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Latam Airlines Group S/A x Gabriel Lucas Scardini Barros

ID: 295822120

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Turma Recursal Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL Nº Processo: 1001172-03.2025.8.11.0001

Data de Disponibilização: 11/06/2025

Polo Ativo:

LATAM AIRLINES GROUP S/A

Polo Passivo:

GABRIEL LUCAS SCARDINI BARROS

Decisão

Advogados:

GABRIELA MACHADO DE OLIVEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

FERNANDO ROSENTHAL

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE 3. PRIMEIRA TURMA GABINETE 3. PRIMEIRA TURMA RECURSO INOMINADO (460) 1001172-03.2025.8.11.0001 RECORRENTE: LATAM AIRLINES GROUP S/A… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE 3. PRIMEIRA TURMA GABINETE 3. PRIMEIRA TURMA RECURSO INOMINADO (460) 1001172-03.2025.8.11.0001 RECORRENTE: LATAM AIRLINES GROUP S/A RECORRIDO: GABRIEL LUCAS SCARDINI BARROS DECISÃO MONOCRÁTICA EMENTA DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO DE VOO E PERDA DE CONEXÃO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA COMPANHIA AÉREA. DANO MORAL CONFIGURADO. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Vistos etc. Trata-se de Recurso Inominado interposto pela TAM LINHAS AÉREAS S/A (LATAM AIRLINES BRASIL), conforme peça de ID 290667397, em face da sentença proferida pelo Juízo do 5º Juizado Especial Cível de Cuiabá (ID 290667394 e ID 290667395), nos autos da Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais ajuizada por GABRIEL LUCAS SCARDINI BARROS. A lide originária versa sobre pedido de reparação por danos decorrentes de atraso de voo e consequente perda de conexão, que teriam resultado em um atraso de aproximadamente nove horas para a chegada do autor ao seu destino final, além de falhas na prestação de assistência material pela companhia aérea. A sentença de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, condenando a empresa recorrente ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais e R$ 175,00 (cento e setenta e cinco reais) a título de danos materiais, referentes aos custos de hospedagem arcados pelo autor. Em suas razões recursais (ID 290667397), a recorrente sustenta, em síntese, que o atraso no voo inicial (LA3557) foi de apenas 1 hora e 49 minutos, decorrente de "efeito reacionário" de aeronave, o que configuraria, a seu ver, uma circunstância que não lhe acarretaria responsabilidade. Alega, ademais, ter prestado toda a assistência material cabível ao recorrido, em conformidade com a Resolução nº 400/2016 da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC). Argumenta pela inexistência de danos morais presumidos, invocando o artigo 251-A da Lei nº 14.034/2020 (Código Brasileiro de Aeronáutica), que condiciona a indenização por dano extrapatrimonial à efetiva demonstração do prejuízo. Pugna, assim, pelo afastamento da condenação por danos morais ou, subsidiariamente, pela sua minoração para patamares razoáveis. Requer, ainda, o afastamento da condenação ao pagamento de danos materiais, sob o fundamento de ausência de ato ilícito. O preparo recursal foi devidamente comprovado mediante as guias de ID 290667398 e o comprovante de pagamento de ID 290667399. O recorrido, GABRIEL LUCAS SCARDINI BARROS, apresentou contrarrazões (ID 290668352), pugnando pela manutenção integral da sentença vergastada, rechaçando os argumentos da recorrente e reiterando a ocorrência dos danos e a falha na prestação dos serviços. O recurso foi recebido apenas no efeito devolutivo, conforme decisões de ID 290668350 e ID 290668351. É o relatório. Decido. I. DA ADMISSIBILIDADE DO RECURSO Verifico que o recurso interposto é tempestivo, uma vez que a sentença foi proferida em 29/04/2025 (ID 290667394) e o recurso protocolado em 19/05/2025 (ID 290667397), respeitando o prazo legal. O preparo foi devidamente recolhido, conforme documentos de ID 290667398 e ID 290667399. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. II. DA FUNDAMENTAÇÃO Analiso, pormenorizadamente, as teses arguidas pela recorrente, adiantando que o recurso merece parcial provimento, unicamente no que tange ao quantum indenizatório fixado a título de danos morais. II.I. Da Alegada Ausência de Ato Ilícito, da Prestação de Assistência Material e da Excludente de Responsabilidade A recorrente principia sua argumentação buscando minimizar a extensão do atraso e caracterizar o evento como decorrente de "reacionário de aeronave", o que, em sua ótica, afastaria sua responsabilidade. Contudo, tal tese não encontra amparo nos elementos probatórios e na correta aplicação do direito à espécie. Inicialmente, cumpre rechaçar a alegação de que o atraso se limitou a 1 hora e 49 minutos. Os cartões de embarque colacionados aos autos (ID 290667380 – cartão de embarque inicial e ID 290667381 – cartão de embarque final) demonstram, de forma inequívoca, que a previsão original de chegada do recorrido a Florianópolis/SC era às 23:25 do dia 05/11/2024, tendo o desembarque ocorrido somente às 06:50 do dia 06/11/2024, o que perfaz um atraso total de aproximadamente 09 (nove) horas na chegada ao destino final. Essa disparidade temporal é substancial e não pode ser desconsiderada. No que concerne à justificativa apresentada pela recorrente – "reacionário de aeronave" –, entendo que tal circunstância se enquadra na categoria de fortuito interno. Problemas operacionais, logísticos ou de manutenção, que afetam a disponibilidade de aeronaves e a pontualidade dos voos, são inerentes ao risco da atividade empresarial explorada pela transportadora aérea. Não se trata, pois, de evento externo, imprevisível e inevitável, capaz de romper o nexo de causalidade e eximir a fornecedora de sua responsabilidade objetiva, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. A organização da malha aérea, a manutenção preventiva das aeronaves e a gestão de imprevistos operacionais são deveres da companhia, e eventuais falhas nesses processos não podem ser transferidas ao consumidor como causa excludente de responsabilidade. Quanto à alegada prestação de assistência material, a recorrente afirma ter cumprido as determinações da Resolução nº 400/2016 da ANAC. Todavia, a narrativa constante da petição inicial (ID 290667376), corroborada pela impugnação à contestação (ID 290667393), aponta para uma assistência deficiente. Embora tenha sido fornecido um voucher para pernoite, o recorrido relata que, ao chegar ao aeroporto de Congonhas/SP, foi informado da indisponibilidade de hotel na cidade de São Paulo, sendo-lhe oferecida hospedagem em Santos/SP, o que se mostrou inviável diante da distância e do exíguo tempo para descanso antes do voo remarcado. Tal situação culminou na necessidade de o autor arcar, por conta própria, com as despesas de hospedagem em São Paulo, conforme comprovante de pagamento do Hotel Kyoto (Doc. 06 - ID 290667382). A tela sistêmica apresentada pela recorrente em sua contestação (ID 290667390) é genérica e não comprova, de forma cabal, a efetiva e adequada prestação de toda a assistência material devida, especialmente no que tange à acomodação em local compatível com a espera e as necessidades do passageiro. Destarte, considero que restou configurada a falha na prestação do serviço pela recorrente, tanto pelo atraso expressivo na chegada ao destino final quanto pela assistência material inadequada fornecida ao consumidor. II.II. Do Dano Material A sentença de primeiro grau condenou a recorrente ao pagamento de R$ 175,00 (cento e setenta e cinco reais) a título de danos materiais, valor este correspondente à despesa com hospedagem custeada pelo recorrido, conforme comprovante anexado no Doc. 06 (ID 290667382). A recorrente pugna pelo afastamento desta condenação, argumentando a ausência de ato ilícito. Contudo, uma vez reconhecida a falha na prestação do serviço, que resultou na necessidade de o consumidor arcar com despesas extraordinárias e que deveriam ter sido cobertas pela companhia aérea (assistência material em caso de atraso superior a 4 horas, incluindo hospedagem, conforme art. 27, III, da Resolução nº 400/2016 da ANAC), a obrigação de ressarcir o prejuízo material efetivamente comprovado é medida que se impõe. O dano material está devidamente demonstrado pelo documento fiscal de ID 290667382, não havendo razões para a reforma da sentença neste particular. Assim, rejeito a tese recursal e mantenho a condenação por danos materiais no importe de R$ 175,00 (cento e setenta e cinco reais). II.III. Da Inaplicabilidade da Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor Observo que a petição inicial (ID 290667376) formulou pedido de indenização por desvio produtivo do consumidor no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais). A sentença de primeiro grau (ID 290667394), ao analisar os pleitos, consignou que "não há se falar em condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por dano temporal, porquanto os mesmos estão inseridos nos danos morais, os quais se mostram suficientes para ressarcir o tempo despendido para a solução do caso", julgando, portanto, improcedente este pedido específico de indenização autônoma por desvio produtivo. O recurso interposto pela empresa (ID 290667397) não se volta contra este capítulo da sentença, que lhe foi favorável. A recorrente, em sua peça de defesa (Contestação - ID 290667390), já havia impugnado a aplicabilidade da teoria do desvio produtivo. Dessa forma, não há interesse recursal da empresa quanto a este ponto, e a matéria não foi devolvida a esta Turma Recursal de forma a ensejar uma reforma que prejudique a recorrente. Apenas constato que a sentença já afastou a pretensão de indenização autônoma por desvio produtivo, e esta decisão monocrática não alterará tal conclusão. II.IV. Do Dano Moral e da Revisão do Quantum Indenizatório A questão central do presente recurso, e que comporta parcial acolhimento, reside na configuração do dano moral e, principalmente, na adequação do valor arbitrado a este título. A sentença de origem reconheceu o dano moral e fixou a indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais). A recorrente, por sua vez, sustenta a inexistência de dano moral indenizável ou, alternativamente, a necessidade de sua drástica redução, invocando, inclusive, o artigo 251-A do Código Brasileiro de Aeronáutica, que exige a demonstração do prejuízo extrapatrimonial. Entendo que a situação vivenciada pelo recorrido ultrapassou, de fato, a esfera do mero aborrecimento ou dissabor cotidiano. O atraso de aproximadamente nove horas para alcançar o destino final, a perda do voo de conexão, a incerteza quanto à resolução do problema, a falha na prestação da assistência material, notadamente a dificuldade em obter hospedagem adequada e a necessidade de arcar com tal despesa em um momento de vulnerabilidade, configuram um conjunto de transtornos que impuseram ao consumidor angústia, desconforto e frustração significativos, afetando sua tranquilidade e planejamento. Ainda que se considere a orientação de que o dano moral em casos de atraso de voo não é sempre in re ipsa, as particularidades do caso concreto, como a longa espera, a pernoite em cidade de conexão sem o amparo integral da companhia aérea e o dispêndio financeiro imprevisto para acomodação, evidenciam a lesão a direitos da personalidade do consumidor, justificando a reparação moral. A aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso é inafastável, sendo a responsabilidade da transportadora objetiva pelos danos causados aos seus passageiros em decorrência de falha na prestação do serviço. Todavia, no que tange ao quantum indenizatório, assiste parcial razão à recorrente. A fixação da indenização por danos morais deve pautar-se pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, levando-se em consideração a extensão do dano, a capacidade econômica das partes, o grau de culpa do ofensor e o caráter pedagógico-punitivo da medida, sem, contudo, ensejar enriquecimento sem causa para a vítima ou impor um ônus excessivamente gravoso ao ofensor. No caso dos autos, embora reprovável a conduta da companhia aérea, entendo que o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), fixado na sentença, mostra-se elevado diante das circunstâncias específicas. O principal prejuízo material direto e comprovado foi o custo da diária de hotel, no valor de R$ 175,00, o qual já está sendo devidamente ressarcido. Os demais transtornos, embora relevantes, não justificam, a meu ver, uma indenização moral no patamar estabelecido. Considerando a necessidade de encontrar um valor que, ao mesmo tempo, compense o recorrido pelos dissabores experimentados e sirva de desestímulo à reiteração de condutas semelhantes pela recorrente, sem configurar locupletamento indevido, reputo mais adequado e proporcional reduzir a indenização por danos morais para o montante de R$ 3.000,00 (três mil reais). Este valor cumpre as finalidades compensatória e pedagógica da reparação moral no contexto fático apresentado. II.V. Da Inversão do Ônus da Prova A decisão interlocutória de ID 290667383, proferida na fase inicial do processo, já havia deferido a inversão do ônus da prova em favor do consumidor, com fulcro no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor. A sentença de mérito (ID 290667394) aplicou tal inversão ao analisar as provas e a responsabilidade da fornecedora. A recorrente, em sua contestação (ID 290667390), manifestou insurgência quanto a essa inversão, e em seu recurso inominado (ID 290667397), embora não dedique um capítulo autônomo para impugnar especificamente a inversão do ônus probatório, tangencia o tema ao discutir a não comprovação dos danos morais. Mantenho o entendimento exarado pelo juízo a quo quanto à correta aplicação da inversão do ônus da prova no presente caso. A relação jurídica estabelecida entre as partes é inegavelmente de consumo, e a hipossuficiência técnica e informacional do consumidor frente à companhia aérea é manifesta, o que autoriza a aplicação da referida norma protetiva. Cabia à recorrente, portanto, demonstrar a inexistência de falha na prestação do serviço ou a ocorrência de alguma excludente de responsabilidade, ônus do qual não se desincumbiu satisfatoriamente, conforme já analisado. III. DO DISPOSITIVO Ante o exposto, com fulcro no artigo 932, inciso V, alínea 'a', do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente ao rito dos Juizados Especiais, e considerando a necessidade de adequação do julgado aos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade, CONHEÇO do Recurso Inominado interposto por TAM LINHAS AÉREAS S/A (LATAM AIRLINES BRASIL) e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para reformar em parte a sentença proferida pelo Juízo do 5º Juizado Especial Cível de Cuiabá (ID 290667394 e ID 290667395), o fazendo nos seguintes termos: a) REDUZO o valor da condenação a título de danos morais para R$ 3.000,00 (três mil reais), montante este que deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir da data desta decisão (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (artigo 405 do Código Civil), por se tratar de responsabilidade contratual. b) MANTENHO a condenação da recorrente ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 175,00 (cento e setenta e cinco reais), que deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir do desembolso (06/11/2024 – ID 290667382) e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação. c) Mantenho, nos demais termos, a sentença recorrida, inclusive quanto à improcedência do pedido de indenização por desvio produtivo do tempo e quanto aos critérios de atualização monetária e juros moratórios para períodos posteriores a 28/08/2024, conforme detalhado na sentença de primeiro grau, em observância à Lei nº 14.905/2024. Em razão do provimento parcial do recurso, deixo de condenar a parte recorrente ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, nos termos do artigo 55, caput, segunda parte, da Lei nº 9.099/95. Advirta-se, desde já, que eventual recurso contra esta decisão estará sujeita à multa (arts. 1021, §4º e 1026, §2º, do CPC. Publique-se. Intimem-se. EDUARDO CALMON DE ALMEIDA CÉZAR Juiz de Direito – Relator

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