Processo nº 8003042-45.2021.8.05.0138
ID: 300536372
Tribunal: TJBA
Órgão: 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 8003042-45.2021.8.05.0138
Data de Disponibilização:
17/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GIOVANNA BASTOS SAMPAIO CORREIA
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003042-45.20…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003042-45.2021.8.05.0138 Órgão Julgador: 1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA AUTOR: SILVIA MARIA FERNANDES SUZART RODRIGUES Advogado(s): BRUNO ROBERIO GARCIA MELO LOPES DE ARAUJO (OAB:BA34609) REU: BANCO MASTER S/A Advogado(s): GIOVANNA BASTOS SAMPAIO CORREIA (OAB:BA42468) SENTENÇA I - RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO REVISIONAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS proposta por SILVIA MARIA FERNANDES SUZART RODRIGUES em face de BANCO MÁXIMA S/A, partes qualificadas, sob o relato sucinto de que em novembro de 2018 firmou por telefone empréstimo consignado junto a ré no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) e, em março de 2019, contratou novo empréstimo no valor de R$ 2.172,60 (dois mil cento e setenta e dois reais e sessenta centavos), no qual , apenas foi-lhe informado o valor total disponível para empréstimo, sem qualquer menção ao custo efetivo total da transação, quantidade de parcelas ou mesmo ao percentual de juros aplicado. No entanto, afirma que pensou tratar-se de empréstimo consignado comum e não saque de limite cartão de crédito, modalidade muito mais onerosa. Requereu, dentre outros, gratuidade da justiça e, no mérito, que seja declarada a nulidade do cartão de crédito e que sejam fixados os parâmetros do contrato de empréstimo consignado, com base nas taxas praticadas no mercado em favor de servidores públicos, ao tempo da contratação, considerando os valores de R$ 7.000,00 (sete mil reais) e R$ 2.172,60 (dois mil cento e setenta e dois reais e sessenta centavos) disponibilizados em conta corrente para o consumidor, bem como restituição em dobro e indenização por danos morais. Despacho inaugural concedendo a gratuidade da justiça (id.151101333) Citado, o réu apresentou contestação (id.187939788), cujas ponderações de sua defesa serão analisadas no mérito desta sentença. Tentativa de conciliação inexitosa (id.188293634) O demandante manifestou-se da contestação, apresentando réplica (id.191477747) Vieram-me os autos conclusos. Fundamento e decido. II - FUNDAMENTAÇÃO Questão Prévia: A impugnação à gratuidade da justiça gratuita trata-se de meio pelo qual a parte adversa pode impugnar concessão de gratuidade àqueles que se encontram fora da situação de pobreza. Carecendo nesta situação, da comprovação. É premissa de que quem alega tem de provar e não conjecturar, porém a ré não cumpriu o ônus que lhe compete. Não trouxe, a Ré nada que depusesse contra o pleito dos ora impugnado ao benefício da assistência judiciária gratuita. Se realmente visava à revogação do benefício temporário, que, ao menos, trouxesse um mínimo de prova sobre a alegada boa saúde financeira do Impugnado. A Lei 1.060/50, no seu art. 4º, de fato afirma que o benefício há de ser deferido mediante simples alegação de carência de condições de arcar com as custas do processo presumindo-se a pobreza até prova em contrário. E essa prova, no caso dos autos, não foi produzida. Rejeito a preliminar. Presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, oportuno o julgamento imediato do mérito no presente caso, a teor do disposto no art. 355, I, do Código de Processo Civil. Tal dispositivo autoriza o juiz a julgar prontamente a demanda, quando não houver necessidade de fazer prova em audiência, tendo em vista que a lide versa, primordialmente, sobre relação contratual, onde as provas documentais são primordiais para a elucidação do juiz quanto a licitude da conduta da demandada, sendo despicienda a produção de demais provas pelas partes. Não se pode olvidar que cabe ao juiz, como destinatário da prova, decidir sobre a produção de provas necessárias à instrução do processo e ao seu livre convencimento, indeferindo aquelas que se apresentem desnecessárias ou meramente protelatórias, nos termos do artigo 370, § único, do Código de Processo Civil. Sobre o tema, leciona ARRUDA ALVIM: "Além do dever de o juiz vedar a procrastinação do feito, cabe-lhe impedir diligências probatórias inúteis ao respectivo objeto (art. 130), que, aliás, são também procrastinatórias. Desta forma, não há disponibilidade quanto aos meios de prova, no sentido de a parte poder impor ao juiz provas por ele reputadas inúteis (relativamente a fatos alegados, mas não relevantes), como procrastinatórias (relativamente à produção de provas sem necessidade de expedição de precatória ou rogatória, mas, antes de outro meio mais expedito)" (Manual de Direito Processual Civil, 6ª ed., II/455). Superadas as preliminares, passo ao exame do mérito. Verifica-se que se trata de uma típica relação de consumo, onde a empresa requerida figura como prestadora de serviços, enquanto a autora, apresenta-se como consumidora, aplicando-se portanto, as disposições do CDC, visto que se dá entre consumidor e fornecedor, nos termos dos arts. 1°, 2° e 3° do CDC. Cediço que o ônus da prova de um fato ou de um direito cabe a quem o alega. Por essa razão o Código de Processo Civil, em seu artigo 373, estabeleceu que incumbe ao autor provar o fato constitutivo de seu direito, e ao réu a prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral. No entanto, faz-se mister ressalvar que tal disciplinamento só deve ser aplicável quando se estiver diante de uma relação jurídica em que ambas as partes estejam em condições de igualdade e quando a causa versar sobre direitos disponíveis, o que não ocorre no caso dos autos. Neste sentido, ensina SÉRGIO CAVALIERI FILHO: "Consciente das desigualdades existentes entre os sujeitos de uma relação jurídica de consumo, e da vulnerabilidade processual que também caracteriza o consumidor, estabeleceu o art. 6º, VIII, da Lei nº 8.078/90, como direito básico deste, a facilitação da defesa de seus interesses em juízo, inclusive com a possibilidade de ser invertido o ônus da prova, em seu favor e a critério do juiz, quando estiver convencido o julgador da verossimilhança das alegações daquele, ou, alternativamente, de sua hipossuficiência (em sentido amplo)". Neste contexto, estabelece o art. 6º do CDC que: "Art. 6º São direitos básicos do consumidor: […] VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências." Ademais, havendo defeito ou falha no serviço, a inversão do ônus da prova é ope legis, isto é, por força da lei, consoante regra estatuída no art. 14, § 3º, da Lei n. 8.078/90. Em decorrência do instituto da inversão do onus probandi, transfere-se para o fornecedor o ônus de provar que o alegado pela parte autora não corresponde à verdade dos fatos. O cerne da controvérsia reside, consubstancialmente, no suposto ato ilícito praticado pela ré quanto à suposta substituição de empréstimo consignado tradicional, por outra operação de crédito mais onerosa para o consumidor. A instituição financeira ré, por seu turno, em síntese, afirma que além da autora ter realizado compras com seu cartão, solicitou quatro serviços de saque, recebendo a quantia total de R$ 11.344,26 (onze mil, trezentos e quarenta e quatro reais e vinte e seis centavos), via call center em 09/11/2018, 19/03/2019, 21/03/2019 e 12/07/2019. É certo que os contratos bancários estão sujeitos ao CDC, conforme seu art. 3º e a Súmula n. 297 do STJ ("O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.") e assim informados por vários princípios contratuais gerais, como o da obrigatoriedade e autonomia da vontade, mitigados, porém, por normas sociais e de ordem pública como maneira de intervenção e dirigismo contratual estatal, para compensar a vulnerabilidade fática e técnica. Além disso, o ajuste que respeita as regras gerais e/ou consumeristas sempre adquire eficácia plena e força vinculante para os contratantes, espelhando um negócio jurídico perfeito. Por outro lado, a revisão contratual é excepcional, com tratamento em três dispositivos do Código Civil integrantes da Seção que cuida da resolução do contrato por onerosidade excessiva (arts. 478, 479 e 480). Com efeito, da análise das circunstâncias do caso em concreto, estamos diante de uma peculiaridade, no qual, a presente ação merece uma atenção pormenorizada. No caso dos autos, importante frisar que o "Programa Credicesta" foi instituído através Decreto Estadual nº 18.353/2018, como uma linha de crédito pré-aprovado com intuito de apoiar e facilitar a aquisição de bens e serviços para servidores públicos, mediante uma margem de consignação em folha de pagamento de 30% sobre remuneração líquida: " Art. 2º O Programa Credicesta consiste em uma linha de crédito pré-aprovada que assegura, inclusive mediante o uso do Cartão do Programa Credicesta, uma margem de consignação em folha de pagamentos de 30% (trinta por cento) da remuneração líquida dos beneficiários do Programa." Nesse contexto, o decreto estabelece que o acesso ao crédito será facilitado por meio de um cartão associado ao programa, garantindo ao empreendedor comercial a capacidade de expandir ou melhorar as funcionalidades desse cartão. É importante destacar que o consumidor que deseja participar do "Programa Credicesta", deve autorizar explicitamente os descontos em folha no momento da contratação: "Art. 3º Ao detentor dos direitos de exploração comercial relativos ao Cartão do Programa Credicesta é assegurado modificar, ampliar, aperfeiçoar ou, por quaisquer mecanismos viáveis e juridicamente legítimos, diversificar as funcionalidades do cartão referido, a este podendo associar a ampliação da rede de compras e a contratação de serviços, inclusive comerciais, creditícios, financeiros, securitários e congêneres. (...) Art. 5º O beneficiário interessado em participar do Programa Credicesta deverá autorizar, por meio físico ou eletrônico, os descontos em seu contracheque a título de ressarcimento de eventuais lançamentos, no parágrafo único do art. 57 e no art. 58, ambos da LEI nº 6.677, de 26 de setembro de 1994." Pois bem. Não se desconhece que é permitida a contratação por meio eletrônico, mediante a clara e devida autorização dada pelo mutuário para que o pagamento de eventuais parcelas ajustadas seja realizado mediante descontos junto a conta-corrente, todavia, a validade destas operações deve ser demonstrada por meio de prova irrefutável da manifestação de vontade e aceite do consumidor/requerente, no sentido de aderir aos termos da contratação que será realizada e autorizar. Com efeito, da análise meticulosa dos documentos encartados aos autos, mormente a gravação via call center realizada pelo preposto da empresa ré junto a parte autora (id.187939793 e seguintes), percebe-se, claramente, que não restou demonstrado que o autor foi regularmente informado acerca de todas as cláusulas, taxas de juros e os exatos termos da contratação, ficando claro, ademais, que aquela objetivava contratar um mútuo com parcelas fixas e mensais. Entendo que as informações e esclarecimentos devem ser prestados de forma clara e objetiva pela ré, de modo a certificar que o consumidor de fato entendeu todas as nuances da transação, o que não ocorreu no caso dos autos. Não obstante, ainda que se cogite da possibilidade de contratação de empréstimo via telefone, entendo ainda que deve ser fornecido documento escrito, dentro das formalidades exigidas em lei, a fim de que o consumidor tenha pleno e completo acesso a todas as normas e condições que embasam a contratação realizada, conforme preceitua o art. 784, inciso II, do CPC, sendo requisito essencial para garantir a validade do título executivo extrajudicial. Desta forma, tenho que o caso dos autos circunda o direito à informação ampla, que é corolário do princípio da boa-fé objetiva e do princípio da confiança, expressamente consagrados na legislação consumerista, nos moldes do art. 4º, inc. III, do Código de Defesa do Consumidor, sendo certo que fornecedor e consumidor devem agir com lealdade e confiança na busca do fim comum (adimplemento das obrigações respectivas), protegendo-se, assim, as legítimas expectativas de ambas as partes. Ademais, a Constituição Federal, em seu artigo 170, inciso V, introduziu a figura do consumidor como agente econômico e social, estabelecendo de forma expressa como princípio da ordem econômica a defesa do consumidor, possibilitando a intervenção do Estado nas relações privadas, de modo a garantir os direitos fundamentais dos cidadãos. Assim, a intervenção do Estado na atividade econômica encontra autorização constitucional quando tem por finalidade proteger o consumidor. Notadamente o réu não prestou o dever adequado de informação ao consumidor, vez que claramente o induziu a erro, a não dispor em contrato, inequivocamente, o valor total das parcelas, bem como os juros que seriam aplicados. Outrossim, à época das referidas contratações, a autora já era considerada pessoa idosa, o que me leva a crer que o réu agiu com desídia ao não cumprir com a obrigação de informar ao mesmo os valores que seriam descontados de sua conta. Em observância ao princípio da "pacta sunt servanda", o contrato, em princípio, deve ser cumprido como celebrado, relativizando-se tal princípio na hipótese de ilegalidades e cláusulas contratuais abusivas. Assim sendo, é possível, no nosso ordenamento jurídico, a revisão de contratos diante da alegação de existência de abusividades, sobretudo pela aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor à espécie, nos termos de seu artigo 6º, inciso V, hipótese que se amolda ao caso em comento. Destarte, possível se revela a revisão da contratação para fins de afastamento dos excessos porventura apurados, sob pena de gerar desequilíbrio entre os contratantes, o que é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, eis o trato jurisprudencial em casos análogos: "EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO FIRMADO VIA "CALL CENTER"/TELEMARKETING. CONTRATAÇÃO INVÁLIDA. DESCONTOS INDEVIDOS A TÍTULO DE PRÊMIO DE SEGURO. RESTITUIÇÃO. DANO MORAL. CRITÉRIO. REDUÇÃO DESCABIDA. - É direito do consumidor a informação precisa sobre o produto ou serviço, sendo corolário dos princípios da boa-fé objetiva, confiança e transparência - Não comprovada a contratação válida da apólice de seguro, que se deu via "call center"/telemarketing, porquanto não demonstrado que a consumidora tenha anuído, de forma consciente e livre, com o produto ofertado, nem que tenha autorizado a estipulante a realizar os descontos em sua conta corrente - É devida a restituição dos descontos mensais relativos aos prêmios - Os descontos indevidos de valores junto a benefício previdenciário configura ato ilícito causador de dano moral - O arbitramento econômico do dano moral deve ser realizado com moderação, em atenção à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes. Não se pode olvidar da necessidade de desestimular o ofensor a repetir o ato, consoante a jurisprudência pátria. (TJ-MG - AC: 50003786620228130710, Relator: Des.(a) Cláudia Maia, Data de Julgamento: 10/02/2023, Câmaras Cíveis / 14ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 10/02/2023) "SEGURO DE VIDA - COBRANÇA INDEVIDA DE SERVIÇOS NÃO CONTRATADOS - DÉBITO AUTOMÁTICO EM CONTA CORRENTE - DIREITO DO CONSUMIDOR. Ação de repetição de indébito cumulada com pedido de indenização por danos morais e obrigação de não fazer. Parcial procedência. Recurso da autora, buscando a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais e à devolução em dobro dos valores indevidamente cobrados e debitados pelos réus - DANO MORAL - OCORRÊNCIA - A autora suportou descontos indevidos em seu benefício de aposentadoria, de natureza alimentar, mais de uma vez por mês, por quase dois anos, mesmo após impugnação específica e expressa aos réus, que retornaram a realizar as cobranças, o que por si só gera o dano moral indenizável - DEVOLUÇÃO EM DOBRO - CABIMENTO - O artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor determina a devolução em dobro de valores indevidamente cobrados do consumidor - Réus que permaneceram cobrando e descontando os valores da conta corrente da autora, mesmo após impugnação específica pela consumidora - Devolução em dobro que é medida que se impõe - Sentença parcialmente reformada - Redistribuição do ônus da sucumbência e majoração da verba honorária - Inteligência do artigo 85, parágrafo 11, do Código de Processo Civil - Recurso provido. (TJ-SP - AC: 10036791820198260004 SP 1003679-18.2019.8.26.0004, Relator: Carlos Nunes, Data de Julgamento: 18/06/2020, 31ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/06/2020)" APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO PESSOAL. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS MUITO ACIMA DA MÉDIA DO MERCADO. ABUSIVIDADE CONSTATADA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA O comportamento da Apelante não observou as cautelas necessárias, e, diante dos elementos de convicção trazidos aos autos, os pressupostos necessários para gerar o dever de indenizar por danos morais restaram demonstrados, sobretudo, pois de um lado, temos uma instituição financeira robusta que violou princípios do Código de Defesa do Consumidor, como da boa-fé, probidade e da função social do contrato, incorrendo em falha na prestação do serviço; do outro lado, uma consumidora com um contrato de adesão com juros abusivos obrigando-a a quitar dívida muito superior ao valor emprestado, condição suficiente a violar direito da personalidade, circunstâncias que caracterizam sua má-fé, o que supera, em muito, o mero aborrecimento do cotidiano. O dano moral advém da postura abusiva e desrespeitosa da empresa, impondo o arbitramento de valor indenizatório justo e adequado ao caso, arcando a ré ainda com os ônus da sucumbência. Recurso conhecido e provido. Ausente o interesse Ministerial. (TJ-AM - Apelação Cível: 0421886-96.2023.8.04.0001 Manaus, Relator: Joana dos Santos Meirelles, Data de Julgamento: 30/11/2023, Primeira Câmara Cível, Data de Publicação: 30/11/2023) APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. RMC. ABUSIVIDADE. DANO MORAL NÃO DEMONSTRADO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A presente hipótese consiste em examinar o eventual caráter abusivo da celebração do negócio jurídico denominado ?cartão de crédito consignado?, bem como a pretensão de restituição, em dobro, do montante das parcelas descontadas em folha de pagamento e, finalmente, a possibilidade de compensação por danos morais. 2. O termo de adesão assinado pela recorrente padece da ausência de informações suficientes a respeito das condições de pagamento do montante mutuado. 3. O direito à informação ampla é corolário do princípio da boa-fé objetiva e do princípio da confiança, expressamente consagrados na legislação consumerista (art. 4º, inc. III, do Código de Defesa do Consumidor), sendo certo que fornecedor e consumidor devem agir com lealdade e confiança na busca do fim comum (adimplemento das obrigações respectivas), protegendo-se, assim, as legítimas expectativas de ambas as partes. 4. Eventual quantia cobrada a maior deverá ser devolvida ao demandante de modo simples pois no presente caso não ficou caracterizada a hipótese prevista no art. 42 do Código de Defesa do Consumidor. 5. O fato de ter a autora ter contratado empréstimo sem informações claras a respeito de seu modo de pagamento, isoladamente, não é suficiente para causar interferência em sua esfera jurídica extrapatrimonial. 6. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJ-DF 07145085320198070007 1703421, Relator: ALVARO CIARLINI, Data de Julgamento: 17/05/2023, 2ª Turma Cível, Data de Publicação: 07/06/2023)(grifos acrescidos) Outrossim, o descumprimento do dever de informação gera dano moral in re ipsa em favor do consumidor enquanto presumidamente vulnerável, fazendo jus à indenização, cujo arbitramento deve operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes, atendendo aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, observadas as peculiaridades do caso e em atenção a sua finalidade compensatória e preventiva. Sob tal prisma, a hipótese dos autos abriga a ocorrência de dano moral decorrente da falha na prestação de serviços de empresa de grande porte, para a qual a fixação de valores demasiadamente reduzidos não representaria efetivo desestímulo à reiteração da conduta, no caso, manifestamente ilegal. Assim, recai perfeitamente nos moldes dos art. 186 e 927 do Código Civil. Sabendo que os danos morais são presumidos e independem de prova do prejuízo sofrido, deve, a parte autora, ser indenizada, porque inequívoco o transtorno ocasionado para esta. Logo, resta evidente a responsabilidade do Banco réu, cabendo avaliar o evento danoso. O dano moral, geralmente, é definido como aquele dano causado injustamente por alguém a outra pessoa, o qual não atinge ou diminui o patrimônio material (conjunto de valor econômico) da vítima, ou seja, do qual não resulta uma perda pecuniária. O patrimônio atingido pelo dano moral se diz patrimônio ideal ou o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico (patrimônio desmaterializado). Na fixação do quantum deve-se ter em mente o fim de proporcionar ao ofendido uma compensação monetária pelo sofrimento vivido, sem prejuízo de impor ao ofensor uma sanção de cunho pedagógico e intimidativo, com o objetivo de desestimulá-lo a reincidir no evento de que cuidam os autos. Por fim, procedendo à convergência dos caracteres consubstanciadores da reparação pelo dano moral, quais sejam, o punitivo, para que o causador do dano, pelo fato da condenação, se veja castigado pela ofensa perpetrada e o compensatório para a vítima, que receberá uma soma de dinheiro que lhe proporcione prazeres como contrapartida pelo mal sofrido, fixo a indenização devida pela ré, em R$ 10.000,00 (dez mil reais), considerando, para tanto, sua condição econômica, o grau de culpa do réu, a recalcitrância na prática sistemática de condutas ilícitas idênticas contra aposentados, e, ainda, ao disposto no art. 944 do Código Civil. Nesse diapasão, ante irregularidade do pacto discutido, é devida a restituição dos valores debitados da conta do acionante, uma vez que sua inobservância enseja o enriquecimento sem causa, expressamente vedado pelo art. 884 do Código Civil/2022. Oportuno trazer à baila, o entendimento esposado pela Corte Especial do STJ, quando do julgamento dos EAREsp 676.608/RS, que pacificou entendimento acerca do tema previsto no parágrafo único do art. 42, do CDC, entendendo cabível a repetição de indébito, na forma dobrada, quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, sendo, portanto, desnecessário averiguar a natureza do elemento volitivo da conduta, modulando seus efeitos para pagamentos realizados após 30/03/2021, a partir de quando a repetição de indébito deverá ocorrer na forma dobrada. Todavia, amparado no entendimento esposado pelo STJ e na modulação dos efeitos fixado no acórdão paradigma, a restituição, in casu, deve ocorrer na forma simples, com respeito aos valores descontados antes de 30/03/2021, e em dobro para os descontos realizados após o referido marco temporal, cujo valores deverão ser apurados em sede de liquidação de sentença. Outrossim, como consequência da presente decisão, apesar do contrato ser considerado irregular, verifico que demandado demonstrou que teria sido creditado na conta do autor os valores correspondentes, conforme comprovante de transferência juntados no id.431271666 e corroborados no ofício encaminhado pela Casa Financeira juntado no id.487054011, e que não foram devolvidos à instituição financeira, pelo que entendo que uma decisão judicial para ser correta e justa, também não pode permitir o enriquecimento sem causa de uma das partes. Verificando-se ainda que ambas as partes são credoras e devedoras, a compensação prevista no artigo 368 do CC, deve ser aplicada, no momento do encontro de contas entre elas, nos moldes da parte dispositiva. Sobre o tema, têm-se o seguinte julgado: "Recurso Inominado nº.: 1024833-50.2021.8.11.0001 Origem: Segundo Juizado Especial Cível de Cuiabá Recorrente (s): DENISE PEREIRA JAUDY Recorrido (s): BANCO MERCANTIL DO BRASIL S/A Juiz Relator: Marcelo Sebastião Prado de Moraes Data do Julgamento: 28/04/2022 EMENTA RECURSO INOMINADO - RELAÇÃO DE CONSUMO - CONTRATO BANCÁRIO - EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - CONTRATO COM ASSINATURA DIVERGENTE - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - INSURGÊNCIA DA PARTE RECLAMANTE - NEGATIVA DE CONTRATAÇÃO - DANO MORAL OCORRENTE - DEVOLUÇÃO DO VALOR PARA NÃO CONFIGURAR ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA - COMPENSAÇÃO DE VALORES - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Nas relações de consumo o ônus da prova é invertido, devendo a empresa desconstituir as provas colacionadas pela parte autora. Ante a demonstração de realização de empréstimo não solicitado pelo consumidor, deve ser reformada a sentença que julgou improcedente a ação. Ocorre ainda o dano moral, pelo prejuízo financeiro na aposentadoria, causando dor, angústia e humilhação suficientes a gerar a indenização pelos danos morais, cabendo ao magistrado a fixação de valores dentro da razoabilidade e proporcionalidade. O valor indevidamente recebido em conta corrente deve ser devolvido ao reclamado para não configurar o enriquecimento sem causa, com a compensação de valores, nos moldes do artigo 368 do C.C. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJ-MT 10248335020218110001 MT, Relator: MARCELO SEBASTIAO PRADO DE MORAES, Data de Julgamento: 28/04/2022, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 29/04/2022)". Então, por óbvio, a evitar o locupletamento sem causa, a parte tem que devolver o valor, sob pena de enriquecimento ilícito. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, extingo o processo com resolução do mérito (art. 487, inciso I, do CPC), e por conseguinte, JULGO PROCEDENTE a pretensão inicial para: Condenar o Réu a pagar a parte autora o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais, acrescidos de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, contados a partir da citação válida e correção monetária pelo INPC, a partir da data desta sentença; Condenar o Réu, à título de danos materiais, todo o valor descontado na conta corrente do autor na modalidade simples, com respeito aos valores descontados antes de 30/03/2021, e em dobro para os descontos realizados após o referido marco temporal, referente aos contratos de "CrediCesta" objetos da lide, a ser corrigida monetariamente até o efetivo pagamento, aplicando-se juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da data da citação (art. 406, CC) e; Declarar nulo os contratos do Programa Credicesta objetos da lide, que originou tais descontos. A fim de evitar locupletamento indevido, determino que a parte autora realize o depósito judicial os valores que teriam sido indevidamente depositados em conta de sua titularidade, devendo ocorrer a subsequente expedição de alvará em nome da instituição requerida BANCO MASTER S/A para que a mesma possa efetuar a retirada dos mesmos, no prazo que fixo em 30 (trinta) dias, a contar do trânsito em julgado. Condeno o réu ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios de sucumbência, estes no valor de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. Advirto às partes que eventuais embargos de declaração interpostos sem a estrita observância das hipóteses de cabimento previstas no art. 1.022 do CPC ou destinados a rediscutir matéria já apreciada, serão considerados manifestamente protelatórios e a parte embargante será sancionada nos termos do art. 1.026 do mesmo diploma, sem prejuízo de condenação de multa por litigância de má-fé, quando for o caso. Publique-se. Intimem-se, por seus advogados. Após as formalidades legais, arquivem-se os autos. Com o escopo de garantir a efetividade e celeridade processual, atribuo força de mandado/ citação/ intimação/ notificação e/ou ofício ao presente pronunciamento judicial. Jaguaquara - BA, data da assinatura digital. ANDRÉA PADILHA SODRÉ LEAL PALMARELLA Juíza de Direito kb
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