular, não há como deixar de reconhecer o sofrimento moral experimentado, que decorre da aflição e da angústia pela negativa indevida do tratamento médico necessário ao restabelecimento e/ou manutenção do quadro clínico de saúde. O c. STJ tem posicionamento uníssono nesse sentido, in verbis: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA INJUSTIFICADA. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO DE URGÊNCIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. VALOR INDENIZATÓRIO. FIXAÇÃO COM RAZOABILIDADE. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. Conforme entendimento adotado pela jurisprudência deste Tribunal Superior, a recusa injustificada de autorização para realização de cirurgia de urgência em período de carência ou feita por médico ou hospital não credenciados constitui falha na prestação do serviço, caracterizando o dano moral, não havendo que se falar em mero aborrecimento por inadimplemento contratual. 2. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a redução do valor da indenização por danos morais somente é permitida quando a quantia estipulada for exorbitante, o que não se configura na presente hipótese. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ - AgInt no AREsp 891.445/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/09/2016, DJe 22/09/2016) (grifo nosso) “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO A PACIENTE COM ANEURISMA CEREBRAL. DANO MORAL. RECUSA INDEVIDA E INJUSTIFICADA. CARACTERIZAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO. INVIABILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nas hipóteses em que há recusa indevida de realização de procedimento e/ou fornecimento de medicamento por parte da operadora do plano de saúde para tratamento do segurado, como ocorrido no presente caso, a jurisprudência do STJ é assente quanto à caracterização de dano moral, não se tratando apenas de mero aborrecimento. 2. Somente é possível a revisão do montante da indenização a título de danos morais nas hipóteses em que o quantum fixado na origem for exorbitante ou irrisório, o que, no entanto, não ocorreu no caso em exame. Isso, porque a indenização, arbitrada em R$ 20.000,00, não é exorbitante nem desproporcional aos danos sofridos pela recorrida, que teve negado indevidamente o fornecimento de material essencial à realização de procedimento cirúrgico e de medicamento para tratar enfermidade grave, qual seja, aneurisma cerebral. 3. Agravo interno não provido.” (STJ - AgRg no REsp 1014906/MA, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 03/05/2016, DJe 13/05/2016) (grifo nosso) No que se refere à quantificação, cuja minoração é pretendida no apelo, sabe-se que o valor deve ser fixado de acordo com a extensão do dano, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. E, nesse aspecto, o Des. Carlos Alberto Alves da Rocha em julgamento de recurso submetido à apreciação desta c. Câmara, assim ressaltou: “O dano moral por si só não requer prova, até porque sua exigência descaracterizaria seu propósito que é o de ressarcir aquilo que não é material e por isso também não pode ter valor categoricamente estipulado. No que se refere ao quantum fixado, é de se ressaltar que não existe uma tabela precisa onde há valores pré-fixados para cada tipo de dano moral, mormente pelo fato de este ser imensurável. Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação, observando os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito a vítima, ao mesmo tempo o valor deve ser significativo para que não passe despercebido coibindo a conduta negligente do agente. Não é demais ressaltar, que o valor indenizatório devido no dano moral tem dupla função: compensatória em relação ao dano sofrido e penalizadora pela conduta negligente do agente causador. (AC nº. 17843/2011, 3ª Câmara de Direito Privado, TJ/MT, publicado em 11/08/2011). Outro precedente: Ap, 157706/2014, DES.CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, QUINTA CÂMARA CÍVEL, Data do Julgamento 25/02/2015. Justamente, em razão dessas observações é que o c. STJ firmou o entendimento no sentido de que o valor estabelecido para os danos morais só pode ser revisto quando se mostrar irrisório ou exorbitante a ponto de ferir os princípios da razoabilidade e proporcionalidade (AgInt no AREsp nº. 1025364/SP, 4ª Turma/STJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 17/08/2017). Neste sentido, tenho que os fundamentos da sentença são contundentes e não há argumentos capazes de desconstituir as teses ali esposadas, devendo ser mantida a condenação moral imposta no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), já que razoável e proporcional às particularidades do caso, que além de não causar enriquecimento indevido da parte recompensada ou onerar demasiadamente o ofensor, se afigura condizente com os valores atualmente aplicados pelos Tribunais. Dispositivo. Com estas considerações, em consonância com o parecer ministerial, conheço do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO. Majoro os honorários advocatícios para 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 11/06/2025

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Processo nº 1041622-67.2022.8.11.0041

ID: 300459904

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1041622-67.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

A. B. A. R.

Acórdão

Advogados:

ELENE CRISTINA MARTINS DE ALMEIDA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1041622-67.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Práticas Abusivas, Obrigação de Fazer / Não Fa… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1041622-67.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Práticas Abusivas, Obrigação de Fazer / Não Fazer, Tratamento médico-hospitalar] Relator: Des(a). DIRCEU DOS SANTOS Turma Julgadora: [DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA] Parte(s): [UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (APELANTE), JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), A. B. A. R. - CPF: 086.685.051-14 (APELADO), ELENE CRISTINA MARTINS DE ALMEIDA - CPF: 029.749.741-39 (ADVOGADO), LUCAS REMES RAMALHO BARBOSA - CPF: 020.288.711-13 (APELADO), LUCAS REMES RAMALHO BARBOSA - CPF: 020.288.711-13 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – TRATAMENTO EM HOME CARE – INCIDÊNCIA DO CDC – DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE E URGÊNCIA – RISCO À SAÚDE – DESDOBRAMENTO DO TRATAMENTO HOSPITALAR – NEGATIVA DE COBERTURA – CLÁUSULA CONTRATUAL ABUSIVA – ART. 51, § 1º, INCISO II, DO CDC – INDICAÇÃO FEITA POR PROFISSIONAL ESPECIALISTA – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM MANTIDO – PRECEDENTES DO STJ – CONFORMIDADE COM PARECER MINISTERIAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Compete ao médico de confiança do paciente, profissional habilitado e civilmente responsável por sua conduta e escolhas, a indicação do melhor tratamento para reabilitação do enfermo, não podendo a operadora de planos de saúde escolher qual tratamento médico dará efetiva cobertura. Registrada a necessidade de continuidade do tratamento em âmbito domiciliar (Home Care), é de direito o seu custeio pela operadora de planos de saúde, na medida em que se constitui em desdobramento do tratamento hospitalar contratualmente previsto, sendo descabida sua limitação. Segundo a jurisprudência do c, STJ, é abusiva a cláusula contratual que importe em vedação da internação domiciliar como alternativa de substituição à hospitalar, visto que se revela incompatível com a boa-fé ou a equidade, colocando o usuário (consumidor) em situação de desvantagem exagerada (art. 51, IV, da Lei nº 8.078/1990). É dever do plano de saúde fornecer o procedimento médico prescrito por médico cooperado e que acompanha o caso da paciente, pois cabe àquele definir qual é o melhor tratamento para o segurado (TJMT. AI 65686/2015). Nas hipóteses em que há recusa indevida de realização de procedimento e/ou fornecimento de medicamento por parte da operadora do plano de saúde para tratamento do segurado, como ocorrido no presente caso, a jurisprudência do STJ é assente quanto à caracterização de dano moral, não se tratando apenas de mero aborrecimento. (STJ - AgRg no REsp 1014906/MA). No que se refere à quantificação dos danos morais, sabe-se que o valor deve ser fixado de acordo com a extensão do dano, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação cível interposta por UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, visando reformar a sentença de proferida pelo Juízo da 11ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização Por Danos Morais nº 041622-67.2022.811.0041, movida por A.B.A.R., representado por seu genitor LUCAS REMES RAMALHO BARBOSA, julgou procedente os pedidos aduzidos na inicial, para: “a. Tornar definitiva a tutela de urgência parcialmente concedida; b. Condenar a parte requerida ao pagamento do valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) à parte autora, a título de indenização por danos morais, acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação, e correção monetária pelo índice INPC, a partir da data desta sentença; c. Condenar o requerido ao pagamento da indenização por danos materiais no valor de R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais) acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da data do evento danoso, (artigo 398 do CC e súmula 54 do STJ), e correção monetária pelo INPC a da data do efetivo prejuízo, in causa, 14/12/2003 (súmula 43 do STJ). d. Condenar a parte requerida ao pagamento de custas e honorários advocatícios, que fixo em 15% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º do Código de Processo Civil.”. Em suas razões de ID 271207426 a apelante aduz que o tratamento reclamado nos autos (Home Care) foi fornecido por sua mera liberalidade, pois não há cobertura contratual das órteses e insumos solicitados. Alega que o CNJ recomenda a obrigatoriedade da observância do rol de procedimentos e eventos em saúde listados pela ANS. Defende a validade das cláusulas contratuais estipuladas entre as partes e que é necessário o equilíbrio atuarial da atividade. Sustenta que inexistem danos morais passíveis de indenização no caso em análise e que o quantum fixado em primeiro grau se deu em quantia exagerada. Requer, ao final, o provimento do seu recurso para ser julgada totalmente improcedente a pretensão da apelada, subsidiariamente pede a redução do quantum indenizatório arbitrados a título de danos morais. Contrarrazões foram devidamente apresentadas (id. 271207430). A douta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer emanado pelo Dr. Marcelo Ferra de Carvalho, opinou pelo desprovimento do recurso (id. 281156890). Eis os relatos necessários. Peço dia para julgamento. Des. DIRCEU DOS SANTOS RELATOR V O T O R E L A T O R Eminentes pares. Conforme os laudos médicos acostados nos ids. 271205994 e 271207355, em especial o assinalado pela Dra. Viviane Cabral Quixabeira (Neurologista Infantil), atestam que o menor recorrido, foi acometida por “paralisia cerebral do tipo tetraplegia espástica e epilepsia, secundária as sequelas de afogamento”, o que vem lhe causando distúrbio do sono, atraso na fala, alterações sensoriais e crises epilépticas, apresentando disfagia grave e fazendo uso de via alternativa de alimentação (gastrostomia). Embora exigente de tratamento multidisciplinar prescrito pelos médicos, bem como diversos medicamentos, plano terapêutico, entre outros tipos de insumos, tais como fraldas, alimentação enteral, os profissionais que a assistem fazem-lhe visitas programadas pela própria equipe. É apontado ainda que o menor “deve ser atendido pelo sistema de home care, pois é totalmente dependente para realizar todas as suas atividades diárias, com necessidade de troca de decúbito de forma constante, auxilio na troca de fralda, higiene e recebe alimentação via gastrostomia.” (id. 271205994). Pois bem. Tem-se que a relação jurídica travada entre as partes, a toda evidência, sujeita-se às regras dispostas pelo Código de Defesa do Consumidor, pois há a figura do consumidor e do fornecedor denominados pelos artigos 2º e 3º da Lei Consumerista. Tem-se, ainda, o teor da Súmula nº 469 do STJ a qual aduz que “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde.”. Por sua vez o artigo 35-G da Lei nº 9.656/98, prevê que “Aplicam-se subsidiariamente aos contratos entre usuários e operadoras de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei as disposições da Lei no 8.078, de 1990.”. Incontroverso nos autos que a parte autora se viu obrigada a buscar o Judiciário para receber o tratamento médico que detém o direito por contrato válido mantido entre as partes. É imperioso recordar que o contrato de plano de saúde se define pela transferência onerosa e contratual de riscos futuros à saúde do contratante e seus dependentes, mediante a prestação de assistência médico-hospitalar por meio de entidades conveniadas, estipulando a administradora um prêmio a ser pago mensalmente pelo beneficiário, que receberá em troca assistência médica de que vier a necessitar. Considerando a relevância do direito constitucional/fundamental envolvido, têm as administradoras de planos de saúde o dever de agir com boa-fé, tanto na elaboração, quanto na execução do contrato, preservando-se a dignidade, a saúde, a segurança e a proteção dos interesses econômicos do beneficiário, em face da presunção legal de sua vulnerabilidade. Por outro lado, a interpretação sobre a cobertura, ou não, de determinado procedimento pela administradora do plano de saúde deve ser realizada à luz do CDC, consoante artigo 3º daquele diploma legal, sendo seus usuários considerados consumidores para todos os fins de direito. Nesse sentido são as lições de Cláudia Lima Marques: “Apesar de a Lei 9.656/98, na sua versão atual, nominar os antigos contratos de seguro-saúde como planos privados de assistência à saúde, indiscutível que tanto os antigos contratos de seguro-saúde, os atuais planos de saúde, como os, também comuns, contratos de assistência médica possuem características e sobretudo uma finalidade em comum: o tratamento e a segurança contra os riscos envolvendo a saúde do consumidor e de sua família ou dependentes. Mencione-se, assim, com o eminente Professor e Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, que: 'dúvida não pode haver quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor sobre os serviços prestados pelas empresas de medicina em grupo, de prestação especializada em seguro-saúde. A forma jurídica que pode revestir esta categoria de serviços ao consumidor, portanto, não desqualifica a incidência do Código do Consumidor. O reconhecimento da aplicação do Código do Consumidor implica subordinar os contratos aos direitos básicos do consumidor, previstos no art. 6º do Código (...)” (Contrato no Código de Defesa do Consumidor - O novo regime das relações contratuais, 4ª ed., Revista dos Tribunais, p. 399) Compulsando os autos verifico o descabimento da tese da recorrente de que o serviço home care estaria expressamente excluído do contrato de seguro de saúde que rege a relação dos litigantes. O serviço home care não é um simples tratamento domiciliar, ele se assemelha à internação hospitalar, pois o paciente recebe todos os cuidados fundamentais à sua recuperação, tal como se naquele ambiente estivesse. Esse tipo de tratamento apresenta-se como uma alternativa para a diminuição dos custos a serem suportados pela cooperativa, se comparado com a internação hospitalar, além de beneficiar o paciente com a diminuição do risco de infecção. Assim, havendo indicação médica de que a internação domiciliar é a mais adequada, deve ser deferida. Dada a particularidade do home care dentre os tipos de tratamento domiciliar, tem-se que, a priori, o dispositivo contratual indicado pela apelante não atende ao comando do art. 54, § 4º, do CDC. Ademais, o c. STJ firmou o entendimento de que o plano de saúde pode especificar a abrangência da cobertura, mas não o tipo de tratamento a ser utilizado, por comprometer a própria essência do negócio jurídico, que é a manutenção da saúde. A propósito: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. (...) TRATAMENTO HOME CARE. RECUSA INDEVIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 3. De acordo com a orientação jurisprudencial do STJ, o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de tratamento utilizado para a cura de cada uma, sendo abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento domiciliar quando essencial para garantir a saúde ou a vida do segurado. 4. Agravo regimental não provido.” (AgRg no Ag nº. 1.325.939/DF, 4ª Turma/STJ, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 03.04.2014, DJe de 09.05.2014) (grifo nosso) Na Corte Superior também é pacífico o entendimento de ser ilegítima a negativa de internação domiciliar em situação de urgência, se o plano de saúde dispõe de equipe especializada para tanto (AREsp nº. 253.329/RS, publicado em 19/09/2014; AREsp nº. 569151/SP, publicado em 12.09.2014; REsp nº 1.402.179/PE, publicado em 11.09.2014; REsp nº. 1.459.549/PB, publicado em 09.09.2014, todos em decisão monocrática). Outrossim, em detida análise, eis de observar que a cláusula invocada pela parte apelante é abusiva. Ocorre que a referida cláusula, desconfigura o contrato firmado entre as partes, pois a obrigação da operadora é prestar assistência médica aos beneficiários, dando-lhe a cobertura de tratamento para eventuais patologias e ferimentos que ocorrer no futuro, sendo abusivo limitar os meios necessários para o restabelecimento da saúde do paciente. Em outras palavras, se há cobertura para patologia do paciente, deverá haver cobertura para o tratamento recomendado pelo médico especialista. Sobre o tema, o c. Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado no sentido de que a limitação de cobertura em contratos de plano de saúde não pode ser arbitrária e alheia ao postulado da boa-fé objetiva. Ainda segundo a jurisprudência do c. STJ, a cláusula contratual que importe em vedação da internação domiciliar como alternativa de substituição à internação hospitalar é incompatível com a boa-fé ou a equidade, enquadrando-se no disposto do art. 51, inciso IV, do CDC, in verbis: “Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...) IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade; Confira-se: “RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. INTERNAÇÃO HOSPITALAR. CONVERSÃO EM ATENDIMENTO MÉDICO DOMICILIAR. POSSIBILIDADE. SERVIÇO DE HOME CARE. CLÁUSULA CONTRATUAL OBSTATIVA. ABUSIVIDADE. SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DO TRATAMENTO. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. AGRAVAMENTO DAS PATOLOGIAS. GRANDE AFLIÇÃO PSICOLÓGICA. 1. Ação ordinária que visa a continuidade e a prestação integral de serviço assistencial médico em domicílio (serviço home care 24 horas), a ser custeado pelo plano de saúde bem como a condenação por danos morais. 2. Apesar de os planos e seguros privados de assistência à saúde serem regidos pela Lei nº 9.656/1998, as operadoras da área que prestam serviços remunerados à população enquadram-se no conceito de fornecedor, existindo, pois, relação de consumo, devendo ser aplicadas também, nesses tipos contratuais, as regras do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Ambos instrumentos normativos incidem conjuntamente, sobretudo porque esses contratos, de longa duração, lidam com bens sensíveis, como a manutenção da vida. Incidência da Súmula nº 469/STJ. 3. Apesar de, na Saúde Suplementar, o tratamento médico em domicílio não ter sido incluído no rol de procedimentos mínimos ou obrigatórios que devem ser oferecidos pelos planos de saúde, é abusiva a cláusula contratual que importe em vedação da internação domiciliar como alternativa de substituição à internação hospitalar, visto que se revela incompatível com a equidade e a boa-fé, colocando o usuário (consumidor) em situação de desvantagem exagerada (art. 51, IV, da Lei nº 8.078/1990). Precedentes. 4. O serviço de saúde domiciliar não só se destaca por atenuar o atual modelo hospitalocêntrico, trazendo mais benefícios ao paciente, pois terá tratamento humanizado junto da família e no lar, aumentando as chances e o tempo de recuperação, sofrendo menores riscos de reinternações e de contrair infecções e doenças hospitalares, mas também, em muitos casos, é mais vantajoso para o plano de saúde, já que há a otimização de leitos hospitalares e a redução de custos: diminuição de gastos com pessoal, alimentação, lavanderia, hospedagem (diárias) e outros. 5. Na ausência de regras contratuais que disciplinem a utilização do serviço, a internação domiciliar pode ser obtida como conversão da internação hospitalar. Assim, para tanto, há a necessidade (i) de haver condições estruturais da residência, (ii) de real necessidade do atendimento domiciliar, com verificação do quadro clínico do paciente, (iii) da indicação do médico assistente, (iv) da solicitação da família, (v) da concordância do paciente e (vi) da não afetação do equilíbrio contratual, como nas hipóteses em que o custo do atendimento domiciliar por dia não supera o custo diário em hospital. 6. A prestação deficiente do serviço de home care ou a sua interrupção sem prévia aprovação ou recomendação médica, ou, ainda, sem a disponibilização da reinternação em hospital, gera dano moral, visto que submete o usuário em condições precárias de saúde à situação de grande aflição psicológica e tormento interior, que ultrapassa o mero dissabor, sendo inidônea a alegação de mera liberalidade em seu fornecimento. 7. Recurso especial não provido.” (Recurso Especial nº 1537301/RJ, relator o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 18/08/2015, DJe de 23/10/2015) (grifo nosso) Certo que o contrato de seguro/saúde está amparado pela boa-fé, presente nos artigos 4°, III, e 51, IV, do CDC e na cláusula geral do art. 422 do CC, tendo ainda, um artigo próprio no Código Civil no qual está explícita a boa-fé exigida nesta espécie contratual. Dispõe o art. 765 do Código Civil: “O segurado e segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.” A boa-fé acima referida é a objetiva, ou seja, a exigência de comportamento legal e honesto entre as partes contratantes, de modo a preservar as legítimas expectativas geradas pelo contrato. Assim, ao firmar um contrato de assistência de saúde, o consumidor visa à tranquilidade e segurança de um bom atendimento, na medida em que Poder Público, infelizmente, deixa a desejar no seu dever de garantir a saúde de seus cidadãos. Note-se, por oportuno, que o objetivo do consumidor é o de se proteger contra certas patologias, independentemente do procedimento médico, enquanto a operadora de plano de saúde se obriga a indenizar o segurado pelos custos com o tratamento. Outrossim, no caso dos autos, o tratamento domiciliar nada mais é que um desdobramento do tratamento hospitalar, cuja cobertura contratual sequer é discutida nos autos. Se a parte autora estivesse internada em um hospital, recebendo idêntico tratamento àquele ministrado em sua residência, viria a operadora de planos de saúde se negar a custeá-lo? De mais a mais, a parte autora teve que recorrer ao judiciário para iniciar e manter o atendimento indicado por médico especialista, desse modo, resta evidenciado o nexo de causalidade entre a conduta da Unimed em recusar a cobertura do tratamento médico especializado e o resultado suportado pela paciente, com transtorno, angústia e abalo psicológico de grande monta, inclusive pela urgência do tratamento. E neste particular, não há como deixar de reconhecer o sofrimento moral experimentado, que decorre da aflição e da angústia pela negativa indevida do tratamento médico necessário ao restabelecimento e/ou manutenção do quadro clínico de saúde. O c. STJ tem posicionamento uníssono nesse sentido, in verbis: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA INJUSTIFICADA. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO DE URGÊNCIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. VALOR INDENIZATÓRIO. FIXAÇÃO COM RAZOABILIDADE. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. Conforme entendimento adotado pela jurisprudência deste Tribunal Superior, a recusa injustificada de autorização para realização de cirurgia de urgência em período de carência ou feita por médico ou hospital não credenciados constitui falha na prestação do serviço, caracterizando o dano moral, não havendo que se falar em mero aborrecimento por inadimplemento contratual. 2. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a redução do valor da indenização por danos morais somente é permitida quando a quantia estipulada for exorbitante, o que não se configura na presente hipótese. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ - AgInt no AREsp 891.445/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/09/2016, DJe 22/09/2016) (grifo nosso) “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO A PACIENTE COM ANEURISMA CEREBRAL. DANO MORAL. RECUSA INDEVIDA E INJUSTIFICADA. CARACTERIZAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO. INVIABILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nas hipóteses em que há recusa indevida de realização de procedimento e/ou fornecimento de medicamento por parte da operadora do plano de saúde para tratamento do segurado, como ocorrido no presente caso, a jurisprudência do STJ é assente quanto à caracterização de dano moral, não se tratando apenas de mero aborrecimento. 2. Somente é possível a revisão do montante da indenização a título de danos morais nas hipóteses em que o quantum fixado na origem for exorbitante ou irrisório, o que, no entanto, não ocorreu no caso em exame. Isso, porque a indenização, arbitrada em R$ 20.000,00, não é exorbitante nem desproporcional aos danos sofridos pela recorrida, que teve negado indevidamente o fornecimento de material essencial à realização de procedimento cirúrgico e de medicamento para tratar enfermidade grave, qual seja, aneurisma cerebral. 3. Agravo interno não provido.” (STJ - AgRg no REsp 1014906/MA, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 03/05/2016, DJe 13/05/2016) (grifo nosso) No que se refere à quantificação, cuja minoração é pretendida no apelo, sabe-se que o valor deve ser fixado de acordo com a extensão do dano, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. E, nesse aspecto, o Des. Carlos Alberto Alves da Rocha em julgamento de recurso submetido à apreciação desta c. Câmara, assim ressaltou: “O dano moral por si só não requer prova, até porque sua exigência descaracterizaria seu propósito que é o de ressarcir aquilo que não é material e por isso também não pode ter valor categoricamente estipulado. No que se refere ao quantum fixado, é de se ressaltar que não existe uma tabela precisa onde há valores pré-fixados para cada tipo de dano moral, mormente pelo fato de este ser imensurável. Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação, observando os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito a vítima, ao mesmo tempo o valor deve ser significativo para que não passe despercebido coibindo a conduta negligente do agente. Não é demais ressaltar, que o valor indenizatório devido no dano moral tem dupla função: compensatória em relação ao dano sofrido e penalizadora pela conduta negligente do agente causador. (AC nº. 17843/2011, 3ª Câmara de Direito Privado, TJ/MT, publicado em 11/08/2011). Outro precedente: Ap, 157706/2014, DES.CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, QUINTA CÂMARA CÍVEL, Data do Julgamento 25/02/2015. Justamente, em razão dessas observações é que o c. STJ firmou o entendimento no sentido de que o valor estabelecido para os danos morais só pode ser revisto quando se mostrar irrisório ou exorbitante a ponto de ferir os princípios da razoabilidade e proporcionalidade (AgInt no AREsp nº. 1025364/SP, 4ª Turma/STJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 17/08/2017). Neste sentido, tenho que os fundamentos da sentença são contundentes e não há argumentos capazes de desconstituir as teses ali esposadas, devendo ser mantida a condenação moral imposta no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), já que razoável e proporcional às particularidades do caso, que além de não causar enriquecimento indevido da parte recompensada ou onerar demasiadamente o ofensor, se afigura condizente com os valores atualmente aplicados pelos Tribunais. Dispositivo. Com estas considerações, em consonância com o parecer ministerial, conheço do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO. Majoro os honorários advocatícios para 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 11/06/2025

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Francielma Da Silva e outros x Francielma Da Silva e outros

ID: 311627891

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1011547-26.2022.8.11.0015

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

FRANCIELMA DA SILVA ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS

Polo Passivo:

FRANCIELMA DA SILVA ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS

Acórdão

Advogados:

JONES EVERSON CARDOSO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PAULO EDUARDO PRADO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011547-26.2022.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Protesto Indevido de Título, Cancelamento de P… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011547-26.2022.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Protesto Indevido de Título, Cancelamento de Protesto, Efeitos] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [FRANCIELMA DA SILVA - CPF: 045.148.121-61 (APELADO), JONES EVERSON CARDOSO - CPF: 810.311.739-00 (ADVOGADO), ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS - CNPJ: 30.366.229/0001-05 (APELANTE), PAULO EDUARDO PRADO - CPF: 130.886.688-70 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELANTE), HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO - CPF: 213.647.038-82 (ADVOGADO), ESTADO DE SAO PAULO - CNPJ: 46.379.400/0001-50 (APELADO), FRANCIELMA DA SILVA - CPF: 045.148.121-61 (APELANTE), JONES EVERSON CARDOSO - CPF: 810.311.739-00 (ADVOGADO), ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS - CNPJ: 30.366.229/0001-05 (APELADO), PAULO EDUARDO PRADO - CPF: 130.886.688-70 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELADO), HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO - CPF: 213.647.038-82 (ADVOGADO), GLAUCO GOMES MADUREIRA - CPF: 223.213.118-19 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, AMBOS RECURSOS DESPROVIDOS. E M E N T A APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS - PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – CONTRATO FIRMADO MEDIANTE FRAUDE E OBJETO DE CESSÃO DE CRÉDITO – ASSINATURA DIVERGENTE A OLHO NU E DOCUMENTOS COM DADOS DIVERGENTES DA PARTE AUTORA – DESNECESSIDADE DE PROVA PERICIAL – DÉBITO QUE ENSEJOU O PROTESTO DO NOME DA CONSUMIDORA INDEVIDAMENTE - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA PARTE REQUERIDA - DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO RAZOÁVEL E PROPORCIONAL - MANUTENÇÃO DO VALOR ARBITRADO - SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS DESPROVIDOS. O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. Comprovada a fraude na celebração de contrato de financiamento de veículo em nome da autora, impõe-se a manutenção da declaração de inexistência da relação jurídica e nulidade do contrato, bem como da condenação à indenização por danos morais. O valor fixado a título de danos morais deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, não se mostrando irrisório ou exorbitante, sendo mantido quando se revela compatível com as peculiaridades do caso concreto. O recurso da parte ré não logra êxito em afastar a responsabilidade pelo evento danoso que culminou no protesto do nome da parte autora, notadamente diante da ausência de cautela quanto à regularidade da cessão do crédito e da comprovação do dano à parte autora, cuja negativação decorreu de contrato fraudulento. Recurso adesivo da parte autora que visa à majoração da indenização por danos morais. Valor fixado em consonância com os parâmetros da jurisprudência e com a extensão do dano sofrido. Sentença que não merece reparo. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1011547-26.2022.8.11.0015 APELANTES: FRANCIELMA DA SILVA E ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NAO-PADRONIZADOS APELADOS: AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A; ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS E FRANCIELMA DA SILVA RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de apelação interpostos por FRANCIELMA DA SILVA e ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NAO-PADRONIZADOS, contra sentença proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara Cível da Comarca de Sinop/MT, Dr. Cleber Luis Zeferino de Paula, lançada nos autos da Ação de Indenização por Perdas e Danos, ajuizada por FRANCIELMA DA SILVA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para declarar inexistente qualquer relação jurídica entre as partes, de modo a declarar nulo o contrato de compra e venda discutido no processo, devendo a parte requerida promover todas as baixas necessárias, inclusive eventual débito fiscal, retirando o veículo do nome da parte requerente, sob pena de multa diária de R$ 100,00 limitados a R$ 50.000,00, bem como condenou a parte requerida a pagar em favor da parte autora a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, corrigidos e com juros moratórios nas bases retro expendidas. Condenou, ainda, a parte requerida a pagar as custas e as despesas processuais, assim como honorários advocatícios da contraparte, arbitrado em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, com fulcro no artigo 85, § 2º, incisos I a IV, do Código de Processo Civil. Foram opostos embargos de declaração no Id. 285265390, sendo estes rejeitados em Id. 285265399. O apelante (Itapeva XII Multicarteira Fundo de Investimento em Direitos Creditórios – Não Padronizados) inicialmente requer que o recurso seja recebido também no seu efeito suspensivo, em razão da presença dos requisitos para tanto (fumus boni iuris e pericullum in mora). No mérito, diz que tendo a dívida origem certa e conhecida pela parte recorrida, cabível é a inscrição do seu nome nos órgãos cadastrais de inadimplentes, pois após a cessão do crédito a mesma não arcou com suas obrigações, o que tornou legítima a cobrança. Aponta que não é caso de indenização por danos morais, haja vista não ter ocorrido qualquer ato ilícito por parte do recorrente, que agiu em exercício de seu direito ao inscrever o nome da parte recorrida em órgãos de cadastro de inadimplentes, razão pela qual, pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, para julgar a presente ação totalmente improcedente, e, caso não seja este o entendimento, requer, subsidiariamente, a redução do quantum fixado a título de indenização por danos morais (Id. 285265402). A parte apelante (Francielma da Silva), alega que houve a utilização fraudulenta do nome da recorrente para aquisição de um veículo, gerando débitos fiscais junto ao Estado de São Paulo e outras pendências em cartórios, e em contrapartida, afirma que a recorrida, ao adquirir o crédito, tinha o dever de verificar a regularidade da operação, não podendo se eximir da responsabilidade sob a alegação de que apenas adquiriu o crédito de terceiro alegando que o valor fixado deve ser majorado. A par desses argumentos, pugna pelo provimento do recurso, com a reforma parcial da sentença, no sentido de majorar a indenização por danos morais para o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios conforme determinado na sentença; bem como, requer o pagamento de honorários advocatícios recursais, nos termos do artigo 85, §11, do Código de Processo Civil. A parte autora ofereceu as contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso (id. 285265407). A requerida (Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A) ofereceu as contrarrazões, impugnando a concessão da justiça gratuita, e no mérito, pugna pelo desprovimento do recurso. A requerida (Itapeva) apresentou as contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso (id. 285265414). A parte requerida efetuou o recolhimento do preparo no Id. 285265403, e a parte autora, não efetuou o recolhimento do preparo, em razão de ser beneficiária da justiça gratuita, conforme certidão acostada no Id. 286044350. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Recolhido os respectivos preparos, e estando adequados e tempestivos, CONHEÇO os apelos interpostos, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Inicialmente, a parte requerida/apelante (Itapeva XII Multicarteira Fundo de Investimento em Direitos Creditórios) pleiteia que o apelo seja recebido também pelo efeito suspensivo, em razão da presença do periculum in mora e o fumus boni iuris ensejadores para tanto. Entretanto, quanto ao efetivo pleito de atribuição do efeito suspensivo ao recurso interposto, não vejo como conferir-lhe guarida, considerando o disposto no art. 1.012 do CPC, em seus §§ 1º, III e §3, I e II, preleciona o seguinte: “Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1º Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: (...) § 3º O pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1º poderá ser formulado por requerimento dirigido ao: I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação.” Da leitura do supracitado dispositivo processual, evidencia-se que o pedido de atribuição de efeito suspensivo em recurso de apelação deve ser formulado por petição autônoma, dirigida ao tribunal, ou, quando já distribuído o recurso, ao relator, também por petição própria, e não como preliminar recursal, tal qual o caso em tela, o que obsta seu reconhecimento. Nesse sentido, colaciono entendimentos desta Corte de Justiça e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, in verbis: “TRIBUTÁRIO – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – EXECUÇÃO FISCAL – PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – NÃO CONHECIDO - SISTEMÁTICA PARA CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – TERMO INICIAL DO PRAZO DE SUSPENSÃO – PRIMEIRA INTIMAÇÃO ACERCA DA NÃO LOCALIZAÇÃO DE BENS OU DO DEVEDOR – INTIMAÇÃO OBSERVADA NO FEITO – INÉRCIA DA FAZENDA PÚBLICA POR MAIS DE 5 (CINCO) ANOS APÓS INÍCIO DO RESPECTIVO PRAZO PRESCRICIONAL - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. “O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação depende de procedimento próprio, consubstanciado na formulação de requerimento autônomo dirigido ao tribunal, restando inviável o exame do pedido efetuado no próprio recurso de apelação.” (N.U 1010000-67.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/11/2022, Publicado no DJE 13/12/2022).” (N.U 0016170-29.2009.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Público, Relator: Edson Dias Reis, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, julgado em 14/02/2023, publicado no DJE 24/02/2023) (grifei) “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINARES. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO. ARTIGO 375-A DO TJMG. NÃO CONHECIDO. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DA JUSTIÇA. REJEIÇÃO. MÉRITO. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. DESCONTO DE PRESTAÇÕES SUPERIOR A 30% DOS PROVENTOS DA AUTORA. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS CONSIGNADOS. IMPOSSIBILIDADE. TEMA 1.085 DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. - O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. - O benefício da justiça gratuita somente pode ser revogado se o impugnante demonstrar, de forma cabal, que o beneficiário detém capacidade financeira, o que não ocorreu no presente caso. - Nos termos do que foi decidido no Tema 1.085, do STJ, deve ser obedecido o limite de 30% de descontos dos proventos nos empréstimos consignados. - Deve-se manter a sentença que determinou a limitação dos descontos no benefício previdenciário da apelada em 30% (trinta por cento), diante do caráter alimentar dessa verba.” (TJMG - Apelação Cível 1.0000.23.231925-1/001, Relator(a): Des.(a) Aparecida Grossi, 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 21/02/2024, publicação da súmula em 21/02/2024) (grifei) Desse modo, resta inviável o exame do pedido formulado na própria apelação, razão pelo qual não conheço do pedido, diante da manifesta inadequação da via eleita. Ademais, a requerida (Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A) ofereceu as contrarrazões, impugnando a concessão da justiça gratuita, sob o argumento que a parte autora possui condições de arcar com as custas processuais, contudo, sem razão a requerida, isso porque, a parte autora é beneficiária da assistência judiciária gratuita, conforme certidão acostada no Id. 286044350. Quanto ao mérito, cinge-se dos autos que FRANCIELMA DA SILVA ajuizou ação de indenização por perdas e danos em desfavor de ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS, alegando, em síntese, não ter contraído qualquer negociação com a parte requerida, especialmente a compra de um veículo na cidade de São Paulo. Afirma que foi vítima de fraude, pois teve conhecimento da existência de um veículo na cidade de São Paulo em seu nome, com dívidas de impostos e ainda, que teve seu nome protestado no cartório, por débito que jamais contratou. A par desses argumentos, requer a declaração da inexistência do débito com a condenação da parte requerida em danos morais em quantia não inferior ao valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), além da repetição do valor cobrado em dobro. Sobreveio a sentença, em que o magistrado a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para declarar inexistente qualquer relação jurídica entre as partes, de modo a declarar nulo o contrato de compra e venda discutido no processo, devendo a parte requerida promover todas as baixas necessárias, inclusive eventual débito fiscal, retirando o veículo do nome da parte requerente, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais) limitados a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), bem como condenou a parte requerida a pagar em favor da parte autora a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, corrigidos e com juros moratórios nas bases retro expendidas. Inconformados com os contornos da sentença, ambas as partes recorrem, sendo que a parte requerida (Itapeva) alega que tendo a dívida origem certa e conhecida pela parte recorrida, cabível é a inscrição do seu nome nos órgãos cadastrais de inadimplentes, pois após a cessão do crédito a mesma não arcou com suas obrigações, o que tornou legítima a cobrança. Aponta que não é caso de indenização por danos morais, haja vista não ter ocorrido qualquer ato ilícito por parte do recorrente, que agiu em exercício de seu direito ao inscrever o nome da parte recorrida em órgãos de cadastro de inadimplentes, razão pela qual, pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, para julgar a presente ação totalmente improcedente, e, caso não seja este o entendimento, requer, subsidiariamente, a redução do quantum fixado a título de indenização por danos morais. Por sua vez, a parte autora pugna pelo provimento do recurso, com a reforma parcial da sentença, no sentido de majorar a indenização por danos morais para o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios conforme determinado na sentença; bem como, requer o pagamento de honorários advocatícios recursais, nos termos do artigo 85, §11, do Código de Processo Civil. Pois bem. A controvérsia cinge-se à análise da apelação interposta por ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO-PADRONIZADOS, que busca a reforma da sentença que declarou a inexistência de relação jurídica entre as partes e condenou-a ao pagamento de R$ 10.000,00 por danos morais; bem como ao recurso adesivo manejado por FRANCIELMA DA SILVA, que pleiteia a majoração da indenização arbitrada. Ao presente caso, se aplicam as disposições do Código de Defesa do Consumidor, à medida que patente à relação de consumo entre as partes, evidenciando-se a figura do consumidor e do fornecedor de serviços (arts. 2º e 3º). Ressai dos autos que a parte autora suscita na sua exordial que não contraiu qualquer negociação com a parte requerida, especialmente, a compra de um veículo na Cidade de São Paulo, que gerou dívidas de impostos e protesto de seu nome no cartório, sendo, vítima de fraude. No caso em análise, o ônus da prova recai em favor do apelante, ainda que seja o Banco o responsável por inserir o nome do apelado nos órgãos de proteção ao crédito, visto que a origem do negócio jurídico se perpetrou supostamente entre as partes litigantes, de modo que o recorrente possui todos os elementos para a elucidação da lide. Em que pese a apresentação do espelho do contrato pela parte requerida em sede de contestação (Id 285265361), verifica-se que a assinatura aposta no contrato é dessemelhante a olho nu da assinatura constante nos documentos pessoais da parte autora, além das divergências constantes no documento pessoal carreado em confronto com o anexado pela autora na exordial, restando caracterizada, assim, a fraude perpetrada, já que não fora feita prova em contrário pelo banco promovido, que requereu, inclusive, o julgamento antecipado da lide (Id. 285265383). Chama também a atenção o fato de que o banco apelante não cumpriu a determinação judicial no que se refere a juntada de contrato original e legível na sua integralidade, de modo que restou prejudicada a realização de perícia grafotécnica nos autos. Desse modo, a despeito da ausência de realização da perícia grafotécnica antes determinada pelo juízo de origem, é certo que as assinaturas são divergentes a olho nu, de modo que evidente a fraude no caso em análise. A propósito, em caso análogo, assim restou decidido por esta Corte de Justiça. Confira-se: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – CONTRATO FIRMADO MEDIANTE FRAUDE – ASSINATURA DIVERGENTE – PERCEPTÍVEL A OLHO NU – DESNECESSIDADE DE PROVA PERICIAL – DÉBITO INEXISTENTE – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – NEXO CAUSAL CONFIGURADO – DEVER DE INDENIZAR – SENTENÇA MANITDA – RECURSO DESPROVIDO. Observa-se a olho nu que a assinatura constante no suposto ajuste é nitidamente diversa daquela constante no documento de identidade, circunstância que demonstra ter havido contratação com terceiro mediante fraude. Não demonstrada a regularidade na contratação, tem-se por inexistente a dívida, e os descontos realizados no benefício é considerado ilegal, devendo ser restituído na forma simples. A má prestação no serviço, consubstanciado em contrato de empréstimo realizado mediante fraude impõe o dever de indenizar. O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes.” (TJ-MT 00010966920178110035 MT, Relator: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 14/09/2021, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/09/2021) Desse modo, não agindo o banco recorrente com as cautelas necessárias quando da realização do negócio jurídico, permitindo que terceiro contratasse em nome da autora, configura-se o ato ilícito que gera dano moral e o dever de reparação a ser fixada em consonância com o disposto no artigo 944 do Código Civil. Nesse sentido é o entendimento deste sodalício: “AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – DIVIDA ORIUNDA DE CONTRATOS OBTIDOS MEDIANTE FRAUDE – AUSÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO – INSCRIÇÃO DO NOME NO CADASTRO DE INADIMPLENTES – NEXO CAUSAL CONFIGURADO – DEVER DE INDENIZAR – QUANTUM ARBITRADO – VALOR JUSTO E RAZOÁVEL – MULTA DIÁRIA – MANUTENÇÃO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDOS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Compete à instituição bancária verificar se os documentos apresentados eram, de fato, da pessoa com que estava contratando. A má prestação no serviço, consubstanciada na contratação de abertura de conta corrente e cartões de crédito em nome do consumidor, sem que este tenha participado do ato, isto é, procedido mediante fraude, aliada à inscrição indevida nos órgãos de proteção ao crédito, impõe o dever se indenizar. O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes, devendo ser mantido o valor arbitrado na sentença, quando se apresenta consentâneo com a realidade do caso concreto. Obedecidos aos princípios da equidade, razoabilidade e proporcionalidade, deve ser mantida a astreintes. In casu, correto se mostra o valor fixado a título de honorários advocatícios, sendo justo e razoável, de acordo com o art. 85, §2º, do CPC.” (N.U 1012100-46.2021.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/11/2021, Publicado no DJE 26/11/2021) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – FRAUDE– INSCRIÇÃO INDEVIDA DE NOME EM CADASTRO DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO – ATO ILÍCITO CONFIGURADO – DANO MORAL IN RE IPSA – DEVER REPARATÓRIO CARACTERIZADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO – VALOR DA CONDENAÇÃO QUE ATENDE AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE – INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – NÃO CONFIGURAÇÃO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Demonstrado o ato ilícito com a inscrição do nome do suposto devedor nos cadastros de proteção ao crédito, por conta de débito inexistente, nasce a obrigação de indenizar, independentemente da prova de prejuízo, porque, nesta hipótese, o dano é presumido e basta a comprovação da ocorrência do fato que o gerou. A indenização por dano moral deve ser fixada em montante que não onere em demasia o ofensor, mas, por outro lado, atenda à finalidade para a qual foi concedida, compensando o sofrimento da vítima e desencorajando a parte quanto aos outros procedimentos de igual natureza. Descabe a aplicação da multa por litigância de má-fé quando não caracterizada uma das hipóteses do rol taxativo do art. 80 do CPC.” (N.U 1039566-03.2018.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 28/07/2021, Publicado no DJE 06/08/2021) A argumentação trazida pela apelante sustenta a inexistência de dano moral indenizável, afirmando que não houve conduta ilícita e que não se trata de mais do que meros aborrecimentos. Tal alegação não se sustenta. A jurisprudência pátria consolidou-se no sentido de que a inscrição indevida do nome do consumidor em cadastros restritivos de crédito, especialmente quando decorrente de fraude, configura dano moral in re ipsa, prescindindo de prova do abalo psíquico concreto. A responsabilidade civil da instituição cessionária é objetiva, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, sendo presumido o nexo causal entre o dano e a conduta omissiva quanto à diligência mínima exigida na cessão e cobrança do crédito. O valor fixado a título de danos morais (R$ 10.000,00) mostrou-se proporcional à gravidade da lesão, às condições econômicas das partes e aos princípios da razoabilidade e vedação ao enriquecimento sem causa. O recurso adesivo interposto pela autora visa à majoração da indenização fixada. Contudo, não há nos autos qualquer elemento adicional que demonstre a necessidade de reavaliação do quantum. O montante arbitrado atende aos critérios jurisprudenciais e doutrinários, sendo apto a compensar o abalo e a cumprir a função pedagógica da condenação. Ressalte-se que a majoração de valores indenizatórios exige demonstração de inadequação manifesta do valor fixado, o que não se verifica na hipótese. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO a ambos os recursos, mantendo a r. sentença de primeiro grau por seus próprios fundamentos, e por consequência, majoro os honorários advocatícios a serem suportados pela recorrente de 15 para 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do §11 do art. 85 do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Francielma Da Silva e outros x Aymore Credito, Financiamento E Investimento S.A. e outros

ID: 311627892

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1011547-26.2022.8.11.0015

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

FRANCIELMA DA SILVA ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS

Polo Passivo:

AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. FRANCIELMA DA SILVA ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS

Acórdão

Advogados:

HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

GLAUCO GOMES MADUREIRA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

JONES EVERSON CARDOSO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PAULO EDUARDO PRADO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011547-26.2022.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Protesto Indevido de Título, Cancelamento de P… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011547-26.2022.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Protesto Indevido de Título, Cancelamento de Protesto, Efeitos] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [FRANCIELMA DA SILVA - CPF: 045.148.121-61 (APELADO), JONES EVERSON CARDOSO - CPF: 810.311.739-00 (ADVOGADO), ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS - CNPJ: 30.366.229/0001-05 (APELANTE), PAULO EDUARDO PRADO - CPF: 130.886.688-70 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELANTE), HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO - CPF: 213.647.038-82 (ADVOGADO), ESTADO DE SAO PAULO - CNPJ: 46.379.400/0001-50 (APELADO), FRANCIELMA DA SILVA - CPF: 045.148.121-61 (APELANTE), JONES EVERSON CARDOSO - CPF: 810.311.739-00 (ADVOGADO), ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS - CNPJ: 30.366.229/0001-05 (APELADO), PAULO EDUARDO PRADO - CPF: 130.886.688-70 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELADO), HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO - CPF: 213.647.038-82 (ADVOGADO), GLAUCO GOMES MADUREIRA - CPF: 223.213.118-19 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, AMBOS RECURSOS DESPROVIDOS. E M E N T A APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS - PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – CONTRATO FIRMADO MEDIANTE FRAUDE E OBJETO DE CESSÃO DE CRÉDITO – ASSINATURA DIVERGENTE A OLHO NU E DOCUMENTOS COM DADOS DIVERGENTES DA PARTE AUTORA – DESNECESSIDADE DE PROVA PERICIAL – DÉBITO QUE ENSEJOU O PROTESTO DO NOME DA CONSUMIDORA INDEVIDAMENTE - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA PARTE REQUERIDA - DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO RAZOÁVEL E PROPORCIONAL - MANUTENÇÃO DO VALOR ARBITRADO - SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS DESPROVIDOS. O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. Comprovada a fraude na celebração de contrato de financiamento de veículo em nome da autora, impõe-se a manutenção da declaração de inexistência da relação jurídica e nulidade do contrato, bem como da condenação à indenização por danos morais. O valor fixado a título de danos morais deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, não se mostrando irrisório ou exorbitante, sendo mantido quando se revela compatível com as peculiaridades do caso concreto. O recurso da parte ré não logra êxito em afastar a responsabilidade pelo evento danoso que culminou no protesto do nome da parte autora, notadamente diante da ausência de cautela quanto à regularidade da cessão do crédito e da comprovação do dano à parte autora, cuja negativação decorreu de contrato fraudulento. Recurso adesivo da parte autora que visa à majoração da indenização por danos morais. Valor fixado em consonância com os parâmetros da jurisprudência e com a extensão do dano sofrido. Sentença que não merece reparo. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1011547-26.2022.8.11.0015 APELANTES: FRANCIELMA DA SILVA E ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NAO-PADRONIZADOS APELADOS: AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A; ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO-PADRONIZADOS E FRANCIELMA DA SILVA RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de apelação interpostos por FRANCIELMA DA SILVA e ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NAO-PADRONIZADOS, contra sentença proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara Cível da Comarca de Sinop/MT, Dr. Cleber Luis Zeferino de Paula, lançada nos autos da Ação de Indenização por Perdas e Danos, ajuizada por FRANCIELMA DA SILVA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para declarar inexistente qualquer relação jurídica entre as partes, de modo a declarar nulo o contrato de compra e venda discutido no processo, devendo a parte requerida promover todas as baixas necessárias, inclusive eventual débito fiscal, retirando o veículo do nome da parte requerente, sob pena de multa diária de R$ 100,00 limitados a R$ 50.000,00, bem como condenou a parte requerida a pagar em favor da parte autora a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, corrigidos e com juros moratórios nas bases retro expendidas. Condenou, ainda, a parte requerida a pagar as custas e as despesas processuais, assim como honorários advocatícios da contraparte, arbitrado em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, com fulcro no artigo 85, § 2º, incisos I a IV, do Código de Processo Civil. Foram opostos embargos de declaração no Id. 285265390, sendo estes rejeitados em Id. 285265399. O apelante (Itapeva XII Multicarteira Fundo de Investimento em Direitos Creditórios – Não Padronizados) inicialmente requer que o recurso seja recebido também no seu efeito suspensivo, em razão da presença dos requisitos para tanto (fumus boni iuris e pericullum in mora). No mérito, diz que tendo a dívida origem certa e conhecida pela parte recorrida, cabível é a inscrição do seu nome nos órgãos cadastrais de inadimplentes, pois após a cessão do crédito a mesma não arcou com suas obrigações, o que tornou legítima a cobrança. Aponta que não é caso de indenização por danos morais, haja vista não ter ocorrido qualquer ato ilícito por parte do recorrente, que agiu em exercício de seu direito ao inscrever o nome da parte recorrida em órgãos de cadastro de inadimplentes, razão pela qual, pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, para julgar a presente ação totalmente improcedente, e, caso não seja este o entendimento, requer, subsidiariamente, a redução do quantum fixado a título de indenização por danos morais (Id. 285265402). A parte apelante (Francielma da Silva), alega que houve a utilização fraudulenta do nome da recorrente para aquisição de um veículo, gerando débitos fiscais junto ao Estado de São Paulo e outras pendências em cartórios, e em contrapartida, afirma que a recorrida, ao adquirir o crédito, tinha o dever de verificar a regularidade da operação, não podendo se eximir da responsabilidade sob a alegação de que apenas adquiriu o crédito de terceiro alegando que o valor fixado deve ser majorado. A par desses argumentos, pugna pelo provimento do recurso, com a reforma parcial da sentença, no sentido de majorar a indenização por danos morais para o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios conforme determinado na sentença; bem como, requer o pagamento de honorários advocatícios recursais, nos termos do artigo 85, §11, do Código de Processo Civil. A parte autora ofereceu as contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso (id. 285265407). A requerida (Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A) ofereceu as contrarrazões, impugnando a concessão da justiça gratuita, e no mérito, pugna pelo desprovimento do recurso. A requerida (Itapeva) apresentou as contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso (id. 285265414). A parte requerida efetuou o recolhimento do preparo no Id. 285265403, e a parte autora, não efetuou o recolhimento do preparo, em razão de ser beneficiária da justiça gratuita, conforme certidão acostada no Id. 286044350. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Recolhido os respectivos preparos, e estando adequados e tempestivos, CONHEÇO os apelos interpostos, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Inicialmente, a parte requerida/apelante (Itapeva XII Multicarteira Fundo de Investimento em Direitos Creditórios) pleiteia que o apelo seja recebido também pelo efeito suspensivo, em razão da presença do periculum in mora e o fumus boni iuris ensejadores para tanto. Entretanto, quanto ao efetivo pleito de atribuição do efeito suspensivo ao recurso interposto, não vejo como conferir-lhe guarida, considerando o disposto no art. 1.012 do CPC, em seus §§ 1º, III e §3, I e II, preleciona o seguinte: “Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1º Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: (...) § 3º O pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1º poderá ser formulado por requerimento dirigido ao: I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação.” Da leitura do supracitado dispositivo processual, evidencia-se que o pedido de atribuição de efeito suspensivo em recurso de apelação deve ser formulado por petição autônoma, dirigida ao tribunal, ou, quando já distribuído o recurso, ao relator, também por petição própria, e não como preliminar recursal, tal qual o caso em tela, o que obsta seu reconhecimento. Nesse sentido, colaciono entendimentos desta Corte de Justiça e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, in verbis: “TRIBUTÁRIO – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – EXECUÇÃO FISCAL – PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – NÃO CONHECIDO - SISTEMÁTICA PARA CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – TERMO INICIAL DO PRAZO DE SUSPENSÃO – PRIMEIRA INTIMAÇÃO ACERCA DA NÃO LOCALIZAÇÃO DE BENS OU DO DEVEDOR – INTIMAÇÃO OBSERVADA NO FEITO – INÉRCIA DA FAZENDA PÚBLICA POR MAIS DE 5 (CINCO) ANOS APÓS INÍCIO DO RESPECTIVO PRAZO PRESCRICIONAL - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. “O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação depende de procedimento próprio, consubstanciado na formulação de requerimento autônomo dirigido ao tribunal, restando inviável o exame do pedido efetuado no próprio recurso de apelação.” (N.U 1010000-67.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/11/2022, Publicado no DJE 13/12/2022).” (N.U 0016170-29.2009.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Público, Relator: Edson Dias Reis, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, julgado em 14/02/2023, publicado no DJE 24/02/2023) (grifei) “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINARES. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO. ARTIGO 375-A DO TJMG. NÃO CONHECIDO. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DA JUSTIÇA. REJEIÇÃO. MÉRITO. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. DESCONTO DE PRESTAÇÕES SUPERIOR A 30% DOS PROVENTOS DA AUTORA. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS CONSIGNADOS. IMPOSSIBILIDADE. TEMA 1.085 DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. - O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. - O benefício da justiça gratuita somente pode ser revogado se o impugnante demonstrar, de forma cabal, que o beneficiário detém capacidade financeira, o que não ocorreu no presente caso. - Nos termos do que foi decidido no Tema 1.085, do STJ, deve ser obedecido o limite de 30% de descontos dos proventos nos empréstimos consignados. - Deve-se manter a sentença que determinou a limitação dos descontos no benefício previdenciário da apelada em 30% (trinta por cento), diante do caráter alimentar dessa verba.” (TJMG - Apelação Cível 1.0000.23.231925-1/001, Relator(a): Des.(a) Aparecida Grossi, 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 21/02/2024, publicação da súmula em 21/02/2024) (grifei) Desse modo, resta inviável o exame do pedido formulado na própria apelação, razão pelo qual não conheço do pedido, diante da manifesta inadequação da via eleita. Ademais, a requerida (Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A) ofereceu as contrarrazões, impugnando a concessão da justiça gratuita, sob o argumento que a parte autora possui condições de arcar com as custas processuais, contudo, sem razão a requerida, isso porque, a parte autora é beneficiária da assistência judiciária gratuita, conforme certidão acostada no Id. 286044350. Quanto ao mérito, cinge-se dos autos que FRANCIELMA DA SILVA ajuizou ação de indenização por perdas e danos em desfavor de ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS, alegando, em síntese, não ter contraído qualquer negociação com a parte requerida, especialmente a compra de um veículo na cidade de São Paulo. Afirma que foi vítima de fraude, pois teve conhecimento da existência de um veículo na cidade de São Paulo em seu nome, com dívidas de impostos e ainda, que teve seu nome protestado no cartório, por débito que jamais contratou. A par desses argumentos, requer a declaração da inexistência do débito com a condenação da parte requerida em danos morais em quantia não inferior ao valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), além da repetição do valor cobrado em dobro. Sobreveio a sentença, em que o magistrado a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para declarar inexistente qualquer relação jurídica entre as partes, de modo a declarar nulo o contrato de compra e venda discutido no processo, devendo a parte requerida promover todas as baixas necessárias, inclusive eventual débito fiscal, retirando o veículo do nome da parte requerente, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais) limitados a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), bem como condenou a parte requerida a pagar em favor da parte autora a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, corrigidos e com juros moratórios nas bases retro expendidas. Inconformados com os contornos da sentença, ambas as partes recorrem, sendo que a parte requerida (Itapeva) alega que tendo a dívida origem certa e conhecida pela parte recorrida, cabível é a inscrição do seu nome nos órgãos cadastrais de inadimplentes, pois após a cessão do crédito a mesma não arcou com suas obrigações, o que tornou legítima a cobrança. Aponta que não é caso de indenização por danos morais, haja vista não ter ocorrido qualquer ato ilícito por parte do recorrente, que agiu em exercício de seu direito ao inscrever o nome da parte recorrida em órgãos de cadastro de inadimplentes, razão pela qual, pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, para julgar a presente ação totalmente improcedente, e, caso não seja este o entendimento, requer, subsidiariamente, a redução do quantum fixado a título de indenização por danos morais. Por sua vez, a parte autora pugna pelo provimento do recurso, com a reforma parcial da sentença, no sentido de majorar a indenização por danos morais para o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios conforme determinado na sentença; bem como, requer o pagamento de honorários advocatícios recursais, nos termos do artigo 85, §11, do Código de Processo Civil. Pois bem. A controvérsia cinge-se à análise da apelação interposta por ITAPEVA XII MULTICARTEIRA FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO-PADRONIZADOS, que busca a reforma da sentença que declarou a inexistência de relação jurídica entre as partes e condenou-a ao pagamento de R$ 10.000,00 por danos morais; bem como ao recurso adesivo manejado por FRANCIELMA DA SILVA, que pleiteia a majoração da indenização arbitrada. Ao presente caso, se aplicam as disposições do Código de Defesa do Consumidor, à medida que patente à relação de consumo entre as partes, evidenciando-se a figura do consumidor e do fornecedor de serviços (arts. 2º e 3º). Ressai dos autos que a parte autora suscita na sua exordial que não contraiu qualquer negociação com a parte requerida, especialmente, a compra de um veículo na Cidade de São Paulo, que gerou dívidas de impostos e protesto de seu nome no cartório, sendo, vítima de fraude. No caso em análise, o ônus da prova recai em favor do apelante, ainda que seja o Banco o responsável por inserir o nome do apelado nos órgãos de proteção ao crédito, visto que a origem do negócio jurídico se perpetrou supostamente entre as partes litigantes, de modo que o recorrente possui todos os elementos para a elucidação da lide. Em que pese a apresentação do espelho do contrato pela parte requerida em sede de contestação (Id 285265361), verifica-se que a assinatura aposta no contrato é dessemelhante a olho nu da assinatura constante nos documentos pessoais da parte autora, além das divergências constantes no documento pessoal carreado em confronto com o anexado pela autora na exordial, restando caracterizada, assim, a fraude perpetrada, já que não fora feita prova em contrário pelo banco promovido, que requereu, inclusive, o julgamento antecipado da lide (Id. 285265383). Chama também a atenção o fato de que o banco apelante não cumpriu a determinação judicial no que se refere a juntada de contrato original e legível na sua integralidade, de modo que restou prejudicada a realização de perícia grafotécnica nos autos. Desse modo, a despeito da ausência de realização da perícia grafotécnica antes determinada pelo juízo de origem, é certo que as assinaturas são divergentes a olho nu, de modo que evidente a fraude no caso em análise. A propósito, em caso análogo, assim restou decidido por esta Corte de Justiça. Confira-se: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – CONTRATO FIRMADO MEDIANTE FRAUDE – ASSINATURA DIVERGENTE – PERCEPTÍVEL A OLHO NU – DESNECESSIDADE DE PROVA PERICIAL – DÉBITO INEXISTENTE – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – NEXO CAUSAL CONFIGURADO – DEVER DE INDENIZAR – SENTENÇA MANITDA – RECURSO DESPROVIDO. Observa-se a olho nu que a assinatura constante no suposto ajuste é nitidamente diversa daquela constante no documento de identidade, circunstância que demonstra ter havido contratação com terceiro mediante fraude. Não demonstrada a regularidade na contratação, tem-se por inexistente a dívida, e os descontos realizados no benefício é considerado ilegal, devendo ser restituído na forma simples. A má prestação no serviço, consubstanciado em contrato de empréstimo realizado mediante fraude impõe o dever de indenizar. O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes.” (TJ-MT 00010966920178110035 MT, Relator: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 14/09/2021, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/09/2021) Desse modo, não agindo o banco recorrente com as cautelas necessárias quando da realização do negócio jurídico, permitindo que terceiro contratasse em nome da autora, configura-se o ato ilícito que gera dano moral e o dever de reparação a ser fixada em consonância com o disposto no artigo 944 do Código Civil. Nesse sentido é o entendimento deste sodalício: “AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – DIVIDA ORIUNDA DE CONTRATOS OBTIDOS MEDIANTE FRAUDE – AUSÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO – INSCRIÇÃO DO NOME NO CADASTRO DE INADIMPLENTES – NEXO CAUSAL CONFIGURADO – DEVER DE INDENIZAR – QUANTUM ARBITRADO – VALOR JUSTO E RAZOÁVEL – MULTA DIÁRIA – MANUTENÇÃO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDOS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Compete à instituição bancária verificar se os documentos apresentados eram, de fato, da pessoa com que estava contratando. A má prestação no serviço, consubstanciada na contratação de abertura de conta corrente e cartões de crédito em nome do consumidor, sem que este tenha participado do ato, isto é, procedido mediante fraude, aliada à inscrição indevida nos órgãos de proteção ao crédito, impõe o dever se indenizar. O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes, devendo ser mantido o valor arbitrado na sentença, quando se apresenta consentâneo com a realidade do caso concreto. Obedecidos aos princípios da equidade, razoabilidade e proporcionalidade, deve ser mantida a astreintes. In casu, correto se mostra o valor fixado a título de honorários advocatícios, sendo justo e razoável, de acordo com o art. 85, §2º, do CPC.” (N.U 1012100-46.2021.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/11/2021, Publicado no DJE 26/11/2021) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – FRAUDE– INSCRIÇÃO INDEVIDA DE NOME EM CADASTRO DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO – ATO ILÍCITO CONFIGURADO – DANO MORAL IN RE IPSA – DEVER REPARATÓRIO CARACTERIZADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO – VALOR DA CONDENAÇÃO QUE ATENDE AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE – INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – NÃO CONFIGURAÇÃO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Demonstrado o ato ilícito com a inscrição do nome do suposto devedor nos cadastros de proteção ao crédito, por conta de débito inexistente, nasce a obrigação de indenizar, independentemente da prova de prejuízo, porque, nesta hipótese, o dano é presumido e basta a comprovação da ocorrência do fato que o gerou. A indenização por dano moral deve ser fixada em montante que não onere em demasia o ofensor, mas, por outro lado, atenda à finalidade para a qual foi concedida, compensando o sofrimento da vítima e desencorajando a parte quanto aos outros procedimentos de igual natureza. Descabe a aplicação da multa por litigância de má-fé quando não caracterizada uma das hipóteses do rol taxativo do art. 80 do CPC.” (N.U 1039566-03.2018.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 28/07/2021, Publicado no DJE 06/08/2021) A argumentação trazida pela apelante sustenta a inexistência de dano moral indenizável, afirmando que não houve conduta ilícita e que não se trata de mais do que meros aborrecimentos. Tal alegação não se sustenta. A jurisprudência pátria consolidou-se no sentido de que a inscrição indevida do nome do consumidor em cadastros restritivos de crédito, especialmente quando decorrente de fraude, configura dano moral in re ipsa, prescindindo de prova do abalo psíquico concreto. A responsabilidade civil da instituição cessionária é objetiva, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, sendo presumido o nexo causal entre o dano e a conduta omissiva quanto à diligência mínima exigida na cessão e cobrança do crédito. O valor fixado a título de danos morais (R$ 10.000,00) mostrou-se proporcional à gravidade da lesão, às condições econômicas das partes e aos princípios da razoabilidade e vedação ao enriquecimento sem causa. O recurso adesivo interposto pela autora visa à majoração da indenização fixada. Contudo, não há nos autos qualquer elemento adicional que demonstre a necessidade de reavaliação do quantum. O montante arbitrado atende aos critérios jurisprudenciais e doutrinários, sendo apto a compensar o abalo e a cumprir a função pedagógica da condenação. Ressalte-se que a majoração de valores indenizatórios exige demonstração de inadequação manifesta do valor fixado, o que não se verifica na hipótese. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO a ambos os recursos, mantendo a r. sentença de primeiro grau por seus próprios fundamentos, e por consequência, majoro os honorários advocatícios a serem suportados pela recorrente de 15 para 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do §11 do art. 85 do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Processo nº 1022856-63.2022.8.11.0041

ID: 283509934

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1022856-63.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 29/05/2025

Polo Ativo:

BRDU URBANISMO S/A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

CARLOS EDUARDO CAMPOS RESENDE

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

JULIANA MACHADO RIBEIRO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

RICARDO DE MORAIS FURTADO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1022856-63.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão / Resolução, Rescisão do contrato e d… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1022856-63.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão / Resolução, Rescisão do contrato e devolução do dinheiro] Relator: Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Turma Julgadora: [DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO] Parte(s): [JAMIRE ABDALA DE QUEIROZ - CPF: 683.509.886-49 (APELADO), IGOR GIRALDI FARIA - CPF: 841.693.111-91 (ADVOGADO), MURILO MAFIA MARTINS - CPF: 972.493.437-34 (APELADO), BRDU URBANISMO S/A - CNPJ: 12.484.905/0001-63 (APELANTE), CARLOS EDUARDO CAMPOS RESENDE - CPF: 033.093.581-00 (ADVOGADO), JULIANA MACHADO RIBEIRO - CPF: 018.771.571-80 (ADVOGADO), RICARDO DE MORAIS FURTADO - CPF: 688.545.101-06 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE REGISTRO. APLICAÇÃO DO CDC. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS COM RETENÇÃO DE 10%. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta contra sentença que reconheceu a possibilidade de rescisão contratual cumulada com restituição parcial dos valores pagos por comprador de lote urbano, afastando a incidência da Lei nº 9.514/1997 e aplicando o Código de Defesa do Consumidor para determinar a restituição imediata de 90% do montante pago, com retenção de 10%. II. Questão em discussão Questões em discussão: (i) saber se é legítima a inclusão da BRDU Urbanismo S/A no polo passivo da ação, à luz da Teoria da Aparência e da responsabilidade solidária do CDC; (ii) saber se é aplicável a Lei nº 9.514/1997 em contrato com cláusula de alienação fiduciária não registrada; e (iii) saber se é razoável a fixação da cláusula penal em 10% e a devolução imediata dos valores pagos. III. Razões de decidir A empresa recorrente integra o grupo econômico responsável pela comercialização do imóvel, justificando sua legitimidade com base na Teoria da Aparência e na responsabilidade solidária prevista nos arts. 7º e 25 do CDC. A ausência de registro da cláusula de alienação fiduciária no Cartório de Registro de Imóveis inviabilizou a incidência da Lei nº 9.514/1997, devendo ser aplicado o CDC, conforme precedentes do STJ. A devolução dos valores pagos, com retenção de 10%, observa os critérios de razoabilidade e proporcionalidade definidos na Súmula 543 do STJ e encontra respaldo na jurisprudência consolidada. A pretensão de parcelamento não foi amparada em provas de prejuízo financeiro. IV. Dispositivo e tese Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: “1. É legítima a inclusão no polo passivo da empresa que participa da cadeia de fornecimento e faz parte do mesmo grupo empresarial, nos termos do CDC. 2. A ausência de registro da cláusula de alienação fiduciária afasta a incidência da Lei nº 9.514/1997 e impõe a aplicação do CDC. 3. Em rescisão contratual por iniciativa do comprador, é válida a retenção de 10% dos valores pagos, com devolução imediata do saldo remanescente.” Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 7º e 25; CC, art. 421-A; Lei nº 9.514/1997, art. 23. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.987.389/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 30.08.2022; STJ, AgInt nos EDcl no REsp nº 2.014.411/SP, Rel. Min. Ricardo Cueva, 3ª Turma, j. 14.08.2023; TJMT, RAC nº 1014779-31.2023.8.11.0041, Rel. Des. Márcio Vidal, 5ª Câmara de Direito Privado, j. 01.04.2025. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação cível interposto por BRDU Urbanismo S.A., em face da r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, que nos autos da ação de rescisão contratual e restituição de quantias pagas c/c tutela de urgência, movida por Jamire Abdala de Queiroz e Murilo Máfia Martins, julgou procedente os pedidos iniciais, para declara a rescisão do contrato firmado entre as partes, condenando a ré a promover a restituição no valor de R$ 37.380,60 (trinta e sete mil trezentos e oitenta reais e sessenta centavos), devidamente corrigida, além do pagamento das custas e despesas processuais, e honorários advocatícios fixado em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85,§2º do CPC. Inconformado, o apelante suscita, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, alegando que o contrato foi firmado com BRDU SPE Cuiabá 01 Ltda., e não com a BRDU Urbanismo S/A. No mérito, alega a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, argumentando que o contrato se encontra sob o regime da Lei 9.514/97 (alienação fiduciária), o que impediria a rescisão judicial e a restituição direta de valores. Não obstante, subsidiariamente, sustenta a desproporcionalidade na fixação da cláusula penal em 10%, pugnando pela majoração para 25%, conforme precedentes do STJ e o parcelamento da devolução dos valores em 12 vezes, como medida de equilíbrio financeiro e garantia da continuidade da atividade empresarial. Ao final, requer a reforma da sentença. Os apelados apresentaram contrarrazões (id. 280522876), pugnando pelo desprovimento do apelo. É o relatório. Inclua-se na pauta. Cuiabá, 28 de maio de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator V O T O R E L A T O R Cinge-se dos autos que Jamire Abdala de Queiroz ajuizou ação de rescisão contratual c/c com restituição de quantias pagas e pedido de tutela de urgência, em face da empresa BRDU Urbanismo S/A, relatando que, em 05 de outubro de 2013, firmou com a requerida um Instrumento Particular de Compra e Venda de Imóvel com Financiamento Imobiliário e Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária, visando à aquisição do lote de terreno urbano nº 39, quadra 06, no Loteamento Residencial Mirante do Parque, situado na cidade de Cuiabá/MT. Afirma que o contrato previa o pagamento do preço no valor de R$ 27.985,65 (vinte e sete mil novecentos e oitenta e cinco reais e sessenta e cinco centavos), mediante sinal composto por 03 (três) parcelas de R$ 241,66, além de 144 (cento e quarenta e quatro) parcelas mensais no valor unitário de R$ 346,26, corrigidas anualmente pelo IGP-M. Alega que efetuou o pagamento regular de 92 parcelas, o que, somado ao valor da entrada, perfaz o total de R$ 41.533,99. Todavia, em razão da grave crise econômica advinda da pandemia da COVID-19 e do acentuado aumento inflacionário, sobretudo do IGP-M, passou a enfrentar severas dificuldades financeiras que inviabilizaram a continuidade do cumprimento do contrato. Aduz, inclusive, que tentou negociar amigavelmente a rescisão com a ré, mas a empresa se mostrou desinteressada em formalizar distrato ou proposta razoável de devolução dos valores pagos. Diante disso, postulou pela concessão da tutela de urgência para a imediata suspensão da exigibilidade das parcelas vencidas e vincendas, a exclusão ou abstenção de inscrição de seu nome nos órgãos de restrição ao crédito, bem como o impedimento de consolidação da propriedade do imóvel em nome da requerida. Ao final, requer a procedência da ação, com a rescisão do contrato, restituição de valores, condenação da requerida em custas e honorários, e a confirmação da tutela antecipada, por sentença definitiva. Após o devido processo legal, o douto magistrado a quo reconheceu que, embora o contrato celebrado entre as partes contivesse cláusula de alienação fiduciária, não houve registro no Cartório de Registro de Imóveis, o que impede a incidência da Lei nº 9.514/1997 e autoriza a aplicação do CDC, considerando, ainda, que a parte autora manifestou desistência do contrato por motivos financeiros supervenientes, sem que se configurasse inadimplemento ou mora, Diante disso, afastou a aplicação do Tema 1095 do STJ e da sistemática da propriedade fiduciária, reconhecendo o direito à rescisão contratual com devolução imediata de 90% dos valores pagos, retendo-se 10% a título de cláusula penal, além da condenação da ré ao pagamento de custas e honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor da condenação (id. 280522864). Inconformado, o apelante suscita, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, alegando que o contrato foi firmado com BRDU SPE Cuiabá 01 Ltda., e não com a BRDU Urbanismo S/A. No mérito, alega a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, argumentando que o contrato se encontra sob o regime da Lei 9.514/97 (alienação fiduciária), o que impediria a rescisão judicial e a restituição direta de valores. Subsidiariamente, sustenta a desproporcionalidade na fixação da cláusula penal em 10%, pugnando pela majoração para 25%, conforme precedentes do STJ e o parcelamento da devolução dos valores em 12 vezes, como medida de equilíbrio financeiro e garantia da continuidade da atividade empresarial. Ao final, requer a reforma da sentença. Pois bem. Inicialmente, quanto à tese de ilegitimidade passiva da BRDU Urbanismo S/A., adianto que não deve ser acolhida. Explico. A questão, como bem analisada na decisão saneadora (id. 280522858), evidencia a inserção da empresa recorrente na cadeia de fornecimento, presumindo fazer parte do mesmo grupo econômico, conduzindo à legítima expectativa do consumidor quanto à vinculação da empresa à obrigação. A propósito: “A ilegitimidade passiva, realmente, a BrDU Urbanismo S/A não consta como promitente vendedora do imóvel. Ocorre que, consoante defende a Autora, a Requerida participou da cadeia de serviços, tanto é que sua logomarca aparece em quase todos os documentos juntados pela parte autora, o que faz presumir ser do mesmo grupo econômico, justificando a sua legitimidade, à luz da Teoria da Aparência, já que, ao contratar a aquisição do lote de terras, a parte autora foi induzida a crer que todas as empresas garantiam o negócio demonstrando mais confiança na entrega do bem.” (id. 280522858). Tal entendimento encontra amparo no ordenamento jurídico, especialmente nos artigos 7º, parágrafo único, e 25, §1º, do Código de Defesa do Consumidor, que consagram a responsabilidade solidária entre os integrantes da cadeia de fornecimento, inclusive entre empresas do mesmo conglomerado, quando partícipes da relação de consumo. Nesse sentido, em casos semelhantes, já decidiu este Tribunal: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESCISÃO CONTRATUAL E RESTITUIÇÃO DE QUANTIAS PAGAS – CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA – MÉRITO - DISTRATO POR PARTE DA PROMITENTE COMPRADORA – SÚMULA 543 STJ - RETENÇÃO DE 10% DOS VALORES PAGOS - INAPLICABILIDADE DA LEI 9.514/97 – PREVALÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - JUROS DE MORA – TERMO INICIAL – TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA – TEMA 1002 STJ – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. In casu, não há dúvidas sobre a legitimidade passiva da apelante, uma vez que também integrou a cadeia negocial e faz parte do mesmo grupo empresarial. (...)” (RAC n.º 1009993-41.2023.8.11.0041, Terceira Câmara, Rel. Desa. Antonia Siqueira Goncalves, j. 07.08.2024 – destaquei). DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. GRUPO ECONÔMICO. REJEIÇÃO. RESCISÃO CONTRATUAL POR INICIATIVA DO COMPRADOR. RETENÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO. PACTO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA SEM REGISTRO. INEFICÁCIA. RECURSO DESPROVIDO. (...) "1. É legítima a inclusão de empresa pertencente ao mesmo grupo econômico no polo passivo da ação de rescisão contratual, nos termos do CDC. (...).” (RAC n.º 1014779-31.2023.8.11.0041, Quinta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 01.04.2025 – destaquei). Assim, afasto a preliminar. Superada essa questão, a vexata quaestio reside em averiguar qual legislação deve ser aplicada na lide, que visa a resolução do contrato firmado entre as partes, além do percentual de retenção. Inicialmente, cumpre esclarecer que, nos termos do art. 23 da Lei nº 9.514/1997, a constituição da propriedade fiduciária de bem imóvel depende de registro no competente Cartório de Registro de Imóveis: “Art. 23. Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título.” § 1º. Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel.” Logo, evidente que o registro não possui apenas função publicitária. Trata-se de elemento constitutivo da garantia real fiduciária. Assim, na ausência do registro, não há constituição válida da propriedade fiduciária, o que afasta por completo o regime jurídico da Lei nº 9.514/1997, inclusive os arts. 26 e 27, que tratam da consolidação da propriedade e do procedimento de leilão. Nesse sentido: “CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL C/C PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DAS QUANTIAS PAGAS. CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. AUSÊNCIA DE REGISTRO NO COMPETENTE REGISTRO DE IMÓVEIS. GARANTIA NÃO CONSTITUÍDA. ART. 23 DA LEI Nº 9.514/1997. PROCEDIMENTO PREVISTO NO ARTS. 26 E 27 DA LEI Nº 9.514/1997. NÃO APLICAÇÃO. RESCISÃO DO CONTRATO PELO ADQUIRENTE COM RESTITUIÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO. POSSIBILIDADE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA. (...) 4. No regime especial da Lei nº 9.514/97, o registro do contrato no competente Registro de Imóveis tem natureza constitutiva, sem o qual a propriedade fiduciária de coisa imóvel e a garantia dela decorrente não se perfazem. 5. Na ausência do registro que prevê o art. 23 da Lei nº 9.514/1997, não há constituição da propriedade fiduciária de coisa imóvel, tampouco haverá consolidação da propriedade em nome do credor na hipótese de inadimplência, razão pela qual não incidem os arts. 26 e 27 da Lei nº 9.514/1997, podendo o adquirente pleitear a rescisão do ajuste, com a restituição dos valores pagos, sem precisar se submeter ao procedimento previsto nestes dispositivos. 6. Hipótese em que, embora o contrato tenha sido celebrado em 20/11/2017, na data do ajuizamento da ação pelo adquirente do imóvel (21/10/2020), pleiteando a rescisão do contrato, não havia o registro deste no competente Registro de Imóveis, razão pela qual a garantia fiduciária não tinha se constituído e o adquirente - recorrido - tinha o direito de rescindir o ajuste, com a restituição de parte do valor pago, sem a necessidade de se submeter ao procedimento previsto no art. 27 da Lei nº 9.514/1997. 7. Recurso especial conhecido e não provido.” (REsp n.º 1.987.389/SP, Terceira Turma, relatora Ministra Nancy Andrighi, j. 30.08.2022 – destaquei). Embora haja nos autos notícia de notificação extrajudicial encaminhada pela própria parte ré à autora, tal comunicação, por si só, não é suficiente para ensejar os efeitos jurídicos próprios do regime da alienação fiduciária, nos moldes da Lei n.º 9.514/1997. Isso porque, além de não ter sido expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis competente, como exige o §1º do art. 26 da referida norma, também não houve o prévio registro do contrato de alienação fiduciária na matrícula do imóvel, conforme determina o seu art. 23. Ausente, portanto, os requisitos legais, mostra-se inaplicável o rito da consolidação da propriedade e do leilão extrajudicial, devendo prevalecer, no caso concreto, a disciplina do Código de Defesa do Consumidor. In casu, a parte autora é consumidora final de lote urbano para fins residenciais, enquanto a requerida figura como fornecedora de produto imobiliário, nos termos dos arts. 2º e 3º do CDC. A hipossuficiência técnica e econômica da parte autora é manifesta, impondo-se, portanto, a incidência do regime protetivo do consumidor. A propósito, segue a jurisprudência, confira: “AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA. RESCISÃO. FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. CLÁUSULA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. LEI Nº 9.514/1997. REGISTRO DO CONTRATO. IMPRESCINDIBILIDADE. 1. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça tem firme jurisprudência no sentido de que necessário o registro do contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária no competente Registro de Imóveis para a constituição da propriedade e garantia fiduciárias e aplicação das regras previstas na Lei nº 9.514/1997 em caso de inadimplência do devedor. 2. Na espécie, não foi realizado o registro do contrato, motivo pelo qual a garantia fiduciária não tinha se constituído e o adquirente/agravado tinha o direito de rescindir o ajuste sem a necessidade de se submeter ao procedimento previsto no artigo 27 da Lei nº 9.514/1997. 3. Agravo interno não provido.” (AgInt nos EDcl no REsp n. 2.014.411/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 14.8.2023 – destaquei). “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA COM GARANTIA EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CDC. APLICAÇÃO. CONSTITUIÇÃO EM MORA. REGISTRO. ACOLHIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. 1. O entendimento do tribunal de origem está em consonância com a jurisprudência desta Corte no sentido de que quando o devedor não for constituído em mora e quando não houver registro do contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária deve ser afastado o regime especial da Lei nº 9.514/1997, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor. (...).” (STJ, AgInt no AREsp: 2647833/SP, Terceira Turma, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 14.10.2024 - destaquei). “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM FAVOR DA PRÓPRIA VENDEDORA. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 9.514/1997. AFASTAMENTO DO TEMA 1095 DO STJ. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RECURSO DESPROVIDO. (...) Tese de julgamento: 1. Alienação fiduciária instituída em favor da própria vendedora em contrato de compra e venda direta de imóvel não se submete ao regime da Lei nº 9.514/1997. 2. O Tema 1095 do STJ somente se aplica a contratos com típico financiamento imobiliário com terceiro mutuante e registro imobiliário prévio. 3. Em tais hipóteses, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, permitindo a resolução contratual e a restituição das parcelas pagas, com retenção moderada.” (RAC n.º 1033571-67.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Desa. Serly Marcondes Alves, j. 02.04.2025 – destaquei). “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE REGISTRO. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 9.514/97. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESCISÃO CONTRATUAL. RETENÇÃO DE PARTE DOS VALORES PAGOS. JUROS DE MORA. INCIDÊNCIA A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) Tese de julgamento: A ausência de registro do contrato de compra e venda com cláusula de alienação fiduciária impede a constituição da propriedade fiduciária, afastando a incidência da Lei nº 9.514/97 e permitindo a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Em caso de rescisão contratual por iniciativa do comprador, admite-se a retenção de percentual razoável dos valores pagos, conforme jurisprudência do STJ, para evitar prejuízos ao vendedor. Nos compromissos de compra e venda de imóveis anteriores à Lei nº 13.786/2018, os juros de mora sobre os valores a serem restituídos ao comprador incidem a partir do trânsito em julgado da decisão.” (RAC n.º 1027898-50.2021.8.11.0002, Quinta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Marcos Regenold Fernandes, j. 11.02.2025 - destaquei). Diante da rescisão por vontade da própria parte autora, comprovada pela notificação extrajudicial id. 280521426, a jurisprudência inclina-se no sentido de que é lícita a rescisão contratual por iniciativa do promitente comprador, e que a devolução dos valores pagos deve ser imediata, com retenção moderada, como forma de compensar a parte vendedora pelas despesas administrativas e eventuais perdas, conforme prescreve a Súmula 543 do STJ: “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.” Sendo assim, o c. STJ tem autorizado que a promitente vendedora retenha o percentual de 10% a 25% do valor pago, quando a rescisão ocorrer por culpa do promissário comprador, confira, verbis: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESOLUÇÃO. RETENÇÃO. PERCENTUAL DE 10%. RAZOABILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte de Justiça, nas hipóteses de rescisão de contrato de promessa de compra e venda por inadimplemento do comprador, tem admitido a flutuação do percentual de retenção pelo vendedor entre 10% a 25% do total da quantia paga. 2. O percentual a ser retido pelo vendedor é fixado pelas instâncias ordinárias em conformidade com as particularidades do caso concreto, de maneira que não se mostra adequada sua revisão na via estreita do recurso especial. 3. O Tribunal de origem, ao analisar os documentos acostados aos autos, bem como o contrato firmado entre as partes, entendeu abusiva a cláusula contratual que previa a retenção de 25% do valor das quantias pagas em caso de rescisão por inadimplemento. Analisando as peculiaridades do caso, fixou a retenção em 10% do valor das parcelas pagas, o que não se distancia do admitido por esta Corte Superior. 4. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp n. 600.887/PE, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 19.05.2015 – negritei). Nessa trilha, o d. magistrado agiu com o costumeiro acerto ao determinar a retenção de 10% (dez por cento) do valor efetivamente pago pelos promissários compradores, estando de acordo com o entendimento jurisprudencial pacificado pelo c. STJ, reafirmo, não havendo motivo plausível para sua majoração consoante pleiteado pelo recorrente. Assim, a fixação da retenção em 10% do valor pago revela-se razoável, proporcional e em conformidade também com a jurisprudência deste Tribunal em caso semelhante, confira: “DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. GRUPO ECONÔMICO. REJEIÇÃO. RESCISÃO CONTRATUAL POR INICIATIVA DO COMPRADOR. RETENÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO. PACTO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA SEM REGISTRO. INEFICÁCIA. RECURSO DESPROVIDO. (...) "1. É legítima a inclusão de empresa pertencente ao mesmo grupo econômico no polo passivo da ação de rescisão contratual, nos termos do CDC. 2. É válida a fixação do percentual de retenção em 10% dos valores pagos em rescisão contratual por iniciativa do comprador, quando não demonstrado prejuízo excepcional ao vendedor. 3. O pacto de alienação fiduciária é ineficaz sem o devido registro no Cartório de Registro de Imóveis." (RAC n.º 1014779-31.2023.8.11.0041, Quinta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 01.04.2025 – destaquei). Por outro lado, quanto à devolução em parcela única, inexiste justificativa plausível para o parcelamento em 12 vezes, como pretende o recorrente, especialmente diante da duração do contrato, do valor pago e da ausência de prova de que o ressarcimento integral comprometeria a saúde financeira da empresa requerida. Portanto, por estes termos e estribado nessas razões, tenho que a r. sentença está em consonância com a legislação pátria, doutrina e jurisprudência, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos. De outra banda, deixo de majorar os honorários advocatícios (art. 85, §11), mormente porque já fixados no teto estabelecido no art. 85, § 2º, do CPC. Posto isso, conheço do recurso e lhe NEGO PROVIMENTO. Cuiabá, 28 de maio de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 28/05/2025

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Processo nº 1022856-63.2022.8.11.0041

ID: 283509940

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1022856-63.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 29/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JAMIRE ABDALA DE QUEIROZ MURILO MAFIA MARTINS

Acórdão

Advogados:

IGOR GIRALDI FARIA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1022856-63.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão / Resolução, Rescisão do contrato e d… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1022856-63.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão / Resolução, Rescisão do contrato e devolução do dinheiro] Relator: Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Turma Julgadora: [DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO] Parte(s): [JAMIRE ABDALA DE QUEIROZ - CPF: 683.509.886-49 (APELADO), IGOR GIRALDI FARIA - CPF: 841.693.111-91 (ADVOGADO), MURILO MAFIA MARTINS - CPF: 972.493.437-34 (APELADO), BRDU URBANISMO S/A - CNPJ: 12.484.905/0001-63 (APELANTE), CARLOS EDUARDO CAMPOS RESENDE - CPF: 033.093.581-00 (ADVOGADO), JULIANA MACHADO RIBEIRO - CPF: 018.771.571-80 (ADVOGADO), RICARDO DE MORAIS FURTADO - CPF: 688.545.101-06 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE REGISTRO. APLICAÇÃO DO CDC. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS COM RETENÇÃO DE 10%. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta contra sentença que reconheceu a possibilidade de rescisão contratual cumulada com restituição parcial dos valores pagos por comprador de lote urbano, afastando a incidência da Lei nº 9.514/1997 e aplicando o Código de Defesa do Consumidor para determinar a restituição imediata de 90% do montante pago, com retenção de 10%. II. Questão em discussão Questões em discussão: (i) saber se é legítima a inclusão da BRDU Urbanismo S/A no polo passivo da ação, à luz da Teoria da Aparência e da responsabilidade solidária do CDC; (ii) saber se é aplicável a Lei nº 9.514/1997 em contrato com cláusula de alienação fiduciária não registrada; e (iii) saber se é razoável a fixação da cláusula penal em 10% e a devolução imediata dos valores pagos. III. Razões de decidir A empresa recorrente integra o grupo econômico responsável pela comercialização do imóvel, justificando sua legitimidade com base na Teoria da Aparência e na responsabilidade solidária prevista nos arts. 7º e 25 do CDC. A ausência de registro da cláusula de alienação fiduciária no Cartório de Registro de Imóveis inviabilizou a incidência da Lei nº 9.514/1997, devendo ser aplicado o CDC, conforme precedentes do STJ. A devolução dos valores pagos, com retenção de 10%, observa os critérios de razoabilidade e proporcionalidade definidos na Súmula 543 do STJ e encontra respaldo na jurisprudência consolidada. A pretensão de parcelamento não foi amparada em provas de prejuízo financeiro. IV. Dispositivo e tese Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: “1. É legítima a inclusão no polo passivo da empresa que participa da cadeia de fornecimento e faz parte do mesmo grupo empresarial, nos termos do CDC. 2. A ausência de registro da cláusula de alienação fiduciária afasta a incidência da Lei nº 9.514/1997 e impõe a aplicação do CDC. 3. Em rescisão contratual por iniciativa do comprador, é válida a retenção de 10% dos valores pagos, com devolução imediata do saldo remanescente.” Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 7º e 25; CC, art. 421-A; Lei nº 9.514/1997, art. 23. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.987.389/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 30.08.2022; STJ, AgInt nos EDcl no REsp nº 2.014.411/SP, Rel. Min. Ricardo Cueva, 3ª Turma, j. 14.08.2023; TJMT, RAC nº 1014779-31.2023.8.11.0041, Rel. Des. Márcio Vidal, 5ª Câmara de Direito Privado, j. 01.04.2025. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação cível interposto por BRDU Urbanismo S.A., em face da r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, que nos autos da ação de rescisão contratual e restituição de quantias pagas c/c tutela de urgência, movida por Jamire Abdala de Queiroz e Murilo Máfia Martins, julgou procedente os pedidos iniciais, para declara a rescisão do contrato firmado entre as partes, condenando a ré a promover a restituição no valor de R$ 37.380,60 (trinta e sete mil trezentos e oitenta reais e sessenta centavos), devidamente corrigida, além do pagamento das custas e despesas processuais, e honorários advocatícios fixado em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85,§2º do CPC. Inconformado, o apelante suscita, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, alegando que o contrato foi firmado com BRDU SPE Cuiabá 01 Ltda., e não com a BRDU Urbanismo S/A. No mérito, alega a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, argumentando que o contrato se encontra sob o regime da Lei 9.514/97 (alienação fiduciária), o que impediria a rescisão judicial e a restituição direta de valores. Não obstante, subsidiariamente, sustenta a desproporcionalidade na fixação da cláusula penal em 10%, pugnando pela majoração para 25%, conforme precedentes do STJ e o parcelamento da devolução dos valores em 12 vezes, como medida de equilíbrio financeiro e garantia da continuidade da atividade empresarial. Ao final, requer a reforma da sentença. Os apelados apresentaram contrarrazões (id. 280522876), pugnando pelo desprovimento do apelo. É o relatório. Inclua-se na pauta. Cuiabá, 28 de maio de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator V O T O R E L A T O R Cinge-se dos autos que Jamire Abdala de Queiroz ajuizou ação de rescisão contratual c/c com restituição de quantias pagas e pedido de tutela de urgência, em face da empresa BRDU Urbanismo S/A, relatando que, em 05 de outubro de 2013, firmou com a requerida um Instrumento Particular de Compra e Venda de Imóvel com Financiamento Imobiliário e Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária, visando à aquisição do lote de terreno urbano nº 39, quadra 06, no Loteamento Residencial Mirante do Parque, situado na cidade de Cuiabá/MT. Afirma que o contrato previa o pagamento do preço no valor de R$ 27.985,65 (vinte e sete mil novecentos e oitenta e cinco reais e sessenta e cinco centavos), mediante sinal composto por 03 (três) parcelas de R$ 241,66, além de 144 (cento e quarenta e quatro) parcelas mensais no valor unitário de R$ 346,26, corrigidas anualmente pelo IGP-M. Alega que efetuou o pagamento regular de 92 parcelas, o que, somado ao valor da entrada, perfaz o total de R$ 41.533,99. Todavia, em razão da grave crise econômica advinda da pandemia da COVID-19 e do acentuado aumento inflacionário, sobretudo do IGP-M, passou a enfrentar severas dificuldades financeiras que inviabilizaram a continuidade do cumprimento do contrato. Aduz, inclusive, que tentou negociar amigavelmente a rescisão com a ré, mas a empresa se mostrou desinteressada em formalizar distrato ou proposta razoável de devolução dos valores pagos. Diante disso, postulou pela concessão da tutela de urgência para a imediata suspensão da exigibilidade das parcelas vencidas e vincendas, a exclusão ou abstenção de inscrição de seu nome nos órgãos de restrição ao crédito, bem como o impedimento de consolidação da propriedade do imóvel em nome da requerida. Ao final, requer a procedência da ação, com a rescisão do contrato, restituição de valores, condenação da requerida em custas e honorários, e a confirmação da tutela antecipada, por sentença definitiva. Após o devido processo legal, o douto magistrado a quo reconheceu que, embora o contrato celebrado entre as partes contivesse cláusula de alienação fiduciária, não houve registro no Cartório de Registro de Imóveis, o que impede a incidência da Lei nº 9.514/1997 e autoriza a aplicação do CDC, considerando, ainda, que a parte autora manifestou desistência do contrato por motivos financeiros supervenientes, sem que se configurasse inadimplemento ou mora, Diante disso, afastou a aplicação do Tema 1095 do STJ e da sistemática da propriedade fiduciária, reconhecendo o direito à rescisão contratual com devolução imediata de 90% dos valores pagos, retendo-se 10% a título de cláusula penal, além da condenação da ré ao pagamento de custas e honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor da condenação (id. 280522864). Inconformado, o apelante suscita, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, alegando que o contrato foi firmado com BRDU SPE Cuiabá 01 Ltda., e não com a BRDU Urbanismo S/A. No mérito, alega a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, argumentando que o contrato se encontra sob o regime da Lei 9.514/97 (alienação fiduciária), o que impediria a rescisão judicial e a restituição direta de valores. Subsidiariamente, sustenta a desproporcionalidade na fixação da cláusula penal em 10%, pugnando pela majoração para 25%, conforme precedentes do STJ e o parcelamento da devolução dos valores em 12 vezes, como medida de equilíbrio financeiro e garantia da continuidade da atividade empresarial. Ao final, requer a reforma da sentença. Pois bem. Inicialmente, quanto à tese de ilegitimidade passiva da BRDU Urbanismo S/A., adianto que não deve ser acolhida. Explico. A questão, como bem analisada na decisão saneadora (id. 280522858), evidencia a inserção da empresa recorrente na cadeia de fornecimento, presumindo fazer parte do mesmo grupo econômico, conduzindo à legítima expectativa do consumidor quanto à vinculação da empresa à obrigação. A propósito: “A ilegitimidade passiva, realmente, a BrDU Urbanismo S/A não consta como promitente vendedora do imóvel. Ocorre que, consoante defende a Autora, a Requerida participou da cadeia de serviços, tanto é que sua logomarca aparece em quase todos os documentos juntados pela parte autora, o que faz presumir ser do mesmo grupo econômico, justificando a sua legitimidade, à luz da Teoria da Aparência, já que, ao contratar a aquisição do lote de terras, a parte autora foi induzida a crer que todas as empresas garantiam o negócio demonstrando mais confiança na entrega do bem.” (id. 280522858). Tal entendimento encontra amparo no ordenamento jurídico, especialmente nos artigos 7º, parágrafo único, e 25, §1º, do Código de Defesa do Consumidor, que consagram a responsabilidade solidária entre os integrantes da cadeia de fornecimento, inclusive entre empresas do mesmo conglomerado, quando partícipes da relação de consumo. Nesse sentido, em casos semelhantes, já decidiu este Tribunal: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESCISÃO CONTRATUAL E RESTITUIÇÃO DE QUANTIAS PAGAS – CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA – MÉRITO - DISTRATO POR PARTE DA PROMITENTE COMPRADORA – SÚMULA 543 STJ - RETENÇÃO DE 10% DOS VALORES PAGOS - INAPLICABILIDADE DA LEI 9.514/97 – PREVALÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - JUROS DE MORA – TERMO INICIAL – TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA – TEMA 1002 STJ – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. In casu, não há dúvidas sobre a legitimidade passiva da apelante, uma vez que também integrou a cadeia negocial e faz parte do mesmo grupo empresarial. (...)” (RAC n.º 1009993-41.2023.8.11.0041, Terceira Câmara, Rel. Desa. Antonia Siqueira Goncalves, j. 07.08.2024 – destaquei). DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. GRUPO ECONÔMICO. REJEIÇÃO. RESCISÃO CONTRATUAL POR INICIATIVA DO COMPRADOR. RETENÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO. PACTO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA SEM REGISTRO. INEFICÁCIA. RECURSO DESPROVIDO. (...) "1. É legítima a inclusão de empresa pertencente ao mesmo grupo econômico no polo passivo da ação de rescisão contratual, nos termos do CDC. (...).” (RAC n.º 1014779-31.2023.8.11.0041, Quinta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 01.04.2025 – destaquei). Assim, afasto a preliminar. Superada essa questão, a vexata quaestio reside em averiguar qual legislação deve ser aplicada na lide, que visa a resolução do contrato firmado entre as partes, além do percentual de retenção. Inicialmente, cumpre esclarecer que, nos termos do art. 23 da Lei nº 9.514/1997, a constituição da propriedade fiduciária de bem imóvel depende de registro no competente Cartório de Registro de Imóveis: “Art. 23. Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título.” § 1º. Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel.” Logo, evidente que o registro não possui apenas função publicitária. Trata-se de elemento constitutivo da garantia real fiduciária. Assim, na ausência do registro, não há constituição válida da propriedade fiduciária, o que afasta por completo o regime jurídico da Lei nº 9.514/1997, inclusive os arts. 26 e 27, que tratam da consolidação da propriedade e do procedimento de leilão. Nesse sentido: “CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL C/C PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DAS QUANTIAS PAGAS. CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. AUSÊNCIA DE REGISTRO NO COMPETENTE REGISTRO DE IMÓVEIS. GARANTIA NÃO CONSTITUÍDA. ART. 23 DA LEI Nº 9.514/1997. PROCEDIMENTO PREVISTO NO ARTS. 26 E 27 DA LEI Nº 9.514/1997. NÃO APLICAÇÃO. RESCISÃO DO CONTRATO PELO ADQUIRENTE COM RESTITUIÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO. POSSIBILIDADE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA. (...) 4. No regime especial da Lei nº 9.514/97, o registro do contrato no competente Registro de Imóveis tem natureza constitutiva, sem o qual a propriedade fiduciária de coisa imóvel e a garantia dela decorrente não se perfazem. 5. Na ausência do registro que prevê o art. 23 da Lei nº 9.514/1997, não há constituição da propriedade fiduciária de coisa imóvel, tampouco haverá consolidação da propriedade em nome do credor na hipótese de inadimplência, razão pela qual não incidem os arts. 26 e 27 da Lei nº 9.514/1997, podendo o adquirente pleitear a rescisão do ajuste, com a restituição dos valores pagos, sem precisar se submeter ao procedimento previsto nestes dispositivos. 6. Hipótese em que, embora o contrato tenha sido celebrado em 20/11/2017, na data do ajuizamento da ação pelo adquirente do imóvel (21/10/2020), pleiteando a rescisão do contrato, não havia o registro deste no competente Registro de Imóveis, razão pela qual a garantia fiduciária não tinha se constituído e o adquirente - recorrido - tinha o direito de rescindir o ajuste, com a restituição de parte do valor pago, sem a necessidade de se submeter ao procedimento previsto no art. 27 da Lei nº 9.514/1997. 7. Recurso especial conhecido e não provido.” (REsp n.º 1.987.389/SP, Terceira Turma, relatora Ministra Nancy Andrighi, j. 30.08.2022 – destaquei). Embora haja nos autos notícia de notificação extrajudicial encaminhada pela própria parte ré à autora, tal comunicação, por si só, não é suficiente para ensejar os efeitos jurídicos próprios do regime da alienação fiduciária, nos moldes da Lei n.º 9.514/1997. Isso porque, além de não ter sido expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis competente, como exige o §1º do art. 26 da referida norma, também não houve o prévio registro do contrato de alienação fiduciária na matrícula do imóvel, conforme determina o seu art. 23. Ausente, portanto, os requisitos legais, mostra-se inaplicável o rito da consolidação da propriedade e do leilão extrajudicial, devendo prevalecer, no caso concreto, a disciplina do Código de Defesa do Consumidor. In casu, a parte autora é consumidora final de lote urbano para fins residenciais, enquanto a requerida figura como fornecedora de produto imobiliário, nos termos dos arts. 2º e 3º do CDC. A hipossuficiência técnica e econômica da parte autora é manifesta, impondo-se, portanto, a incidência do regime protetivo do consumidor. A propósito, segue a jurisprudência, confira: “AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA. RESCISÃO. FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. CLÁUSULA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. LEI Nº 9.514/1997. REGISTRO DO CONTRATO. IMPRESCINDIBILIDADE. 1. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça tem firme jurisprudência no sentido de que necessário o registro do contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária no competente Registro de Imóveis para a constituição da propriedade e garantia fiduciárias e aplicação das regras previstas na Lei nº 9.514/1997 em caso de inadimplência do devedor. 2. Na espécie, não foi realizado o registro do contrato, motivo pelo qual a garantia fiduciária não tinha se constituído e o adquirente/agravado tinha o direito de rescindir o ajuste sem a necessidade de se submeter ao procedimento previsto no artigo 27 da Lei nº 9.514/1997. 3. Agravo interno não provido.” (AgInt nos EDcl no REsp n. 2.014.411/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 14.8.2023 – destaquei). “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA COM GARANTIA EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CDC. APLICAÇÃO. CONSTITUIÇÃO EM MORA. REGISTRO. ACOLHIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. 1. O entendimento do tribunal de origem está em consonância com a jurisprudência desta Corte no sentido de que quando o devedor não for constituído em mora e quando não houver registro do contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária deve ser afastado o regime especial da Lei nº 9.514/1997, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor. (...).” (STJ, AgInt no AREsp: 2647833/SP, Terceira Turma, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 14.10.2024 - destaquei). “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM FAVOR DA PRÓPRIA VENDEDORA. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 9.514/1997. AFASTAMENTO DO TEMA 1095 DO STJ. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RECURSO DESPROVIDO. (...) Tese de julgamento: 1. Alienação fiduciária instituída em favor da própria vendedora em contrato de compra e venda direta de imóvel não se submete ao regime da Lei nº 9.514/1997. 2. O Tema 1095 do STJ somente se aplica a contratos com típico financiamento imobiliário com terceiro mutuante e registro imobiliário prévio. 3. Em tais hipóteses, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, permitindo a resolução contratual e a restituição das parcelas pagas, com retenção moderada.” (RAC n.º 1033571-67.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Desa. Serly Marcondes Alves, j. 02.04.2025 – destaquei). “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE REGISTRO. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 9.514/97. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESCISÃO CONTRATUAL. RETENÇÃO DE PARTE DOS VALORES PAGOS. JUROS DE MORA. INCIDÊNCIA A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) Tese de julgamento: A ausência de registro do contrato de compra e venda com cláusula de alienação fiduciária impede a constituição da propriedade fiduciária, afastando a incidência da Lei nº 9.514/97 e permitindo a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Em caso de rescisão contratual por iniciativa do comprador, admite-se a retenção de percentual razoável dos valores pagos, conforme jurisprudência do STJ, para evitar prejuízos ao vendedor. Nos compromissos de compra e venda de imóveis anteriores à Lei nº 13.786/2018, os juros de mora sobre os valores a serem restituídos ao comprador incidem a partir do trânsito em julgado da decisão.” (RAC n.º 1027898-50.2021.8.11.0002, Quinta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Marcos Regenold Fernandes, j. 11.02.2025 - destaquei). Diante da rescisão por vontade da própria parte autora, comprovada pela notificação extrajudicial id. 280521426, a jurisprudência inclina-se no sentido de que é lícita a rescisão contratual por iniciativa do promitente comprador, e que a devolução dos valores pagos deve ser imediata, com retenção moderada, como forma de compensar a parte vendedora pelas despesas administrativas e eventuais perdas, conforme prescreve a Súmula 543 do STJ: “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.” Sendo assim, o c. STJ tem autorizado que a promitente vendedora retenha o percentual de 10% a 25% do valor pago, quando a rescisão ocorrer por culpa do promissário comprador, confira, verbis: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESOLUÇÃO. RETENÇÃO. PERCENTUAL DE 10%. RAZOABILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte de Justiça, nas hipóteses de rescisão de contrato de promessa de compra e venda por inadimplemento do comprador, tem admitido a flutuação do percentual de retenção pelo vendedor entre 10% a 25% do total da quantia paga. 2. O percentual a ser retido pelo vendedor é fixado pelas instâncias ordinárias em conformidade com as particularidades do caso concreto, de maneira que não se mostra adequada sua revisão na via estreita do recurso especial. 3. O Tribunal de origem, ao analisar os documentos acostados aos autos, bem como o contrato firmado entre as partes, entendeu abusiva a cláusula contratual que previa a retenção de 25% do valor das quantias pagas em caso de rescisão por inadimplemento. Analisando as peculiaridades do caso, fixou a retenção em 10% do valor das parcelas pagas, o que não se distancia do admitido por esta Corte Superior. 4. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp n. 600.887/PE, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 19.05.2015 – negritei). Nessa trilha, o d. magistrado agiu com o costumeiro acerto ao determinar a retenção de 10% (dez por cento) do valor efetivamente pago pelos promissários compradores, estando de acordo com o entendimento jurisprudencial pacificado pelo c. STJ, reafirmo, não havendo motivo plausível para sua majoração consoante pleiteado pelo recorrente. Assim, a fixação da retenção em 10% do valor pago revela-se razoável, proporcional e em conformidade também com a jurisprudência deste Tribunal em caso semelhante, confira: “DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. GRUPO ECONÔMICO. REJEIÇÃO. RESCISÃO CONTRATUAL POR INICIATIVA DO COMPRADOR. RETENÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO. PACTO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA SEM REGISTRO. INEFICÁCIA. RECURSO DESPROVIDO. (...) "1. É legítima a inclusão de empresa pertencente ao mesmo grupo econômico no polo passivo da ação de rescisão contratual, nos termos do CDC. 2. É válida a fixação do percentual de retenção em 10% dos valores pagos em rescisão contratual por iniciativa do comprador, quando não demonstrado prejuízo excepcional ao vendedor. 3. O pacto de alienação fiduciária é ineficaz sem o devido registro no Cartório de Registro de Imóveis." (RAC n.º 1014779-31.2023.8.11.0041, Quinta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 01.04.2025 – destaquei). Por outro lado, quanto à devolução em parcela única, inexiste justificativa plausível para o parcelamento em 12 vezes, como pretende o recorrente, especialmente diante da duração do contrato, do valor pago e da ausência de prova de que o ressarcimento integral comprometeria a saúde financeira da empresa requerida. Portanto, por estes termos e estribado nessas razões, tenho que a r. sentença está em consonância com a legislação pátria, doutrina e jurisprudência, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos. De outra banda, deixo de majorar os honorários advocatícios (art. 85, §11), mormente porque já fixados no teto estabelecido no art. 85, § 2º, do CPC. Posto isso, conheço do recurso e lhe NEGO PROVIMENTO. Cuiabá, 28 de maio de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 28/05/2025

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Processo nº 1005334-39.2024.8.11.0013

ID: 256550152

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1005334-39.2024.8.11.0013

Data de Disponibilização: 15/04/2025

Polo Ativo:

CENTRAL NACIONAL DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS- (ASSOCIACAO SANTO ANTONIO)

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

FRANCISCO DE ASSIS SALES NETO

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1005334-39.2024.8.11.0013 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Abatimento prop… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1005334-39.2024.8.11.0013 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Abatimento proporcional do preço, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [BALBINA JULIA ALVARES - CPF: 175.901.081-20 (APELADO), FARES AQUINO DOS SANTOS - CPF: 053.799.471-82 (ADVOGADO), CENTRAL NACIONAL DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS- (ASSOCIACAO SANTO ANTONIO) - CNPJ: 23.490.345/0001-76 (APELANTE), FRANCISCO DE ASSIS SALES NETO - CPF: 074.653.713-17 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – PRELIMINAR DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE REJEITADA – MÉRITO - COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONTRATAÇÃO – COBRANÇA INDEVIDA – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – MERO DISSABOR – SENTENÇA PARCIALMENTE RETIFICADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. Não há falar em violação ao princípio da dialeticidade, visto que a apelante rebateu os termos da sentença, expondo os motivos para alteração da decisão. Deve ser mantida a sentença recorrida no tocante a ilegalidade dos descontos relativos à “Contribuição Cenap/Asa”, não solicitados/contratados pela parte autora, todavia, a restituição deve ocorrer na forma simples, ante a ausência de comprovação da má-fé. Todavia, a cobrança de serviços não contratados, por si só, não enseja a reparação por dano moral, sem demonstração de efetivo dano extrapatrimonial, representando mero dissabor. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1005334-39.2024.8.11.0013 APELANTE: CENTRAL NACIONAL DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS (ASSOCIAÇÃO SANTO ANTÔNIO) APELADA: BALBINA JULIA ALVARES RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por CENTRAL NACIONAL DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS (ASSOCIAÇÃO SANTO ANTÔNIO) contra sentença proferida pelo MM. Juiz da 2ª Vara Cível da Comarca de Pontes e Lacerda/MT, Dr. Ítalo Osvaldo Alves da Silva, lançada nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica cumulada com Repetição de Indébito e Indenização por Danos Materiais e Morais, ajuizada por BALBINA JULIA ALVARES, que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, e declarou a inexistência da relação jurídica estabelecida no contrato acostado aos autos; condenou a requerida a devolução em dobro dos valores descontados do benefício previdenciário da autora, com a incidência de juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária pelo índice INPC, a partir de cada desconto realizado (Súmula 43, STJ); condenou a requerida ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a título de danos morais, corrigidos pelo INPC, desde a publicação da sentença (Súmula n. 362, do STJ) e com juros de mora de 1% ao mês, desde o evento danoso (celebração do contrato fraudulento) Súmula n. 54, do STJ e condenou o réu ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor do benefício econômico obtido pela parte autora, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, todavia suspendeu a exigibilidade, tendo em vista a gratuidade da justiça concedida à parte autora. Inconformada, a parte apelante sustenta, inicialmente, em suas razões que o recurso seja recebido também no seu efeito suspensivo, em razão do preenchimento dos requisitos ensejadores para tanto (fumus boni iuris e pericullum in mora). Discorre que “a validação da biometria, o próprio sistema gera uma assinatura desenhada; ou seja, não é a parte quem assina o documento, mas sim o sistema após a extração e validação da biometria facial – de tal forma, qualquer alegação quanto à uma invalidade de assinatura é incorreta” (sic). Argumenta que “o caso em análise, não há evidências nos autos que comprovem que a apelada tenha experimentado qualquer tipo de abalo extrapatrimonial, humilhação, vexame, ou sofrimento relevante. A alegação de descontos indevidos em seu benefício previdenciário, embora apresentada, não tem impacto suficiente para afetar seus direitos subjetivos ou causar sofrimento psicológico” (sic). Discorre que “ante a ausência de provas concretas de danos morais, combinada com a inexistência de má-fé por parte da apelante, justifica-se a rejeição do pedido de indenização. Portanto, dada a falta de correspondência entre o direito e os fatos, a improcedência do pedido é o que se pede. Entretanto, afirma que “mesmo que se entenda que houve cobrança indevida e que o CDC se aplica à discussão em questão, o que se cogita por extrema cautela processual, cumpre ressaltar que o deferimento do pedido de devolução em dobro pressupõe a demonstração de conduta contrária à boa-fé objetiva por parte da requerida, comprovando a prática de má-fé pela promovida, ônus do qual, inequivocamente, a parte apelada não se desincumbiu” (sic). A par desses argumentos, pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial, e caso for mantida a condenação, requer a redução do quantum indenizatório, em consonância com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade; bem como, que a restituição ocorra de forma simples, ante a ausência de comprovação da má-fé, requerendo, ao final, a condenação da parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais, no percentual de 20% sobre o valor da causa, conforme o disposto no art. 85 do Código de Processo Civil (Id. 270163888). A parte apelada ofertou as contrarrazões, arguindo, em preliminar sobre a Violação ao Princípio da Dialeticidade, ante a ausência de impugnação específica dos fundamentos da decisão recorrida, e no mérito, pugna pelo desprovimento do recurso, requerendo, ao final, pela majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, em razão do trabalho adicional realizado em sede recursal, fixando-os em 20% sobre o valor da condenação (Id. 270163896). A apelante é beneficiária da justiça gratuita (Id. 271386873). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Conheço do recurso de apelação, ante a presença dos pressupostos de admissibilidade. Inicialmente, a parte requerida/apelante pleiteia que o apelo seja recebido também pelo efeito suspensivo, em razão da presença do periculum in mora e o fumus boni iuris ensejadores para tanto. Entretanto, quanto ao efetivo pleito de atribuição do efeito suspensivo ao recurso interposto, não vejo como conferir-lhe guarida, considerando o disposto no art. 1.012 do CPC, em seus §§ 1º, III e §3, I e II, preleciona o seguinte: “Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1º Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: (...) § 3º O pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1º poderá ser formulado por requerimento dirigido ao: I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação.” Da leitura do supracitado dispositivo processual, evidencia-se que o pedido de atribuição de efeito suspensivo em recurso de apelação deve ser formulado por petição autônoma, dirigida ao tribunal, ou, quando já distribuído o recurso, ao relator, também por petição própria, e não como preliminar recursal, tal qual o caso em tela, o que obsta seu reconhecimento. Nesse sentido, colaciono entendimentos desta Corte de Justiça e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, in verbis: “TRIBUTÁRIO – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – EXECUÇÃO FISCAL – PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – NÃO CONHECIDO - SISTEMÁTICA PARA CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – TERMO INICIAL DO PRAZO DE SUSPENSÃO – PRIMEIRA INTIMAÇÃO ACERCA DA NÃO LOCALIZAÇÃO DE BENS OU DO DEVEDOR – INTIMAÇÃO OBSERVADA NO FEITO – INÉRCIA DA FAZENDA PÚBLICA POR MAIS DE 5 (CINCO) ANOS APÓS INÍCIO DO RESPECTIVO PRAZO PRESCRICIONAL - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. “O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação depende de procedimento próprio, consubstanciado na formulação de requerimento autônomo dirigido ao tribunal, restando inviável o exame do pedido efetuado no próprio recurso de apelação.” (N.U 1010000-67.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/11/2022, Publicado no DJE 13/12/2022).” (N.U 0016170-29.2009.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Público, Relator: Edson Dias Reis, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, julgado em 14/02/2023, publicado no DJE 24/02/2023) (grifei) “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINARES. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO. ARTIGO 375-A DO TJMG. NÃO CONHECIDO. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DA JUSTIÇA. REJEIÇÃO. MÉRITO. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. DESCONTO DE PRESTAÇÕES SUPERIOR A 30% DOS PROVENTOS DA AUTORA. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS CONSIGNADOS. IMPOSSIBILIDADE. TEMA 1.085 DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. - O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. - O benefício da justiça gratuita somente pode ser revogado se o impugnante demonstrar, de forma cabal, que o beneficiário detém capacidade financeira, o que não ocorreu no presente caso. - Nos termos do que foi decidido no Tema 1.085, do STJ, deve ser obedecido o limite de 30% de descontos dos proventos nos empréstimos consignados. - Deve-se manter a sentença que determinou a limitação dos descontos no benefício previdenciário da apelada em 30% (trinta por cento), diante do caráter alimentar dessa verba.” (TJMG - Apelação Cível 1.0000.23.231925-1/001, Relator(a): Des.(a) Aparecida Grossi, 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 21/02/2024, publicação da súmula em 21/02/2024) (grifei) Desse modo, resta inviável o exame do pedido formulado na própria apelação, razão pelo qual não conheço do pedido, diante da manifesta inadequação da via eleita. Ademais, a parte apelada suscitou em contrarrazões, o não conhecimento do recurso de apelação por ofensa à dialeticidade, contudo tal alegação não merece prosperar, visto que o entendimento dominante do STJ é no sentido de que a mera reprodução dos termos da exordial, ou mesmo da contestação, não acarretam tal violação, desde que seja possível verificar que as questões decididas na sentença foram devidamente impugnadas, como ocorre na espécie, pelo que rejeito a preliminar. Quanto ao mérito, cinge-se dos autos que BALBINA JULIA ALVARES ajuizou a presente ação em desfavor da CENTRAL NACIONAL DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS (ASSOCIAÇÃO SANTO ANTÔNIO), alegando, em síntese, que é aposentada por idade rural (NB 166.390.040-7), recebendo benefício no valor de um salário-mínimo, conforme extrato previdenciário anexo (Id. 270162892 - pág. 3). Afirma que notou diminuição em seu benefício, e ao retirar o extrato constatou descontos indevidos a partir da competência do mês de julho de 2024. Sustenta que a partir do mês de julho de 2024 até a presente data, foi descontado mensalmente o valor de R$ 28,24 (vinte e oito reais e vinte e quatro centavos), a título de “CONTRIB. CENAP/ASA”, e alega que esses descontos realizados não foram autorizados por ela, que jamais contratou com a referida empresa, das quais desconhece totalmente sua origem e ramo de atividade. A par desses argumentos, pugna na exordial pela procedência dos pedidos, no sentido de declarar inexistente a relação jurídica, diante da não contratação dos serviços e a inexistência da dívida, a condenação da requerida ao pagamento da indenização por danos morais e a restituição em dobro. Após regular tramitação do feito, sobreveio a sentença aqui hostilizada, na qual o magistrado a quo julgou procedentes os pedidos formulados na inicial e declarou a inexistência da relação jurídica estabelecida no contrato acostado aos autos; condenou a requerida a devolução em dobro dos valores descontados do benefício previdenciário da autora, com a incidência de juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária pelo índice INPC, a partir de cada desconto realizado (Súmula 43, STJ). Ainda, condenou a requerida ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a título de danos morais, acrescido dos consectários legais. Inconformada, a parte apelante recorre com o presente apelo, sob o argumento de que a parte autora teve ciência da contratação e que não houve ato ilícito passível de dano moral e que não há se falar em restituição na forma dobrada. A par desses argumentos, pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial, e caso for mantida a condenação, requer a redução do quantum indenizatório, bem como, que a restituição ocorra de forma simples, ante a ausência de comprovação da má-fé, requerendo, ao final, a condenação da parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais, no percentual de 20% sobre o valor da causa, conforme o disposto no art. 85 do Código de Processo. Pois bem. É patente que o caso se submete às regras do direito consumerista, pelo qual, responde a parte requerida/apelante, objetivamente, como fornecedora de serviços, pelos danos causados ao consumidor (art. 14 do CDC), independentemente da perquirição da existência de sua culpa. Assim, tendo a parte autora alegado fato negativo, qual seja, a inexistência da relação jurídica, bem como do débito, impõe-se a parte requerida o ônus de comprovar a origem e regularidade da cobrança efetuada, de modo a legitimar a sua conduta e eximir-se da obrigação de indenizar por eventuais danos dela decorrentes (art. 373, inciso II, do CPC). É fato incontroverso nos autos que a requerida/apelante realizou débitos no benefício previdenciário da parte autora/apelada, denominado “Contribuição Cenap/Asa”, no valor de R$ 28,24 (vinte e oito reais e vinte e quatro centavos), conforme Id. 270162892 – pág. 03, e alega a autora que esses descontos realizados não foram autorizados por ela, que desconhece. Por sua vez, a requerida/apelante, em sua defesa, sustenta que houve legalidade da contratação, e junta a ficha de filiação e o termo de desfiliação, ambos anexados nos Ids. 270163862 - pág. 01 à 03 e Id. 270163863 Compulsando detidamente os autos, e para evitar tautologia, a questão foi muito bem dirimida pelo togado singular, o qual peço as máximas vênias para transcrever seus fundamentos a subsidiar o fundamento do reconhecimento da irregularidade perpetrada, em vista da cobrança indevida, e, com isso, declarar a inexigibilidade do débito discutido nestes autos, ipsis litteris: “(...) O pleito da parte autora se funda na falha da prestação do serviço, configurada pela realização de um contrato de filiação a uma entidade sem fins lucrativos (ID 178231843), por meio do qual foram realizados descontos indevidos em seu benefício previdenciário. No caso concreto a parte autora questiona a existência e validade do negócio jurídico, aduzindo que: “[...] a parte Requerente não celebrou o referido contrato de empréstimo sobre cartão consignado”. A parte requerida, no entanto, juntou aos autos o contrato firmado com a parte autora ID 178231843. Em contrapartida, a proponente impugnou o documento, alegando que a assinatura aposta no contrato não é autêntica, de modo que a formalização de negócio jurídico não é legítima (ID 178632794). Destaque-se, nesse ponto, que as declarações constantes em documento particular presumem-se verdadeiras em relação àquele que o subscreve, salvo os casos em que impugnada sua autenticidade e não for comprovada a veracidade, na forma expressa no art. 428 do Código de Processo Civil. Por sua vez, o artigo 429, inciso II, do referido diploma legal, elenca que o ônus da prova, tratando-se de alegação de falsidade da assinatura aposta, incube àquele que produziu o documento assinado. Nessa senda, na forma dos dispositivos citados, havendo a autora impugnado a autenticidade da assinatura constante no contrato, competia a requerida fazer prova da lidimidade do documento. (...) Apesar disso, na oportunidade que lhe cabia, a requerida deixou de comprovar a autenticidade da assinatura lançada no contrato, tendo pleiteado pelo julgamento antecipado do feito (ID 181351705). Nesse diapasão, insta salientar que a demandada não se desincumbiu a contento do ônus que lhe incumbia, especificamente a prova concreta de que a parte autora teria contratado os seus serviços. Assim sendo, de rigor o reconhecimento de que o contrato de ID 178231843 não foi firmado pela autora, o que implica a inexistência do negócio jurídico” (Id. 270163883). Logo, diante da alegação de falsidade da assinatura aposta, incumbe àquele que produziu o documento assinado comprovar a legitimidade do mesmo, o que não foi realizado nos autos, de modo que acertada a sentença quanto ao acolhimento do pedido da requerente quanto a declaração de inexistência do débito a título de “Contribuição Cenap/Asa”. A propósito, segue jurisprudência deste Tribunal de Justiça: “APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – DESCONTO REALIZADO NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO AUTOR - CONTRIBUIÇÃO CENTRAPE - AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO - RESTITUIÇÃO DEVIDA NA FORMA SIMPLES - AUSÊNCIA DO DEVER DE REPARAR POR DANOS MORAIS – RECURSO NÃO PROVIDO. Se o desconto realizado no benefício previdenciário do autor não foi autorizado, é devida a restituição do montante pago indevidamente na forma simples, uma vez que não identificada má-fé na cobrança. O autor não faz jus à indenização por danos morais, se a situação não ultrapassou o mero inadimplemento contratual”. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1026932-67.2021.8.11.0041, Relator: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Data de Julgamento: 12/06/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 14/06/2024). “REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - LANÇAMENTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO A TÍTULO DE “CONTRIBUIÇÃO CONAFER” – DESCONTOS INDEVIDOS – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL INEXISTENTE – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. No caso, houve o desconto indevido na folha de pagamento do benefício previdenciário, ante a inexistência do débito, razão pela qual deve haver a restituição dos valores, acrescido de juros e correção monetária. O entendimento dominante no c. STJ é no sentido de admitir a repetição do indébito na forma simples, devidamente atualizado, e não em dobro, salvo comprovada má-fé, o que não restou comprovado na hipótese em voga. Não há que se falar em dano moral in re ipsa em razão de cobrança indevida, quando inexistir ato restritivo de crédito ou inscrição em cadastro de inadimplentes. Precedentes do STJ. Recurso desprovido”. (TJMT, Ap nº 10000362020228110051, 3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 22-11-2023, sem grifos no original). Dessa forma, não restando evidenciada a conduta maliciosa da requerida, os valores que tenham sido indevidamente cobrados devem ser devolvidos na forma simples, sendo que, nesse ponto, merece ser acolhida a pretensão da parte requerida/apelante e retificada a sentença nesse ponto. No que tange a indenização, cumpre dizer que o dano moral diz respeito ao prejuízo decorrente da dor imputada a uma pessoa, em razão de atos que, indevidamente, ofendem seus sentimentos de honra e dignidade, que provocam mágoa e atribulações na esfera interna pertinente à sensibilidade moral. Há de se considerar ainda que o dano moral diz respeito à violação dos direitos referentes à dignidade humana, a doutrina especializada e a jurisprudência dominante vêm entendendo que a consequência do dano encontra-se ínsita na própria ofensa, porquanto deflui da ordem natural das coisas, tomando-se como parâmetro a vida comum das pessoas ou empresa. Entretanto, apesar do possível transtorno suportado pela parte autora/apelada ao tentar resolver o problema criado pela associação, ora apelante, referente à cobrança de valores não contratados, a jurisprudência tem se firmado no sentido de que suposto ilícito contratual não é capaz, por si só, de ensejar danos morais indenizáveis. Inclusive, no mesmo sentido, segue julgados deste Tribunal: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – COBRANÇA NA APOSENTADORIA – CONTRIBUIÇÃO SINDICAL – DÉBITO DECLARADO INEXISTENTE – RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO – NA FORMA SIMPLES – MÁ-FÉ NÃO EVIDENCIADA – DANO MORAL – NÃO CONFIGURADO – AUSENTES OS PRESSUPOSTOS CARACTERIZADORES DO PREJUÍZO MORAL INDENIZÁVEL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Diante do desconto indevido na folha de pagamento do benefício previdenciário e tendo em vista o reconhecimento da inexistência do débito, deve haver a restituição dos valores, acrescido de juros e correção monetária. O entendimento dominante no c. STJ é no sentido de admitir a repetição do indébito na forma simples, devidamente atualizado, e não em dobro, salvo comprovada má-fé, o que não restou comprovado na hipótese em voga. A cobrança injustificada não configura, por si só, o dano moral. Ademais, se não demonstrados os requisitos caracterizadores da reparação civil, não é cabível a indenização a título de dano moral. Destarte, o c. STJ possui entendimento pacificado de que “não há falar em dano moral “in re ipsa” em virtude de cobrança indevida, quando inexistente ato restritivo de crédito ou inscrição em cadastro de inadimplentes.” (STJ, AgInt no AREsp n. 1682299/MT, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 21.09.2020)”. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10385861720228110041, Relator: SERLY MARCONDES ALVES, Data de Julgamento: 21/02/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 23/02/2024). Conquanto os fatos relatados na inicial possam ter causado aborrecimentos a parte autora, não há falar-se em ocorrência de dano moral, configurando tão-somente incômodo inerente à vida em sociedade, notadamente se não ocorreu fato capaz de gerar constrangimento. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, para retificar em parte a sentença determinando que a requerida proceda com a restituição dos valores descontados indevidamente, na forma simples e julgar improcedente a pretensão inicial quanto à condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais. Por consequência, considerando a sucumbência recíproca, as custas processuais e os honorários advocatícios deverão ser suportados por ambas as partes, pro rata, sendo o percentual dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado dado a causa, cuja exigibilidade em relação a autora fica suspensa por ser beneficiária da gratuidade da justiça, consoante previsão contida no art. 98, §3º do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/04/2025

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Processo nº 1005334-39.2024.8.11.0013

ID: 256550154

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1005334-39.2024.8.11.0013

Data de Disponibilização: 15/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BALBINA JULIA ALVARES

Acórdão

Advogados:

FARES AQUINO DOS SANTOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1005334-39.2024.8.11.0013 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Abatimento prop… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1005334-39.2024.8.11.0013 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Abatimento proporcional do preço, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [BALBINA JULIA ALVARES - CPF: 175.901.081-20 (APELADO), FARES AQUINO DOS SANTOS - CPF: 053.799.471-82 (ADVOGADO), CENTRAL NACIONAL DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS- (ASSOCIACAO SANTO ANTONIO) - CNPJ: 23.490.345/0001-76 (APELANTE), FRANCISCO DE ASSIS SALES NETO - CPF: 074.653.713-17 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – PRELIMINAR DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE REJEITADA – MÉRITO - COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONTRATAÇÃO – COBRANÇA INDEVIDA – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – MERO DISSABOR – SENTENÇA PARCIALMENTE RETIFICADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. Não há falar em violação ao princípio da dialeticidade, visto que a apelante rebateu os termos da sentença, expondo os motivos para alteração da decisão. Deve ser mantida a sentença recorrida no tocante a ilegalidade dos descontos relativos à “Contribuição Cenap/Asa”, não solicitados/contratados pela parte autora, todavia, a restituição deve ocorrer na forma simples, ante a ausência de comprovação da má-fé. Todavia, a cobrança de serviços não contratados, por si só, não enseja a reparação por dano moral, sem demonstração de efetivo dano extrapatrimonial, representando mero dissabor. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1005334-39.2024.8.11.0013 APELANTE: CENTRAL NACIONAL DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS (ASSOCIAÇÃO SANTO ANTÔNIO) APELADA: BALBINA JULIA ALVARES RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por CENTRAL NACIONAL DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS (ASSOCIAÇÃO SANTO ANTÔNIO) contra sentença proferida pelo MM. Juiz da 2ª Vara Cível da Comarca de Pontes e Lacerda/MT, Dr. Ítalo Osvaldo Alves da Silva, lançada nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica cumulada com Repetição de Indébito e Indenização por Danos Materiais e Morais, ajuizada por BALBINA JULIA ALVARES, que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, e declarou a inexistência da relação jurídica estabelecida no contrato acostado aos autos; condenou a requerida a devolução em dobro dos valores descontados do benefício previdenciário da autora, com a incidência de juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária pelo índice INPC, a partir de cada desconto realizado (Súmula 43, STJ); condenou a requerida ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a título de danos morais, corrigidos pelo INPC, desde a publicação da sentença (Súmula n. 362, do STJ) e com juros de mora de 1% ao mês, desde o evento danoso (celebração do contrato fraudulento) Súmula n. 54, do STJ e condenou o réu ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor do benefício econômico obtido pela parte autora, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, todavia suspendeu a exigibilidade, tendo em vista a gratuidade da justiça concedida à parte autora. Inconformada, a parte apelante sustenta, inicialmente, em suas razões que o recurso seja recebido também no seu efeito suspensivo, em razão do preenchimento dos requisitos ensejadores para tanto (fumus boni iuris e pericullum in mora). Discorre que “a validação da biometria, o próprio sistema gera uma assinatura desenhada; ou seja, não é a parte quem assina o documento, mas sim o sistema após a extração e validação da biometria facial – de tal forma, qualquer alegação quanto à uma invalidade de assinatura é incorreta” (sic). Argumenta que “o caso em análise, não há evidências nos autos que comprovem que a apelada tenha experimentado qualquer tipo de abalo extrapatrimonial, humilhação, vexame, ou sofrimento relevante. A alegação de descontos indevidos em seu benefício previdenciário, embora apresentada, não tem impacto suficiente para afetar seus direitos subjetivos ou causar sofrimento psicológico” (sic). Discorre que “ante a ausência de provas concretas de danos morais, combinada com a inexistência de má-fé por parte da apelante, justifica-se a rejeição do pedido de indenização. Portanto, dada a falta de correspondência entre o direito e os fatos, a improcedência do pedido é o que se pede. Entretanto, afirma que “mesmo que se entenda que houve cobrança indevida e que o CDC se aplica à discussão em questão, o que se cogita por extrema cautela processual, cumpre ressaltar que o deferimento do pedido de devolução em dobro pressupõe a demonstração de conduta contrária à boa-fé objetiva por parte da requerida, comprovando a prática de má-fé pela promovida, ônus do qual, inequivocamente, a parte apelada não se desincumbiu” (sic). A par desses argumentos, pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial, e caso for mantida a condenação, requer a redução do quantum indenizatório, em consonância com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade; bem como, que a restituição ocorra de forma simples, ante a ausência de comprovação da má-fé, requerendo, ao final, a condenação da parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais, no percentual de 20% sobre o valor da causa, conforme o disposto no art. 85 do Código de Processo Civil (Id. 270163888). A parte apelada ofertou as contrarrazões, arguindo, em preliminar sobre a Violação ao Princípio da Dialeticidade, ante a ausência de impugnação específica dos fundamentos da decisão recorrida, e no mérito, pugna pelo desprovimento do recurso, requerendo, ao final, pela majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, em razão do trabalho adicional realizado em sede recursal, fixando-os em 20% sobre o valor da condenação (Id. 270163896). A apelante é beneficiária da justiça gratuita (Id. 271386873). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Conheço do recurso de apelação, ante a presença dos pressupostos de admissibilidade. Inicialmente, a parte requerida/apelante pleiteia que o apelo seja recebido também pelo efeito suspensivo, em razão da presença do periculum in mora e o fumus boni iuris ensejadores para tanto. Entretanto, quanto ao efetivo pleito de atribuição do efeito suspensivo ao recurso interposto, não vejo como conferir-lhe guarida, considerando o disposto no art. 1.012 do CPC, em seus §§ 1º, III e §3, I e II, preleciona o seguinte: “Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1º Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: (...) § 3º O pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1º poderá ser formulado por requerimento dirigido ao: I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação.” Da leitura do supracitado dispositivo processual, evidencia-se que o pedido de atribuição de efeito suspensivo em recurso de apelação deve ser formulado por petição autônoma, dirigida ao tribunal, ou, quando já distribuído o recurso, ao relator, também por petição própria, e não como preliminar recursal, tal qual o caso em tela, o que obsta seu reconhecimento. Nesse sentido, colaciono entendimentos desta Corte de Justiça e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, in verbis: “TRIBUTÁRIO – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – EXECUÇÃO FISCAL – PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO – NÃO CONHECIDO - SISTEMÁTICA PARA CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – TERMO INICIAL DO PRAZO DE SUSPENSÃO – PRIMEIRA INTIMAÇÃO ACERCA DA NÃO LOCALIZAÇÃO DE BENS OU DO DEVEDOR – INTIMAÇÃO OBSERVADA NO FEITO – INÉRCIA DA FAZENDA PÚBLICA POR MAIS DE 5 (CINCO) ANOS APÓS INÍCIO DO RESPECTIVO PRAZO PRESCRICIONAL - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. “O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação depende de procedimento próprio, consubstanciado na formulação de requerimento autônomo dirigido ao tribunal, restando inviável o exame do pedido efetuado no próprio recurso de apelação.” (N.U 1010000-67.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/11/2022, Publicado no DJE 13/12/2022).” (N.U 0016170-29.2009.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Público, Relator: Edson Dias Reis, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, julgado em 14/02/2023, publicado no DJE 24/02/2023) (grifei) “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINARES. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO. ARTIGO 375-A DO TJMG. NÃO CONHECIDO. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DA JUSTIÇA. REJEIÇÃO. MÉRITO. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. DESCONTO DE PRESTAÇÕES SUPERIOR A 30% DOS PROVENTOS DA AUTORA. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS CONSIGNADOS. IMPOSSIBILIDADE. TEMA 1.085 DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. - O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. - O benefício da justiça gratuita somente pode ser revogado se o impugnante demonstrar, de forma cabal, que o beneficiário detém capacidade financeira, o que não ocorreu no presente caso. - Nos termos do que foi decidido no Tema 1.085, do STJ, deve ser obedecido o limite de 30% de descontos dos proventos nos empréstimos consignados. - Deve-se manter a sentença que determinou a limitação dos descontos no benefício previdenciário da apelada em 30% (trinta por cento), diante do caráter alimentar dessa verba.” (TJMG - Apelação Cível 1.0000.23.231925-1/001, Relator(a): Des.(a) Aparecida Grossi, 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 21/02/2024, publicação da súmula em 21/02/2024) (grifei) Desse modo, resta inviável o exame do pedido formulado na própria apelação, razão pelo qual não conheço do pedido, diante da manifesta inadequação da via eleita. Ademais, a parte apelada suscitou em contrarrazões, o não conhecimento do recurso de apelação por ofensa à dialeticidade, contudo tal alegação não merece prosperar, visto que o entendimento dominante do STJ é no sentido de que a mera reprodução dos termos da exordial, ou mesmo da contestação, não acarretam tal violação, desde que seja possível verificar que as questões decididas na sentença foram devidamente impugnadas, como ocorre na espécie, pelo que rejeito a preliminar. Quanto ao mérito, cinge-se dos autos que BALBINA JULIA ALVARES ajuizou a presente ação em desfavor da CENTRAL NACIONAL DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS (ASSOCIAÇÃO SANTO ANTÔNIO), alegando, em síntese, que é aposentada por idade rural (NB 166.390.040-7), recebendo benefício no valor de um salário-mínimo, conforme extrato previdenciário anexo (Id. 270162892 - pág. 3). Afirma que notou diminuição em seu benefício, e ao retirar o extrato constatou descontos indevidos a partir da competência do mês de julho de 2024. Sustenta que a partir do mês de julho de 2024 até a presente data, foi descontado mensalmente o valor de R$ 28,24 (vinte e oito reais e vinte e quatro centavos), a título de “CONTRIB. CENAP/ASA”, e alega que esses descontos realizados não foram autorizados por ela, que jamais contratou com a referida empresa, das quais desconhece totalmente sua origem e ramo de atividade. A par desses argumentos, pugna na exordial pela procedência dos pedidos, no sentido de declarar inexistente a relação jurídica, diante da não contratação dos serviços e a inexistência da dívida, a condenação da requerida ao pagamento da indenização por danos morais e a restituição em dobro. Após regular tramitação do feito, sobreveio a sentença aqui hostilizada, na qual o magistrado a quo julgou procedentes os pedidos formulados na inicial e declarou a inexistência da relação jurídica estabelecida no contrato acostado aos autos; condenou a requerida a devolução em dobro dos valores descontados do benefício previdenciário da autora, com a incidência de juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária pelo índice INPC, a partir de cada desconto realizado (Súmula 43, STJ). Ainda, condenou a requerida ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a título de danos morais, acrescido dos consectários legais. Inconformada, a parte apelante recorre com o presente apelo, sob o argumento de que a parte autora teve ciência da contratação e que não houve ato ilícito passível de dano moral e que não há se falar em restituição na forma dobrada. A par desses argumentos, pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial, e caso for mantida a condenação, requer a redução do quantum indenizatório, bem como, que a restituição ocorra de forma simples, ante a ausência de comprovação da má-fé, requerendo, ao final, a condenação da parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais, no percentual de 20% sobre o valor da causa, conforme o disposto no art. 85 do Código de Processo. Pois bem. É patente que o caso se submete às regras do direito consumerista, pelo qual, responde a parte requerida/apelante, objetivamente, como fornecedora de serviços, pelos danos causados ao consumidor (art. 14 do CDC), independentemente da perquirição da existência de sua culpa. Assim, tendo a parte autora alegado fato negativo, qual seja, a inexistência da relação jurídica, bem como do débito, impõe-se a parte requerida o ônus de comprovar a origem e regularidade da cobrança efetuada, de modo a legitimar a sua conduta e eximir-se da obrigação de indenizar por eventuais danos dela decorrentes (art. 373, inciso II, do CPC). É fato incontroverso nos autos que a requerida/apelante realizou débitos no benefício previdenciário da parte autora/apelada, denominado “Contribuição Cenap/Asa”, no valor de R$ 28,24 (vinte e oito reais e vinte e quatro centavos), conforme Id. 270162892 – pág. 03, e alega a autora que esses descontos realizados não foram autorizados por ela, que desconhece. Por sua vez, a requerida/apelante, em sua defesa, sustenta que houve legalidade da contratação, e junta a ficha de filiação e o termo de desfiliação, ambos anexados nos Ids. 270163862 - pág. 01 à 03 e Id. 270163863 Compulsando detidamente os autos, e para evitar tautologia, a questão foi muito bem dirimida pelo togado singular, o qual peço as máximas vênias para transcrever seus fundamentos a subsidiar o fundamento do reconhecimento da irregularidade perpetrada, em vista da cobrança indevida, e, com isso, declarar a inexigibilidade do débito discutido nestes autos, ipsis litteris: “(...) O pleito da parte autora se funda na falha da prestação do serviço, configurada pela realização de um contrato de filiação a uma entidade sem fins lucrativos (ID 178231843), por meio do qual foram realizados descontos indevidos em seu benefício previdenciário. No caso concreto a parte autora questiona a existência e validade do negócio jurídico, aduzindo que: “[...] a parte Requerente não celebrou o referido contrato de empréstimo sobre cartão consignado”. A parte requerida, no entanto, juntou aos autos o contrato firmado com a parte autora ID 178231843. Em contrapartida, a proponente impugnou o documento, alegando que a assinatura aposta no contrato não é autêntica, de modo que a formalização de negócio jurídico não é legítima (ID 178632794). Destaque-se, nesse ponto, que as declarações constantes em documento particular presumem-se verdadeiras em relação àquele que o subscreve, salvo os casos em que impugnada sua autenticidade e não for comprovada a veracidade, na forma expressa no art. 428 do Código de Processo Civil. Por sua vez, o artigo 429, inciso II, do referido diploma legal, elenca que o ônus da prova, tratando-se de alegação de falsidade da assinatura aposta, incube àquele que produziu o documento assinado. Nessa senda, na forma dos dispositivos citados, havendo a autora impugnado a autenticidade da assinatura constante no contrato, competia a requerida fazer prova da lidimidade do documento. (...) Apesar disso, na oportunidade que lhe cabia, a requerida deixou de comprovar a autenticidade da assinatura lançada no contrato, tendo pleiteado pelo julgamento antecipado do feito (ID 181351705). Nesse diapasão, insta salientar que a demandada não se desincumbiu a contento do ônus que lhe incumbia, especificamente a prova concreta de que a parte autora teria contratado os seus serviços. Assim sendo, de rigor o reconhecimento de que o contrato de ID 178231843 não foi firmado pela autora, o que implica a inexistência do negócio jurídico” (Id. 270163883). Logo, diante da alegação de falsidade da assinatura aposta, incumbe àquele que produziu o documento assinado comprovar a legitimidade do mesmo, o que não foi realizado nos autos, de modo que acertada a sentença quanto ao acolhimento do pedido da requerente quanto a declaração de inexistência do débito a título de “Contribuição Cenap/Asa”. A propósito, segue jurisprudência deste Tribunal de Justiça: “APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – DESCONTO REALIZADO NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO AUTOR - CONTRIBUIÇÃO CENTRAPE - AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO - RESTITUIÇÃO DEVIDA NA FORMA SIMPLES - AUSÊNCIA DO DEVER DE REPARAR POR DANOS MORAIS – RECURSO NÃO PROVIDO. Se o desconto realizado no benefício previdenciário do autor não foi autorizado, é devida a restituição do montante pago indevidamente na forma simples, uma vez que não identificada má-fé na cobrança. O autor não faz jus à indenização por danos morais, se a situação não ultrapassou o mero inadimplemento contratual”. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1026932-67.2021.8.11.0041, Relator: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Data de Julgamento: 12/06/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 14/06/2024). “REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - LANÇAMENTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO A TÍTULO DE “CONTRIBUIÇÃO CONAFER” – DESCONTOS INDEVIDOS – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL INEXISTENTE – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. No caso, houve o desconto indevido na folha de pagamento do benefício previdenciário, ante a inexistência do débito, razão pela qual deve haver a restituição dos valores, acrescido de juros e correção monetária. O entendimento dominante no c. STJ é no sentido de admitir a repetição do indébito na forma simples, devidamente atualizado, e não em dobro, salvo comprovada má-fé, o que não restou comprovado na hipótese em voga. Não há que se falar em dano moral in re ipsa em razão de cobrança indevida, quando inexistir ato restritivo de crédito ou inscrição em cadastro de inadimplentes. Precedentes do STJ. Recurso desprovido”. (TJMT, Ap nº 10000362020228110051, 3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 22-11-2023, sem grifos no original). Dessa forma, não restando evidenciada a conduta maliciosa da requerida, os valores que tenham sido indevidamente cobrados devem ser devolvidos na forma simples, sendo que, nesse ponto, merece ser acolhida a pretensão da parte requerida/apelante e retificada a sentença nesse ponto. No que tange a indenização, cumpre dizer que o dano moral diz respeito ao prejuízo decorrente da dor imputada a uma pessoa, em razão de atos que, indevidamente, ofendem seus sentimentos de honra e dignidade, que provocam mágoa e atribulações na esfera interna pertinente à sensibilidade moral. Há de se considerar ainda que o dano moral diz respeito à violação dos direitos referentes à dignidade humana, a doutrina especializada e a jurisprudência dominante vêm entendendo que a consequência do dano encontra-se ínsita na própria ofensa, porquanto deflui da ordem natural das coisas, tomando-se como parâmetro a vida comum das pessoas ou empresa. Entretanto, apesar do possível transtorno suportado pela parte autora/apelada ao tentar resolver o problema criado pela associação, ora apelante, referente à cobrança de valores não contratados, a jurisprudência tem se firmado no sentido de que suposto ilícito contratual não é capaz, por si só, de ensejar danos morais indenizáveis. Inclusive, no mesmo sentido, segue julgados deste Tribunal: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – COBRANÇA NA APOSENTADORIA – CONTRIBUIÇÃO SINDICAL – DÉBITO DECLARADO INEXISTENTE – RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO – NA FORMA SIMPLES – MÁ-FÉ NÃO EVIDENCIADA – DANO MORAL – NÃO CONFIGURADO – AUSENTES OS PRESSUPOSTOS CARACTERIZADORES DO PREJUÍZO MORAL INDENIZÁVEL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Diante do desconto indevido na folha de pagamento do benefício previdenciário e tendo em vista o reconhecimento da inexistência do débito, deve haver a restituição dos valores, acrescido de juros e correção monetária. O entendimento dominante no c. STJ é no sentido de admitir a repetição do indébito na forma simples, devidamente atualizado, e não em dobro, salvo comprovada má-fé, o que não restou comprovado na hipótese em voga. A cobrança injustificada não configura, por si só, o dano moral. Ademais, se não demonstrados os requisitos caracterizadores da reparação civil, não é cabível a indenização a título de dano moral. Destarte, o c. STJ possui entendimento pacificado de que “não há falar em dano moral “in re ipsa” em virtude de cobrança indevida, quando inexistente ato restritivo de crédito ou inscrição em cadastro de inadimplentes.” (STJ, AgInt no AREsp n. 1682299/MT, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 21.09.2020)”. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10385861720228110041, Relator: SERLY MARCONDES ALVES, Data de Julgamento: 21/02/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 23/02/2024). Conquanto os fatos relatados na inicial possam ter causado aborrecimentos a parte autora, não há falar-se em ocorrência de dano moral, configurando tão-somente incômodo inerente à vida em sociedade, notadamente se não ocorreu fato capaz de gerar constrangimento. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, para retificar em parte a sentença determinando que a requerida proceda com a restituição dos valores descontados indevidamente, na forma simples e julgar improcedente a pretensão inicial quanto à condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais. Por consequência, considerando a sucumbência recíproca, as custas processuais e os honorários advocatícios deverão ser suportados por ambas as partes, pro rata, sendo o percentual dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado dado a causa, cuja exigibilidade em relação a autora fica suspensa por ser beneficiária da gratuidade da justiça, consoante previsão contida no art. 98, §3º do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/04/2025

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