Processo nº 1001071-33.2024.8.11.0087
ID: 319686043
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara Criminal
Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO
Nº Processo: 1001071-33.2024.8.11.0087
Data de Disponibilização:
08/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MAURICIO RICARDO ALVES
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001071-33.2024.8.11.0087 Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associaçã…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001071-33.2024.8.11.0087 Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins] Relator: Des(a). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES Turma Julgadora: [DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (RECORRENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRENTE), CARLOS ALBERTO DA SILVA - CPF: 078.002.351-06 (RECORRIDO), JUNIOR CABRAL - CPF: 047.749.381-57 (RECORRIDO), MAURICIO RICARDO ALVES - CPF: 405.597.691-72 (ADVOGADO), JUNIOR CEZAR NAVARRO - CPF: 032.662.101-66 (RECORRIDO), RENATO DANIEL EICKOFF - CPF: 011.937.191-00 (ASSISTENTE), LEANDRO LOPES DE SOUZA - CPF: 039.618.403-00 (ASSISTENTE), RENATO ALVES PEREZ - CPF: 023.835.231-51 (ASSISTENTE), A SOCIEDADE E OUTROS (VÍTIMA)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. EMENTA: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. REJEIÇÃO PARCIAL DA DENÚNCIA PELO JUÍZO ESPECIALIZADO. DESACERTO. JUSTA CAUSA CONFIGURADA. ELEMENTOS DE CONVICÇÃO INICIAIS SUFICIENTES (DEPOIMENTOS POLICIAIS E APREENSÃO DE CELULARES PARA PERÍCIA). RECURSO MINISTERIAL PROVIDO. RECEBIMENTO INTEGRAL DA DENÚNCIA. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra a decisão do Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, que revogou o recebimento anterior da denúncia e a rejeitou parcialmente em relação ao crime de associação para o tráfico (art. 35 da Lei nº 11.343/2006), determinando a devolução dos autos à Comarca de Guarantã do Norte/MT. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2. O Ministério Público postula a manutenção da imputação inicial do crime de associação para o tráfico de drogas, alegando inadequação e desvio procedimental na decisão de Sinop que revogou o recebimento da denúncia após a preclusão, antecipando um julgamento de mérito. 3. Argumenta que havia requerido a produção de prova pericial em aparelhos telefônicos para comprovar o vínculo associativo, indiciado pelos depoimentos policiais, e que a decisão recorrida ignorou esse pedido, impedindo a coleta de provas essenciais. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A denúncia imputa aos recorridos a prática dos crimes de tráfico de drogas e, em associação estável e permanente, a prática do tráfico de drogas. A equipe policial, com base em informações de inteligência, localizou os denunciados, que resistiram à abordagem. Foram apreendidas na residência 08 porções médias de maconha (aprox. 880g), 15 invólucros pequenos e 08 invólucros médios de pasta base de cocaína (aprox. 120g), balança de precisão e R$ 71,00. Os suspeitos, em confissão informal aos policiais, teriam confirmado a comercialização de entorpecentes e a divisão de tarefas (distribuição, armazenamento, embalagem e venda), além de apreendidos três aparelhos de telefonia celular. 5. O juízo da Vara Única da Comarca de Guarantã do Norte recebeu a denúncia em todos os seus termos, mas declinou a competência para a 5ª Vara Criminal de Sinop/MT em razão da Resolução 15 do TJMT/OE, que ampliou a competência desta última para abranger crimes de organização criminosa. 6. Ao receber o feito, o juízo especializado de Sinop rejeitou parcialmente a denúncia em relação ao delito de associação para o tráfico, sob o fundamento de ausência de justa causa, por entender que os elementos probatórios até então produzidos (sem prova pericial em aparelhos telefônicos ou menção a tratativas prévias) não demonstram o liame subjetivo associativo, tampouco a estabilidade e perenidade. 7. A decisão que rejeitou a denúncia desbordou do grau de cognição próprio da fase processual, adentrando indevidamente no mérito da imputação. A fase de recebimento da denúncia exige apenas uma análise sumária, bastando a existência de prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, conforme o artigo 41 do CPP. 8. Os depoimentos dos policiais, harmonizados com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação, e no caso, indicam a mercancia conjunta e a divisão de tarefas. Ademais, o Ministério Público havia requerido expressamente a produção de prova pericial nos celulares apreendidos, o que poderia comprovar o vínculo associativo e que não foi oportunizado. Desacreditar prematuramente os relatos policiais e impedir a produção de prova pericial requerida traduz inadequada antecipação do juízo de mérito. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso em Sentido Estrito CONHECIDO e PROVIDO, para reformar a decisão de primeiro grau e, consequentemente, receber a denúncia pela prática do delito descrito no artigo 35 da Lei de Drogas em desfavor dos recorridos. Tese de Julgamento: "O recebimento da denúncia por associação para o tráfico prescinde de prova pericial em aparelhos telefônicos ou de minuciosa demonstração do liame subjetivo associativo em fase inicial, bastando a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade, como depoimentos policiais e apreensão de grande quantidade de droga e celulares, cuja perícia foi requerida, sendo prematura a rejeição da peça acusatória que adentra indevidamente no mérito da imputação." Dispositivos Legais e Jurisprudência Mencionados: Código Penal (CP): Art. 6º, Art. 69, Art. 70. Código de Processo Penal (CPP): Art. 41, Art. 69, I, Art. 70, Art. 395, III. Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas): Art. 33, caput; Art. 35, caput. Resoluções do TJMT/OE: N° 14, de 23 de novembro de 2023; N° 15, de 24 de outubro de 2024. Jurisprudência: TJMT - N.U 1011980-95.2024.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 25/06/2024, Publicado no DJE 01/07/2024. TJMT - N.U 1000384-23.2021.8.11.0035, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, WESLEY SANCHEZ LACERDA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 13/05/2025, Publicado no DJE 13/05/2025. Enunciado do TJMT: Enunciado 08 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas (TCCR/TJMT): "Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal." RELATÓRIO EXMO. SR. DES. JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra a decisão proferida pelo Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, que revogou anterior decisão de recebimento da denúncia e a rejeitou parcialmente, em relação ao crime de associação para o tráfico (art. 35 da Lei nº 11.343/2006), promovendo, ainda, a devolução dos autos ao Juízo da Comarca de Guarantã do Norte/MT. Nas razões do recurso em sentido estrito, o Ministério Público postula, em síntese, a manutenção da imputação inicial do crime de associação para o tráfico de drogas e, por consequência, a permanência dos autos no Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, por ser competente, em razão da matéria. Em suas razões, o Ministério Público alega inadequação e desvio procedimental na decisão da 5ª Vara Criminal de Sinop, que teria revogado o recebimento da denúncia após a preclusão, antecipando um julgamento de mérito com efeitos definitivos e ferindo o devido processo legal. Argumenta que o afastamento da imputação de associação para o tráfico de drogas sem fundamentação compromete a competência material da vara especializada, configurando desvio de finalidade e prejuízo à instrução probatória. O Parquet destaca que, embora o Juízo de Sinop tenha afirmado a ausência de prova pericial referente à quebra de sigilo de dados em aparelhos telefônicos, havia requerido a produção dessa prova na cota de oferecimento da denúncia, medida apta a comprovar o vínculo associativo, indiciado pelo depoimento dos policiais militares. Assim, o Juízo de Sinop teria ignorado tal pedido, argumentando a pretensa inexistência de justa causa, medida que potencialmente, impediria a coleta de provas essenciais. Conclui que há justa causa para o prosseguimento da ação penal quanto aos delitos de tráfico e associação, devendo o recurso ser provido para manter a imputação inicial e, de modo reflexo, a competência da 5ª Vara Criminal de Sinop. A defesa dos recorridos apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso. Em juízo de retratação, o magistrado manteve a decisão recorrida pelos seus próprios fundamentos. O parecer da Procuradoria Geral de Justiça, da lavra do Procurador Antônio Sergio Cordeiro Piedade, é pelo provimento do recurso, a fim de que a denúncia seja integralmente recebida e a competência mantida no Juízo da 5ª Vara Criminal de Sinop/MT, para o regular prosseguimento do feito. É o relatório À pauta. VOTO Egrégia Câmara: Presentes os pressupostos subjetivos e objetivos, conheço do presente recurso interposto pelo Ministério Público Estadual. O douto Promotor da Segunda Promotoria da Comarca de Guarantã do Norte ofereceu a seguinte denúncia: “I. No dia 11 de fevereiro de 2024, por volta das 22h, em frente à residência particular localizada na rua Freire Nunes, em Novo Mundo/MT, o denunciado JUNIOR CÉZAR NAVARRO transportava e trazia consigo drogas, com finalidade diversa do consumo pessoal, sem autorização e em desacordo com a determinação legal ou regulamentar; II. Além disto, ainda no dia 11 de fevereiro de 2024, por volta das 22h, em residência particular localizada na rua Freire Nunes, em Novo Mundo/MT, os denunciados CARLOS ALBERTO DA SILVA e JUNIOR CABRAL tinham em depósito e guardavam drogas, com finalidade diversa do consumo pessoal, sem autorização e em desacordo com a determinação legal ou regulamentar; III. Em arremate, em data e horário não identificados, mas antes do dia 11 de fevereiro de 2024, JUNIOR CÉZAR NAVARRO, CARLOS ALBERTO DA SILVA e JUNIOR CABRAL associaram-se, de maneira estável e permanente, para o fim de praticarem o tráfico de drogas. Segundo o relatado no caderno investigativo, na data e horário acima mencionados, a equipe de Força Tática recebeu informações da Agência Regional de Inteligência informando que o suspeito conhecido como Kauna (Junior Cézar), conjuntamente a outros suspeitos, estavam comercializando drogas, além de receber o material proscrito para ali ser comercializado. Os Policiais, então, foram até a residência e, ao chegarem nas imediações, depararam-se com o denunciado Junior Cézar, que também chegava no local com uma sacola em mãos. Nesta oportunidade, os Policias tentaram abordar o denunciado, oportunidade em que ele correu para o fundo da residência, sendo perseguido e capturado. No interior da residência foram abordados os outros dois suspeitos, Carlos Alberto e Junior. Na sacola que estava em posse de Junior Cézar foram encontrados 08 (oito) porções médias de maconha, totalizando, aproximadamente, 880 (oitocentos e oitenta) gramas da substância. Em razão da fundada suspeita da ocorrência de crime permanente no local, os policiais realizaram buscas na residência, encontrando um pote em cima de um sofá contendo 15 (quinze) invólucros pequenos de substância de base de cocaína, enquanto em outro estavam 08 (oito) invólucros médios de pasta base de cocaína, com aproximadamente 120 (cento e vinte) gramas, além de uma balança de precisão e R$ 71, 00 (setenta e um reais). Assim, ao se alinhar a quantidade de drogas apreendidas e as informações dadas pelos suspeitos, há informações suficientes para se concluir que os denunciados estavam, de maneira estável e permanente, associados para o fim de cometerem o tráfico de drogas. Inclusive, segundo as apurações, Carlos seria encarregado de fazer a distribuição e receber os pagamentos relacionados à comercialização, além do que Junior Cabral era, como proprietário da residência, responsável por armazenar as drogas. Por fim, a Junior Cézar recaia a responsabilidade por embalar e vender os entorpecentes. Em arremate, todo o material apreendido foi submetido a perícia e teve a natureza proscrita atestada no Laudo Pericial nº 544.3.10.9887.2024.161783-A01 (ID 153114877). Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO denuncia JUNIOR CÉZAR NAVARRO, CARLOS ALBERTO DA SILVA e JUNIOR CABRAL pela prática das condutas capituladas nos artigos 33, caput, e 35, caput, da Lei nº 11.343/06.” O juízo da Vara Única da Comarca de Guarantã do Norte, após notificação dos denunciados, recebeu a denúncia, anotando o seguinte: “Não se verificando quaisquer das hipóteses previstas no artigo 395 do Código de Processo Penal, uma vez que estão presentes as condições da ação, bem como há justa causa para a ação penal, recebo a denúncia em todos os seus termos contra os acusados.” (fl. 293) Posteriormente, exarou a seguinte decisão, declinando da competência: “Considerando que na data de 30/10/2024, o TJMT/OE editou a RESOLUÇÃO 15, a fim de ampliar a competência da 5ª Vara Criminal de Sinop/MT, para abranger também as comarcas do Polo IV, remeta-se os autos ao Juízo da 5ª Vara Criminal de Sinop/MT.” Anoto que a mencionada resolução alterou a competência da Quinta Vara Criminal da Comarca de Sinop para lhe incumbir do julgamento dos crimes praticados – grosso modo – no contexto de organizações criminosas. Ao receber o feito, o juízo especializado de Sinop houve por bem rejeitar a denúncia, parcialmente, apenas em relação ao delito descrito no artigo 35 da Lei de Drogas (associação para o tráfico de drogas), ao fundamento de ausência de justa causa, restituindo os autos ao juízo precedente. Anotou, em síntese, que: “A denúncia foi recebida em 25.10.2024 (ID 173432366). Ao Id. 174858351, o Juízo da Vara Única da Comarca de Guarantã do Norte/MT declinou a competência para processar e julgar o presente feito a este Juízo, por entender que esta Vara Criminal possui competência para processar e julgar delitos de associação para o tráfico de drogas. Os autos vieram distribuídos a esta vara especializada. Em síntese, é o relatório. Decido. Inicialmente, muito embora o Juízo da Vara Única da Comarca de Guarantã do Norte/MT tenha recebido a denúncia em desfavor dos acusados, saliento a possibilidade da reanálise do recebimento da peça acusatória, atinente à justa causa, consoante entendimento jurisprudencial abaixo colacionado: (...) No caso em espeque, é forçoso concluir pela ausência de justa causa e a consequente inépcia material da exordial acusatória no que toca, especificamente, ao crime de associação para o tráfico de drogas (art. 35 da Lei n° 11.343/06). (...) Ademais, em que pese haver quantidade significativa de entorpecentes, não foi produzida e tampouco requerida prova pericial em aparelhos telefônicos e não há nos autos sequer menção a conversas e tratativas prévias para ajuste da prática de delitos da Lei 11.343/06 pelos acusados. Os elementos probatórios até agora produzidos não demonstram o liame subjetivo associativo entre os acusados, tampouco há um mínimo de prova da estabilidade e perenidade do ânimo associativo. Lado outro, a instrução processual em juízo se limitará à oitiva de testemunhas, as quais não servem, exclusivamente, para comprovação de tais requisitos, os quais demandam também um mínimo de prova comprobatória, ora inexistente. (...) Em face do exposto, reanalisando o recebimento da denúncia, REJEITO PARCIALMENTE a inicial acusatória quanto ao delito previsto no art. 35 da Lei n° 11.343/2006, de acordo com o art. 395, inciso III, do CPP. De outro norte, considerando que o Ministério Público imputa ao indiciado o delito de tráfico de drogas, a presente ação penal deverá ser processada pelo magistrado competente, pois, nos termos das Resoluções TJMT/OE n° 14, de 23 de novembro de 2023 e TJMT/OE n° 15, de 24 de outubro de 2024, a jurisdição da 5ª Vara Criminal compreende somente processar e julgar infrações penais praticadas nas Comarcas dos Polos III e IV, previstas no artigo 35 da Lei n° 11.343/2006, na Lei n° 12.850/2013, na Lei n° 9.613/1998, na Lei n° 8.137/1990; e receber inquéritos policias instaurados para apuração de infrações penais praticadas nas Comarcas dos Polos III e IV, previstas no artigo 35 da Lei n° 11.343/2006, na Lei n° 12.850/2013, na Lei n° 9.613/1998, na Lei n° 8.137/1990, além de cumprir cartas precatórias rogatória e de ordem. (...) Portanto, uma vez que o delito descrito no inquérito policial se consumou, em tese, em Guarantã do Norte/MT, DECLINO a competência para processar e julgar este feito e DETERMINO a remessa dos autos ao Juízo da Vara Única daquela Comarca, nos termos dos artigos 6° do Código Penal e 69, inciso I e 70, ambos do Código de Processo Penal.” Reputo essencial tecer, ainda, um esboço dos elementos de convicção juntados aos autos até o momento. O Sargento da Polícia Militar, Renato Daniel Eickoff, em sede inquisitiva, relatou que: “POR VOLTA DAS 22:00 HORAS, ESTA EQUIPE DE FORÇA TÁTICA RECEBEU INFORMAÇÕES DA AGENCIA REGIONAL DE INTELIGENCIA, DE QUE NA CIDADE DE NOVO MUNDO, MAIS PRECISAMENTE NA RUA FREIRE NUNES, UM SUSPEITO POR VULGO DE KAUNA, ESTARIA JUNTAMENTE COM OUTROS SUSPEITOS, REALIZANDO O COMÉRCIO ILÍCITO DE DROGAS, EM UMA RESIDENCIA, BEM COMO SENDO INFORMADO QUE NESTA DATA E HORÁRIO ARROLADOS OS SUSPEITOS ESTARIAM RECEBENDO ENTORPECENTES PARA FAZERA COMERCIALIZAÇÃO; QUE DIANTE DAS INFORMAÇÕES, JUNTAMENTE COM APOIO DA 13ª CIPM E NPM DE NOVOMUNDO, REALIZAMOS CERCO A REFERIDA RESIDENCIA E AO AVISTAR O SUSPEITO KAUNA CHEGANDO COM UMA SACOLA, TENTAMOS REALIZAR A ABORDAGEM DO MESMO; QUE MOMENTO EM QUE O SUSPEITO CORREU PARA DENTRO DA RESIDENCIA, ATRAVESSANDO-A E TENTANDO SAIR PELOS FUNDOS, TENDO EM VISTA SER UMA REGIÃO DE MATA. PORÉM PREVENDO A POSSÍVEL TENTATIVA DE FUGA POR PARTE DOS SUSPEITOS, COM CERCO MONTADO, O SUSPEITO VEIO A SE DEPARAR COM OS POLICIAIS QUE ESTAVAM NOS FUNDOS DA RESIDENCIA, QUE DE IMEDIATO TENTAMOS REALIZAR A ABORDAGEM, SENDO QUE O SUSPEITO VEIO RESISTIR, SE DEBATENDO E TENTANDO SE DESVENCILHAR DOS POLICIAIS; QUE NO MOMENTO FORA NECESSÁRIO UTILIZAR TÉCNICAS DE IMOBILIZAÇÃO, BEM COMO USO MODERADO DA FORÇA, LOGRANDO EXITO EM CONTER E ALGEMAR O SUSPEITO. EM ATO CONTINUO FOI REALIZADO ABORDAGEM AOS DEMAIS SUSPEITOS QUE ESTAVAM NO INTERIOR DA RESIDENCIA, BEM COMO LOCALIZADO A SACOLA QUE ESTAVA COM O SUPEITO KAUNA, ONDE FOI POSSIVEL CONFIRMAR A VERACIDADE DAS INFORMAÇÕES RECEBIDAS, QUE SE TRATANDO DE SUBSTANCIA ANÁLOGA A MACONHA, SENDO 8 (OITO) PORÇÕES MÉDIAS, TOTALIZANDO APROXIMADAMENTE 880(OITOCENTOS E OITENTA ) GRAMAS, BEM COMO UM POTE EM CIMA DE UM DOS SOFÁ, CONTENDO 15 (QUINZE) INVÓLUCROS PEQUENOS DE SUBSTANCIA ANÁLOGA A PASTA BASE DE COCAÍNA; QUE EM CONTINUIDADE DAS BUSCAS, FOI LOCALIZADO DENTRO DE UM POTE GRANDE, MAIS UMA GRANDE QUANTIDADE DE PASTA BASE, TOTALIZANDO 8 (OITO) INVÓLUCROS MÉDIOS TOTALIZANDO APROXIMADAMENTE 160 (CENTO E SESSENTA) GRAMAS, FORA LOCALIZADO AINDA UMA BALANÇA DE PRECISÃO E 71,00(REAIS). EM ENTREVISTA COM OS SUSPEITOS, ESTES CONFIRMARAM QUE ESTARIAM COMERCIALIZANDO O REFERIDO ENTORPECENTE, E QUE SERIAM FACCIONADOS EM UMA FACÇÃO CRIMINOSA; QUE EM ENTREVISTA COM O SUSPEITO CARLOS, ESTE RELATOU QUE ESTARIA ENCARREGADO DE FAZER A DISTRIBUIÇÃO PARA OS LOJISTAS, BEM COMO RECEBER O PAGAMENTO PELOS ENTORPECENTES, FATO ESTE QUE PODERIA SER COMPROVADO EM CONVERSAS PELO SEU CELULAR,SENDO ASSIM FEITA A APREENSÃO DO REFERIDO APARELHO; QUE O SUSPEITO POR VULGO CABRAL SERIAM PROPRIETÁRIO DA RESIDENCIA E RESPONSÁVEL POR ARMAZENAR O ENTORPECENTE. E O SUSPEITO KAUNA RESPONSÁVEL POR EMBALAR E VENDER O ENTORPECENTE; QUE OBS: O SUSPEITO KAUNA JÁ POSSUI PASSAGEM POR TRÁFICO, ONDE NA OCASIÃO O MESMO TAMBÉM RELATOU QUE FAZIA O COMERCIO DE ENTORPECENTES, RELATANDO AINDA QUE TERIA SAÍDO DA PRISÃO A APROXIMADAMENTE DOIS MESES.; Nada mais disse, nem lhe foi perguntado” No mesmo sentido, consta o depoimento do policial militar Leandro Lopes de Souza. Em sentido contrário, os réus não confirmaram a confissão informal narrada pelos policiais, alegando o seguinte: “QUE no dia de ontem (11/02/2024) por volta 22h00 estava na residência de seu amigo JÚNIOR CABRAL na cidade de NOVO MUNDO-MT; QUE tinha bebido vodka e fumou maconha no período da tarde; QUE ele e JUNIOR eram amigos há 02 (dois) anos e se conheceram em festas de rua; QUE não sabia que a residência de JUNIOR era um ponto de comércio ilícito de drogas; QUE estavam todos sentados na sala conversando, quando a Polícia Militar rendendo ele e seus amigos; QUE posteriormente foram conduzidos para a delegacia municipal; QUE não reagiu a abordagem da polícia; QUE em nenhum momento viu os entorpecentes sendo comercializados na casa e não pertence a nenhuma facção criminosa; QUE já possui passagens anteriores por tráfico, mas que reconhece ser apenas usuário de drogas e que nunca comercializou; Nada mais disse, nem lhe foi perguntado”. (JUNIOR CÉZAR NAVARRO - fl. 27) “QUE no dia de ontem (11/02/2024) por volta 20h00 estava na residência bebendo com seus amigos; QUE neste dia, não usou nenhum tipo de droga; QUE conhece CARLOS ALBERTO da vizinhança há 01 (um) mês e JUNIOR CERSAR NAVARRO há mais de 01 (um) ano; QUE sua casa não é um ponto de comercialização de drogas, mas reconhece que usa pasta base, às vezes, em na sua residência; QUE estava no seu quarto quando a Polícia TÁTICA DA PM entrou e começou buscar por armas e drogas; QUE a polícia mandou todo mundo deitar no chão e não viu o momento em que a droga foi encontrada; QUE não resistiu a prisão, sendo conduzido até a viatura algemado; QUE não p responsável pelo armazenamento de drogas em sua residência e vive de uma aposentadoria por motivo de invalidez; QUE não pertence a nenhum tipo de facção criminosa; Nada mais disse, nem lhe foi perguntado.” (JUNIOR CABRAL, FL. 39). “QUE no dia de ontem (11/02/2024) por volta 20h00 estava na residência de seu vizinho JUNIOR CABRAL em uma conversa entre amigos; QUE conhece JUNIOR CABRAL há 06 (seis) meses e frequenta a casa dele há uma (01) semana desde que mudou para o bairro; QUE conhece JUNIOR CESAR NAVARRO há 03 (três) anos somente de conversas na rua; QUE havia acabado de entrar na residência de JUNIOR CABRAL quando policiais chegaram e mandaram todo mundo ficar no chão; QUE não viu o momento que a droga foi encontrada; QUE a todo momento os policiais perguntavam onde estavam as outras drogas; QUE não resistiu a prisão e foi conduzido algemado para a viatura, e, posteriormente, conduzido até a delegacia municipal; QUE não sabia que a residência de JUNIOR era um ponto de comércio de drogas e NÃO ninguém usando drogas no local; QUE não possui passagem pela polícia e vive de seu emprego de montador em uma empresa tercerizada; QUE não tinha ciência que as pessoas que frequentavam a casa de JUNIOR CABRAL tinham passagens pela polícia; Nada mais disse, nem lhe foi perguntado” (CARLOS ALBERTO DA SILVA, fl. 50) As drogas apreendidas foram submetidas a laudo preliminar, aferindo-se a natureza nociva. Consta da cota da denúncia o seguinte pedido: “Por derradeiro, pugno pelo deferimento de quebra de sigilo de dados dos aparelhos celulares apreendidos com os denunciados” (fl. 218) Nesse contexto, a questão posta em debate, quer me parecer, cinge-se a aferir se a confissão informal, em tese feita pelos réus aos policiais no momento da prisão em flagrante, mas não confirmada nos interrogatórios inquisitivos, seria adminículo apto a configurar a justa causa para o recebimento da denúncia pelo delito de associação para o tráfico. A conclusão, data maxima venia do aguerrido julgador da vara especializada, é pela possibilidade do recebimento. Realmente, considerando que o enunciado 08 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas (“Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal.”) indica, regra geral, a validade dos depoimentos policiais, bem como aquilatando a fase processual incipiente, a demandar mero juízo perfunctório de aferição de justa causa, é forçoso concluir pelo equívoco na prolação de decisão de rejeição da denúncia, sobretudo porque, como visto, para além dos relatos dos policiais, foram apreendidos três aparelhos de telefonia celular em poder dos agentes, cuja perícia foi expressamente requestada na cota da denúncia. Anoto, em reforço, que os três agentes foram presos na mesma residência, onde foram apreendidas variadas porções de drogas, em quantidade relevante, existindo, segundo os policiais, informações anteriores da inteligência assinalando a mercancia conjunta. Com efeito, os elementos informativos reunidos no inquérito policial, a despeito de parcos, são suficientes para o recebimento da peça inaugural; a denúncia apresentou descrição clara e objetiva do fato e da conduta imputada, em plena consonância com os requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal. Nesse contexto, a fase de recebimento da denúncia exige apenas uma análise sumária, não demandando avaliação aprofundada do conjunto probatório, bastando a existência de prova da materialidade e indícios suficientes de autoria. Este Egrégio Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de decidir matéria semelhante da seguinte forma: “RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – TRÁFICO DE DROGAS – DENÚNCIA REJEITADA – IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL – ACOLHIMENTO – PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/2006 DO CPP - RECURSO PROVIDO. O recebimento da denúncia não exige a exposição detalhada dos fatos, é necessário o contexto da peça acusatória relatando o fato criminoso, os elementos e indícios de envolvimento do acusado, data do crime, permitindo assim o exercício da ampla defesa e contraditório. É inviável a rejeição da denúncia quando lastreada em elementos indiciários suficientes à instauração da ação penal.” (N.U 1011980-95.2024.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 25/06/2024, Publicado no DJE 01/07/2024) Ademais, ainda que este Tribunal tenha entendimento segundo o qual, em crime de associação para o tráfico, “os depoimentos policiais que mencionam a denúncia anônima e a confissão informal prestada na fase policial não esclarece, de forma suficiente, a autoria dos crimes imputados.” (N.U 1000384-23.2021.8.11.0035, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, WESLEY SANCHEZ LACERDA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 13/05/2025, Publicado no DJE 13/05/2025), quer nos parecer que estes elementos de convicção se prestam ao recebimento da denúncia, sobretudo quando existe, como no caso, outra fonte de prova a ser explorada em juízo, isto é, a perícia dos telefones celulares apreendidos em poder dos agentes, prova cuja produção já foi requerida pelo Ministério Público na cota da denúncia. Desacreditar prematuramente os relatos dos policiais, sem a devida apuração probatória, deixando de viabilizar a produção de prova pericial já requerida, traduz inadequada antecipação do juízo de mérito, bem como opõe empecilho ao direito à produção da prova, em contraditório. Desta forma, conclui-se que a decisão que rejeitou a denúncia desbordou do grau de cognição próprio da fase processual, adentrando no mérito imputação, medida açodada e, por isso mesmo, inadequada. Ante o exposto, em consonância com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, CONHEÇO do recurso aviado pelo Ministério Público Estadual e DOU PROVIMENTO, para reformar a decisão proferida pelo Juízo singular e, consequentemente, receber a denúncia pela prática do delito descrito no artigo 35 da Lei de Drogas em desfavor de Junior Cézar Navarro, Carlos Alberto da Silva e Júnior Cabral. Com o trânsito em julgado dessa decisão, remetam-se os autos ao juízo da Quinta Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT. Anoto, obiter dictum, que a presente decisão não se reporta à competência em razão da matéria, a ser analisada pelo juízo singular (kompetenz-kompetenz) ou em procedimento próprio. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025
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