Carla Beatriz Alves e outros x Carla Beatriz Alves e outros
ID: 332040328
Tribunal: TRT3
Órgão: 07ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0010698-07.2024.5.03.0005
Data de Disponibilização:
23/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FERNANDA DRUMMOND CHALHOUB
OAB/MG XXXXXX
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RAFAEL DE LACERDA CAMPOS
OAB/MG XXXXXX
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FABIANA DINIZ ALVES
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 07ª TURMA Relatora: Cristiana Maria Valadares Fenelon ROT 0010698-07.2024.5.03.0005 RECORRENTE: CARLA BEATRIZ ALV…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 07ª TURMA Relatora: Cristiana Maria Valadares Fenelon ROT 0010698-07.2024.5.03.0005 RECORRENTE: CARLA BEATRIZ ALVES E OUTROS (1) RECORRIDO: DROGARIA ARAUJO S A E OUTROS (1) PROCESSO nº 0010698-07.2024.5.03.0005 (ROT) RECORRENTES: CARLA BEATRIZ ALVES, DROGARIA ARAÚJO S.A. RECORRIDOS: DROGARIA ARAÚJO S.A., CARLA BEATRIZ ALVES RELATORA: CRISTIANA MARIA VALADARES FENELON EMENTA ADICIONAL DE INSPEÇÃO E FISCALIZAÇÃO. LEI N. 3.207/57. Comprovado que o autor, exercendo as funções de vendedor, desenvolvia atividades de inspeção e de fiscalização, faz jus ao adicional de 1/10 sobre a remuneração percebida, conforme disposto no art. 8º da Lei n. 3.207/57. A despeito da disposição do parágrafo único do art. 456 da CLT, o adicional por acúmulo de função deriva de imposição legal. RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário, em que figuram, como recorrentes, DROGARIA ARAÚJO S.A. e CARLA BEATRIZ ALVES e, como recorridos, OS MESMOS. A MM. Juíza em exercício na 5ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, Dra. LUCIANE PARMA PINTO, pela r. sentença de ID. eb7915d, julgou procedentes em parte os pedidos formulados por CARLA BEATRIZ ALVES em face de DROGARIA ARAÚJO S.A. A reclamada interpõe recurso ordinário (ID. 39c3c99) postulando a exclusão da condenação ao pagamento de adicional de insalubridade, salário substituição e respectivos reflexos. A reclamante interpõe recurso ordinário (ID. d0ab8d0) arguindo preliminar de nulidade processual por cerceamento de defesa. No mérito, postula a reforma da sentença no tocante às diferenças de comissões, adicional de inspeção e fiscalização, adicional convencional sobre as horas extras intervalares, conversão do pedido de demissão em rescisão indireta e multa do art. 477, § 8°, da CLT. Contrarrazões pela reclamada (ID. f5aa2a8). Embora intimada (ID. 2123e8a), a reclamante não apresentou contrarrazões. Dispensado o parecer da d. Procuradoria Regional do Trabalho porque ausente o interesse público no deslinde da controvérsia. É o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE Os recursos interpostos são próprios, tempestivos e a representação processual está regular (ID. 9e2d199, ID. e1adb4a - Pág. 2; ID. a4ab137). A reclamada recolheu as custas processuais (ID. 501b7ac, 75c6d09) e apresentou Apólice de Seguro em substituição ao depósito recursal (ID. 2a2a090), em conformidade com o art. 899, § 11, da CLT e Ato Conjunto nº 1/TST.CSJT.CGJT, de 16/10/2019. Conheço dos apelos porquanto atendidos os pressupostos de admissibilidade. As matérias objeto dos recursos serão examinadas de acordo com a sua prejudicialidade. MÉRITO NULIDADE PROCESSUAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. CERCEAMENTO DE DEFESA (Recurso da reclamante) A reclamante requer seja acolhida a preliminar de cerceamento de defesa e negativa de prestação jurisdicional, devendo ser declarada a nulidade da sentença, com a remessa dos autos à origem, "para que sejam prestados todos os esclarecimentos solicitados e prolatada nova sentença, incluindo nas razões de decidir os pontos levantados pela Reclamante sobre as diferenças de comissões". A negativa de prestação jurisdicional configura-se quando a matéria integrante da lide não é objeto de exame pelo órgão julgador, em ofensa ao art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, o que não ocorreu no presente caso. Ademais, consoante o art. 1.013 do CPC, o recurso devolve ao Tribunal toda a matéria que não tiver sido analisada por inteiro, motivo pelo qual não cabe cogitar de prejuízo à reclamante. Logo, nos termos do art. 794 da CLT, não há nulidade a ser declarada. A reclamante também argumenta que "o único relatório de comissões juntado pela Reclamada - Id ee9667a - contempla somente o período de 10.01.2018 a 23.01.2019, configurando hipótese de evidente cerceamento de defesa pela negativa de exibição de documentos". Entendo que a análise dessa questão não trata propriamente de cerceamento de defesa. Cuida-se de matéria atinente ao mérito, cuja apreciação será realizada no tópico pertinente. Rejeito. RECURSO DA RECLAMADA INSALUBRIDADE. PPP. HONORÁRIOS PERICIAIS A sentença condenou a reclamada a pagar à autora o adicional de insalubridade, com reflexos, no percentual de 20% sobre o salário mínimo. A reclamada sustenta que a natureza do local da prestação de serviços é a comercialização de medicamentos em geral (farmácia), não se enquadrando como estabelecimento destinado aos cuidados da saúde humana. Destaca que o rol de atividades da autora era extenso, não se caracterizando o contato permanente com o agente nocivo detectado. Realizada perícia técnica, o perito oficial apresentou o seguinte levantamento acerca do contato com agentes biológicos: "(...) Da constatação: contato com pacientes portadores de patologias variáveis para aplicação de injetáveis. Do enquadramento normativo: este anexo relacionou atividades e operações envolvendo a exposição aos agentes biológicos proveniente do contato com pacientes ou com objeto de uso destes não previamente esterilizados. Portanto, o pré-requisito técnico e legal é laborar sob a influência dos riscos biológicos oriundos destas fontes geradoras (pacientes ou objeto de uso destes não previamente esterilizados). Assim, as atividades constatadas estão previstas no item deste anexo que prevê: "Insalubridade de grau médio Trabalhos e operações em contato permanente com pacientes, animais ou com material infecto-contagiante, em: - hospitais, serviços de emergências, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados ao cuidado da saúde humana, (aplica-se unicamente ao pessoal que tenha contato com pacientes, bem como aos que manuseiam objetos de uso destes pacientes, não previamente esterilizados);" Frequência e Tempo de Exposição e Equipamento de Proteção Individual: o contágio devido a um agente patogênico pode ocorrer num espaço de tempo extremamente curto, por um simples contato, por menor que seja e até mesmo pelas vias aéreas. Portanto, não há que se discutir, tecnicamente, tempo de duração da atividade envolvendo riscos gerados por agentes biológicos ou equipamentos e proteção individual(...)" (grifei, ID. 04e1af1 - Pág. 11). Em arremate, o "expert" concluiu: "Ficou CARACTERIZADA a INSALUBRIDADE em grau médio (20%) por Agentes Biológicos - Anexo 14, NR 15 - com exposição intermitente vivenciada durante todo o período de labor como Vendedora e Vendedora Responsável de novembro de 2018 até o desligamento" (ID. 04e1af1 - Pág. 26). Em manifestação complementar (ID. 245258b, bd9d2a5), o perito do juízo respondeu quesitos da reclamada e ratificou na íntegra a conclusão do laudo pericial. Destaco o esclarecimento veiculado na resposta n. 4 de ID. bd9d2a5 - Pág. 2: "Fica afirmado que os serviços fizeram parte da rotina de trabalho com exposição ao risco de natureza ocupacional. A insalubridade está caracterizada pela quantidade de injetáveis aplicados conforme apurado e independentemente do tempo de duração de todo o processo de apuração". As características da atividade laboral e as tarefas atribuídas à autora não deixam dúvida sobre as condições insalubres por contato com agentes biológicos, na forma do Anexo 14 da NR-15 da Portaria 3.214/78 do Ministério do Trabalho. A farmácia que presta serviços de aplicação de medicamentos injetáveis está enquadrada no conceito de estabelecimento destinado ao cuidado da saúde humana. Entendo que a aplicação de medicamentos injetáveis enseja o enquadramento no Anexo 14 da NR-15, porquanto a autora mantinha contato com clientes que enfrentavam alguma enfermidade, submetendo-se a riscos de contágio por sangue eventualmente contaminado. Este Tribunal Regional editou a Tese Jurídica Prevalecente n.º 19: "Empregado de farmácia ou drogaria. Aplicação de medicamentos injetáveis. Adicional de insalubridade. Farmácia ou drogaria que disponibiliza o serviço de aplicação de medicamentos injetáveis enquadra-se no conceito de estabelecimento destinado aos cuidados da saúde humana, nos termos do Anexo 14 da NR 15 da Portaria n. 3.214, de 1978, do MTE, para fins de concessão de adicional de insalubridade aos empregados que apliquem medicamentos injetáveis. (RA 259/2017, disponibilização: DEJT/TRT-MG/Cad. Jud. 18 e 19/12/2017, 8, 23 e 24/01/2018)". Conforme apurado no laudo, a aplicação de injetáveis fazia parte das atividades habituais e rotineiras da reclamante, pelo que resta caracterizada a exposição em caráter intermitente e não eventual, suficiente a ensejar o direito ao adicional de insalubridade, nos termos da Súmula 47 do TST: "O trabalho executado em condições insalubres, em caráter intermitente, não afasta, só por essa circunstância, o direito à percepção do respectivo adicional". Em se tratando de agente biológico, não há EPI que neutralize os efeitos nocivos por este causados, já que o agente se propaga no ar, possibilitando a contaminação até mesmo pelas vias aéreas. No caso, o levantamento pericial foi realizado de forma completa, por profissional capacitado e da confiança do juízo, com base em diligência realizada no local de trabalho. As conclusões contidas no laudo técnico foram devidamente fundamentadas e justificadas (com amparo nas normas técnicas aplicáveis), dirimindo a controvérsia a respeito do labor em condição de insalubridade, inexistindo, nos autos, elementos probatórios capazes de infirmá-las. O juízo não está adstrito às conclusões do perito oficial. Extrai-se dos arts. 371 e 479 do CPC que o magistrado apreciará a prova pericial em cotejo com os demais elementos de convicção produzidos nos autos, indicando os motivos que o levaram a considerar, ou afastar, as conclusões constantes do laudo. Assim, desde que indicadas as razões do convencimento, poderá ser rejeitado o resultado do exame técnico. Entretanto, a reclamada não produziu prova apta a ensejar a desconstituição do laudo técnico. A expedição e entrega do PPP retificado é mero corolário do reconhecimento da exposição a agente insalubre, sendo obrigação do empregador, nos termos do § 4º do art. 58 da Lei 8.213/91. Mantenho a condenação da ré ao pagamento dos honorários periciais, tendo em vista a sua sucumbência no objeto da perícia. O valor arbitrado na origem (R$1.500,00) não comporta a redução pretendida pela ré, porque fixado com razoabilidade. Nego provimento. SALÁRIO SUBSTITUIÇÃO A sentença condenou a reclamada ao pagamento das diferenças salariais entre o salário da reclamante e o dos gerentes e subgerentes substituídos, durante os períodos de afastamento, conforme relatório juntado pela própria ré (id b4fc222), com reflexos em férias + 1/3, 13º salário, FGTS e adicional noturno, deferindo a dedução dos valores quitados sob a rubrica "COBERTURA GERÊNCIA". A reclamada alega que a reclamante era a vendedora responsável (VR) na ausência do subgerente ou gerente, significando que poderia realizar coberturas de caráter eventual do corpo gerencial. Afirma que as lojas possuíam vários vendedores responsáveis, que se revezavam nas coberturas dos gerentes e subgerentes, e que nunca houve substituição irrestrita, ocorrendo apenas um suporte, com pagamento de gratificação específica. Consoante a Súmula 159, item I, do TST, "enquanto perdurar a substituição que não tenha caráter meramente eventual, inclusive nas férias, o empregado substituto fará jus ao salário contratual do substituído". Os relatórios de cobertura de gerência vieram aos autos em ID. b4fc222 e registram as substituições ocorridas a partir de fevereiro de 2022. Esses documentos consignam os nomes dos gerentes e subgerentes substituídos pela reclamante, a data da substituição, a quantidade de minutos correspondente, bem como o tipo de cobertura, se integral (I) ou parcial (P). A testemunha Victor Rodrigues Lagares, ouvida a rogo da reclamante, disse que: "a reclamante também exerceu a função de VR, que consistia em cobrir o gerente, ficando responsável pela loja, pelo cofre, pela fiscalização de receitas quando a farmacêutica não estava; o VR era a autoridade máxima da loja durante a substituição e assumia totalmente as funções do gerente; em alguns casos, a farmacêutica poderia ser uma autoridade presente na loja durante a cobertura, para questões de receita, mas a questão gerencial era do VR; em casos de emergência, a reclamante, como VR, tinha autonomia para atuar sozinha;a reclamante não tinha e-mail corporativo como VR, e não sabe informar se gerente e gestor de canal tinham; a reclamante montava a escala de vendas da semana, mas não tinha certeza se ela montava escala de férias; acredita que a reclamante não podia admitir ou dispensar colaboradores, mas podia aplicar advertências; a N5 era uma reunião diária que envolvia o grupo da manhã, incluindo vendedores, farmacêutica e algumas pessoas do caixa; existiam reuniões específicas para lideranças, incluindo VRs, gerência e farmacêutica, e também outras que envolviam o gestor de canal; acredita que a reclamante poderia participar das reuniões com o gestor de canal; a reclamante não tinha autonomia para pedir remanejamento de colaboradores; havia épocas em que a loja tinha dois ou três VRs" (ID. eb7915d - Pág. 9-10). Por fim, a testemunha Gabriela Pinheiro Vieira, convidada pela reclamada, declarou que: "o VR auxilia a gerência na folga, dando suporte aos caixas, vendas, cancelamento de cupons e atendimento, mas não substitui o gerente; a reclamante não tinha autonomia para montar escala de férias, admitir ou dispensar colaboradores, ou aplicar advertências como VR, essas atividades eram de responsabilidade da gerente da loja; a reclamante não participava da reunião de liderança N5 como VR; havia quatro VRs na loja na época em que a reclamante trabalhava lá" (ID. eb7915d - Pág. 10). A testemunha da ré afirmou que o VR não substitui o gerente. Porém, trata-se de fato admitido pela preposta da empresa e demonstrado pela prova documental juntada com a própria defesa. Considerando as provas produzidas nos autos, não se sustenta a ilação da ré de que ocorria apenas um suporte para a gerência, pois as substituições eram bastante frequentes, sendo quase todas em tempo integral. É certo que a reclamante cumpriu atribuições suficientes para manter a regularidade da gerência, sendo perfeitamente aplicável o entendimento consolidado na Súmula 159, I, do TST. Desse modo, impõe-se reconhecer o direito da autora ao pagamento de diferenças a título de salário substituição. Nego provimento. RECURSO DA RECLAMANTE DIFERENÇAS DE COMISSÕES A reclamante aponta a existência de diferenças de comissões pelas seguintes razões: a) alterações unilaterais nos relatórios de comissões, painéis e mapas de vendas diárias; b) descompasso entre o volume de vendas lançado nos relatórios e os pagamentos efetuados; c) desconto das comissões em decorrência de devoluções de produtos pelos clientes; d) e direcionamento equivocado de vendas para o "autosserviço", por ausência de identificação do vendedor no momento do pagamento. Requer seja aplicada a pena de confissão (art. 400/CPC), devido à insuficiência da prova documental, deferindo-se diferenças de comissões no importe médio mensal de R$ 500,00. Em defesa, a reclamada asseverou "que todas as comissões devidas foram rigorosamente pagas segundo o percentual correspondente, conforme fichas financeiras e relatórios de comissão ora colacionados. Note-se que estas comissões são apuradas à vista dos cupons fiscais emitidos, onde informados a identificação do produto, seu valor e o nome do funcionário responsável pela transação" (ID. 6ef72c0 - Pág. 36). De início, convém esclarecer que os relatórios de vendas anexados aos IDs. ee9667a e ebbb352 são imprestáveis para a solução da lide, pois se referem a período integralmente coberto pela prescrição. Por consequência, também são irrelevantes os apontamentos realizados pela autora com base nesses documentos (ID. 4612c5d). Na promoção de ID. 6dc406e, a empresa forneceu um link de acesso aos relatórios de vendas e comissões da reclamante, esclarecendo que a tamanho dos arquivos é incompatível com os padrões aceitos pelo PJe. A recorrente alega que "a Reclamada junta um link com os supostos documentos sobre as comissões, mas o link encontra-se corrompido, e a Reclamante não teve acesso aos documentos" (ID. d0ab8d0 - Pág. 11). Não assiste razão à autora, uma vez que não encontrei dificuldades para visualizar a prova documental disponibilizada no link em questão. Acentuo que a reclamante foi intimada para se manifestar sobre a petição de ID. 6dc406e, porém, silenciou sobre a suposta dificuldade de acesso aos relatórios de comissões (vide ID. d61013a, 632047a). Os aludidos relatórios cobrem a totalidade do período imprescrito e discriminam a data da transação, nome do vendedor (reclamante), código e denominação do produto, quantidade de produtos vendidos, valor da venda, valor e percentual da comissão. Com relação à prova oral, trago à colação a degravação disponibilizada pela reclamante em seu recurso, a qual está em conformidade com a videogravação disponibilizada no link de ID. b4092bf - Pág. 3. "DEPOIMENTO DA PREPOSTA: (DIFERENÇAS DE COMISSÕES) Advogada da Reclamante: Eu gostaria de saber quais documentos que o vendedor tem acesso dentro da empresa para poder conferir as comissões. Preposta da Reclamada: Olha, a gente tem no sistema, diariamente, essas comissões. Aparece para eles quantos que ele vendeu no dia anterior, a comissão que ele ganhou. Aparece até os produtos que ele vendeu. É um relatório que sai diariamente. Advogada da Reclamante: Esse documento, ele chama painel de vendas? Preposta da Reclamada: Sim. Advogada da Reclamante: Existe também um documento que chama mapa resumo do vendedor? Mapa resumo diário? Preposta da Reclamada: Esse mapa resumo é justamente para que o vendedor possa identificar mesmo o que ele vendeu em cada data do mês, os produtos que ele vendeu, os resultados dele. Advogada da Reclamante: É caso o vendedor queira, ele pode imprimir esses documentos? Preposta da Reclamada: Sim, porque fica no sistema. E o sistema tem ação direta, tem impressora dentro da própria loja. (...) Advogada da Reclamante: Na drogaria Araújo, no caso de produtos devolvidos, as comissões são estornadas do vendedor que vendeu, você sabe dizer? Preposta da Reclamada: São estornadas. Advogada da Reclamante: Você sabe se ocorre um desconto na comissão ou se eles zeram a venda? Você sabe dizer? Preposta da Reclamada: Isso eu realmente não tenho acesso. Advogada da Reclamante: Sim. Você sabe dizer quanto tempo que demora para o painel de vendas atualizar? Quanto tempo que demora entre a venda e o painel de vendas para a venda ser lançada no painel de vendas? Preposta da Reclamada: De uma em uma hora o painel atualiza. Advogada da Reclamante: E já presencial alguma hipótese de operador de caixa não passar o cartãozinho do vendedor? Preposta da Reclamada: Olha, como a gente também tem que ser humano, pode ocorrer, as vezes falham lá, as vezes o próprio vendedor esquece de pôr a fichinha dentro daquela bolsinha de atendimento padrão. Mas assim, é muito raro isso acontecer. E quando acontece, eu por exemplo, na minha gestão, eu fiz uma forma de as vezes conseguir passar uma venda para esse vendedor para que ele não fique prejudicado. Advogada da Reclamante: Sim, mas teria alguma maneira de recuperar a venda? Preposta da Reclamada: Olha, é igual eu te disse, as vezes por exemplo, eu mesmo faço um atendimento no balcão, porque nessa ela está muito cheia e digamos que ela perdeu uma venda de 80 reais. Eu estou prestando esse atendimento, eu acompanho esse atendimento e solicito ao caixa que a sua venda seja passada nela. Advogada da Reclamante: Você sabe se existem produtos e serviços que estão vendidos sem previsão de comissão? Preposta da Reclamada: Todos os produtos comercializados dentro da drogaria Araújo tem comissão. Advogada da Reclamante: E serviços, por exemplo, o serviço farmacêutico, por exemplo, que ele vende? Preposta da Reclamada: Mas o serviço farmacêutico, quem faz é o farmacêutico. Advogada da Reclamada: Mas, por exemplo, mesmo o vendedor, ele vendendo o serviço e depois ele repassa o teste farmacêutico, ele não recebe? Preposta da Reclamada: Os nossos serviços são testes de covid, por exemplo A senhora quer saber se o vendedor ganha comissão sobre isso? Advogada da Reclamante: Sim? Preposta da Reclamada: Não, porque quem realiza o serviço é o farmacêutico. Inclusive, a gente tem uma maquininha que 90% desses atendimentos é feito pelo farmacêutico nela. E, às vezes, pode ocorrer assim, do vendedor, o cliente chega no balcão e solicita, eu quero fazer um teste de covid. O vendedor, ele anota um código lá, X, e manda o serviço para as minhas clientes ou para o farmacêutico atentar. Advogada da Reclamante: Entendi, mas você sabe, então, por qual motivo que esses serviços farmacêuticos são lançados nos relatórios de venda? Preposta da Reclamada: Mas esses serviços, eles não são lançados nos relatórios de venda. Advogada da Reclamante: São lançados sim nos relatórios de venda. Por exemplo, o teste covid e a comissão zerada. Eu queria saber por quê. Preposta da Reclamada: Olha, isso aí é uma situação que a gente deveria ver na TI, porque a gente está lá, né. Porque não gera comissão. Advogada da Reclamante: Por exemplo, vacinas também, a gente vê vacinas, eles não recebem também quando eles vendem? Preposta da Reclamada: A venda das vacinas, sim. Serviço, não, né. Que, no caso, seria aplicação. Advogada da Reclamante: E, questão de, lá na loja Guaraparí, tem o serviço de manipulação? Preposta da Reclamada: Sim. Advogada da Reclamante: Nos casos, quando ocorre, assim, o recebimento antecipado de fórmula, às vezes consta lá no relatório que acredito que seja quando eles vendem a fórmula e depois do prazo eles recebem. Você sabe se isso gera comissões? Preposta da Reclamada: Olha, manipulação é uma venda, né? Eles fazem um atendimento, mandam, o cliente paga no caixa e é como um produto qualquer. E tem um percentual de comissões também? Advogada da Reclamante: Sim." (grifei, ID. d0ab8d0 - Pág. 12-14). "DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA OUVIDA A ROGO DA RECLAMANTE: Advogada da Reclamante: Vitor, você se recorda quais documentos que ficavam disponíveis para vocês conferirem as comissões em loja? Testemunha da Reclamante: Então, basicamente era tudo no sistema. Eu sei que tinha um painel específico para o vendedor, se eu não me engano era por período, né? E tinha um painel geral da loja, que eu me recordo são esses. Advogada do Reclamante: Você já presenciou alguma divergência nessas vendas, nesses painéis de venda? Problemas? Testemunha do Reclamante: Já, tinha alguns valores que constavam como devolução e esse tipo de coisa geralmente a gente não conseguia conferir, não conseguia ter noção, a gente tinha que meio que tentar adivinhar qual foi o valor que foi devolvido. Então, sim, tinha uma certa divergência. Advogada da Reclamante: Por que vocês não conseguiam conferir? Testemunha da Reclamante: Não acredito que, na verdade não sei, porque na comissão quando puxava ficava o valor total, por exemplo, pessoa X vendeu R$ 50 mil, a comissão total. E era basicamente isso, entendeu? As informações que a gente tinha. E também, se você ficasse, conseguiria ver quanto você vendeu a cada dia. E aí, basicamente isso. Advogada da Reclamante: Você já presenciou alguma hipótese de vendas que foram realizadas e não foram lançadas no relatório? Testemunha da Reclamante: Já aconteceu também. A gente tinha uma ficha, né? Com sua matrícula, seus dados, e essa ficha a gente entregava para os clientes, tanto no salão quanto no balcão. No balcão, a gente tinha que colocar os produtos dentro de uma bolsinha e lacrar ela. A gente colocava o produto junto com a fichinha. Aí algumas vezes a fichinha voltava, em determinado momento do dia, quando iam muitas fichinhas lá no caixa, a gente ia lá e buscava os cestinhos e as bolsinhas voltavam com elas para o balcão. Aí, organizando, a gente percebia que às vezes tinha uma fichinha dentro dessa bolsinha azul e a gente ia conferir e a venda não tinha entrado. Algumas vezes os operadores de caixa esqueciam. Então, sim, acontecia casos assim. Advogada da Reclamante: Você tem ideia de uma frequência média que isso ocorria? Testemunha da Reclamante: Nossa, isso é meio complicado. Tinha operadores que eram mais atentos e tinha alguns operadores que aconteciam com mais frequência. Mais atentos e... Sim. Advogada da Reclamante: Já presenciou hipóteses de produtos e serviços que são vendidos sem o lançamento de comissões? Testemunha da Reclamante: O caso da aplicação mesmo. A aplicação era cobrada um valor. Não vou saber ao certo agora, se eu não me engano, era R$12. E a gente não ganhava por isso. E tinha outras coisas também, como o teste de COVID. Por exemplo, a gente atendia o cliente. Muitas vezes explicava a diferença dos testes que tinha. Aí a gente... Esse serviço ia passar no caixa, aí tinha um valor, mas esse valor não entrava pra gente. Porque fazer o teste, esses testes de COVID, no caso, era farmacêutico. Mas a gente tinha o primeiro contato com o cliente mesmo. Advogada da Reclamante: Questão de manipulação. Quando vocês vendiam uma fórmula antecipada, vocês... Uma fórmula antes, vocês recebiam a comissão de forma antecipada ou não? Testemunha da Reclamante: Então, na maioria dos casos, a fórmula, o cliente... A fórmula manipulada, o cliente tinha que fazer o pagamento na hora. Aí, em alguns casos, o pagamento era na retirada. Retirada da fórmula. Advogada da Reclamante: E você já presenciou alguma hipótese de manipulações que não foram lançadas no relatório? Remédios manipulados que não foram lançados no relatório? Testemunha da Reclamante: Ora, já teve alguns casos, não sei se entraria nessa questão. Já teve alguns casos, por exemplo, de uma fórmula que o cliente ficou de pagar na hora de retirar e nunca veio. E aí, tipo assim, a gente teve todo o processo da venda, a fórmula chegou, e aí a pessoa simplesmente não veio buscar. Mas agora, de não ser lançado, eu acredito que não. Advogada da Reclamante: E você já presenciou a Carla tendo algum problema com comissões? Testemunha da Reclamante: Então, essa questão das fichinhas que não passavam, esse tipo de coisa aconteceu com todo mundo, então sim. Advogada da Reclamante: Ok. Sobre o tema suficiente, excelência. Advogada da Reclamada: Victor, você falou mais cedo que não conseguia acompanhar as vendas, que era um pouco bagunçado essa situação. Mas se você não conseguia acompanhar o que era vendido, produtos, valores, como que você conseguia ver que alguma coisa não era efetivamente passada, ou produto que não era passado e você não recebia a comissão? Testemunha da Reclamante: Então, a gente tinha uma noção pela quantidade de coisas que a gente vendia. Por exemplo, já aconteceu comigo, teve uma venda muito cara, vamos colocar um exemplo assim, uma venda de mil reais, e aí atualizou o painel e esses mil reais simplesmente não entraram. Então, tem vezes que é uma coisa muito discrepante. Então, a gente consegue ter uma noção, não conseguia ver exatamente o que era, mas a gente ia procurando e descobria que não tinha passado a fichinha. Entendeu? Advogada da Reclamada: Entendi. E aí você perdeu essa venda ou você tomou alguma providência? Testemunha da Reclamante: A providência que a gente poderia falar e avisar para quem estivesse na gerência, que aí ia conversar com os operadores para ter mais atenção. E era só isso. Advogada da Reclamada: Entendi. Além dessa venda, você já conseguiu identificar mais alguma outra que não tenha sido acreditada? Testemunha da Reclamante: Quando a fichinha volta, né, é certeza que não passou. Mas aí, como eu falei, a gente consegue ver especificamente. Isso a gente conseguia ver, como eu falei, numa venda que fosse um valor mais alto, a gente conseguiria ver, mas tem muita coisa pequena que provavelmente não passou e a gente não tinha como acompanhar, entendeu? Por ser valores pequenos, 5, 5, 10, 20 reais ali. Aí esse tipo de coisa não tem como acompanhar. Advogada da Reclamada: No mapa de venda, nos relatórios, não tinha como acompanhar? Não. Ficava a venda geral e a venda dos... Ficava uma... Tipo, vendas... O que você vendeu de medicamento, o que você vendeu de... Tipo, dos departamentos da loja. De infantil, de nutrição, mas aí, tipo, específicos, não. Advogada da Reclamada: Entendi. Todas aquelas hipóteses que a doutora Fernanda falou anteriormente, você já viu acontecer com a Carla? Testemunha da Reclamante: Esquecendo a ficha já, da ficha voltar na bolsinha, de operador esquecer de passar. Sim. Advogada da Reclamada: Efetivamente com a Carla? Testemunha da Reclamante: Sim. Advogada da Reclamada: Quantas vezes? Testemunha da Reclamante: Não vou saber lembrar. A gente trabalhou anos juntos. Advogada da Reclamada: Excelência. Sem mais." (grifei, ID. d0ab8d0 - Pág. 14-17). A testemunha da reclamada não foi indagada a respeito do tema ora em análise. A prova oral corrobora, de modo uníssono, que a reclamada não quitava as comissões sobre produtos devolvidos pelos clientes, ou seja, sobre vendas canceladas. O procedimento adotado pela ré viola o disposto no art. 7º da Lei 3.207/57, que autoriza o estorno das comissões apenas no caso de insolvência do cliente, hipótese diversa da ora discutida. No mesmo sentido o Precedente Normativo n. 97/TST. Ademais, nos termos dos artigos 466 da CLT e 2º e 3º da Lei 3.207/57, o direito à comissão se consolida com o ultimato da transação de venda e a aceitação do negócio pelo comprador. Com efeito, o esforço despendido pelo vendedor na captação do cliente e realização da venda exige a remuneração correspondente, mormente quando se trata de comissionista pura, como é o caso da autora. A prática evidenciada contraria a regra do art. 2º da CLT, segundo a qual os riscos do empreendimento econômico devem ser suportados pelo empregador. A prova oral evidencia que havia perda de comissões porque nem sempre o operador de caixa computava a venda na matrícula do vendedor. E em tais ocasiões, infere-se do relato da testemunha que os vendedores não recebiam a comissão ou qualquer compensação. Por fim, a testemunha da reclamante confirmou a existência de irregularidade no pagamento de comissões sobre determinados serviços, a exemplo das aplicações e testes de Covid. Diante das irregularidades constatadas, inclusive relacionadas ao montante de vendas contabilizado, com base nos postulados da razoabilidade e proporcionalidade, defiro à reclamante o pagamento de diferenças de comissões, por todo o período imprescrito, no importe mensal de R$ 200,00, com reflexos em DSR, horas extras, adicional noturno, férias + 1/3, 13º salário e FGTS. Deixo de analisar, por ora, os reflexos em aviso prévio indenizado e multa de 40%, tendo em vista a controvérsia existente quanto ao fim do contrato de trabalho. Provejo em parte. ADICIONAL DE INSPEÇÃO E FISCALIZAÇÃO A reclamante não se conforma com a decisão que julgou improcedente o pedido de pagamento das diferenças salariais pelas atividades de organização, fiscalização e inspeção. A reclamante foi promovida a vendedora em 01/10/2018 (ID. c9860cd - Pág. 2). As fichas financeiras demonstram que, no período imprescrito, quando a autora já atuava como vendedora, não houve percepção de salário fixo, sendo a remuneração composta por comissões, prêmios e adicional noturno (ID. f54ae35). No entanto, em que pese a alteração do salário fixo para comissões, o formulário de descrição do cargo elenca outras tarefas distintas das vendas, como reposição, limpeza, aplicação de injeções, precificações e conferência de validade da mercadoria (ID. cdc6a55). O efetivo exercício de tais atribuições foi corroborado pela preposta da empresa, "verbis": "a principal função do vendedor é o atendimento ao cliente no balcão, incluindo a venda de medicamentos e outros produtos; além do atendimento, os vendedores são responsáveis pela organização, limpeza e precificação de suas seções; não há dias específicos em que os vendedores fazem apenas faxina, pois eles devem atender os clientes mesmo durante as atividades de limpeza e organização; os vendedores podem gastar até três dias para organizar suas seções, devido à necessidade de atender clientes; o tempo gasto com a limpeza varia, pois o vendedor precisa interromper a atividade para atender no balcão; a loja possui de 10 a 11 vendedores, e as seções são distribuídas para não sobrecarregar a equipe; os preços são atualizados diariamente, mas nem todos os produtos são precificados todos os dias; acredita que a reclamante fazia a precificação cerca de três vezes por semana e gastava no máximo meia hora nessa atividade; os vendedores fazem uma organização rápida das prateleiras diariamente, gastando cerca de 10 minutos; os vendedores verificam a validade dos produtos em suas seções; a reposição de mercadorias é feita por auxiliares de loja, mas os vendedores podem fazê-la em casos raros; os vendedores devem manter os produtos de acordo com o layout da empresa; os funcionários da JR Higienização limpam apenas as áreas gerais da loja, não as seções; as atividades de precificação e verificação de validade não são diárias, mas a organização dos produtos nas gôndolas deve ser feita diariamente, embora nem sempre seja cumprida; acredita que a reclamante gastava cerca de meia hora por dia com as atividades que não eram de venda, como precificação" (ID. eb7915d - Pág. 6-7). Ainda que as atividades distintas da efetiva venda não representem atribuição de maior responsabilidade ou complexidade, a atuação como comissionista limita a retribuição apenas pelas vendas realizadas, não compreendendo referidas atividades acrescentadas no feixe de tarefas da autora. Logo, as atribuições não relacionadas às vendas revelam descompasso com a natureza do serviço remunerado pelas comissões. Se a empregadora não contrata pessoal específico para as funções de reposição, limpeza, aplicação de injeções, etiquetagem, precificações, conferência de validade e estado de conservação de produtos, não pode simplesmente repassar tais atribuições para a vendedora, sem a necessária recomposição da disparidade na contraprestação ajustada. Não é razoável atribuir o desempenho de maiores funções, sem o incremento salarial, em violação ao caráter sinalagmático do contrato de trabalho, atinente à reciprocidade de obrigações, assim como à característica comutativa, correspondente à equivalência das condições entre as partes. O artigo 8º da Lei 3.207/57 assegura o acréscimo de um décimo da remuneração ao vendedor no caso de acúmulo de atribuições com o serviço de inspeção. Ainda que a referida lei regulamente a atividade do vendedor pracista ou viajante, é perfeitamente cabível a aplicação analógica ao caso dos autos. Assim, o importe de 10% do valor das comissões recebidas a cada mês representa a adequada medida de retribuição. Provejo para acrescer à condenação o pagamento de 10% do valor das comissões recebidas a cada mês, em razão do acúmulo das funções, a ser apurado conforme os demonstrativos de pagamento juntados aos autos, com reflexos em DSR, 13º salário, férias + 1/3 e FGTS. O pedido de reflexos em aviso prévio indenizado e multa de 40% será apreciado em momento oportuno. ADICIONAL CONVENCIONAL. INTERVALOS INTRAJORNADA E INTERJORNADAS A reclamante requer a aplicação do adicional convencional de 95% para o cálculo das horas extras decorrentes da supressão parcial dos intervalos intrajornada e interjornadas. Conforme disposto no § 4º do art. 71 da CLT, o pagamento devido pela não concessão ou concessão parcial do intervalo intrajornada possui natureza indenizatória e deve incidir apenas sobre o período suprimido, acrescido de 50% sobre o valor da hora normal. A aplicação desse adicional decorre de sua natureza específica, diversa das horas extras de sobrejornada. A incidência do adicional normativo só se justificaria se houvesse previsão expressa na CCT determinando sua incidência também sobre a supressão dos intervalos intrajornada e interjornadas, não sendo esse o caso dos autos (v.g. cl. 16 da CCT 2020/2021 - ID. 829d047 - Pág. 4). Nego provimento. PEDIDO DE DEMISSÃO. CONVERSÃO EM RESCISÃO INDIRETA. RETIFICAÇÃO DA CTPS. MULTA DO ART. 477, §8º, DA CLT O juízo singular indeferiu o pedido de rescisão indireta do contrato pelos seguintes fundamentos: "A considerar os termos da exordial e o documento de pedido de demissão, a autora é confessa quanto ao pedido de demissão, o qual foi livremente manifestado por ela que, à época, tinha inegável intuito de romper com o contrato havido com a reclamada. Nesse sentido, o fato de a autora, após tal manifestação, revolver eventuais desacertos vivenciados ao tempo do contrato laboral, não a legitima no pedido intencionado de convolar a demissão em rescisão indireta. Sem falar que a livre manifestação de vontade não se torna nula em razão do arrependimento, o qual sequer é tipificado como vício de vontade. Não houve coação patronal, tampouco pressão para que a autora pedisse demissão do emprego, sendo irrelevante perquirir-se sobre a sua lógica de raciocínio ou pessoal sentimento que deram ensejo àquela regular iniciativa. Manifestado o ato, este resta perfeito e acabado, surtindo os seus naturais efeitos, dada a inexistência de vício" (ID. eb7915d - Pág. 4). A reclamante requer a conversão do pedido de demissão em rescisão indireta. Alega, em síntese, "que não pediu demissão por motivos pessoais, e sim, por conta dos grandes prejuízos financeiros que estava sofrendo na empresa", mais precisamente em função do descumprimento de obrigações trabalhistas relacionadas ao adicional de insalubridade, intervalo intrajornada, atividades de inspeção e fiscalização, salário substituição e comissões. De fato, veio aos autos o comunicado de pedido de demissão escrito pela autora de próprio punho (ID. 46908dd). Contudo, ainda que a reclamante tenha optado por pedir demissão, nada impede que, posteriormente, possa obter o reconhecimento judicial de que as condições de trabalho autorizavam a ruptura do contrato por culpa da empregadora, e, consequentemente, a converter o pedido de demissão em rescisão indireta. Somente o cumprimento das obrigações do contrato pela empregadora pode afastar a possibilidade de conversão do pedido de demissão em rescisão indireta. Nem se argumente que haveria desrespeito ao ato jurídico perfeito, pois a vontade do empregado somente seria livremente manifestada se a empresa não houvesse incorrido em qualquer falta que justificasse o rompimento contratual, isto é, se toda a cadeia de fatos que antecederam a ruptura contratual não estivesse contaminada pela ilicitude. O TST, inclusive, não considera que o pedido de demissão constitua obstáculo à rescisão indireta, como se infere das seguintes decisões: "AGRAVO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. PEDIDO DE DEMISSÃO. CONVERSÃO EM RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. LABOR EXTRAORDINÁRIO ALÉM DO PERMITIDO NA LEGISLAÇÃO SEM A CONCESSÃO DE FOLGAS. MATÉRIA FÁTICA. 1. Confirma-se a decisão monocrática que negou seguimento ao recurso de revista interposto pela ré. 2. Na hipótese, o Tribunal Regional registrou expressamente que "a Reclamada exigia do Reclamante a prestação de serviços superiores às suas forças e alheios ao contrato de trabalho. Sendo que o Reclamante era obrigado a prestar um excessivo número de horas extras, conforme abaixo exposto, comprometendo sua saúde e seu bem-estar físico e mental", mantendo a sentença que converteu o pedido de demissão em rescisão indireta. 3. Esta Corte Superior já se manifestou reiteradamente no sentido de que o pedido de demissão não impede, por si só, que seja posteriormente reconhecida a rescisão indireta do contrato de trabalho quando presente alguma das hipóteses do art. 483 da CLT, como na hipótese.4. Em tal perspectiva, para infirmar a conclusão regional e aferir as teses recursais em sentido contrário, seria imprescindível o reexame de fatos e provas, o que não se admite nesta fase recursal extraordinária, a teor da Súmula nº 126 do TST. Agravo a que se nega provimento" (Ag-ED-RR-1660-06.2017.5.09.0245, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 20/10/2023). "(...) II - RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA. RECURSO INTERPOSTO NA ÉGIDE DA LEI N.º 13.015/2014. PEDIDO DE DEMISSÃO. CONVERSÃO EM RESCISÃO INDIRETA. EMPREGADA PORTADORA DE NECESSIDADE ESPECIAL. CARREGAMENTO DE PRODUTOS COM PESO SUPERIOR À SUA CONDIÇÃO. Hipótese em que o Tribunal Regional reconheceu a rescisão indireta, sob o fundamento de que a reclamada descumpriu o dever de adequação das condições laborais, inviabilizando a continuidade do trabalho. A jurisprudência desta Corte Superior firmou o entendimento de que é possível a conversão do pedido de demissão em rescisão indireta quando presente alguma das hipóteses do art. 483 da CLT. No caso, a empregadora incorreu em falta grave do art. 483, "a", da CLT, apta a romper o vínculo contratual, pois não observou o dever de adequação das condições laborais, impondo à autora serviços superiores às suas forças, ao realizar o carregamento de produtos com peso superior à sua condição física. Precedentes. Óbice da Súmula 333/TST. Recurso de revista não conhecido" (RRAg-11084-29.2019.5.03.0129, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 23/06/2023) . "In casu", restou reconhecido o labor em condição de insalubridade, em grau médio (20%), em razão da exposição a agentes biológicos. A reclamante permaneceu trabalhando mais de 5 anos sem o recebimento do adicional de insalubridade. E assim ocorrendo, considero evidenciado o descumprimento contratual apto a autorizar o rompimento oblíquo, com fulcro no art. 483, "d", da CLT. Nesse sentido, os recentes arestos do TST: "AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. DESCUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. CONFIGURAÇÃO. Constatada a viabilidade de trânsito do recurso trancado por meio de decisão monocrática, o Agravo Interno deve ser acolhido. Agravo conhecido e provido. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. DESCUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. CONFIGURAÇÃO. Demonstrada violação do artigo 483, alínea "d", da CLT, dá-se provimento ao Agravo de Instrumento, determinando-se o regular seguimento do Recurso de Revista. Agravo de Instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. DESCUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. CONFIGURAÇÃO. O art. 483 da CLT faculta ao empregado considerar como rescindido o contrato de trabalho e, por conseguinte, pleitear a devida indenização, nos casos de cometimento, pelo empregador, de condutas reprováveis e com gravidade suficientes para tornar insustentável a manutenção do vínculo empregatício. No caso dos autos, o elemento fático-jurídico a ensejar a rescisão indireta é o inadimplemento contratual pelo empregador em razão da supressão do pagamento do adicional de insalubridade e do intervalo intrajornada, nos termos da alínea "d" do art. 483 da CLT.No que se refere à ausência de atualidade das faltas, esta Corte consagrou jurisprudência no sentido de que a falta de imediatidade da reação do empregado contra atos ilegais praticados pela empregadora não constitui fator determinante para o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho. Recurso de Revista conhecido e provido" (RR-11073-75.2019.5.03.0007, 1.ª Turma, Relator Ministro Luiz José Dezena da Silva, DEJT 18/03/2024) (grifo nosso). "AGRAVO INTERNO EM RECURSO DE REVISTA. RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI N.º 13.015/2014. AUSÊNCIA DO REGULAR PAGAMENTO DAS HORAS EXTRAS E DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. RESCISÃO INDIRETA. DESCUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. FALTA GRAVE DA EMPREGADORA. O artigo 483, alínea "d", da CLT preceitua que o empregado poderá considerar rescindido o contrato, pleiteando, pois, a indenização respectiva, no caso de o empregador não cumprir as obrigações contratuais. A interpretação mais adequada do dispositivo citado é a de que a expressão "obrigações do contrato" alcança os diversos deveres inerentes à relação contratual de emprego, visto que as respectivas obrigações podem ter origem nas inúmeras fontes formais do direito do trabalho, inclusive legal e constitucional, bem como podem decorrer dos costumes, de decisão arbitral ou judicial ou de normas coletivas, entre outras. Sabe-se que a maioria das obrigações pertinentes ao contrato de trabalho decorre de previsão da legislação trabalhista ou até mesmo da Constituição Federal, como é o caso do pagamento das horas extras eventualmente prestadas - ante a limitação da jornada laboral imposta tanto no texto constitucional quanto na CLT -, e que a sua inobservância faz incidir a justa causa patronal. Na hipótese em comento, ao que sobressai do acórdão regional, é incontroverso que a reclamada não efetuava o pagamento das horas extras e do adicional de insalubridade. Assim, a conduta da ré, ante a consideração de que a remuneração correspondente às referidas parcelas importa em salário, revela-se suficientemente grave a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho, diante dos prejuízos ocasionados ao reclamante (precedentes). Agravo desprovido" (Ag-RRAg-1000871-49.2020.5.02.0319, 3.ª Turma, Relator Ministro José Roberto Freire Pimenta, DEJT 16/02/2024) (grifei). Restou também comprovado que a autora, comissionista pura, era deslocada das funções próprias de vendedora. Também nesse aspecto está comprovado o descumprimento de obrigação legal por parte da reclamada, a qual impôs prejuízos à obreira por todo o período imprescrito. Ademais, a prova dos autos confirma a irregularidade no pagamento de comissões. Ressalto que o requisito da imediatidade é atenuado no caso em exame. Isso porque a conduta tipificada no art. 483, "d", da CLT, qual seja, "não cumprir o empregador as obrigações do contrato", pressupõe, naturalmente, a reiteração do ato abusivo ao longo da prestação de serviços. Desse modo, é inviável a alegação de que a reclamante teria concordado tacitamente com as irregularidades praticadas pelo empregador. O direito do trabalho é composto, precipuamente, por normas imperativas, inafastáveis pela vontade das partes. Outrossim, o art. 468 da CLT não admite a aderência ao contrato de trabalho de condição ilícita. Por fim, a posição hipossuficiente do trabalhador na relação de emprego justifica a tolerância de situações prejudiciais, como forma de manutenção do emprego para sustento próprio e de sua família. Não cabe cogitar, pois, de desatualização da falta. Dessa maneira, restaram devidamente comprovadas as faltas patronais. Provejo para declarar a rescisão indireta do contrato de trabalho em 18/06/2024, deferindo-se o pagamento de saldo de salário, aviso prévio indenizado (63 dias), férias proporcionais acrescidas do terço constitucional, 13º salário proporcional, FGTS + 40% e reflexos do adicional de inspeção e fiscalização, salário substituição, insalubridade e diferença de comissões sobre aviso prévio indenizado e multa de 40%, tudo conforme se apurar em liquidação e observados os limites do pedido. Seriam devidas, ainda, as retificações na CTPS, entrega de guias, bem como a multa do art. 477, §8º, da CLT. Entretanto, esse não foi o entendimento da d. Maioria, a qual acompanhou a divergência lançada pelo Exmo. Juiz Convocado Leonardo Passos Ferreira, nos seguintes termos: "A reclamante pediu demissão, em 18/06/2024 (ID 46908dd). Ajuizou a presente ação em 28/07/2024. Não há qualquer alegação de vício no pedido de demissão, redigido de próprio punho e com indicação de que não cumpriria o aviso prévio. Se entendia a autora que as condições de trabalho eram inadequadas, a ensejar a ruptura indireta do vínculo empregatício, deveria ajuizar a respectiva ação trabalhista, com pedido de rescisão indireta, afastando-se do trabalho, se assim entendesse, conforme permissivo legal. Rompido o contrato de trabalho por iniciativa da trabalhadora no dia 18/06/2024, não havendo vício de vontade em seu pedido de demissão, não há como se acolher uma rescisão indireta de um contrato que já não existe. A propósito, oportuna a transcrição dos fundamentos lançados na sentença: "A considerar os termos da exordial e o documento de pedido de demissão, a autora é confessa quanto ao pedido de demissão, o qual foi livremente manifestado por ela que, à época, tinha inegável intuito de romper com o contrato havido com a reclamada. Nesse sentido, o fato de a autora, após tal manifestação, revolver eventuais desacertos vivenciados ao tempo do contrato laboral, não a legitima no pedido intencionado de convolar a demissão em rescisão indireta. Sem falar que a livre manifestação de vontade não se torna nula em razão do arrependimento, o qual sequer é tipificado como vício de vontade. Não houve coação patronal, tampouco pressão para que a autora pedisse demissão do emprego, sendo irrelevante perquirir- se sobre a sua lógica de raciocínio ou pessoal sentimento que deram ensejo àquela regular iniciativa. Manifestado o ato, este resta perfeito e acabado, surtindo os seus naturais efeitos, dada a inexistência de vício. Ademais, ante as violações contratuais supostamente perpetradas pela reclamada, a reclamante poderia ter suspendido a prestação de serviços e ajuizado uma ação trabalhista postulando a rescisão indireta do contrato de trabalho (art. 483, §3º, da CLT), o que não foi feito." Por tais razões, nego provimento ao recurso da reclamante no aspecto, mantendo a decisão de primeiro grau, que reconheceu a autora como demissionária e indeferiu a multa do art. 477, CLT". Provimento negado, vencida a Relatora. ACÓRDÃO Fundamentos pelos quais O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, por sua 7a.Turma, em sessão ordinária de julgamento realizada em 21 de julho de 2025, à unanimidade, conheceu dos recursos ordinários. No mérito, sem divergência, NEGOU PROVIMENTO ao recurso da reclamada e, por maioria de votos, PROVEU, EM PARTE, o da reclamante para: a) deferir o pagamento de diferenças de comissões, com reflexos, por todo o período imprescrito, no importe mensal de R$ 200,00; b) deferir o pagamento de 10% do valor das comissões recebidas a cada mês, com reflexos. Parâmetros de liquidação conforme fundamentos. Acresceu à condenação o valor de R$ 20.000,00, com custas adicionais, pela reclamada, no importe de R$ 400,00. Ficou parcialmente vencida a Relatora, que provia o apelo da reclamante para declarar a rescisão indireta e deferir os consectários legais. Presidiu o julgamento o Exmo. Desembargador Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto. Tomaram parte no julgamento: Exma. Desembargadora Cristiana Maria Valadares Fenelon (Relatora), Exma. Juíza convocada Daniela Torres Conceição (substituindo o Exmo. Desembargador Vicente de Paula Maciel Júnior) e Exmo. Juiz convocado Leonardo Passos Ferreira (substituindo o Exmo. Desembargador Fernando César da Fonseca). Presente a i. Representante do Ministério Público do Trabalho, Dra. Maria Helena da Silva Guthier. Sustentação oral: Dr. Lui Peterson Miranda de Souza. CRISTIANA MARIA VALADARES FENELON Relatora VOTOS BELO HORIZONTE/MG, 22 de julho de 2025. LUCIENE DUARTE SOUZA
Intimado(s) / Citado(s)
- DROGARIA ARAUJO S A
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