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Processo nº 6061032-04.2024.8.09.0173

ID: 316320825

Tribunal: TJGO Órgão: São Simão - Juizado Especial Cível Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 6061032-04.2024.8.09.0173

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

DARLEY DIAS BORGES

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

DAIANE GONCALVES BORGES

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

Poder Judiciário Comarca de São Simão Estado de Goiás Gabinete do Juiz Filipe Luis Peruca Autos n.º: 6061032-04.2024.8.09.0173Requerente: Darley Dias BorgesRequerido: Eip Empresas LtdaN… Poder Judiciário Comarca de São Simão Estado de Goiás Gabinete do Juiz Filipe Luis Peruca Autos n.º: 6061032-04.2024.8.09.0173Requerente: Darley Dias BorgesRequerido: Eip Empresas LtdaNatureza da Ação: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimento do Juizado Especial CívelSENTENÇAVistos e etc.Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS ajuizada por DARLEY DIAS BORGES em face de IMPERIAR REFRIGERAÇÃO AUTOMOTIVA já devidamente qualificadas nos autos. Tendo por base o disposto nos artigos 2º e 38 da Lei nº 9.099/95, fica dispensado o relatório pormenorizado desta sentença, em razão dos princípios que norteiam os juizados especiais, quais sejam: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade.DECIDO.A questão jurídica versada, mesmo de direito e de fato, acha-se suficientemente demonstrada pela documentação trazida pelas partes, não havendo a necessidade da realização de provas outras, além daquelas já encartadas nos autos.Nessa perspectiva, resta pacificado que, sendo o juiz o destinatário da prova, somente a ele cumpre aferir sobre a necessidade ou não de sua realização. Havendo nos autos elementos de prova documental suficientes para formar o convencimento do julgador, inocorre cerceamento de defesa se julgada antecipadamente a lide. O feito comporta, dessa forma, julgamento antecipado (artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil), porquanto a medida não é mera faculdade, mas dever que a lei impõe ao magistrado (artigo 6º, do Código de Processo Civil) em homenagem ao princípio constitucional da razoável duração do processo, passo ao exame da causa. PRELIMINARESDa Ilegitimidade Passiva A requerida alega sua ilegitimidade passiva para figurar no polo passivo da presente demanda, uma vez que, de acordo com sua argumentação, sua atividade se restringe à comercialização do produto. Em sua defesa, a requerida sustenta que a responsabilidade pela instalação do kit de ar-condicionado adquirido pelo autor não lhe compete, pois o autor contratou empresa terceira para realizar a montagem, sendo o valor pago àquela empresa de R$ 1.000,00 (mil reais), conforme relato do autor.Entretanto, é necessário analisar se, em razão do vício do produto ou defeito na comercialização e orientação oferecida pela requerida, pode haver responsabilidade solidária ou subsidiária por danos materiais decorrentes do processo de instalação e funcionamento do equipamento. A mera alegação de comercialização não exclui a possibilidade de responsabilidade da requerida, especialmente se for verificado que a venda do produto envolveu informações incorretas ou a ausência de instruções necessárias para a instalação correta do equipamento.A análise da legitimidade passiva dependerá da verificação das condições em que o produto foi fornecido, das obrigações contratuais da empresa fornecedora e da responsabilidade da empresa montadora.Desse modo, REJEITO a preliminar suscitada.Incompetência absoluta dos juizados especiais – Necessidade de Perícia A requerida alega, preliminarmente, a incompetência absoluta dos Juizados Especiais, sustentando que a necessidade de perícia técnica é essencial para a análise do mérito da presente ação. Segundo a requerida, o autor adquiriu um Kit Ar Condicionado da empresa e o encaminhou para uma empresa terceira para instalação. Alega ainda que a perícia técnica seria necessária para identificar o problema ocorrido com o produto.Entretanto, conforme se verifica nos autos, o produto foi devolvido ao fabricante para o conserto através da garantia, o que impossibilita a realização de perícia técnica, pois o bem em questão já foi submetido ao reparo pelo fornecedor. O fato de o produto ter sido devolvido para reparo dentro da garantia exclui a possibilidade de a perícia ser realizada no item original, uma vez que não está mais na mesma condição em que se encontrava quando da alegada falha.Portanto, REJEITO a preliminar ventilada.Não havendo mais preliminares a serem dirimidas, passo a análise de mérito.MÉRITOO ponto fundamental da presente demanda consiste em determinar se o autor tem direito à restituição do valor pago pelo ar-condicionado eletrônico, que apresentou defeito dois dias após a instalação, considerando as circunstâncias do caso e a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor.Inicialmente, esclareço que a relação jurídica entre as partes é, claramente, de consumo, devendo ser aplicado ao presente caso o Código de Defesa do Consumidor. É consabido que, ao caso vertente, emprega-se a legislação consumerista, nos moldes preconizados no artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor. A relação jurídica em questão é tipicamente de consumo, incidindo no caso o disposto no artigo 6º, VIII do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe sobre a facilitação da defesa do consumidor em Juízo, inclusive com a inversão do ônus da prova em seu favor.Ademais, por se tratar de relação de consumo, incide o disposto no artigo 14 do diploma legal: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. E o §1º deste mesmo artigo dispõe que o serviço é defeituoso quando não fornece segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, dentre as quais: o modo de seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam e a época em que foi fornecido. Conforme dispõe o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, o consumidor possui o direito de desistir do contrato no prazo de 7 (sete) dias, contados a partir da assinatura do contrato ou do ato de recebimento do produto ou serviço, vejamos: Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.Contudo, conforme preconiza o referido artigo, o direito de desistência do contrato no prazo de 7 (sete) dias é aplicável somente quando a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente em situações de venda à distância, como compras realizadas por telefone ou em domicílio. No caso em análise, conforme áudio e imagem colacionados ao evento nº 19 – arquivo 06, não se verifica a ocorrência de tal modalidade de venda, uma vez que o próprio autor declarou: “Pois é, e eu comprei pessoalmente aí com você, né?”, após a empresa ter informado que a devolução seria restrita a compras realizadas online. Assim, como o autor realizou a compra pessoalmente no balcão e teve contato visual com o produto, não se aplica o direito de arrependimento previsto no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor. Segundo documentos colacionados observa-se que o autor efetuou a compra do ar-condicionado no dia 21/09/2024 (evento nº 01 – arquivo nº 05 – fl. 23), e a instalação foi realizada no mesmo dia, conforme comprovante anexado ao evento nº 01 – arquivo nº 06 – fl. 24. No dia 23/09/2024, o produto apresentou defeito, e o autor devolveu o produto à loja. O produto foi, então, encaminhado para a assistência técnica em 26/09/2024, conforme demonstrado no evento nº 19 – arquivo nº 02 – fl. 70.Em 17/11/2024, foi disponibilizada ao autor uma nova peça intacta, que poderia ser retirada pelo autor, em razão da garantia oferecida, conforme documentação no evento nº 19 – arquivo nº 09 – fl. 71, contudo o autor não quis a restituição do produto.De acordo com o art. 18 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), em caso de vício do produto, não sanado no prazo máximo de 30 dias, o consumidor pode exigir, alternativamente e à sua escolha a substituição do produto, a restituição do valor ou o abatimento. Vejamos: Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;III - o abatimento proporcional do preço.Sobre o tema, já manifestou este egrégio Tribunal de Justiça: (...)3. Vício do produto de forma reiterada. Defeito de aparelho multimídia de veículo. Restituição da quantia paga devida. Sobre o direito a restituição do valor pago pelo produto, o Código de Defesa do Consumidor é claro, esgotado o prazo legal (30 dias) e não sanado o vício pelo fornecedor, faculta-se para o consumidor às alternativas que lhe são dispensadas pelo artigo 18, §1º, I, II e III, quais sejam: substituição do produto por outros da mesma espécie em perfeitas condições de uso, restituição da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos ou abatimento proporcional do preço...(TJGO, Apelação Cível nº 5569468-55, 6ª Câmara Cível, Desembargador Dr. Jeronymo Pedro Villas Boas, DJ de 21/08/2023). No presente caso, conforme consta dos autos, o produto novo disponibilizado ao autor ultrapassou o prazo de 30 dias estabelecido para a resolução do vício. Dessa forma, o autor tem o direito à restituição do valor pago, devidamente atualizado, conforme previsto no art. 18, §1º, II, do CDC.Quanto as despesas efetuadas referente a mão de obra no valor de R$1.000,00 (mil reais), verificando que esta encontra-se devidamente comprovada através do recibo juntado na inicial, entendo que também deverá ser restituída diante do já fundamentado. No entanto, as restituições deveram ser feitas de forma simples, ou seja, no montante original pago, uma vez que não estão presentes os requisitos legais para a devolução em dobro, conforme pleiteado pelo autor. O artigo 42, parágrafo único, do CDC, que trata da repetição do indébito em dobro, exige que haja cobrança indevida e má-fé por parte do fornecedor, o que não se verifica no caso em questão, pois a ré não agiu com dolo ou intenção de lesar o autor. Assim, a restituição do valor pago deve ocorrer de forma simples, garantindo ao consumidor o reembolso integral sem, contudo, gerar o enriquecimento sem causa. Por fim, no tocante ao pedido de compensação por dano moral, entendo que não restaram configurados no caso em análise.Inicialmente, cabe destacar que o dano moral indenizável é aquele que ultrapassa o mero aborrecimento do cotidiano, causando abalo significativo aos direitos da personalidade, como a honra, imagem, integridade psíquica ou dignidade da pessoa.O Código de Defesa do Consumidor visa proteger o consumidor contra práticas abusivas e garantir a qualidade dos produtos e serviços, porém, não se verifica, no presente caso, um abalo psicológico ou humilhação que exceda o mero dissabor do cotidiano. Os vícios do produto e as dificuldades enfrentadas para a sua reparação, embora incômodos e frustrantes, não atingiram um grau de gravidade que justifique a reparação por danos morais. Nesse sentido:APELAÇÃO CÍVEL. Compra e venda. Ação de restituição de valores c.c. indenização por danos morais. Sentença de parcial procedência. Apelo do autor. Aquisição de produto (televisão) pela internet para utilização em estabelecimento comercial. Constatado defeito em televisor que impossibilita seu uso. Inércia da loja acionada quanto à substituição do bem por outro de igual característica ou a devolução do valor equivalente. Pretensão à indenização por danos morais. Impossibilidade. Falha na prestação dos serviços pela acionada que, no caso concreto, não se eleva ao patamar de dano extrapatrimonial indenizável. Inadimplemento contratual. Ausência de situação excepcional. Mero aborrecimento. Danos morais não caracterizados. Sentença mantida. RECURSO IMPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1000710-77.2024.8.26.0352; Relator(a): João Casali; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro de Miguelópolis -1ª Vara; Data do Julgamento: 16/05/2025; Data de Registro: 16/05/2025) Assim, o pedido de indenização por danos morais deve ser rejeitado, considerando que os aborrecimentos enfrentados pelo autor não ultrapassam os limites do razoável e esperado nas relações de consumo. É o que basta.DISPOSITIVODiante do exposto, PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial, e CONDENO a parte requerida a restituir ao autor o valor de R$ 6.860,00 (seis mil oitocentos e sessenta reais), corrigido monetariamente pelo IPCA do desembolso até a citação, sendo que da citação em diante deve incidir apenas a taxa SELIC, índice responsável por atualizar e acrescer de juros de mora, nos termos do art. 406, §1º c/c art. 389, parágrafo único do Código Civil, alterado pela lei 14.905/2024. Sem custas e honorários advocatícios em primeira instância, nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95.Caso seja interposto tempestivamente recurso inominado e recolhido o respectivo preparo, salvo se a parte for beneficiária da gratuidade da justiça, INTIME-SE a parte recorrida para apresentar contrarrazões no prazo legal de dez dias (art. 42, § 2°, da Lei n° 9.099/95).Após o trânsito em julgado, e nada mais sendo requerido, arquivem-se os autos com as cautelas de praxe.A presente Sentença possui força de Mandado/Ofício, nos termos dos artigos 136 à 139 do Código de Normas e Procedimentos do Foro, da Corregedoria do Estado de Goiás.Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. Expeça-se o necessário.São Simão/GO, datado e assinado digitalmente.Filipe Luis PerucaJuiz de Direito Respondente

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Processo nº 6061032-04.2024.8.09.0173

ID: 316320832

Tribunal: TJGO Órgão: São Simão - Juizado Especial Cível Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 6061032-04.2024.8.09.0173

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

EIP EMPRESAS LTDA

Sentença

Advogados:

PAULO HENRIQUE ALVES DE OLIVEIRA

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Poder Judiciário Comarca de São Simão Estado de Goiás Gabinete do Juiz Filipe Luis Peruca Autos n.º: 6061032-04.2024.8.09.0173Requerente: Darley Dias BorgesRequerido: Eip Empresas LtdaN… Poder Judiciário Comarca de São Simão Estado de Goiás Gabinete do Juiz Filipe Luis Peruca Autos n.º: 6061032-04.2024.8.09.0173Requerente: Darley Dias BorgesRequerido: Eip Empresas LtdaNatureza da Ação: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimento do Juizado Especial CívelSENTENÇAVistos e etc.Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS ajuizada por DARLEY DIAS BORGES em face de IMPERIAR REFRIGERAÇÃO AUTOMOTIVA já devidamente qualificadas nos autos. Tendo por base o disposto nos artigos 2º e 38 da Lei nº 9.099/95, fica dispensado o relatório pormenorizado desta sentença, em razão dos princípios que norteiam os juizados especiais, quais sejam: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade.DECIDO.A questão jurídica versada, mesmo de direito e de fato, acha-se suficientemente demonstrada pela documentação trazida pelas partes, não havendo a necessidade da realização de provas outras, além daquelas já encartadas nos autos.Nessa perspectiva, resta pacificado que, sendo o juiz o destinatário da prova, somente a ele cumpre aferir sobre a necessidade ou não de sua realização. Havendo nos autos elementos de prova documental suficientes para formar o convencimento do julgador, inocorre cerceamento de defesa se julgada antecipadamente a lide. O feito comporta, dessa forma, julgamento antecipado (artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil), porquanto a medida não é mera faculdade, mas dever que a lei impõe ao magistrado (artigo 6º, do Código de Processo Civil) em homenagem ao princípio constitucional da razoável duração do processo, passo ao exame da causa. PRELIMINARESDa Ilegitimidade Passiva A requerida alega sua ilegitimidade passiva para figurar no polo passivo da presente demanda, uma vez que, de acordo com sua argumentação, sua atividade se restringe à comercialização do produto. Em sua defesa, a requerida sustenta que a responsabilidade pela instalação do kit de ar-condicionado adquirido pelo autor não lhe compete, pois o autor contratou empresa terceira para realizar a montagem, sendo o valor pago àquela empresa de R$ 1.000,00 (mil reais), conforme relato do autor.Entretanto, é necessário analisar se, em razão do vício do produto ou defeito na comercialização e orientação oferecida pela requerida, pode haver responsabilidade solidária ou subsidiária por danos materiais decorrentes do processo de instalação e funcionamento do equipamento. A mera alegação de comercialização não exclui a possibilidade de responsabilidade da requerida, especialmente se for verificado que a venda do produto envolveu informações incorretas ou a ausência de instruções necessárias para a instalação correta do equipamento.A análise da legitimidade passiva dependerá da verificação das condições em que o produto foi fornecido, das obrigações contratuais da empresa fornecedora e da responsabilidade da empresa montadora.Desse modo, REJEITO a preliminar suscitada.Incompetência absoluta dos juizados especiais – Necessidade de Perícia A requerida alega, preliminarmente, a incompetência absoluta dos Juizados Especiais, sustentando que a necessidade de perícia técnica é essencial para a análise do mérito da presente ação. Segundo a requerida, o autor adquiriu um Kit Ar Condicionado da empresa e o encaminhou para uma empresa terceira para instalação. Alega ainda que a perícia técnica seria necessária para identificar o problema ocorrido com o produto.Entretanto, conforme se verifica nos autos, o produto foi devolvido ao fabricante para o conserto através da garantia, o que impossibilita a realização de perícia técnica, pois o bem em questão já foi submetido ao reparo pelo fornecedor. O fato de o produto ter sido devolvido para reparo dentro da garantia exclui a possibilidade de a perícia ser realizada no item original, uma vez que não está mais na mesma condição em que se encontrava quando da alegada falha.Portanto, REJEITO a preliminar ventilada.Não havendo mais preliminares a serem dirimidas, passo a análise de mérito.MÉRITOO ponto fundamental da presente demanda consiste em determinar se o autor tem direito à restituição do valor pago pelo ar-condicionado eletrônico, que apresentou defeito dois dias após a instalação, considerando as circunstâncias do caso e a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor.Inicialmente, esclareço que a relação jurídica entre as partes é, claramente, de consumo, devendo ser aplicado ao presente caso o Código de Defesa do Consumidor. É consabido que, ao caso vertente, emprega-se a legislação consumerista, nos moldes preconizados no artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor. A relação jurídica em questão é tipicamente de consumo, incidindo no caso o disposto no artigo 6º, VIII do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe sobre a facilitação da defesa do consumidor em Juízo, inclusive com a inversão do ônus da prova em seu favor.Ademais, por se tratar de relação de consumo, incide o disposto no artigo 14 do diploma legal: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. E o §1º deste mesmo artigo dispõe que o serviço é defeituoso quando não fornece segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, dentre as quais: o modo de seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam e a época em que foi fornecido. Conforme dispõe o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, o consumidor possui o direito de desistir do contrato no prazo de 7 (sete) dias, contados a partir da assinatura do contrato ou do ato de recebimento do produto ou serviço, vejamos: Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.Contudo, conforme preconiza o referido artigo, o direito de desistência do contrato no prazo de 7 (sete) dias é aplicável somente quando a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente em situações de venda à distância, como compras realizadas por telefone ou em domicílio. No caso em análise, conforme áudio e imagem colacionados ao evento nº 19 – arquivo 06, não se verifica a ocorrência de tal modalidade de venda, uma vez que o próprio autor declarou: “Pois é, e eu comprei pessoalmente aí com você, né?”, após a empresa ter informado que a devolução seria restrita a compras realizadas online. Assim, como o autor realizou a compra pessoalmente no balcão e teve contato visual com o produto, não se aplica o direito de arrependimento previsto no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor. Segundo documentos colacionados observa-se que o autor efetuou a compra do ar-condicionado no dia 21/09/2024 (evento nº 01 – arquivo nº 05 – fl. 23), e a instalação foi realizada no mesmo dia, conforme comprovante anexado ao evento nº 01 – arquivo nº 06 – fl. 24. No dia 23/09/2024, o produto apresentou defeito, e o autor devolveu o produto à loja. O produto foi, então, encaminhado para a assistência técnica em 26/09/2024, conforme demonstrado no evento nº 19 – arquivo nº 02 – fl. 70.Em 17/11/2024, foi disponibilizada ao autor uma nova peça intacta, que poderia ser retirada pelo autor, em razão da garantia oferecida, conforme documentação no evento nº 19 – arquivo nº 09 – fl. 71, contudo o autor não quis a restituição do produto.De acordo com o art. 18 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), em caso de vício do produto, não sanado no prazo máximo de 30 dias, o consumidor pode exigir, alternativamente e à sua escolha a substituição do produto, a restituição do valor ou o abatimento. Vejamos: Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;III - o abatimento proporcional do preço.Sobre o tema, já manifestou este egrégio Tribunal de Justiça: (...)3. Vício do produto de forma reiterada. Defeito de aparelho multimídia de veículo. Restituição da quantia paga devida. Sobre o direito a restituição do valor pago pelo produto, o Código de Defesa do Consumidor é claro, esgotado o prazo legal (30 dias) e não sanado o vício pelo fornecedor, faculta-se para o consumidor às alternativas que lhe são dispensadas pelo artigo 18, §1º, I, II e III, quais sejam: substituição do produto por outros da mesma espécie em perfeitas condições de uso, restituição da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos ou abatimento proporcional do preço...(TJGO, Apelação Cível nº 5569468-55, 6ª Câmara Cível, Desembargador Dr. Jeronymo Pedro Villas Boas, DJ de 21/08/2023). No presente caso, conforme consta dos autos, o produto novo disponibilizado ao autor ultrapassou o prazo de 30 dias estabelecido para a resolução do vício. Dessa forma, o autor tem o direito à restituição do valor pago, devidamente atualizado, conforme previsto no art. 18, §1º, II, do CDC.Quanto as despesas efetuadas referente a mão de obra no valor de R$1.000,00 (mil reais), verificando que esta encontra-se devidamente comprovada através do recibo juntado na inicial, entendo que também deverá ser restituída diante do já fundamentado. No entanto, as restituições deveram ser feitas de forma simples, ou seja, no montante original pago, uma vez que não estão presentes os requisitos legais para a devolução em dobro, conforme pleiteado pelo autor. O artigo 42, parágrafo único, do CDC, que trata da repetição do indébito em dobro, exige que haja cobrança indevida e má-fé por parte do fornecedor, o que não se verifica no caso em questão, pois a ré não agiu com dolo ou intenção de lesar o autor. Assim, a restituição do valor pago deve ocorrer de forma simples, garantindo ao consumidor o reembolso integral sem, contudo, gerar o enriquecimento sem causa. Por fim, no tocante ao pedido de compensação por dano moral, entendo que não restaram configurados no caso em análise.Inicialmente, cabe destacar que o dano moral indenizável é aquele que ultrapassa o mero aborrecimento do cotidiano, causando abalo significativo aos direitos da personalidade, como a honra, imagem, integridade psíquica ou dignidade da pessoa.O Código de Defesa do Consumidor visa proteger o consumidor contra práticas abusivas e garantir a qualidade dos produtos e serviços, porém, não se verifica, no presente caso, um abalo psicológico ou humilhação que exceda o mero dissabor do cotidiano. Os vícios do produto e as dificuldades enfrentadas para a sua reparação, embora incômodos e frustrantes, não atingiram um grau de gravidade que justifique a reparação por danos morais. Nesse sentido:APELAÇÃO CÍVEL. Compra e venda. Ação de restituição de valores c.c. indenização por danos morais. Sentença de parcial procedência. Apelo do autor. Aquisição de produto (televisão) pela internet para utilização em estabelecimento comercial. Constatado defeito em televisor que impossibilita seu uso. Inércia da loja acionada quanto à substituição do bem por outro de igual característica ou a devolução do valor equivalente. Pretensão à indenização por danos morais. Impossibilidade. Falha na prestação dos serviços pela acionada que, no caso concreto, não se eleva ao patamar de dano extrapatrimonial indenizável. Inadimplemento contratual. Ausência de situação excepcional. Mero aborrecimento. Danos morais não caracterizados. Sentença mantida. RECURSO IMPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1000710-77.2024.8.26.0352; Relator(a): João Casali; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro de Miguelópolis -1ª Vara; Data do Julgamento: 16/05/2025; Data de Registro: 16/05/2025) Assim, o pedido de indenização por danos morais deve ser rejeitado, considerando que os aborrecimentos enfrentados pelo autor não ultrapassam os limites do razoável e esperado nas relações de consumo. É o que basta.DISPOSITIVODiante do exposto, PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial, e CONDENO a parte requerida a restituir ao autor o valor de R$ 6.860,00 (seis mil oitocentos e sessenta reais), corrigido monetariamente pelo IPCA do desembolso até a citação, sendo que da citação em diante deve incidir apenas a taxa SELIC, índice responsável por atualizar e acrescer de juros de mora, nos termos do art. 406, §1º c/c art. 389, parágrafo único do Código Civil, alterado pela lei 14.905/2024. Sem custas e honorários advocatícios em primeira instância, nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95.Caso seja interposto tempestivamente recurso inominado e recolhido o respectivo preparo, salvo se a parte for beneficiária da gratuidade da justiça, INTIME-SE a parte recorrida para apresentar contrarrazões no prazo legal de dez dias (art. 42, § 2°, da Lei n° 9.099/95).Após o trânsito em julgado, e nada mais sendo requerido, arquivem-se os autos com as cautelas de praxe.A presente Sentença possui força de Mandado/Ofício, nos termos dos artigos 136 à 139 do Código de Normas e Procedimentos do Foro, da Corregedoria do Estado de Goiás.Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. Expeça-se o necessário.São Simão/GO, datado e assinado digitalmente.Filipe Luis PerucaJuiz de Direito Respondente

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Processo nº 1000710-40.2025.8.11.0100

ID: 299622214

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE BRASNORTE Classe: AUTO DE PRISãO EM FLAGRANTE Nº Processo: 1000710-40.2025.8.11.0100

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DOUGLAS PIRES DA COSTA YURI DA SILVA SANTOS

Decisão

Advogados:

GLAUCIO ARAUJO DE SOUZA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE BRASNORTE ATA DE AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA Processo n.º 1000710-40.2025.8.11.0100 PRESENTES Juiz Substituto: Romeu da Cunha Gomes. Promotora de Justiç… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE BRASNORTE ATA DE AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA Processo n.º 1000710-40.2025.8.11.0100 PRESENTES Juiz Substituto: Romeu da Cunha Gomes. Promotora de Justiça: Roberta Camara Vieira Jacob. Autuado: Douglas Pires da Costa. Autuado: Yuri da Silva Santos. Advogado: Gláucio Araújo de Souza. Data/hora: 13.06.2025, às 17 horas. Meio de realização: presencial. Aberta a audiência de custódia referente aos presentes autos, foram apregoadas as partes e observadas todas as formalidades legais, assegurando-se aos custodiados o direito à entrevista prévia e reservada com seu defensor, nos termos do artigo 19 da Resolução n.º 329/2020 do Conselho Nacional de Justiça. O ato foi realizado de forma presencial, na sala de audiências do Fórum da Comarca de Brasnorte/MT, com a presença do MM. Juiz Substituto, Dr. Romeu da Cunha Gomes, e dos custodiados Douglas Pires da Costa e Yuri da Silva Santos. Participaram da audiência, por videoconferência, a representante do Ministério Público, Drª. Roberta Camara Vieira Jacob, e o advogado constituído dos custodiados, Dr. Gláucio Araújo de Souza. Na sequência, foi realizada a oitiva individual dos custodiados, oportunidade em que prestaram informações sobre suas condições pessoais, antecedentes, vínculos familiares e comunitários, atividades laborais, bem como acerca das circunstâncias da prisão que originou o presente procedimento. QUALIFICAÇÃO DO AUTUADO DOUGLAS PIRES DA COSTA Nome: Douglas Pires da Costa; Apelido: não informado; Pai: Aroldo Gregório da Costa; Mãe: Aparecida Brandao Pires da Costa; Data de Nascimento: 09.09.2002; RG: 27901122 SSP MT; CPF: 129.186.136-06; Possui irmão gêmeo: não; Nacionalidade: Brasileiro; Naturalidade: Contagem/MG; Idioma falado: Português; Estado Civil: solteiro; Sexo: masculino; Identidade de gênero: homem cisgênero; Orientação sexual: heterossexual; Raça/Cor: pardo; Endereço: Rua Jauru, n.º 461, Bairro Santo Amaro, Brasnorte/MT, CEP: 78350000; Status da residência: alugada; Telefone: não informado; Nível de Escolaridade: ensino médio incompleto; Atualmente estuda: não; Situação econômica: autônomo; Possui dependente(s): não; Nome(s) completo(s) do(s) dependentes(s): prejudicado; Data de nascimento do(s) dependente(s): prejudicado; Grau de parentes: prejudicado; É o único responsável pelo dependente: prejudicado; Possui doença grave: não; Possui alguma deficiência: não; Faz uso de medicamento obrigatório: não; Faz uso de álcool ou droga: sim, maconha. QUALIFICAÇÃO DO AUTUADO YURI DA SILVA SANTOS Nome: Yuri da Silva Santos; Apelido: não informado; Pai: Leandro dos Santos Diniz; Mãe: Adail Maria da Silva; Data de Nascimento: 18.11.1999; RG: 29284147 SSP MT; CPF: 061.117.121-01; Possui irmão gêmeo: não; Nacionalidade: Brasileiro; Naturalidade: Rosário Oeste/MT; Idioma falado: Português; Estado Civil: convivente; Sexo: masculino; Identidade de gênero: homem cisgênero; Orientação sexual: heterossexual; Raça/Cor: negro; Endereço: Rua Antônio Arlindo Mayer, Bairro Aeroporto, Brasnorte/MT, CEP: 78350000; Status da residência: alugada; Telefone: não informado; Nível de Escolaridade: ensino médio completo; Atualmente estuda: não; Situação econômica: desempregado; Possui dependente(s): não; Nome(s) completo(s) do(s) dependentes(s): prejudicado; Data de nascimento do(s) dependente(s): prejudicado; Grau de parentes: prejudicado; É o único responsável pelo dependente: prejudicado; Possui doença grave: não; Possui alguma deficiência: não; Faz uso de medicamento obrigatório: não; Faz uso de álcool ou droga: não. DELIBERAÇÃO EM AUDIÊNCIA Com a palavra, a representante do Ministério Público, inicialmente, manifestou-se pelo relaxamento da prisão em flagrante de Yuri da Silva Santos, diante da ausência de indícios mínimos de autoria que justificassem a sua custódia. No tocante ao custodiado Douglas Pires da Costa, opinou pela homologação da prisão em flagrante, por entender configuradas as hipóteses do artigo 302 do Código de Processo Penal. Na análise da necessidade da custódia cautelar, requereu a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva, por considerar presentes os requisitos do artigo 312 do CPP, notadamente a necessidade de resguardar a ordem pública, tendo em vista a gravidade concreta da conduta e a periculosidade do agente. Por fim, opinou favoravelmente ao pedido de quebra do sigilo telemático do aparelho celular apreendido em poder do custodiado Douglas. Por sua vez, a Defesa técnica dos custodiados pugnou pelo relaxamento da prisão de ambos, sob o argumento de que houve violação de domicílio, diante da inexistência de fundada suspeita que autorizasse o ingresso forçado na residência, além da ausência de indícios mínimos de autoria delitiva. Subsidiariamente, caso não acolhido o pedido de relaxamento, pleiteou a concessão de liberdade provisória mediante aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, nos termos do artigo 319 do Código de Processo Penal. Pelo MM. Juiz foi proferida a seguinte decisão: “Trata-se de comunicação de prisão em flagrante de Douglas Pires da Costa e Yuri da Silva Santos, devidamente qualificados nos autos, pela suposta prática dos crimes de tráfico de drogas e posse irregular de arma de fogo de uso permitido, previstos, respectivamente, no artigo 33 da Lei n.º 11.343/2006 e no artigo 12 da Lei n.º 10.826/2003. 1. Inicialmente, cumpre apreciar a alegação defensiva de nulidade da prisão, fundada na suposta ausência de fundada suspeita que legitimasse o ingresso dos policiais na residência e a subsequente apreensão dos objetos ilícitos. Pois bem. Embora a informação oriunda do setor de inteligência, que indicava a possível prática de tráfico de drogas no local e descrevia as características físicas do suspeito, não constitua, isoladamente, fundamento suficiente para autorizar o ingresso forçado em domicílio, verifico que, no caso concreto, a atuação policial foi motivada por circunstância adicional ocorrida no momento da abordagem. Conforme consta, ao perceber a aproximação da guarnição policial, o custodiado Douglas teria arremessado um objeto para o interior da residência, gesto interpretado pelos agentes como uma possível tentativa de ocultação de material ilícito. Diante dessa conduta, os policiais se aproximaram da entrada do imóvel com o intuito de averiguar o que havia sido lançado e, nesse contexto, afirmaram ter visualizado uma substância com aparência semelhante à maconha sobre o balcão da cozinha, o que, segundo consignado, motivou o ingresso no domicílio sob a justificativa de flagrante delito. À luz desse conjunto fático, os elementos até aqui reunidos indicam que a atuação policial encontra amparo nas exceções reconhecidas pela jurisprudência ao direito constitucional à inviolabilidade do domicílio, notadamente diante da possível configuração de situação de flagrante delito, razão pela qual não se vislumbra, por ora, nulidade a ser reconhecida. 2. Ultrapassada a análise preliminar da legalidade do ingresso no domicílio, passo ao exame individualizado da prisão em flagrante de cada custodiado, iniciando-se por YURI DA SILVA SANTOS. A partir da análise dos elementos constantes dos autos, constata-se a inexistência de indícios mínimos capazes de vincular o custodiado à prática das condutas delituosas que motivaram a lavratura do auto de prisão em flagrante. Conforme narrado nos autos, a prisão de Yuri decorreu unicamente de sua presença ao lado de Douglas no momento da abordagem policial e da constatação de que possuía antecedentes criminais, circunstâncias que, embora possam ter motivado a condução inicial, não são suficientes para justificar sua segregação cautelar, pois não estabelecem qualquer vínculo concreto com os objetos apreendidos nem indicam, ainda que de forma indiciária, sua participação nas condutas delituosas imputadas ao corréu. Dessa forma, diante da inexistência de elementos mínimos de autoria delitiva, impõe-se o relaxamento da prisão, nos termos do artigo 5º, inciso LXV, da Constituição Federal e do artigo 310, inciso I, do Código de Processo Penal. Ante o exposto, RELAXO a prisão em flagrante de YURI DA SILVA SANTOS, com fundamento no artigo 310, inciso I, do Código de Processo Penal. 3. Superada a análise da situação do custodiado Yuri da Silva Santos, passa-se à apreciação da legalidade da prisão em flagrante de Douglas Pires da Costa. Da análise dos elementos constantes nos autos, concluo que a prisão em flagrante se deu em conformidade com as hipóteses legais previstas no artigo 302 do Código de Processo Penal. Com efeito, a prisão em flagrante é medida cautelar de restrição à liberdade que exige apenas a presença de indícios de materialidade e autoria, não se exigindo, neste momento, juízo aprofundado acerca da ilicitude ou da culpabilidade da conduta. Nos termos do artigo 304, caput, do Código de Processo Penal, foram colhidos os depoimentos do condutor e do custodiado, devidamente reduzidos a termo e assinados por todos os presentes, em estrita observância à legislação vigente. Também foi entregue ao custodiado a respectiva nota de culpa, nos moldes do art. 306 do CPP, contendo a descrição formal das imputações, bem como a identificação do condutor e das testemunhas ouvidas no auto de prisão em flagrante. No tocante à legalidade da prisão, não há, neste momento, qualquer elemento que a invalide ou que denote vício formal. Todavia, diante da alegação do custodiado de que teria sofrido agressões físicas no momento da abordagem policial, bem como da apresentação espontânea de vermelhidão na região das costas, supostamente provocada por um dos agentes estatais, DETERMINO a realização de novo exame de corpo de delito, a fim de aferir eventual existência e extensão de lesões corporais decorrentes da atuação policial. Diante do exposto, reconheço a legalidade da prisão em flagrante de Douglas Pires da Costa, uma vez que o auto atende aos requisitos formais exigidos, em conformidade com os artigos 304 e 306 do Código de Processo Penal e com os incisos LXI, LXII, LXIII e LXIV do artigo 5º da Constituição Federal, razão pela qual HOMOLOGO o auto de prisão em flagrante, por estarem presentes os pressupostos legais, sem prejuízo do regular prosseguimento das investigações policiais. 4. Concluída a análise da legalidade da prisão em flagrante, passo à apreciação da necessidade de decretação da prisão preventiva do custodiado Douglas Pires da Costa. Da análise do regramento legal (art. 312 do CPP), tem-se que “a preventiva poderá ser decretada quando houver prova da existência do crime (materialidade) e indício suficiente de autoria, mais a demonstração de um elemento variável: (a) garantia da ordem pública; ou (b) garantia da ordem econômica; ou (c) por conveniência da instrução criminal; ou (d) para assegurar a aplicação da lei penal. Para qualquer dessas hipóteses, é imperiosa a demonstração concreta e objetiva de que tais pressupostos incidem na espécie, assim como deve ser insuficiente o cabimento de outras medidas cautelares, nos termos do art. 282, § 6º, do Código de Processo Penal” (STF, HC 126846, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 17/03/2015). No presente caso, a materialidade delitiva encontra-se demonstrada, em juízo preliminar, por meio do boletim de ocorrência (id. 197530078), do auto de apreensão (id. 197530089), dos autos de constatação preliminar de entorpecente (ids. 197530085 e 197530086), dos laudos de eficiência de arma de fogo (ids. 197530087 e 197530088), das imagens dos objetos apreendidos (id. 197530080), bem como pelas declarações prestadas pelos policiais que realizaram a abordagem (ids. 197530081 e 197530083). Quanto aos indícios suficientes de autoria, estes igualmente se fazem presentes, especialmente em razão dos relatos firmes e coerentes dos agentes responsáveis pela prisão, corroborados pelo interrogatório do autuado (id. 197531043), revelando, neste momento processual, elementos suficientes para a imputação provisória da prática dos delitos. Nesse cenário, entendo ser caso de acolhimento da representação formulada pela autoridade policial, a qual conta com parecer favorável do Ministério Público, diante da gravidade concreta dos fatos. Explico. Como é sabido, a prisão preventiva constitui medida de natureza excepcional, só podendo ser decretada quando presentes os requisitos legais e diante da demonstração de que nenhuma outra medida cautelar menos gravosa é suficiente para resguardar os fins do processo penal, devendo ser imposta com parcimônia e em estrita observância aos princípios constitucionais do devido processo legal, da presunção de inocência e da proporcionalidade. Não obstante a primariedade e a pouca idade do custodiado, verifica-se, no caso concreto, a presença de elementos objetivos e contemporâneos que impõem a segregação cautelar como única medida adequada e suficiente à garantia da ordem pública, nos termos do artigo 312 do Código de Processo Penal. Isso porque a gravidade concreta da conduta imputada ao custodiado decorre não apenas da natureza dos delitos em apuração, mas, sobretudo, da expressiva quantidade, variedade e organização dos materiais ilícitos apreendidos, dentre os quais se destacam porções de haxixe e maconha, quantia significativa em dinheiro em espécie, balança de precisão, 82 pinos comumente utilizados para embalo de entorpecentes, além de diversas armas de fogo (espingardas e pistolas) e munições, conforme consta do auto de apreensão. Esse conjunto probatório, indica, em juízo preliminar, a existência de uma possível estrutura criminosa minimamente organizada voltada à mercancia ilícita de entorpecentes, o que, nesta fase, afasta a tese de posse eventual para consumo próprio. Ademais, a apreensão de armamento variado, incluindo espingardas, pistolas e munições, não apenas reforça a gravidade concreta dos fatos, como também imprime à conduta contornos de maior periculosidade, revelando risco concreto de reiteração delitiva, circunstâncias que, consideradas em conjunto, evidenciam a necessidade da segregação cautelar como medida idônea e proporcional para a tutela da ordem pública. Esse entendimento, inclusive, encontra respaldo na jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, que reconhece a quantidade e a variedade das drogas apreendidas como fundamento idôneo para a decretação da prisão preventiva, a exemplo do que restou decidido no AgRg no RHC n.º 207.353/MT, rel. Min. Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do TJSP), Sexta Turma, julgado em 14/5/2025, DJEN de 20/5/2025. Tenho, ainda, que a utilização desses elementos para subsidiar a presente decisão não viola o direito constitucional à presunção de inocência, previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, uma vez que, para fins de decretação da prisão preventiva, o que se exige é a existência de indícios mínimos da prática de fatos que demonstrem a periculosidade do agente e o risco concreto de reiteração delitiva, e não o status processual do custodiado ou a aplicação antecipada de consequência jurídica aos eventos em apuração, entendimento esse já reconhecido pela jurisprudência (nesse sentido: N.U 1007499-98.2024.8.11.0000, Câmaras Isoladas Criminais, Rel. Des. Jorge Luiz Tadeu Rodrigues, Segunda Câmara Criminal, julgado em 29/05/2024, publicado no DJE de 29/05/2024). Além disso, as medidas cautelares diversas da prisão não se mostram, neste momento, aptas a assegurar os fins a que se destina a prisão preventiva, nos termos do artigo 282, § 6º, do Código de Processo Penal, uma vez que não seriam suficientes para neutralizar o risco concreto de reiteração delitiva, tampouco para resguardar a ordem pública diante da gravidade dos fatos apurados. Por fim, a medida encontra respaldo também no artigo 313, inciso I, do Código de Processo Penal, uma vez que os delitos imputados são dolosos e apenados, somados, com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos. Diante de todo o exposto, CONVERTO a prisão em flagrante de DOUGLAS PIRES DA COSTA em PRISÃO PREVENTIVA, por se tratar da única medida, neste momento, apta a garantir a ordem pública, com fundamento nos artigos 312, 313, inciso I, e 282, § 6º, todos do Código de Processo Penal. 5. Quanto ao pedido de quebra de sigilo de dados telemáticos dos aparelhos celulares apreendidos, entendo que a medida deve ser parcialmente acolhida. Com relação ao aparelho apreendido em posse de Douglas Pires da Costa, a medida revela-se necessária, adequada e proporcional ao regular desenvolvimento das investigações, considerando a natureza do delito imputado, os elementos já colhidos nos autos e a plausibilidade de que o dispositivo contenha informações relevantes à apuração dos fatos, tais como registros de comunicação, arquivos, mensagens, contatos e dados de geolocalização, que possam evidenciar a dinâmica da atividade delitiva. A inviolabilidade da intimidade e das comunicações constitui direito fundamental assegurado pelo artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, mas de caráter relativo, podendo ser afastado por decisão judicial devidamente fundamentada, nos termos do artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, desde que presentes os requisitos da justa causa, necessidade e proporcionalidade. No caso em análise, o aparelho foi apreendido no contexto de flagrante relacionado ao tráfico de drogas, havendo nos autos elementos que indicam, de forma plausível, que o dispositivo pode conter informações relevantes à dinâmica da atividade criminosa, como registros de comunicação, trocas de mensagens, arquivos, contatos e dados de geolocalização. Embora a regra seja a proteção à privacidade, o ordenamento jurídico impõe à autoridade policial o dever de reunir elementos que auxiliem na elucidação da materialidade e das circunstâncias do delito, nos termos do artigo 6º, inciso III, do Código de Processo Penal. Por essa razão, a análise dos dados já armazenados no dispositivo mostra-se, assim, medida pertinente para o aprofundamento da investigação, especialmente em se tratando de crime que, por sua própria natureza, envolve estruturação em rede e colaboração entre diversos agentes. Importa ressaltar, ademais, que a medida pleiteada não se confunde com interceptação telefônica, por não envolver a captação de comunicações em tempo real, tratando-se, na verdade, de acesso a dados já armazenados no aparelho, o que reforça sua adequação e proporcionalidade no caso concreto. Diferente é a situação do custodiado Yuri da Silva Santos, cuja prisão foi relaxada diante da ausência de indícios mínimos de autoria e da inexistência de vínculo concreto com os objetos ilícitos apreendidos, circunstância que, por si só, afasta a existência de justa causa para a adoção de medida invasiva como a quebra de sigilo de dados de seu aparelho celular, não se revelando presente qualquer motivação idônea que a justifique. Diante do exposto, com fundamento no artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, e em consonância com o parecer ministerial, ACOLHO PARCIALMENTE o pedido formulado pela autoridade policial para AUTORIZAR a quebra do sigilo dos dados telemáticos armazenados no aparelho celular apreendido exclusivamente em posse do custodiado DOUGLAS PIRES DA COSTA, atualmente recolhido na unidade policial, restringindo-se o acesso aos dados já existentes no dispositivo. Por outro lado, INDEFIRO a medida em relação ao aparelho pertencente a YURI DA SILVA SANTOS, devendo o referido aparelho ser restituído ao seu titular. 6. Para tanto, DETERMINO à Secretaria a adoção das seguintes providências: 1. EXPEÇA-SE alvará de soltura, via BNMP 3.0, em favor de YURI DA SILVA SANTOS. 2. EXPEÇA-SE mandado de prisão pelo sistema BNMP 3.0 em desfavor de DOUGLAS PIRES DA COSTA, a fim de regularizar sua situação junto ao sistema prisional; 3. OFICIE-SE à Autoridade Policial para ciência desta decisão e para que observe o prazo legal para a conclusão do inquérito policial; 4. COMUNIQUE-SE às Comarcas em que o custodiado Douglas Pires da Costa eventualmente responda a outra ação penal, informando sobre a prisão em flagrante e sua conversão em prisão preventiva. 5. INTIME-SE à Autoridade Policial para que proceda ao acesso aos dados armazenados no aparelho celular apreendido, advertindo-se que a medida abrange mensagens, registros de aplicativos de comunicação e arquivos armazenados na memória do dispositivo, limitando-se estritamente às informações relacionadas aos fatos sob investigação, com a devida exclusão de conversas ou arquivos alheios aos delitos apurados, em observância à garantia constitucional da intimidade, devendo ser rigorosamente observada a manutenção da cadeia de custódia, bem como o prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento da diligência e a apresentação do respectivo relatório a este Juízo. 6. Após a juntada do relatório de extração de dados, DÊ-SE vista ao Ministério Público para manifestação e requerimento do que entender pertinente. 7. Caso o inquérito policial já tenha sido distribuído, TRANSLADEM-SE os presentes autos ao feito principal, promovendo-se, em seguida, o arquivamento destes autos, com as anotações e baixas de praxe. Cumpra-se, inclusive em plantão, expedindo-se quanto o mais necessário, servindo a presente, por cópia, como mandado, ofício ou carta.” Nada mais havendo a consignar, por mim, Ingrid Bastos, Assessora de Gabinete, foi lavrado o presente termo. Em virtude de o ato ter sido realizado inteiramente em ambiente digital, dispensada a assinatura das partes, em atenção do artigo 26 do Provimento do TJMT nº 15/2020. Brasnorte/MT, documento datado e assinado digitalmente. ROMEU DA CUNHA GOMES Juiz Substituto

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Processo nº 3000236-08.2023.8.06.0112

ID: 315093322

Tribunal: TJCE Órgão: 3º Gabinete da 2ª Câmara de Direito Público Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000236-08.2023.8.06.0112

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

JOSE CLAUDIO FERNANDES DA SILVA

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

JOSE ROBERTO CARNEIRO TORRES

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ANTONUALASOM DO NASCIMENTO ROLIM

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LUCAS TAVARES DE FIGUEIREDO

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ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇAGABINETE DO DESEMBARGADOR LUIZ EVALDO GONÇALVES LEITE PROCESSO: 3000236-08.2023.8.06.0112 - APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTES: JOSE CLAUDIO FERNANDES … ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇAGABINETE DO DESEMBARGADOR LUIZ EVALDO GONÇALVES LEITE PROCESSO: 3000236-08.2023.8.06.0112 - APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTES: JOSE CLAUDIO FERNANDES DA SILVA, MUNICIPIO DE JUAZEIRO DO NORTE APELADOS: MUNICIPIO DE JUAZEIRO DO NORTE, JOSE CLAUDIO FERNANDES DA SILVA RELATOR: DESEMBARGADOR LUIZ EVALDO GONÇALVES LEITE ÓRGÃO JULGADOR: SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÕES CÍVEIS EM AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO. ACIDENTE EM VIA PÚBLICA. OMISSÃO DO MUNICÍPIO. DANO EM VEÍCULO DE TRANSPORTE DE CARGA. DANOS EMERGENTES RECONHECIDOS. LUCROS CESSANTES E DANOS MORAIS INDEFERIDOS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS. I. CASO EM EXAME 1. Apelações cíveis interpostas por ambas as partes litigantes em face de sentença que, em sede de Ação Ordinária de Indenização por Danos Materiais e Morais, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para condenar o ente municipal ao pagamento de R$ 2.062,80, a título de danos materiais (danos emergentes), indeferindo os pleitos de indenização por danos morais e lucros cessantes. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) definir se o Município de Juazeiro do Norte possui responsabilidade civil por danos decorrentes de buracos em via pública; (ii) estabelecer se há provas suficientes para a condenação em lucros cessantes; e (iii) determinar se estão presentes os pressupostos para o deferimento de indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A responsabilidade do Município por danos causados por buracos em vias públicas decorre do dever legal de manutenção e conservação das vias urbanas, conforme prevê o art. 37, § 6º, da CF/1988, sendo objetiva quando decorrente de omissão específica associada à ausência de fiscalização e reparo da malha viária. 4. A responsabilidade do Município por danos causados por buracos em vias públicas decorre do dever legal de manutenção e conservação das vias urbanas, conforme prevê o art. 37, § 6º, da CF/1988, sendo objetiva quando decorrente de omissão específica associada à ausência de fiscalização e reparo da malha viária. 5. Configurado o nexo de causalidade entre a omissão administrativa e os danos materiais sofridos pelo autor (avarias no caminhão), impõe-se a reparação por danos emergentes no valor de R$ 2.062,80, devidamente comprovados por documentos acostados aos autos. 6. A pretensão de indenização por lucros cessantes carece de provas mínimas quanto à renda auferida, à paralisação do veículo e à atividade comercial do autor, não sendo admissível presunção de lucro. A jurisprudência do STJ veda indenização por lucros hipotéticos. 7. Inexistem nos autos elementos que demonstrem ofensa à dignidade da pessoa humana, sofrimento psíquico relevante ou violação de direitos da personalidade que autorizem a indenização por danos morais. O fato não extrapola o mero dissabor cotidiano, sendo incabível a reparação pretendida. IV. DISPOSITIVO 8. Recursos conhecidos e desprovidos. __________________________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CPC/2015. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1963583/SP, Quarta Turma, Rel. Min. Marco Buzzi, j. 13.06.2022. STJ, AgInt no AREsp 2194058/SC, Primeira Turma, Rel. Min. Sérgio Kukina, j. 22.05.2023; TJ-CE, Apelação Cível nº 0052825-59.2020.8.06.0071, Rel. Des. José Tarcílio Souza da Silva, j. 25.11.2024. ACÓRDÃO Vistos, discutidos e relatados os presentes autos em que são partes as acima indicadas, acorda a Segunda Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade, em conhecer dos recursos apelatórios para negar-lhes provimento, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. Presidente do Órgão Julgador Desembargador Luiz Evaldo Gonçalves Leite Relator RELATÓRIO Cuidam os autos de apelações cíveis interpostas por JOSÉ CLÁUDIO FERNANDES DA SILVA contra o MUNICÍPIO DE JUAZEIRO DO NORTE, com o fito de reformar a sentença de ID 20996105, da lavra do Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Juazeiro do Norte que, em sede de Ação Ordinária de Indenização por Danos Morais e Materiais ajuizada pelo primeiro recorrente em face do segundo, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: Diante do exposto, com fundamento no art. 487, inc. I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, para fins de: I- CONDENAR o réu a efetuar o pagamento de R$ 2.062,80 (dois mil reais e oitenta centavos) à parte autora autora, a título de danos materiais (danos emergentes), com correção monetária a partir do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ) e juros de mora a contar do evento danoso (Súmula 54 do STJ), devendo incidir exclusivamente a taxa SELIC, nos termos da Emenda Constitucional 113/2021; II- DENEGAR o pedido de condenação do réu ao pagamento de danos materiais (lucros cessantes) e danos morais. Considerando o princípio da sucumbência e por serem promovente e promovida vencedores e vencidos, defino o ganho de causa em favor da parte autora em 60% e em favor da ré em 40%, o que servirá de norte para pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10%, tudo com base no valor da condenação, conforme disposto no art. 86, do CPC/15. Destaca-se que, a exigibilidade em relação à promovente está suspensa em razão da gratuidade judiciária deferida, bem como que o réu é isento de custas processuais (isenção legal). Irresignado parcialmente com a sentença, o autor interpôs o recurso apelatório de ID 20996110, argumentando, em síntese, que faz jus a ser indenizado por danos morais pois o acidente sofrido extrapolou o mero aborrecimento, tendo que lidar com o trabalho de providenciar por conta própria meios para retirar o caminhão dos buracos, além de arcar com os reparos do veículo e os dias parados até a conclusão das manutenções. Assevera que a não condenação do ente público em danos extrapatrimoniais poderá estimular a prática da ilegalidade, isso em virtude da sensação de impunidade do lesante, o qual muitas vezes acredita ter obtido vantagem com o ilícito. Reafirma a responsabilidade do município pelos danos causados, bem como diz que apresentou estimativa dos lucros cessantes relativos aos dias em que o caminhão ficou parado. Com fulcro nesses fundamentos, requereu a parcial reforma da sentença no sentido de que seja o promovido condenado em lucros cessantes e danos morais. Igualmente insatisfeito com a sentença, o promovido interpôs o recurso apelatório de ID 20996113, argumentando, em resumo, que não há que imputar falha ao serviço do município uma vez que, no caso concreto, têm-se a hipótese de aferição da possibilidade de responsabilização civil do Estado decorrente de conduta omissiva, por suposta omissão genérica, indicativa, portando, da necessidade de comprovação da existência de culpa (dolo ou culpa) por parte da Administração para o deferimento do pleito condenatório. Alega que, o ordenamento jurídico (federal, estadual e municipal) não dispõe de qualquer dispositivo de lei direcionado à regulamentação da prática fiscalizatória preventiva que pudesse atribuir à Municipalidade este poder-dever de agir no sentido de coibir processos como os que ocasionaram a abertura do buraco na via. Aduz, ainda, que não há prova de omissão culposa da administração pública, porquanto não recebeu nenhuma notificação de que havia um problema na via pública, não sendo razoável exigir que o ente fiscalize todo o território municipal. Assevera, em mais, que o autor não logrou êxito em provar a ocorrência do dano e sua extensão, na medida em que não foi realizada perícia à época do fato, não se prestando, para tanto, meros recibos colacionados aos autos. Requer, assim, a integral reforma da sentença. Subsidiariamente, requer que o autor seja condenado, de forma isolada, nos ônus da sucumbência. Contrarrazões do promovido repousam no ID 20996114. O autor, por sua vez, apresentou contrarrazões sob ID 20996120. Desnecessária a abertura de vista à Procuradoria-Geral de Justiça, ante a ausência do interesse público na lide (art. 178 do CPC/2015). É o relatório. VOTO Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço das insurgências recursais. O cerne da questão controvertida cinge-se em determinar se é responsabilidade do Município de Juazeiro do Norte a fiscalização e conservação das vias públicas, dentro dos limites do seu território e, em decorrência, se foi correta a condenação do ente em danos materiais (dano emergente) e se deve este ser condenado ao pagamento de lucros cessantes e em danos morais. Estando interligados os argumentos lançados nos dois recursos, passa-se a analisá-los em conjunto. No caso concreto, o promovente informou em sua petição inicial que trabalha com venda de água mineral, fazendo o transporte do produto em veículo próprio (caminhão). Diz que o veículo teve uma de suas rodas tragadas por um enorme buraco na via pública, Rua José Maria Filomeno Vieira, causando-lhe um prejuízo imediato que totalizou, com relação ao caminhão, R$ 2.062,00 (dois mil e sessenta e dois reais), e, relativamente aos garrafões de água que ficaram destruídos, a quantia de R$ 400,00 (quatrocentos reais). Acrescentou que, aproximadamente 12 dias após o primeiro sinistro, sofreu um acidente idêntico em uma outra rua. Explica que, neste caso o piso cedeu com o peso do veículo de transporte, causando-lhe um prejuízo de R$ 340,00 (trezentos e quarenta reais), com a destruição de vários garrafões de água. Disse que, em decorrência do primeiro acidente, o caminhão em que trabalha ficou três dias na oficina, impedindo o autor de exercer o seu ofício, situação que o fez deixar de receber uma média de R$ 2.000,00 (dois mil reais), que seriam os lucros cessantes. Quanto aos danos morais, apenas afirma que o ato ilícito, por si só, configura o direito de a vítima a ser indenizada por dano extrapatrimonial. Por sua vez, o promovido diz que não poderia lhe ser imputada nenhuma responsabilidade civil, pois não ficara demonstrado dolo ou culpa da administração até porque não está obrigado a exercer constante fiscalização sobre as vias públicas, sendo necessário, para tanto, requerimento dos populares, o que não ocorreu na espécie. Assevera, em mais, que para a comprovação dos danos materiais seria necessário a realização de perícia nos locais dos acidentes, o que não foi providenciado na época. Na sentença, o douto magistrado condenou o promovido apenas em parcela dos danos emergentes, equivalente ao valor relativo ao conserto do caminhão (R$ 2.062,80), por entender que não há provas quanto ao montante que teria o autor desembolsado, no que se refere aos garrafões de água possivelmente perdidos no momento dos ocorridos. Pois bem. Antes de mais nada, faz-se necessário estabelecer se o promovido realmente deve ser responsabilizado pela fiscalização e conservação das vias públicas. Quanto à pessoa jurídica de direito público, veja-se o que dispõe o art. 37, § 6º, da Constituição da República (sem grifos no original): Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, o seguinte: (...) § 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Da análise do supramencionado dispositivo constitucional, tem-se que a responsabilidade do Estado - assim compreendida a União, os Estados-membros e os Municípios - é objetiva, sob a modalidade do risco administrativo, respondendo, a Administração Pública, pelos danos que seus agentes causarem a terceiros, sendo, para tanto, suficiente a prova do nexo de causalidade entre o ato ilícito e o dano dele advindo. Todavia, cuidando-se de conduta omissiva, como no caso dos autos, faz-se necessário divisar se essa omissão constitui ou não fato gerador da responsabilidade civil, pois nem toda conduta omissiva retrata negligência do Estado no cumprimento de um dever legal. Sobre o tema, colhe-se escólio do renomado administrativista José dos Santos Carvalho Filho, in Manual de Direito Administrativo, 28 ed. rev. ampl. e atual - São Paulo: Atlas, 2015, p.p. 589-590, ad litteram: Somente quando o Estado se omitir diante do dever legal de impedir a ocorrência do dano é que será responsável civilmente e obrigado a reparar os prejuízos. A consequência, dessa maneira, reside em que a responsabilidade civil do Estado, no caso de conduta omissiva, só se desenhará quando presentes estiverem os elementos que caracterizam a culpa. A culpa origina-se, na espécie, do descumprimento do dever legal, atribuído ao Poder Público, de impedir a consumação do dano. Resulta, por conseguinte, que, nas omissões estatais, a teoria da responsabilidade objetiva não tem perfeita aplicabilidade, como ocorre nas condutas comissivas (…) quando se diz que nas omissões o Estado responde por culpa, não se está dizendo que incide a responsabilidade subjetiva, mas apenas que se trata da responsabilidade comum, ou seja, aquela fundada na culpa, não se admitindo então a responsabilização sem culpa. Acresce notar, por fim, que, mesmo quando presentes os elementos da responsabilidade subjetiva, estarão fatalmente presentes elementos da responsabilidade objetiva, por ser esta mais abrangente que aquela. (destacou-se). Ocorre que, ao inverso do que alega o município, as vias públicas são bens de interesse local, sendo dever legal do ente zelar pela manutenção e conservação dessas, evitando, assim, danos à coletividade. Daí porque, à luz da sobredita teoria da responsabilidade objetiva, lesões causadas a terceiros ou mesmo aos seus bens em decorrência, por exemplo, de buracos e bueiros abertos nas vias públicas, quando originados pela falta de manutenção e conservação dos logradouros públicos, acarretam a responsabilidade do Poder Público, se este não demonstrar a existência de alguma excludente do liame causal. Sobre a temática, colhem-se precedentes jurisprudenciais pátrios, inclusive deste Tribunal de Justiça Alencarino (sem destaques no original): RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE OCORRIDO EM VIA PÚBLICA. QUEDA DE VEÍCULO EM BURACO EXISTENTE NA VIA PÚBLICA. FALTA DE SINALIZAÇÃO E CONSERVAÇÃO PREVENTIVA DA VIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO MUNICÍPIO. HIPÓTESE EM QUE NÃO HOUVE A CULPA EXCLUSIVA DA VITIMA OU DE TERCEIRO. DANOS MATERIAIS DEVIDAMENTE DEMONSTRADOS. REPARAÇÃO MANTIDA. O ente público responsável pela manutenção da via pública, é objetivamente responsável pelos danos materiais causados veiculo da vitima que cai em buraco não sinalizado, surgido no leito daquela, eis que ausentes, neste caso, a culpa exclusiva ou concorrente da vítima. Aplicação do disposto no artigo 37, § 6º da Constituição Federal. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Recurso Inominado Cível: 1000710-41 .2023.8.26.0246 Ilha Solteira, Relator.: Bernardo Mendes Castelo Branco Sobrinho - Colégio Recursal, Data de Julgamento: 22/04/2024, 5ª Turma Recursal de Fazenda Pública, Data de Publicação: 22/04/2024); CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO ENVOLVENDO CICLISTA EM RAZÃO DE BURACO EM VIA PÚBLICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO PARA REALIZAÇÃO DA MANUTENÇÃO E SINALIZAÇÃO DAS VIAS PÚBLICAS A TEOR DO ART. 24 DO CTB. FATO ADMINISTRATIVO. DANO E NEXO DE CAUSALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADOS - CF/88 : ART. 37, § 6º ¿ DEVER DE INDENIZAR COMPROVADO. DANO MORAL QUE ULTRAPASSA O MERO ABORRECIMENTO. RISCO À INTEGRIDADE FÍSICA DO APELADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS A TEOR DO ART. 85, § 11, DO CPC. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Caso em exame: 1.1. Trata-se de recurso de apelação cível (págs. 184/191), interposto pelo Município de Crato em face da sentença de págs. 143/145, proferida pelo Juízo 1ª Vara Cível da Comarca de Crato que julgou parcialmente procedente Ação Ordinária de Indenização por Danos Morais manejada por Cícero Liberalino da Silva contra o apelante. 2. Questão em discussão: 2.1. A presente controvérsia consiste em verificar se foram preenchidos os elementos caracterizadores da responsabilidade civil do Ente Público Municipal por dano sofrido por ciclista em razão de acidente causado por buraco em via pública. 3.Razões de decidir: 3.1. Tratando-se de responsabilidade objetiva necessário a comprovação do dano e do nexo de causalidade entre a conduta omissiva e o dano (art. 37, § 6º, da CF). 3.2. Compulsando os autos é possível constatar que restou devidamente comprovado o dano causado ao promovente: a) buraco na via pública da Rua Rotary (fotografias de págs. 77/78 e testemunho das testemunhas ouvidas em audiência); b) internação hospitalar do autor (prontuário de págs. 8/73) e c) as lesões corporais sofridas (fotografias de págs. 74/76 e depoimento das testemunhas ouvidas de pág. 277). 3.3. Igualmente demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta omissiva do ente público municipal, a quem competia realizar a conservação e sinalização da via pública, e não o fez. 3.4. Constatado o dano e o nexo de causalidade entre a conduta omissiva do ente público exsurge a responsabilidade civil do Município de Crato. 3.5. Quanto a indenização por dano moral no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), vez que a situação enfrentada em razão da conduta negligente do ente público ultrapassou o mero dissabor, em razão do sofrimento experimentado pelo acidente, cujo impacto sofrido pelo promovente com o buraco existente na via, acabou por colocar em risco a integridade física do apelado. 3.6. Ante a sucumbência recursal do ente público municipal, majoro os honorários advocatícios para 12% (doze por cento) sobre o valor da condenação, a teor do art. 85, § 11, do CPC 4. Dispositivo: 4.1. Recurso de Apelação conhecido e desprovido. Sentença mantida. (Apelação Cível - 0052825-59.2020.8.06.0071, Rel. Desembargador(a) JOSÉ TARCÍLIO SOUZA DA SILVA, 1ª Câmara Direito Público, data do julgamento: 25/11/2024, data da publicação: 25/11/2024). Efetivamente compete ao Poder Público a constante fiscalização e recuperação de suas vias, principalmente para evitar acidentes como o ora discutido nestes autos, não tendo cabimento sua argumentação em sentido contrário. Configurada a responsabilidade da administração, resta saber se existem provas dos danos materiais e morais. No que se refere aos danos materiais, na modalidade emergentes, acertadamente o magistrado condenou o ente requerido ao pagamento do valor de R$ 2.062,80 (dois mil e sessenta e dois reais e oitenta centavos), porquanto não há provas do montante relativo ao suposto prejuízo com a perda de garrafões de água. De igual modo, acertada a decisão ao denegar os lucros cessantes. É que, o dano material não pode ser presumido, em nenhuma de suas formas. Na espécie sob exame, não obstante se presuma que o veículo permaneceu parado por certo tempo a fim de possibilitar o conserto das avarias, o autor não se desincumbiu de acostar nenhuma prova do valor médio que apurava em um dia de vendas. Ademais, não há prova, mesmo que testemunhal, de que não utilizou outro veículo para exercer sua atividade comercial e muito menos demonstrou o tipo de produto (água) que comercializa, comprovando seu valor unitário, não juntando, também, a movimentação de caixa do seu comércio em um dia normal de vendas. Dessa forma, inexistindo prova hábil para os fins colimados, não faz jus o autor a ser ressarcido por lucros cessantes. Na mesma linha de pensamento, colhem-se precedentes jurisprudenciais do Superior Tribunal de Justiça, in verbis (negritou-se): AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. PERDA DE IMÓVEL. LUCROS CESSANTES . PRESUNÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. SÚMULA 83/STJ . AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. As razões apresentadas pela agravante são insuficientes para a reconsideração da decisão. 2 . A jurisprudência do STJ não admite a indenização de lucros cessantes sem comprovação, rejeitando os lucros hipotéticos, remotos ou presumidos. 3. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no REsp: 1963583 SP 2021/0025527-6, Data de Julgamento: 13/06/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/06/2022); ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE E INDENIZAÇÃO . LUCROS CESSANTES. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO CONCRETA. FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA . IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. No caso dos autos, o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas e apreciou integralmente a controvérsia posta nos autos; não se pode confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. 2. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que "os lucros cessantes devem corresponder a tudo aquilo que o lesado deixou de lucrar, de forma razoável, em decorrência do dano causado pelo devedor. Todavia, esse dano deve ser efetivo, certo, atual e subsistente. Não pode depender de uma grande carga de probabilidade, de meras presunções, de fatores indiretos e hipotéticos" ( REsp 1 .438.408/DF, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. p/ Acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 23/10/2014, DJe 19/12/2014). 3. Tendo o acórdão recorrido afirmado expressamente a ausência de demonstração concreta dos valores pleiteados a título de lucros cessantes, eventual discordância das conclusões adotadas exigiria nova incursão no acervo probatório dos autos, providência que encontra óbice no teor da Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 2194058 SC 2022/0268270-5, Relator.: SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 22/05/2023, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/05/2023). Dessarte, acertadamente a sentença negou esse pleito inaugural. No que se refere aos danos morais, entende-se que não restaram configurados os pressupostos necessários à sua concessão. Conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o simples aborrecimento, desconforto ou frustração causados por acidente de trânsito decorrente de má conservação da via pública não caracterizam, por si sós, dano moral indenizável. Isso porque tais eventos integram o risco ordinário da vida em sociedade e não ultrapassam a esfera dos dissabores cotidianos. Na espécie, não houve vítimas, além do que o prejuízo material será devidamente ressarcido pelo promovido. Na verdade, não há prova de que o fato extrapolou a esfera do aborrecimento. Sobre a temática, destacam-se os seguintes precedentes dos tribunais pátrios (destacou-se): EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - ACIDENTE DE TRÂNSITO - DANOS MORAIS - INDEVIDOS - DANOS MATERIAIS - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. - O dano moral decorre da violação dos direitos integrantes da personalidade do indivíduo, atingindo valores internos e anímicos da pessoa, tais como a intimidade, a vida privada e a honra, entre outros - Um acidente de trânsito sem vítimas, que culmina com lesão leve, sem qualquer prova de afronta aos direitos da personalidade, não enseja a indenização por danos morais. - A indenização por danos materiais depende de prova do prejuízo sofrido, sendo que, à mingua de tal comprovação, descabida a pretensão indenizatória. (TJ-MG - AC: 10000220084487001 MG, Relator.: Roberto Apolinário de Castro (JD Convocado), Data de Julgamento: 05/04/2022, Câmaras Cíveis / 9ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 08/04/2022); RECURSO INOMINADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO SEM VÍTIMAS. DANOS MORAIS INDEVIDOS. RECURSO DESPROVIDO. 1. Ainda que se possam presumir os aborrecimentos sofridos pelo autor, que teve seu veículo danificado, não se vê ofensa a qualquer dos direitos da personalidade protegidos pelo instituto da responsabilidade civil, nem sofrimento ou abalo de monta que justifique a compensação pecuniária. Neste sentido: STJ, REsp 1653413/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/06/2018, DJe 08/06/2018. 2. Recurso desprovido. 5. Condeno a parte recorrente ao pagamento das custas processuais (Lei Estadual nº . 18.413/2014) e de honorários advocatícios que fixo em 20% do valor da condenação (Lei nº. 9.099/95, art . 55), observada a condição suspensiva de exigibilidade devido aos benefícios da assistência judiciária gratuita (art. 98, § 3º do CPC). (TJ-PR - RI: 00087024620188160045 PR 0008702-46.2018 .8.16.0045 (Acórdão), Relator.: Juiz Alvaro Rodrigues Junior, Data de Julgamento: 10/12/2019, 2ª Turma Recursal, Data de Publicação: 11/12/2019); APELAÇÃO - ACIDENTE DE TRÂNSITO SEM VÍTIMAS - DANO MORAL - INOCORRÊNCIA. O dano moral pressupõe, minimamente, a violação de direitos de personalidade, de modo que a simples colisão, ainda que gere danos materiais elevados, não é capaz de dar ensejo à indenização por danos morais ante a inexistência de vítimas com lesões corporais. RECURSO DE APELAÇÃO IMPROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível: 10188583020208260562 Santos, Relator.: João Battaus Neto, Data de Julgamento: 12/09/2024, Núcleo de Justiça 4 .0 em Segundo Grau - Turma II (Direito Privado 3), Data de Publicação: 12/09/2024) No presente caso, embora comprovado o prejuízo material decorrente dos danos ao veículo do autor - o que enseja, de fato, reparação pecuniária -, não foi demonstrado qualquer elemento extraordinário que configure abalo à honra, sofrimento psíquico relevante ou violação à dignidade da pessoa humana, sendo incabível, portanto, a reparação por dano moral. Dessarte, a manutenção da sentença é medida que se impõe. Ante a tais considerações, conhece-se dos recursos apelatórios, no entanto, para negar-lhes provimento, mantendo-se a sentença em sua inteireza. Majoram-se os honorários advocatícios de sucumbência ao percentual de 15% do valor dado à causa, dividido entre os sucumbentes na mesma proporção consignada na sentença. É como voto. Fortaleza/CE, data e hora indicadas pelo sistema. Des. LUIZ EVALDO GONÇALVES LEITE Relator A1

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Newton Santos De Oliveira x Jesus Soares

ID: 278633764

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE ALTO TAQUARI Classe: EMBARGOS à EXECUçãO Nº Processo: 1000710-98.2024.8.11.0092

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

NEWTON SANTOS DE OLIVEIRA

Polo Passivo:

JESUS SOARES

Sentença

Advogados:

RICARDO ALEXANDRE TORTORELLI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ROGEIRO RODRIGUES MACHADO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

VIVIANE DE SOUSA OLIVEIRA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

AMANDA SOUZA NUNES

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE ALTO TAQUARI SENTENÇA Processo n°: 1000710-98.2024.8.11.0092 I - RELATÓRIO Trata-se de embargos a execução ajuizados por NEWTON SANTOS DE OLIVEIRA… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE ALTO TAQUARI SENTENÇA Processo n°: 1000710-98.2024.8.11.0092 I - RELATÓRIO Trata-se de embargos a execução ajuizados por NEWTON SANTOS DE OLIVEIRA em desfavor de JESUS SOARES. O embargante requer, em síntese, o reconhecimento da inexigibilidade dos cheques que embasam a execução, sob o argumento de que os títulos foram emitidos em razão de um contrato de compra e venda de um veículo Volvo, placa OGL 2979, que apresentou defeitos graves no câmbio, resultando na rescisão do contrato e na devolução do veículo ao embargado. Alega que a relação entre as partes se enquadra como relação de consumo, pleiteando a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e a inversão do ônus da prova, em razão da sua hipossuficiência e da verossimilhança de suas alegações. Afirma, ainda, que a manutenção da execução configuraria enriquecimento ilícito do embargado, uma vez que o veículo foi devolvido e o embargante arcou com despesas de reparo. Por fim, requer a produção de provas, inclusive pericial, para comprovar os vícios apresentados pelo veículo, bem como a improcedência da execução, com a consequente condenação do embargado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios (ID. 169789379). Recolhimento das custas pelo embargante ao ID. 169914747 e seguintes. Decisão recebendo à inicial (ID. 173149976). Citado, o réu impugnou os embargos, pugnando pela improcedência dos pedidos formulados pelo embargante. Sustentou a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso, argumentando a inexistência de vulnerabilidade técnica, econômica ou jurídica do embargante que justificasse a inversão do ônus da prova. Além disso, refutou a alegação de que os cheques executados se referiam à compra do veículo Volvo, placas OGL 2979, afirmando que tais títulos de crédito foram emitidos para a quitação de outros veículos adquiridos pelo embargante, quais sejam: um Eco Sport, ano 2012, e uma Ford Ranger, ano 2015. Alegou, ainda, que não houve qualquer acordo de devolução do veículo Volvo, sustentando que a tentativa do embargante de compensar o valor dos cheques com a suposta devolução do veículo e com gastos referentes a reparos configura conduta de má-fé processual. Por fim, requereu a condenação do embargante ao pagamento de multa por litigância de má-fé, a improcedência dos embargos e a manutenção da execução dos cheques (ID. 173306310). Apresentada impugnação à contestação em ID. 175175092, na qual foram rebatidas as alegações da parte ré e ratificados os termos iniciais. Indeferimento da inversão do ônus da prova decorrente de relação consumerista, bem como determinada a intimação das partes para especificação de provas (ID. 175204395). Intimadas as partes para especificação de provas, a embargante pleiteou pela produção de prova oral consistente na oitiva de testemunhas e depoimento do embargado, bem como juntada de documentos novos (ID. 177374251), enquanto o embargado pugnou pelo julgamento antecipado da lide, com a improcedência dos embargos à execução (ID. 177583757). Verificada a ausência de designação da audiência de conciliação, determinou-se a sua realização, conforme consta no ID. 179381517, a qual restou infrutífera (ID. 183775960). Decisão de saneamento do feito (ID. 186794509). Termo da Audiência de Instrução, realizada conforme registro no ID. 189918157. Instado a se manifestar em sede de alegações finais ao ID. 191473892, o embargante alegou que a relação entre as partes caracterizou-se como uma relação de consumo, havendo rompimento contratual em virtude de vícios ocultos no veículo adquirido, um Volvo, que apresentou defeitos logo após a compra, gerando prejuízos e motivando a rescisão contratual com a consequente devolução do bem. Sustentou que, diante do desacordo comercial, as cártulas executadas tornaram-se inexigíveis, ressaltando que não houve o cumprimento do dever de boa-fé pelo embargado, que, mesmo ciente dos defeitos, teria colocado o veículo novamente à venda, pleiteando, ao final, a total procedência dos embargos à execução. Por fim, o embargado, em manifestação colacionada ao ID. 193640868, em sede de alegações finais, refutou as alegações do embargante, sustentando que os cheques objeto da execução não possuem qualquer relação com o veículo Volvo, mas sim com a aquisição de dois outros veículos , Ford Ecosport e Ford Ranger, conforme demonstrado por prova documental e pelos depoimentos das testemunhas arroladas pelo próprio embargante. Aduziu que não houve comprovação da alegada rescisão contratual, tampouco de vício insanável no negócio jurídico, pleiteando, ao final, a total improcedência dos embargos, a condenação do embargante por litigância de má-fé, bem como o prosseguimento da execução. Os autos vieram conclusos para julgamento. É o breve relatório. II - FUNDAMENTAÇÃO Computam-se dos autos que o presente feito versa sobre embargos à execução, opostos por Newton Santos de Oliveira, no bojo de ação de execução de título extrajudicial de n°: 1000454-58.2024.8.11.0092, ajuizada por Jesus Soares, fundada em dois cheques, no valor total de R$ 70.000,00 (sendo um no valor de R$ 45.000,00 e outro de R$ 25.000,00), emitidos pelo embargante e não pagos por insuficiência de fundos. A controvérsia posta nos autos diz respeito à origem e à exigibilidade dos cheques executados. O embargante sustenta que os títulos foram emitidos em razão de uma negociação de compra e venda de um veículo Volvo, que, segundo afirma, apresentou vícios logo após a aquisição. Alega que, diante da recorrência dos defeitos, realizou a devolução do veículo ao embargado, o que, em sua ótica, resultaria na extinção da obrigação representada pelos cheques, tornando-os inexigíveis. Por outro lado, o embargado refuta essa narrativa e afirma que os cheques objeto da execução não decorrem da negociação do Volvo, mas sim da venda de outros dois veículos, sendo uma Ford EcoSport e uma Ford Ranger, os quais teriam sido adquiridos pelo filho e neto do embargante. Aduz que esses veículos foram devidamente entregues aos compradores e não foram objeto de devolução, razão pela qual os títulos permanecem exigíveis. Portanto, a questão central a ser dirimida reside em apurar se os cheques executados estão vinculados à compra do Volvo, como defende o embargante, ou à compra da Ford EcoSport e da Ranger, como sustenta o embargado. Superadas essas questões, passa-se à análise das provas dos autos e das normas aplicáveis para a adequada solução do litígio. No decorrer da instrução, colheu-se o depoimento pessoal do embargante, senhor Newton Santos de Oliveira, que relatou, em síntese, que adquiriu um veículo Volvo do embargado Jesus Soares, o qual apresentou defeitos poucos dias após a compra. Segundo afirmou, o carro apresentou problemas ainda em Alto Taquari, foi levado para conserto em Mineiros, mas continuou com defeitos recorrentes. Diante disso, decidiu devolver o veículo ao embargado, manifestando sua intenção de não permanecer com o bem, solicitando, na ocasião, a devolução dos cheques emitidos como pagamento. Em juízo, respectivamente: Juiz: Consta aqui, senhor Newton... uma execução de alguns cheques... essa execução foi feita pelo seu Jesus Soares. Em relação a esses cheques, o quê que aconteceu? Newton Santos De Oliveira: Eu comprei um carro... (inaudível) e não deu uma semana... o carro deu problema... ele estava aqui em Taquari... eu levei ele para Mineiros... mandei arrumar... eu vim para cá... bem... para cá de Araguaia... ele estragou de novo... eu não quis mais o carro... entreguei o carro (inaudível)... e eu não quis mais. Juiz: Certo. Esse carro o senhor comprou de quem? Newton Santos De Oliveira: Eu comprei... da garagem... da garagem do... Tenho que falar o nome do homem? A garagem (inaudível)? Mas não sei o nome do rapaz, não. Juiz: Certo. O rapaz que estava aqui... o nome dele é Jesus Soares. Ele era o proprietário da garagem? Newton Santos De Oliveira: Ele é dono da garagem aqui. Taquari. Juiz: Dono da garagem? Certo. Quando o senhor fez a negociação do carro... o senhor fez essa negociação direto ali na garagem? Newton Santos De Oliveira: É... eu comprei o carro aqui... eu fiquei com ele uma semana e meia aqui... eu não fiquei mais do que isso. Ele estragou... deu problema... levei para Mineiros... mandei arrumar... mandei arrumar... voltei para vim... para o Taquari... ele me (inaudível)... de novo. Eu não quis ele mais. Pode ficar com seu carro ai que eu não quero ele mais. Juiz: Entendi. Quando o senhor comprou esse carro... como foi combinado o pagamento? O senhor pagou em dinheiro? O senhor pagou em... Newton Santos De Oliveira: Não... o senhor deu o cheque para ele. Dei o cheque para ele... ele (inaudível) o cheque... paguei a vista. Ele (inaudível) o cheque. Como eu não quis mais o carro... me da meu cheque eu não quero mais o carro. (inaudível). Juiz: E ele devolveu o cheque para o senhor? Newton Santos De Oliveira: Não devolveu não. Ele ta com o cheque ainda. Juiz: Entendi. Esse carro... o senhor o devolveu direto lá na garagem? Newton Santos De Oliveira: Eu o devolvi para o proprietário... para o dono da garagem. Jesus. Juiz: Certo. Entre o dia... o dia em que o senhor foi lá tirar o carro... o dia em que o senhor comprou o carro... Newton Santos De Oliveira: Hã... Juiz: E o dia em que o senhor o devolveu... quantos dias foram mais ou menos? Newton Santos De Oliveira: Que eu fiquei com o carro? Juiz: Isso. Newton Santos De Oliveira: Eu fiquei com o carro... uns 15 dias... 20 dias... não foi mais que isso. E entreguei o carro pra ele. Juiz: Certo. Quando o senhor foi devolver o carro... o senhor pediu para ele devolver o cheque? Newton Santos De Oliveira: Falei para ele... Falei... falei para ele... Você pode ficar com o carro e me devolve meu cheque. E... aí ele levou o carro para aqui no Alto Taquari... e levou até Mineiros. Foi não sei pra onde (inaudível)... tá com o carro até hoje. Juiz: E o quê que ele falou sobre o cheque? Ele falou para o senhor que ia devolver... Newton Santos De Oliveira: (inaudível)... Por conseguinte, Newton afirmou que os cheques entregues foram exclusivamente para pagamento do Volvo, negando que tivessem relação com a compra de outros veículos, como uma Ford Ranger e uma Ford EcoSport, conforme alegado pela parte contrária. Declarou, ainda, que não lembra com exatidão os valores ou datas da negociação, atribuindo essa dificuldade à sua idade avançada. Negou, igualmente, que tenha oferecido um veículo Palio ou qualquer outro bem como parte do pagamento, sustentando que a única transação realizada foi a aquisição do Volvo, que posteriormente foi devolvido. Por fim, confirmou que, embora tenha solicitado a devolução dos cheques, o embargado não os restituiu, e desde então não teve mais contato com ele, tampouco recebeu qualquer satisfação sobre os títulos, conforme consta em arquivo de mídia colacionado ao ID. 189918157 e seus consectários: Juiz: Ah, tá. Então o senhor consegue afirmar para mim que esses dois cheques foram para o Volvo ou o senhor não tem essa certeza? Newton Santos De Oliveira: É para pagar o Volvo, pra pagar o Volvo. Juiz: Pra pagar o volvo. A doutora mencionou aí que foi comprado também uma Ranger e... Dra. Viviane De Sousa Oliveira: Uma EcoSport. Juiz: Uma EcoSport. Como que foi feito o pagamento dessa Ranger e a EcoSport? Newton Santos De Oliveira: Não foi disso não. Juiz: Mas o senhor lembra como que o senhor pagou a Ranger e a EcoSport? Como que foi feito o pagamento delas? Newton Santos De Oliveira: Eu comprei o Volvo e os dois cheques para pagar o Volvo. Só isso que eu sei. Juiz: Ah, tá. Então os cheques que o senhor lembra foram para pagar o Volvo. Newton Santos De Oliveira: É, só isso. Não tem outra negociação de carro nenhum. Dra. Viviane De Sousa Oliveira: Posso fazer outra pergunta? Juiz: Pode, doutora. Dra. Viviane De Sousa Oliveira: É porque nessa notificação extrajudicial ainda menciona que esse Volvo foi dado em pagamento, na verdade, um carro e mais 30 mil reais em dinheiro. Newton Santos De Oliveira: Foi dado o quê? Dra. Viviane De Sousa Oliveira: Um carro como forma de pagamento desse Volvo. Um carro. Acho que é um Palio Adventure, se eu não me engano. E mais 30 mil reais de dinheiro. O senhor reconhece essa transação? Teve essa troca de carro? Newton Santos De Oliveira: Não teve não. Não teve não (inaudível). O carro que era, na verdade, a minha esposa foi o que eu devolvi (inaudível). Eu não quis o carro (inaudível). Ai devolvi o Volvo. Eu... Essas histórias, minha filha, eu não lembro dessas coisas direito. Direitinho não lembro disso. Faz tempo que eu não lembro nem que ele foi isso. Foi em 2022, foi em 2023, não lembro nem mais. Faz tempo esse cara. Esse o Palio... No mesmo sentido advieram os relatos dos informantes Valdeir Peres de Sousa e José Victor Alessandro De Lima Silva, que confirmaram que o embargante adquiriu um veículo Volvo da garagem do embargado, o qual apresentou sucessivos defeitos mecânicos poucos dias após a compra. Ambos relataram que o carro foi levado para conserto em Mineiros e, mesmo após os reparos, continuou apresentando problemas, motivo pelo qual teria sido posteriormente devolvido à garagem do embargado, em sua oitiva, o informante José Victor: Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: Tá, e quanto a esse Volvo, você sabe se ele chegou a apresentar algum problema, se está com esse Volvo até hoje, o que aconteceu? José Victor Alessandro De Lima Silva: Sim, eu lembro que poucas semanas depois que eles compraram, deu um problema na embreagem. Aí, depois desse problema na embreagem, eles pegaram para arrumar. Aí eu lembro que eles arrumaram, aí deu um problema acho que no acelerador. Depois desse problema no acelerador, acho que eles levaram para Mineiros o carro para arrumar, e aí a garagem deixou um carro com eles provisoriamente, nesse tempo que eles estavam sem carro. E aí depois o seu Newton, a esposa do seu Newton e o Beckenbauer, foram até Mineiros buscar o carro. E nesse dia que eles foram buscar o Mineiros em carro, eles vindo ali para Taquari, deu um problema no meio do caminho, e eles ficaram, tiveram que ir buscar o guincho lá até no pessoal que trabalha ali na rodovia. Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: Quem levou esse carro para Mineiros para arrumar? Foi a garagem ou foi o seu Newton e o Beckenbauer? José Victor Alessandro De Lima Silva: Até onde eu sei, foi o seu Newton e o Beckenbauer que levou. Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: Tá, e aí o carro deu um problema na última vez que o senhor falou, quando eles estavam vindo para Mineiros, né? Aí o senhor sabe se o carro hoje está com o seu Newton, se eles devolveram o carro? José Victor Alessandro De Lima Silva: Não, não estão com o carro mais, se não me engano eles devolveram, né? Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: E o senhor sabe se a garagem devolveu o dinheiro para eles? O senhor sabe sobre essa negociação? José Victor Alessandro De Lima Silva: Olha, eu não tenho muito conhecimento não, não sei te falar, mas até onde eu sei, pô, que eu conversei, disseram que não tinham devolvido. Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: Tá bom, sem mais. Ademais, confirmou, ainda, que na negociação envolvendo o veículo Volvo foi entregue um veículo Palio como parte do pagamento. Declarou que: Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: Esse processo é sobre um suposto desacordo comercial entre o senhor Newton, que emitiu uns cheques, e o senhor Jesus, pela venda de um veículo, de alguns veículos, feito pelo filho dele, do senhor Newton, o Beckenbauer. O senhor sabe alguma coisa sobre essa negociação que eles fizeram, sobre a compra desses veículos? José Victor Alessandro De Lima Silva: A única coisa que eu sei da negociação é que eles deram um palio adventure de entrada, é a única coisa que eu sei. Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: Esse palio, o senhor sabe que veículo que foi? Qual veículo que eles compraram do senhor Jesus? José Victor Alessandro De Lima Silva: Foi o Volvo, né? Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: O senhor sabe se eles deram alguns cheques para o pagamento desse Volvo também? José Victor Alessandro De Lima Silva: Sim, eu sei que eles deram, acho que um ou dois cheques. Agora, como foi a forma de negociação, eu não sei. Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: E além desse Volvo, o senhor sabe se eles compraram outros veículos do senhor Jesus? José Victor Alessandro De Lima Silva: Não, não sei. Referindo-se ao modelo utilizado na transação, e que, quanto ao restante do valor, teria sido pago por meio de cheques. Embora tenha admitido não conhecer os detalhes exatos da forma de pagamento, sua fala corrobora a versão do embargante de que a aquisição do Volvo envolveu, além dos cheques ora executados, a entrega do veículo Palio como entrada. Em continuidade, o informante Valdeir foi enfático ao afirmar que, de seu conhecimento, a negociação envolvia apenas o veículo Volvo, desconhecendo qualquer aquisição de outros veículos como Ford Ranger ou EcoSport. Importante destacar que ambos os informantes, apesar de confirmarem os problemas com o veículo e a devolução, não participaram diretamente da negociação, limitando-se a relatar os fatos de seu conhecimento pessoal e conversas com as partes. Por fim, o embargado, em seu depoimento pessoal, afirmou de forma categórica que os cheques objeto da execução não estão vinculados à compra do veículo Volvo, mas sim à aquisição de dois outros veículos, sendo uma Ford EcoSport e uma Ford Ranger, negociadas com o filho e o neto do embargante. Sustenta que tais veículos foram devidamente entregues e nunca foram objeto de devolução. No tocante ao Volvo, confirmou que também houve uma negociação, porém distinta, realizada mediante a troca de um veículo Palio e um valor complementar em cheque, cujo montante exato não recorda. Esclareceu que o Volvo apresentou um problema no câmbio dentro do prazo de garantia legal, tendo providenciado o reparo, com custo superior a R$ 15.000,00, além de ter disponibilizado um veículo reserva à família do embargante durante o período de conserto. Relatou que, após algum tempo (segundo sua estimativa, mais de três meses após a venda, já fora do prazo de garantia), o embargante compareceu à loja e simplesmente deixou o veículo Volvo no local, sem que houvesse qualquer acordo formal para devolução ou rescisão contratual. Afirmou que, em momento algum, anuiu com a devolução do bem como forma de extinção da obrigação e que o Volvo permaneceu em sua posse desde então. Reiterou, ainda, que os cheques ora executados não possuem qualquer relação com o negócio envolvendo o Volvo, mas são fruto exclusivo da venda da EcoSport e da Ranger. Nestes termos, segue: Juiz: Ok. Então, como que deu essa negociação acerca desses cheques que o senhor teria recebido? Jesus Soares: Não, esses cheques foram de uma EcoSport LT Freestyle, ano 2012, R$ 50 mil, e R$ 20 mil é de uma Ranger, entendeu? Essa é a negociação desses cheques. Juiz: Certo. Quem foi que comprou a Ranger e a EcoSport do senhor? Jesus Soares: Foi o filho do... como que chama o senhor aí... o senhor Newton, Becker. Juiz: Como que é o nome do filho dele? Jesus Soares: Becker. Juiz: Certo. Quando ele foi negociar, esses dois carros, ele comprou de uma vez só? Jesus Soares: Não, ele comprou um, depois outro. Juiz: Tá. E qual carro foi o primeiro, pra eu entender? Jesus Soares: Pra entender, foi a EcoSport. Juiz: Como que foi a negociação? Qual era o valor? Como que foi a questão do pagamento? Jesus Soares: R$ 50 mil. Juiz: R$ 50 mil. Jesus Soares: Porém, essa EcoSport tinha um sócio. Tem até um cheque de R$ 25 mil aí, certo? R$ 25 mil. E tem outro cheque de R$ 45 mil. O de R$ 25 mil seria do sócio, e o de R$ 45 mil seria os R$ 25 mil da EcoSport e R$ 20 mil da Ranger, que foi para o neto do seu Newton, filho do Becker. Juiz: Entendi. Quando ele foi comprar essa EcoSport, no valor de R$ 50 mil, naquele momento da negociação, como foi a questão do pagamento? Pagou algum valor à vista ou já deu o cheque de imediato? Jesus Soares: Não, ele deu o cheque com prazo, né? Porém, eu documentei a EcoSport pra ele no ato, sem vencer os cheques, e a Ranger também. Juiz: Então, os dois veículos foram disponibilizados ali na hora? Jesus Soares: Na hora, com prazo e documentação. Eu dei prazo pra eles no cheque. Juiz: E esses cheques que o senhor está cobrando são os mesmos cheques que foram dados no dia que ele comprou a EcoSport? Jesus Soares: Isso, isso. É a origem da EcoSport. Juiz: Certo. Teve algum problema com essa EcoSport? Ela foi devolvida pro senhor? Jesus Soares: Não, a EcoSport, em momento algum, foi devolvida. Foi transferida até pro neto do seu Newton. Juiz: E a questão desse Volvo, foi comprado um veículo Volvo do senhor? Jesus Soares: Foi, mas outra negociação. Juiz: Como que foi essa negociação? Jesus Soares: Essa negociação foi numa troca de uma Palio que eles tinham. (...) Juiz: Certo, e daí o valor foi, a troca foi sem ter que voltar um troco? Jesus Soares: Eles voltaram. Juiz: Voltaram, voltaram quantos pro senhor? Jesus Soares: Eu não sei falar pro senhor, porque já tem tempo, eu não sei falar o valor certinho. Juiz: Mas como que foi? Foi em dinheiro? Foi em cheque? Jesus Soares: Foi, foi a prazo também. Juiz: A prazo, mas como que foi? Em dinheiro, cheque, ou cartão? Jesus Soares: Foi em cheque, em cheque também. Juiz: O senhor lembra quais foram os valores dos cheques? Jesus Soares: Não lembro não, doutor, porque já faz tempo. Toda a vida nós fizemos bastante negociação, foram vários carros que a gente negociou. Juiz: Certo. Jesus Soares: Teve um problema nessa situação aí. Juiz: Em relação a esse Volvo, teve algum problema com esse carro que foi devolvido pro senhor? Jesus Soares: Não, esse Volvo tem uma garantia de três meses por lei, certo? Teve um problema no câmbio, mas eu peguei o carro, mandei pra Goiânia, gastei mais de R$ 15 mil no câmbio, entendeu? Deixei um carro à disposição da esposa do seu Newton lá pra ela não ficar a pé, dei toda a assistência. Juiz: Certo. Depois que esse carro foi para o conserto e voltou, o senhor entregou para o seu Newton? Ele ficou com o carro ou devolveu depois? Jesus Soares: Entreguei pra ele o carro, entreguei. Juiz: Certo. Ele permaneceu com o veículo ou ele levou e depois devolveu pro senhor? Jesus Soares: Não, ele levou lá na loja e deixou lá, mas não teve acordo nenhum de devolução. Juiz: Certo. E o carro permaneceu com o senhor? Jesus Soares: Isso. Juiz: Entendi. Eu preciso entender agora a cronologia de tudo. Então, primeiro, foi comprada a EcoSport e a Ranger. Depois, quanto tempo depois foi adquirido o Volvo? Jesus Soares: O Volvo eu não sei falar pro senhor quanto tempo não, porque já tem bastante tempo essa negociação, não sei te falar exato. Juiz: Certo, mas o senhor acha que passou de um ano, dois anos? Jesus Soares: Não, não, não, isso foi coisa de menos de um ano. Juiz: Menos de um ano, entendi. Jesus Soares: Foi depois de um ano, não. Juiz: Entendi. Só mais um minutinho. Consta aqui nos autos da execução, dois cheques então emitidos. O senhor lembra quando foi feita a compra da Ranger e da EcoSport? Foi em 2023, 2022, 2024? Jesus Soares: Acredito que meado de 23 pra 24, alguma coisa assim. Juiz: Meado de 2023? Jesus Soares: Acredito que é (...). Eu só sei que vencia em março os cheques. Juiz: Certo, certo. Então, esse cheque de R$ 25 mil e o cheque de R$ 45 mil, o senhor está me dizendo que foram dados pra pagar a Ranger e a EcoSport? Jesus Soares: Isso. A origem da EcoSport e da Ranger, esses cheques. Não tem nada a ver com a Volvo. Juiz: Em relação à Volvo, o senhor afirmou aí que ele acabou indo lá e deixando a Volvo na loja do senhor, sem qualquer tipo de negociação? Jesus Soares: Nenhum acordo pra pegar em devolução, porque se tivesse, eu não teria pedido os cheques pra eles, não estaria nessa situação que está. Juiz: Certo, certo. E o veículo permanece lá com o senhor até hoje, esse Volvo? Jesus Soares: Isso, isso. Juiz: Certo. E os cheques em relação a essa Volvo, o senhor compensou no banco? Jesus Soares: Não, ele pagou o cheque. Ele pagou o cheque. Juiz: Ah, esse do Volvo ele pagou, então? Jesus Soares: Ah, não, ele pagou o Volvo. Ele compensou. Juiz: Certo. O senhor chegou a entrar em contato com ele pra negociar isso? Porque, ao mesmo tempo que ele devolveu o veículo pro senhor, o senhor também recebeu o valor do cheque da Volvo. O senhor chegou a tentar negociar com ele pra devolver esse veículo? Jesus Soares: Não (...) Quando ele deixou a Volvo, eu já tinha concluído o cheque. Juiz: Ah, tá. Então, quando ele deixou a Volvo, o cheque já estava compensado? Jesus Soares: Não tem... não tem mentira. A situação desse processo é só a questão do cheque da Ranger e da EcoSport. Essa é a origem da Ranger e da EcoSport, que eu documentei eles. Porém, documentei antes de receber os cheques. Juiz: Nós ouvimos aqui, agora há pouco, o seu Newton, e ele alega o seguinte: quando ele comprou a Volvo do senhor, foram uns 15 dias quando deu problema nessa Volvo, ele levou até Mineiros pra consertar, na sequência, ele devolveu na loja do senhor. Então, isso aí ocorreu em torno de 15 dias, segundo ele. Jesus Soares: Não, ele não levou a Volvo pra Mineiros arrumar, não. Que eu saiba, não. Juiz: Entendi. Jesus Soares: O defeito que deu na Volvo, dentro da garantia, eu dei toda a assistência pra ele. Quando deu defeito, já tinha saído da garantia. Não estava mais na garantia. Juiz: Entendi. Jesus Soares: Em momento algum eu me desforcei de corrigir o defeito do carro. Eu gastei o dinheiro do carro. Juiz: Só um minutinho que cortou essa parte. O senhor falou que em nenhum momento... Pode repetir, fazendo um favor, porque está cortando bastante. Jesus Soares: Deixei de dar assistência na Volvo. Porém, eu gastei mais de R$ 15 mil no câmbio. Juiz: Entendi. De quando ele tirou a Volvo da loja do senhor até devolvê-la, quanto tempo foi? Jesus Soares: Ah, eu não sei falar certo, senhor, não. Juiz: Mas assim, o senhor não consegue precisar, se foi um mês, mais de um mês, menos? Jesus Soares: Isso aí foi... não, passou de 3 meses, né, porque ela já estava fora da garantia. Juiz: Passou de 3 meses, então? Jesus Soares: Isso aí, porque já estava fora... Dentro da garantia, eu dei toda a assistência pra ele. Juiz: Entendi. Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: O senhor acabou de dizer que dentro da garantia deu toda a assistência na Volvo, né? Quer dizer que, dentro da garantia, ela já chegou a apresentar problema e o senhor deu assistência, é isso? Jesus Soares: Isso, isso. Deixei até um carro à disposição da esposa dele lá na casa deles pra ela não ficar a pé. Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: Aí, depois dos 3 meses, o senhor não deu mais assistência? Jesus Soares: Não, aí não tinha como dar, porque saiu da garantia. Dr. Ricardo Alexandre Tortorelli: Sim, sem mais perguntas. Embora o embargado tenha afirmado que os valores em execução decorreriam da venda de uma Ford EcoSport e uma Ford Ranger a familiares do embargante, não apresentou qualquer prova documental idônea que comprove tal alegação ou que vincule diretamente os títulos executados aos referidos veículos. Ainda que tenha sido juntada aos autos a notificação registrada sob ID. 173306321, não restou demonstrado, de forma inequívoca, que os cheques objeto da presente execução estejam vinculados à compra dos veículos Ford Ranger e Ford EcoSport. Por sua vez, o embargante, em seu depoimento, foi claro ao afirmar que os cheques foram emitidos exclusivamente como forma de pagamento do veículo Volvo. Segundo relatado, referido automóvel apresentou vícios no câmbio logo após a aquisição, circunstância que culminou na sua devolução ao embargado, sem que houvesse restituição dos valores pagos ou dos títulos emitidos. Essa narrativa, inclusive, encontra respaldo nos próprios autos, uma vez que o embargado reconheceu a devolução do veículo, ainda que tenha alegado que tal ato ocorreu sem acordo prévio. Cumpre salientar, ademais, que a referida notificação aponta como partes na compra da Ford Ranger os notificantes Beckenbauer de Oliveira e Alzira Maria Vaz de Oliveira, pessoas que, embora tenham relação com o embargante, não figuram formalmente como partes no presente feito. A mesma situação se verifica na alegada negociação envolvendo a Ford EcoSport, uma vez que a obrigação de pagamento teria sido atribuída ao embargante apenas de forma genérica, sem que se apresentasse qualquer documento hábil a comprovar a destinação dos cheques à quitação dessas transações. Ressalte-se, por oportuno, que o embargado tampouco logrou êxito em demonstrar, de forma satisfatória, que os cheques em discussão referem-se à aquisição dos veículos Ford Ranger e Ford EcoSport, conforme sustentado em sua defesa. As provas constantes dos autos, inclusive a notificação apresentada, mencionam tais veículos em nome de terceiros, sem trazer elementos objetivos que permitam vincular os títulos executados às supostas negociações. Além disso, ao reconhecer que o veículo Volvo foi devolvido e permaneceu sob sua posse, sem qualquer acordo formal de rescisão contratual, e ainda assim tentar receber os valores representados pelos cheques, o embargado evidencia o inadimplemento da contraprestação a que estaria obrigado. De forma oposta, a versão apresentada pelo embargante mostra-se coerente e harmônica com os demais elementos constantes nos autos. Segundo ele, os cheques foram emitidos exclusivamente para o pagamento do veículo Volvo, que apresentou vícios ocultos e foi, por esse motivo, devolvido. A ausência de qualquer documentação que relacione de maneira clara e segura os cheques aos veículos apontados pelo embargado fragiliza sobremaneira sua tese, conferindo maior verossimilhança à versão do embargante quanto à origem da dívida ora executada. Destaca-se, ainda, que a notificação traz a alegação de compensação unilateral de créditos e débitos entre os notificantes e a empresa notificada KM Motors, demonstrando que as partes sequer buscaram, antes do ajuizamento da presente demanda, uma composição consensual para os conflitos oriundos das diversas negociações entabuladas. Dessa forma, permanece incerta a origem dos cheques executados, sendo insuficiente o suporte probatório trazido pelo embargado para afastar a alegação de que tais títulos foram emitidos em razão da aquisição e posterior devolução do veículo Volvo. Em continuidade, as alegações do embargante encontram respaldo no conjunto probatório constante dos autos, especialmente na documentação anexada sob os IDs. 169790146, 169790148, 169790151, 169790153 e 169790157, que corroboram sua versão acerca da negociação envolvendo o veículo Volvo, placas OGL 2979, bem como a existência de vícios ocultos que motivaram a devolução do bem. Ademais, verifica-se que, após a devolução, o referido veículo permaneceu na posse do embargado, o qual, inclusive, o recolocou à venda em sua loja, conforme demonstram as fotografias juntadas aos autos nos IDs 169790166 e 169790169. Tais elementos fortalecem a tese de que os cheques emitidos não são mais exigíveis, diante da ausência de contraprestação devida, o que afasta a obrigação do embargante e evidencia o desequilíbrio contratual. Portanto, com base na análise do caso concreto e nas provas constantes dos autos, observa-se que os cheques objeto da presente execução foram emitidos como forma de pagamento de um veículo Volvo que apresentou vícios ocultos logo após a entrega, os quais comprometeram sua funcionalidade. A existência desses defeitos foi corroborada pelas oitivas realizadas em juízo, e pelo próprio embargado, que reconheceu a ocorrência de problema no câmbio do veículo. Tal circunstância caracteriza hipótese típica de rescisão contratual por vício oculto, conforme preceitua o Código Civil, em seu art. 441: Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor. Na mesma linha, o art. 475 do Código Civil estabelece que: Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. Assim, estando demonstrado que o bem adquirido não servia adequadamente à sua finalidade e que, após tentativas de reparo, foi devolvido ao fornecedor, autorizando-se a rescisão do contrato e a restituição das obrigações assumidas. Por consequência, o embargante não pode ser compelido ao cumprimento de sua contraprestação (pagamento dos cheques), uma vez que o embargado não cumpriu adequadamente sua obrigação. Tal premissa encontra respaldo no art. 476 do Código Civil, que determina: Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro. No presente caso, revela-se aplicável a exceção do contrato não cumprido, prevista no art. 476 do Código Civil. Restou evidenciado nos autos que o embargado não cumpriu integralmente sua obrigação contratual, ao entregar ao embargante um veículo com vícios ocultos, o qual foi posteriormente devolvido. Ainda assim, pretende o exequente receber os valores correspondentes aos cheques emitidos como pagamento por tal bem, o que contraria o princípio da reciprocidade obrigacional. Neste sentido, é pertinente o entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, o qual, ao julgar a Apelação Cível n.º 1000772-34.2022.8.11.0020, reconheceu expressamente que, em sede de embargos à execução, é legítima a oposição da exceção do contrato não cumprido, cabendo ao exequente demonstrar o adimplemento das obrigações assumidas. Não tendo o embargado logrado êxito em comprovar o cumprimento adequado do contrato de compra e venda, tampouco a vinculação dos cheques a outros negócios distintos, mostra-se inviável a exigência do pagamento, sob pena de enriquecimento sem causa, confira-se: APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – CONTRATO DE ARRENDAMENTO DE IMÓVEL RURAL – INADIMPLEMENTO DO CONTRATO – EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO – ÔNUS DA PROVA – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. O Código Civil, no art. 476, preconiza que: Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprir a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro. Nos termos do art . 373, I e II, do CPC, cabe ao autor o ônus da prova quanto aos fatos constitutivos do seu direito, e ao réu o ônus da prova quanto aos fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito do autor. Em ações de execução, o exequente desincumbe-se do onus probandi apresentando o título executivo, cabendo ao executado provar o pagamento do débito reclamado ou o descumprimento da obrigação imputada ao credor. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1000772-34.2022 .8.11.0020, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 23/02/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/02/2024) (Grifado). Importa ressaltar que, conforme consta dos depoimentos colhidos e da própria impugnação aos embargos, parte do pagamento pelo veículo Volvo, objeto da controvérsia, foi realizada mediante a entrega de um veículo Palio Adventure, avaliado em aproximadamente R$ 38.000,00. Tal circunstância foi confirmada tanto por testemunhas quanto pelo próprio embargado, que reconheceu ter recebido o Palio como parte do negócio. Contudo, apesar da posterior devolução do Volvo pelo embargante em razão dos vícios ocultos apresentados, não há nos autos qualquer indicação de que o veículo Palio tenha sido restituído ao embargante, o que reforça a configuração de enriquecimento sem causa, vedado pelo art. 884 do Código Civil. Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Assim, o embargado permaneceu com o bem entregue como parte do pagamento, bem como com o próprio Volvo, sem que houvesse devolução do valor pago ou das cártulas de cheque emitidas, o que evidencia a ausência de justa causa para a exigência da obrigação executada. Com efeito, o embargado se encontra na posse do veículo devolvido e, ao mesmo tempo, busca o recebimento dos cheques que foram emitidos como pagamento pelo mesmo bem. Tal conduta revela duplicidade de vantagem econômica, sem respaldo legal, sendo de rigor a anulação dos cheques ou, ao menos, o reconhecimento de sua inexigibilidade. No aspecto processual, os embargos à execução mostraram-se via adequada para veicular tal matéria. O Código de Processo Civil, em seu art. 917, I e IV, permite que o executado alegue: Art. 917. Nos embargos à execução, o executado poderá alegar: I - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; (...) VI - qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento. Por fim, o art. 786 do CPC dispõe que: Art. 786. A execução pode ser instaurada caso o devedor não satisfaça a obrigação certa, líquida e exigível consubstanciada em título executivo. Todavia, conforme demonstrado, a obrigação representada pelos cheques não é exigível, tendo em vista o vício na prestação do serviço e a devolução do bem. A falta de liquidez e certeza da dívida, somada à controvérsia quanto à origem dos títulos e à ausência de prestação válida, impede o prosseguimento da execução. Em razão do reconhecimento da inexigibilidade dos títulos executados, decorrente da rescisão contratual motivada por vícios ocultos no bem adquirido, impõe-se a extinção da presente execução, por ausência de obrigação válida a ser exigida. Em conformidade, o art. 924, inciso III, do Código de Processo Civil dispõe que: Art. 924. Extingue-se a execução quando: (...) III - o executado obtiver, por qualquer outro meio, a extinção total da dívida; Por fim, cumpre destacar que não vislumbro, nos autos, elementos suficientes que caracterizem a litigância de má-fé por parte de qualquer uma das partes envolvidas. Embora as partes tenham apresentado posições divergentes, não se evidenciam condutas que impliquem em deslealdade processual, abuso de direito ou intenções de procrastinar ou prejudicar a outra parte. Assim, não há que se falar em aplicação das sanções previstas no artigo 81 do Código de Processo Civil, razão pela qual deixo de declarar a litigância de má-fé em relação a qualquer uma das partes. Diante de todo o exposto, deve ser reconhecida a rescisão do contrato, a inexigibilidade dos cheques e, por consequência, extinta a execução com fundamento nos dispositivos legais citados, resguardando-se a parte embargante da indevida cobrança por obrigação já desconstituída de sua causa. Ante o exposto, com fulcro no art. 924, III do Código de Processo Civil, julgo PROCEDENTES os embargos à execução para: a) DECLARAR a rescisão do contrato de compra e venda do veículo Volvo, placa OGL 2979, diante da existência de vícios ocultos constatados nos autos e sua devolução; b) RECONHECER a inexigibilidade dos cheques n.º 000369 e 000370, no valor total de R$ 70.000,00 (quarenta e cinco mil reais e vinte e cinco mil reais, respectivamente), emitidos em favor do embargado; c) EXTINGUIR a execução n.º 1000454-58.2024.8.11.0092, com fundamento no art. 924, III, do Código de Processo Civil. d) TRASLADE-SE cópia desta sentença aos autos principais de n° 1000454-58.2024.8.11.0092, bem como, INTIMEM-SE as partes sobre o teor dessa sentença. e) CONDENO o embargado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC. f) Em tempo, AUTORIZO, desde já, o desbloqueio/levantamento de valores (ou bens) eventualmente penhorados nos autos da execução original, n° 1000454-58.2024.8.11.0092. g) Em caso de interposição de recurso, independentemente de conclusão, deverá proceder-se com a intimação da parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões, no prazo legal, devendo os autos, posteriormente, sem conclusão, serem remetidos, nos termos dos artigos 1.009 e seguintes do CPC, ao Egrégio Tribunal de Justiça Mato-Grossense, com as homenagens de estilo e as cautelas de praxe. h) Oportunamente, arquivem-se os autos, na condição de findo, com as baixas e anotações necessárias. Publique-se. O registro se dá de forma automática. Intimem-se. Cumpra-se. Diligências necessárias. Alto Taquari/MT, datado e assinado digitalmente. ANDERSON FERNANDES VIEIRA Juiz de Direito

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Isabel Cristina Brieman x Banco Agibank S.A

ID: 333470386

Tribunal: TJSC Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 5113146-11.2023.8.24.0930

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

ISABEL CRISTINA BRIEMAN

Polo Passivo:

BANCO AGIBANK S.A

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MS XXXXXX Desbloquear

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

FERNANDO HIDEAKI ZAVAN YAMAGURO

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

Apelação Nº 5113146-11.2023.8.24.0930/SC APELANTE : ISABEL CRISTINA BRIEMAN (AUTOR) ADVOGADO(A) : FERNANDO HIDEAKI ZAVAN YAMAGURO (OAB SC059520) APELADO : BANCO AGIBANK S.A (RÉU) ADVOGADO(A) : DENNE… Apelação Nº 5113146-11.2023.8.24.0930/SC APELANTE : ISABEL CRISTINA BRIEMAN (AUTOR) ADVOGADO(A) : FERNANDO HIDEAKI ZAVAN YAMAGURO (OAB SC059520) APELADO : BANCO AGIBANK S.A (RÉU) ADVOGADO(A) : DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA (OAB MS006835) ADVOGADO(A) : DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA (OAB SC051063) DESPACHO/DECISÃO ISABEL CRISTINA BRIEMAN interpôs apelação cível contra a sentença proferida pela Vara Estadual de Direito Bancário, que na "ação de "conhecimento nº 5113146-11.2023.8.24.0930", julgou os pedidos formulados na lide, nos seguintes termos: [...] Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos inicias constantes na presente ação movida por ISABEL CRISTINA BRIEMAN em face de BANCO AGIBANK S.A , com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, para: I - Limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil, acrescidos de 50%, nos termos da fundamentação, no tocante ao contrato discutido nos autos. II - Reconhecer descaracterizada eventual mora no tocante ao contrato questionado nos autos. III - Condenar à ré a restituição simples dos valores eventualmente cobrados e pagos a maior, com correção monetária pelo INPC, desde a data de cada pagamento, e juros simples de mora de 1% a.m., desde a citação. Figurando as partes, reciprocamente, na condição de credores e devedores, está autorizado o encontro de contas com a extinção das obrigações na medida em que se compensarem (art. 368 do CC). Diante da sucumbência mínima, condeno a ré ao pagamento integral das custas e honorários, estes fixados em 10% do proveito econômico obtido pelo autor, devidamente atualizados pelo INPC e acrescidos de juros simples de 1% a.m. a partir do trânsito em julgado ( evento 19, SENT1 ). Em suas razões recursais a parte apelante sustentou, em suma, que: a) "a possibilidade de realizar a revisão dos juros remuneratórios já foi objeto de análise perante o STJ, não havendo óbice ao acolhimento dos pedidos da parte autora"; b) "em qualquer um dos contratos expostos pela parte Ré está escancarada a abusividade da Apelada. Verifica-se que os juros contratuais são extremamente abusivos e desproporcionais à média de mercado, sendo admitida a revisão do contrato, uma vez que coloca o consumidor em desvantagem exagerada impondo-lhe ônus claramente excessivo"; c) "restando configurada a abusividade alegada, requer a redução da taxa de juros anual do(s) contrato(s) em análise para a média de mercado apurada para a data de celebração do(s) empréstimo(s)"; d) "o juízo de piso fixou os juros com acréscimo de 50% da taxa média e não da tabela do BACEN, sendo totalmente contrário ao entendimento deste tribunal"; e) "em que pese a empresa afirme correr maior risco no empréstimo de dinheiro para negativados, na prática não é o que acontece, uma vez que a empresa já retém o valor das parcelas no exato momento em que o pagamento cai na conta de seus clientes" Ao final, pugnou pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, para: a) declarar nula de pleno direito as cláusulas contratuais que preveem a incidência de taxa de juros remuneratórios ANUAIS fixadas nos contratos SEM O ACRÉSCIMO DE 50% A TAXA, para que seja substituída pela taxa anual da média de mercado para EMPRÉSTIMO PESSOAL apurada pelo Banco Central do Brasil, referente ao período correspondente a celebração do(s) contrato(s), sendo: a. Para o 1º contrato, deverá incidir a taxa média series de nº 20742, disponibilizada no sitio do Banco Central do Brasil, condenando a requerida a restituir, de FORMA SIMPLES, as diferenças dos valores cobrados em excesso nas parcelas quitadas pela parte Apelante, valor este a ser devidamente corrigido a partir do desembolso de cada parcela e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, contados a partir da citação, nos termos da petição inicial; b) Condenar o (a) recorrido aos pagamentos das custas processuais e honorários advocatícios no valor mínimo de R$ 4.000,00" ( evento 23, APELAÇÃO1 ). As contrarrazões foram apresentadas ( evento 29, CONTRAZ1 ). Ato contínuo, os autos ascenderam a este e. Tribunal de Justiça e vieram conclusos para julgamento. Contrarrazões Ofensa à dialeticidade Em sede de contrarrazões, a instituição financeira apelada sustentou, em sede de preliminar, que o apelo não pode ser conhecido, pois "a parte recorrente não rebate aos argumentos lançados na prolação da Decisium " ( evento 29, CONTRAZ1 ), o que não merece prosperar. Ao analisar a peça recursal, verifica-se que a parte apelante claramente discordou da decisão tomada pelo juiz de primeira instância, apresentando argumentos coerentes e plausíveis. Além disso, a parte recorrente solicitou de forma explícita a revisão da decisão judicial, o que afasta qualquer alegação de violação ao princípio da dialeticidade. Julgamento monocrático Por decisão monocrática, passa-se à análise do recurso, nos termos do art. 932, inciso VIII, do Código de Processo Civil e do art. 132, inciso XVI, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça, o qual dispõe: "depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento a recurso nos casos previstos no inciso V do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando a decisão recorrida for contrária a enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça;" Admissibilidade Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conhece-se do recurso. Possibilidade de revisão contratual A mitigação do princípio do pacta sunt servanda permite uma revisão mais justa e adequada dos termos contratuais, especialmente em situações onde as cláusulas podem se tornar desproporcionais ou excessivamente onerosas devido a fatos supervenientes. Ao flexibilizar esse princípio, o ordenamento jurídico garante a proteção dos direitos do consumidor, permitindo que contratos possam ser adaptados para refletir a realidade econômica e social dos envolvidos, evitando assim abusos e desequilíbrios nas relações contratuais. Essa abordagem é essencial para assegurar que a autonomia da vontade e a observância aos termos contratados não sejam absolutas, mas sim sujeitas a uma análise criteriosa das circunstâncias de cada caso. Dessa forma, a possibilidade de revisão contratual serve como uma ferramenta de justiça e equilíbrio, proporcionando soluções que atendam aos princípios de razoabilidade e proporcionalidade, e garantindo que os contratos sejam instrumentos eficazes e equitativos na regulação das relações entre as partes. Sobre a temática, colhe-se da jurisprudência do STJ: [...] Do cabimento da revisão das cláusulas contratuais A revisão judicial dos contratos é juridicamente possível, calcada que é em preceitos constitucionais e nas regras de direito comum, sobretudo havendo abusividades no instrumento contratual. Encontra-se inserido na Constituição Federal de 1988, entre as garantias fundamentais (art. 5º, inciso XXXV), dispositivo que assegura a intervenção do Poder Judiciário para apreciação de lesão ou ameaça a direito da parte. Em se tratando de relação de consumo, como no caso apreciado, esta intervenção encontra-se reforçada pelo inciso XXXII do art. 5º da Carta Magna e pelas disposições contidas no Código de Defesa do Consumidor, lei especial em relação ao regulamento civil, asseverando ser possível a revisão dos contratos, como maneira de adequá-los às normas e sem que isso implique resolução da avença. É o que reza o art. 6º, V, do referido diploma, in verbis: (...) Não se cuida, portanto, de fazer letra morta ao princípio da obrigatoriedade dos contratos - Pacta Sun Servanda- - que permanece vigente, mas sim, como é juridicamente apropriado, de redimensioná-lo em seus termos, quando se constatar a abusividade ou onerosidade excessiva da prestação de uma das partes, em prejuízo da outra (AREsp 2703842., julgado em 15/08/2024, Ministro Humberto Martins). E deste entendimento esta Corte de Justiça não destoa: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATOS DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE E DEMAIS OPERAÇÕES ATRELADAS - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA - PUBLICAÇÃO SOB A ÉGIDE O REGRAMENTO PROCESSUAL DE 1973 - RECUSO INTERPOSTO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. REVISÃO CONTRATUAL - POSSIBILIDADE - MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO "PACTA SUNT SERVANDA" - INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À BOA-FÉ OBJETIVA - INSURGÊNCIA INACOLHIDA NESTE PONTO. "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." (Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça). Estando a relação negocial salvaguardada pelos ditames desta norma, mitiga-se a aplicabilidade do princípio do pacta sunt servanda, viabilizando a revisão dos termos pactuados, uma vez que a alteração das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais, ou até mesmo as que se tornem excessivamente onerosas em decorrência de fato superveniente à assinatura do instrumento, configura direito básico do consumidor, nos moldes do inc. V do art. 6º da Lei n. 8.078/1990. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 1000710-75.2013.8.24.0075, de Tubarão, rel. Des. Robson Luz Varella, j. 20-06-2017). Assim, é perfeitamente viável realizar a revisão contratual. Tal revisão requer a verificação da existência, ou não, de ilegalidades contratuais no caso concreto. Mérito recursal Antes de iniciar o exame das questões de fundo suscitadas no recurso, importa assinalar que é pacífico o entendimento, consagrado na Súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça, de que as instituições financeiras se submetem às normas do Código de Defesa do Consumidor, interpretação que se revela plenamente aplicável à presente controvérsia. Juros remuneratórios Quanto aos juros remuneratórios, estabeleceu o Grupo de Câmaras de Direito Comercial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, especificamente em seu Enunciado I, que, " nos contratos bancários, com exceção das cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12% (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil ". Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial n. 1.061.530/RS, no qual foi instaurado incidente de recurso repetitivo, sob a relatoria da eminente Ministra Nancy Andrighi, esclareceu a questão relativa ao encargo em destaque (juros remuneratórios), e prevaleceu, portanto, a orientação de que, " demonstrado o excesso, deve-se aplicar a taxa média para as operações equivalentes, segundo apurado pelo Banco Central do Brasil ". Assim, ao editar a Primeira Orientação dos recursos repetitivos, a 2ª Seção do STJ consolidou o entendimento de que: a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios que foi estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), como dispõe a Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano por si só não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do caso concreto. Não se olvida, aliás, que a perquirição da abusividade demanda processamento dinâmico, ou seja, torna-se possível também a adoção de critérios genéricos e universais, e, respeitante a isso, " a taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos " (Resp. n.1.061.530/RS). Por ser livre, portanto, a maneira de o juiz investigar a existência de abusividades nas contratações, é certo que pode ser adotada como vetor da taxa de juros remuneratórios a média praticada pelo mercado, sem que isso incorra em instituir um sistema rígido no parâmetro regulatório, pois não se está influenciando no modo da aferição utilizado pelo Banco Central, mas apenas utilizando-se de parâmetros já informados para limitar a imposição exacerbada da remuneração do capital emprestado. Nesse contexto, a matéria em tela foi palco de discussão na Corte Superior, cujo posicionamento restou definido no sentido de que: [...] . O caráter abusivo da taxa de juros contratada haverá de ser demonstrado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando-se em consideração circunstâncias como o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos.[...] 6. Recurso especial provido. (REsp n. 1.821.182/RS, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 23/6/2022, DJe de 29/6/2022, sem grifos no original). E deste entendimento este Órgão Fracionário não destoa. Confira-se: [...] "De acordo com os parâmetros adotados pela Corte Superior, o fato de a taxa contratada de juros remuneratórios estar acima da taxa média de mercado, por si só, não configura abusividade, devendo ser observados, para a limitação dos referidos juros, fatores como o custo de captação dos recursos, o spread da operação, a análise de risco de crédito do contratante, ponderando-se a caracterização da relação de consumo e eventual desvantagem exagerada do consumidor" (TJSC, Apelação n. 5004544-25.2024.8.24.0045, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Mohr, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 10-10-2024). Nesse linha de intelecção, verificada na hipótese específica a pactuação acima de uma faixa razoável de aplicabilidade da taxa de juros remuneratórios estabelecida nos registros da autarquia financeira oficial, sem que haja nos autos qualquer elemento concreto que justifique a aplicação de uma taxa tão elevada em comparação ao referencial, caracterizada está a abusividade na cobrança do encargo. Na hipótese dos autos, tem-se o contrato sub judice: Número do contrato 0332217001 ( evento 1, CONTR4 ) Tipo de contrato Crédito pessoal não consignado Data do contrato 11/03/2014 Taxa média do Bacen na data do contrato 5,68% a.m 94,09% a.a Juros contratados 20,00% a.m 791,61% a.a A toda evidência, a taxa de juros remuneratórios contratada excede de maneira excessiva a média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil à época das contratações para a operação específica (Série Temporal nº 25464), sem que haja nos autos qualquer elemento que justifique a adoção de uma taxa tão elevada em comparação ao referencial. Observa-se que, nos registros disponíveis, não há qualquer evidência de inadimplência nos órgãos competentes no momento da contratação, tampouco existe outro fator concreto que demonstre um risco elevado da operação, a fim de justificar a diferença exorbitante entre a taxa acordada e as taxas de mercado para operações similares. A propósito, embora a empresa sustente que corre risco elevado ao conceder empréstimos a pessoas com restrições, essa alegação não se sustenta na prática, pois o valor das parcelas é automaticamente retido assim que o crédito é depositado na conta do cliente. Essa discrepância entre as taxas contratadas e a média de mercado divulgada pelo Banco Central suscita sérias dúvidas sobre a transparência e a equidade das condições acordadas. A ausência de justificativas plausíveis nos autos para a escolha de uma taxa significativamente superior àquela indicada pelo órgão regulador expõe a operação a questionamentos acerca de sua onerosidade excessiva e desproporcionalidade, configurando, em última análise, prática abusiva. E, nos termos do artigo 373, II, do Código de Processo Civil, incumbia à instituição bancária o ônus de comprovar a excepcionalidade que justificaria tal diferença, o que não foi devidamente demonstrado no presente caso. Portanto, era imprescindível que a instituição financeira tivesse apresentado provas seguras para a imposição de condições tão desfavoráveis ao contratante, com o objetivo de assegurar a conformidade com os princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato. Todavia, não houve tal comprovação na espécie, certo de que a intituição financeira só apresentou alegações genéricas a respeito. Nesse cenário, conclui-se que a transparência e a equidade nas condições contratuais, pilares essenciais para a manutenção da confiança no sistema financeiro, foram desrespeitadas, de sorte que a aplicação da taxa média é fundamental para evitar práticas abusivas e proteger os direitos dos consumidores. Nessa linha intelecção, destaca-se julgados desta Corte de Justiça em caso similar: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. PLEITO DE RECONHECIMENTO DO JULGAMENTO ULTRA PETITA EM RELAÇÃO À ALTERAÇÃO DO SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO. PEDIDO QUE NÃO FEZ PARTE DA EXORDIAL. NECESSIDADE DE REFORMA DA SENTENÇA NO PONTO. JUROS REMUNERATÓRIOS. ORIENTAÇÃO 1 DO RESP. N. 1.061.530/RS, EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO (TEMAS 24 A 27). PERCENTUAL PACTUADO EXCESSIVO. ABUSIVIDADE QUE COLOCA O CONSUMIDOR EM DESVANTAGEM. EXTRAORDINÁRIO CUSTO DE CAPTAÇÃO DE RECURSOS E EXCEPCIONAL RISCO DO CRÉDITO NÃO COMPROVADOS. INEXISTÊNCIA DE JUSTIFICATIVAS PARA A PACTUAÇÃO DAQUELE PERCENTUAL ELEVADO. REFORMA DA SENTENÇA PARA LIMITAR A COBRANÇA DOS JUROS À TAXA MÉDIA PRATICADA PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL À ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS RECONHECIDA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO DEPÓSITO DO VALOR INCONTROVERSO. APLICAÇÃO DO TEMA 28 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NOVO POSICIONAMENTO DESTA CORTE. SÚMULA 66 DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO COMERCIAL REVOGADA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CABIMENTO NA FORMA SIMPLES. ÔNUS SUCUMBENCIAL. RECONHECIMENTO DA SUCUMBÊNCIA MÍNIMA. NECESSIDADE DE INVERSÃO. HONORÁRIOS RECURSAIS. DESCABIMENTO. CRITÉRIOS CUMULATIVOS ESTABELECIDOS PELO STJ NÃO ATENDIDOS (AGINT NOS ERESP N. 1539725/DF). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO (TJSC, Apelação n. 5003388-57.2023.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Getúlio Corrêa, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 11-06-2024 - grifou-se). E, deste eg. Órgão Fracionário: APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO REVISIONAL. EMPRÉSTIMOS PESSOAIS NÃO CONSIGNADOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. RECURSO DE APELAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA [...] JUROS REMUNERATÓRIOS. DEFENDIDA MANUTENÇÃO DAS TAXAS CONTRATADAS. INSUBSISTÊNCIA. TAXA MÉDIA DE MERCADO QUE SERVE COMO PARÂMETRO BASILAR, DEVENDO TAMBÉM LEVAR EM CONTA A AVALIAÇÃO DE OUTROS FATORES ENVOLVIDOS PARA A REALIZAÇÃO DA OPERAÇÃO DE CRÉDITO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELA CORTE DA CIDADANIA. ENCARGO PACTUADO EM PERCENTUAIS SIGNIFICATIVAMENTE ACIMA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO, DIVULGADA PELO BACEN, PARA OPERAÇÃO DE MESMA ESPÉCIE, À DATA DA CONTRATAÇÃO, EM TODOS OS CONTRATOS SOB REVISÃO. AUSÊNCIA DE HISTÓRICO DE INADIMPLÊNCIA DO DEVEDOR OU QUALQUER OUTRO ELEMENTO QUE DEMONSTRE O RISCO DA OPERAÇÃO. ABUSIVIDADE EVIDENCIADA. LIMITAÇÃO IMPERATIVA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PRETENDIDO AFASTAMENTO. INVIABILIDADE. ENCARGO REDUZIDO A ENSEJAR A RESTITUIÇÃO DE VALORES, NA FORMA SIMPLES, QUE RESTA MANTIDA. ADEQUAÇÃO, EX OFFICIO, DOS ÍNDICES DE ATUALIZAÇÃO. ATÉ 29-08-2024, CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC, A CONTAR DE CADA DESEMBOLSO, ACRESCIDA DE JUROS DE MORA DE 1% AO MÊS, DESDE A CITAÇÃO. A PARTIR DE 30-08-2024, SALVO SE HOUVER ESTIPULAÇÃO EM CONTRÁRIO, JUROS MORATÓRIOS PELA TAXA SELIC, ÍNDICE ESTE QUE JÁ ENGLOBA CORREÇÃO MONETÁRIA (ART. 406, § 1°, DO CÓDIGO CIVIL, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 14.905/2024). RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA [...](TJSC, Apelação n. 5009691-93.2024.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Mohr, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 07-11-2024 - grifou-se). Em conclusão, ao analisar o caso específico, evidencia-se a abusividade na taxa de juros aplicada no contrato em questão, o que coloca o consumidor em manifesta desvantagem na relação contratual. Por isso, torna-se necessária a revisão da taxa dos contratos controversos, limitando-a à média de mercado divulgada pelo Banco Central, sem o acréscimo de 50% (cinquenta por cento). Repetição do indébito Sabe-se que se for apurado pagamento a mais, opera-se a restituição na forma simples ou compensação em favor do consumidor, independentemente da prova do erro. A propósito, colhe-se julgado desta Corte: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. CRÉDITO PESSOAL CONSIGNADO PARA TRABALHADORES DO SETOR PÚBLICO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. [...] REPETIÇÃO DO INDÉBITO OU COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. DIREITO DO CONSUMIDOR (ART. 42 DO CDC). HIPÓTESE EM QUE HOUVE MODIFICAÇÃO CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DE PROVAS DE QUE A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA TERIA AGIDO DE MÁ-FÉ. RESTITUIÇÃO OU COMPENSAÇÃO PERMITIDA NA FORMA SIMPLES . CORREÇÃO PELO INPC DESDE A DATA DE CADA PAGAMENTO INDEVIDO E COM APLICAÇÃO DE JUROS MORATÓRIOS DE 1% AO MÊS, A CONTAR DA CITAÇÃO. [...] (Apelação Cível n. 5078651-38.2023.8.24.0930, rel.. Des. Newton Varella Júnior, j. em 29-2-2024, grifou-se). Outrossim: APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. RECURSO DA CASA BANCÁRIA RÉ. ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. OBSERVÂNCIA DAS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO (SITUAÇÃO DA ECONOMIA À ÉPOCA, GARANTIAS OFERECIDAS, PERFIL DO CONTRATANTE E RISCOS DA OPERAÇÃO). TAXA MÉDIA DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL (BACEN) QUE SERVE APENAS COMO CRITÉRIO ÚTIL DE AFERIÇÃO. TODAVIA, CASO CONCRETO EM QUE A TAXA PRATICADA FOI MUITO SUPERIOR À MÉDIA DO MÊS DE PACTUAÇÃO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE DEMONSTRAR O RESULTADO DA ANÁLISE DE PERFIL DO MUTUÁRIO, DE MODO A JUSTIFICAR A ALÍQUOTA. ENCARGO ABUSIVO. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE APLICAÇÃO DA MÉDIA MERCADOLÓGICA ACRESCIDA DE UMA VEZ E MEIA QUE SE MOSTRA INADEQUADO. REJEIÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DA AUTORA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. DESCABIMENTO. AINDA QUE PRESENTE ENCARGO ABUSIVO, MÁ-FÉ CONTRATUAL INDEMONSTRADA. REPETIÇÃO NA FORMA SIMPLES. REJEIÇÃO. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. SENTENÇA QUE ARBITROU A VERBA COM BASE NO VALOR DA CAUSA. MONTANTE INDICADO NA INICIAL MUITO BAIXO. PARÂMETRO QUE NÃO PODE SER UTILIZADO. VERBA QUE DEVE SER FIXADA POR EQUIDADE. TABELA DA OAB. APLICABILIDADE NÃO OBRIGATÓRIA. ABRITRAMENTO DE ACORDO COM O VALOR USUALMENTE PRATICADO POR ESTA CORTE. PLEITO RECURSAL ACOLHIDO PARCIALMENTE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. HIPÓTESE QUE NÃO AUTORIZA A MAJORAÇÃO PREVISTA NO ART. 85, § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS FIXADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO DA PARTE RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. (TJSC, Apelação n. 5074645-85.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Silvio Franco, Primeira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 24-10-2024 - grifou-se). Em tempo, impende ainda consignar que, "inviável a repetição dobrada, haja vista que inexiste conduta contrária à boa-fé objetiva na celebração de um contrato de mútuo mesmo que com juros muito superiores à taxa média, porquanto assim pactuados em decorrência de uma série de peculiaridades, conforme anotou a instituição financeira nos autos" (TJSC, Apelação n. 5005540-82.2022.8.24.0048, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Zanelato, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 27-06-2024). Por corolário, diante da abusividade constatada, necessária a devolução ou compensação dos valores porventura pagos a mais, na modalidade simples. Tal montante, por oportuno, assevera-se que deve ser acrescido de correção monetária pelo INPC até 29.08.2024 e pelo IPCA a partir de então, a contar de cada pagamento indevido, bem como de juros de mora, a partir da citação de 1% ao mês até 29/08/2024, aplicando-se os termos da Lei n. 14.905/24 (Taxa Selic, deduzido o IPCA) a partir de então. Sobre o assunto, confira-se: AC n. 50974365320238240023, Des. Rel. João Marcos Buch. j. 08.10.2024. Conclusão Fortes nesses fundamentos, a sentença merece ser reformada para a fim de limitar a taxa de juros remuneratórios dos contratos sub judice à média de mercado divulgada pelo Banco Central com a repetição simples do indébito, nos termos noticiados. Convém destacar, por oportuno, que o juízo de origem condenou a parte ré ao pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o proveito econômico obtido pelo autor, com atualização monetária pelo INPC e acréscimo de juros simples de 1% ao mês a partir do trânsito em julgado. Considerando que a sucumbência foi integralmente atribuída à parte apelada, mostra-se adequada sua manutenção, sendo apenas necessário o ajuste da verba honorária. Sobre o tema, defende a parte apelante a condenação do banco apelado ao pagamento dos ônus sucumbenciais no valor mínimo de R$ 4.000,00. Acerca dos honorários advocatícios sucumbenciais, dispõe o Código de Processo Civil de 2015: Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. [...] § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. [...] § 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º. § 8º-A. Na hipótese do § 8º deste artigo, para fins de fixação equitativa de honorários sucumbenciais, o juiz deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil a título de honorários advocatícios ou o limite mínimo de 10% (dez por cento) estabelecido no § 2º deste artigo, aplicando-se o que for maior. Com efeito, salienta-se que a tabela de honorários divulgada pela Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional de Santa Catarina tem caráter meramente informativo e, por tal motivo, não vincula o magistrado no ato de arbitrar a verba honorária sucumbencial. Isso porque, o grau de zelo do profissional (inc. I), o lugar de prestação do serviço (inc. II), a natureza e a importância da causa (inc. III), e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço (inc. IV) devem ser analisados conforme as peculiaridades de cada caso concreto. Acerca do tema, colhe-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. TABELA DE HONORÁRIOS DA SECCIONAL DA OAB. NATUREZA INFORMATIVA. NÃO VINCULANTE. HONORÁRIOS FIXADOS OBSERVANDO OS PARÂMETROS LEGAIS E EM VALOR RAZOÁVEL. ALTERAÇÃO. INVIABILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Esta Corte Superior manifesta-se no sentido de que "a tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB tem natureza meramente orientadora e não vincula o julgador, devendo ser levada em consideração a realidade do caso concreto" (AgInt no REsp 1.751.304/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 24/9/2019, DJe de 30/9/2019). [...] (AgInt no AREsp n. 2.038.616/RJ, rel. Min. Raul Araújo, j. em 10-10-2022, grifou-se). Assim, deixa-se de utilizar a tabela de honorários da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional de Santa Catarina para fins de arbitramento da verba honorária sucumbencial, porquanto sua natureza informativa não vincula o julgador no ato de definir o montante do estipêndio patronal. Feitas tais considerações, impende destacar que, embora o juízo de origem tenha fixado os honorários advocatícios com base no proveito econômico obtido pelo autor, essa forma de cálculo revela-se inadequada no caso concreto. Isso porque, apesar de reconhecido o êxito da parte autora, a quantificação precisa do benefício econômico decorrente da decisão não é possível de ser mensurada com exatidão a este tempo, seja pela natureza da obrigação reconhecida judicialmente, seja pela ausência de liquidez imediata do direito reconhecido. Ademais, o valor atribuído à causa não reflete, de forma justa ou proporcional, a complexidade da demanda, o trabalho desempenhado pelo patrono da parte autora ou o grau de zelo profissional, além de se mostrar manifestamente irrisório para os fins de fixação dos honorários, nos termos do § 8º do art. 85 do CPC. Nesse contexto, considerando ainda os critérios previstos no § 2º do referido artigo, tais como o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, bem como o tempo exigido para o serviço, impõe-se a fixação dos honorários por apreciação equitativa. Assim, arbitra-se a verba honorária em R$ 2.000,00 (dois mil reais), valor que se mostra razoável e proporcional às peculiaridades do caso concreto, em consonância com os parâmetros legais. Honorários recursais Por fim, ante o provimento parcial do recurso, inviável a fixação dos honorários advocatícios recursais, nos termos do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.864.633/RS (Tema 1.059): RECURSO ESPECIAL REPETITIVO - DIREITO PROCESSUAL CIVIL - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS - ART. 85, § 11, DO CPC - MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA EM GRAU RECURSAL - IMPOSSIBILIDADE EM CASO DE PROVIMENTO PARCIAL OU TOTAL DO RECURSO, AINDA QUE MÍNIMA A ALTERAÇÃO DO RESULTADO DO JULGAMENTO - FIXAÇÃO DE TESE JURÍDICA DE EFICÁCIA VINCULANTE - SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO: PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL. [...] 5. Tese jurídica de eficácia vinculante, sintetizadora da ratio decidendi do julgado paradigmático: " A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento e limitada a consectários da condenação. " [...] (Resp n. 1.864.633/RS, rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, j. em 9-11-23, grifou-se). Assim, deixa-se de fixar honorários recursais na espécie. Dispositivo Ante o exposto, voto por conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para: a) limitar a taxa de juros remuneratórios incidente nos contratos objeto da lide à média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil, sem o acréscimo de 50% (cinquenta por cento); b) reconhecer o direito à repetição do indébito, de forma simples, nos termos delineados; c) readequar os honorários advocatícios para o valor fixo de R$ 2.000,00 (dois mil reais), com fundamento nos §§ 2º e 8º do art. 85 do Código de Processo Civil, considerando a complexidade da demanda, o grau de zelo profissional e o proveito econômico envolvido.

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Fernanda De Medeiros Burato x Banco Daycoval S.A.

ID: 333470489

Tribunal: TJSC Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 5113300-29.2023.8.24.0930

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

FERNANDA DE MEDEIROS BURATO

Polo Passivo:

BANCO DAYCOVAL S.A.

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

ALESSANDRA MICHALSKI VELLOSO

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

MICHELLE MARY DA SILVA CACHOEIRA

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

Apelação Nº 5113300-29.2023.8.24.0930/SC APELANTE : FERNANDA DE MEDEIROS BURATO (AUTOR) ADVOGADO(A) : MICHELLE MARY DA SILVA CACHOEIRA (OAB SC021133) APELADO : BANCO DAYCOVAL S.A. (RÉU) ADVOGADO(A) … Apelação Nº 5113300-29.2023.8.24.0930/SC APELANTE : FERNANDA DE MEDEIROS BURATO (AUTOR) ADVOGADO(A) : MICHELLE MARY DA SILVA CACHOEIRA (OAB SC021133) APELADO : BANCO DAYCOVAL S.A. (RÉU) ADVOGADO(A) : ALESSANDRA MICHALSKI VELLOSO (OAB RS045283) DESPACHO/DECISÃO FERNANDA DE MEDEIROS BURATO interpôs apelação cível contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário que, nos autos da "ação de conhecimento com pedido de revisão de cláusula contratual com repetição de indébito" ajuizada em face de Banco BANCO DAYCOVAL S/A., julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial ( evento 18, SENT1 ). Em suas razões recursais, sustentou, em suma: a) a abusividade dos juros remuneratórios; a "ilegalidade da cobrança de tarifas administrativas"; b) a ilicitude do seguro prestamista; c) a necessidade de descaracterização da mora; d) a "repetição e/ou compensação dos valores cobrados a maior". Ao final, pugnou pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, nos termos noticiados ( evento 24, APELAÇÃO1 ). As contrarrazões foram apresentadas ( evento 29, CONTRAZAP1 ). É o relato. Admissibilidade Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conhece-se do recurso. Julgamento monocrático Por decisão monocrática, passa-se à análise do recurso, nos termos da alínea "a" do inciso IV do artigo 932 do Código de Processo Civil e do artigo 132, inciso XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o qual dispõe que: "é atribuição do relator negar provimento a recurso nos casos previstos no inciso IV do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando esteja em confronto com enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça". Lado outro, o artigo 132, inciso XVI, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, dispõe que é atribuição do relator "depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento a recurso nos casos previstos no inciso V do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando a decisão recorrida for contrária a enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça". Possibilidade de revisão contratual A mitigação do princípio do pacta sunt servanda permite uma revisão mais justa e adequada dos termos contratuais, especialmente em situações onde as cláusulas podem se tornar desproporcionais ou excessivamente onerosas devido a fatos supervenientes. Ao flexibilizar esse princípio, o ordenamento jurídico garante a proteção dos direitos do consumidor, permitindo que contratos possam ser adaptados para refletir a realidade econômica e social dos envolvidos, evitando assim abusos e desequilíbrios nas relações contratuais. Essa abordagem é essencial para assegurar que a autonomia da vontade e a observância aos termos contratados não sejam absolutas, mas sim sujeitas a uma análise criteriosa das circunstâncias de cada caso. Dessa forma, a possibilidade de revisão contratual serve como uma ferramenta de justiça e equilíbrio, proporcionando soluções que atendam aos princípios de razoabilidade e proporcionalidade, e garantindo que os contratos sejam instrumentos eficazes e equitativos na regulação das relações entre as partes. Sobre a temática, colhe-se da jurisprudência do STJ: [...] Do cabimento da revisão das cláusulas contratuais A revisão judicial dos contratos é juridicamente possível, calcada que é em preceitos constitucionais e nas regras de direito comum, sobretudo havendo abusividades no instrumento contratual. Encontra-se inserido na Constituição Federal de 1988, entre as garantias fundamentais (art. 5º, inciso XXXV), dispositivo que assegura a intervenção do Poder Judiciário para apreciação de lesão ou ameaça a direito da parte. Em se tratando de relação de consumo, como no caso apreciado, esta intervenção encontra-se reforçada pelo inciso XXXII do art. 5º da Carta Magna e pelas disposições contidas no Código de Defesa do Consumidor, lei especial em relação ao regulamento civil, asseverando ser possível a revisão dos contratos, como maneira de adequá-los às normas e sem que isso implique resolução da avença. É o que reza o art. 6º, V, do referido diploma, in verbis: (...) Não se cuida, portanto, de fazer letra morta ao princípio da obrigatoriedade dos contratos - Pacta Sun Servanda- - que permanece vigente, mas sim, como é juridicamente apropriado, de redimensioná-lo em seus termos, quando se constatar a abusividade ou onerosidade excessiva da prestação de uma das partes, em prejuízo da outra (AREsp 2703842., julgado em 15/08/2024, Ministro Humberto Martins). E deste entendimento esta Corte de Justiça não destoa: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATOS DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE E DEMAIS OPERAÇÕES ATRELADAS - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA - PUBLICAÇÃO SOB A ÉGIDE O REGRAMENTO PROCESSUAL DE 1973 - RECUSO INTERPOSTO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. REVISÃO CONTRATUAL - POSSIBILIDADE - MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO "PACTA SUNT SERVANDA" - INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À BOA-FÉ OBJETIVA - INSURGÊNCIA INACOLHIDA NESTE PONTO. "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." (Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça). Estando a relação negocial salvaguardada pelos ditames desta norma, mitiga-se a aplicabilidade do princípio do pacta sunt servanda, viabilizando a revisão dos termos pactuados, uma vez que a alteração das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais, ou até mesmo as que se tornem excessivamente onerosas em decorrência de fato superveniente à assinatura do instrumento, configura direito básico do consumidor, nos moldes do inc. V do art. 6º da Lei n. 8.078/1990. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 1000710-75.2013.8.24.0075, de Tubarão, rel. Des. Robson Luz Varella, j. 20-06-2017). Assim, é perfeitamente viável realizar a revisão contratual. Tal revisão requer a verificação da existência, ou não, de ilegalidades contratuais no caso concreto. Mérito recursal Antes de iniciar o exame das questões de fundo suscitadas no recurso, importa assinalar que é pacífico o entendimento, consagrado na Súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça, de que as instituições financeiras se submetem às normas do Código de Defesa do Consumidor, interpretação que se revela plenamente aplicável à presente controvérsia. Juros remuneratórios Quanto aos juros remuneratórios, estabeleceu o Grupo de Câmaras de Direito Comercial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, especificamente em seu Enunciado I, que, " nos contratos bancários, com exceção das cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12% (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil ". Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial n. 1.061.530/RS, no qual foi instaurado incidente de recurso repetitivo, sob a relatoria da eminente Ministra Nancy Andrighi, esclareceu a questão relativa ao encargo em destaque (juros remuneratórios), e prevaleceu, portanto, a orientação de que, " demonstrado o excesso, deve-se aplicar a taxa média para as operações equivalentes, segundo apurado pelo Banco Central do Brasil ". Assim, ao editar a Primeira Orientação dos recursos repetitivos, a 2ª Seção do STJ consolidou o entendimento de que: a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios que foi estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), como dispõe a Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano por si só não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do caso concreto. Não se olvida, aliás, que a perquirição da abusividade demanda processamento dinâmico, ou seja, torna-se possível também a adoção de critérios genéricos e universais, e, respeitante a isso, " a taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos " (Resp. n.1.061.530/RS). Por ser livre, portanto, a maneira de o juiz investigar a existência de abusividades nas contratações, é certo que pode ser adotada como vetor da taxa de juros remuneratórios a média praticada pelo mercado, sem que isso incorra em instituir um sistema rígido no parâmetro regulatório, pois não se está influenciando no modo da aferição utilizado pelo Banco Central, mas apenas utilizando-se de parâmetros já informados para limitar a imposição exacerbada da remuneração do capital emprestado. Nesse contexto, a matéria em tela foi palco de discussão na Corte Superior, cujo posicionamento restou definido no sentido de que: [...] . O caráter abusivo da taxa de juros contratada haverá de ser demonstrado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando-se em consideração circunstâncias como o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos.[...] 6. Recurso especial provido. (REsp n. 1.821.182/RS, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 23/6/2022, DJe de 29/6/2022, sem grifos no original). E deste entendimento este Órgão Fracionário não destoa. Confira-se: [...] "De acordo com os parâmetros adotados pela Corte Superior, o fato de a taxa contratada de juros remuneratórios estar acima da taxa média de mercado, por si só, não configura abusividade, devendo ser observados, para a limitação dos referidos juros, fatores como o custo de captação dos recursos, o spread da operação, a análise de risco de crédito do contratante, ponderando-se a caracterização da relação de consumo e eventual desvantagem exagerada do consumidor" (TJSC, Apelação n. 5004544-25.2024.8.24.0045, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Mohr, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 10-10-2024). Nesse linha de intelecção, verificada na hipótese específica a pactuação acima de uma faixa razoável de aplicabilidade da taxa de juros remuneratórios estabelecida nos registros da autarquia financeira oficial, sem que haja nos autos qualquer elemento concreto que justifique a aplicação de uma taxa tão elevada em comparação ao referencial, caracterizada está a abusividade na cobrança do encargo. Na hipótese dos autos, tem-se o contrato sub judice: Número do contrato CCB Nº 14-1221289/22 ( evento 1, CONTR3 ) Tipo de contrato Série: 20749 e 25471 Data do contrato 20/07/2022 Taxa média do Bacen na data do contrato 2,05 % a.m. e 27,64 % a.a Juros contratados 2,92 % a. m. - 41,25 % a. a. A toda evidência, a taxa de juros remuneratórios contratada excede de maneira excessiva a média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil à época das contratações para a operação específica (Série Temporal nº 20749 e 25471), sem que haja nos autos qualquer elemento que justifique a adoção de uma taxa tão elevada em comparação ao referencial. Observa-se que, nos registros disponíveis, não há qualquer evidência de inadimplência nos órgãos competentes no momento da contratação, tampouco existe outro fator concreto que demonstre um risco elevado da operação, a fim de justificar a diferença exorbitante entre a taxa acordada e as taxas de mercado para operações similares. A propósito, embora a empresa sustente que corre risco elevado ao conceder empréstimos a pessoas com restrições, essa alegação não se sustenta na prática, pois o valor das parcelas é automaticamente retido assim que o crédito é depositado na conta do cliente. Essa discrepância entre as taxas contratadas e a média de mercado divulgada pelo Banco Central suscita sérias dúvidas sobre a transparência e a equidade das condições acordadas. A ausência de justificativas plausíveis nos autos para a escolha de uma taxa significativamente superior àquela indicada pelo órgão regulador expõe a operação a questionamentos acerca de sua onerosidade excessiva e desproporcionalidade, configurando, em última análise, prática abusiva. E, nos termos do artigo 373, II, do Código de Processo Civil, incumbia à instituição bancária o ônus de comprovar a excepcionalidade que justificaria tal diferença, o que não foi devidamente demonstrado no presente caso. Portanto, era imprescindível que a instituição financeira tivesse apresentado provas seguras para a imposição de condições tão desfavoráveis ao contratante, com o objetivo de assegurar a conformidade com os princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato. Todavia, não houve tal comprovação na espécie, certo de que a intituição financeira só apresentou alegações genéricas a respeito. Nesse cenário, conclui-se que a transparência e a equidade nas condições contratuais, pilares essenciais para a manutenção da confiança no sistema financeiro, foram desrespeitadas, de sorte que a aplicação da taxa média é fundamental para evitar práticas abusivas e proteger os direitos dos consumidores. Nessa linha intelecção, destaca-se julgados desta Corte de Justiça em caso similar: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. PLEITO DE RECONHECIMENTO DO JULGAMENTO ULTRA PETITA EM RELAÇÃO À ALTERAÇÃO DO SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO. PEDIDO QUE NÃO FEZ PARTE DA EXORDIAL. NECESSIDADE DE REFORMA DA SENTENÇA NO PONTO. JUROS REMUNERATÓRIOS. ORIENTAÇÃO 1 DO RESP. N. 1.061.530/RS, EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO (TEMAS 24 A 27). PERCENTUAL PACTUADO EXCESSIVO. ABUSIVIDADE QUE COLOCA O CONSUMIDOR EM DESVANTAGEM. EXTRAORDINÁRIO CUSTO DE CAPTAÇÃO DE RECURSOS E EXCEPCIONAL RISCO DO CRÉDITO NÃO COMPROVADOS. INEXISTÊNCIA DE JUSTIFICATIVAS PARA A PACTUAÇÃO DAQUELE PERCENTUAL ELEVADO. REFORMA DA SENTENÇA PARA LIMITAR A COBRANÇA DOS JUROS À TAXA MÉDIA PRATICADA PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL À ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS RECONHECIDA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO DEPÓSITO DO VALOR INCONTROVERSO. APLICAÇÃO DO TEMA 28 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NOVO POSICIONAMENTO DESTA CORTE. SÚMULA 66 DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO COMERCIAL REVOGADA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CABIMENTO NA FORMA SIMPLES. ÔNUS SUCUMBENCIAL. RECONHECIMENTO DA SUCUMBÊNCIA MÍNIMA. NECESSIDADE DE INVERSÃO. HONORÁRIOS RECURSAIS. DESCABIMENTO. CRITÉRIOS CUMULATIVOS ESTABELECIDOS PELO STJ NÃO ATENDIDOS (AGINT NOS ERESP N. 1539725/DF). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO (TJSC, Apelação n. 5003388-57.2023.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Getúlio Corrêa, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 11-06-2024 - grifou-se). E, deste eg. Órgão Fracionário: APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO REVISIONAL. EMPRÉSTIMOS PESSOAIS NÃO CONSIGNADOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. RECURSO DE APELAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA [...] JUROS REMUNERATÓRIOS. DEFENDIDA MANUTENÇÃO DAS TAXAS CONTRATADAS. INSUBSISTÊNCIA. TAXA MÉDIA DE MERCADO QUE SERVE COMO PARÂMETRO BASILAR, DEVENDO TAMBÉM LEVAR EM CONTA A AVALIAÇÃO DE OUTROS FATORES ENVOLVIDOS PARA A REALIZAÇÃO DA OPERAÇÃO DE CRÉDITO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELA CORTE DA CIDADANIA. ENCARGO PACTUADO EM PERCENTUAIS SIGNIFICATIVAMENTE ACIMA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO, DIVULGADA PELO BACEN, PARA OPERAÇÃO DE MESMA ESPÉCIE, À DATA DA CONTRATAÇÃO, EM TODOS OS CONTRATOS SOB REVISÃO. AUSÊNCIA DE HISTÓRICO DE INADIMPLÊNCIA DO DEVEDOR OU QUALQUER OUTRO ELEMENTO QUE DEMONSTRE O RISCO DA OPERAÇÃO. ABUSIVIDADE EVIDENCIADA. LIMITAÇÃO IMPERATIVA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PRETENDIDO AFASTAMENTO. INVIABILIDADE. ENCARGO REDUZIDO A ENSEJAR A RESTITUIÇÃO DE VALORES, NA FORMA SIMPLES, QUE RESTA MANTIDA. ADEQUAÇÃO, EX OFFICIO, DOS ÍNDICES DE ATUALIZAÇÃO. ATÉ 29-08-2024, CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC, A CONTAR DE CADA DESEMBOLSO, ACRESCIDA DE JUROS DE MORA DE 1% AO MÊS, DESDE A CITAÇÃO. A PARTIR DE 30-08-2024, SALVO SE HOUVER ESTIPULAÇÃO EM CONTRÁRIO, JUROS MORATÓRIOS PELA TAXA SELIC, ÍNDICE ESTE QUE JÁ ENGLOBA CORREÇÃO MONETÁRIA (ART. 406, § 1°, DO CÓDIGO CIVIL, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 14.905/2024). RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA [...](TJSC, Apelação n. 5009691-93.2024.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Mohr, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 07-11-2024 - grifou-se). Em conclusão, ao analisar o caso específico, evidencia-se a abusividade na taxa de juros aplicada no contrato em questão, o que coloca o consumidor em manifesta desvantagem na relação contratual. Por isso, torna-se necessária a revisão da taxa dos contratos controversos, limitando-a à média de mercado divulgada pelo Banco Central. Tarifa administrativas A parte recorrente impugna a legalidade das cobranças efetuadas a título de tarifa de cadastro e de despesas de registro contratual. Razão lhe assiste, ao menos parcialmente. Com relação à tarifa de cadastro, é pacífico o entendimento jurisprudencial quanto à sua validade, desde que observados certos requisitos. De acordo com o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça, consagrado na Súmula n. 566, é admissível a cobrança do referido encargo nos seguintes termos: "Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira." Tal entendimento foi reafirmado no julgamento do REsp 1.251.331/RS, sob a sistemática dos recursos repetitivos, oportunidade em que se reconheceu a legitimidade da tarifa, desde que prevista de forma expressa, cobrada uma única vez, e exclusivamente no início da contratação. No caso concreto, o contrato foi firmado em 20/07/2022, já sob a égide da normativa vigente, e há expressa pactuação da tarifa de cadastro no valor de R$ 1.700,00 ( evento 1, CONTR3 ). Também não há nos autos elementos que indiquem sua cobrança em momento distinto da celebração do ajuste. Todavia, a jurisprudência tem reconhecido que, embora válida, a tarifa de cadastro deve observar critérios de razoabilidade e proporcionalidade, de modo a coibir a cobrança de valores manifestamente excessivos, incompatíveis com a natureza do encargo. A propósito, este órgão Fracionário vem mitigando o valor da tarifa sempre que constatada discrepância relevante entre o montante estipulado contratualmente e a média praticada pelas instituições financeiras à época da contratação, conforme dados disponibilizados pelo Banco Central. Veja-se: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA VOLTADA À AQUISIÇÃO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. CONTRARRAZÕES. IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA CONCEDIDA AO REQUERENTE. INSUBSISTÊNCIA. DEMONSTRAÇÃO SATISFATÓRIA DA HIPOSSUFICIÊNCIA PELO CONSUMIDOR. PRESUNÇÃO LEGAL DA DECLARAÇÃO DE POBREZA NÃO INFIRMADA. ART. 99, § 3º, DO CPC. BENESSE MANTIDA. APELAÇÃO. JUROS REMUNERATÓRIOS. VENTILADA A EXORBITÂNCIA DAS TAXAS CONTRATUAIS. IMPROVIMENTO. RELAÇÃO DE CONSUMO. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. OBSERVÂNCIA DAS MÉDIAS DIVULGADAS PELO BACEN APENAS A TÍTULO REFERENCIAL. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO CONCRETA DA ABUSIVIDADE. ENTENDIMENTO PACIFICADO PELO STJ SOB A ÉGIDE DOS RECURSOS REPETITIVOS. MÉDIAS DE MERCADO, NO CASO, NÃO ULTRAPASSADAS EM MONTA DESARRAZOADA E INJUSTIFICADA. ONEROSIDADE EXCESSIVA INDEMONSTRADA. LEGALIDADE INAFASTÁVEL. DECISÃO IMACULADA. JUROS CAPITALIZADOS. AVENTADA A ILICITUDE EM QUALQUER PERIODICIDADE. PARCIAL ACOLHIMENTO. ANATOCISMO MENSAL. TAXA ANUAL SUPERIOR AO DUODÉCUPLO DA MENSAL. PREVISÃO POR EXPRESSÃO NUMÉRICA ADMITIDA. SÚMULA N. 541 DO STJ. VALIDADE MANIFESTA. COBRANÇA AUTORIZADA. SENTENÇA ESCORREITA. CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA. INCIDÊNCIA CONDICIONADA À INDICAÇÃO DA RESPECTIVA TAXA. CIRCUNSTÂNCIA NÃO VISLUMBRADA NO CASO. AFRONTA AOS DEVERES DE INFORMAÇÃO E TRANSPARÊNCIA PLASMADOS NO CDC. ILEGALIDADE EVIDENTE. INCONFORMISMO ATENDIDO NO PONTO. TARIFA DE CADASTRO. SUSCITADA A ABUSIVIDADE DA RUBRICA. RECHAÇO. INCIDÊNCIA LEGÍTIMA QUANDO EXPRESSAMENTE CONTRATADA E EXIGIDA NO INÍCIO DA RELAÇÃO CONTRATUAL. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA N. 566 DO STJ. REQUISITOS VISLUMBRADOS. ENCARGO MANTIDO. EXIGÊNCIA, PORÉM, EM IMPORTE EXCESSIVO. ADEQUAÇÃO DEVIDA PARA O VALOR MÉDIO VEICULADO PELO BACEN AO TEMPO DA ASSINATURA. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. COMANDO SINGULAR RETOCADO. PEDIDO DE RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES COBRADOS EM EXCESSO. PARCIAL PROVIMENTO. DEVOLUÇÃO NECESSÁRIA DA QUANTIA PAGA A MAIOR, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. RESTITUIÇÃO, CONTUDO, NA FORMA SIMPLES. HIPÓTESE DE ENGANO JUSTIFICÁVEL. MÁ-FÉ INDEMONSTRADA. ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. REPETIÇÃO DO INDÉBITO A SER PROMOVIDA MEDIANTE COMPENSAÇÃO COM O SALDO DEVEDOR. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC A PARTIR DE CADA DESEMBOLSO, E DE JUROS DE MORA EM 1% AO MÊS DESDE A CITAÇÃO. APLICAÇÃO, OUTROSSIM, DA TAXA SELIC A CONTAR DE 30-8-2024, CONFORME A ALTERAÇÃO PROMOVIDA NO ART. 406, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL AO ADVENTO DA LEI N. 14.905/2024. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. ÊXITO ÍNFIMO DA FORMULAÇÃO REVISIONAL. DECAIMENTO IRRISÓRIO DA RÉ EVIDENCIADO. IMPUTAÇÃO DAS VERBAS MANTIDA EXCLUSIVAMENTE AO AUTOR. INTELECÇÃO DO ART. 86, PARÁFRAGO ÚNICO, DO CPC. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (TJSC, Apelação n. 5029028-05.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rubens Schulz, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 26-06-2025 - grifou-se). No mesmo sentido de outros Câmaras deste Tribunal de Justiça: [...] “Considerando que o valor da tarifa de cadastro estabelecido no contrato supera em muito a média apresentada pelo Bacen, conclui-se pela abusividade do montante exigido a esse título pela instituição financeira ré, de modo que o valor do referido encargo deve ser limitado ao valor médio praticado pelas instituições financeiras do mesmo segmento à época da operação." (TJSC, Apelação n. 5017560-65.2021.8.24.0008, rel. Des. Soraya Nunes Lins, j. 24-08-2023) No caso sob análise, não consta comprovação de que o valor cobrado esteja compatível com a média de mercado à época da contratação. Pelo contrário, consulta ao sítio eletrônico do Banco Central revela que o valor médio praticado para tarifa de cadastro em julho de 2022 era de aproximadamente R$ 746,47 (setecentos e quarenta e seis reais e quarenta e sete centavos) o que evidencia a disparidade frente ao montante estipulado no contrato, R$ 1.700,00 (um mil e setecentos reais). Diante disso, embora lícita a cobrança da tarifa, impõe-se reconhecer a abusividade do valor contratado, razão pela qual deve ser limitado ao valor médio praticado pelas instituições financeiras do mesmo segmento na data da contratação. No tocante à tarifa de registro, constata-se que houve a cobrança do valor de R$ 274,72 ( evento 1, CONTR3 ). Embora alegada a ausência de demonstração da prestação do serviço, verifica-se que o valor se refere ao registro do gravame da alienação fiduciária junto ao órgão de trânsito competente, providência essencial à constituição da garantia contratual e normalmente realizada por meio de empresas terceirizadas contratadas pelos agentes financeiros. A propósito, confira-se: evento 12, OUT6 . Nessa senda, havendo previsão contratual e correspondência com o serviço prestado, não há falar em ilegalidade ou devolução dos valores, especialmente quando o encargo guarda correspondência com os custos efetivos da diligência e não se evidencia cobrança duplicada ou desproporcional. Assim, mantém-se a sentença quanto à legalidade da cobrança da tarifa de registro, enquanto se impõe a redução da tarifa de cadastro para R$ 746,47, conforme média de mercado praticada à época da contratação. Seguro Prestamista Acerca do seguro de proteção financeira, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento segundo o qual, nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada (Tema 972). A respeito do tema: RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 972/STJ. DIREITO BANCÁRIO. DESPESA DE PRÉ-GRAVAME. VALIDADE NOS CONTRATOS CELEBRADOS ATÉ 25/02/2011. SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. VENDA CASADA. RESTRIÇÃO À ESCOLHA DA SEGURADORA. ANALOGIA COM O ENTENDIMENTO DA SÚMULA 473/STJ. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. NÃO OCORRÊNCIA. ENCARGOS ACESSÓRIOS. 1. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA: Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito dasrelações de consumo. 2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 2.1 - Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da despesa com o registro do pré-gravame, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula pactuada no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva. 2.2 - Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada . 2.3 - A abusividade de encargos acessórios do contrato não descaracteriza a mora. 3. CASO CONCRETO. 3.1. Aplicação da tese 2.3 ao caso concreto, mantendo-se a procedência da ação de reintegração de posse do bem arrendado. 4. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO (Recurso Especial n. 1.639.320/SP, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. em 12-12-2018, grifou-se). No contrato em questão houve a contratação do seguro prestamista no valor de R$ 594,82 (quinhentos e noventa e quatro reais e oitenta e dois centavos) ( evento 1, CONTR3 ). Todavia, constata-se que o consumidor não teve assegurada a liberdade de escolha quanto à seguradora responsável pela apólice. Ao contrário, foi direcionado a contratar com a empresa previamente indicada pela instituição financeira, sem qualquer alternativa real de escolha ou possibilidade de negociação. A propósito, confira-se: evento 12, OUT5 . Tal conduta revela uma prática comercial abusiva, pois restringe a autonomia do contratante e impõe uma condição que, embora disfarçada de facultativa, se apresenta como obrigatória na prática. A ausência de liberdade na escolha da seguradora descaracteriza a voluntariedade da contratação e compromete a validade do seguro prestamista. A imposição velada de um serviço adicional, atrelado à concessão do crédito, configura uma forma de venda casada, prática vedada no ordenamento jurídico por afrontar os princípios da transparência, da boa-fé e da livre concorrência. Nesse sentido, destaca-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CRÉDITO DIRETO AO CONSUMIDOR (CDC) - VEÍCULOS. PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. [...] RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA SEGURO PRESTAMISTA. DEFENDIDA LEGALIDADE. INSUBSISTÊNCIA. CLÁUSULA CONTRATUAL COM EXPRESSA PACTUAÇÃO DA RUBRICA. AUSÊNCIA, TODAVIA, DE POSSIBILIDADE DE ESCOLHA DA SEGURADORA PELO CONSUMIDOR. DIREITO DE INFORMAÇÃO E DE LIBERDADE CONTRATUAL NÃO OBSERVADOS. VENDA CASADA. PRÁTICA VEDADA. ART. 39, I, DO CÓDIGO CONSUMERISTA. TESE FIXADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO (RESP N. 1639320/SP - TEMA 972). COBRANÇA INDEVIDA. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. AVENTADO DECAIMENTO MÍNIMO. PRETENDIDA REDISTRIBUIÇÃO INTEGRAL EM DESFAVOR DA PARTE AUTORA. INSUBSISTÊNCIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA EVIDENCIADA. EXEGESE DO ART. 86, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REPARTIÇÃO OPERADA NA ORIGEM EM CONSONÂNCIA COM A PROPORÇÃO DE ÊXITO OU REVÉS DE CADA LITIGANTE. HONORÁRIOS RECURSAIS FIXADOS, EIS QUE PREENCHIDOS OS REQUISITOS CUMULATIVOS DEFINIDOS PELO STJ (TEMA 1059). EXIGIBILIDADE SUSPENSA À PARTE AUTORA ANTE A GRATUIDADE JUDICIÁRIA. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS (TJSC, Apelação n. 5003943-49.2024.8.24.0035, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Mohr, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 03-07-2025 - grifou-se). Outrossim, desta relatoria: TJSC, Apelação n. 5045316-28.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Altamiro de Oliveira, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 25-09-2024. Além disso, a forma como o seguro foi inserido no contrato revela uma assimetria informacional que prejudica o consumidor, parte vulnerável da relação. Não há nos autos qualquer demonstração de que foram prestadas informações claras, adequadas e suficientes sobre a natureza do seguro, seus custos, benefícios e, principalmente, sobre a possibilidade de escolha entre diferentes seguradoras. Dessa forma, resta evidente que a contratação do seguro prestamista, nos moldes em que foi realizada, não observou os requisitos mínimos de legalidade e transparência exigidos nas relações de consumo, devendo, portanto, ser afastada a exigência do encargo. Descaracterização da mora Em relação aos efeitos da mora, sabe-se que, de acordo com o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.061.530/RS, opera-se a descaracterização da mora nos casos de reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual e, uma vez constatada, impede-se a inscrição ou manutenção do nome do devedor em cadastros de órgãos de proteção ao crédito. Veja-se: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. [...] I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. [...] ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora; b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual. [...] ORIENTAÇÃO 4 - INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES a) A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz; b) A inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de inadimplentes decidida na sentença ou no acórdão observará o que for decidido no mérito do processo. Caracterizada a mora, correta a inscrição/manutenção [...] (REsp n. 1.061.530/RS, rela. Mina. Nancy Andrighi, j. em 22-10-2008). Outrossim, no mesmo sentido, confira-se: TJSC, Apelação n. 5045316-28.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Altamiro de Oliveira, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 25-09-2024. Dito isso, a taxa de juros remuneratórios foi limitada à média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil, de modo que necessário descaracterizar a mora, impedir a inscrição ou manutenção do nome do autora/apelante nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito. Repetição do indébito Sabe-se que se for apurado pagamento a mais, opera-se a restituição na forma simples ou compensação em favor do consumidor, independentemente da prova do erro. A propósito, colhe-se julgado desta Corte: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. CRÉDITO PESSOAL CONSIGNADO PARA TRABALHADORES DO SETOR PÚBLICO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. [...] REPETIÇÃO DO INDÉBITO OU COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. DIREITO DO CONSUMIDOR (ART. 42 DO CDC). HIPÓTESE EM QUE HOUVE MODIFICAÇÃO CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DE PROVAS DE QUE A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA TERIA AGIDO DE MÁ-FÉ. RESTITUIÇÃO OU COMPENSAÇÃO PERMITIDA NA FORMA SIMPLES . CORREÇÃO PELO INPC DESDE A DATA DE CADA PAGAMENTO INDEVIDO E COM APLICAÇÃO DE JUROS MORATÓRIOS DE 1% AO MÊS, A CONTAR DA CITAÇÃO.[...] (Apelação Cível n. 5078651-38.2023.8.24.0930, rel.. Des. Newton Varella Júnior, j. em 29-2-2024, grifou-se). Outrossim: APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. RECURSO DA CASA BANCÁRIA RÉ. ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. OBSERVÂNCIA DAS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO (SITUAÇÃO DA ECONOMIA À ÉPOCA, GARANTIAS OFERECIDAS, PERFIL DO CONTRATANTE E RISCOS DA OPERAÇÃO). TAXA MÉDIA DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL (BACEN) QUE SERVE APENAS COMO CRITÉRIO ÚTIL DE AFERIÇÃO. TODAVIA, CASO CONCRETO EM QUE A TAXA PRATICADA FOI MUITO SUPERIOR À MÉDIA DO MÊS DE PACTUAÇÃO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE DEMONSTRAR O RESULTADO DA ANÁLISE DE PERFIL DO MUTUÁRIO, DE MODO A JUSTIFICAR A ALÍQUOTA. ENCARGO ABUSIVO. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE APLICAÇÃO DA MÉDIA MERCADOLÓGICA ACRESCIDA DE UMA VEZ E MEIA QUE SE MOSTRA INADEQUADO. REJEIÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DA AUTORA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. DESCABIMENTO. AINDA QUE PRESENTE ENCARGO ABUSIVO, MÁ-FÉ CONTRATUAL INDEMONSTRADA. REPETIÇÃO NA FORMA SIMPLES. REJEIÇÃO. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. SENTENÇA QUE ARBITROU A VERBA COM BASE NO VALOR DA CAUSA. MONTANTE INDICADO NA INICIAL MUITO BAIXO. PARÂMETRO QUE NÃO PODE SER UTILIZADO. VERBA QUE DEVE SER FIXADA POR EQUIDADE. TABELA DA OAB. APLICABILIDADE NÃO OBRIGATÓRIA. ABRITRAMENTO DE ACORDO COM O VALOR USUALMENTE PRATICADO POR ESTA CORTE. PLEITO RECURSAL ACOLHIDO PARCIALMENTE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. HIPÓTESE QUE NÃO AUTORIZA A MAJORAÇÃO PREVISTA NO ART. 85, § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS FIXADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO DA PARTE RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. (TJSC, Apelação n. 5074645-85.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Silvio Franco, Primeira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 24-10-2024 - grifou-se). Em tempo, impende ainda consignar que, "inviável a repetição dobrada, haja vista que inexiste conduta contrária à boa-fé objetiva na celebração de um contrato de mútuo mesmo que com juros muito superiores à taxa média, porquanto assim pactuados em decorrência de uma série de peculiaridades, conforme anotou a instituição financeira nos autos" (TJSC, Apelação n. 5005540-82.2022.8.24.0048, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Zanelato, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 27-06-2024). Por corolário, diante da abusividade constatada, necessária a devolução ou compensação dos valores porventura pagos a mais, na modalidade simples. Tal montante, por oportuno, assevera-se que deve ser acrescido de correção monetária pelo INPC até 29.08.2024 e pelo IPCA a partir de então, a contar de cada pagamento indevido, bem como de juros de mora, a partir da citação de 1% ao mês até 29/08/2024, aplicando-se os termos da Lei n. 14.905/24 (Taxa Selic, deduzido o IPCA) a partir de então. Sobre o assunto, confira-se: AC n. 50974365320238240023, Des. Rel. João Marcos Buch. j. 08.10.2024. Conclusão Fortes nesses fundamentos, impõe-se a reforma da sentença para julgar parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos termos delineados ao longo desta manifestação. Ônus da sucumbência Considerando o parcial provimento do recurso, nos termos do parágrafo único do art. 86 do Código de Processo Civil, impõe-se a inversão dos ônus sucumbenciais, de modo que a instituição financeira demandada arque integralmente com as custas processuais e os honorários advocatícios sucumbenciais. Quanto à verba honorária, dispõe o art. 85, § 2º, do CPC/2015, que: "Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. [...] § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço." À luz desses critérios, especialmente o grau de zelo profissional, o tempo de tramitação da demanda, a relevância da matéria discutida e o local da prestação do serviço, arbitra-se os honorários advocatícios sucumbenciais em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da causa, em favor do patrono da parte autora. Honorários recursais Por fim, ante o provimento parcial do recurso, inviável a fixação dos honorários advocatícios recursais, nos termos do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.864.633/RS (Tema 1.059): RECURSO ESPECIAL REPETITIVO - DIREITO PROCESSUAL CIVIL - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS - ART. 85, § 11, DO CPC - MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA EM GRAU RECURSAL - IMPOSSIBILIDADE EM CASO DE PROVIMENTO PARCIAL OU TOTAL DO RECURSO, AINDA QUE MÍNIMA A ALTERAÇÃO DO RESULTADO DO JULGAMENTO - FIXAÇÃO DE TESE JURÍDICA DE EFICÁCIA VINCULANTE - SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO: PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL. [...] 5. Tese jurídica de eficácia vinculante, sintetizadora da ratio decidendi do julgado paradigmático: " A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento e limitada a consectários da condenação. " [...] (Resp n. 1.864.633/RS, rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, j. em 9-11-23, grifou-se). Assim, deixa-se de fixar honorários recursais na espécie. Dispositivo Ante o exposto, voto por conhecer do recurso e conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para: a) limitar a taxa de juros remuneratórios incidente no contrato sub judice à média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil para operações da mesma natureza e prazo; b) limitar a cobrança da tarifa de cadastro ao valor de R$ 746,47 (setecentos e quarenta e seis reais e quarenta e sete centavos); c) afastar a cobrança do seguro prestamista; d) determinar a restituição, na forma simples, dos valores pagos a maior, mediante compensação com eventual saldo devedor, acrescidos de correção monetária desde cada desembolso indevido e juros de mora a partir da citação, nos termos da fundamentação; e) inverter os ônus da sucumbência, condenando a instituição financeira demandada ao pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais, estes arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da causa.

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