Processo nº 5301989-34.2019.8.09.0051
ID: 323097234
Tribunal: TJGO
Órgão: 1ª Câmara Cível
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5301989-34.2019.8.09.0051
Data de Disponibilização:
11/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FERNANDO EVARISTO PINHEIRO DE LEMOS
OAB/GO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Desembargador Héber Carlos de Oliveira
APELAÇÃO CÍVEL N. 5301989-34.2019.8.09.0051
COMARCA DE GOIÂNIA
JUIZ DE 1º GR…
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Desembargador Héber Carlos de Oliveira
APELAÇÃO CÍVEL N. 5301989-34.2019.8.09.0051
COMARCA DE GOIÂNIA
JUIZ DE 1º GRAU: ALESSANDRA GONTIJO DO AMARAL
1ª CÂMARA CÍVEL
APELANTE : SPE BAMBUÍ VACA BRAVA LTDA
APELADO : NIVALDO DA SILVA JÚNIOR
RELATOR : DESEMBARGADOR HÉBER CARLOS DE OLIVEIRA
VOTO
1. DA CONTEXTUALIZAÇÃO DA LIDE
Como visto, trata-se de apelação cível interposta por SPE BAMBUÍ VACA BRAVA LTDA contra a sentença proferida pela Juíza de Direito da 19ª Vara Cível e Ambiental da Comarca de Goiânia, Dra. Alessandra Gontijo do Amaral, nos autos da ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais ajuizada por NIVALDO DA SILVA JÚNIOR, qualificados.
A pretensão inicial informa que o autor firmou com a ré um contrato de compra e venda de imóvel e efetuou o pagamento de todas as parcelas. Alegou que o imóvel foi entregue com vícios de qualidade, em desconformidade com o memorial descritivo, consistentes em infiltrações nas paredes, piso manchado sem o devido desnível, rachaduras no gesso do teto, problemas hidráulicos e defeito na cortina de vidro. Requereu a substituição do piso, a reparação dos demais vícios e indenização por danos morais.
A ré apresentou contestação (mov. 30), onde alega ausência de interesse processual e de danos morais, e que o autor não permitiu a realização dos reparos no piso.
Laudo pericial colacionado na mov. 131.
Instados, o autor manifestou favorável ao laudo, enquanto a parte ré se manteve inerte (mov. 135 e 136).
O despacho de mov. 139 intimou o perito para elaborar laudo complementar.
Laudo complementar jungido na mov. 147.
Intimados, a parte ré concordou com o laudo complementar, enquanto o autor discorreu que realizou os reparos (mov. 151 e 152).
A decisão de mov. 154 homologou o laudo pericial e determinou a intimação das partes para manifestarem se persiste o interesse na produção de prova oral ou se requerem o julgamento da lide com as provas já produzidas.
A sentença ora recorrida (mov. 165), restou assim assentada:
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na exordial, para condenar a requerida:
1. A realizar a substituição do piso do imóvel do autor por outro da mesma espécie e de qualidade, conforme memorial descritível do imóvel, no prazo máximo de 90 (noventa) dias, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia de atraso, limitada a R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Fica ressalvada a possibilidade de conversão, caso não cumprida a obrigação.
2. Ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), acrescido de correção monetária pelo INPC a partir do presente arbitramento (Súmula 362/STJ) e juros de mora de 1% desde a citação.
3. Tendo em vista a sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento de honorários sucumbenciais, estes fixados em 20% (vinte por cento) sobre o proveito econômico obtido pelo autor, bem como às custas processuais, na proporção de 30% (trinta por cento) a cargo do autor e 70% (cinquenta por cento) a cargo do requerido.
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de admissibilidade a ser exercido pelo juízo a quo (art. 1.010, CPC), sem nova conclusão intime-se a parte contrária, caso possua advogado, para oferecer contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias. Em havendo recurso adesivo, também deve ser intimada a parte contrária para oferecer contrarrazões. Após remetam-se os autos ao TJGO para apreciação do recurso de apelação.
Por fim, proceda-se a Escrivania a habilitação dos advogados mencionados na mov. 164.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Transitada em julgado, arquivem-se.
Cumpra-se.
ALESSANDRA GONTIJO DO AMARAL
Juíza de Direito.
Inconformada com a sentença prolatada (mov. 165), SPE BAMBUÍ VACA BRAVA LTDA, dela recorre (evento n. 168).
Nas razões recursais, sustenta que: 1) a sentença foi proferida em contradição à prova pericial, que isenta a culpa da apelante, pois a perícia concluiu que o vício decorreu da fabricação das peças e o art. 18 do CDC responsabiliza o fornecedor do produto, não o prestador do serviço da obra; 2) a apelante ofereceu novo tratamento para solucionar o problema, que foi negado pelo apelado, o que demonstra sua boa-fé, sendo que o autor não permitiu que a ré finalizasse o serviço; 3) inexistem danos morais, pois o defeito no piso não passou de um entrave estético, não havendo necessidade de desocupação do imóvel ou risco à integridade do apelado. Requer o provimento do recurso para reformar a sentença.
Na manifestação apresentada na mov. 171, SPE BAMBUÍ VACA BRAVA LTDA, traz aos autos suposto fato novo alegando que a parte autora realizou a venda do imóvel, oportunidade em que pede a cassação da sentença por ilegitimidade superveniente.
Petição de evento 173 onde o autor/apelado argumenta que a obrigação de troca do piso permanece válida e exigível, mesmo após a venda do imóvel.
2. DA ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, estando devidamente preparado, tempestivo e observando o princípio da dialeticidade. Portanto, merece conhecimento.
3 – DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE SUPERVENIENTE
Inicialmente, cumpre analisar a preliminar arguida pela apelante em petição autônoma (mov. 171), na qual alega ilegitimidade superveniente do autor em razão da suposta venda do imóvel.
A preliminar não merece prosperar. A alienação do bem após o ajuizamento da demanda não afeta a legitimidade do autor originário para prosseguir na lide, especialmente quando se trata de vícios preexistentes à venda. A obrigação de reparar os defeitos construtivos permanece exigível da construtora, independentemente da posterior transferência do domínio.
Ademais, tratando-se de vício redibitório preexistente, o direito já estava incorporado ao patrimônio do autor quando da propositura da ação, não se cogitando de perda superveniente da legitimidade.
Assim, haure-se que a alegação de que após a interposição do recuso de apelação a parte autora “vendeu a unidade imobiliária, caracterizando a perda superveniente do objeto da lide”, não merece guarida.
Também porque, a legitimidade passiva da ré é patente, restou incontroverso que a venda e compra foi firmada entre a autora e a ré quanto ao imóvel situado à "Rua 237, Qd. 553, Lt. 05/09, n. 85, apto. 1602, Edifício Palco Vaca Brava, Setor Jardim América, Goiânia-Goiás, CEP: 74.290-140", conforme Escritura Pública de Compra e Venda (mov. 01 / arq. 03). A construção da unidade se deu sob a responsabilidade da ré, bem como sua fiscalização acerca dos respectivos serviços.
Inclusive, nos termos do art. 618 do Código Civil, “Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo”.
As obrigações propter rem se vinculam à titularidade de um direito real, independentemente da manifestação de vontade do titular, e, são, assumidas "por causa da coisa" (propter rem), e por isso elas aderem à coisa e não à pessoa que as contraiu.
Nesse sentido, mutatis mutandis:
EMENTA: DUPLA APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO. EXECUÇÃO DE TAXA CONDOMINIAL. PENHORA DE UNIDADE DEVEDORA. OBJETO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. RESPONSABILIDADE DO PROMITENTE COMPRADOR SOMENTE A PARTIR DA EFETIVA POSSE DO BEM. ILEGALIDADE DA PENHORA. PRECEDENTES DO STJ. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.1. As obrigações propter rem, se vinculam à titularidade de um direito real, independentemente da manifestação de vontade do titular, e, por isso, são transmitidas a todos os que lhe sucederem em sua posição; são, pois, assumidas "por causa da coisa" (propter rem), e por isso elas aderem à coisa e não à pessoa que contraiu, podendo a responsabilidade pelo débito ser imputado independentemente de quem seja o titular do domínio ou detenha a sua posse.2. (…) 4. Na oposição de embargos de terceiro, quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários advocatícios, consoante o entendimento sumular n° 303 do STJ. Contudo, nas hipóteses em que, mesmo após tomar ciência da transmissão do bem, o embargado, ainda, insiste na impugnação para manter o ato constritivo incidente, a ele deve ser atribuída a responsabilidade pelo pagamento dos ônus sucumbenciais. 5. 1° APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PROVIDA. 2° APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5296205-37.2023.8.09.0051, Rel. Des(a). WILLIAM COSTA MELLO, 1ª Câmara Cível, julgado em 04/06/2024, DJe de 04/06/2024).
Ação de obrigação de fazer c/c danos morais. Vícios construtivos. Pretendida responsabilização de Saned Engenharia e Empreendimentos Ltda e inclusão no polo passivo. Não cabimento .Ré que detinha a obrigatoriedade de fiscalizar a obra. Contrato claro nesse aspecto. Ocorrência dos vícios construtivos no imóvel a gerar a obrigação de reparar os danos constatados. Vícios decorrentes de falha na construção. Afastada a pretendida ausência de responsabilidade, uma vez que o vício tem natureza construtiva. Pedidos de majoração do dano moral e de arbitramento de multa diária. Acolhimento parcial em relação ao dano moral, majorado de R$ 5.000,00 para R$ 12.000,00. Insurgência contra a não aplicação da Súmula 54 do STJ. Não cabimento, por se tratar de relação contratual. Sentença reformada em pequena parte. Honorários sem majoração. Recurso da Ré não provido e parcialmente provido o da Autora. (TJ-SP – Apelação Cível: 1000525-90.2023.8.26.0411 Pacaembu, Data de Julgamento: 07/02/2024, 3ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/02/2024).
Ementa: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR . APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. VÍCIOS CONSTRUTIVOS EM IMÓVEL. RESPONSABILIDADE DA CONSTRUTORA . PRAZO DE GARANTIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS CONFIGURADOS. RECURSOS IMPROVIDOS. I. CASO EM EXAME Ação ajuizada por proprietária de imóvel contra construtora, pleiteando reparação de vícios construtivos, indenização por danos materiais e morais, e pagamento de aluguel durante os reparos. Sentença de parcial procedência. Ambas as partes recorrem. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão consistem em: (i) analisar a preliminar de ilegitimidade passiva da construtora; (ii) verificar a responsabilidade pelos vícios construtivos e o prazo de garantia aplicável; (iii) examinar a configuração e quantificação dos danos materiais e morais; (iv) avaliar o pedido de pagamento de aluguel; (v) analisar o pedido de tutela de urgência/evidência em sede recursal. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A construtora é parte legítima para responder por vícios construtivos, mesmo que o imóvel tenha sido adquirido de terceiros. 4. O prazo de garantia de 5 anos previsto no art. 618 do Código Civil é de garantia, não de prescrição ou decadência. Os vícios foram constatados dentro deste prazo, sendo aplicável o prazo prescricional de 10 anos para a ação reparatória. 5. O laudo técnico comprova a existência de vícios construtivos que comprometem a habitabilidade e segurança do imóvel, configurando a responsabilidade objetiva da construtora. 6. Os danos materiais foram corretamente fixados em R$ 2.500,00, correspondendo aos gastos com elaboração do laudo técnico. 7. A condenação por danos morais no valor de R$ 3 .000,00 mostra-se adequada e proporcional aos transtornos experimentados pela autora. 8. Não ficou comprovada a necessidade de desocupação do imóvel para realização dos reparos, não se justificando o pagamento de aluguel. 9 . Não há elementos que justifiquem a concessão de tutela de urgência/evidência em sede recursal. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recursos de apelação improvidos . Tese de julgamento: "1. O prazo de 5 anos previsto no art. 618 do Código Civil é de garantia, não de prescrição ou decadência, sendo aplicável o prazo prescricional de 10 anos para a ação reparatória por vícios construtivos. 2. A construtora responde objetivamente pelos vícios construtivos que comprometem a habitabilidade e segurança do imóvel, ainda que este tenha sido adquirido de terceiros." Dispositivos relevantes citados: CC, art. 618; CDC, art. 14. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1467013/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 09/09/2019. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível n.º 0038081-54.2018.8 .17.2001, ACORDAM os Desembargadores que integram a 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco, à unanimidade, em conhecer e NEGAR PROVIMENTO a ambos os recursos, na conformidade do relatório, dos votos proferidos e das notas taquigráficas. Recife/PE, na data da assinatura digital. Des. NEVES BAPTISTA Relator (TJ-PE – Apelação Cível: 00380815420188172001, Relator.: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO, Data de Julgamento: 25/10/2024, Gabinete do Des. Sílvio Neves Baptista Filho (5ª CC)).
APELAÇÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. VÍCIO CONSTRUTIVO. Sentença Procedência. Inconformismo. Decadência. Prescrição. Inocorrência. Prazo estabelecido no art. 618 do Código Civil de 2002 que é de garantia e não de prescrição ou decadência. Prazo aplicável às ações de obrigação de fazer/ressarcimento promovida em face do construtor, em virtude de vício construtivo que é de 10 anos. Artigo 205 do Código Civil. Precedentes jurisprudenciais. Vícios construtivos devidamente caraterizados. Danos materiais comprovados em laudo pericial. Danos morais. Ocorrência. Quantum bem arbitrado. Alteração, de ofício, do termo inicial dos juros moratórios na indenização por danos morais, por se tratar de matéria de ordem pública. Sentença alterada. Recurso desprovido. (TJ-SP – Apelação Cível: 1079133-70.2020.8.26.0100 São Paulo, Relator.: Hertha Helena de Oliveira, Data de Julgamento: 20/05/2024, 2ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 20/05/2024).
Rejeito a preliminar.
4 – DO MÉRITO
4.1. DA RESPONSABILIDADE PELOS VÍCIOS DO PISO
A apelante sustenta que a perícia teria isentado sua responsabilidade, atribuindo o defeito à fabricação das peças cerâmicas, o que atrairia a aplicação do art. 18 do CDC em detrimento do art. 14.
A argumentação não convence.
O laudo pericial, efetivamente, constatou vícios no piso do imóvel, consistentes em manchas e desníveis que comprometem a qualidade e adequação do revestimento. Ainda que o defeito tenha origem na fabricação do material cerâmico, tal circunstância não exonera a construtora de sua responsabilidade.
A construtora/incorporadora responde objetivamente pelos vícios de qualidade da edificação com base no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece a responsabilidade do prestador de serviços pelos defeitos (prova pericial e demais elementos de cognição) relativos à prestação dos serviços. A construção de imóvel constitui prestação de serviço sujeita às regras consumeristas.
O fato de o vício ter origem no material empregado não afasta a responsabilidade da construtora, que tem o dever de fiscalizar e garantir a qualidade dos materiais utilizados na obra. A escolha e aquisição dos materiais integram o serviço de construção, respondendo a construtora solidariamente com o fabricante pelos defeitos apresentados.
Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. SEGURO HABITACIONAL. AÇÃO DE REGRESSO. DANOS EM IMÓVEL. FALHA NO PROJETO ESTRUTURAL. CIÊNCIA DA CONSTRUTORA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. PRECEDENTES. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ . 1. "Nos termos da jurisprudência consolidada nesta Corte, firmada à luz do Código de Defesa do Consumidor,"é solidária a responsabilidade entre os fornecedores constantes da cadeia de produção ou de prestação de serviços"( AgInt no REsp 1.738.902/AC, Rel . Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/09/2018, DJe de 27/09/2018)" ( AgInt no AREsp n. 1.913.403/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe de 17/12/2021.) 2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula 7/STJ).3. Agravo interno a que se nega provimento . (STJ – AgInt no AREsp: 2101234 RJ 2022/0096408-3, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 03/04/2023, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/04/2023).
Essa Corte de Justiça também se curva a esse entendimento:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO (DANOS MORAIS E MATERIAIS). COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RESIDENCIAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. VÍCIO DO PRODUTO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA FORNECEDORA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 18, §1º, DO CDC. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR PROPORCIONAL. SENTENÇA MANTIDA. 1. Restando comprovada nos autos, sobretudo por perícia judicial, a existência do vício do produto alegado na inicial (piso de porcelanato manchado), responde a fornecedora (ré/apelante), objetivamente, pela reparação dos danos causados ao consumidor (autor/apelado), à luz do art. 14 do CDC. 2. In casu, não há falar em inobservância da regra disposta no art. 18, §1º, do CDC, como aponta a recorrente, já que a alternativa por ela ofertada ao recorrido (polimento do piso), no intuito de solucionar o problema, é medida desaconselhada pelo próprio fabricante do produto, além de haver sido constatada a sua ineficácia (portanto, não se poderia obrigar o consumidor a aceitá-la). Segundo conclusão exarada no laudo da perícia judicial, é recomendada a substituição do produto, nos moldes então pleiteados pelo requerente (art. 18, §1º, I, CPC). 3. Vislumbrada a presença dos requisitos caracterizadores do dano moral, na hipótese de compra e venda de imóvel eivado de vício de construção, o qual, na situação sub judice, foi atestado mediante prova pericial, há de ser mantida a condenação da fornecedora a reparar o prejuízo extrapatrimonial causado ao consumidor. Ademais, o quantum indenizatório arbitrado na sentença (cinco mil reais) revela-se razoável e condizente com as peculiaridades do caso, não se justificando sua eventual redução (Súmula 32/TJGO). Apelação Cível desprovida. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5300542-11.2019.8.09.0051, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ZACARIAS NEVES COELHO, 2ª Câmara Cível, julgado em 05/06/2024, DJe de 05/06/2024).
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRAZO DECADENCIAL. PRELIMINAR AFASTADA. PISO CERÂMICO QUE APRESENTOU MANCHAS APÓS INSTALAÇÃO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO COMERCIANTE. PROVA PERICIAL REALIZADA. DEFEITO CONSTATADO. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR. RAZOÁVEL. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. No caso em apreço, o autor postula a reparação dos danos materiais e morais causados em virtude de vício oculto no produto, ou seja, ação indenizatória cumulada com pedido de obrigação de fazer, não se tratando, portanto, de ação de resolução de contrato ou de abatimento do preço, incidindo, pois, a prescrição quinquenal prevista no artigo 27 da legislação consumerista, tendo como termo inicial a constatação do vício e de sua autoria, nos exatos termos da norma precitada. 2. O CDC estabelece sistema de responsabilidade ampla e solidária pelos vícios do produto ou serviço, alcançando todo aquele que, de alguma forma, tenha participado do fornecimento, justamente para que o consumidor não se perca na imensa cadeia de produção/distribuição do bem de consumo. 3. Comprovada através de laudo pericial a existência de vício no piso do tipo porcelanato adquirido pelo autor que, após regular instalação, apresentou manchas e não tendo sido o vício sanado pelo fornecedor, mesmo após reclamações, responde ele objetivamente pela reparação dos danos causados ao consumidor (art. 14, do CDC), impondo-se a substituição do produto adquirido. 4- Resta caracterizado o dano moral pelo evidente transtorno sofrido pelo consumidor que, tendo adquirido um produto defeituoso, viu-se alijado de seu uso regular, por longo período, em razão de vício que não deu causa. 5- Nos termos da Súmula nº 32 dessa Corte Estadual, a verba indenizatória do dano moral somente será modificada, se não atendidos pela sentença os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação do valor da condenação. 6- Evidenciada a sucumbência recursal, majora-se a verba advocatícia anteriormente fixada em desfavor da empresa ré, ora apelante, nos termos do art. 85, §11, do CPC. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 0445321-27.2015.8.09.0006, Rel. Des(a). DESEMBARGADORA NELMA BRANCO FERREIRA PERILO, 4ª Câmara Cível, julgado em 22/03/2024, DJe de 22/03/2024)
Assim, correta a sentença ao determinar a substituição do piso defeituoso, nos termos do art. 18, §1º, I, do CDC, por aplicação analógica, já que se trata de vício de qualidade que compromete a adequação do produto/serviço.
A recusa do autor em permitir novo tratamento do piso oferecido pela ré não afasta a responsabilidade desta, pois o consumidor tem o direito de exigir a substituição integral quando o reparo se mostrar inadequado ou insuficiente para sanar definitivamente o vício.
5. DOS DANOS MORAIS
Quanto aos danos morais, todavia, a pretensão merece reforma.
A sentença condenou a apelante ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de danos morais, fundamentando-se no transtorno causado pelos vícios do imóvel.
Contudo, analisando detidamente as circunstâncias do caso, verifico que os vícios constatados no piso, embora comprometam a qualidade estética do imóvel, não extrapolaram o limite do mero aborrecimento ou contrariedade inerente à vida em sociedade.
Os defeitos no piso, consistentes em manchas e desníveis, conquanto indesejáveis e passíveis de reparação, não causaram dano à personalidade do autor, não implicaram riscos à sua segurança ou saúde, nem exigiram a desocupação temporária do imóvel.
O dano moral indenizável pressupõe lesão efetiva aos direitos da personalidade, com repercussão na esfera íntima, psíquica ou social da pessoa. Não se confunde com o mero dissabor, aborrecimento ou contrariedade decorrente de descumprimento contratual, ainda que cause transtornos ao contratante.
Na hipótese dos autos, não restou demonstrado que os vícios no piso tenham causado abalo psíquico, constrangimento, humilhação ou qualquer outro sentimento negativo apto a caracterizar lesão extrapatrimonial indenizável.
Nesse sentido, a jurisprudência consolidada do STJ:
AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSTRUTORA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. INCIDÊNCIA. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Consoante a jurisprudência desta Corte, "o dano moral, na ocorrência de vícios de construção, não se presume, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel" (AgInt no AREsp 1.288.145/DF, Rel . Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, DJe de 16/11/2018). 2. Na hipótese, a alteração das premissas fáticas adotadas pelo Tribunal a quo, no tocante à presença dos elementos caracterizadores da responsabilidade civil e do dever de indenizar, diante da existência de defeitos no imóvel decorrentes de problemas na construção, assim como acerca da caracterização do dano moral, demandaria, necessariamente, o reexame de matéria fática e probatória dos autos. 3. Agravo interno desprovido. (STJ – AgInt nos EDcl no AREsp: 1693983 SC 2020/0094400-7, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 16/11/2020, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/12/2020).
6. DA SUCUMBÊNCIA
Com a reforma parcial da sentença, a sucumbência deve ser redistribuída. O autor decaiu na pretensão indenizatória (danos morais), enquanto a ré sucumbiu quanto à obrigação de fazer (substituição do piso).
Considerando que o valor da obrigação de fazer supera significativamente o valor dos danos morais afastados, a ré deve arcar com a maior parte dos ônus sucumbenciais.
Fixo os honorários advocatícios em 15% sobre o valor da causa, cabendo 70% à ré e 30% ao autor. As custas processuais devem ser rateadas na mesma proporção.
7. DO DISPOSITIVO
Ante o exposto, conheço do recurso de apelação cível interposto e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para reformar a sentença objurgada e tão somente decotar a condenação alusiva aos danos morais.
Fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, cabendo 70% à ré e 30% ao autor. As custas processuais devem ser rateadas na mesma proporção.
Transitada em julgado, devolvam-se imediatamente os autos ao juízo de origem, retirando-se do acervo desta relatoria.
É como voto.
Desembargador HÉBER CARLOS DE OLIVEIRA
Relator
ACÓRDÃO
VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Cível nº 5301989-34.2019.8.09.0051, Comarca de Goiânia.
ACORDAM os integrantes da Quinta Turma Julgadora, da 1ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade de votos, em conhecer e prover parcialmente a apelação cível, nos termos do voto do Relator.
VOTARAM, além do Relator, o Des. José Proto de Oliveira e o Dr. Antônio Cézar Pereira Meneses (subst. do Des. Átila Naves Amaral).
ACOMPANHA o Dr. Antônio Cézar Pereira Menezes com ressalva de entendimento, no sentido de ser cabível o dano moral.
Presidiu a sessão o Des. Altair Guerra da Costa.
Presente a ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Rúbian Corrêa Coutinho.
Goiânia, datado e assinado digitalmente.
Desembargador HÉBER CARLOS DE OLIVEIRA
Relator
APELAÇÃO CÍVEL N. 5301989-34.2019.8.09.0051
COMARCA DE GOIÂNIA
JUIZ DE 1º GRAU: ALESSANDRA GONTIJO DO AMARAL
1ª CÂMARA CÍVEL
APELANTE : SPE BAMBUÍ VACA BRAVA LTDA
APELADO : NIVALDO DA SILVA JÚNIOR
RELATOR : DESEMBARGADOR HÉBER CARLOS DE OLIVEIRA
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. VÍCIO CONSTRUTIVO. VENDA DO IMÓVEL A TERCEIRO. ALEGAÇÃO DE PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO DA LIDE. PRELIMINAR REJEITADA. PISO CERÂMICO QUE APRESENTOU MANCHAS CAUSADAS POR PROCESSO DE POLIMENTO DURANTE A FABRICAÇÃO. PERÍCIA TÉCNICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONSTRUTORA. DANO MORAL AFASTADO. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, ajuizada em razão de vícios construtivos constatados em imóvel adquirido. A sentença condenou a parte ré à substituição do piso do imóvel e ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a construtora pode ser responsabilizada pelos vícios apresentados no imóvel, especialmente no piso cerâmico, mesmo tendo a perícia indicado defeito de fabricação do material; e (ii) saber se os vícios constatados são suficientes para justificar a indenização por danos morais.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A responsabilidade da construtora pelos vícios do imóvel é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC. Ainda que o defeito tenha origem na fabricação do material, a construtora responde solidariamente pela má prestação do serviço, devendo garantir a qualidade e adequação dos materiais empregados. 4. A jurisprudência reconhece a responsabilidade solidária entre todos os integrantes da cadeia de fornecimento, especialmente em se tratando de vício de qualidade em imóvel novo. 5. O fato de a parte autora ter recusado o tratamento proposto pela ré não a impede de exigir a substituição do piso, diante da ineficácia da solução alternativa ofertada. Ademais a construtora responde objetivamente pelos vícios construtivos que comprometem a habitabilidade e segurança do imóvel, ainda que este tenha sido adquirido de terceiros. 6. Não se verifica a configuração de dano moral, pois os vícios no piso limitaram-se a aspectos estéticos e não comprometeram a segurança ou a habitabilidade do imóvel, não sendo comprovada ofensa à dignidade ou aos direitos da personalidade do consumidor. 7. A venda posterior do imóvel pelo autor não afasta sua legitimidade para prosseguir na ação, pois os vícios eram preexistentes e o direito à reparação já integrava seu patrimônio jurídico. 8. Diante da reforma parcial da sentença, a sucumbência foi redistribuída, fixando-se os honorários advocatícios em 15% sobre o valor da causa, com repartição proporcional entre as partes.
IV. DISPOSITIVO E TESE
9. Recurso conhecido e parcialmente provido.
Tese de julgamento: "1. A construtora responde objetivamente pelos vícios de qualidade em imóvel novo, ainda que decorrentes de defeito no material fornecido por terceiro, nos termos do art. 14 do CDC." "2. O mero descumprimento contratual, sem repercussão efetiva nos direitos da personalidade, não configura dano moral indenizável." "3. A alienação do imóvel após o ajuizamento da ação não afasta a legitimidade ativa para a reparação dos vícios construtivos preexistentes."
Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 14 e 18, §1º, I; CPC, arts. 85, §11, e 1.010.
Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2101234/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 03.04.2023; STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 1693983/SC, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª Turma, j. 16.11.2020; TJGO, Apelação Cível 5300542-11.2019.8.09.0051, Rel. Des. Zacarias Neves Coêlho, j. 05.06.2024; TJGO, Apelação Cível 0445321-27.2015.8.09.0006, Rel. Des.ª Nelma Branco Ferreira Perilo, j. 22.03.2024.
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