Processo nº 5000740-85.2022.8.08.0038
ID: 292749238
Tribunal: TJES
Órgão: Vice-Presidência do Tribunal de Justiça
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5000740-85.2022.8.08.0038
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VICTOR CERQUEIRA ASSAD
OAB/ES XXXXXX
Desbloquear
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO VICE-PRESIDÊNCIA RECURSO ESPECIAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000740-85.2022.8.08.0038 RECORRENTE: MUNICIPIO DE NOVA VENÉCIA RECORRIDO: …
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO VICE-PRESIDÊNCIA RECURSO ESPECIAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000740-85.2022.8.08.0038 RECORRENTE: MUNICIPIO DE NOVA VENÉCIA RECORRIDO: IKK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO LTDA ADVOGADO: VICTOR CERQUEIRA ASSAD - OAB ES16776-A DECISÃO MUNICIPIO DE NOVA VENÉCIA interpôs RECURSO ESPECIAL (id. 10620639), com fulcro no artigo 105, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, contra ACÓRDÃO (id. 7681212 integrado por 9552115) proferida pela Egrégia Segunda Câmara Cível que negou provimento ao RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL, interposto pelo Recorrente em face de SENTENÇA, proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível de Nova Venécia-ES, nos autos dos EMBARGOS DE TERCEIROS, opostos pelo Recorrente em face de IKK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO LTDA, cujo decisum julgou improcedentes os pedidos iniciais. O referido Acórdão restou assim ementado, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO. DOAÇÃO DE BEM PÚBLICO COM CLÁUSULA DE REVERSÃO. IMPENHORABILIDADE AFASTADA. INEXECUÇÃO DO ENCARGO NÃO COMPROVADA. TRANSCURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL PARA REAVER O BEM. PRAZO DE 10 ANOS. ARTIGO 205 DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Aplica-se o prazo prescricional geral do Código Civil – 10 anos – para a revogação de doação por inexecução de encargo. 2. A revogação de doação por inexecução do encargo só é possível quando houver caracterização nos autos do alegado descumprimento de obrigação. 3. Após mais de 25 (vinte e cinco) anos sem notícias do descumprimento dos requisitos para manutenção da doação, nem tampouco de que o ente público tenha adotado procedimento para retomada do bem, tem-se que a cláusula de reversão exauriu seus efeitos, restando afastada a impenhorabilidade do bem, diante do transcurso do prazo prescricional para revogação da doação em exame. 4. Recurso conhecido e desprovido. (TJES. APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000740-85.2022.8.08.0038. SEGUNDA CÂMARA CÍVEL. Relator (a): Des. RAPHAEL AMERICANO CAMARA. Julgado em 15/03/2024). Opostos aclaratórios, os quais foram desprovidos, conforme id. 9552115. Irresignado, aduz o Recorrente violação aos artigos 101, 102 e 205, do Código Civil, violação ao artigo 17, inciso I, da Lei n° 8.666/93, sob o fundamento de que “o ente público municipal não se manteve inerte conforme outrora alegado no v. Acórdão, vez que constantemente adotou medidas administrativas no intuito de dar continuidade ao Termo de Doação com a empresa donatária. (...) da interpretação sistemática dos dispositivos constitucionais destacados acima, temos que não se aplica o instituto da prescrição in casu. Dito isso, temos que o v. Acórdão, ao estipular o prazo prescricional geral de 10 (dez) anos afrontou as normas do Código Civil acima citadas e também o disposto nos artigos 37, §5º e 183, §3º da Constituição Federal. (...) Ainda, admitir a aplicação da prescrição nos imóveis em destaque configura burla ao artigo 17, I, da Lei nº 8.666/1993, vigente à época, posto que houve alienação de bem imóvel sem cumprimento dos requisitos legais. Ou seja, houve a alienação dos imóveis para particular de forma a fraudar procedimento licitatório para tanto, decisão deste eg. TJES que, respeitosamente, vulnera os bens públicos e os expõe à alienações fraudulentas, na medida em que é possível vislumbrar uma empresa que se endivida totalmente com outra e, após, coloca como garantia o imóvel público, passando para esta. Isto é uma hipótese de alienação indireta do imóvel, que não pode ocorrer!”. Devidamente intimado, o Recorrido apresentou Contrarrazões no id. 12262285. Nesse contexto, insta trazer à baila os termos do Voto Condutor do Aresto hostilizado, verbo ad verbum: “I - DA PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE ALEGADA PELA IKK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO LTDA EM CONTRARRAZÕES: Aduz a parte recorrida, IKK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO LTDA, em contrarrazões, que a apelação interposta pela EDP MUNICÍPIO DE NOVA VENÉCIA/ES carece de dialeticidade, por tratar-se de recurso no qual não houve impugnação dos fundamentos efetivamente apresentados no édito sentencial. Todavia, entendo que a preliminar não prospera, uma vez que o recurso apresentado está devidamente embasado, com demonstração da sua inconformidade em relação à sentença, indicando de modo suficiente os motivos pelos quais requer reforma da decisão objurgada. Sob tal aspecto, convém mencionar que o fato das razões de apelação não se reportarem aos exatos termos utilizados pelo julgador sentenciante para analisar a demanda não configura ausência de dialeticidade, uma vez que as razões apresentadas se comunicam diretamente com o sentido do decisum. Da mesma forma, o fato de o recurso reproduzir os argumentos que já foram apresentados na petição inicial não tem o condão de atrair ofensa ao princípio da dialeticidade recursal. Nesse sentido: […] I Considera-se que a preliminar de falta de dialeticidade não prospera, porquanto o recurso apresentado pelo Apelante está perfeitamente embasado, demonstrando sua inconformidade com a sentença e, inclusive, indicando os motivos de fato e de direito pelos quais requer a reforma da decisão hostilizada, não havendo que se falar na falta de dialeticidade quando a parte se reporta aos fundamentos contidos na petição inicial ou na peça de defesa. (TJES, Classe: Apelação Cível, 038170027122, Relator: JORGE DO NASCIMENTO VIANA, Órgão julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 08/02/2022, Data da Publicação no Diário: 23/02/2022) […] 2. Preliminar: Ausência de dialeticidade recursal. Recurso está devidamente embasado, com demonstração da sua inconformidade em relação à sentença. O fato da apelação se reportar a fundamentos contidos nas demais peças processuais não evidencia ausência de dialeticidade. Preliminar rejeitada. […] (TJES; AC 0001456-38.2016.8.08.0062; Segunda Câmara Cível; Rel. Des. Raphael Americano Câmara; Julg. 28/06/2022; DJES 07/07/2022) Isto posto, considerando que as razões recursais do apelante demonstram suficientemente sua irresignação com a sentença, REJEITO A PRELIMINAR suscitada pela IKK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO LTDA. II - MÉRITO Conforme relatado, tratam os autos de apelação cível interposta pelo MUNICÍPIO DE NOVA VENÉCIA/ES contra a sentença proferida pelo Juízo de Direito da 2ª Vara Cível de Nova Venécia/ES, que em EMBARGOS DE TERCEIRO, ajuizados em face de IKK DO BRASIL INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA, julgou improcedentes os pedidos autorais. Em suas razões recursais (ID 5822346), o MUNICÍPIO DE NOVA VENÉCIA/ES argumenta pela impenhorabilidade de imóvel doado pelo ente público gravado com cláusula de reversibilidade e encargos, o que faz com que o bem não possa ser objeto de constrição, ainda que não tenha sido oficialmente revertido ao patrimônio do ente doador. Em contrarrazões (ID 5822349), IKK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO LTDA almeja o não conhecimento do recurso, por ausência de dialeticidade e, no mérito, a manutenção da sentença. Pois bem. Em síntese, o MUNICÍPIO DE NOVA VENÉCIA/ES ajuizou a presente demanda (embargos de terceiro) em virtude da indisponibilidade de bem determinada na demanda de número 000690-04.2009.8.08.0038, proposta por IKK DO BRASIL INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA em desfavor de OVERGRAN GRANITOS LTDA. Isso porque, o bem objeto da controvérsia teria sido doado pelo ente público ao então executado (OVERGRAN GRANITOS LTDA) com cláusula de reversão e alienação condicionada à autorização do doador, motivo pelo qual entende que este seria impenhorável. Assim, tem-se como ponto controverso estabelecer se, no caso concreto, o bem doado pelo ente municipal com cláusula de reversão permanece impenhorável. Primeiramente, reputo relevante ressaltar que a doação do lote, por parte do MUNICÍPIO DE NOVA VENÉCIA/ES à empresa OVERGRAN GRANITOS LTDA, se deu ainda em 21/06/1995 (ID 5822214), com previsão da condição de que, no prazo de 6 (seis) meses, a donatária deveria iniciar sua instalação no imóvel, em observância do projeto e cronograma de execução, sob pena de reversão do bem ao patrimônio da doadora. Ao longo dos anos, foram efetuadas diversas hipotecas sobre o bem (ID 5822214), sem que haja indicativo de que o ente público tenha se insurgido anteriormente em face de tais medidas. Ato seguinte, em datas mais recentes, foram estabelecidas ordens de indisponibilidade do referido bem (ID 5822214 - processos 0003870-91.2010.8.08.0038 e 004980-62.2019.8.08.0038), sem que exista notícia de providências tomadas pelo ente público. Ato seguinte, uma última indisponibilidade, antes da penhora, foi ordenada nos autos do processo 00006900-04.2009.8.08.0038, já no ano de 2020, e, em 21/03/2022, o MUNICÍPIO DE NOVA VENÉCIA/ES ajuizou a presente demanda para tentar afastar a constrição do imóvel. Neste ponto, convém mencionar que há registro (ID 5822215) de que, em 08/09/1999, foi construído pela donatária (OVERGRAN GRANITOS LTDA) “um galpão industrial com estrutura metálica sobre alicerces de pedras, alvenaria de lajotas, piso de cimento liso, medindo 231,00m²” no imóvel objeto da doação, o que enfraquece a tese recursal, notadamente quando a reversibilidade da doação estava condicionada ao descumprimento do encargo. Ora, como se sabe, o bem doado por ente municipal perde as características típicas dos bens públicos, todavia, a cláusula de reversão mantém a impenhorabilidade do imóvel, diante da possibilidade de haver o retorno do lote à Administração Pública. Ocorre que, a jurisprudência pátria tem se posicionado no sentido de que a cláusula de reversão não possui caráter perpétuo, isto é, existe um prazo máximo para que o ente público doador possa efetivar o direito potestativo de reversão. A esse respeito, colaciono os seguintes julgados, que indicam o prazo prescricional previsto no artigo 205 do Código Civil como o aplicável para situações como as ora em exame, sob pena de eternizar a possibilidade do ente público reaver o bem doado: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DO OURO. Doação de bem imóvel. Revogação por descumprimento de encargo. Prescrição averiguada. - conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, aplica-se o prazo prescricional geral do Código Civil - 10 anos - para a revogação de doação por inexecução de encargo. - pedido de revogação da doação de imóvel ajuizada mais de dez anos após o DAER deixar de utilizar a área para sua capatazia. Ausência de causa interruptiva da prescrição, já que nos feitos administrativos não houve ato inequívoco importando em reconhecimento do direito pelo devedor. Prescrição averiguada. Deram provimento à apelação. (TJRS; AC 5001706-12.2022.8.21.0127; São José do Ouro; Terceira Câmara Cível; Relª Desª Matilde Chabar Maia; Julg. 24/08/2023; DJERS 31/08/2023) [...] 1. O prazo prescricional para a revogação da doação por ente público diante da inexecução do encargo pelo donatário é decenal, nos termos do art. 205 do CC, aplicável à espécie, não incidindo, portanto, o prazo anual da revogação de doação por ingratidão. [...] (TJGO; RN 5015438-77.2019.8.09.0134; Quarta Câmara Cível; Rel. Des. Carlos Escher; Julg. 19/11/2021; DJEGO 25/11/2021; Pág. 3041) [...] IMÓVEL DOADO POR ENTE PÚBLICO COM CLÁUSULA DE REVERSÃO. PENHORA. 1. Tendo se passado quase 10 anos do Termo de Compromisso firmado sem que haja notícias do descumprimento dos requisitos, nem tampouco de que o Município tenha adotado procedimentos durante esse tempo para a retomada do bem, compreende-se que a cláusula de reversão já exauriu seus efeitos. 2. Assim, prevalece a conclusão de que a empresa ré se desincumbiu dos encargos que lhe cabiam para a propriedade plena do imóvel objeto da doação. 3. Agravo de petição não provido. (TRT 24ª R.; AP 0024082-56.2018.5.24.0007; Segunda Turma; Rel. Des. João Marcelo Balsanelli; Julg. 02/05/2022; DEJTMS 02/05/2022; Pág. 502) AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REVERSÃO DE BEM IMÓVEL. REVOGAÇÃO DA DOAÇÃO DE TERRENO PÚBLICO POR INEXECUÇÃO DO ENCARGO. PRAZO PRESCRICIONAL. MARCO INICIAL. CIÊNCIA DA LESÃO OU VIOLAÇÃO DO DIREITO. O prazo prescricional para a revogação da doação de terreno público por inexecução do encargo é regulado pelo Código Civil. Ou seja, de 20 anos, considerando o CC/1916 (art. 177); de 10 anos, tendo por base o CC/2002 (art. 205). [...] (TJMG; AI 2114209-42.2022.8.13.0000; Sétima Câmara Cível; Rel. Juiz Conv. Magid Nauef Láuar; Julg. 30/08/2023; DJEMG 04/09/2023) Aplicando tal entendimento ao caso concreto, verifica-se que, como a doação se deu ainda no ano de 1995, não se afigura razoável permitir que, após mais de 25 (vinte e cinco) anos sem exercício da cláusula de reversão, o Município pretenda fazê-lo nesse momento, sem sequer indicar a necessária inexecução do encargo. Em qualquer caso, a inexistência de registro de que tenha havido o descumprimento efetivo do encargo já seria suficiente para inviabilizar a pretensão do recorrente. Isso porque, a jurisprudência é clara ao indicar que a revogação de doação por inexecução do encargo só é possível quando houver caracterização nos autos do alegado descumprimento de obrigação: APELAÇÃO CÍVEL. PROCEDIMENTO COMUM. REVOGAÇÃO DE DOAÇÃO ONEROSA DE BEM PARTICULAR A MUNICÍPIO. DESCUMPRIMENTO DO ENCARGO. PRESCRIÇÃO. [...] 2. Encargo consistente em construção de estações elevatória e de tratamento de esgoto nos lotes doados. Inexecução bem caracterizada nos autos, diante de alterações de projeto que tornaram desnecessário o uso dos referidos lotes. Revogação que se impõe em ordem a restaurar o patrimônio do doador, evitando-se o enriquecimento injusto. Precedentes desta Corte e desta Câmara. Sentença reformada. RECURSO PROVIDO. (TJSP; AC 1004337-26.2022.8.26.0428; Ac. 16955831; Paulínia; Décima Primeira Câmara de Direito Público; Rel. Des. Márcio Kammer de Lima; Julg. 19/07/2023; DJESP 24/07/2023; Pág. 2514) [...] A doação pode ser revogada por ingratidão ou por inexecução do encargo, nos termos do art. 555 do Código Civil. Correta a sentença que dá pela revogação da doação e reversão do bem ao município de dois irmãos. [...] (TJRS; AC 5000223-34.2015.8.21.0145; Dois Irmãos; Vigésima Primeira Câmara Cível; Rel. Des. Marco Aurélio Heinz; Julg. 18/05/2022; DJERS 25/05/2022) [...] 6. Dessarte, ante a inexecução do encargo posto, correta a sentença que deferiu os pedidos de revogação da doação e de reincorporação do bem doado ao patrimônio do autor, em consonância com os arts. 553 e 555, ambos do Código Civil de 2002. 7. Remessa ex officio conhecida e desprovida. Sentença mantida. (TJCE; RN 0163339-13.2011.8.06.0001; Segunda Câmara de Direito Público; Rel. Des. Luiz Evaldo Gonçalves Leite; DJCE 06/09/2021; Pág. 54) No caso, reitero, a doação se deu em 1995, com previsão do prazo de 06 (seis) meses para início das obras, o que, ao que tudo indica (documento de ID 5822215), fora cumprido pela donatária. Ainda que assim não fosse, houve o transcurso do prazo prescricional para exercício da pretensão de revogação da doação, diante do fato da demanda ter sido ajuizada apenas em 21/03/2022 (ID 5822212). Senão, vejamos: BEM PÚBLICO. REVOGAÇÃO DE DOAÇÃO COM ENCARGO. PRESCRIÇÃO. Doação com a finalidade de construção, instalação e funcionamento de estabelecimento industrial, no prazo de um ano, a partir de dezembro de 1996. Não cumprimento dos encargos. Termo inicial do prazo prescricional em janeiro de 2003 (data de início da vigência do Código Civil de 2002. Arts. 205 e 2.028 do CC/02. Ação ajuizada janeiro de 2021. Prescrição configurada. RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; AC 1000706-20.2021.8.26.0037; Ac. 16292096; Araraquara; Sexta Câmara de Direito Público; Rel. Des. Alves Braga Junior; Julg. 30/11/2022; DJESP 05/12/2022; Pág. 2817) Em suma, após tamanho lapso temporal sem notícias do descumprimento dos requisitos para manutenção da doação, nem tampouco de que o ente público tenha adotado procedimento para eventual retomada do bem, entendo que a cláusula de reversão já exauriu seus efeitos, prevalecendo a conclusão sentencial no sentido que resta afastada a impenhorabilidade do bem, diante do transcurso do prazo prescricional para revogação da doação em exame. Em face do exposto, CONHEÇO do recurso de apelação interposto pelo MUNICÍPIO DE NOVA VENÉCIA/ES para NEGAR-LHE PROVIMENTO. Tendo em vista o não provimento do recurso, fixo os honorários recursais em 1% (dois por cento) sobre o valor da causa (art. 85, §11º, CPC). É como voto.”. Com efeito, verifica-se que o entendimento adotado pelo Acórdão objurgado encontra-se em consonância com a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, in litteris: EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATÓRIA DE DOAÇÃO ONEROSA DE IMÓVEL PÚBLICO C/C CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO. REGIME JURÍDICO DA PRESCRIÇÃO. 1. A Municipalidade ajuizou "ação de reversão da doação condicionada de imóvel público", contra a Associação Médica de Goiás, objetivando anular a transferência de terreno público, ao argumento de que a recorrida não cumpriu com o encargo que lhe fora atribuído (construção de imóvel edificado no terreno). 2. O Tribunal de origem decretou a prescrição, ao fundamento de que a doação foi realizada por meio da Lei Municipal 382, de 19 de junho de 1981, consumando-se a prescrição vintenária em 19 de junho de 2001 (a demanda foi ajuizada em 15 de dezembro de 2012). 3. "Se a lei diz que a doação resolve-se de pleno direito, caso o imóvel não seja utilizado para os fins que justificaram a alienação, é defeso ao donatário inadimplente invocar as regras do art. 178 do Código Civil para alegar prescrição da ação" (REsp 56.612/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, DJ 6/3/1995, p. 4325). 4. Na Segunda Turma do STJ, em julgados mais recentes, adota-se o entendimento de incidência da prescrição, regida pelo Código Civil, e não pelo Decreto 20.910/1932. No julgamento do REsp 1.565.239/MG (Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe de 19/12/2017), por exemplo, a Segunda Turma do STJ afastou a tese de que a data da celebração da doação corresponde necessariamente ao termo inicial da prescrição, pois o Código Civil de 1916 (art. 128) e o de 2002 (art. 136) preveem a possibilidade de a imposição do ônus ao donatário gerar efeito suspensivo do direito. 5. Para a decretação da prescrição, como se vê, não basta averiguar o transcurso de prazo entre a data da doação e a data de ajuizamento da Ação de Reversão, sendo imprescindível que o Tribunal de origem verifique se a lei que viabilizou a doação condicional incluía previsão a respeito da desconstituição automática, caso não cumprido o encargo. 6. À luz dos precedentes acima, entende-se que, nos termos do art. 67 do CC/1916, se houver previsão - na lei que disciplina a doação - de reversão automática, esta opera-se ope legis e, assim, descabe a exceção de prescrição na demanda que judicializa a questão. Inexistindo previsão no sentido acima descrito, a prescrição será regida pelo Código Civil, devendo apurar-se o termo inicial à luz da actio nata. 7. Afastada a premissa utilizada para o julgamento da Apelação nas instâncias de origem, devem os autos retornar para que a análise a respeito da prescrição observe os parâmetros acima estabelecidos, bem como para que, em sendo o caso, se examinem os demais fundamentos veiculados na Apelação e nas contrarrazões respectivas. 8. Recurso Especial provido. (STJ: REsp n. 1.796.417/GO, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 14/5/2024, DJe de 4/6/2024.) Por conseguinte, em razão da aludida circunstância, incide no caso em tela a Súmula nº 83, do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida”, cujo teor “aplica-se, inclusive, aos recursos especiais interpostos com fundamento na alínea a do permissivo constitucional” (STJ, AgInt no AREsp 1484037/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2019, DJe 09/12/2019). Isto posto, com fulcro no artigo 1.030, inciso V, do Código de Processo Civil, inadmito o recurso. Diligencie-se. Após, retornem os autos conclusos. NAMYR CARLOS DE SOUZA FILHO DESEMBARGADOR VICE-PRESIDENTE DO TJES RECURSO EXTRAORDINÁRIO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000740-85.2022.8.08.0038 RECORRENTE: MUNICIPIO DE NOVA VENÉCIA RECORRIDO: IKK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO LTDA ADVOGADO: VICTOR CERQUEIRA ASSAD - OAB ES16776-A DECISÃO MUNICIPIO DE NOVA VENÉCIA interpôs RECURSO EXTRAORDINÁRIO (id. 10620672), com fulcro no artigo 102, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, contra ACÓRDÃO (id. 7681212 integrado por 9552115) proferida pela Egrégia Segunda Câmara Cível que negou provimento ao RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL, interposto pelo Recorrente em face de SENTENÇA, proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível de Nova Venécia-ES, nos autos dos EMBARGOS DE TERCEIROS, opostos pelo Recorrente em face de IKK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO LTDA, cujo decisum julgou improcedentes os pedidos iniciais. O referido Acórdão restou assim ementado, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO. DOAÇÃO DE BEM PÚBLICO COM CLÁUSULA DE REVERSÃO. IMPENHORABILIDADE AFASTADA. INEXECUÇÃO DO ENCARGO NÃO COMPROVADA. TRANSCURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL PARA REAVER O BEM. PRAZO DE 10 ANOS. ARTIGO 205 DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Aplica-se o prazo prescricional geral do Código Civil – 10 anos – para a revogação de doação por inexecução de encargo. 2. A revogação de doação por inexecução do encargo só é possível quando houver caracterização nos autos do alegado descumprimento de obrigação. 3. Após mais de 25 (vinte e cinco) anos sem notícias do descumprimento dos requisitos para manutenção da doação, nem tampouco de que o ente público tenha adotado procedimento para retomada do bem, tem-se que a cláusula de reversão exauriu seus efeitos, restando afastada a impenhorabilidade do bem, diante do transcurso do prazo prescricional para revogação da doação em exame. 4. Recurso conhecido e desprovido. (TJES. APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000740-85.2022.8.08.0038. SEGUNDA CÂMARA CÍVEL. Relator (a): Des. RAPHAEL AMERICANO CAMARA. Julgado em 15/03/2024). Opostos aclaratórios, os quais foram desprovidos, conforme id. 9552115. Irresignado, aduz o Recorrente violação aos artigos 37, §5°, 183, §3°, e 191, da Constituição Federal, sob o fundamento de que “da interpretação sistemática dos dispositivos constitucionais destacados acima, temos que não se aplica o instituto da prescrição in casu. É certo que os bens públicos gozam de imprescritibilidade, tal como destacado nos artigos 101 e 102 do Código Civil, não podendo se aplicar regra prescritiva do artigo 205. A imprescritibilidade dos bens públicos tem como finalidade assegurar proteção especial a esta espécie de bens, justificada pelo interesse público. A jurisprudência pátria afirma que o bem público é função social em si mesmo. Assim, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo e o Superior Tribunal de Justiça já se manifestaram acerca do tema, destacando, dentre outros, a ausência de prescrição nas demandas que versem sobre doação de bem público com encargos. Dito isso, temos que o v. Acórdão, ao estipular o prazo prescricional geral de 10 (dez) anos afrontou as normas do Código Civil acima citadas e também o disposto nos artigos 37, §5º e 183, §3º da Constituição Federal. O prazo prescricional geral disposto no art. 2051 do Código Civil se aplica aos casos em onde a lei não haja fixado prazo menor. Devidamente intimado, o Recorrido apresentou Contrarrazões no id. 12262285. Com efeito, o Apelo Extremo não comporta admissibilidade, haja vista a irresignação evidenciar a necessidade de se perquirir, primeiramente, suposta afronta a dispositivo infraconstitucional, notadamente os artigos 101, 102 e 205, do Código Civil, o artigo 17, inciso I, da Lei n° 8.666/93, para, a partir daí, aferir eventual ofensa reflexa à Constituição Federal, inclusive tais dispositivos também foram objeto de Recurso Especial. Dessa forma, incide a Súmula nº 280, do Excelso Supremo Tribunal Federal, dispondo que “por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário”. Nesse sentido: “EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. REVISÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5º, LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. EVENTUAL VIOLAÇÃO REFLEXA DA CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA NÃO VIABILIZA O RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A controvérsia, conforme já asseverado na decisão guerreada, não alcança estatura constitucional. Não há falar em afronta aos preceitos constitucionais indicados nas razões recursais. Compreensão diversa demandaria a análise da legislação infraconstitucional encampada na decisão da Corte de origem, a tornar oblíqua e reflexa eventual ofensa à Constituição, insuscetível, como tal, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. Desatendida a exigência do art. 102, III, a, da Lei Maior, nos termos da jurisprudência desta Suprema Corte. 2. As razões do agravo não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 3. A teor do art. 85, § 11, do CPC, o “tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento”. 4. Agravo interno conhecido e não provido”. (STF, ARE 1395277AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Tribunal Pleno, DJe 16.02.2023) Isto posto, com fulcro no artigo 1.030, inciso V, do Código de Processo Civil, inadmito o recurso. Intimem-se as partes. Publique-se na íntegra. Transcorrido e certificado o trânsito em julgado, proceda-se à baixa definitiva do processo nos assentamentos deste Egrégio Tribunal de Justiça, inclusive, nos sistemas eletrônicos de processamento de dados, remetendo-se, ato contínuo, os autos, ao Juízo a quo, com as cautelas de estilo. NAMYR CARLOS DE SOUZA FILHO DESEMBARGADOR VICE-PRESIDENTE DO TJES
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear