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Dheyssonn Gama Da Silva Santos x Spal Industria Brasileira De Bebidas S/A e outros

ID: 339127648

Tribunal: TRT21 Órgão: Primeira Turma de Julgamento Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0000946-80.2024.5.21.0014

Data de Disponibilização: 31/07/2025

Polo Ativo:

DHEYSSONN GAMA DA SILVA SANTOS

Polo Passivo:

SPAL INDUSTRIA BRASILEIRA DE BEBIDAS S/A V V C ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA

Acórdão

Advogados:

VIVIANE CASTRO NEVES PASCOAL MALDONADO DAL MAS

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TAINA FLORINTINO SILVA

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MARCUS VINICIUS FURTADO DA CUNHA

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MOISES ALEX DE ARAUJO SILVA

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA DE JULGAMENTO Relator: ERIDSON JOAO FERNANDES MEDEIROS ROT 0000946-80.2024.5.21.0014 RECORRENTE: … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA DE JULGAMENTO Relator: ERIDSON JOAO FERNANDES MEDEIROS ROT 0000946-80.2024.5.21.0014 RECORRENTE: DHEYSSONN GAMA DA SILVA SANTOS RECORRIDO: V V C ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA E OUTROS (1) Acórdão Recurso Ordinário nº 0000946-80.2024.5.21.0014 Desembargador Relator: Eridson João Fernandes Medeiros Recorrente: Dheyssonn Gama da Silva Santos Advogada: Tainá Florintino Silva Recorrido: VVC Alto Oeste Transportes e Logística Ltda. Advogados: Marcus Vinícius Furtado da Cunha e outro Recorrido: Spal Indústria Brasileira de Bebidas S.A. Advogada: Viviane Castro Neves Pascoal Maldonado Dal Mas Origem: 4ª Vara do Trabalho de Mossoró/RN EMENTA DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. RESCISÃO INDIRETA. ACÚMULO DE FUNÇÕES. DANO MORAL. HORAS EXTRAS. PEDIDO CONTRAPOSTO. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso Ordinário interposto pelo reclamante contra sentença que, embora tenha reconhecido o acúmulo de funções com deferimento de acréscimo salarial, julgou improcedentes os pedidos de rescisão indireta do contrato de trabalho, indenização por danos morais e horas extras, convertendo o fim do vínculo em pedido de demissão. A sentença também acolheu o pedido contraposto da empresa reclamada, condenando o reclamante a restituir valor depositado por engano. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há 4 questões em discussão: (a) definir se o acúmulo de funções, por si só, configura falta grave do empregador apta a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483 da CLT; (b) estabelecer se cobranças ríspidas por desempenho e o transporte do empregado em compartimento de carga do veículo configuram assédio moral passível de indenização; (c) analisar o direito a horas extras e intervalo intrajornada, diante da confissão do autor sobre a fidedignidade dos horários de entrada e saída e da pré-assinalação do intervalo nos cartões de ponto; (d) determinar se é devida a restituição de valor depositado por erro pela empregadora, sobre o qual o reclamante não se manifestou quando da contestação ao pedido contraposto. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O mero acúmulo de funções, embora possa gerar direito a um acréscimo salarial para reequilibrar o contrato, não configura, por si só, a falta grave prevista no art. 483, 'a', da CLT, sendo necessária a demonstração de que a exigência de serviços alheios ao contrato tornou a continuidade da relação de emprego insustentável. 4. Cobranças por resultados, ainda que ríspidas, inserem-se no poder diretivo do empregador e não caracterizam o rigor excessivo do art. 483, 'b', da CLT, quando não extrapolam a razoabilidade para resultar em assédio ou humilhação sistemática. 5. O transporte de empregado em condições inadequadas, embora configure grave falha de segurança do trabalho, não se equipara ao assédio moral se não for demonstrada a intenção deliberada e sistemática de humilhar o trabalhador, elemento essencial para a configuração do ilícito. 6. A confissão judicial do empregado de que os horários de início e término da jornada eram corretamente registrados nos controles de frequência torna os fatos incontroversos, prevalecendo sobre alegações posteriores em contrário e afastando o direito a horas extras, nos termos dos arts. 374, II, e 389 do CPC. 7. A pré-assinalação do intervalo intrajornada nos cartões de ponto é autorizada pelo art. 74, § 2º, da CLT, gerando uma presunção relativa de sua fruição, que só pode ser afastada por prova robusta em contrário, cujo ônus é do empregado, conforme o art. 818, I, da CLT. 8. O silêncio do reclamante em sua manifestação sobre a contestação e o pedido contraposto tornam incontroversa a alegação de pagamento indevido, nos termos do art. 341 do CPC. 9. A manutenção no patrimônio do empregado de valor recebido por erro comprovado do empregador, cuja causa jurídica o recebedor desconhece, configura enriquecimento ilícito e impõe o dever de restituição, conforme o art. 884 do Código Civil. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso ordinário conhecido e desprovido. Teses de julgamento: 1. O acúmulo de funções que enseja o pagamento de um adicional salarial não constitui, isoladamente, falta grave do empregador para fins de rescisão indireta, a menos que se comprove uma alteração contratual lesiva de magnitude que torne a continuidade do vínculo insustentável. 2. Cobranças ríspidas por desempenho, inseridas no poder diretivo, e falhas de segurança do trabalho, como o transporte inadequado, não configuram assédio moral quando ausente a prova da reiteração da conduta com o objetivo de desestabilizar psicologicamente o empregado. 3. A confissão judicial do trabalhador sobre a fidedignidade dos horários de entrada e saída registrados nos cartões de ponto faz prova contra o confidente e impede o deferimento de horas extras com base na invalidade desses mesmos registros. 4. A ausência de impugnação específica ao pedido contraposto, somada à prova do depósito equivocado, tornam incontroversa a obrigação do empregado de restituir o valor recebido indevidamente, a fim de evitar o enriquecimento sem causa. Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 74, § 2º, 483, 'a', 'b' e 'c', e 818, I; CPC, arts. 341, 374, II, e 389; Código Civil, art. 884. Jurisprudência relevante citada: TST, RRAg-1000764-53.2022.5.02.0442, 1ª Turma, Rel. Min. Amaury Rodrigues Pinto Júnior, DEJT 26/02/2025. RELATÓRIO Vistos etc. Trata-se de recurso ordinário interposto por DHEYSSONN GAMA DA SILVA SANTOS contra a sentença oriunda da 4ª Vara do Trabalho de Mossoró/RN (Id. 7418beb; fls. 209/230), que, nos autos da reclamação trabalhista, julgou improcedentes os pedidos deduzidos em face da reclamada SPAL INDÚSTRIA BRASILEIRA DE BEBIDAS S.A. e procedentes, em parte, os pedidos formulados em face da reclamada VVC ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA., condenando esta "a pagar, 48 horas após o trânsito em julgado da presente sentença: 1. acúmulo de função de 10% (dez por cento) do seu salário base, pelo exercício simultâneo das funções de Auxiliar de entrega e motorista e os reflexos do adicional de acúmulo de função nas férias acrescidas de 1/3 (um terço), 13º salário e FGTS. 2. 5% (cinco por cento) do valor da condenação à título de honorários advocatícios sucumbenciais", além de custas processuais. Além disso, julgou "PROCEDENTE o pedido contraposto formulado pela ré V V C ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA. em face de DHEYSSONN GAMA DA SILVA SANTOS, para condená-lo a restituir a quantia de R$ 1.069,19 em favor da sua ex-empregadora." Nas suas razões de recurso (Id. 305d25b; fls. 441/458), o reclamante se insurge, de início, contra o não reconhecimento da rescisão indireta, argumentando que a própria sentença é contraditória ao deferir o adicional por acúmulo de função, mas não considerar tal fato como falta grave do empregador. Alega que o acúmulo de função sem a devida contraprestação, somado ao tratamento com rigor excessivo, à exposição a risco físico e ao desrespeito verbal por parte do superior hierárquico, conforme demonstrado por áudios e vídeos, configuram motivos suficientes para a rescisão do contrato por culpa da empregadora, nos termos do art. 483, "b" e "c", da CLT. Afirma também que o indeferimento do pedido de danos morais, ignorou as provas de assédio, como arquivos de mídia que evidenciam condutas humilhantes e tratamento desrespeitoso. Sustenta que foi exposto a risco físico ao ser compelido a transitar no baú do caminhão com as portas abertas. Menciona, ainda, o depoimento de uma testemunha que, apesar de não ter trabalhado no mesmo período, confirmou o tratamento rude e grosseiro praticado pelo gerente com os empregados em geral. Além disso, em relação às horas extras, alega que os cartões de ponto não refletem a jornada real, pois, por orientação do gerente, registrava o ponto no horário contratual e continuava trabalhando. Assevera que usufruía de apenas 30 minutos de intervalo para refeição, e não uma hora. Ressalta que o próprio sócio da empresa confessou em depoimento que o intervalo era pré-assinalado nos controles de frequência, o que, segundo o recorrente, invalida tais registros como prova da fruição integral do descanso. Ao final, refuta a condenação a devolver valores à recorrida. Argumenta que o montante supostamente depositado por engano foi pago juntamente com as verbas rescisórias, não sendo possível identificar a que título se refere, o que tornaria improcedente o pedido contraposto. Contrarrazões pela reclamada VVC ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA. (Id. 3debcdd). É o relatório. VOTO 1. ADMISSIBILIDADE O reclamante tomou ciência da sentença em 23/04/2025, por meio de publicação no Diário Eletrônico, conforme informação lançada no sistema do PJE. Interpôs o presente recurso em 27/04/2025 (fls. 263), tempestivamente, portanto. Preparo inexigível. Representação regular pela advogada Tainá Florintino Silva (Id. b02f361; apud acta). Conheço. 2. MÉRITO O reclamante, ora recorrente, se insurge, de início, contra o não reconhecimento da rescisão indireta, argumentando que a própria sentença é contraditória ao deferir o adicional por acúmulo de função, mas não considerar tal fato como falta grave do empregador. Alega que o acúmulo de função sem a devida contraprestação, somado ao tratamento com rigor excessivo, à exposição a risco físico e ao desrespeito verbal por parte do superior hierárquico, conforme demonstrado por áudios e vídeos, configuram motivos suficientes para a rescisão do contrato por culpa da empregadora, nos termos do art. 483, "b" e "c", da CLT. Ao exame. Na sentença, em relação ao tema, o d. julgador, embora tenha deferido o pagamento de um plus salarial decorrente do acúmulo de funções, entendeu pela não configuração de falta grave apta a ensejar a resolução contratual por culpa da empregadora, sob o fundamento de que o reclamante recorrente não logrou êxito em comprovar o ato faltoso de gravidade suficiente para tanto. In verbis: "O autor assevera que "diante das ilegalidades praticadas pela a 1ª Reclamada, o Reclamante decidiu ingressar com a presente Reclamação Trabalhista, valendo-se do entendimento previsto no artigo 483 da CLT, pleiteando a rescisão indireta do contrato de trabalho" (fl. 12). A parte ré se escuda: No dia 29/11/2024 o Reclamante dirigiu-se à empresa e informou através de Comunicação de Rescisão Indireta (em anexo) seu desligamento, ocasião em que notificou a Reclamada que não mais compareceria ao trabalho e que havia ingressado com esta demanda onde discutiria a Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho (fl. 145). Pois bem. A rescisão indireta, diante da lição do art. 483 da CLT, considera que o empregado pode rescindir o contrato e pleitear indenização quando forem exigidos serviços superiores às suas forças, proibidos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato; for tratado pelo empregador ou superiores hierárquicos com rigor excessivo; e correr perigo evidente de mal considerável. No entanto, haja vista que nem todas as situações desagradáveis ao empregado podem ser motivo desta forma de rompimento contratual, o empregado que pleitear a rescisão indireta, necessariamente deverá provar o ato grave e faltoso do empregador, seja por meio de provas testemunhais ou documentais, o que no caso não ocorreu. Indefiro. Uma vez não acolhida a rescisão indireta, a melhor solução é decidir pela rescisão do contrato de trabalho por pedido de demissão, uma vez que o autor usufruiu da faculdade de se ausentar do emprego, não sendo possível a continuidade da relação empregatícia" (fls. 218/219). Analisa-se. Primeiramente, na hipótese de empregado contratado como auxiliar de entrega que também desempenha as funções de motorista, com o consequente reconhecimento judicial do acúmulo de funções, é de se perquirir se tal acúmulo configura, por si só, motivo para a rescisão indireta do contrato de trabalho com base no art. 483, "a", da CLT. O art. 483 Consolidado elenca as hipóteses em que o empregado pode considerar o contrato de trabalho rescindido por falta grave do empregador, a chamada "justa causa do empregador" ou rescisão indireta. A alínea "a" especifica que a rescisão é cabível quando "forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato". No caso, a controvérsia central reside na interpretação do termo "alheios ao contrato". Em uma análise inicial, poder-se-ia concluir que, se um empregado foi contratado para uma função específica (auxiliar de entrega), a exigência de outra (motorista) caracterizaria a prestação de serviços alheios ao pactuado. Contudo, a jurisprudência trabalhista tem se consolidado no sentido de que o mero acúmulo de funções, embora possa gerar o direito a um acréscimo salarial para compensar o desequilíbrio contratual, não configura automaticamente a falta grave prevista na alínea "a" do artigo 483. Para uma análise mais aprofundada, é fundamental distinguir o acúmulo do desvio de função. No acúmulo, o empregado exerce, além de sua função principal, outras atividades de natureza diversa. No desvio, ele passa a exercer função completamente distinta e de maior responsabilidade daquela para a qual foi contratado, sem a devida anotação em carteira e o correspondente aumento salarial. Na presente causa, verificadas as peculiaridades fáticas, das quais consta o registro em sentença de que constituía "prática da empresa permitir que os ajudantes de motorista que tenham habilitação possam conduzir os veículos em rotas próximas e pouco complicadas, com vistas a promoção futura", conforme depoimento do preposto, o auxiliar de entrega que também dirige o veículo se enquadra mais classicamente na hipótese de acúmulo de funções. Consoante a jurisprudência pátria, para a configuração da rescisão indireta com base no art. 483, "a", da CLT, é necessário que a exigência de serviços alheios ao contrato seja de tal monta que torne a continuidade da relação de emprego insustentável. Assim, a falta cometida pelo empregador deve ser grave o suficiente, para quebrar a confiança e a boa-fé que devem reger o contrato de trabalho. Veja-se, quanto à matéria, o recente pronunciamento do colendo TST: "RESCISÃO INDIRETA. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. O reconhecimento de diferenças de horas extras, acúmulo de funções e adicional de insalubridade, não configuram faltas aptas a justificar, por si sós, a rescisão indireta do contrato de trabalho" (RRAg-1000764-53.2022.5.02.0442, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Júnior, DEJT 26/02/2025). Logo, o simples fato de o empregador exigir tarefas adicionais, compatíveis com a condição pessoal do empregado e que não representem uma alteração contratual lesiva de grande magnitude, não é considerado falta grave para justificar a rescisão indireta. A consequência jurídica mais comum, nessa hipótese, é a condenação do empregador no pagamento do adicional salarial, a fim de reequilibrar o contrato. Essa situação só muda de figura se o acúmulo de funções vier acompanhado de outros elementos que demonstrem a gravidade da conduta patronal. Por exemplo, se a função de motorista: 1) exigir qualificação específica que o empregado não possui, colocando-o em risco ou em situação de ilegalidade (exercício ilegal da profissão); 2) resultar em uma sobrecarga de trabalho excessiva e prejudicial à saúde, caracterizando "serviços superiores às suas forças"; 3) representar uma alteração contratual unilateral e lesiva, que desvirtue completamente o objeto inicial do contrato, aproximando-se de um desvio de função; 4) for acompanhada de tratamento rigoroso e humilhante por parte do empregador. Nesses cenários descritos acima, que não restaram comprovados nos presentes autos, o juiz pode, com efeito, entender que a conduta do empregador ultrapassou o mero desequilíbrio contratual e configurou falta grave, apta a ensejar a rescisão indireta com base não apenas na alínea "a", mas também em outras alíneas do artigo 483, como a "d" (não cumprir o empregador as obrigações do contrato) ou "e" (praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama). Voltando ao exame das alegações recursais, não se vislumbra, in casu, a alegada contradição no julgado. Isso porque o deferimento de diferenças salariais por acúmulo de função representa o reconhecimento de um desequilíbrio na base comutativa do contrato, o qual é sanado por meio de uma reparação de cunho patrimonial. Tal condenação, por si só, não se traduz, automaticamente, em falta grave capitulada no art. 483 da CLT. A exigência de serviços alheios ao contrato, prevista na alínea "a" do referido artigo, para justificar a rescisão indireta, pressupõe uma alteração lesiva e substancial das condições pactuadas, que imponha ao trabalhador um ônus excessivo e desproporcional. No caso, a própria condenação no pagamento do adicional por acúmulo de função tem o condão de restabelecer o equilíbrio financeiro do contrato, não se revelando, isoladamente, como um ato de gravidade suficiente a ponto de impedir a continuidade do vínculo. Ademais, no que tange à alegação de tratamento com rigor excessivo e desrespeito verbal por parte do superior hierárquico (art. 483, "b", da CLT), a análise das provas audiovisuais (áudios e vídeos) acostadas aos autos não corrobora a tese do recorrente. Conforme bem pontuado na sentença, e ora se constata, o que se revela são diálogos em tom mais acalorado, nos quais o superior hierárquico questiona o reclamante sobre avarias recorrentes na carga transportada. Embora a urbanidade e o respeito devam nortear as relações de trabalho, cobranças por resultados e esclarecimentos sobre falhas operacionais, ainda que ríspidas, inserem-se no âmbito do poder diretivo do empregador. O rigor excessivo a que alude a lei é aquele que extrapola os limites da razoabilidade, descambando para o assédio, a humilhação ou o tratamento vexatório sistemático, o que, data venia, não restou robustamente comprovado nos autos. Discussões pontuais, relacionadas a problemas concretos do serviço, não possuem o condão de caracterizar a falta grave prevista na alínea "b" do art. 483 da CLT. Por fim, quanto ao suposto perigo manifesto de mal considerável (art. 483, "c", da CLT), a argumentação do reclamante recorrente é igualmente frágil. A existência de avarias nos produtos durante os deslocamentos não implica, necessariamente, a exposição do trabalhador a risco físico. Para a configuração desta hipótese, seria imprescindível a comprovação de que o empregador, de forma negligente, expunha o empregado a uma condição de perigo real e iminente, como, por exemplo, a ausência de manutenção nos veículos, a imposição de rotas notória e extraordinariamente perigosas ou a falta de fornecimento de equipamentos de proteção. O reclamante recorrente não produziu qualquer prova nesse sentido, limitando-se a ilações genéricas que não se prestam a fundamentar a gravidade exigida pela norma. Destarte, para a configuração da rescisão indireta, a falta do empregador deve se revestir de gravidade tal, que abale profundamente a fidúcia e torne impossível a subsistência da relação contratual. No caso em tela, o reclamante recorrente não se desincumbiu do seu ônus probatório, nos termos do art. 818, I, da CLT, quanto à ocorrência de fatos suficientemente graves para justificar a resolução do contrato por culpa da empresa reclamada recorrida. Sentença que se mantém, em relação a este tópico. O reclamante recorrente afirma também que o indeferimento do pedido quanto ao alegado dano moral ignorou as provas de assédio, como arquivos de mídia que evidenciam condutas humilhantes e tratamento desrespeitoso. Sustenta que foi exposto a risco físico ao ser compelido a transitar no baú do caminhão com as portas abertas. Menciona, ainda, o depoimento de uma testemunha que, apesar de não ter trabalhado no mesmo período, confirmou o tratamento rude e grosseiro praticado pelo gerente com os empregados em geral. Na decisão, o d. julgador fundamentou: "[...]. No que respeita aos fatos narrados pelo reclamante, após as oitivas atentas dos áudios juntados, não se vislumbra o assédio moral aventado. Para se amparar a pretensão indenizatória por danos morais, necessária a análise da coexistência de três requisitos na etiologia da responsabilidade civil: a ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta, o dano e o nexo de causalidade do evento com o trabalho. No caso dos autos, o primeiro vídeo juntado pelo autor (id. b80fe40) mostra a narração do reclamante que é levado no baú de caminhão carregado de bebidas com a porta aberta, porque não teria lugar na cabine para sua ocupação. O segundo (id. d87dd86) parece ser continuidade do primeiro, no qual o reclamante aparece fardado na condição narrada no primeiro. O terceiro (id. a7a2ad5) diz respeito a gravação de ligação telefônica entre o reclamante e seu superior Vilamar acerca das avarias que ocorriam nos produtos. No áudio o reclamante recebe admoestações para lidar com o problema que foi reportado, não somente apontá-lo, mas resolvê-lo ou pedir ajudar para tal. O superior questiona a atitude do reclamante em continuar rodando com o caminhão de entrega com as recorrentes avarias sem pensar ou pedir uma solução, ao menos pelo celular fornecido pela empresa. O último arquivo (id. a163721) diz respeito a gravação telefônica o superior mais uma vez solicita a atenção e empenho do reclamante. Chama a atenção das reiteradas advertências verbais que o reclamante vem recebendo acerca do seu desempenho e da pontualidade e se coloca à disposição para retirar dúvidas quando for necessário. Em que pese verificar-se questionamentos mais acalorados do seu superior em relação a determinada conduta do autor em razão das avarias dos produtos que ocorriam durante o trânsito, o gestor insiste no cumprimento das normas da reclamada e na habilidade do reclamante para solucionar problemas. Pois bem. Como dito anteriormente, o assédio moral no ambiente de trabalho demanda a presença de alguns requisitos, quais sejam abusividade da conduta, natureza psicológica do atentado à dignidade psíquica do indivíduo, reiteração da conduta e finalidade de exclusão. A conduta isolada do empregador, que cause algum desconforto psicológico ao empregado, não tem o condão de configurar a presença de assédio moral, pois afasta a hipótese de reiteração de conduta; no máximo, resulta em mero aborrecimento. Ademais, a gravidade do ato não deve ser aferida em abstrato, mas contextualizada às circunstâncias do caso concreto. A repreensão realizada pelo superior não tem o condão de configurar assédio moral, pois como dito, é fundamental a repetição e a intenção do assediador de atingir o empregado. No caso em tela, o reclamante narra fatos sem a intensidade da violência psicológica e o prolongamento no tempo capazes de ocasionar um abalo moral no empregado a ponto de marginalizá-lo no seu ambiente de trabalho. Indefiro" (fls. 215/216). Correto o decisum. A reparação por assédio moral havido na relação de trabalho pressupõe a prática de um ato ilícito, pelo empregador ou seu preposto, consistente no psicoterrorismo que decorre da submissão do trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas, durante a jornada de trabalho, bem como o nexo de causalidade entre o ato de assédio e o dano experimentado pelo empregado - afetando seu estado psicológico, deteriorando sua autoestima e o levando, muitas vezes, a pedir demissão. No presente caso, deve ser frisado que repreensões mais contundentes ou cobrança de resultados pelo superior hierárquico, por si só, não são suficientes ao deferimento da pretensão, quando inexiste evidência de que os atos praticados pela empresa reclamada recorrida para esse fim tenham causado desgaste emocional agressivo no empregado. No pertinente aos arquivos de mídia anexados pelo reclamante recorrente, uma análise detalhada desses elementos de prova descritos na sentença demonstra que os fatos narrados não se amoldam ao conceito de assédio moral. A alegação do reclamante, em seu recurso, de que as provas foram ignoradas e que foi submetido a condutas humilhantes e tratamento desrespeitoso não encontra respaldo na caracterização jurídica do assédio, que exige a presença de conduta reiterada, com o objetivo específico de minar a autoestima e a permanência do empregado na empresa. Os dois primeiros vídeos, que mostram o reclamante recorrente sendo transportado no compartimento de carga de um caminhão, com a porta aberta, por falta de espaço na cabine, evidenciam, inegavelmente, uma grave falha de segurança do trabalho. A conduta da empresa ao permitir tal situação expôs o trabalhador a um risco físico iminente e a uma condição de trabalho degradante. Todavia, para a configuração do assédio moral, é imprescindível a demonstração de uma perseguição deliberada e sistemática, um "terrorismo psicológico" que visa a desestabilizar emocionalmente o empregado. A análise da mídia, em linha com o decidido pelo d. julgador, não indica que o transporte inadequado fosse uma prática contínua e direcionada especificamente ao reclamante recorrente com o intuito de humilhá-lo. Trata-se de uma irregularidade na gestão do transporte que afetaria a todos que porventura não coubessem na cabine, e não um ato de perseguição pessoal. Embora seja condenável o transporte de empregados em condições inadequadas, não se pode equipará-lo automaticamente ao assédio moral, que possui requisitos específicos. Já as gravações de ligações telefônicas entre o reclamante recorrente e seu superior, Vilamar, são o ponto central para descaracterizar a alegação de assédio. No primeiro áudio, o superior admoesta o reclamante a ter uma postura mais proativa diante das avarias, buscando soluções ou pedindo ajuda, em vez de apenas reportar o problema. Na segunda gravação, o superior reitera a necessidade de atenção e empenho, mencionando advertências verbais anteriores sobre seu desempenho e pontualidade, e se colocando à disposição para sanar dúvidas. Essas cobranças, embora possam ter sido ríspidas, inserem-se no âmbito do poder diretivo do empregador, que tem o direito e o dever de zelar pela eficiência e qualidade do serviço. A exigência de que o empregado não apenas aponte falhas, mas também contribua para a solução, é uma expectativa legítima em uma relação de trabalho. Da mesma forma, a cobrança por pontualidade e desempenho não constitui assédio. Destaca-se, ademais, que o superior se colocou à disposição para sanar dúvidas, o que demonstra uma intenção de orientar e não de humilhar. Para que a cobrança por metas e resultados resvalasse para o assédio moral, seria necessária a comprovação de que era feita de forma vexatória, reiterada e dirigida ao reclamante recorrente, com o uso de palavras de baixo calão, ameaças de demissão constantes e humilhações que minassem sua autoestima, o que não foi descrito na sentença. Em suma, a tese recursal do reclamante falha por não conseguir demonstrar a presença dos elementos essenciais que configuram o assédio moral. O transporte no caminhão, embora grave, não se demonstrou como uma prática sistemática e pessoal de humilhação. As cobranças, por sua vez, são inerentes à relação de emprego. Por fim, não há nos autos indícios de que as atitudes do superior tivessem o objetivo de forçar a rescisão contratual do reclamante recorrente. Pelo contrário, ao se colocar à disposição para ajudar, o superior demonstra uma tentativa de corrigir a rota e manter o empregado em seus quadros. Portanto, com base na análise dos fatos descritos, conclui-se que o reclamante recorrente foi, de fato, vítima de uma irregularidade trabalhista no que tange às condições de transporte. No entanto, a alegação de assédio moral não se sustenta, pois as provas não demonstram a perseguição sistemática e a intenção de desestabilizar psicologicamente o trabalhador, elementos indispensáveis para a configuração de tão grave ilícito. Por sua vez, a prova oral colhida nos autos (fls. 198) igualmente não evidenciou o alegado assédio. A testemunha trazida a juízo pelo reclamante recorrente, apesar de não ter trabalhado no mesmo período, relatou que o gerente da empresa reclamada recorrida gritava e perseguia os empregados, no caso de ordens não cumpridas, o que se revela por demais genérico e não serve à comprovação do pretenso abuso. Demais disso, a testemunha não especificou uma conduta direcionada unicamente ao reclamante recorrente, o que revela um ambiente de cobranças generalizadas, decorrentes de um comando geral e impessoal, destinado a todos os empregados da unidade, sem que a conduta do preposto do empregador tenha sido motivada por perseguição, com caráter sub-reptício, dirigida ao reclamante recorrente. Como bem define Vólia Bomfim, "o assédio moral é espécie de dano extrapatrimonial e se distingue do dano moral, pois, enquanto neste a lesão é identificada, sentida, percebida pela vítima, no assédio é camuflado, não perceptível. O dano moral pode ser pontual ou repetitivo, mas sempre expresso, claro e real. O terror psicológico é velado, oculto, despercebido pela vítima quando praticado. Caracteriza-se pela prática de sucessivos atos que baixam a autoestima do trabalhador de tal forma que ele próprio acredita na sua baixa competência ou no seu fracasso" (in Direito do Trabalho, p. 933, 18ª ed., Editora Método, 2021). Na hipótese vertente, não houve comprovação do alegado tratamento desrespeitoso por parte do empregador, apto à caracterização do pretenso assédio moral, haja vista que os elementos probatórios, quanto ao alegado ambiente de trabalho hostil, não oferecem suporte à constatação do ânimo de perseguição, de modo furtivo ou dissimulado, pela entidade patronal em relação a um determinado trabalhador, causando-lhe desestabilização emocional. Dessa forma, entendo que o demandante recorrente não foi submetido a nenhuma situação de degradação emocional, decorrente de comportamento persecutório e velado do empregador (terror psicológico), razão pela qual mantenho a sentença no tocante ao indeferimento da indenização por assédio moral. Além disso, em relação às horas extras, o reclamante recorrente alega que os cartões de ponto não refletem a jornada real, pois, por orientação do gerente, registrava o ponto no horário contratual e continuava trabalhando. Assevera que usufruía de apenas 30 minutos de intervalo para refeição, e não uma hora. Ressalta que o próprio sócio da empresa reclamada recorrida confessou em depoimento que o intervalo era pré-assinalado nos controles de frequência, o que, segundo o recorrente, invalida tais registros como prova da fruição integral do descanso. Examina-se. Para a apreciação da insurgência recursal, faz-se imprescindível observar o que ficou decidido na sentença impugnada, cabendo a citação do seguinte excerto: "[...]. Na assentada de instrução disse o autor que "os horários de início e término da jornada de trabalho eram corretamente consignados nos controles de frequência; que os registros de frequência eram feitos através de um aplicativo disponibilizado em um aparelho celular da empresa; que tinha 30 minutos para intervalo para refeições" (fl. 197), portanto, são válidos os controles juntados ao feito. Compulsando-os com zelo (id. dfcc49b), verifica-se que o autor laborou em jornada suplementar com a devida compensação conforme acordo de id. f7019a2. Insta registrar quanto ao intervalo que, embora o preposto tenha confessado que "o intervalo para refeições é pré-assinalado nos controles de frequência" (fl. 198), não cuidou o autor de desconstituir tal prova, uma vez que a testemunha convidada se mostrou inservível pois não laborou no mesmo período do reclamante. Indefiro" (fls. 217). No pertinente à prova da jornada de trabalho, o entendimento deste Relator é no sentido de que cabe ao reclamante comprovar a existência de trabalho em sobrejornada, a teor do que dispõe o art. 818, I, da CLT, independentemente da apresentação dos controles de frequência pelo empregador, pois constitui fato extraordinário ao contrato de trabalho, necessitando, assim, de comprovação. Ademais, relativamente à prática de labor extraordinário, é preciso ter em mente que, em se tratando de lide trabalhista, necessária é a incidência do princípio da primazia da realidade. Esse princípio é assentado na noção de que o contrato de trabalho é um contrato-realidade, na terminologia utilizada por Mário de La Cueva. Os fatos prevalecem sobre as formas, as formalidades ou as aparências. Ou ainda, na definição de Mozart Victor Russomano: mais valem os pressupostos fáticos da relação de trabalho do que os títulos jurídicos apresentados. Assim, como leciona Maurício Godinho Delgado, a prática concreta e habitual ao longo da prestação de serviços, independentemente da vontade manifestada pelas partes, "altera o contrato pactuado, gerando direitos e obrigações novos às partes contratantes (respeitada a fronteira da inalterabilidade contratual lesiva" (in Curso de Direito do Trabalho, p. 211, 14ª ed., LTr, 2015). Nesses termos, uma vez apresentado o controle de frequência pela empresa, na forma do art. 74, § 2º, da CLT, cabe a perquirição sobre a correspondência desses registros com a realidade, por meio do confronto com outros meios probatórios produzidos pelas partes, em especial pelo reclamante, a quem cabe desconstituir o referido elemento de prova. O reclamante recorrente busca a reforma da sentença para que sejam deferidas as horas extras, sob a alegação de invalidade dos cartões de ponto. Argumenta que os registros não refletem a jornada efetivamente cumprida. Entretanto, a pretensão recursal esbarra na prova dos autos, mais especificamente no depoimento pessoal do próprio reclamante recorrente. Conforme consta da ata de audiência (fls. 197), o reclamante afirmou de forma expressa e inequívoca que "os horários de início e término da jornada de trabalho eram corretamente consignados nos controles de frequência." Tal declaração, nos termos do art. 389 do CPC, aplicado subsidiariamente ao processo do trabalho, constitui confissão judicial, fazendo prova contra o confidente. A confissão, uma vez produzida, torna incontroversos os fatos sobre os quais versa, dispensando a produção de outras provas a respeito (art. 374, II, do CPC). A alegação tecida no recurso, de que o empregado registrava o ponto e continuava a trabalhar, além de não ter sido minimamente provada, contradiz frontalmente a sua própria assertiva em juízo, sob o crivo do contraditório. Não pode a parte, ao seu alvedrio, dispor da realidade fática conforme a conveniência de cada fase processual. Assim, havendo confissão do reclamante recorrente quanto à fidedignidade dos horários de entrada e saída, e considerando a existência de acordo de compensação de jornada válido (Id. f7019a2), reputo, ratificando o entendimento do juízo de origem, que a jornada suplementar foi devidamente quitada ou compensada. Nada deferir, portanto, neste ponto. Quanto ao intervalo intrajornada, a insurgência também não prospera. Primeiramente, é imperioso destacar que a pré-assinalação do período de repouso e alimentação é procedimento expressamente autorizado pela legislação, nos termos do art. 74, § 2º, da CLT, para os estabelecimentos que contam com mais de 20 (vinte) trabalhadores. A adoção de tal método, portanto, não constitui, por si só, qualquer irregularidade. Ao apresentar os controles de frequência (Id. dfcc49b) com a pré-assinalação de um intervalo superior a 1 (uma) hora, a empresa reclamada recorrida cumpriu com seu ônus probatório inicial, estabelecendo uma presunção relativa (juris tantum) de que o descanso era efetivamente usufruído em sua integralidade. A partir de então, cabia ao reclamante recorrente, nos exatos termos do art. 818, I, da CLT, o ônus de produzir prova robusta e convincente em sentido contrário, capaz de desconstituir a presunção de veracidade que emana dos documentos apresentados. Desse encargo, todavia, o autor não se desvencilhou. Conforme bem salientado pelo d. Magistrado de primeiro grau, o depoimento da testemunha trazida pelo reclamante recorrente se mostrou inservível, visto que não laborou no mesmo período, não podendo, assim, prestar declarações fidedignas acerca da rotina de trabalho e dos intervalos usufruídos pelo reclamante recorrente. A prova oral que lhe cabia produzir restou, então, frustrada. Resta a análise da declaração do preposto, que, segundo o reclamante recorrente, configuraria uma confissão. No entanto, sem razão. Ao afirmar que "o intervalo para refeições é pré-assinalado nos controles de frequência" (fls. 198), o representante da empresa apenas confirmou o que já era evidente pela simples análise dos espelhos de ponto (Id. dfcc49b) e o que a própria lei faculta. Tal assertiva não contém qualquer admissão de que o intervalo assinalado não era de fato usufruído. Trata-se de mera descrição de um procedimento lícito, e não de uma confissão de supressão de direitos. Dessa forma, a alegação do reclamante recorrente, isolada nos autos e desprovida de qualquer elemento probatório que a corrobore, não possui força suficiente para infirmar os registros de ponto apresentados, os quais se presumem verdadeiros. Chancelar o entendimento contrário seria admitir que a simples alegação da parte, por si só, pudesse sobrepujar a prova documental válida, em clara subversão às regras de distribuição do ônus probatório. Por todo o exposto, ausente prova da supressão do intervalo intrajornada, impõe-se a manutenção da decisão que indeferiu o pedido correspondente. Ao final, o reclamante recorrente impugna a condenação a devolver valores à empresa reclamada recorrida. Argumenta que o montante supostamente depositado por engano foi pago juntamente com as verbas rescisórias, não sendo possível identificar a que título se refere, o que tornaria improcedente o pedido contraposto. Na sentença, ficou consignado: "A reclamada assevera que "ao gerar seu arquivo de folha de pagamento no dia 03.12. 2024, inseriu equivocadamente a quantia de R$ 1.069,19 (hum mil, sessenta e nove reais e dezenove centavos), recebendo o Reclamante indevidamente tal valor em sua conta bancária. Instado a devolver o valor, o Reclamante negou-se a fazê-lo, o que se constitui apropriação indevida de tal quantia" (fl. 150). Juntou documentos. A parte reclamante silencia quanto ao pleito na manifestação de fl. 196. [...]. Fixada a premissa supra, verifico à fl. 177 comprovante de depósito realizado pela ré em favor do reclamante no valor de R$ 1.069,19 em 03/12 /2024, quando já encerrado o vínculo, mas antes do pagamento das verbas rescisórias, que ocorreu em 05/12/2024. Não havendo contestação quanto ao pleito, julgo-o procedente para condenar o reclamante a restituir em favor da reclamada a quantia de R$1.069,19" (fls. 219/220). Correto o decisum. Conforme bem delineado pelo juízo a quo, a empregadora comprovou, por meio de documento inequívoco (comprovante de depósito de Id. bfa5e17), a realização de uma transferência bancária autônoma, no exato valor de R$ 1.069,19, para a conta do reclamante recorrente em 03/12/2024 (fls. 177). O pagamento das verbas rescisórias, por sua vez, ocorreu em um momento distinto e posterior, em 05/12/2024 (fls. 181; Id. 1b34c0f). A alegação recursal de que o valor foi pago juntamente com as verbas rescisórias é, portanto, factualmente improcedente. A existência de um comprovante de transação específico, com data e valor próprios, desvinculado do termo de rescisão contratual, afasta por completo a tese de que se tratava de uma parcela rescisória de natureza desconhecida. Ademais, a questão processual é fulminante para a pretensão do reclamante recorrente. Instado a se manifestar sobre a contestação e o pedido contraposto formulado pela ré, o reclamante, conforme ata às fls. 196, manteve-se silente. Nos termos do art. 341 do CPC, incumbe ao réu (no caso, ao reclamante, em relação ao pedido contraposto) manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas. O silêncio do autor, na primeira oportunidade que teve para falar nos autos sobre o tema, tornou incontroversa a alegação da empresa de que o pagamento se deu por erro. Por fim, o argumento do próprio reclamante recorrente de que não se faz possível identificar a que título se refere o depósito milita em seu desfavor. Ao admitir que não sabe a razão do recebimento da quantia, o reclamante implicitamente confessa que não lhe era devida. A manutenção em seu patrimônio de um valor cuja causa jurídica desconhece, diante da afirmação patronal de erro no pagamento, configura o exato tipo do enriquecimento ilícito, vedado pelo nosso ordenamento jurídico, nos termos do art. 884 do Código Civil, de aplicação subsidiária: "Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários." Não há nos autos qualquer indício de que o valor de R$ 1.069,19, corresponda a alguma parcela salarial ou indenizatória devida ao reclamante recorrente. Ao contrário, há a alegação inconteste de erro por parte da pagadora e a admissão de desconhecimento da causa pelo recebedor. A devolução, portanto, não é apenas uma medida de direito, mas um imperativo de justiça, a fim de se evitar o locupletamento indevido de uma parte em detrimento da outra. Destarte, correta a sentença que, diante da ausência de impugnação específica e da prova do depósito equivocado, acolheu o pedido contraposto e determinou a restituição do valor. Nada a reformar, assim, na sentença recorrida. Recurso ordinário conhecido e desprovido. 3. CONCLUSÃO Por todo o exposto, conheço do recurso ordinário e, no mérito, nego-lhe provimento. É como voto. Acórdão Isto posto, em Sessão Ordinária de Julgamento realizada nesta data, sob a Presidência da Excelentíssima Senhora Desembargadora Maria Auxiliadora Barros de Medeiros Rodrigues, com a presença dos Excelentíssimos Senhores Desembargadores Eridson João Fernandes Medeiros (Relator), Ricardo Luís Espíndola Borges, do Juiz Convocado Décio Teixeira de Carvalho Júnior e do(a) Representante da Procuradoria Regional do Trabalho da 21ª Região, Dra. Heloíse Ingersoll Sá, ACORDAM os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Federais e o Juiz Convocado da Primeira Turma de Julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da Vigésima Primeira Região, por unanimidade, conhecer do recurso ordinário. Mérito: por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário. Obs.: Ausente, justificadamente, o Excelentíssimo Senhor Desembargador Bento Herculano Duarte Neto. Convocado o Excelentíssimo Senhor Juiz Décio Teixeira de Carvalho Júnior (ATO TRT21-GP Nº 163/2025, prorrogado pelo ATO TRT21-GP Nº 188/2025). Natal/RN, 29 de julho de 2025. ERIDSON JOÃO FERNANDES MEDEIROS Desembargador Relator NATAL/RN, 30 de julho de 2025. TASIA CRISTINA MATIAS DE MACEDO Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - V V C ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA

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Dheyssonn Gama Da Silva Santos x Spal Industria Brasileira De Bebidas S/A e outros

ID: 339127719

Tribunal: TRT21 Órgão: Primeira Turma de Julgamento Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0000946-80.2024.5.21.0014

Data de Disponibilização: 31/07/2025

Polo Ativo:

DHEYSSONN GAMA DA SILVA SANTOS

Polo Passivo:

SPAL INDUSTRIA BRASILEIRA DE BEBIDAS S/A V V C ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA

Acórdão

Advogados:

VIVIANE CASTRO NEVES PASCOAL MALDONADO DAL MAS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

TAINA FLORINTINO SILVA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

MARCUS VINICIUS FURTADO DA CUNHA

OAB/RN XXXXXX Desbloquear

MOISES ALEX DE ARAUJO SILVA

OAB/RN XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA DE JULGAMENTO Relator: ERIDSON JOAO FERNANDES MEDEIROS ROT 0000946-80.2024.5.21.0014 RECORRENTE: … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA DE JULGAMENTO Relator: ERIDSON JOAO FERNANDES MEDEIROS ROT 0000946-80.2024.5.21.0014 RECORRENTE: DHEYSSONN GAMA DA SILVA SANTOS RECORRIDO: V V C ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA E OUTROS (1) Acórdão Recurso Ordinário nº 0000946-80.2024.5.21.0014 Desembargador Relator: Eridson João Fernandes Medeiros Recorrente: Dheyssonn Gama da Silva Santos Advogada: Tainá Florintino Silva Recorrido: VVC Alto Oeste Transportes e Logística Ltda. Advogados: Marcus Vinícius Furtado da Cunha e outro Recorrido: Spal Indústria Brasileira de Bebidas S.A. Advogada: Viviane Castro Neves Pascoal Maldonado Dal Mas Origem: 4ª Vara do Trabalho de Mossoró/RN EMENTA DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. RESCISÃO INDIRETA. ACÚMULO DE FUNÇÕES. DANO MORAL. HORAS EXTRAS. PEDIDO CONTRAPOSTO. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso Ordinário interposto pelo reclamante contra sentença que, embora tenha reconhecido o acúmulo de funções com deferimento de acréscimo salarial, julgou improcedentes os pedidos de rescisão indireta do contrato de trabalho, indenização por danos morais e horas extras, convertendo o fim do vínculo em pedido de demissão. A sentença também acolheu o pedido contraposto da empresa reclamada, condenando o reclamante a restituir valor depositado por engano. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há 4 questões em discussão: (a) definir se o acúmulo de funções, por si só, configura falta grave do empregador apta a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483 da CLT; (b) estabelecer se cobranças ríspidas por desempenho e o transporte do empregado em compartimento de carga do veículo configuram assédio moral passível de indenização; (c) analisar o direito a horas extras e intervalo intrajornada, diante da confissão do autor sobre a fidedignidade dos horários de entrada e saída e da pré-assinalação do intervalo nos cartões de ponto; (d) determinar se é devida a restituição de valor depositado por erro pela empregadora, sobre o qual o reclamante não se manifestou quando da contestação ao pedido contraposto. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O mero acúmulo de funções, embora possa gerar direito a um acréscimo salarial para reequilibrar o contrato, não configura, por si só, a falta grave prevista no art. 483, 'a', da CLT, sendo necessária a demonstração de que a exigência de serviços alheios ao contrato tornou a continuidade da relação de emprego insustentável. 4. Cobranças por resultados, ainda que ríspidas, inserem-se no poder diretivo do empregador e não caracterizam o rigor excessivo do art. 483, 'b', da CLT, quando não extrapolam a razoabilidade para resultar em assédio ou humilhação sistemática. 5. O transporte de empregado em condições inadequadas, embora configure grave falha de segurança do trabalho, não se equipara ao assédio moral se não for demonstrada a intenção deliberada e sistemática de humilhar o trabalhador, elemento essencial para a configuração do ilícito. 6. A confissão judicial do empregado de que os horários de início e término da jornada eram corretamente registrados nos controles de frequência torna os fatos incontroversos, prevalecendo sobre alegações posteriores em contrário e afastando o direito a horas extras, nos termos dos arts. 374, II, e 389 do CPC. 7. A pré-assinalação do intervalo intrajornada nos cartões de ponto é autorizada pelo art. 74, § 2º, da CLT, gerando uma presunção relativa de sua fruição, que só pode ser afastada por prova robusta em contrário, cujo ônus é do empregado, conforme o art. 818, I, da CLT. 8. O silêncio do reclamante em sua manifestação sobre a contestação e o pedido contraposto tornam incontroversa a alegação de pagamento indevido, nos termos do art. 341 do CPC. 9. A manutenção no patrimônio do empregado de valor recebido por erro comprovado do empregador, cuja causa jurídica o recebedor desconhece, configura enriquecimento ilícito e impõe o dever de restituição, conforme o art. 884 do Código Civil. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso ordinário conhecido e desprovido. Teses de julgamento: 1. O acúmulo de funções que enseja o pagamento de um adicional salarial não constitui, isoladamente, falta grave do empregador para fins de rescisão indireta, a menos que se comprove uma alteração contratual lesiva de magnitude que torne a continuidade do vínculo insustentável. 2. Cobranças ríspidas por desempenho, inseridas no poder diretivo, e falhas de segurança do trabalho, como o transporte inadequado, não configuram assédio moral quando ausente a prova da reiteração da conduta com o objetivo de desestabilizar psicologicamente o empregado. 3. A confissão judicial do trabalhador sobre a fidedignidade dos horários de entrada e saída registrados nos cartões de ponto faz prova contra o confidente e impede o deferimento de horas extras com base na invalidade desses mesmos registros. 4. A ausência de impugnação específica ao pedido contraposto, somada à prova do depósito equivocado, tornam incontroversa a obrigação do empregado de restituir o valor recebido indevidamente, a fim de evitar o enriquecimento sem causa. Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 74, § 2º, 483, 'a', 'b' e 'c', e 818, I; CPC, arts. 341, 374, II, e 389; Código Civil, art. 884. Jurisprudência relevante citada: TST, RRAg-1000764-53.2022.5.02.0442, 1ª Turma, Rel. Min. Amaury Rodrigues Pinto Júnior, DEJT 26/02/2025. RELATÓRIO Vistos etc. Trata-se de recurso ordinário interposto por DHEYSSONN GAMA DA SILVA SANTOS contra a sentença oriunda da 4ª Vara do Trabalho de Mossoró/RN (Id. 7418beb; fls. 209/230), que, nos autos da reclamação trabalhista, julgou improcedentes os pedidos deduzidos em face da reclamada SPAL INDÚSTRIA BRASILEIRA DE BEBIDAS S.A. e procedentes, em parte, os pedidos formulados em face da reclamada VVC ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA., condenando esta "a pagar, 48 horas após o trânsito em julgado da presente sentença: 1. acúmulo de função de 10% (dez por cento) do seu salário base, pelo exercício simultâneo das funções de Auxiliar de entrega e motorista e os reflexos do adicional de acúmulo de função nas férias acrescidas de 1/3 (um terço), 13º salário e FGTS. 2. 5% (cinco por cento) do valor da condenação à título de honorários advocatícios sucumbenciais", além de custas processuais. Além disso, julgou "PROCEDENTE o pedido contraposto formulado pela ré V V C ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA. em face de DHEYSSONN GAMA DA SILVA SANTOS, para condená-lo a restituir a quantia de R$ 1.069,19 em favor da sua ex-empregadora." Nas suas razões de recurso (Id. 305d25b; fls. 441/458), o reclamante se insurge, de início, contra o não reconhecimento da rescisão indireta, argumentando que a própria sentença é contraditória ao deferir o adicional por acúmulo de função, mas não considerar tal fato como falta grave do empregador. Alega que o acúmulo de função sem a devida contraprestação, somado ao tratamento com rigor excessivo, à exposição a risco físico e ao desrespeito verbal por parte do superior hierárquico, conforme demonstrado por áudios e vídeos, configuram motivos suficientes para a rescisão do contrato por culpa da empregadora, nos termos do art. 483, "b" e "c", da CLT. Afirma também que o indeferimento do pedido de danos morais, ignorou as provas de assédio, como arquivos de mídia que evidenciam condutas humilhantes e tratamento desrespeitoso. Sustenta que foi exposto a risco físico ao ser compelido a transitar no baú do caminhão com as portas abertas. Menciona, ainda, o depoimento de uma testemunha que, apesar de não ter trabalhado no mesmo período, confirmou o tratamento rude e grosseiro praticado pelo gerente com os empregados em geral. Além disso, em relação às horas extras, alega que os cartões de ponto não refletem a jornada real, pois, por orientação do gerente, registrava o ponto no horário contratual e continuava trabalhando. Assevera que usufruía de apenas 30 minutos de intervalo para refeição, e não uma hora. Ressalta que o próprio sócio da empresa confessou em depoimento que o intervalo era pré-assinalado nos controles de frequência, o que, segundo o recorrente, invalida tais registros como prova da fruição integral do descanso. Ao final, refuta a condenação a devolver valores à recorrida. Argumenta que o montante supostamente depositado por engano foi pago juntamente com as verbas rescisórias, não sendo possível identificar a que título se refere, o que tornaria improcedente o pedido contraposto. Contrarrazões pela reclamada VVC ALTO OESTE TRANSPORTES E LOGÍSTICA LTDA. (Id. 3debcdd). É o relatório. VOTO 1. ADMISSIBILIDADE O reclamante tomou ciência da sentença em 23/04/2025, por meio de publicação no Diário Eletrônico, conforme informação lançada no sistema do PJE. Interpôs o presente recurso em 27/04/2025 (fls. 263), tempestivamente, portanto. Preparo inexigível. Representação regular pela advogada Tainá Florintino Silva (Id. b02f361; apud acta). Conheço. 2. MÉRITO O reclamante, ora recorrente, se insurge, de início, contra o não reconhecimento da rescisão indireta, argumentando que a própria sentença é contraditória ao deferir o adicional por acúmulo de função, mas não considerar tal fato como falta grave do empregador. Alega que o acúmulo de função sem a devida contraprestação, somado ao tratamento com rigor excessivo, à exposição a risco físico e ao desrespeito verbal por parte do superior hierárquico, conforme demonstrado por áudios e vídeos, configuram motivos suficientes para a rescisão do contrato por culpa da empregadora, nos termos do art. 483, "b" e "c", da CLT. Ao exame. Na sentença, em relação ao tema, o d. julgador, embora tenha deferido o pagamento de um plus salarial decorrente do acúmulo de funções, entendeu pela não configuração de falta grave apta a ensejar a resolução contratual por culpa da empregadora, sob o fundamento de que o reclamante recorrente não logrou êxito em comprovar o ato faltoso de gravidade suficiente para tanto. In verbis: "O autor assevera que "diante das ilegalidades praticadas pela a 1ª Reclamada, o Reclamante decidiu ingressar com a presente Reclamação Trabalhista, valendo-se do entendimento previsto no artigo 483 da CLT, pleiteando a rescisão indireta do contrato de trabalho" (fl. 12). A parte ré se escuda: No dia 29/11/2024 o Reclamante dirigiu-se à empresa e informou através de Comunicação de Rescisão Indireta (em anexo) seu desligamento, ocasião em que notificou a Reclamada que não mais compareceria ao trabalho e que havia ingressado com esta demanda onde discutiria a Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho (fl. 145). Pois bem. A rescisão indireta, diante da lição do art. 483 da CLT, considera que o empregado pode rescindir o contrato e pleitear indenização quando forem exigidos serviços superiores às suas forças, proibidos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato; for tratado pelo empregador ou superiores hierárquicos com rigor excessivo; e correr perigo evidente de mal considerável. No entanto, haja vista que nem todas as situações desagradáveis ao empregado podem ser motivo desta forma de rompimento contratual, o empregado que pleitear a rescisão indireta, necessariamente deverá provar o ato grave e faltoso do empregador, seja por meio de provas testemunhais ou documentais, o que no caso não ocorreu. Indefiro. Uma vez não acolhida a rescisão indireta, a melhor solução é decidir pela rescisão do contrato de trabalho por pedido de demissão, uma vez que o autor usufruiu da faculdade de se ausentar do emprego, não sendo possível a continuidade da relação empregatícia" (fls. 218/219). Analisa-se. Primeiramente, na hipótese de empregado contratado como auxiliar de entrega que também desempenha as funções de motorista, com o consequente reconhecimento judicial do acúmulo de funções, é de se perquirir se tal acúmulo configura, por si só, motivo para a rescisão indireta do contrato de trabalho com base no art. 483, "a", da CLT. O art. 483 Consolidado elenca as hipóteses em que o empregado pode considerar o contrato de trabalho rescindido por falta grave do empregador, a chamada "justa causa do empregador" ou rescisão indireta. A alínea "a" especifica que a rescisão é cabível quando "forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato". No caso, a controvérsia central reside na interpretação do termo "alheios ao contrato". Em uma análise inicial, poder-se-ia concluir que, se um empregado foi contratado para uma função específica (auxiliar de entrega), a exigência de outra (motorista) caracterizaria a prestação de serviços alheios ao pactuado. Contudo, a jurisprudência trabalhista tem se consolidado no sentido de que o mero acúmulo de funções, embora possa gerar o direito a um acréscimo salarial para compensar o desequilíbrio contratual, não configura automaticamente a falta grave prevista na alínea "a" do artigo 483. Para uma análise mais aprofundada, é fundamental distinguir o acúmulo do desvio de função. No acúmulo, o empregado exerce, além de sua função principal, outras atividades de natureza diversa. No desvio, ele passa a exercer função completamente distinta e de maior responsabilidade daquela para a qual foi contratado, sem a devida anotação em carteira e o correspondente aumento salarial. Na presente causa, verificadas as peculiaridades fáticas, das quais consta o registro em sentença de que constituía "prática da empresa permitir que os ajudantes de motorista que tenham habilitação possam conduzir os veículos em rotas próximas e pouco complicadas, com vistas a promoção futura", conforme depoimento do preposto, o auxiliar de entrega que também dirige o veículo se enquadra mais classicamente na hipótese de acúmulo de funções. Consoante a jurisprudência pátria, para a configuração da rescisão indireta com base no art. 483, "a", da CLT, é necessário que a exigência de serviços alheios ao contrato seja de tal monta que torne a continuidade da relação de emprego insustentável. Assim, a falta cometida pelo empregador deve ser grave o suficiente, para quebrar a confiança e a boa-fé que devem reger o contrato de trabalho. Veja-se, quanto à matéria, o recente pronunciamento do colendo TST: "RESCISÃO INDIRETA. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. O reconhecimento de diferenças de horas extras, acúmulo de funções e adicional de insalubridade, não configuram faltas aptas a justificar, por si sós, a rescisão indireta do contrato de trabalho" (RRAg-1000764-53.2022.5.02.0442, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Júnior, DEJT 26/02/2025). Logo, o simples fato de o empregador exigir tarefas adicionais, compatíveis com a condição pessoal do empregado e que não representem uma alteração contratual lesiva de grande magnitude, não é considerado falta grave para justificar a rescisão indireta. A consequência jurídica mais comum, nessa hipótese, é a condenação do empregador no pagamento do adicional salarial, a fim de reequilibrar o contrato. Essa situação só muda de figura se o acúmulo de funções vier acompanhado de outros elementos que demonstrem a gravidade da conduta patronal. Por exemplo, se a função de motorista: 1) exigir qualificação específica que o empregado não possui, colocando-o em risco ou em situação de ilegalidade (exercício ilegal da profissão); 2) resultar em uma sobrecarga de trabalho excessiva e prejudicial à saúde, caracterizando "serviços superiores às suas forças"; 3) representar uma alteração contratual unilateral e lesiva, que desvirtue completamente o objeto inicial do contrato, aproximando-se de um desvio de função; 4) for acompanhada de tratamento rigoroso e humilhante por parte do empregador. Nesses cenários descritos acima, que não restaram comprovados nos presentes autos, o juiz pode, com efeito, entender que a conduta do empregador ultrapassou o mero desequilíbrio contratual e configurou falta grave, apta a ensejar a rescisão indireta com base não apenas na alínea "a", mas também em outras alíneas do artigo 483, como a "d" (não cumprir o empregador as obrigações do contrato) ou "e" (praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama). Voltando ao exame das alegações recursais, não se vislumbra, in casu, a alegada contradição no julgado. Isso porque o deferimento de diferenças salariais por acúmulo de função representa o reconhecimento de um desequilíbrio na base comutativa do contrato, o qual é sanado por meio de uma reparação de cunho patrimonial. Tal condenação, por si só, não se traduz, automaticamente, em falta grave capitulada no art. 483 da CLT. A exigência de serviços alheios ao contrato, prevista na alínea "a" do referido artigo, para justificar a rescisão indireta, pressupõe uma alteração lesiva e substancial das condições pactuadas, que imponha ao trabalhador um ônus excessivo e desproporcional. No caso, a própria condenação no pagamento do adicional por acúmulo de função tem o condão de restabelecer o equilíbrio financeiro do contrato, não se revelando, isoladamente, como um ato de gravidade suficiente a ponto de impedir a continuidade do vínculo. Ademais, no que tange à alegação de tratamento com rigor excessivo e desrespeito verbal por parte do superior hierárquico (art. 483, "b", da CLT), a análise das provas audiovisuais (áudios e vídeos) acostadas aos autos não corrobora a tese do recorrente. Conforme bem pontuado na sentença, e ora se constata, o que se revela são diálogos em tom mais acalorado, nos quais o superior hierárquico questiona o reclamante sobre avarias recorrentes na carga transportada. Embora a urbanidade e o respeito devam nortear as relações de trabalho, cobranças por resultados e esclarecimentos sobre falhas operacionais, ainda que ríspidas, inserem-se no âmbito do poder diretivo do empregador. O rigor excessivo a que alude a lei é aquele que extrapola os limites da razoabilidade, descambando para o assédio, a humilhação ou o tratamento vexatório sistemático, o que, data venia, não restou robustamente comprovado nos autos. Discussões pontuais, relacionadas a problemas concretos do serviço, não possuem o condão de caracterizar a falta grave prevista na alínea "b" do art. 483 da CLT. Por fim, quanto ao suposto perigo manifesto de mal considerável (art. 483, "c", da CLT), a argumentação do reclamante recorrente é igualmente frágil. A existência de avarias nos produtos durante os deslocamentos não implica, necessariamente, a exposição do trabalhador a risco físico. Para a configuração desta hipótese, seria imprescindível a comprovação de que o empregador, de forma negligente, expunha o empregado a uma condição de perigo real e iminente, como, por exemplo, a ausência de manutenção nos veículos, a imposição de rotas notória e extraordinariamente perigosas ou a falta de fornecimento de equipamentos de proteção. O reclamante recorrente não produziu qualquer prova nesse sentido, limitando-se a ilações genéricas que não se prestam a fundamentar a gravidade exigida pela norma. Destarte, para a configuração da rescisão indireta, a falta do empregador deve se revestir de gravidade tal, que abale profundamente a fidúcia e torne impossível a subsistência da relação contratual. No caso em tela, o reclamante recorrente não se desincumbiu do seu ônus probatório, nos termos do art. 818, I, da CLT, quanto à ocorrência de fatos suficientemente graves para justificar a resolução do contrato por culpa da empresa reclamada recorrida. Sentença que se mantém, em relação a este tópico. O reclamante recorrente afirma também que o indeferimento do pedido quanto ao alegado dano moral ignorou as provas de assédio, como arquivos de mídia que evidenciam condutas humilhantes e tratamento desrespeitoso. Sustenta que foi exposto a risco físico ao ser compelido a transitar no baú do caminhão com as portas abertas. Menciona, ainda, o depoimento de uma testemunha que, apesar de não ter trabalhado no mesmo período, confirmou o tratamento rude e grosseiro praticado pelo gerente com os empregados em geral. Na decisão, o d. julgador fundamentou: "[...]. No que respeita aos fatos narrados pelo reclamante, após as oitivas atentas dos áudios juntados, não se vislumbra o assédio moral aventado. Para se amparar a pretensão indenizatória por danos morais, necessária a análise da coexistência de três requisitos na etiologia da responsabilidade civil: a ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta, o dano e o nexo de causalidade do evento com o trabalho. No caso dos autos, o primeiro vídeo juntado pelo autor (id. b80fe40) mostra a narração do reclamante que é levado no baú de caminhão carregado de bebidas com a porta aberta, porque não teria lugar na cabine para sua ocupação. O segundo (id. d87dd86) parece ser continuidade do primeiro, no qual o reclamante aparece fardado na condição narrada no primeiro. O terceiro (id. a7a2ad5) diz respeito a gravação de ligação telefônica entre o reclamante e seu superior Vilamar acerca das avarias que ocorriam nos produtos. No áudio o reclamante recebe admoestações para lidar com o problema que foi reportado, não somente apontá-lo, mas resolvê-lo ou pedir ajudar para tal. O superior questiona a atitude do reclamante em continuar rodando com o caminhão de entrega com as recorrentes avarias sem pensar ou pedir uma solução, ao menos pelo celular fornecido pela empresa. O último arquivo (id. a163721) diz respeito a gravação telefônica o superior mais uma vez solicita a atenção e empenho do reclamante. Chama a atenção das reiteradas advertências verbais que o reclamante vem recebendo acerca do seu desempenho e da pontualidade e se coloca à disposição para retirar dúvidas quando for necessário. Em que pese verificar-se questionamentos mais acalorados do seu superior em relação a determinada conduta do autor em razão das avarias dos produtos que ocorriam durante o trânsito, o gestor insiste no cumprimento das normas da reclamada e na habilidade do reclamante para solucionar problemas. Pois bem. Como dito anteriormente, o assédio moral no ambiente de trabalho demanda a presença de alguns requisitos, quais sejam abusividade da conduta, natureza psicológica do atentado à dignidade psíquica do indivíduo, reiteração da conduta e finalidade de exclusão. A conduta isolada do empregador, que cause algum desconforto psicológico ao empregado, não tem o condão de configurar a presença de assédio moral, pois afasta a hipótese de reiteração de conduta; no máximo, resulta em mero aborrecimento. Ademais, a gravidade do ato não deve ser aferida em abstrato, mas contextualizada às circunstâncias do caso concreto. A repreensão realizada pelo superior não tem o condão de configurar assédio moral, pois como dito, é fundamental a repetição e a intenção do assediador de atingir o empregado. No caso em tela, o reclamante narra fatos sem a intensidade da violência psicológica e o prolongamento no tempo capazes de ocasionar um abalo moral no empregado a ponto de marginalizá-lo no seu ambiente de trabalho. Indefiro" (fls. 215/216). Correto o decisum. A reparação por assédio moral havido na relação de trabalho pressupõe a prática de um ato ilícito, pelo empregador ou seu preposto, consistente no psicoterrorismo que decorre da submissão do trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas, durante a jornada de trabalho, bem como o nexo de causalidade entre o ato de assédio e o dano experimentado pelo empregado - afetando seu estado psicológico, deteriorando sua autoestima e o levando, muitas vezes, a pedir demissão. No presente caso, deve ser frisado que repreensões mais contundentes ou cobrança de resultados pelo superior hierárquico, por si só, não são suficientes ao deferimento da pretensão, quando inexiste evidência de que os atos praticados pela empresa reclamada recorrida para esse fim tenham causado desgaste emocional agressivo no empregado. No pertinente aos arquivos de mídia anexados pelo reclamante recorrente, uma análise detalhada desses elementos de prova descritos na sentença demonstra que os fatos narrados não se amoldam ao conceito de assédio moral. A alegação do reclamante, em seu recurso, de que as provas foram ignoradas e que foi submetido a condutas humilhantes e tratamento desrespeitoso não encontra respaldo na caracterização jurídica do assédio, que exige a presença de conduta reiterada, com o objetivo específico de minar a autoestima e a permanência do empregado na empresa. Os dois primeiros vídeos, que mostram o reclamante recorrente sendo transportado no compartimento de carga de um caminhão, com a porta aberta, por falta de espaço na cabine, evidenciam, inegavelmente, uma grave falha de segurança do trabalho. A conduta da empresa ao permitir tal situação expôs o trabalhador a um risco físico iminente e a uma condição de trabalho degradante. Todavia, para a configuração do assédio moral, é imprescindível a demonstração de uma perseguição deliberada e sistemática, um "terrorismo psicológico" que visa a desestabilizar emocionalmente o empregado. A análise da mídia, em linha com o decidido pelo d. julgador, não indica que o transporte inadequado fosse uma prática contínua e direcionada especificamente ao reclamante recorrente com o intuito de humilhá-lo. Trata-se de uma irregularidade na gestão do transporte que afetaria a todos que porventura não coubessem na cabine, e não um ato de perseguição pessoal. Embora seja condenável o transporte de empregados em condições inadequadas, não se pode equipará-lo automaticamente ao assédio moral, que possui requisitos específicos. Já as gravações de ligações telefônicas entre o reclamante recorrente e seu superior, Vilamar, são o ponto central para descaracterizar a alegação de assédio. No primeiro áudio, o superior admoesta o reclamante a ter uma postura mais proativa diante das avarias, buscando soluções ou pedindo ajuda, em vez de apenas reportar o problema. Na segunda gravação, o superior reitera a necessidade de atenção e empenho, mencionando advertências verbais anteriores sobre seu desempenho e pontualidade, e se colocando à disposição para sanar dúvidas. Essas cobranças, embora possam ter sido ríspidas, inserem-se no âmbito do poder diretivo do empregador, que tem o direito e o dever de zelar pela eficiência e qualidade do serviço. A exigência de que o empregado não apenas aponte falhas, mas também contribua para a solução, é uma expectativa legítima em uma relação de trabalho. Da mesma forma, a cobrança por pontualidade e desempenho não constitui assédio. Destaca-se, ademais, que o superior se colocou à disposição para sanar dúvidas, o que demonstra uma intenção de orientar e não de humilhar. Para que a cobrança por metas e resultados resvalasse para o assédio moral, seria necessária a comprovação de que era feita de forma vexatória, reiterada e dirigida ao reclamante recorrente, com o uso de palavras de baixo calão, ameaças de demissão constantes e humilhações que minassem sua autoestima, o que não foi descrito na sentença. Em suma, a tese recursal do reclamante falha por não conseguir demonstrar a presença dos elementos essenciais que configuram o assédio moral. O transporte no caminhão, embora grave, não se demonstrou como uma prática sistemática e pessoal de humilhação. As cobranças, por sua vez, são inerentes à relação de emprego. Por fim, não há nos autos indícios de que as atitudes do superior tivessem o objetivo de forçar a rescisão contratual do reclamante recorrente. Pelo contrário, ao se colocar à disposição para ajudar, o superior demonstra uma tentativa de corrigir a rota e manter o empregado em seus quadros. Portanto, com base na análise dos fatos descritos, conclui-se que o reclamante recorrente foi, de fato, vítima de uma irregularidade trabalhista no que tange às condições de transporte. No entanto, a alegação de assédio moral não se sustenta, pois as provas não demonstram a perseguição sistemática e a intenção de desestabilizar psicologicamente o trabalhador, elementos indispensáveis para a configuração de tão grave ilícito. Por sua vez, a prova oral colhida nos autos (fls. 198) igualmente não evidenciou o alegado assédio. A testemunha trazida a juízo pelo reclamante recorrente, apesar de não ter trabalhado no mesmo período, relatou que o gerente da empresa reclamada recorrida gritava e perseguia os empregados, no caso de ordens não cumpridas, o que se revela por demais genérico e não serve à comprovação do pretenso abuso. Demais disso, a testemunha não especificou uma conduta direcionada unicamente ao reclamante recorrente, o que revela um ambiente de cobranças generalizadas, decorrentes de um comando geral e impessoal, destinado a todos os empregados da unidade, sem que a conduta do preposto do empregador tenha sido motivada por perseguição, com caráter sub-reptício, dirigida ao reclamante recorrente. Como bem define Vólia Bomfim, "o assédio moral é espécie de dano extrapatrimonial e se distingue do dano moral, pois, enquanto neste a lesão é identificada, sentida, percebida pela vítima, no assédio é camuflado, não perceptível. O dano moral pode ser pontual ou repetitivo, mas sempre expresso, claro e real. O terror psicológico é velado, oculto, despercebido pela vítima quando praticado. Caracteriza-se pela prática de sucessivos atos que baixam a autoestima do trabalhador de tal forma que ele próprio acredita na sua baixa competência ou no seu fracasso" (in Direito do Trabalho, p. 933, 18ª ed., Editora Método, 2021). Na hipótese vertente, não houve comprovação do alegado tratamento desrespeitoso por parte do empregador, apto à caracterização do pretenso assédio moral, haja vista que os elementos probatórios, quanto ao alegado ambiente de trabalho hostil, não oferecem suporte à constatação do ânimo de perseguição, de modo furtivo ou dissimulado, pela entidade patronal em relação a um determinado trabalhador, causando-lhe desestabilização emocional. Dessa forma, entendo que o demandante recorrente não foi submetido a nenhuma situação de degradação emocional, decorrente de comportamento persecutório e velado do empregador (terror psicológico), razão pela qual mantenho a sentença no tocante ao indeferimento da indenização por assédio moral. Além disso, em relação às horas extras, o reclamante recorrente alega que os cartões de ponto não refletem a jornada real, pois, por orientação do gerente, registrava o ponto no horário contratual e continuava trabalhando. Assevera que usufruía de apenas 30 minutos de intervalo para refeição, e não uma hora. Ressalta que o próprio sócio da empresa reclamada recorrida confessou em depoimento que o intervalo era pré-assinalado nos controles de frequência, o que, segundo o recorrente, invalida tais registros como prova da fruição integral do descanso. Examina-se. Para a apreciação da insurgência recursal, faz-se imprescindível observar o que ficou decidido na sentença impugnada, cabendo a citação do seguinte excerto: "[...]. Na assentada de instrução disse o autor que "os horários de início e término da jornada de trabalho eram corretamente consignados nos controles de frequência; que os registros de frequência eram feitos através de um aplicativo disponibilizado em um aparelho celular da empresa; que tinha 30 minutos para intervalo para refeições" (fl. 197), portanto, são válidos os controles juntados ao feito. Compulsando-os com zelo (id. dfcc49b), verifica-se que o autor laborou em jornada suplementar com a devida compensação conforme acordo de id. f7019a2. Insta registrar quanto ao intervalo que, embora o preposto tenha confessado que "o intervalo para refeições é pré-assinalado nos controles de frequência" (fl. 198), não cuidou o autor de desconstituir tal prova, uma vez que a testemunha convidada se mostrou inservível pois não laborou no mesmo período do reclamante. Indefiro" (fls. 217). No pertinente à prova da jornada de trabalho, o entendimento deste Relator é no sentido de que cabe ao reclamante comprovar a existência de trabalho em sobrejornada, a teor do que dispõe o art. 818, I, da CLT, independentemente da apresentação dos controles de frequência pelo empregador, pois constitui fato extraordinário ao contrato de trabalho, necessitando, assim, de comprovação. Ademais, relativamente à prática de labor extraordinário, é preciso ter em mente que, em se tratando de lide trabalhista, necessária é a incidência do princípio da primazia da realidade. Esse princípio é assentado na noção de que o contrato de trabalho é um contrato-realidade, na terminologia utilizada por Mário de La Cueva. Os fatos prevalecem sobre as formas, as formalidades ou as aparências. Ou ainda, na definição de Mozart Victor Russomano: mais valem os pressupostos fáticos da relação de trabalho do que os títulos jurídicos apresentados. Assim, como leciona Maurício Godinho Delgado, a prática concreta e habitual ao longo da prestação de serviços, independentemente da vontade manifestada pelas partes, "altera o contrato pactuado, gerando direitos e obrigações novos às partes contratantes (respeitada a fronteira da inalterabilidade contratual lesiva" (in Curso de Direito do Trabalho, p. 211, 14ª ed., LTr, 2015). Nesses termos, uma vez apresentado o controle de frequência pela empresa, na forma do art. 74, § 2º, da CLT, cabe a perquirição sobre a correspondência desses registros com a realidade, por meio do confronto com outros meios probatórios produzidos pelas partes, em especial pelo reclamante, a quem cabe desconstituir o referido elemento de prova. O reclamante recorrente busca a reforma da sentença para que sejam deferidas as horas extras, sob a alegação de invalidade dos cartões de ponto. Argumenta que os registros não refletem a jornada efetivamente cumprida. Entretanto, a pretensão recursal esbarra na prova dos autos, mais especificamente no depoimento pessoal do próprio reclamante recorrente. Conforme consta da ata de audiência (fls. 197), o reclamante afirmou de forma expressa e inequívoca que "os horários de início e término da jornada de trabalho eram corretamente consignados nos controles de frequência." Tal declaração, nos termos do art. 389 do CPC, aplicado subsidiariamente ao processo do trabalho, constitui confissão judicial, fazendo prova contra o confidente. A confissão, uma vez produzida, torna incontroversos os fatos sobre os quais versa, dispensando a produção de outras provas a respeito (art. 374, II, do CPC). A alegação tecida no recurso, de que o empregado registrava o ponto e continuava a trabalhar, além de não ter sido minimamente provada, contradiz frontalmente a sua própria assertiva em juízo, sob o crivo do contraditório. Não pode a parte, ao seu alvedrio, dispor da realidade fática conforme a conveniência de cada fase processual. Assim, havendo confissão do reclamante recorrente quanto à fidedignidade dos horários de entrada e saída, e considerando a existência de acordo de compensação de jornada válido (Id. f7019a2), reputo, ratificando o entendimento do juízo de origem, que a jornada suplementar foi devidamente quitada ou compensada. Nada deferir, portanto, neste ponto. Quanto ao intervalo intrajornada, a insurgência também não prospera. Primeiramente, é imperioso destacar que a pré-assinalação do período de repouso e alimentação é procedimento expressamente autorizado pela legislação, nos termos do art. 74, § 2º, da CLT, para os estabelecimentos que contam com mais de 20 (vinte) trabalhadores. A adoção de tal método, portanto, não constitui, por si só, qualquer irregularidade. Ao apresentar os controles de frequência (Id. dfcc49b) com a pré-assinalação de um intervalo superior a 1 (uma) hora, a empresa reclamada recorrida cumpriu com seu ônus probatório inicial, estabelecendo uma presunção relativa (juris tantum) de que o descanso era efetivamente usufruído em sua integralidade. A partir de então, cabia ao reclamante recorrente, nos exatos termos do art. 818, I, da CLT, o ônus de produzir prova robusta e convincente em sentido contrário, capaz de desconstituir a presunção de veracidade que emana dos documentos apresentados. Desse encargo, todavia, o autor não se desvencilhou. Conforme bem salientado pelo d. Magistrado de primeiro grau, o depoimento da testemunha trazida pelo reclamante recorrente se mostrou inservível, visto que não laborou no mesmo período, não podendo, assim, prestar declarações fidedignas acerca da rotina de trabalho e dos intervalos usufruídos pelo reclamante recorrente. A prova oral que lhe cabia produzir restou, então, frustrada. Resta a análise da declaração do preposto, que, segundo o reclamante recorrente, configuraria uma confissão. No entanto, sem razão. Ao afirmar que "o intervalo para refeições é pré-assinalado nos controles de frequência" (fls. 198), o representante da empresa apenas confirmou o que já era evidente pela simples análise dos espelhos de ponto (Id. dfcc49b) e o que a própria lei faculta. Tal assertiva não contém qualquer admissão de que o intervalo assinalado não era de fato usufruído. Trata-se de mera descrição de um procedimento lícito, e não de uma confissão de supressão de direitos. Dessa forma, a alegação do reclamante recorrente, isolada nos autos e desprovida de qualquer elemento probatório que a corrobore, não possui força suficiente para infirmar os registros de ponto apresentados, os quais se presumem verdadeiros. Chancelar o entendimento contrário seria admitir que a simples alegação da parte, por si só, pudesse sobrepujar a prova documental válida, em clara subversão às regras de distribuição do ônus probatório. Por todo o exposto, ausente prova da supressão do intervalo intrajornada, impõe-se a manutenção da decisão que indeferiu o pedido correspondente. Ao final, o reclamante recorrente impugna a condenação a devolver valores à empresa reclamada recorrida. Argumenta que o montante supostamente depositado por engano foi pago juntamente com as verbas rescisórias, não sendo possível identificar a que título se refere, o que tornaria improcedente o pedido contraposto. Na sentença, ficou consignado: "A reclamada assevera que "ao gerar seu arquivo de folha de pagamento no dia 03.12. 2024, inseriu equivocadamente a quantia de R$ 1.069,19 (hum mil, sessenta e nove reais e dezenove centavos), recebendo o Reclamante indevidamente tal valor em sua conta bancária. Instado a devolver o valor, o Reclamante negou-se a fazê-lo, o que se constitui apropriação indevida de tal quantia" (fl. 150). Juntou documentos. A parte reclamante silencia quanto ao pleito na manifestação de fl. 196. [...]. Fixada a premissa supra, verifico à fl. 177 comprovante de depósito realizado pela ré em favor do reclamante no valor de R$ 1.069,19 em 03/12 /2024, quando já encerrado o vínculo, mas antes do pagamento das verbas rescisórias, que ocorreu em 05/12/2024. Não havendo contestação quanto ao pleito, julgo-o procedente para condenar o reclamante a restituir em favor da reclamada a quantia de R$1.069,19" (fls. 219/220). Correto o decisum. Conforme bem delineado pelo juízo a quo, a empregadora comprovou, por meio de documento inequívoco (comprovante de depósito de Id. bfa5e17), a realização de uma transferência bancária autônoma, no exato valor de R$ 1.069,19, para a conta do reclamante recorrente em 03/12/2024 (fls. 177). O pagamento das verbas rescisórias, por sua vez, ocorreu em um momento distinto e posterior, em 05/12/2024 (fls. 181; Id. 1b34c0f). A alegação recursal de que o valor foi pago juntamente com as verbas rescisórias é, portanto, factualmente improcedente. A existência de um comprovante de transação específico, com data e valor próprios, desvinculado do termo de rescisão contratual, afasta por completo a tese de que se tratava de uma parcela rescisória de natureza desconhecida. Ademais, a questão processual é fulminante para a pretensão do reclamante recorrente. Instado a se manifestar sobre a contestação e o pedido contraposto formulado pela ré, o reclamante, conforme ata às fls. 196, manteve-se silente. Nos termos do art. 341 do CPC, incumbe ao réu (no caso, ao reclamante, em relação ao pedido contraposto) manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas. O silêncio do autor, na primeira oportunidade que teve para falar nos autos sobre o tema, tornou incontroversa a alegação da empresa de que o pagamento se deu por erro. Por fim, o argumento do próprio reclamante recorrente de que não se faz possível identificar a que título se refere o depósito milita em seu desfavor. Ao admitir que não sabe a razão do recebimento da quantia, o reclamante implicitamente confessa que não lhe era devida. A manutenção em seu patrimônio de um valor cuja causa jurídica desconhece, diante da afirmação patronal de erro no pagamento, configura o exato tipo do enriquecimento ilícito, vedado pelo nosso ordenamento jurídico, nos termos do art. 884 do Código Civil, de aplicação subsidiária: "Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários." Não há nos autos qualquer indício de que o valor de R$ 1.069,19, corresponda a alguma parcela salarial ou indenizatória devida ao reclamante recorrente. Ao contrário, há a alegação inconteste de erro por parte da pagadora e a admissão de desconhecimento da causa pelo recebedor. A devolução, portanto, não é apenas uma medida de direito, mas um imperativo de justiça, a fim de se evitar o locupletamento indevido de uma parte em detrimento da outra. Destarte, correta a sentença que, diante da ausência de impugnação específica e da prova do depósito equivocado, acolheu o pedido contraposto e determinou a restituição do valor. Nada a reformar, assim, na sentença recorrida. Recurso ordinário conhecido e desprovido. 3. CONCLUSÃO Por todo o exposto, conheço do recurso ordinário e, no mérito, nego-lhe provimento. É como voto. Acórdão Isto posto, em Sessão Ordinária de Julgamento realizada nesta data, sob a Presidência da Excelentíssima Senhora Desembargadora Maria Auxiliadora Barros de Medeiros Rodrigues, com a presença dos Excelentíssimos Senhores Desembargadores Eridson João Fernandes Medeiros (Relator), Ricardo Luís Espíndola Borges, do Juiz Convocado Décio Teixeira de Carvalho Júnior e do(a) Representante da Procuradoria Regional do Trabalho da 21ª Região, Dra. Heloíse Ingersoll Sá, ACORDAM os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Federais e o Juiz Convocado da Primeira Turma de Julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da Vigésima Primeira Região, por unanimidade, conhecer do recurso ordinário. Mérito: por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário. Obs.: Ausente, justificadamente, o Excelentíssimo Senhor Desembargador Bento Herculano Duarte Neto. Convocado o Excelentíssimo Senhor Juiz Décio Teixeira de Carvalho Júnior (ATO TRT21-GP Nº 163/2025, prorrogado pelo ATO TRT21-GP Nº 188/2025). Natal/RN, 29 de julho de 2025. ERIDSON JOÃO FERNANDES MEDEIROS Desembargador Relator NATAL/RN, 30 de julho de 2025. TASIA CRISTINA MATIAS DE MACEDO Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - SPAL INDUSTRIA BRASILEIRA DE BEBIDAS S/A

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Processo nº 7005384-27.2024.8.22.0022

ID: 339197150

Tribunal: TJRO Órgão: São Miguel do Guaporé - 2ª Vara Genérica Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 7005384-27.2024.8.22.0022

Data de Disponibilização: 31/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CLADEMILTON BRAGA MELLO

Sentença

Advogados:

FABIO DE PAULA NUNES DA SILVA

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LUCAS WESTFAL STRELOW

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia São Miguel do Guaporé - 2ª Vara Genérica Av.São Paulo, nº 1395, Bairro Cristo Rei, CEP 76932-000, São Miguel do Guaporé Número d… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia São Miguel do Guaporé - 2ª Vara Genérica Av.São Paulo, nº 1395, Bairro Cristo Rei, CEP 76932-000, São Miguel do Guaporé Número do processo: 7005384-27.2024.8.22.0022 Classe: Ação Penal - Procedimento Ordinário Polo Ativo: MPRO - Ministério Público do Estado de Rondônia, P. -. S. -. 1. D. D. P. C. ADVOGADOS DOS AUTORES: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA, PCRO - POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE RONDONIA Polo Passivo: CLADEMILTON BRAGA MELLO ADVOGADOS DO DENUNCIADO: LUCAS WESTFAL STRELOW, OAB nº RO13983, FABIO DE PAULA NUNES DA SILVA, OAB nº RO8713 SENTENÇA I. RELATÓRIO Trata-se de ação penal de iniciativa pública incondicionada, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Rondônia em face do réu CLADEMILTON BRAGA MELLO, já qualificado nos autos, imputando-lhe a prática da conduta descrita no art. 129, §1º, inciso I, do Código Penal. A acusação foi formulada com a seguinte descrição fática (Id. 115389097): “No dia 15/11/2024, por volta das 18h30min, na BR-429, próximo à entrada da cidade de Seringueiras, sentido saída para São Francisco, zona rural do município de Seringueiras/RO, o denunciado CLADEMILTON BRAGA MELLO agindo dolosamente, ciente da ilicitude e reprovabilidade da sua conduta, mediante o uso de arma fogo, ofendeu a integridade corporal da vítima Milena Da Silva Ramos. Segundo restou apurado, na data supramencionada, a vítima Milena da Silva Ramos deslocava-se em uma motocicleta no retorno do Distrito Novo Planalto, acompanhada de amigos. Durante o trajeto, um veículo não identificado, semelhante a uma caminhonete, aproximou-se. Nesse momento, a vítima sentiu uma dor aguda no pé direito e, ao verificar a situação, constatou uma perfuração causada por um disparo de arma de fogo, segundo análise preliminar de seus companheiros. Em ato contínuo, a vítima foi conduzida ao hospital, onde foi constatado que o disparo resultou em lesões graves, incluindo o rompimento de tendões e fraturas nos dedos do pé direito, gerando incapacidade para ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias, conforme o Laudo de Exame de Lesão Corporal (fls. 99/100) - ID 115322893. Por fim, consta nos autos que, no decorrer das investigações, a vítima identificou o denunciado CLADEMILTON como o autor do delito. Ademais, em seu próprio depoimento prestado após a prisão, o denunciado confessou ter efetuado o disparo de arma de fogo. Ante o exposto, denuncia-se CLADEMILTON BRAGA MELLO como incurso na conduta típica prevista no art. 129, §1º, incido I, do Código Penal Brasileiro. ” Oferecida a denúncia (Id. 115389097), esta foi recebida em 09/01/2025, ocasião em que a prisão preventiva foi revogada (Id. 115503467). O acusado foi citado e apresentou resposta à acusação (Id. 116280467). Designada audiência de instrução e julgamento, foram ouvidas a informante Ana Carolina Gabrecht Friedrich e a vítima Milena da Silva Ramos. Ao final da instrução, procedeu-se ao interrogatório do réu (Id. 123861190). O Ministério Público apresentou alegações finais requerendo a procedência integral da denúncia. Sustentou que a autoria e a materialidade do delito estão amplamente comprovadas nos autos, com base nos seguintes elementos: ocorrência policial contendo os registros iniciais dos fatos, com a oitiva da vítima e de testemunhas; relatório de análise de dados relativos ao denunciado; prontuário médico e laudo de exame de lesões corporais, que atestaram a incapacidade da vítima para as atividades habituais por período superior a 30 dias, indicando que as lesões demandariam de três a seis semanas para regeneração; confissão do próprio acusado, que admitiu ter realizado disparos de arma de fogo no contexto narrado na denúncia; depoimento prestado pela vítima em juízo, que confirma a dinâmica dos fatos. Diante dessas provas, o parquet concluiu pela responsabilidade penal do réu Clademilton Braga Mello na prática do crime previsto no art. 129, §1º, inciso I, do Código Penal, requerendo, portanto, a condenação nos termos da exordial acusatória. A Defesa apresentou alegações finais sem suscitar preliminares, reconhecendo que a autoria e a materialidade do delito são incontroversas, razão pela qual optou por não se manifestar de forma detida sobre esses pontos. Impugnou, contudo, a gravidade da lesão, argumentando com base no laudo de exame de corpo de delito que a vítima recebeu alta hospitalar cinco dias após o fato. Destacou que ela permaneceu cerca de uma semana na casa da mãe e mais duas semanas sem realizar suas atividades habituais, o que, segundo a Defesa, não perfaria os 30 dias exigidos pelo § 1º do art. 129 do Código Penal para caracterização da lesão corporal grave — ainda que o exame médico indireto ateste incapacidade superior a esse período. No tocante à dosimetria da pena, a Defesa pleiteou a fixação da sanção no mínimo legal, destacando que as circunstâncias judiciais são favoráveis ao réu. Requereu, ainda, o reconhecimento da confissão como atenuante, a fixação do regime inicial aberto para eventual cumprimento de pena e o direito de o acusado recorrer em liberdade. O réu responde ao processo em LIBERDADE. Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório. Decido. II – DAS PRELIMINARES E DA REGULARIDADE PROCESSUAL Antes de adentrar no mérito, consigne-se que não foram suscitadas questões preliminares. No mais, verifica-se a presença das condições da ação, uma vez que a denúncia descreve fato típico, ilícito e culpável, havendo, portanto, justa causa para o prosseguimento da ação penal. Trata-se de ação penal pública incondicionada, o que confere legitimidade ao Ministério Público para figurar no polo ativo da demanda. Do mesmo modo, o réu possui legitimidade para compor o polo passivo. Assim, estando presentes a possibilidade jurídica do pedido, a legitimidade das partes e o interesse de agir, conclui-se pela regular constituição da relação processual. Igualmente, estão atendidos os pressupostos processuais, na medida em que as partes são legítimas e o Juízo é competente para processar e julgar a presente causa. Ademais, não se verifica a incidência de causas de impedimento ou suspeição. Estão igualmente satisfeitos os pressupostos processuais de natureza negativa, uma vez que não há litispendência nem coisa julgada relativamente à presente demanda. Considerando, portanto, que o processo se encontra hígido, tanto material quanto formalmente, passa-se à análise do mérito. III. DO MÉRITO Imputa-se ao acusado CLADEMILTON BRAGA MELLO, já qualificado nos autos, a conduta tipificada no art. 129, §1º, inciso I, do Código Penal. A materialidade delitiva encontra-se comprovada pelos seguintes elementos de prova: Boletim de Ocorrência nº 00195331/2024; Laudo de Exame de Lesão Corporal 9/2024; Depoimentos colhidos no curso do inquérito policial e sob o crivo do contraditório judicial. No que tange à autoria, passa-se à análise da conduta imputada. Em seu interrogatório judicial, o acusado Clademilton Braga Mello declarou que, no dia dos fatos, estava trabalhando e passou pelo Distrito Planalto, onde encontrou conhecidos em um bar. Disse que permaneceu no local ingerindo cerveja e, posteriormente, saiu de motocicleta, seguindo atrás de Ana, Milena e Ailton. Segundo o réu, durante o trajeto, parou na estrada para urinar e, em seguida, conduziu Ana na moto. Narrou que, enquanto trafegavam em baixa velocidade, tentou ultrapassar uma caminhonete, iniciando uma aceleração. Alegou que, próximo a Seringueiras, a mesma caminhonete teria feito uma manobra arriscada, quase os empurrando contra outro veículo. Clademilton afirmou que, diante da situação, sentindo-se ameaçado, efetuou três disparos com a arma de um colega “apenas para alertar” o condutor da caminhonete. Ressaltou que não atirou em direção a ninguém e negou portar armas habitualmente. Declarou que não possui armas de fogo e que nunca havia disparado contra veículos anteriormente. Por fim, afirmou que ajudou financeiramente no tratamento da vítima, entregando dinheiro a Ailton, para que fosse repassado à Milena. Ressalte-se, por outro lado, que, embora a confissão não mais detenha o status de “rainha das provas” (regina probationum), como proclamava a doutrina clássica, ela ainda constitui elemento probatório de grande relevância. Nos casos como o presente, quando a confissão é prestada de forma expressa, circunstanciada e compatível com os demais elementos probatórios constantes dos autos, especialmente ao detalhar minuciosamente as circunstâncias do fato, afasta-se qualquer dúvida razoável acerca da autoria delitiva. A vítima Milena da Silva Ramos declarou que, no dia dos fatos era feriado nacional. Afirmou que estava no Rancho do Pescador acompanhada de Ailton, Ana e outros amigos. Relatou que, em determinado momento, o grupo decidiu seguir para um sítio nas proximidades. Durante o trajeto, pararam em um bar, onde consumiram cervejas, ocasião em que o acusado também chegou ao local, ingerindo uma bebida com o grupo, por volta das 17h. Segundo a vítima, ao saírem do bar, o grupo se organizou para retornar, pois Ailton estava sob monitoramento eletrônico e precisava respeitar o horário imposto pela tornozeleira. Narrando a sequência dos fatos, afirmou que, pouco antes de chegarem à BR-429, o grupo fez uma parada para que os presentes urinassem. Nesse momento, Ana seguiu viagem com o acusado em um veículo, enquanto a vítima prosseguiu na garupa da motocicleta conduzida por Ailton. Próximos à cidade de Seringueiras, em baixa velocidade, a vítima sentiu uma dor aguda no pé direito. Pediu a Ailton que parasse a motocicleta, acreditando inicialmente que havia sido atingida por algum objeto. Ao verificar a situação, constatou sangramento intenso e fraturas nos ossos do pé, o que a levou a imaginar que algo havia se chocado contra ela. Pouco depois, Ana chegou ao local e alertou que a vítima havia sido atingida por um disparo de arma de fogo. A vítima informou que foi levada ao hospital, onde ficou internada entre sete e nove dias, recebendo antibióticos e outros cuidados médicos. O laudo médico confirmou que o projétil transpassou o pé, causando fraturas e lesões graves nos tendões, o que a deixou impossibilitada de realizar atividades habituais por longo período. Disse ainda que a enfermeira lhe mostrou os ossos quebrados e a alertou sobre o risco de perder o pé caso não seguisse os cuidados médicos corretamente. Afirmou que, após a alta hospitalar, precisou passar cerca de uma semana na casa dos pais no sítio, pois não conseguia apoiar o pé no chão, e posteriormente retornou para casa, utilizando muletas. Declarou que precisou pagar pessoas para realizar a limpeza de sua residência, pois estava incapaz de executar as tarefas domésticas. Contou que não recebeu qualquer assistência do acusado, mesmo após o episódio, e que, conforme relato de Ana, ele teria efetuado três disparos em direção a um veículo, sendo que um dos tiros a atingiu no pé. Relatou, ainda, que, depois de melhorar, voltou algumas vezes ao Rancho do Pescador, mas seu pé demorou a cicatrizar, apresentando inclusive áreas de necrose. Disse também que, em ocasião posterior, envolveu-se em uma briga no Rancho do Pescador, ressaltando que Ana não estava presente nesse dia. Por fim, relatou que atualmente reside em Ariquemes, tendo retornado ao Rancho do Pescador apenas uma ou duas vezes após a melhora do ferimento, e que, logo depois de retirar a faixa do pé — cerca de duas semanas após deixar a casa dos pais —, conseguiu retomar gradualmente suas atividades. É oportuno destacar a importância conferida pela jurisprudência ao depoimento da vítima, especialmente em crimes dessa natureza, sobretudo quando seu relato é corroborado por outros elementos probatórios. A informante Ana Carolina Gabrecht Friedrich declarou que, no dia em que a vítima Milena da Silva Ramos foi atingida por um disparo de arma de fogo no pé, todos estavam retornando do Distrito Novo Planalto. Relatou que, em determinado momento, o acusado Clademilton Braga Mello, que conduzia a motocicleta em que ela estava como passageira, tentou ultrapassar um automóvel, mas o veículo não permitiu a manobra. Segundo a informante, diante da situação, o acusado sacou um revólver e efetuou disparos contra o carro. Ana afirmou não recordar exatamente quantos tiros foram disparados, mas reiterou que os disparos foram direcionados ao automóvel, e não intencionalmente contra Milena. Acrescentou que, em seu primeiro depoimento, mentiu por medo do acusado. Posteriormente, ao ser informada pela autoridade policial de que os fatos já haviam sido apurados, decidiu relatar a verdade sobre o ocorrido. Da análise dos autos, evidencia-se a existência de provas materiais robustas, notadamente o laudo de exame de corpo de delito indireto e os prontuários médicos da vítima, os quais confirmam a extensão das lesões e sua gravidade, corroborando de forma direta os depoimentos colhidos em juízo e reforçando a tese acusatória. O laudo pericial descreveu com precisão a natureza das lesões, apontando fraturas, rompimento de tendões e incapacidade da vítima para as ocupações habituais por período superior a 30 (trinta) dias, o que enquadra a conduta do acusado na hipótese prevista no art. 129, §1º, inciso I, do Código Penal. No tocante à autoria, a alegação do réu de que os disparos foram efetuados apenas “para alertar” outro veículo, sem intenção de atingir a vítima, não encontra respaldo nas provas dos autos. Os depoimentos da vítima Milena da Silva Ramos e da informante Ana Carolina Gabrecht Friedrich mostram-se harmônicos e convergentes, descrevendo a dinâmica dos fatos e a conduta do acusado, que sacou a arma e efetuou os disparos. Ademais, a vítima reconheceu expressamente o acusado como o autor do disparo que a atingiu, não havendo qualquer indício de equívoco, má-fé ou contradição relevante nesse reconhecimento. Quanto à alegação defensiva de que o resultado não configuraria lesão corporal grave por supostamente não ter causado incapacidade por mais de 30 dias, a prova pericial é categórica: o laudo oficial atestou a gravidade da lesão, a fratura óssea e a necessidade de tratamento prolongado, fixando o período de incapacidade acima do limite legal. Ainda que a Defesa aponte divergências quanto ao tempo de internação e repouso, tais apontamentos não afastam a força probatória do laudo pericial, que prevalece em face de meras interpretações subjetivas. Diante do conjunto probatório, conclui-se que estão plenamente demonstradas a materialidade – atestada pelo laudo pericial e pelos prontuários médicos – e a autoria, evidenciada pela coerência dos relatos testemunhais, pelo reconhecimento da vítima e pelos demais elementos dos autos. A conduta do réu subsume-se ao tipo penal descrito no art. 129, §1º, inciso I, do Código Penal, pois restou comprovada a ofensa à integridade corporal da vítima com resultado grave, em consonância com a capitulação jurídica contida na denúncia. Está presente o elemento subjetivo do tipo, evidenciado pelo dolo eventual, uma vez que o acusado, ao efetuar disparos de arma de fogo na direção do veículo, assumiu conscientemente o risco de atingir alguém que nele estivesse ou nas proximidades, como efetivamente ocorreu. A conduta do réu demonstra que, embora não houvesse o propósito direto de lesionar a vítima, ele aceitou o resultado lesivo como possível e, mesmo assim, prosseguiu com a ação, configurando o dolo eventual. Não há, nos autos, qualquer elemento que indique tratar-se de resultado meramente culposo. A conduta típica é igualmente antijurídica, inexistindo qualquer causa legal de exclusão de ilicitude. Conforme a teoria da ratio cognoscendi, a tipicidade da conduta faz presumir a antijuridicidade, cabendo à defesa demonstrar eventual excludente (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular de direito), ônus do qual não se desincumbiu. Quanto à culpabilidade, verifica-se que o réu é plenamente imputável, pois maior de 18 anos, não incidindo em qualquer hipótese prevista no art. 26 do Código Penal. Constatou-se, ademais, que o acusado possuía plena consciência da ilicitude de sua conduta e que lhe era exigível comportamento diverso, inexistindo qualquer excludente de culpabilidade. Dessa forma, a condenação é medida que se impõe. IV. DISPOSITIVO Diante do exposto, resolvo o mérito e julgo procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia, para o fim de CONDENAR o réu CLADEMILTON BRAGA MELLO pela prática do delito tipificado no preceito primário do art. 129, §1º, inciso I, do Código Penal. V. DOSIMETRIA DA PENA Atento ao critério trifásico, bem como aos princípios da proporcionalidade e da individualização da pena (art. 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal), e com fulcro nos artigos 59 e 68 do Código Penal, passo à fixação da pena do réu. 1. Da primeira fase da dosimetria da pena A culpabilidade, consubstanciada na reprovabilidade, não excede àquela abstratamente sugerida pelo tipo penal. O acusado registra antecedentes criminais. No entanto, considerando que a condenação anterior configura simultaneamente agravante genérica, deixo de valorá-la nesta fase. Os motivos são desfavoráveis, pois as razões que levaram o réu a sacar a arma e efetuar disparos contra a caminhonete são evidentemente fúteis e desproporcionais. Disparar arma de fogo em direção a outrem em razão de mera disputa de trânsito demonstra flagrante desprezo pelo bem jurídico protegido (integridade física de terceiros) e revela motivação leviana, incompatível com a convivência social. Outrossim, o réu admitiu ter atirado “apenas para alertar” o condutor, porém o uso de arma de fogo não se coaduna com qualquer forma razoável de “alerta”. As consequências do crime, são inerentes ao tipo penal, não permitindo valoração negativa. Por outro lado, as circunstâncias do crime são desfavoráveis, uma vez que houve retorno ao bar e consumo de álcool e direção sob influência de bebida alcoólica, explico. Restou comprovado nos autos que o réu ingeriu cerveja antes de submeter-se à condução do veículo automotor, aumentando o grau de reprovabilidade sua conduta, aliada a conjunção de embriaguez e porte de arma, potencializando o risco concreto de lesões graves a terceiros. Ademais, ressalte-se que a direção de veículo automotor sob influência de bebida alcoólica configura agravante à segurança no trânsito, não só em relação a vítima do caso sob análise, mas a eventuais pedrestes ou ocupantes de veículos no âmbiente viário ou nas imediações. Por fim, os autos não trazem maiores elementos para se aferir a conduta social e personalidade do acusado. A vítima, por sua vez, não contribuiu para o resultado delitivo. Sopesando circunstâncias acima descritas, observo que a pena-base deve ser fixada, nesta primeira etapa, em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão. 1.2. Da segunda fase da dosimetria da pena Reconheço a atenuante da confissão (art. 65, III, “d”, do CP). Por outro lado, verifico a incidência da agravante da reinciência, pois o sentenciado ostenta uma condenação criminal pelos autos n° 1000764-21.2017.822.0022, com trânsito em julgado em 6/8/2024, mas extinta a punibilidade dentro do período depurador de 5 (cinco) anos - 29/7/2021 (execução penal n. 4000026-11.2019.8.22.0022). Por entender que ambas as circunstâncias são preponderantes, ficam igualmente compensadas, permanecendo a pena como fixada. 1.3. Da terceira fase da dosimetria da pena Inexiste causas de aumento ou diminuição de pena a apreciar. Portanto, fixo a PENA DEFINITIVA para o crime previsto no art. 129, §1º, inciso I do Código Penal, em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão. 4. DETRAÇÃO O acusado foi preso em 19 de dezembro de 2024. Posteriormente, em 9 de janeiro de 2025 foi revogada a prisão preventiva do acusado, concedendo-lhe liberdade provisória mediante o cumprimento de medidas cautelares diversas da prisão, estando em liberdade desde 9 de janeiro de 2025. Nos termos do art. 387, §2º, do Código de Processo Penal, declaro que o réu esteve preso preventivamente entre 19 de dezembro de 2024 e 9 de janeiro de 2025, ou sejá, 21 (vinte e um) dias. Por essa razão, resta a PENA DEFINITIVA para o crime previsto no art. 129, § 1º, I do do Código Penal, em 1 (um) ano, 3 (três) meses e 9 (nove) dias de reclusão. 5.REGIME INICIAL O regime inicial para cumprimento da pena privativa de liberdade será o SEMIABERTO (CP, art. 33, § 2º e 3º c/c 59, III, do CP). 6. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE Deixo de substituir a privação da liberdade por penas restritivas de direitos porque o condenado não preenche os requisitos legais (art. 44, incisos I, do CP), já que o delito foi praticado mediante violência. 7. SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA De igual sorte, inaplicável a suspensão condicional da pena (art. 77, I, do CP), em razão da reincidência. 8. DEMAIS DELIBERAÇÕES Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade. Condeno, ainda, o acusado ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do CPP. Deixo de proceder a fixação do valor mínimo de indenização previsto no art. 387, IV, do CPP, pois não houve pedido neste sentido pelo órgão acusatório, requisito indispensável face a necessária observância do contraditório e da ampla defesa, o que decido na esteira da jurisprudência dos Tribunais Superiores. Declaro o perdimento e determino a destruição dos objetos apreendidos nos autos (id 115322892, fl. 41), lavrando-se o respectivo termo. Intime-se o acusado e Ministério Público para que, caso queiram, interponham recurso no prazo legal (art. 593, I, CPP). Intime-se ainda a vítima (art. 201, §2º, do CPP). Após o trânsito em julgado: I) Expeça-se guia de execução, conforme o regime inicial de cumprimento da pena. II) Comunique-se ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral), ao II/RO (Instituto de Identificação do Estado de Rondônia) e ao INI (Instituto Nacional de Identificação) sobre o teor desta condenação. III) Proceda-se as demais anotações e comunicações necessárias. Certificado o trânsito em julgado, cumpridas as deliberações supra, promovidas as anotações e comunicações pertinentes, arquivem-se os autos. Para o cumprimento das determinações exaradas acima, expeça-se o necessário. SERVE A PRESENTE COMO OFÍCIO/TERMO DE COMPROMISSO/ MANDADO DE CITAÇÃO/INTIMAÇÃO/ NOTIFICAÇÃO/ALVARÁ DE SOLTURA E/OU CARTA PRECATÓRIA. São Miguel do Guaporé, datado eletronicamente. Vinícius de Almeida Ferreira Juiz de Direito

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99 Tecnologia Ltda e outros x 99 Taxis e outros

ID: 260055465

Tribunal: TRT4 Órgão: OJ de Análise de Recurso Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0020611-42.2022.5.04.0009

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

99 TECNOLOGIA LTDA ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ

Polo Passivo:

99 TAXIS 99 TAXIS LLC 99 TECNOLOGIA LTDA ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ

Notificação

Advogados:

ANA LUCIA PACHECO DE LIMA

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RICARDO ANDRE ZAMBO

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FABIO RIVELLI

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IBOTI OLIVEIRA BARCELOS JUNIOR

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: ARY FARIA MARIMON FILHO 0020611-42.2022.5.04.0009 : ILDO LAUREANO TELLES MUNI… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: ARY FARIA MARIMON FILHO 0020611-42.2022.5.04.0009 : ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ E OUTROS (1) : ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ E OUTROS (3) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID f291369 proferida nos autos. Recorrente(s): 1. ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ Recorrido(a)(s): 1. 99 TAXIS 2. 99 TAXIS LLC 3. 99 TECNOLOGIA LTDA RECURSO DE: ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Recurso tempestivo (decisão publicada em 06/03/2025 - Id e9b7330; recurso apresentado em 13/03/2025 - Id d2f9d00). Representação processual regular (id 3df768a). Preparo dispensado (id ed0bc3d). PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS 1.1 DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO (13707) / RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO (13722) / TRABALHO SOB APLICATIVOS E/OU PLATAFORMAS DIGITAIS Alegação(ões): - violação do(s) arts. 5º, XXXV, 7º, I e 17, da Constituição Federal. - violação dos arts. 2º e 3º, da CLT. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: (...) Examino. O reclamante ingressou com a presente reclamação em 25.07.2022, alegando que laborou para a reclamada no período compreendido entre 01.10.2017 a 07.02.2022. No caso dos autos, entendo que a existência ou não da relação de emprego depende da forma como o trabalho é prestado, pois o contrato de trabalho é um contrato realidade. Para que possa ser reconhecido o vínculo de emprego alegado pelo trabalhador, é necessário que estejam presentes todos os requisitos caracterizadores desta relação jurídica, quais sejam a pessoalidade, a não eventualidade, o trabalho mediante remuneração e a subordinação. Em seu depoimento pessoal, o autor disse (ID. 4a558b4 - Pág. 1 e 2, destaquei): que ao se cadastrar tomou ciência dos termos de uso da plataforma; que feito o cadastro, passou a trabalhar de imediato; que esteve na sede, na Av. Padre Cacique e depois de aprovado o cadastro aguardou em casa por 14/15 dias e quando passou a funcionar imediatamente passou a fazer corridas; que não tinha outra fonte de renda; que foi cadastrado na Uber, onde iniciou 4 meses antes de iniciar na 99; que passou a trabalhar exclusivamente com a 99; que o problema que teve com a 99 foi o fato de ter tido dois assaltos e não ter recebido qualquer apoio da 99; que os assaltos foram de passageiros da 99; que não conseguiu fazer avaliação dos passageiros porque levaram seu veículo e o aparelho celular; que na CNH do depoente consta registro de EAR; que o depoente trabalhava exclusivamente na 99; que assim procedeu quando estava na Uber, pois estava somente naquela plataforma; que trabalhava das 06h às 20h/21h; que foi o depoente quem escolheu trabalhar nesse horário; que às vezes não fazia intervalo; que trabalhava domingos e feriados; que parou na época da pandemia, quando teve Covid, por um período de 12 /13 dias; que inicialmente a 99 não pagou por esse período; que passados 6 meses a 99 resolveu pagar e fez o pagamento ao depoente no valor aproximado de R$ 600,00; que na época da pandemia e do isolamento social houve redução do número de corridas; que na época sem pandemia o depoente percebia em média R$ 7.000,00 /R$ 8.000,00 e na época da pandemia cerca de R$ 5.000,00; que as despesas com veículo eram por conta do depoente; que gastava em torno de R$ 50,00 para rodar 250km; que essa era a média diária de quilômetros rodados; que ao que recorda no início a 99 cobrava 13% ou 14% do faturamento e depois passaram a cobrar 30%; que podia ficar desligado do aplicativo, mas não era conveniente ao depoente, que precisava rodar; que não sofria punição da plataforma; que foi por 3 anos considerado motorista diamante; que a 99 fazia promoções e era facultativa a participação; que não era obrigado a participar das promoções; que o pagamento das corridas era feito em dinheiro ao depoente pelo passageiro ou no cartão, que ia direto para a plataforma; que a plataforma fazia os repasses semanalmente. Nada mais. Apesar de não terem sido ouvidas testemunhas, em ata de audiência constou o seguinte (ID. 4a558b4 - Pág. 1): Pela ordem, as partes requerem a utilização de prova emprestada, sendo que a parte reclamante fará a juntada nesta data, com a condição de que estejam no polo passivo as reclamadas deste processo; a parte reclamada já juntada aos autos, conforme ID e281ed9 - páginas 04 e 07 os depoimentos de Gustavo Cesário Mota e Márcio Bragança e Silva. As partes esclarecem que não há necessidade de manifestação quanto à prova juntada pela parte contrária, mas requerem a oitiva das partes. Sinalo que a utilização da prova emprestada objetiva a celeridade e a economia processuais, assim dispondo o art. 372 do CPC: Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório. A testemunha M.R.B.S., cujo testemunho foi prestado nos autos do processo de nº 0010154-41.2020.5.03.0140, contou (ID. 73051fd - Pág. 2, destaquei): que começou a trabalhar pelo aplicativo em 2015, aproximadamente, encontrando-se atualmente prestando serviço pelo aplicativo; que as formas de pagamento e de prestação de serviço sempre foram as mesmas até a presente data; que a reclamada retém 20% por cada corrida efetuada, sendo outro o percentual de outras plataformas, ou seja, a Uber cobra 25%; que quando o pagamento ocorre em dinheiro, o motorista recebe o valor inerente ao crédito de outras corridas cujo pagamento foi feito por cartão, já descontada a parte da reclamada, relativa à corrida em dinheiro; que sabe dizer que o reclamante trabalhava para o aplicativo, pelo fato de se encontrarem à noite, em lanchonete, quando tomavam café; que já foi punido 2 vezes pelo aplicativo, mas não lhe foi informado o motivo; que é possível fazer a rejeição de corrida chamada por cliente, vindo escrito no aplicativo "zona de perigo"; que se rejeitasse aproximadamente 3 a 5 corridas, havia suspensão do aplicativo por aproximadamente 15 a 30 minutos; que a punição ocorria se fossem rejeitadas as corridas de forma consecutiva; que quando indagado se efetuar o logout do aplicativo "zerava" o cômputodas corridas rejeitadas, o depoente informa que possui mais de 16.000 corridas, e que só foi punido em duas oportunidades, não sabendo dizer exatamente sobre essa punição; que há a possibilidade de ficar logado em mais de um aplicativo de forma simultânea, aceitando a corrida que lhe seja mais vantajosa; que o depoente utiliza duas plataformas, podendo usá-las simultaneamente, mas ultimamente tem optado por utilizar apenas uma; que não há exigênciade número mínimo de corridas, tempo mínimo logado ou tempo máximo deslogado; que no seu caso optou por ficar 3 meses da quarentena sem trabalhar e não teve problema quando voltou a utilizar o aplicativo; que há incentivos caso, por exemplo, seja feita determinada quantidade de corridas por mês, podendo implicar mudança de categoria, a exemplo "Diamante"; que a troca de categoria não implica mudança no valor recebido pela corrida, influenciando apenas na maior oferta de corridas para aquele determinado motorista; que a realidade/forma de pagamento é a mesma para todos os motoristas. Perguntas do reclamante: que o cadastro é personalíssimo, não podendo outro motorista utilizar o seu cadastro; que aparece no aplicativo apenas um pedido de corrida por vez, podendo o motorista aceitá-lo ou rejeitá-lo; que o depoente não possui margem de negociação do valor da corrida previsto no aplicativo; que pode acontecer de o motorista fazer a corrida diretamente para determinado cliente, sem intermédio da plataforma, mas se a plataforma descobrir, é causa de exclusão; que quando indagado se, por exemplo, poderia combinar com um passageiro uma corrida do aeroporto de Confins a outra localidade, sem intermédio da plataforma, o depoente respondeu afirmativamente, mas ressaltou que não valeria a pena, pois nessa situação ficaria descoberto de alguns riscos, em razão do seguro que é contratado junto à plataforma; que nessa situação não haveria punição pela plataforma, caso a prestação de serviço ocorresse de forma direta ao cliente, sem intermédio da plataforma Já a testemunha G.C.M., cujo testemunho foi prestado nos autos do processo de nº 0010575-11.2018.5.03.0137, disse (ID. ff07475 - Pág. 2, destaquei): que trabalha na ré desde julho de 2017; que não conhece o autor; que trabalha no administrativo da empresa, com CTPS assinada, como coordenador de operações; que o autor trabalha com a parte de passageiros, definindo estratégias; que anteriormente trabalhava em uma área voltada para motoristas; que nesta, divulgava o aplicativo para motoristas, divulgava promoções para incentivar motoristas a utilizarem o aplicativo ("da mesma forma como fazemos para passageiro"), como, por exemplo, definindo um bônus após determinado número de corridas; que também tirava dúvidas dos motoristas que entravam em contato; que não há um número mínimo de viagens que o motorista tem que fazer; que também não há carga horária mínima diária/semanal/mensal; que quem define o horário de ligar ou desligar o aplicativo é o próprio motorista e por quanto tempo ele quiser; que o motorista pode negar uma viagem que chega pelo smartphone; questionado se há punição nesse caso, respondeu que se ele fizer isso sequencialmente, pode haver bloqueio por alguns minutos, para garantir o nível de serviço para o passageiro; que após alguns minutos o aplicativo é liberado novamente; que não há punição de proibição de utilização do aplicativo por algum dia, nesse caso; que o cadastro para começar a operar é feito pelo próprio motorista com o preenchimento de dados pessoais e fotografias de documentos e envia para a plataforma, a qual encaminha para o denatran, de modo que se os documentos forem verdadeiros ele está liberado para operar; que não há treinamento para o motorista, sendo que se o denatran der o "ok" o motorista está liberado; que o carro também tem que estar dentro de padrões específicos; que houve treinamentos opcionais para tirar dúvidas acerca do aplicativo; que os motoristas podem prestar serviços para outra plataforma, sendo que a maioria faz isso, por exemplo para Uber e Cabify; que quem arca com as despesas do veículo é o próprio motorista; que quem define o trajeto a ser percorrido é o passageiro; que quando o passageiro chega ao destino final, o motorista deve finalizar a corrida para que haja a cobrança da corrida; que a avaliação do motorista é apenas um indicativo para saber se está prestando um bom serviço ou não, mas que "não serve para nada", sendo apenas um indicativo; que se o motorista tiver uma nota ruim ele continua trabalhando, sendo que há uma ideia de montar um controle de qualidade para o passageiro, mas isso ainda não há; que a ré não monitora os motoristas por GPS; que no momento que o passageiro aciona o aplicativo o sistema busca motoristas próximos e só quando aceita a corrida há o registro do trajeto que está sendo percorrido; que há uma tarifa mínima estipulada pela 99, aproximadamente R$ 6,50; que não há cadastro de dados bancários pelo motorista; que o motorista recebe por meio de um cartão de crédito pré-pago; que o motorista escolhe com qual opção de pagamento quer trabalhar, retirando "em dinheiro", por exemplo; que esse cartão físico é fornecido pela Paypaxx, que é uma empresa que tem contrato com a ré No caso, entendo que os depoimentos acima transcritos evidenciam a inexistência dos requisitos necessários ao reconhecimento do vínculo empregatício. Nesta senda, embora já tenha sido decidido pelo reconhecimento do vínculo de emprego em caso semelhante ao dos autos, movido por motorista de aplicativo contra a Uber, quando do julgamento do processo de nº 0020287-63.2020.5.04.0028, em 30.11.2022, de relatoria do Exmo. Desembargador Fabiano Holz Beserra, entendo que, no caso dos presentes autos, não ficou demonstrado o preenchimento de todos os requisitos do vínculo de emprego, ao contrário do que ocorreu naquele processo, onde foram produzidas provas documental e oral satisfatórias a evidenciar a existência do vínculo empregatício. Assim, prevalece a presunção advinda da relação ordinária mantida entre o reclamante e a primeira reclamada, demonstrada pelo documento de ID. 6b3a65e, o qual evidencia que a reclamante se cadastrou na plataforma da reclamada como motorista parceiro. Com efeito, ao contrário do que decidiu o Magistrado da origem, entendo que o conjunto probatório dos autos evidencia a inexistência dos requisitos necessários ao reconhecimento do vínculo empregatício. Neste mesmo sentido, inclusive, já decidiu esta 1ª Turma julgadora, em processo de relatoria da Exma.Desembargadora Rosane Serafini Casa Nova e cujo voto acompanhei na íntegra, movido, também, contra a Uber e no qual foram fixados os mesmos pontos incontroversos sobre a relação havida entre as partes fixados presente demanda, motivo pelo qual peço vênia para transcrever e acrescer às razões de decidir os fundamentos lá lançados: Assim, o próprio reclamante confirma que ficava a seu critério os dias e horários de ativação ou desativação do aplicativo, não havia exigência de número de corridas diárias, não havia garantia mínima de ganhos recebendo apenas as viagens feitas e que podia combinar a rota diretamente com o passageiro, bem como que podia prestar o mesmo serviço para outras plataformas (ativação concomitante). Logo, o reclamante não estava obrigado à prestação de serviço para a reclamada, havendo uma relação de autonomia e independência entre as partes. Ressalto, por oportuno, que o fato de o preço da corrida ser estipulado pela reclamada não é, por si, suficiente para caracterizar a subordinação. Ademais, também constato a ausência do elemento da contraprestação salarial por parte da demandada pelos serviços despendidos pelo reclamante, uma vez que é incontroverso que o pagamento era efetuado por tarefa trabalhada, inexistindo pagamento de valores específicos pelas despesas com combustível ou manutenção dos veículos. Ou seja, em que pese a existência de contraprestação pecuniária pelos serviços prestados, tal pagamento não possui cunho remuneratório. Importante referir, ainda, que o valor da diária englobava não só a contraprestação pela atividade desenvolvida mas também as despesas relacionadas ao veículo, caracterizando, assim, a autonomia da atividade. Destarte, tem-se por não demonstrada a existência do vínculo de emprego entre as partes, nos moldes do artigo 2° e 3°, da CLT. Na verdade, o que se vislumbra, no caso, é que o reclamante constitui-se em trabalhador autônomo, que exerce sua atividade por conta e risco próprio, sendo sua relação com a empresa reclamada de forma autônoma. Corroborando as conclusões acima expostas, cito os seguintes julgados deste Tribunal: [...] Por fim, convém mencionar que o Supremo Tribunal Federal, em recente decisão monocrática do Ministro Alexandre de Moraes na Reclamação (RCL) 59795, cassou decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT3), sediado em Belo Horizonte/MG, que havia reconhecido o vínculo de emprego de um motorista com a plataforma Cabify Agência de Serviços de Transporte de Passageiros Ltda., considerando que a decisão desrespeitou o entendimento do STF, firmado em diversos precedentes, que permite outros tipos de contratos distintos da estrutura tradicional da relação de emprego regida pela CLT. Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso do reclamante, mantendo-se a sentença que julgou improcedente a pretensão de reconhecimento de vínculo de emprego, bem como os pedidos associados ao pedido principal não acolhido. (TRT da 4ª Região, 1ª Turma, 0020577-31.2022.5.04.0021 ROT, em 18/07/2024, Desembargadora Rosane Serafini Casa Nova) Dessa forma, inexistentes os requisitos para a caracterização da relação empregatícia, comporta ajustes a decisão, devendo ser afastado o vínculo de emprego. Por consequência, deve ser a ré absolvida das condenações impostas no Juízo da origem, por serem decorrentes do reconhecimento do vínculo de emprego. Diante do ora decidido, fica prejudicada a análise dos tópicos recursais da primeira reclamada referentes à limitação dos valores indicados à inicial, à inaplicabilidade da multa do art. 477 da CLT, à impossibilidade do pagamento de horas extras, adicional noturno e reflexos e à ausência de danos materiais. Igualmente, restam prejudicados os tópicos recursais do recurso adesivo interposto pelo reclamante, quais sejam as verbas relativas aos intervalos intrajornada e interjornada, a aplicação da multa do art. 467 da CLT e a condenação por dano moral em razão da não anotação da CTPS, uma vez que não reconhecido o vínculo empregatício entre si e a primeira reclamada. Por todo o exposto, dou provimento ao recurso ordinário da primeira reclamada para afastar o vínculo de emprego e, em consequência, absolvê-la das condenações impostas no Juízo da origem; e nego provmento ao recurso ordinário adesivo do reclamante. Admito o recurso de revista no item. No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, são identificadas decisões que reconhecem o vínculo de emprego entre o motorista de aplicativo e a plataforma digital, por considerarem configurada a subordinação, reformando decisões regionais que haviam entendido pela não demonstração dos requisitos da relação de emprego. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO - MOTORISTA DE APLICATIVO - EMPRESA-PLATAFORMA DIGITAL - PRESENÇA DE ELEMENTOS FÁTICO-JURÍDICOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 2º E 3º DA CLT - REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. No presente caso, o Tribunal Regional entendeu que estava ausente a subordinação jurídica e, em razão disto, não reconheceu a relação de emprego entre as partes. A conclusão adotada levou em consideração, especialmente, as seguintes premissas fáticas, todas consignadas no acórdão recorrido: (i) "As declarações prestadas pelo autor evidenciam que ele detinha inteira autonomia para estabelecer sua jornada de trabalho, desenvolvendo sua atividade no interesse e conveniência própria. Ele podia trabalhar quando bem entendesse, recusar e cancelar viagens, sem que haja notícia de aplicação de qualquer punição por parte da reclamada"; (ii) "ao autor incumbia inteiramente dispor sobre sua meta e produtividade periódicas, constatando-se, ainda, que ele era remunerado pelo usuário e não pela demandada"; e (iii) "Não se verifica, por outro lado, a efetiva fiscalização de sua rotina laboral ou da qualidade de trabalho pelo reclamado, sendo que a avaliação do serviço prestado estava a cargo dos usuários". A decisão monocrática entendeu que "o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício", reformando o acórdão regional e reconhecendo o vínculo de emprego entre reclamante e reclamada. Como destacado na decisão agravada, o quadro fático consignado pelo TRT permite a esta Corte fazer o reenquadramento jurídico para reconhecer o vínculo de emprego vindicado, sem que se cogite do óbice previsto na Súmula/TST nº 126. Isso porque, a decisão, tal como prolatada, contraria precedente recente desta 2ª Turma, no sentido de que o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício. Nesse sentido, cite-se nova modalidade de subordinação, denominada " subordinação pelo algoritmo ", que está presente no citado modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo. Agravo interno a que se nega provimento" (Ag-RR-10021-05.2022.5.03.0180, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 18/10/2024). Exemplificativamente, também reformando acórdão regional sobre o tema: RR-100353-02.2017.5.01.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 11/04/2022; RR-1000764-25.2021.5.02.0301, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 15/09/2023. Por outro lado, são encontrados acórdãos, no mesmo Tribunal Superior, com entendimento diverso, no sentido de que o trabalho realizado nesses moldes não acarreta o reconhecimento de relação de emprego, destacando que não restaria constatada a subordinação. Nessa linha: "DIREITO DO TRABALHO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. A questão jurídica que envolve o reconhecimento de vínculo de emprego de motorista de aplicativo tem transcendência jurídica. 2. A tese recursal independe do revolvimento de fatos e provas, na medida em que o vínculo empregatício foi reconhecido com base em subordinação algorítmica ou estrutural, tese que tem sido reiteradamente afastada pelo Supremo Tribunal Federal. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL OU ALGORÍTMICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A questão debatida nos autos diz respeito à natureza da relação jurídica que se forma entre empresas que exploram plataformas digitais e motoristas ou entregadores que se utilizam da tecnologia do aplicativo. 2. O Tribunal Regional reconheceu o vínculo empregatício fundamentado exclusivamente na existência de uma subordinação algorítmica, pois o trabalhador teria sua atividade controlada e fiscalizada por meio de sistemas de inteligência artificial. 3. A relação jurídica que envolve os motoristas de aplicativo e as empresas que gerem as plataformas digitais é fruto da revolução tecnológica que promove novas formas de prestação de serviços e novos formatos contratuais, muitas das quais ainda carecem de uma regulamentação legal específica. 4. A chamada subordinação algorítmica não encontra agasalho na ordem jurídica vigente e esse novo modelo contratual que envolve motoristas de aplicativos e empresas provedoras de plataformas digitais não se enquadra no modelo empregatício regulamentado pela Consolidação das Leis do Trabalho. 5. A observância de regras de conduta é inerente a qualquer modalidade contratual e ínsita a qualquer atividade profissional, seja ela subordinada ou não, de modo que as circunstâncias fáticas registradas no acórdão regional (impossibilidade de o motorista ditar o preço do serviço e a necessidade de observar regras de conduta) não são suficientes para caracterizar a relação empregatícia. 6. Não se desconhece a notória necessidade de proteção jurídica aos motoristas de aplicativo, porém, tal desiderato protetivo deve ser alcançado via legislativa, nada justificando trazê-los ao abrigo de uma relação de emprego que não foi pactuada. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-462-04.2022.5.13.0032, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 19/11/2024). Com posicionamento análogo: RRAg-0010190-80.2023.5.03.0107, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 21/11/2024; RRAg-1001341-61.2022.5.02.0044, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 28/10/2024; RRAg-1000446-50.2018.5.02.0009, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 18/03/2024. Além da controvérsia jurídica constatada, cabe destacar que a presente questão ainda será analisada pelo Supremo Tribunal Federal, em razão do Tema 1.291 de Repercussão Geral "Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 1º, IV; 5º, II, XIII; e 170, IV, da Constituição Federal, a possibilidade do reconhecimento de vínculo de emprego entre motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa criadora e administradora da plataforma digital intermediadora". Diante do quadro posto, e em se tratando de matéria que ainda pende de uniformização jurisprudencial, dá-se seguimento ao recurso de revista por possível afronta ao art 5º, XXXV, da Constituição Federal, com base no art. 896, alínea 'c', da CLT. CONCLUSÃO Dou seguimento. Intimem-se, inclusive a parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal. (srn) PORTO ALEGRE/RS, 23 de abril de 2025. ALEXANDRE CORREA DA CRUZ Desembargador Federal do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - 99 TECNOLOGIA LTDA - ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ

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99 Tecnologia Ltda e outros x 99 Taxis e outros

ID: 260055491

Tribunal: TRT4 Órgão: OJ de Análise de Recurso Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0020611-42.2022.5.04.0009

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

99 TECNOLOGIA LTDA ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ

Polo Passivo:

99 TAXIS 99 TAXIS LLC 99 TECNOLOGIA LTDA ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ

Notificação

Advogados:

ANA LUCIA PACHECO DE LIMA

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

RICARDO ANDRE ZAMBO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

FABIO RIVELLI

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

IBOTI OLIVEIRA BARCELOS JUNIOR

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: ARY FARIA MARIMON FILHO 0020611-42.2022.5.04.0009 : ILDO LAUREANO TELLES MUNI… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: ARY FARIA MARIMON FILHO 0020611-42.2022.5.04.0009 : ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ E OUTROS (1) : ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ E OUTROS (3) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID f291369 proferida nos autos. Recorrente(s): 1. ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ Recorrido(a)(s): 1. 99 TAXIS 2. 99 TAXIS LLC 3. 99 TECNOLOGIA LTDA RECURSO DE: ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Recurso tempestivo (decisão publicada em 06/03/2025 - Id e9b7330; recurso apresentado em 13/03/2025 - Id d2f9d00). Representação processual regular (id 3df768a). Preparo dispensado (id ed0bc3d). PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS 1.1 DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO (13707) / RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO (13722) / TRABALHO SOB APLICATIVOS E/OU PLATAFORMAS DIGITAIS Alegação(ões): - violação do(s) arts. 5º, XXXV, 7º, I e 17, da Constituição Federal. - violação dos arts. 2º e 3º, da CLT. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: (...) Examino. O reclamante ingressou com a presente reclamação em 25.07.2022, alegando que laborou para a reclamada no período compreendido entre 01.10.2017 a 07.02.2022. No caso dos autos, entendo que a existência ou não da relação de emprego depende da forma como o trabalho é prestado, pois o contrato de trabalho é um contrato realidade. Para que possa ser reconhecido o vínculo de emprego alegado pelo trabalhador, é necessário que estejam presentes todos os requisitos caracterizadores desta relação jurídica, quais sejam a pessoalidade, a não eventualidade, o trabalho mediante remuneração e a subordinação. Em seu depoimento pessoal, o autor disse (ID. 4a558b4 - Pág. 1 e 2, destaquei): que ao se cadastrar tomou ciência dos termos de uso da plataforma; que feito o cadastro, passou a trabalhar de imediato; que esteve na sede, na Av. Padre Cacique e depois de aprovado o cadastro aguardou em casa por 14/15 dias e quando passou a funcionar imediatamente passou a fazer corridas; que não tinha outra fonte de renda; que foi cadastrado na Uber, onde iniciou 4 meses antes de iniciar na 99; que passou a trabalhar exclusivamente com a 99; que o problema que teve com a 99 foi o fato de ter tido dois assaltos e não ter recebido qualquer apoio da 99; que os assaltos foram de passageiros da 99; que não conseguiu fazer avaliação dos passageiros porque levaram seu veículo e o aparelho celular; que na CNH do depoente consta registro de EAR; que o depoente trabalhava exclusivamente na 99; que assim procedeu quando estava na Uber, pois estava somente naquela plataforma; que trabalhava das 06h às 20h/21h; que foi o depoente quem escolheu trabalhar nesse horário; que às vezes não fazia intervalo; que trabalhava domingos e feriados; que parou na época da pandemia, quando teve Covid, por um período de 12 /13 dias; que inicialmente a 99 não pagou por esse período; que passados 6 meses a 99 resolveu pagar e fez o pagamento ao depoente no valor aproximado de R$ 600,00; que na época da pandemia e do isolamento social houve redução do número de corridas; que na época sem pandemia o depoente percebia em média R$ 7.000,00 /R$ 8.000,00 e na época da pandemia cerca de R$ 5.000,00; que as despesas com veículo eram por conta do depoente; que gastava em torno de R$ 50,00 para rodar 250km; que essa era a média diária de quilômetros rodados; que ao que recorda no início a 99 cobrava 13% ou 14% do faturamento e depois passaram a cobrar 30%; que podia ficar desligado do aplicativo, mas não era conveniente ao depoente, que precisava rodar; que não sofria punição da plataforma; que foi por 3 anos considerado motorista diamante; que a 99 fazia promoções e era facultativa a participação; que não era obrigado a participar das promoções; que o pagamento das corridas era feito em dinheiro ao depoente pelo passageiro ou no cartão, que ia direto para a plataforma; que a plataforma fazia os repasses semanalmente. Nada mais. Apesar de não terem sido ouvidas testemunhas, em ata de audiência constou o seguinte (ID. 4a558b4 - Pág. 1): Pela ordem, as partes requerem a utilização de prova emprestada, sendo que a parte reclamante fará a juntada nesta data, com a condição de que estejam no polo passivo as reclamadas deste processo; a parte reclamada já juntada aos autos, conforme ID e281ed9 - páginas 04 e 07 os depoimentos de Gustavo Cesário Mota e Márcio Bragança e Silva. As partes esclarecem que não há necessidade de manifestação quanto à prova juntada pela parte contrária, mas requerem a oitiva das partes. Sinalo que a utilização da prova emprestada objetiva a celeridade e a economia processuais, assim dispondo o art. 372 do CPC: Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório. A testemunha M.R.B.S., cujo testemunho foi prestado nos autos do processo de nº 0010154-41.2020.5.03.0140, contou (ID. 73051fd - Pág. 2, destaquei): que começou a trabalhar pelo aplicativo em 2015, aproximadamente, encontrando-se atualmente prestando serviço pelo aplicativo; que as formas de pagamento e de prestação de serviço sempre foram as mesmas até a presente data; que a reclamada retém 20% por cada corrida efetuada, sendo outro o percentual de outras plataformas, ou seja, a Uber cobra 25%; que quando o pagamento ocorre em dinheiro, o motorista recebe o valor inerente ao crédito de outras corridas cujo pagamento foi feito por cartão, já descontada a parte da reclamada, relativa à corrida em dinheiro; que sabe dizer que o reclamante trabalhava para o aplicativo, pelo fato de se encontrarem à noite, em lanchonete, quando tomavam café; que já foi punido 2 vezes pelo aplicativo, mas não lhe foi informado o motivo; que é possível fazer a rejeição de corrida chamada por cliente, vindo escrito no aplicativo "zona de perigo"; que se rejeitasse aproximadamente 3 a 5 corridas, havia suspensão do aplicativo por aproximadamente 15 a 30 minutos; que a punição ocorria se fossem rejeitadas as corridas de forma consecutiva; que quando indagado se efetuar o logout do aplicativo "zerava" o cômputodas corridas rejeitadas, o depoente informa que possui mais de 16.000 corridas, e que só foi punido em duas oportunidades, não sabendo dizer exatamente sobre essa punição; que há a possibilidade de ficar logado em mais de um aplicativo de forma simultânea, aceitando a corrida que lhe seja mais vantajosa; que o depoente utiliza duas plataformas, podendo usá-las simultaneamente, mas ultimamente tem optado por utilizar apenas uma; que não há exigênciade número mínimo de corridas, tempo mínimo logado ou tempo máximo deslogado; que no seu caso optou por ficar 3 meses da quarentena sem trabalhar e não teve problema quando voltou a utilizar o aplicativo; que há incentivos caso, por exemplo, seja feita determinada quantidade de corridas por mês, podendo implicar mudança de categoria, a exemplo "Diamante"; que a troca de categoria não implica mudança no valor recebido pela corrida, influenciando apenas na maior oferta de corridas para aquele determinado motorista; que a realidade/forma de pagamento é a mesma para todos os motoristas. Perguntas do reclamante: que o cadastro é personalíssimo, não podendo outro motorista utilizar o seu cadastro; que aparece no aplicativo apenas um pedido de corrida por vez, podendo o motorista aceitá-lo ou rejeitá-lo; que o depoente não possui margem de negociação do valor da corrida previsto no aplicativo; que pode acontecer de o motorista fazer a corrida diretamente para determinado cliente, sem intermédio da plataforma, mas se a plataforma descobrir, é causa de exclusão; que quando indagado se, por exemplo, poderia combinar com um passageiro uma corrida do aeroporto de Confins a outra localidade, sem intermédio da plataforma, o depoente respondeu afirmativamente, mas ressaltou que não valeria a pena, pois nessa situação ficaria descoberto de alguns riscos, em razão do seguro que é contratado junto à plataforma; que nessa situação não haveria punição pela plataforma, caso a prestação de serviço ocorresse de forma direta ao cliente, sem intermédio da plataforma Já a testemunha G.C.M., cujo testemunho foi prestado nos autos do processo de nº 0010575-11.2018.5.03.0137, disse (ID. ff07475 - Pág. 2, destaquei): que trabalha na ré desde julho de 2017; que não conhece o autor; que trabalha no administrativo da empresa, com CTPS assinada, como coordenador de operações; que o autor trabalha com a parte de passageiros, definindo estratégias; que anteriormente trabalhava em uma área voltada para motoristas; que nesta, divulgava o aplicativo para motoristas, divulgava promoções para incentivar motoristas a utilizarem o aplicativo ("da mesma forma como fazemos para passageiro"), como, por exemplo, definindo um bônus após determinado número de corridas; que também tirava dúvidas dos motoristas que entravam em contato; que não há um número mínimo de viagens que o motorista tem que fazer; que também não há carga horária mínima diária/semanal/mensal; que quem define o horário de ligar ou desligar o aplicativo é o próprio motorista e por quanto tempo ele quiser; que o motorista pode negar uma viagem que chega pelo smartphone; questionado se há punição nesse caso, respondeu que se ele fizer isso sequencialmente, pode haver bloqueio por alguns minutos, para garantir o nível de serviço para o passageiro; que após alguns minutos o aplicativo é liberado novamente; que não há punição de proibição de utilização do aplicativo por algum dia, nesse caso; que o cadastro para começar a operar é feito pelo próprio motorista com o preenchimento de dados pessoais e fotografias de documentos e envia para a plataforma, a qual encaminha para o denatran, de modo que se os documentos forem verdadeiros ele está liberado para operar; que não há treinamento para o motorista, sendo que se o denatran der o "ok" o motorista está liberado; que o carro também tem que estar dentro de padrões específicos; que houve treinamentos opcionais para tirar dúvidas acerca do aplicativo; que os motoristas podem prestar serviços para outra plataforma, sendo que a maioria faz isso, por exemplo para Uber e Cabify; que quem arca com as despesas do veículo é o próprio motorista; que quem define o trajeto a ser percorrido é o passageiro; que quando o passageiro chega ao destino final, o motorista deve finalizar a corrida para que haja a cobrança da corrida; que a avaliação do motorista é apenas um indicativo para saber se está prestando um bom serviço ou não, mas que "não serve para nada", sendo apenas um indicativo; que se o motorista tiver uma nota ruim ele continua trabalhando, sendo que há uma ideia de montar um controle de qualidade para o passageiro, mas isso ainda não há; que a ré não monitora os motoristas por GPS; que no momento que o passageiro aciona o aplicativo o sistema busca motoristas próximos e só quando aceita a corrida há o registro do trajeto que está sendo percorrido; que há uma tarifa mínima estipulada pela 99, aproximadamente R$ 6,50; que não há cadastro de dados bancários pelo motorista; que o motorista recebe por meio de um cartão de crédito pré-pago; que o motorista escolhe com qual opção de pagamento quer trabalhar, retirando "em dinheiro", por exemplo; que esse cartão físico é fornecido pela Paypaxx, que é uma empresa que tem contrato com a ré No caso, entendo que os depoimentos acima transcritos evidenciam a inexistência dos requisitos necessários ao reconhecimento do vínculo empregatício. Nesta senda, embora já tenha sido decidido pelo reconhecimento do vínculo de emprego em caso semelhante ao dos autos, movido por motorista de aplicativo contra a Uber, quando do julgamento do processo de nº 0020287-63.2020.5.04.0028, em 30.11.2022, de relatoria do Exmo. Desembargador Fabiano Holz Beserra, entendo que, no caso dos presentes autos, não ficou demonstrado o preenchimento de todos os requisitos do vínculo de emprego, ao contrário do que ocorreu naquele processo, onde foram produzidas provas documental e oral satisfatórias a evidenciar a existência do vínculo empregatício. Assim, prevalece a presunção advinda da relação ordinária mantida entre o reclamante e a primeira reclamada, demonstrada pelo documento de ID. 6b3a65e, o qual evidencia que a reclamante se cadastrou na plataforma da reclamada como motorista parceiro. Com efeito, ao contrário do que decidiu o Magistrado da origem, entendo que o conjunto probatório dos autos evidencia a inexistência dos requisitos necessários ao reconhecimento do vínculo empregatício. Neste mesmo sentido, inclusive, já decidiu esta 1ª Turma julgadora, em processo de relatoria da Exma.Desembargadora Rosane Serafini Casa Nova e cujo voto acompanhei na íntegra, movido, também, contra a Uber e no qual foram fixados os mesmos pontos incontroversos sobre a relação havida entre as partes fixados presente demanda, motivo pelo qual peço vênia para transcrever e acrescer às razões de decidir os fundamentos lá lançados: Assim, o próprio reclamante confirma que ficava a seu critério os dias e horários de ativação ou desativação do aplicativo, não havia exigência de número de corridas diárias, não havia garantia mínima de ganhos recebendo apenas as viagens feitas e que podia combinar a rota diretamente com o passageiro, bem como que podia prestar o mesmo serviço para outras plataformas (ativação concomitante). Logo, o reclamante não estava obrigado à prestação de serviço para a reclamada, havendo uma relação de autonomia e independência entre as partes. Ressalto, por oportuno, que o fato de o preço da corrida ser estipulado pela reclamada não é, por si, suficiente para caracterizar a subordinação. Ademais, também constato a ausência do elemento da contraprestação salarial por parte da demandada pelos serviços despendidos pelo reclamante, uma vez que é incontroverso que o pagamento era efetuado por tarefa trabalhada, inexistindo pagamento de valores específicos pelas despesas com combustível ou manutenção dos veículos. Ou seja, em que pese a existência de contraprestação pecuniária pelos serviços prestados, tal pagamento não possui cunho remuneratório. Importante referir, ainda, que o valor da diária englobava não só a contraprestação pela atividade desenvolvida mas também as despesas relacionadas ao veículo, caracterizando, assim, a autonomia da atividade. Destarte, tem-se por não demonstrada a existência do vínculo de emprego entre as partes, nos moldes do artigo 2° e 3°, da CLT. Na verdade, o que se vislumbra, no caso, é que o reclamante constitui-se em trabalhador autônomo, que exerce sua atividade por conta e risco próprio, sendo sua relação com a empresa reclamada de forma autônoma. Corroborando as conclusões acima expostas, cito os seguintes julgados deste Tribunal: [...] Por fim, convém mencionar que o Supremo Tribunal Federal, em recente decisão monocrática do Ministro Alexandre de Moraes na Reclamação (RCL) 59795, cassou decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT3), sediado em Belo Horizonte/MG, que havia reconhecido o vínculo de emprego de um motorista com a plataforma Cabify Agência de Serviços de Transporte de Passageiros Ltda., considerando que a decisão desrespeitou o entendimento do STF, firmado em diversos precedentes, que permite outros tipos de contratos distintos da estrutura tradicional da relação de emprego regida pela CLT. Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso do reclamante, mantendo-se a sentença que julgou improcedente a pretensão de reconhecimento de vínculo de emprego, bem como os pedidos associados ao pedido principal não acolhido. (TRT da 4ª Região, 1ª Turma, 0020577-31.2022.5.04.0021 ROT, em 18/07/2024, Desembargadora Rosane Serafini Casa Nova) Dessa forma, inexistentes os requisitos para a caracterização da relação empregatícia, comporta ajustes a decisão, devendo ser afastado o vínculo de emprego. Por consequência, deve ser a ré absolvida das condenações impostas no Juízo da origem, por serem decorrentes do reconhecimento do vínculo de emprego. Diante do ora decidido, fica prejudicada a análise dos tópicos recursais da primeira reclamada referentes à limitação dos valores indicados à inicial, à inaplicabilidade da multa do art. 477 da CLT, à impossibilidade do pagamento de horas extras, adicional noturno e reflexos e à ausência de danos materiais. Igualmente, restam prejudicados os tópicos recursais do recurso adesivo interposto pelo reclamante, quais sejam as verbas relativas aos intervalos intrajornada e interjornada, a aplicação da multa do art. 467 da CLT e a condenação por dano moral em razão da não anotação da CTPS, uma vez que não reconhecido o vínculo empregatício entre si e a primeira reclamada. Por todo o exposto, dou provimento ao recurso ordinário da primeira reclamada para afastar o vínculo de emprego e, em consequência, absolvê-la das condenações impostas no Juízo da origem; e nego provmento ao recurso ordinário adesivo do reclamante. Admito o recurso de revista no item. No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, são identificadas decisões que reconhecem o vínculo de emprego entre o motorista de aplicativo e a plataforma digital, por considerarem configurada a subordinação, reformando decisões regionais que haviam entendido pela não demonstração dos requisitos da relação de emprego. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO - MOTORISTA DE APLICATIVO - EMPRESA-PLATAFORMA DIGITAL - PRESENÇA DE ELEMENTOS FÁTICO-JURÍDICOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 2º E 3º DA CLT - REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. No presente caso, o Tribunal Regional entendeu que estava ausente a subordinação jurídica e, em razão disto, não reconheceu a relação de emprego entre as partes. A conclusão adotada levou em consideração, especialmente, as seguintes premissas fáticas, todas consignadas no acórdão recorrido: (i) "As declarações prestadas pelo autor evidenciam que ele detinha inteira autonomia para estabelecer sua jornada de trabalho, desenvolvendo sua atividade no interesse e conveniência própria. Ele podia trabalhar quando bem entendesse, recusar e cancelar viagens, sem que haja notícia de aplicação de qualquer punição por parte da reclamada"; (ii) "ao autor incumbia inteiramente dispor sobre sua meta e produtividade periódicas, constatando-se, ainda, que ele era remunerado pelo usuário e não pela demandada"; e (iii) "Não se verifica, por outro lado, a efetiva fiscalização de sua rotina laboral ou da qualidade de trabalho pelo reclamado, sendo que a avaliação do serviço prestado estava a cargo dos usuários". A decisão monocrática entendeu que "o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício", reformando o acórdão regional e reconhecendo o vínculo de emprego entre reclamante e reclamada. Como destacado na decisão agravada, o quadro fático consignado pelo TRT permite a esta Corte fazer o reenquadramento jurídico para reconhecer o vínculo de emprego vindicado, sem que se cogite do óbice previsto na Súmula/TST nº 126. Isso porque, a decisão, tal como prolatada, contraria precedente recente desta 2ª Turma, no sentido de que o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício. Nesse sentido, cite-se nova modalidade de subordinação, denominada " subordinação pelo algoritmo ", que está presente no citado modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo. Agravo interno a que se nega provimento" (Ag-RR-10021-05.2022.5.03.0180, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 18/10/2024). Exemplificativamente, também reformando acórdão regional sobre o tema: RR-100353-02.2017.5.01.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 11/04/2022; RR-1000764-25.2021.5.02.0301, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 15/09/2023. Por outro lado, são encontrados acórdãos, no mesmo Tribunal Superior, com entendimento diverso, no sentido de que o trabalho realizado nesses moldes não acarreta o reconhecimento de relação de emprego, destacando que não restaria constatada a subordinação. Nessa linha: "DIREITO DO TRABALHO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. A questão jurídica que envolve o reconhecimento de vínculo de emprego de motorista de aplicativo tem transcendência jurídica. 2. A tese recursal independe do revolvimento de fatos e provas, na medida em que o vínculo empregatício foi reconhecido com base em subordinação algorítmica ou estrutural, tese que tem sido reiteradamente afastada pelo Supremo Tribunal Federal. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL OU ALGORÍTMICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A questão debatida nos autos diz respeito à natureza da relação jurídica que se forma entre empresas que exploram plataformas digitais e motoristas ou entregadores que se utilizam da tecnologia do aplicativo. 2. O Tribunal Regional reconheceu o vínculo empregatício fundamentado exclusivamente na existência de uma subordinação algorítmica, pois o trabalhador teria sua atividade controlada e fiscalizada por meio de sistemas de inteligência artificial. 3. A relação jurídica que envolve os motoristas de aplicativo e as empresas que gerem as plataformas digitais é fruto da revolução tecnológica que promove novas formas de prestação de serviços e novos formatos contratuais, muitas das quais ainda carecem de uma regulamentação legal específica. 4. A chamada subordinação algorítmica não encontra agasalho na ordem jurídica vigente e esse novo modelo contratual que envolve motoristas de aplicativos e empresas provedoras de plataformas digitais não se enquadra no modelo empregatício regulamentado pela Consolidação das Leis do Trabalho. 5. A observância de regras de conduta é inerente a qualquer modalidade contratual e ínsita a qualquer atividade profissional, seja ela subordinada ou não, de modo que as circunstâncias fáticas registradas no acórdão regional (impossibilidade de o motorista ditar o preço do serviço e a necessidade de observar regras de conduta) não são suficientes para caracterizar a relação empregatícia. 6. Não se desconhece a notória necessidade de proteção jurídica aos motoristas de aplicativo, porém, tal desiderato protetivo deve ser alcançado via legislativa, nada justificando trazê-los ao abrigo de uma relação de emprego que não foi pactuada. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-462-04.2022.5.13.0032, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 19/11/2024). Com posicionamento análogo: RRAg-0010190-80.2023.5.03.0107, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 21/11/2024; RRAg-1001341-61.2022.5.02.0044, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 28/10/2024; RRAg-1000446-50.2018.5.02.0009, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 18/03/2024. Além da controvérsia jurídica constatada, cabe destacar que a presente questão ainda será analisada pelo Supremo Tribunal Federal, em razão do Tema 1.291 de Repercussão Geral "Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 1º, IV; 5º, II, XIII; e 170, IV, da Constituição Federal, a possibilidade do reconhecimento de vínculo de emprego entre motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa criadora e administradora da plataforma digital intermediadora". Diante do quadro posto, e em se tratando de matéria que ainda pende de uniformização jurisprudencial, dá-se seguimento ao recurso de revista por possível afronta ao art 5º, XXXV, da Constituição Federal, com base no art. 896, alínea 'c', da CLT. CONCLUSÃO Dou seguimento. Intimem-se, inclusive a parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal. (srn) PORTO ALEGRE/RS, 23 de abril de 2025. ALEXANDRE CORREA DA CRUZ Desembargador Federal do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - 99 TAXIS - 99 TAXIS LLC - 99 TECNOLOGIA LTDA - ILDO LAUREANO TELLES MUNIZ

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Edilson Rocha e outros x Uber Do Brasil Tecnologia Ltda. e outros

ID: 261496398

Tribunal: TRT4 Órgão: OJ de Análise de Recurso Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0020014-24.2023.5.04.0111

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

EDILSON ROCHA MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

Polo Passivo:

UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. UBER INTERNATIONAL B.V. UBER INTERNATIONAL HOLDING B.V.

Notificação

Advogados:

LUIZ AFRANIO ARAUJO

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IBOTI OLIVEIRA BARCELOS JUNIOR

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: FRANCISCO ROSSAL DE ARAUJO 0020014-24.2023.5.04.0111 : EDILSON ROCHA : UBER … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: FRANCISCO ROSSAL DE ARAUJO 0020014-24.2023.5.04.0111 : EDILSON ROCHA : UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. E OUTROS (2) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID c54dbe1 proferida nos autos. Recorrente(s): 1. EDILSON ROCHA Recorrido(a)(s): 1. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO 2. UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. 3. UBER INTERNATIONAL B.V. 4. UBER INTERNATIONAL HOLDING B.V. RECURSO DE: EDILSON ROCHA PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Recurso tempestivo (decisão publicada em 11/03/2025 - Id f286aa1; recurso apresentado em 17/03/2025 - Id 0b0202e). Representação processual regular (id 9af70e8). Preparo dispensado (id 28c0322). PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS 1.1 DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO (13707) / RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: O contrato de emprego, espécie de contrato de trabalho, pela terminologia adotada por Martins Catharino, é sinalagmático, consensual, intuitu personae, de trato sucessivo e oneroso. Para que seja verificada a sua existência, necessário se faz que existam as condições acima expostas, juntamente com a caracterização dos pólos da relação de emprego na forma prevista pela CLT, ou seja, empregado e empregador. O art. 3º da CLT traz a definição de empregado: "...é toda a pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário". Por seu turno, o art. 2º da mesma Consolidação define o empregador como sendo aquela empresa, individual ou coletiva, que "assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços". Essencial, portanto, a presença dos elementos subordinação jurídica, pessoalidade, não eventualidade na prestação de serviços e pagamento mediante salário. O empregado necessariamente é pessoa física, sendo impossível a existência de vínculo jurídico de emprego sendo empregado uma pessoa jurídica. Trabalho eventual não caracteriza a existência de relação de emprego, devendo haver correspondência e atendimento às atividades normais do empreendimento econômico, de maneira persistente, com continuidade. O requisito da subordinação é aquele estado de dependência real criado por um direito, o direito do empregador de comandar, dar ordens, donde nasce a obrigação correspondente do empregado de obedecer a estas ordens, sempre, é claro, nos limites legais e ético-morais, segundo Paul Colin, citado por Délio Maranhão in Direito do Trabalho, 13ª edição, Ed. Fundação Getúlio Vargas, 1985, p. 53. Para a configuração da natureza sinalagmática (obrigações contrárias e equivalentes) e onerosa (à prestação de trabalho corresponde a contraprestação salarial) é preciso que haja pagamento de salário. Com o surgimento de modernas relações de trabalho, como é o caso de labor por aplicativos/plataformas digitais, a doutrina e a jurisprudência vêm discutindo os vários conceitos de subordinação jurídica, para além da clássica citada acima, como é o caso da "subordinação estrutural", que para Maurício Godinho Delgado, "é a que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento." Há, ainda, a "subordinação algorítmica", uma nova faceta dentro do mundo das tecnologias, onde o trabalhador é comandado por um "mar" de algoritmos desenvolvidos pela empresa, que dita as regras, como por exemplo a regras de tarifa, o valor da tarifa, o percurso etc, sem poder de influência/autonomia do trabalhador, o que se interliga ao conceito de subordinação jurídica remota, já compreendida no art. 6º da CLT, que dispõe que "os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio." Desse modo, atualmente, há jurisprudência do TST tanto reconhecendo o vínculo de emprego, como o afastando, a depender dos elementos/provas constantes dos autos, a fim de verificar se o trabalhador preenche os requisitos da relação de emprego, previstos no art 3° da CLT, sendo que este Relator entende que o principal pressuposto para se caracterizar a relação de emprego, nesses casos, é o da não eventualidade. O contrato de emprego tem uma relação com o tempo, sendo uma obrigação contínua ou de trato sucessivo. A expressão "trabalho não eventual" constitui um conceito jurídico indeterminado. Pode ocorrer que um contrato inicialmente previsto para ser instantâneo ou de execução diferida se transforme em um contrato de trato sucessivo porque as partes estão ajustando contínuas atividades que, somadas, acabam por modificar a sua natureza. A parte ré admite a prestação de serviços, alegando fatos impeditivos ao direito do autor. Assim sendo, diante das alegações postas, recai sobre os reclamados o ônus probatório do fato impeditivo alegado, nos termos do art. 373, II, do CPC e art. 818, da CLT. Foi utilizada prova oral emprestada de outros processos envolvendo a mesma reclamada: 1. Id 31ffca8- PROCESSO 1001906-63.2016.5.02.0067 - Testemunha Pedro Pacce Prochno (indicada pela reclamada). A testemunha disse que: 1) que trabalha na Uber, registrado, como gerente de comunicação; 2) que tem conhecimento sobre como funciona a plataforma e o contato com os motoristas; 3) que não entra em contato com os motoristas, apenas raramente quando há alguma solicitação da imprensa para dar entrevistas por exemplo; 4) que a plataforma e o funcionamento são os mesmos em todo o território nacional; 5) que qualquer pessoa pode entrar no site da uber e preencher informações para se tornar um motorista da uber; 6) que a uber apenas solicita documentos pessoais, carteira de motorista com observação de que exerce atividade remunerada; 7) que com o cadastramento do motorista, o mesmo recebe as informações sobre funcionamento da plataforma por e-mail, pelo site e pelo próprio aplicativo; 8) que o motorista precisa concordar com essas regras; 9) que o "de acordo" com as normas é realizado pelo motorista parceiro no próprio site da uber ou no aplicativo; 10) que não há treinamentos ou entrevistas com o motorista; 11) que o próprio motorista arca com valores de combustível, multas e afins; 12) que o motorista parceiro pode ter outras pessoas cadastradas para utilização do mesmo carro; 13) que nesse caso, os valores pagos caem na conta da pessoa principal que fez o cadastro, sendo responsável pela divisão posterior; 14) que a reclamada não obrigada o motorista a comprar carro, podendo este ser alugado, de amigo ou de familiar, devendo apenas ter acesso à documentação do veículo ; 15) que quem decide os dias e horários em que irá ligar o aplicativo é o próprio motorista, podendo desligar sempre que desejar; 16) que o motorista pode negar corrida, pode deixar o aplicativo desligado; 17) que para segurança da plataforma, se o motorista ficar inativo por longo período, não sabendo especificar quanto, há o descadastramento, mas o mesmo pode ser recadastrado imediatamente quando solicitado;18) que não há penalidade se o motorista desligar o aplicativo; 19) que o motorista não recebe ordens diretas de ninguém da Uber, nem é fiscalizado por ninguém quanto à sua jornada ou seu dia a dia; 20) que o motorista não tem que prestar contas para ninguém da uber; 21) que a reclamada não fixa jornada ou corridas mínimas ; 22) que quem avalia a viagem são os próprios usuários e os motoristas avaliam os usuários; 23) que se a avaliação for ruim, os dois lados podem ser descadastrados; 24) que a divisão da corrida é variável, sendo do uber black 20% para a uber e o restante para o parceiro e no uberX 25% para a uber; 25) que o motorista pode dirigir para outros aplicativos ou particular; 26) que o motorista pode dar desconto, pelo próprio aplicativo ; 27) que não é necessário uso de uniforme ou terno, não havendo qualquer norma de etiqueta; 28) que a reclamada não obriga a fornecer água e bala; 29) que a reclamada envia mensagens aos motoristas (dicas de outros motoristas para inspirar outros motoristas parceiros); 30) que nas mensagens podem também haver indicação de promoção ou grandes eventos na cidade para que os motoristas possam optar por cobri-los ou não ; 31) que a uber não fixa metas, não avalia os motoristas; 32) que quem decide o trajeto são as partes dentro do veículo ou através de GPS; 33) que não tem certeza se é gerada nota fiscal do serviço; 34) que se não houver água e bala não há punição ;35) que se o motorista recusar corridas em dinheiro, de maneira recorrente, pode ser descadastrado; 36) que acredita que em tal caso não poderá se cadastrar novamente; 37) que não ocorre exclusão através de uma única avaliação negativa,; 38) que o uber tem acesso às viagens realizadas, com sua duração, para que seja realizado o pagamento ao parceiro; 39) que se o pagamento é realizado em dinheiro o próprio cliente faz o pagamento e, se for cartão, a uber repassa; 40) que o repasse ocorre através de depósito em conta indicada pelo motorista, com frequência semanal sempre que houver saldo a receber; 41) que a única indicação da uber é que haja respeito entre motorista e usuário, o que consta nos próprios termos de uso; 42) que não tem como especificar quantas horas o reclamante trabalhava. 2. Id 6939446 - PROCESSO 0100776-82.2017.5.01.0026 - Testemunha Vitor de Lalor Rodrigues da Silva (indicada pela reclamada). A testemunha disse: que é gerente de operações no RJ; que qualquer pessoa pode acessar a plataforma para a Uber; que não é feita entrevista nem feito treinamento; que não há uso de uniforme obrigatório; que não há chefe para o motorista parceiro; que o motorista não envia relatório; que não precisa autorização para desligar o aplicativo; que não é obrigatório bala e água; que é possível o motorista cadastrar mais uma pessoa para conduzir o veículo; que o pagamento é feito ao motorista principal mas o auxiliar recebe um relatório do que ele fez; que é possível usar o aplicativo de concorrente e não há punição; que a avaliação do motorista é feita apenas pelo usuário; que o motorista também avalia o usuário, sem interferência da empresa; que o caminho a ser seguido é decisão do usuário; que é possível ao motorista ficar dias sem se conectar, inclusive longos períodos (6 meses/1 ano) sem precisar avisar ninguém; que o cancelamento de viagem pelo motorista não gera punição; que pode ocorrer de um motorista cancelar a viagem durante seu desenvolvimento; que o motorista pode dar desconto se o pagamento é feito em dinheiro; que não há ajuda financeira da Uber ao motorista para combustível, IPVA e manutenção; que a Uber emite nota fiscal; que se o usuário tem algum débito isso é cobrado na viagem seguinte. 3. Id 50b6824 - processo 0010200-28.2022.5.03.0021 - Testemunha Walter Tadeu Martins Filho (indicada pela reclamada). A testemunha disse: "que é empregado da reclamada; que é gerente de pesquisa e desenvolvimento; que o motorista tem liberdade para definir dias e horários em que estará online; que não tem poderes para contratar e dispensar empregados da Uber, assim como não tem poder para definir valores a serem cobrados por viagens; que não registra sua jornada em cartão de ponto; que no credenciamento não existe entrevista ou treinamento; que o cadastro não é realizado pessoalmente, mas pelo sistema da reclamada; (...) que o motorista não apresenta relatórios para a reclamada; que o motorista não é punido quando não está online; que o motorista não é obrigado a enviar atestado médico para a reclamada; que o motorista pode se cadastrar e permanecer online em outros aplicativos; que a rota da viagem é definida em conjunto pelo motorista e passageiro; que o motorista escolhe o local onde permanecerá online; que o veículo pode ser compartilhado com outros motoristas, mas todos devem estar cadastrados; que a reclamada não exige um número mínimo de viagens a serem feitas; que o motorista é avaliado pelo passageiro e vice-versa; que a avaliação não interfere na distribuição de viagens; que o motorista pode ser descadastrado se mantiver uma nota abaixo da média definida para a cidade de atuação (...) que o UberPro diz respeito a benefícios concedidos no caso de o motorista realizar o maior número de viagens, dentre os quais, bolsa para curso de inglês, desconto em combustível e desconto em academia; que o valor da viagem é definido de acordo com o tempo e distância; que a tarifa dinâmica é definida por região e visa atrair motoristas para determinadas regiões; que a reclamada não monitora o motorista quando o aplicativo está desativado; que o motorista fica impossibilitado de fazer viagens no caso de problemas de documentação ou quando há algumas verificações; (...)" 4) Id c69f5d3 - Processo 0000711-65.2022.5.08.0202 - Ata de Audiência - depoimento Cleyton Nascimento Costa (indicada pelo reclamante). A testemunha disse: que o depoente é motorista do aplicativo Uber desde o ano de 2022; que o depoente recebe as viagens do aplicativo a partir da localização do veículo; que o destino é aquele definido pelo usuário e que para chegar no destino o depoente não pode escolher a rota que conhece e que seja mais rápida, mas sim a rota definida pelo aplicativo; que o aplicativo reclamado questiona o depoente da rota que o depoente escolheu e então o depoente recebe o comunicado de que poderá receber menos corridas; que tomou conhecimento das regras que se descumprida poderiam gerar sua exclusão do aplicativo; que o depoente não pode ficar muito tempo desligado do aplicativo; que se o depoente já ficou um dia sem ligar o aplicativo e passou a receber muitas mensagens; que o depoente recebeu mensagens nessa situação de que estava muito tempo sem receber corridas; que o aplicativo informou ao depoente que o depoente receberia uma punição e ficaria desligado por um período; que o depoente não chegou a receber essa punição porque não chegou a ficar muito tempo desligado; que se o depoente recusar chamadas o depoente pode sofrer diminuição nas demandas por corrida. Às perguntas do patrono do Reclamante, respondeu: que a reclamada envia mensagens para o motorista realizar mais viagens e realizar mais serviços; que o depoente fica recebendo essas mensagens de 2h em 2h até que volte a realizar viagens; que o depoente recebe mensagens do aplicativo reclamado informando áreas de maior demanda por viagens, mas não recebe nenhum acréscimo dos valores das corridas que aceita nessa área; que o motorista não tem liberdade para dar desconto e cobrar um valor livremente; que o depoente tem conhecimento que existe uma nota mínima que tem que alcançar para permanecer no aplicativo e que essa nota varia entre 4 e 5. A partir dessa prova, as partes, em audiência de instrução (id 6cddf0a), ajustaram a inexistência de controvérsia em relação aos seguintes pontos: 1) Ficava a critério do motorista os dias e horários de ativação ou desativação do aplicativo; 2) O motorista poderia alterar a rota definida pelo aplicativo em comum acordo com o passageiro; 3) Não havia exigência quanto ao número mínimo de corridas diárias; 4) Ficava a critério do motorista a participação ou não em promoções; 5) O motorista apenas fez o cadastro por meio do aplicativo, não sendo realizado nenhum processo seletivo; 6) Fica a critério do motorista utilizar outras plataformas, como 99 Pop, Cabify, Blá BláCar etc.; 7) O motorista decide os dias de folga, e nos dias de folga não era necessário justificar a ausência na plataforma; 8) Poderia receber o valor da corrida diretamente do passageiro, quando pago em dinheiro; 9) O motorista arca com as despesas do veículo, inclusive seguro; 10) A reclamada não garante remuneração mínima ao final do dia /mês; 11) A reclamada aceita que dois ou mais motoristas usem o mesmo veículo; 12) Não é obrigatório o fornecimento de água e bala, ficando a critério do motorista. Em que pese possa haver dúvidas quanto à existência de subordinação, os históricos de viagem anexados no id 71212eb dão conta de que as viagens realizadas pelo reclamante não eram frequentes. Desde 2019, ano do seu cadastro na plataforma, verifica-se que, no mês de fevereiro do referido ano, por exemplo, foram registradas apenas 4 viagens, e não foram registradas quaisquer viagens no mês de abril. O mês com mais viagens registradas foi setembro/2019, em que o reclamante chegou a fazer 22 viagens em um só dia (28/09), mas também ficou cinco dias ou mais sem registro. No ano de 2020 foram realizadas algumas poucas viagens (época da pandemia). Porém, em 2021, não houve registro de qualquer viagem. No primeiro mês de 2022 (janeiro), o reclamante fez 17 viagens, menos de uma por dia. Não foram registradas viagens nos meses de fevereiro, março, abril e maio de 2022. Em junho de 2022, foram realizadas 8 viagens. No mês de julho de 2022, foram 55 viagens, em média, duas viagens ao dia. Agosto e setembro de 2022 foram os meses mais significativos, totalizando, respectivamente, 99 e 76 viagens. Após essa data, não foram juntados registros e o reclamante ingressou com a reclamatória em fevereiro de 2023. Assim, ante a demonstração de que a prestação de serviços se dava de forma eventual, afasta-se a caracterização de vínculo de emprego, pois ausente o requisito da "não eventualidade". Nega-se provimento ao recurso ordinário do reclamante. Admito o recurso de revista no item. No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, são identificadas decisões que reconhecem o vínculo de emprego entre o motorista de aplicativo e a plataforma digital, por considerarem configurada a subordinação, reformando decisões regionais que haviam entendido pela não demonstração dos requisitos da relação de emprego. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO - MOTORISTA DE APLICATIVO - EMPRESA-PLATAFORMA DIGITAL - PRESENÇA DE ELEMENTOS FÁTICO-JURÍDICOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 2º E 3º DA CLT - REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. No presente caso, o Tribunal Regional entendeu que estava ausente a subordinação jurídica e, em razão disto, não reconheceu a relação de emprego entre as partes. A conclusão adotada levou em consideração, especialmente, as seguintes premissas fáticas, todas consignadas no acórdão recorrido: (i) "As declarações prestadas pelo autor evidenciam que ele detinha inteira autonomia para estabelecer sua jornada de trabalho, desenvolvendo sua atividade no interesse e conveniência própria. Ele podia trabalhar quando bem entendesse, recusar e cancelar viagens, sem que haja notícia de aplicação de qualquer punição por parte da reclamada"; (ii) "ao autor incumbia inteiramente dispor sobre sua meta e produtividade periódicas, constatando-se, ainda, que ele era remunerado pelo usuário e não pela demandada"; e (iii) "Não se verifica, por outro lado, a efetiva fiscalização de sua rotina laboral ou da qualidade de trabalho pelo reclamado, sendo que a avaliação do serviço prestado estava a cargo dos usuários". A decisão monocrática entendeu que "o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício", reformando o acórdão regional e reconhecendo o vínculo de emprego entre reclamante e reclamada. Como destacado na decisão agravada, o quadro fático consignado pelo TRT permite a esta Corte fazer o reenquadramento jurídico para reconhecer o vínculo de emprego vindicado, sem que se cogite do óbice previsto na Súmula/TST nº 126. Isso porque, a decisão, tal como prolatada, contraria precedente recente desta 2ª Turma, no sentido de que o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício. Nesse sentido, cite-se nova modalidade de subordinação, denominada " subordinação pelo algoritmo ", que está presente no citado modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo. Agravo interno a que se nega provimento" (Ag-RR-10021-05.2022.5.03.0180, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 18/10/2024). Exemplificativamente, também reformando acórdão regional sobre o tema: RR-100353-02.2017.5.01.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 11/04/2022; RR-1000764-25.2021.5.02.0301, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 15/09/2023. Por outro lado, são encontrados acórdãos, no mesmo Tribunal Superior, com entendimento diverso, no sentido de que o trabalho realizado nesses moldes não acarreta o reconhecimento de relação de emprego, destacando que não restaria constatada a subordinação. Nessa linha: "DIREITO DO TRABALHO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. A questão jurídica que envolve o reconhecimento de vínculo de emprego de motorista de aplicativo tem transcendência jurídica. 2. A tese recursal independe do revolvimento de fatos e provas, na medida em que o vínculo empregatício foi reconhecido com base em subordinação algorítmica ou estrutural, tese que tem sido reiteradamente afastada pelo Supremo Tribunal Federal. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL OU ALGORÍTMICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A questão debatida nos autos diz respeito à natureza da relação jurídica que se forma entre empresas que exploram plataformas digitais e motoristas ou entregadores que se utilizam da tecnologia do aplicativo. 2. O Tribunal Regional reconheceu o vínculo empregatício fundamentado exclusivamente na existência de uma subordinação algorítmica, pois o trabalhador teria sua atividade controlada e fiscalizada por meio de sistemas de inteligência artificial. 3. A relação jurídica que envolve os motoristas de aplicativo e as empresas que gerem as plataformas digitais é fruto da revolução tecnológica que promove novas formas de prestação de serviços e novos formatos contratuais, muitas das quais ainda carecem de uma regulamentação legal específica. 4. A chamada subordinação algorítmica não encontra agasalho na ordem jurídica vigente e esse novo modelo contratual que envolve motoristas de aplicativos e empresas provedoras de plataformas digitais não se enquadra no modelo empregatício regulamentado pela Consolidação das Leis do Trabalho. 5. A observância de regras de conduta é inerente a qualquer modalidade contratual e ínsita a qualquer atividade profissional, seja ela subordinada ou não, de modo que as circunstâncias fáticas registradas no acórdão regional (impossibilidade de o motorista ditar o preço do serviço e a necessidade de observar regras de conduta) não são suficientes para caracterizar a relação empregatícia. 6. Não se desconhece a notória necessidade de proteção jurídica aos motoristas de aplicativo, porém, tal desiderato protetivo deve ser alcançado via legislativa, nada justificando trazê-los ao abrigo de uma relação de emprego que não foi pactuada. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-462-04.2022.5.13.0032, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 19/11/2024). Com posicionamento análogo: RRAg-0010190-80.2023.5.03.0107, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 21/11/2024; RRAg-1001341-61.2022.5.02.0044, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 28/10/2024; RRAg-1000446-50.2018.5.02.0009, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 18/03/2024. Além da controvérsia jurídica constatada, cabe destacar que a presente questão ainda será analisada pelo Supremo Tribunal Federal, em razão do Tema 1.291 de Repercussão Geral "Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 1º, IV; 5º, II, XIII; e 170, IV, da Constituição Federal, a possibilidade do reconhecimento de vínculo de emprego entre motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa criadora e administradora da plataforma digital intermediadora". Diante do quadro posto, e em se tratando de matéria que ainda pende de uniformização jurisprudencial, dá-se seguimento ao recurso de revista por possível afronta ao artigo 170 da Constituição Federal, com fulcro na alínea "c" do artigo 896 da CLT. CONCLUSÃO Dou seguimento. Intimem-se, inclusive a parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal. (rfr) PORTO ALEGRE/RS, 25 de abril de 2025. ALEXANDRE CORREA DA CRUZ Desembargador Federal do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - EDILSON ROCHA

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Edilson Rocha e outros x Uber Do Brasil Tecnologia Ltda. e outros

ID: 261496408

Tribunal: TRT4 Órgão: OJ de Análise de Recurso Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0020014-24.2023.5.04.0111

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

EDILSON ROCHA MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

Polo Passivo:

UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. UBER INTERNATIONAL B.V. UBER INTERNATIONAL HOLDING B.V.

Notificação

Advogados:

LUIZ AFRANIO ARAUJO

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IBOTI OLIVEIRA BARCELOS JUNIOR

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: FRANCISCO ROSSAL DE ARAUJO 0020014-24.2023.5.04.0111 : EDILSON ROCHA : UBER … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: FRANCISCO ROSSAL DE ARAUJO 0020014-24.2023.5.04.0111 : EDILSON ROCHA : UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. E OUTROS (2) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID c54dbe1 proferida nos autos. Recorrente(s): 1. EDILSON ROCHA Recorrido(a)(s): 1. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO 2. UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. 3. UBER INTERNATIONAL B.V. 4. UBER INTERNATIONAL HOLDING B.V. RECURSO DE: EDILSON ROCHA PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Recurso tempestivo (decisão publicada em 11/03/2025 - Id f286aa1; recurso apresentado em 17/03/2025 - Id 0b0202e). Representação processual regular (id 9af70e8). Preparo dispensado (id 28c0322). PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS 1.1 DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO (13707) / RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: O contrato de emprego, espécie de contrato de trabalho, pela terminologia adotada por Martins Catharino, é sinalagmático, consensual, intuitu personae, de trato sucessivo e oneroso. Para que seja verificada a sua existência, necessário se faz que existam as condições acima expostas, juntamente com a caracterização dos pólos da relação de emprego na forma prevista pela CLT, ou seja, empregado e empregador. O art. 3º da CLT traz a definição de empregado: "...é toda a pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário". Por seu turno, o art. 2º da mesma Consolidação define o empregador como sendo aquela empresa, individual ou coletiva, que "assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços". Essencial, portanto, a presença dos elementos subordinação jurídica, pessoalidade, não eventualidade na prestação de serviços e pagamento mediante salário. O empregado necessariamente é pessoa física, sendo impossível a existência de vínculo jurídico de emprego sendo empregado uma pessoa jurídica. Trabalho eventual não caracteriza a existência de relação de emprego, devendo haver correspondência e atendimento às atividades normais do empreendimento econômico, de maneira persistente, com continuidade. O requisito da subordinação é aquele estado de dependência real criado por um direito, o direito do empregador de comandar, dar ordens, donde nasce a obrigação correspondente do empregado de obedecer a estas ordens, sempre, é claro, nos limites legais e ético-morais, segundo Paul Colin, citado por Délio Maranhão in Direito do Trabalho, 13ª edição, Ed. Fundação Getúlio Vargas, 1985, p. 53. Para a configuração da natureza sinalagmática (obrigações contrárias e equivalentes) e onerosa (à prestação de trabalho corresponde a contraprestação salarial) é preciso que haja pagamento de salário. Com o surgimento de modernas relações de trabalho, como é o caso de labor por aplicativos/plataformas digitais, a doutrina e a jurisprudência vêm discutindo os vários conceitos de subordinação jurídica, para além da clássica citada acima, como é o caso da "subordinação estrutural", que para Maurício Godinho Delgado, "é a que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento." Há, ainda, a "subordinação algorítmica", uma nova faceta dentro do mundo das tecnologias, onde o trabalhador é comandado por um "mar" de algoritmos desenvolvidos pela empresa, que dita as regras, como por exemplo a regras de tarifa, o valor da tarifa, o percurso etc, sem poder de influência/autonomia do trabalhador, o que se interliga ao conceito de subordinação jurídica remota, já compreendida no art. 6º da CLT, que dispõe que "os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio." Desse modo, atualmente, há jurisprudência do TST tanto reconhecendo o vínculo de emprego, como o afastando, a depender dos elementos/provas constantes dos autos, a fim de verificar se o trabalhador preenche os requisitos da relação de emprego, previstos no art 3° da CLT, sendo que este Relator entende que o principal pressuposto para se caracterizar a relação de emprego, nesses casos, é o da não eventualidade. O contrato de emprego tem uma relação com o tempo, sendo uma obrigação contínua ou de trato sucessivo. A expressão "trabalho não eventual" constitui um conceito jurídico indeterminado. Pode ocorrer que um contrato inicialmente previsto para ser instantâneo ou de execução diferida se transforme em um contrato de trato sucessivo porque as partes estão ajustando contínuas atividades que, somadas, acabam por modificar a sua natureza. A parte ré admite a prestação de serviços, alegando fatos impeditivos ao direito do autor. Assim sendo, diante das alegações postas, recai sobre os reclamados o ônus probatório do fato impeditivo alegado, nos termos do art. 373, II, do CPC e art. 818, da CLT. Foi utilizada prova oral emprestada de outros processos envolvendo a mesma reclamada: 1. Id 31ffca8- PROCESSO 1001906-63.2016.5.02.0067 - Testemunha Pedro Pacce Prochno (indicada pela reclamada). A testemunha disse que: 1) que trabalha na Uber, registrado, como gerente de comunicação; 2) que tem conhecimento sobre como funciona a plataforma e o contato com os motoristas; 3) que não entra em contato com os motoristas, apenas raramente quando há alguma solicitação da imprensa para dar entrevistas por exemplo; 4) que a plataforma e o funcionamento são os mesmos em todo o território nacional; 5) que qualquer pessoa pode entrar no site da uber e preencher informações para se tornar um motorista da uber; 6) que a uber apenas solicita documentos pessoais, carteira de motorista com observação de que exerce atividade remunerada; 7) que com o cadastramento do motorista, o mesmo recebe as informações sobre funcionamento da plataforma por e-mail, pelo site e pelo próprio aplicativo; 8) que o motorista precisa concordar com essas regras; 9) que o "de acordo" com as normas é realizado pelo motorista parceiro no próprio site da uber ou no aplicativo; 10) que não há treinamentos ou entrevistas com o motorista; 11) que o próprio motorista arca com valores de combustível, multas e afins; 12) que o motorista parceiro pode ter outras pessoas cadastradas para utilização do mesmo carro; 13) que nesse caso, os valores pagos caem na conta da pessoa principal que fez o cadastro, sendo responsável pela divisão posterior; 14) que a reclamada não obrigada o motorista a comprar carro, podendo este ser alugado, de amigo ou de familiar, devendo apenas ter acesso à documentação do veículo ; 15) que quem decide os dias e horários em que irá ligar o aplicativo é o próprio motorista, podendo desligar sempre que desejar; 16) que o motorista pode negar corrida, pode deixar o aplicativo desligado; 17) que para segurança da plataforma, se o motorista ficar inativo por longo período, não sabendo especificar quanto, há o descadastramento, mas o mesmo pode ser recadastrado imediatamente quando solicitado;18) que não há penalidade se o motorista desligar o aplicativo; 19) que o motorista não recebe ordens diretas de ninguém da Uber, nem é fiscalizado por ninguém quanto à sua jornada ou seu dia a dia; 20) que o motorista não tem que prestar contas para ninguém da uber; 21) que a reclamada não fixa jornada ou corridas mínimas ; 22) que quem avalia a viagem são os próprios usuários e os motoristas avaliam os usuários; 23) que se a avaliação for ruim, os dois lados podem ser descadastrados; 24) que a divisão da corrida é variável, sendo do uber black 20% para a uber e o restante para o parceiro e no uberX 25% para a uber; 25) que o motorista pode dirigir para outros aplicativos ou particular; 26) que o motorista pode dar desconto, pelo próprio aplicativo ; 27) que não é necessário uso de uniforme ou terno, não havendo qualquer norma de etiqueta; 28) que a reclamada não obriga a fornecer água e bala; 29) que a reclamada envia mensagens aos motoristas (dicas de outros motoristas para inspirar outros motoristas parceiros); 30) que nas mensagens podem também haver indicação de promoção ou grandes eventos na cidade para que os motoristas possam optar por cobri-los ou não ; 31) que a uber não fixa metas, não avalia os motoristas; 32) que quem decide o trajeto são as partes dentro do veículo ou através de GPS; 33) que não tem certeza se é gerada nota fiscal do serviço; 34) que se não houver água e bala não há punição ;35) que se o motorista recusar corridas em dinheiro, de maneira recorrente, pode ser descadastrado; 36) que acredita que em tal caso não poderá se cadastrar novamente; 37) que não ocorre exclusão através de uma única avaliação negativa,; 38) que o uber tem acesso às viagens realizadas, com sua duração, para que seja realizado o pagamento ao parceiro; 39) que se o pagamento é realizado em dinheiro o próprio cliente faz o pagamento e, se for cartão, a uber repassa; 40) que o repasse ocorre através de depósito em conta indicada pelo motorista, com frequência semanal sempre que houver saldo a receber; 41) que a única indicação da uber é que haja respeito entre motorista e usuário, o que consta nos próprios termos de uso; 42) que não tem como especificar quantas horas o reclamante trabalhava. 2. Id 6939446 - PROCESSO 0100776-82.2017.5.01.0026 - Testemunha Vitor de Lalor Rodrigues da Silva (indicada pela reclamada). A testemunha disse: que é gerente de operações no RJ; que qualquer pessoa pode acessar a plataforma para a Uber; que não é feita entrevista nem feito treinamento; que não há uso de uniforme obrigatório; que não há chefe para o motorista parceiro; que o motorista não envia relatório; que não precisa autorização para desligar o aplicativo; que não é obrigatório bala e água; que é possível o motorista cadastrar mais uma pessoa para conduzir o veículo; que o pagamento é feito ao motorista principal mas o auxiliar recebe um relatório do que ele fez; que é possível usar o aplicativo de concorrente e não há punição; que a avaliação do motorista é feita apenas pelo usuário; que o motorista também avalia o usuário, sem interferência da empresa; que o caminho a ser seguido é decisão do usuário; que é possível ao motorista ficar dias sem se conectar, inclusive longos períodos (6 meses/1 ano) sem precisar avisar ninguém; que o cancelamento de viagem pelo motorista não gera punição; que pode ocorrer de um motorista cancelar a viagem durante seu desenvolvimento; que o motorista pode dar desconto se o pagamento é feito em dinheiro; que não há ajuda financeira da Uber ao motorista para combustível, IPVA e manutenção; que a Uber emite nota fiscal; que se o usuário tem algum débito isso é cobrado na viagem seguinte. 3. Id 50b6824 - processo 0010200-28.2022.5.03.0021 - Testemunha Walter Tadeu Martins Filho (indicada pela reclamada). A testemunha disse: "que é empregado da reclamada; que é gerente de pesquisa e desenvolvimento; que o motorista tem liberdade para definir dias e horários em que estará online; que não tem poderes para contratar e dispensar empregados da Uber, assim como não tem poder para definir valores a serem cobrados por viagens; que não registra sua jornada em cartão de ponto; que no credenciamento não existe entrevista ou treinamento; que o cadastro não é realizado pessoalmente, mas pelo sistema da reclamada; (...) que o motorista não apresenta relatórios para a reclamada; que o motorista não é punido quando não está online; que o motorista não é obrigado a enviar atestado médico para a reclamada; que o motorista pode se cadastrar e permanecer online em outros aplicativos; que a rota da viagem é definida em conjunto pelo motorista e passageiro; que o motorista escolhe o local onde permanecerá online; que o veículo pode ser compartilhado com outros motoristas, mas todos devem estar cadastrados; que a reclamada não exige um número mínimo de viagens a serem feitas; que o motorista é avaliado pelo passageiro e vice-versa; que a avaliação não interfere na distribuição de viagens; que o motorista pode ser descadastrado se mantiver uma nota abaixo da média definida para a cidade de atuação (...) que o UberPro diz respeito a benefícios concedidos no caso de o motorista realizar o maior número de viagens, dentre os quais, bolsa para curso de inglês, desconto em combustível e desconto em academia; que o valor da viagem é definido de acordo com o tempo e distância; que a tarifa dinâmica é definida por região e visa atrair motoristas para determinadas regiões; que a reclamada não monitora o motorista quando o aplicativo está desativado; que o motorista fica impossibilitado de fazer viagens no caso de problemas de documentação ou quando há algumas verificações; (...)" 4) Id c69f5d3 - Processo 0000711-65.2022.5.08.0202 - Ata de Audiência - depoimento Cleyton Nascimento Costa (indicada pelo reclamante). A testemunha disse: que o depoente é motorista do aplicativo Uber desde o ano de 2022; que o depoente recebe as viagens do aplicativo a partir da localização do veículo; que o destino é aquele definido pelo usuário e que para chegar no destino o depoente não pode escolher a rota que conhece e que seja mais rápida, mas sim a rota definida pelo aplicativo; que o aplicativo reclamado questiona o depoente da rota que o depoente escolheu e então o depoente recebe o comunicado de que poderá receber menos corridas; que tomou conhecimento das regras que se descumprida poderiam gerar sua exclusão do aplicativo; que o depoente não pode ficar muito tempo desligado do aplicativo; que se o depoente já ficou um dia sem ligar o aplicativo e passou a receber muitas mensagens; que o depoente recebeu mensagens nessa situação de que estava muito tempo sem receber corridas; que o aplicativo informou ao depoente que o depoente receberia uma punição e ficaria desligado por um período; que o depoente não chegou a receber essa punição porque não chegou a ficar muito tempo desligado; que se o depoente recusar chamadas o depoente pode sofrer diminuição nas demandas por corrida. Às perguntas do patrono do Reclamante, respondeu: que a reclamada envia mensagens para o motorista realizar mais viagens e realizar mais serviços; que o depoente fica recebendo essas mensagens de 2h em 2h até que volte a realizar viagens; que o depoente recebe mensagens do aplicativo reclamado informando áreas de maior demanda por viagens, mas não recebe nenhum acréscimo dos valores das corridas que aceita nessa área; que o motorista não tem liberdade para dar desconto e cobrar um valor livremente; que o depoente tem conhecimento que existe uma nota mínima que tem que alcançar para permanecer no aplicativo e que essa nota varia entre 4 e 5. A partir dessa prova, as partes, em audiência de instrução (id 6cddf0a), ajustaram a inexistência de controvérsia em relação aos seguintes pontos: 1) Ficava a critério do motorista os dias e horários de ativação ou desativação do aplicativo; 2) O motorista poderia alterar a rota definida pelo aplicativo em comum acordo com o passageiro; 3) Não havia exigência quanto ao número mínimo de corridas diárias; 4) Ficava a critério do motorista a participação ou não em promoções; 5) O motorista apenas fez o cadastro por meio do aplicativo, não sendo realizado nenhum processo seletivo; 6) Fica a critério do motorista utilizar outras plataformas, como 99 Pop, Cabify, Blá BláCar etc.; 7) O motorista decide os dias de folga, e nos dias de folga não era necessário justificar a ausência na plataforma; 8) Poderia receber o valor da corrida diretamente do passageiro, quando pago em dinheiro; 9) O motorista arca com as despesas do veículo, inclusive seguro; 10) A reclamada não garante remuneração mínima ao final do dia /mês; 11) A reclamada aceita que dois ou mais motoristas usem o mesmo veículo; 12) Não é obrigatório o fornecimento de água e bala, ficando a critério do motorista. Em que pese possa haver dúvidas quanto à existência de subordinação, os históricos de viagem anexados no id 71212eb dão conta de que as viagens realizadas pelo reclamante não eram frequentes. Desde 2019, ano do seu cadastro na plataforma, verifica-se que, no mês de fevereiro do referido ano, por exemplo, foram registradas apenas 4 viagens, e não foram registradas quaisquer viagens no mês de abril. O mês com mais viagens registradas foi setembro/2019, em que o reclamante chegou a fazer 22 viagens em um só dia (28/09), mas também ficou cinco dias ou mais sem registro. No ano de 2020 foram realizadas algumas poucas viagens (época da pandemia). Porém, em 2021, não houve registro de qualquer viagem. No primeiro mês de 2022 (janeiro), o reclamante fez 17 viagens, menos de uma por dia. Não foram registradas viagens nos meses de fevereiro, março, abril e maio de 2022. Em junho de 2022, foram realizadas 8 viagens. No mês de julho de 2022, foram 55 viagens, em média, duas viagens ao dia. Agosto e setembro de 2022 foram os meses mais significativos, totalizando, respectivamente, 99 e 76 viagens. Após essa data, não foram juntados registros e o reclamante ingressou com a reclamatória em fevereiro de 2023. Assim, ante a demonstração de que a prestação de serviços se dava de forma eventual, afasta-se a caracterização de vínculo de emprego, pois ausente o requisito da "não eventualidade". Nega-se provimento ao recurso ordinário do reclamante. Admito o recurso de revista no item. No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, são identificadas decisões que reconhecem o vínculo de emprego entre o motorista de aplicativo e a plataforma digital, por considerarem configurada a subordinação, reformando decisões regionais que haviam entendido pela não demonstração dos requisitos da relação de emprego. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO - MOTORISTA DE APLICATIVO - EMPRESA-PLATAFORMA DIGITAL - PRESENÇA DE ELEMENTOS FÁTICO-JURÍDICOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 2º E 3º DA CLT - REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. No presente caso, o Tribunal Regional entendeu que estava ausente a subordinação jurídica e, em razão disto, não reconheceu a relação de emprego entre as partes. A conclusão adotada levou em consideração, especialmente, as seguintes premissas fáticas, todas consignadas no acórdão recorrido: (i) "As declarações prestadas pelo autor evidenciam que ele detinha inteira autonomia para estabelecer sua jornada de trabalho, desenvolvendo sua atividade no interesse e conveniência própria. Ele podia trabalhar quando bem entendesse, recusar e cancelar viagens, sem que haja notícia de aplicação de qualquer punição por parte da reclamada"; (ii) "ao autor incumbia inteiramente dispor sobre sua meta e produtividade periódicas, constatando-se, ainda, que ele era remunerado pelo usuário e não pela demandada"; e (iii) "Não se verifica, por outro lado, a efetiva fiscalização de sua rotina laboral ou da qualidade de trabalho pelo reclamado, sendo que a avaliação do serviço prestado estava a cargo dos usuários". A decisão monocrática entendeu que "o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício", reformando o acórdão regional e reconhecendo o vínculo de emprego entre reclamante e reclamada. Como destacado na decisão agravada, o quadro fático consignado pelo TRT permite a esta Corte fazer o reenquadramento jurídico para reconhecer o vínculo de emprego vindicado, sem que se cogite do óbice previsto na Súmula/TST nº 126. Isso porque, a decisão, tal como prolatada, contraria precedente recente desta 2ª Turma, no sentido de que o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício. Nesse sentido, cite-se nova modalidade de subordinação, denominada " subordinação pelo algoritmo ", que está presente no citado modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo. Agravo interno a que se nega provimento" (Ag-RR-10021-05.2022.5.03.0180, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 18/10/2024). Exemplificativamente, também reformando acórdão regional sobre o tema: RR-100353-02.2017.5.01.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 11/04/2022; RR-1000764-25.2021.5.02.0301, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 15/09/2023. Por outro lado, são encontrados acórdãos, no mesmo Tribunal Superior, com entendimento diverso, no sentido de que o trabalho realizado nesses moldes não acarreta o reconhecimento de relação de emprego, destacando que não restaria constatada a subordinação. Nessa linha: "DIREITO DO TRABALHO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. A questão jurídica que envolve o reconhecimento de vínculo de emprego de motorista de aplicativo tem transcendência jurídica. 2. A tese recursal independe do revolvimento de fatos e provas, na medida em que o vínculo empregatício foi reconhecido com base em subordinação algorítmica ou estrutural, tese que tem sido reiteradamente afastada pelo Supremo Tribunal Federal. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL OU ALGORÍTMICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A questão debatida nos autos diz respeito à natureza da relação jurídica que se forma entre empresas que exploram plataformas digitais e motoristas ou entregadores que se utilizam da tecnologia do aplicativo. 2. O Tribunal Regional reconheceu o vínculo empregatício fundamentado exclusivamente na existência de uma subordinação algorítmica, pois o trabalhador teria sua atividade controlada e fiscalizada por meio de sistemas de inteligência artificial. 3. A relação jurídica que envolve os motoristas de aplicativo e as empresas que gerem as plataformas digitais é fruto da revolução tecnológica que promove novas formas de prestação de serviços e novos formatos contratuais, muitas das quais ainda carecem de uma regulamentação legal específica. 4. A chamada subordinação algorítmica não encontra agasalho na ordem jurídica vigente e esse novo modelo contratual que envolve motoristas de aplicativos e empresas provedoras de plataformas digitais não se enquadra no modelo empregatício regulamentado pela Consolidação das Leis do Trabalho. 5. A observância de regras de conduta é inerente a qualquer modalidade contratual e ínsita a qualquer atividade profissional, seja ela subordinada ou não, de modo que as circunstâncias fáticas registradas no acórdão regional (impossibilidade de o motorista ditar o preço do serviço e a necessidade de observar regras de conduta) não são suficientes para caracterizar a relação empregatícia. 6. Não se desconhece a notória necessidade de proteção jurídica aos motoristas de aplicativo, porém, tal desiderato protetivo deve ser alcançado via legislativa, nada justificando trazê-los ao abrigo de uma relação de emprego que não foi pactuada. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-462-04.2022.5.13.0032, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 19/11/2024). Com posicionamento análogo: RRAg-0010190-80.2023.5.03.0107, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 21/11/2024; RRAg-1001341-61.2022.5.02.0044, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 28/10/2024; RRAg-1000446-50.2018.5.02.0009, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 18/03/2024. Além da controvérsia jurídica constatada, cabe destacar que a presente questão ainda será analisada pelo Supremo Tribunal Federal, em razão do Tema 1.291 de Repercussão Geral "Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 1º, IV; 5º, II, XIII; e 170, IV, da Constituição Federal, a possibilidade do reconhecimento de vínculo de emprego entre motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa criadora e administradora da plataforma digital intermediadora". Diante do quadro posto, e em se tratando de matéria que ainda pende de uniformização jurisprudencial, dá-se seguimento ao recurso de revista por possível afronta ao artigo 170 da Constituição Federal, com fulcro na alínea "c" do artigo 896 da CLT. CONCLUSÃO Dou seguimento. Intimem-se, inclusive a parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal. (rfr) PORTO ALEGRE/RS, 25 de abril de 2025. ALEXANDRE CORREA DA CRUZ Desembargador Federal do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. - UBER INTERNATIONAL HOLDING B.V. - UBER INTERNATIONAL B.V.

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Douglas Fernandes Ramires x Loggi Tecnologia Ltda.

ID: 280037665

Tribunal: TRT4 Órgão: OJ de Análise de Recurso Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0021095-90.2023.5.04.0019

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

DOUGLAS FERNANDES RAMIRES

Polo Passivo:

LOGGI TECNOLOGIA LTDA.

Notificação

Advogados:

ODILON MARQUES GARCIA JUNIOR

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IVONE DA FONSECA GARCIA

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

GUSTAVO HENRIQUE DOS SANTOS VISEU

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: FERNANDO LUIZ DE MOURA CASSAL 0021095-90.2023.5.04.0019 : DOUGLAS FERNANDES R… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: FERNANDO LUIZ DE MOURA CASSAL 0021095-90.2023.5.04.0019 : DOUGLAS FERNANDES RAMIRES : LOGGI TECNOLOGIA LTDA. INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID f45138a proferida nos autos. 0021095-90.2023.5.04.0019 - 6ª TurmaRecorrente(s): 1. DOUGLAS FERNANDES RAMIRES Recorrido(a)(s): 1. LOGGI TECNOLOGIA LTDA. RECURSO DE: DOUGLAS FERNANDES RAMIRES PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Recurso tempestivo (decisão publicada em 31/03/2025 - Id a76d6d8; recurso apresentado em 10/04/2025 - Id 4ec0a00). Representação processual regular (id 00b5aca). Preparo dispensado (id 01b37aa). PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS 1.1 DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO (13707) / RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: "1. Vínculo de emprego. Trabalho em plataforma digital. O autor sustenta que a relação mantida com a ré caracteriza-se como empregatícia, ante a presença de pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica, embora não formalizada. Pontua que a recorrida não nega a prestação de serviços, reconhecendo o período narrado na inicial, nada obstante defenda que a relação entre as partes é de prestação de serviços autônomos. Sustenta que a ré encaminhava as atividades a ser realizadas, além de cobrar resultados e metas e aduz que a prestação de serviços era exclusiva. Requer, por conseguinte, o reconhecimento do vínculo de emprego, com a determinação do retorno dos autos ao Juízo de origem para que julgue os consectários. Ao exame. Neste particular, o Juízo de origem assim fundamentou sua decisão: De todo modo, o Supremo Tribunal Federal afastou a ilicitude da terceirização na atividade-fim (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 324 e Recurso Extraordinário n. 958252, julgados em 30/8/2018, com repercussão geral reconhecida), no seguinte sentido (ADPF n. 324): O Tribunal, no mérito, por maioria e nos termos do voto do Relator, julgou procedente o pedido e firmou a seguinte tese: 1. É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada. 2. Na terceirização, compete à contratante: i) verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada; e ii) responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias, na forma do art. 31 da Lei 8.212/1993, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Nesta assentada, o Relator esclareceu que a presente decisão não afeta automaticamente os processos em relação aos quais tenha havido coisa julgada. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 30.8.2018. (grifei em negrito) Posto isso, segundo os ensinamentos do mestre Maurício Godinho Delgado (Curso de Direito do Trabalho, 13ª ed. Ltr, 2014, p. 291) "os elementos fático-jurídicos componentes da relação de emprego são cinco: a) prestação de trabalho por pessoa física a um tomador qualquer; b) prestação efetuada com pessoalidade pelo trabalhador; c) também efetuada com não eventualidade; d) efetuada ainda sob subordinação ao tomador dos serviços; e) prestação de trabalho efetuada com onerosidade". A questão principal reside na existência ou não de subordinação entre o motorista-entregador de aplicativo e a plataforma digital. No que toca especificamente à subordinação, esta incide sobre o modo da prestação dos serviços e se caracteriza por ordens emanadas do tomador com repetição, continuidade e intensidade tais que o trabalhador deixe de deter a decisão e a gerência sobre a direção central e cotidiana do seu labor. Posto isso, em que pese a condição em que foi ouvida a depoente indicada pela ré, vejo que as suas alegações encontram respaldo na prova , notadamente no que toca à forma de atuação documental (fls. 165-82) pelo aplicativo da ré, revelando que a parte autora detinha plena autonomia na prestação dos serviços, notadamente porque: a) ficava a critério do entregador os horários de início e de término da prestação de serviços e os dias de folgas, sem necessidade de informar ou justificar os períodos de repouso para a ré; b) o entregador poderia desligar o aplicativo a qualquer momento, negar a realização de entrega ou não fazer a entrega, independentemente de autorização, sem qualquer penalidade por esses fatos; c) o entregador poderia alterar a rota definida pelo aplicativo, o que também é informado na cláusula 5.1.2 do contrato de adesão e termos de uso (fl. 172); d) não havia exigência quanto ao número mínimo de entregas diárias, nem metas de atendimento, dando ênfase, neste ponto, que a não utilização do aplicativo por longo período sequer implicava no bloqueio automático do perfil do entregador; e) o entregador poderia utilizar outras plataformas de serviços de entrega de mercadorias; f) o motorista não recebia ordens diretas ou indiretas de nenhum funcionário da ré, nem era fiscalizado por qualquer preposto da demandada, sequer a título de prestação de contas ou sobre o resultado comercial da prestação dos serviços. Não bastasse, a parte autora arcava com praticamente todo o custo operacional da atividade, pois era o transportador quem pagava as despesas com a manutenção, limpeza (lavagem), seguro e combustível do veículo (item 3 da fundamentação da inicial, fl. 8), cabendo à ré apenas as despesas com a disponibilização da plataforma digital. Esta forma de contratação, na qual a parte trabalhadora absorve todo o custo operacional, é típica de parceria comercial. Noutro quadrante, o pagamento era efetuado pelos solicitantes das entregas na proporção em que os serviços eram executados, com valor variável e consentâneo com o serviço realizado, com repasse à demandada de apenas 1% a 30% da quantia paga pelos solicitantes. O fato de o preço da corrida ser previamente estipulado pela demandada não é suficiente para caracterizar a subordinação jurídica, uma vez que o entregador poderia recusar a corrida. De todo modo, os valores eram fixados com base na distância de deslocamento, assim como ocorre com as tarifas de táxis, que são , sendo que estes meios de transporte, apuradas por taxímetro à evidência, são conduzidos por motoristas profissionais autônomos. Também não havia avaliação do entregador, sequer pelo destinatário da mercadoria. Além disso, não havia processo seletivo para a escolha do motorista ou entrevista, bastando simples cadastro, envio de documentos e identificação do transportador por questões de segurança (foto do motorista, CNH e documento do veículo). O contato com os destinatários da entrega por intermédio do aplicativo (fl. 83) e a apuração de problemas no frete (fl. 85) ocorrem em qualquer tipo de contrato de natureza civil, pois os adquirentes do serviço desejam receber as mercadorias da forma mais rápida possível e sem intercorrências. Com esses argumentos, entendo que a parte autora atuou sem subordinação jurídica, pois ela detinha autonomia na prestação dos serviços e o pagamento era efetuado pelos solicitantes dos fretes (fls. 27-72), o que afasta a existência de relação jurídica de emprego pretendida neste feito. Mesmo que assim não se entenda, a forma de atuação do autor, arcando com os custos da sua prestação de serviços, sendo remunerado por frete e com atuação nos dias e horários que o próprio autor desejava laborar, indica a prestação de serviços na condição de transportador autônomo de carga, o que por igual afasta a existência de relação de emprego entre as partes, na esteira da decisão proferida pela Suprema Corte na ADC nº. 48. Julgo , assim, o pedido de declaração improcedente da existência de relação jurídica de emprego entre as partes (alínea a, parte inicial, do rol de pleitos - fl. 15). Ainda, por consequência lógica, na medida em que as demais pretensões formuladas na peça de ingresso são decorrentes da suposta existência de vínculo de emprego, julgo improcedentes os pedidos articulados nas alíneas a, parte final, do rol de pleitos (fl. 15), e alíneas b a h do rol de pleitos (fls. 15-6). Para que se reconheça o vínculo de emprego, necessária a prova dos requisitos elencados nos artigos 2º e 3º da CLT, quais sejam: pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação. Em especial, é necessária a prova da existência de trabalho subordinado, visto que, se assim não fosse, seria impossível distinguir o contrato de emprego de outros que possuem o mesmo objeto - trabalho. A subordinação é imprescindível para que se configure a relação de emprego e, como elemento tipificador do contrato de trabalho, consiste na atuação do empregador em dar a ordem (comando), acompanhar o cumprimento da ordem (controle) e punir o empregado pelo descumprimento da ordem (fiscalização). Pela distribuição do ônus da prova, quando negada a prestação de serviços incumbe ao autor o ônus de demonstrar os elementos caracterizadores do pacto laboral, fatos constitutivos do seu direito. A contrario sensu, admitida a prestação, mas negada a relação jurídica de emprego, inverte-se o onus probandi, que passa a ser do empregador, a teor dos artigos 818 da CLT e 373, II, do CPC. Na inicial (ID. e2486c6), o autor sustenta que estava vinculado a moderna modalidade de emprego, encontrando-se inserido na estrutura produtiva da empresa, de modo a se encontrar presente a subordinação estrutural. Além disso, afirma que os motoristas/entregadores se reuniam com os representantes da empresa para receberem instruções, recebendo avaliações dos consumidores como meio de fiscalização pelo empregador. Indica, também, que quando houvesse a prática de equívocos, como entrega de encomenda a terceiros, o motorista/entregador recebia penalidades, até mesmo resultando no seu bloqueio na plataforma digital. Ressalto que para a caracterização da relação de emprego faz-se necessária a presença da subordinação jurídica, não havendo falar em vínculo de emprego quando caracterizada apenas a subordinação estrutural. A participação do trabalhador autônomo na dinâmica produtiva do empreendimento, sem submeter-se ao poder diretivo do empregador, afasta o enquadramento da relação havida entre as partes no que dispõe os arts. 2º e 3º da CLT. Ademais, a aplicação da teoria da subordinação estrutural traria a conclusão de que qualquer trabalhador terceirizado manteria vínculo de emprego diretamente ao tomador de serviços, em violação à tese jurídica fixada pelo STF no tema 725 de repercussão geral. Portanto, rechaço de pronto o argumento tecido na inicial e na peça recursal do autor. Em contestação (ID. dfc057a), a ré sustenta que o autor aderiu aos termos e condições da reclamada, passando a utilizar a plataforma para prestar serviços. Defende que apenas fornece um ambiente virtual de aproximação de pessoas com objetivo de conectar entregadores autônomos de clientes que necessitem dos seus serviços, consolidando-se como empresa de tecnologia. Esclarece que o consumidor não realiza avaliações do serviço, mas apenas os solicitantes do frete. Reitera que não tem como atividade econômica a promoção e operacionalização de fretes, mas de fornecimento de tecnologia, disponibilizando aplicativos para smartphones. Pondera que o autor vinculou-se à demandada via CNPJ, mediante sua microempresa individual. Assevera que o autor "NUNCA prestou serviços à Reclamada, o Reclamante contratou os serviços da Loggi, aderindo aos termos da plataforma e o primeiro frete realizado por ele, por intermédio da plataforma Loggi" (contestação - fls. 123). Registra que, por diversos períodos o autor permaneceu sem prestar fretes utilizando o ambiente da Loggi, inclusive não realiza nenhum frete desde agosto de 2022, embora mantenha-se ativo perante a plataforma. A demandada acosta aos autos os termos e condições de uso de sua plataforma (ID. 8edd779), onde indica que a plataforma "tem por finalidade oferecer aos cadastrados ("Usuário") serviços que visam disponibilizar ao Usuário um ambiente virtual que o aproxime de prestadores autônomos ("Condutores autônomos") de serviços de transporte de pequenas cargas, documentos e produtos ("Frete"), por meio das tecnologias e ferramentas disponibilizadas pela Loggi" (item 1.2 - fls. 165). Esclarece que cada "serviço de Frete é contratado diretamente pelo Usuário contratante deste serviços de forma independente, sem que a Loggi participe do contrato de transporte ou por ele se responsabilize" (item 1.3 - fls. 165). Pontuo, ademais, que segundo o item 2.1.1, "Ao se cadastrarem na Plataforma Loggi, os Condutores autônomos declaram e (i) reconhecem que são independentes e autônomos, sem qualquer vínculo empregatício com a Loggi". A reclamada acosta aos autos print de seu site onde esclarece que os entregadores são autônomos e não há exigência de exclusividade, de modo que os motoristas são independentes e tem total liberdade para correr pelas ruas utilizando ou não outros aplicativos (ID. 755ce2a - fls. 186). A prova documental é robusta quanto à forma de constituição da empresa, sua finalidade e a relação autônoma/cível com os entregadores cadastrados na plataforma. Nada obstante, considerando que o contrato de trabalho é um contrato realidade (princípio da primazia da realidade), passo a análise dos depoimentos colhidos no presente feito. Em audiência, o preposto da ré afirma "que o autor era cliente da plataforma ré, recebendo as demandas de transporte de mercadoria via aplicativo, podendo aceitar ou recusar o transporte; que o reclamante recebia o pagamento correspondente a um percentual do valor sendo que o restante permanecia com a plataforma; que a plataforma recebia de 1 a 30% do valor e o reclamante ficava com o restante [...] que o aplicativo não organiza rota de entrega, cabendo ao reclamante fazer esta organização; que não sabe qual era a periodicidade de pagamento feito pela reclamada ao reclamante; que o aplicativo da ré utiliza dados de geolocalização do motorista". Não foi produzida prova oral, sendo colhido o depoimento de Renata tão somente na qualidade de informante. Informa que "para fazer transporte e ter cadastro no aplicativo da ré o entregador precisa ter cadastro de MEI, não sabendo por qual motivo; que o entregador não precisa fazer entrevista para efetuar o seu cadastro, basta enviar documentos; que o entregador precisa possuir veículo próprio; que o entregador pode recusar entregas, pois as ofertas são apontadas no aplicativo, cabendo a ele aceitaram ou não; que ao aceitar ou recusar, antes de fazer a escolha o motorista tem acesso ao valor que vai receber por cada frete e a distância a ser percorrida; que o entregador escolhe o horário e os dias da semana que quer trabalhar; que o entregador pode trabalhar para mais de um aplicativo; que todas as entregas são ofertadas e realizadas pelo aplicativo, nunca por fora do aplicativo; que não sabe o horário de trabalho que o reclamante fazia, nem em quais dias da semana ele trabalhava; que não sabe qual era o valor médio que o reclamante recebia no total no mês, mas ele podia escolher entre receber por semana ou por mês; que não sabe quantas entregas o reclamante fazia por semana ou por mês; que o autor podia simplesmente desligar o aplicativo, não fazer entregas, sem ter o cadastro cancelado ou bloqueado; que não há promessa nem garantia sobre a quantidade de entregas que a reclamada irá ofertar ao entregador; que atualmente há dois pontos de coleta em Porto Alegre, o entregador vai até o ponto de coleta, retira a mercadoria e entrega ao destinatário; que o aplicativo sugere um roteiro a ser efetuado, inclusive se o reclamante retirasse mais de uma mercadoria para entregar a mais de um cliente, mas o entregador não é obrigado a seguir esta rota; que não há a avaliação do entregador, sequer pelo destinatário final; que não sabe qual é o procedimento na hipótese de um motorista extraviar ou danificar alguma mercadoria; que a mercadoria chega no ponto de coleta proveniente de transportes realizados por caminhões da própria reclamada; que as mercadorias são de clientes da reclamada, inclusive Amazon e Mercado Livre, dentre outras; que a própria Loggi inclui no aplicativo as demandas a serem atendidas pelos motoristas; que o entregador tem até às 22 horas do dia da coleta para efetuar a entrega, caso não consiga devolve para o ponto de coleta; que o ponto de coleta tem horário para abrir e para fechar mas não sabe quais são estes horários, porém não trabalha 24 horas; que o tempo de trabalho do entregador é desde o momento em que ele aceita a entrega até realizar esta". Dos elementos dos autos é possível depreender que o autor, mediante abertura de microempresa individual, cadastrou-se no sistema da ré para realizar entregas de encomendas. Não há processo seletivo propriamente dito para admissão, mas qualquer cidadão pode cadastrar-se na plataforma com o preenchimento de seus dados e iniciar imediatamente a realizar as entregas. Mitigado, inclusive, o requisito da pessoalidade. Não está evidenciado nenhum tipo de cobrança para que os entregadores exerçam determinado número de entregas, porém, em sentido oposto, do parco cenário probatório dos autos, alcança-se a conclusão de que o autor detinha autonomia para escolher quais entregas realizar, os dias em que prestaria serviço e a quantidade de entregas que realizaria. Ademais, não pode ser observada a prática de poder diretivo/punitivo pela recorrida. Este Colegiado, em acórdão de lavra da Exma. Desª. Maria Cristina Schaan Ferreira, em julgamento do qual participei, analisou pedido de vínculo de emprego em ação proposta em face da mesma ré. Transcrevo a ementa do julgado: RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. MOTOBOY AUTÔNOMO. APLICATIVO DE ENTREGAS - LOGGI TECNOLOGIA LTDA. Uma vez admitida, pela parte reclamada, a prestação de serviços do reclamante em seu favor, atrai para si o ônus da prova quanto à inexistência de vínculo de emprego na relação havida, nos termos dos arts. 818 da CLT e 373, II, do CPC, encargo do qual se desincumbiu. (TRT da 4ª Região, 6ª Turma, 0020189-18.2023.5.04.0014 ROT, em 09/11/2024, Desembargadora Maria Cristina Schaan Ferreira) No precedente citado, da prova produzida concluiu-se que: [...] o reclamante trabalhava com autonomia, sem que houvesse subordinação à reclamada. Isso porque o próprio reclamante admite que Iniciava a jornada quando se logava e no final do dia se deslogava. Poderia deslogar durante o dia, mas não era recomendado porque poderia sofrer diminuição no recebimento de serviço. Havia a liberdade de inicial mais tarde (ou mais cedo) a jornada, sob pena de diminuição de oferta. Ou seja, o fato de deslogar o aplicativo não estava atrelado ao recebimento de alguma punição, mas na própria quantidade de entregas que seria claramente reduzida. Da mesma forma, não tinha qualquer penalidade para o caso de iniciar mais tarde a prestação de serviços, tendo a mesma consequência. Ainda, o autor declarou que permaneceu um dia sem se logar no aplicativo, sendo que não houve a necessidade de dar justificativa a alguém da empresa, assim como disse claramente que Poderia aceitar ou rejeitar a entrega. Também confirmou que poderia alterar a rota de emprega e Poderia acontecer de o reclamante não cumprir a meta de entrega. Além disso, relatou que A comunicação era via aplicativo com a empresa e haveria contato com o atendente de suporte em caso de insucesso na entrega, mas não sabe onde ficava este atendente. O mencionado contato tinha como objetivo especificar algum detalhe do endereço ou do recebedor, concluindo-se que a orientação do preposto da empresa ("atendente") dizia respeito apenas ao endereço para ser entregue a mercadoria. Por fim, o reclamante disse que a reclamada nunca emitiu nota fiscal, o que vai de encontro aos documentos juntados aos autos no ID cc5235a e seguintes. As declarações da testemunha Clairo Peron, que se mostram imprecisas, pois sequer soube indicar o período exato em que trabalhou para a empresa reclamada, corroboram o mencionado pela preposta da reclamada no sentido de que não havia qualquer controle por parte da reclamada quanto à jornada de trabalho, ao relatar que Não era exigido dia e horário para trabalhar e iam à reclamada pegar os pacotes para fazer a entrega. Além disso, confirmou a afirmação do reclamante de que, conforme chegavam mais cedo, mais entregas poderiam fazer, estando o início ou término da prestação de serviços associados ao interesse do entregador na quantidade de entregas, o que está intrinsecamente relacionado ao valor que perceberiam. Ao final, a testemunha expressamente declarou que A empresa não dizia que o depoente tivesse chegar em determinado horário. Portanto, tem-se que está caracterizado o trabalho autônomo, porque havia a prestação de serviços com liberdade e autonomia, sem qualquer controle ou fiscalização por parte do contratante, nos dias e horários em que melhor convém ao contratado, na forma que desejar, e por sua conta e risco. (TRT da 4ª Região, 6ª Turma, 0020189-18.2023.5.04.0014 ROT, em 09/11/2024, Desembargadora Maria Cristina Schaan Ferreira) O caso ora em análise é muito similar ao exposto acima, de modo que a conclusão mais razoável a ser alcançada, considerando a parca produção probatória neste autos, é de que o autor prestava serviços efetivamente na condição de trabalhador autônomo. No caso, é possível concluir que inexistia processo seletivo para admissão, tampouco controle de horários e de frequência, cobrança por cumprimento de resultados ou aplicação de penalidades. Não é possível observar a subordinação jurídica, sequer de forma diferida, já que os elementos demonstram que o demandante detinha suficiente poder de decisão sobre seu trabalho. Desse modo, ainda que incontroversa a prestação de serviço do reclamante para a reclamada, os elementos probatórios dos autos revelam que esta se deu de forma autônoma, em razão de vínculo de natureza cível, descabendo, portanto, a incidência das normas trabalhistas. Nessa mesma linha, cito o julgamento do recurso ordinário nos autos do processo nº 0020295-75.2023.5.04.0241, de relatoria da Exma. Desª. Ângela Rosi Almeida Chapper, em ação proposta em face da mesma ré, em que não foi reconhecido o vínculo de emprego com o autor, motorista/entregador. Em análogo sentido, cito decisão do Tribunal Superior trabalhista em ação proposta em face da mesma ré (Loggi Tecnologia) discutindo o mesmo pedido (vínculo de emprego): AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017 - RITO SUMARÍSSIMO - LOGGI TECNOLOGIA LTDA. - TRABALHO PRESTADO POR PLATAFORMAS DIGITAIS - INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO DE EMPREGO - TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA O trabalho desempenhado pelas plataformas digitais não cumpre os requisitos dos artigos 2º e 3º da CLT, não havendo vínculo de emprego entre os trabalhadores e a respectiva plataforma. Julgados de Turmas desta Eg. Corte Superior. Agravo de Instrumento a que se nega provimento" (AIRR-10689-80.2022.5.03.0016, 4ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 20/10/2023). Diante do exposto, coaduno com o entendimento declinado em sentença pelo Juízo de origem, razão pela qual nego provimento ao recurso ordinário do autor." Admito o recurso de revista no item. No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, são identificadas decisões que reconhecem o vínculo de emprego entre o motorista de aplicativo e a plataforma digital, por considerarem configurada a subordinação, reformando decisões regionais que haviam entendido pela não demonstração dos requisitos da relação de emprego. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO - MOTORISTA DE APLICATIVO - EMPRESA-PLATAFORMA DIGITAL - PRESENÇA DE ELEMENTOS FÁTICO-JURÍDICOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 2º E 3º DA CLT - REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. No presente caso, o Tribunal Regional entendeu que estava ausente a subordinação jurídica e, em razão disto, não reconheceu a relação de emprego entre as partes. A conclusão adotada levou em consideração, especialmente, as seguintes premissas fáticas, todas consignadas no acórdão recorrido: (i) "As declarações prestadas pelo autor evidenciam que ele detinha inteira autonomia para estabelecer sua jornada de trabalho, desenvolvendo sua atividade no interesse e conveniência própria. Ele podia trabalhar quando bem entendesse, recusar e cancelar viagens, sem que haja notícia de aplicação de qualquer punição por parte da reclamada"; (ii) "ao autor incumbia inteiramente dispor sobre sua meta e produtividade periódicas, constatando-se, ainda, que ele era remunerado pelo usuário e não pela demandada"; e (iii) "Não se verifica, por outro lado, a efetiva fiscalização de sua rotina laboral ou da qualidade de trabalho pelo reclamado, sendo que a avaliação do serviço prestado estava a cargo dos usuários". A decisão monocrática entendeu que "o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício", reformando o acórdão regional e reconhecendo o vínculo de emprego entre reclamante e reclamada. Como destacado na decisão agravada, o quadro fático consignado pelo TRT permite a esta Corte fazer o reenquadramento jurídico para reconhecer o vínculo de emprego vindicado, sem que se cogite do óbice previsto na Súmula/TST nº 126. Isso porque, a decisão, tal como prolatada, contraria precedente recente desta 2ª Turma, no sentido de que o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício. Nesse sentido, cite-se nova modalidade de subordinação, denominada " subordinação pelo algoritmo ", que está presente no citado modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo. Agravo interno a que se nega provimento" (Ag-RR-10021-05.2022.5.03.0180, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 18/10/2024). Exemplificativamente, também reformando acórdão regional sobre o tema: RR-100353-02.2017.5.01.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 11/04/2022; RR-1000764-25.2021.5.02.0301, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 15/09/2023. Por outro lado, são encontrados acórdãos, no mesmo Tribunal Superior, com entendimento diverso, no sentido de que o trabalho realizado nesses moldes não acarreta o reconhecimento de relação de emprego, destacando que não restaria constatada a subordinação. Nessa linha: "DIREITO DO TRABALHO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. A questão jurídica que envolve o reconhecimento de vínculo de emprego de motorista de aplicativo tem transcendência jurídica. 2. A tese recursal independe do revolvimento de fatos e provas, na medida em que o vínculo empregatício foi reconhecido com base em subordinação algorítmica ou estrutural, tese que tem sido reiteradamente afastada pelo Supremo Tribunal Federal. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL OU ALGORÍTMICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A questão debatida nos autos diz respeito à natureza da relação jurídica que se forma entre empresas que exploram plataformas digitais e motoristas ou entregadores que se utilizam da tecnologia do aplicativo. 2. O Tribunal Regional reconheceu o vínculo empregatício fundamentado exclusivamente na existência de uma subordinação algorítmica, pois o trabalhador teria sua atividade controlada e fiscalizada por meio de sistemas de inteligência artificial. 3. A relação jurídica que envolve os motoristas de aplicativo e as empresas que gerem as plataformas digitais é fruto da revolução tecnológica que promove novas formas de prestação de serviços e novos formatos contratuais, muitas das quais ainda carecem de uma regulamentação legal específica. 4. A chamada subordinação algorítmica não encontra agasalho na ordem jurídica vigente e esse novo modelo contratual que envolve motoristas de aplicativos e empresas provedoras de plataformas digitais não se enquadra no modelo empregatício regulamentado pela Consolidação das Leis do Trabalho. 5. A observância de regras de conduta é inerente a qualquer modalidade contratual e ínsita a qualquer atividade profissional, seja ela subordinada ou não, de modo que as circunstâncias fáticas registradas no acórdão regional (impossibilidade de o motorista ditar o preço do serviço e a necessidade de observar regras de conduta) não são suficientes para caracterizar a relação empregatícia. 6. Não se desconhece a notória necessidade de proteção jurídica aos motoristas de aplicativo, porém, tal desiderato protetivo deve ser alcançado via legislativa, nada justificando trazê-los ao abrigo de uma relação de emprego que não foi pactuada. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-462-04.2022.5.13.0032, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 19/11/2024). Com posicionamento análogo: RRAg-0010190-80.2023.5.03.0107, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 21/11/2024; RRAg-1001341-61.2022.5.02.0044, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 28/10/2024; RRAg-1000446-50.2018.5.02.0009, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 18/03/2024. Além da controvérsia jurídica constatada, cabe destacar que a presente questão ainda será analisada pelo Supremo Tribunal Federal, em razão do Tema 1.291 de Repercussão Geral "Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 1º, IV; 5º, II, XIII; e 170, IV, da Constituição Federal, a possibilidade do reconhecimento de vínculo de emprego entre motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa criadora e administradora da plataforma digital intermediadora". Diante do quadro posto, e em se tratando de matéria que ainda pende de uniformização jurisprudencial, dá-se seguimento ao recurso de revista por possível afronta ao artigo 3º da CLT, com base no art. 896, alínea 'c', da CLT. 2.1 DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO (8826) / PARTES E PROCURADORES (8842) / SUCUMBÊNCIA (8874) / HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Não admito o recurso de revista no item. Em 12/12/2018, o Pleno deste TRT4 decidiu, por maioria, acolher parcialmente a arguição formulada nos autos do processo n. 0020024-05.2018.5.04.0124 para declarar incidentalmente a inconstitucionalidade da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa ", constante do § 4º do art. 791-A da CLT, com redação da Lei 13.467 de 13.07.2017. Posteriormente, no julgamento da ADI n. 5766 (ata de julgamento publicada em 05/11/2021, acórdão publicado em 03/05/2022), o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o art. 791-A, § 4º, da CLT, confirmando a diretriz constitucional adotada por este TRT4. No julgamento dos Embargos Declaratórios opostos pelo Advogado-Geral da União ao acórdão prolatado pelo STF na ADI n. 5766, publicado em 29/06/2022, esclareceu o Exmo. Ministro Relator que o comando de seu voto está estritamente limitado pelo teor do pedido formulado pelo Procurador-Geral da República, o qual se limitou a postular a declaração de inconstitucionalidade "da expressão 'desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa," do § 4 o do art. 791-A da CLT ". Assim, conclui-se que a declaração de inconstitucionalidade veiculada no julgamento da ADI n. 5766 se restringe apenas à expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa ," constante do § 4º do art. 791-A da CLT, exatamente como fixado por este TRT4 na Arguição de Inconstitucionalidade Incidental formulada no processo n. 0020024-05.2018.5.04.0124. Estando a decisão recorrida em consonância com a posição do Supremo Tribunal Federal, intérprete final da Constituição Federal, e com base no art. 102, § 2º, da Constituição da República, não se verifica violação constitucional ou legal. Nego seguimento. CONCLUSÃO Admito parcialmente o recurso. Intimem-se, inclusive a parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal quanto aos tópicos admitidos. (smz) PORTO ALEGRE/RS, 25 de maio de 2025. ALEXANDRE CORREA DA CRUZ Desembargador Federal do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - LOGGI TECNOLOGIA LTDA.

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Douglas Fernandes Ramires x Loggi Tecnologia Ltda.

ID: 280037694

Tribunal: TRT4 Órgão: OJ de Análise de Recurso Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0021095-90.2023.5.04.0019

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

DOUGLAS FERNANDES RAMIRES

Polo Passivo:

LOGGI TECNOLOGIA LTDA.

Notificação

Advogados:

ODILON MARQUES GARCIA JUNIOR

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

IVONE DA FONSECA GARCIA

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

GUSTAVO HENRIQUE DOS SANTOS VISEU

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: FERNANDO LUIZ DE MOURA CASSAL 0021095-90.2023.5.04.0019 : DOUGLAS FERNANDES R… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: FERNANDO LUIZ DE MOURA CASSAL 0021095-90.2023.5.04.0019 : DOUGLAS FERNANDES RAMIRES : LOGGI TECNOLOGIA LTDA. INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID f45138a proferida nos autos. 0021095-90.2023.5.04.0019 - 6ª TurmaRecorrente(s): 1. DOUGLAS FERNANDES RAMIRES Recorrido(a)(s): 1. LOGGI TECNOLOGIA LTDA. RECURSO DE: DOUGLAS FERNANDES RAMIRES PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Recurso tempestivo (decisão publicada em 31/03/2025 - Id a76d6d8; recurso apresentado em 10/04/2025 - Id 4ec0a00). Representação processual regular (id 00b5aca). Preparo dispensado (id 01b37aa). PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS 1.1 DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO (13707) / RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: "1. Vínculo de emprego. Trabalho em plataforma digital. O autor sustenta que a relação mantida com a ré caracteriza-se como empregatícia, ante a presença de pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica, embora não formalizada. Pontua que a recorrida não nega a prestação de serviços, reconhecendo o período narrado na inicial, nada obstante defenda que a relação entre as partes é de prestação de serviços autônomos. Sustenta que a ré encaminhava as atividades a ser realizadas, além de cobrar resultados e metas e aduz que a prestação de serviços era exclusiva. Requer, por conseguinte, o reconhecimento do vínculo de emprego, com a determinação do retorno dos autos ao Juízo de origem para que julgue os consectários. Ao exame. Neste particular, o Juízo de origem assim fundamentou sua decisão: De todo modo, o Supremo Tribunal Federal afastou a ilicitude da terceirização na atividade-fim (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 324 e Recurso Extraordinário n. 958252, julgados em 30/8/2018, com repercussão geral reconhecida), no seguinte sentido (ADPF n. 324): O Tribunal, no mérito, por maioria e nos termos do voto do Relator, julgou procedente o pedido e firmou a seguinte tese: 1. É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada. 2. Na terceirização, compete à contratante: i) verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada; e ii) responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias, na forma do art. 31 da Lei 8.212/1993, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Nesta assentada, o Relator esclareceu que a presente decisão não afeta automaticamente os processos em relação aos quais tenha havido coisa julgada. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 30.8.2018. (grifei em negrito) Posto isso, segundo os ensinamentos do mestre Maurício Godinho Delgado (Curso de Direito do Trabalho, 13ª ed. Ltr, 2014, p. 291) "os elementos fático-jurídicos componentes da relação de emprego são cinco: a) prestação de trabalho por pessoa física a um tomador qualquer; b) prestação efetuada com pessoalidade pelo trabalhador; c) também efetuada com não eventualidade; d) efetuada ainda sob subordinação ao tomador dos serviços; e) prestação de trabalho efetuada com onerosidade". A questão principal reside na existência ou não de subordinação entre o motorista-entregador de aplicativo e a plataforma digital. No que toca especificamente à subordinação, esta incide sobre o modo da prestação dos serviços e se caracteriza por ordens emanadas do tomador com repetição, continuidade e intensidade tais que o trabalhador deixe de deter a decisão e a gerência sobre a direção central e cotidiana do seu labor. Posto isso, em que pese a condição em que foi ouvida a depoente indicada pela ré, vejo que as suas alegações encontram respaldo na prova , notadamente no que toca à forma de atuação documental (fls. 165-82) pelo aplicativo da ré, revelando que a parte autora detinha plena autonomia na prestação dos serviços, notadamente porque: a) ficava a critério do entregador os horários de início e de término da prestação de serviços e os dias de folgas, sem necessidade de informar ou justificar os períodos de repouso para a ré; b) o entregador poderia desligar o aplicativo a qualquer momento, negar a realização de entrega ou não fazer a entrega, independentemente de autorização, sem qualquer penalidade por esses fatos; c) o entregador poderia alterar a rota definida pelo aplicativo, o que também é informado na cláusula 5.1.2 do contrato de adesão e termos de uso (fl. 172); d) não havia exigência quanto ao número mínimo de entregas diárias, nem metas de atendimento, dando ênfase, neste ponto, que a não utilização do aplicativo por longo período sequer implicava no bloqueio automático do perfil do entregador; e) o entregador poderia utilizar outras plataformas de serviços de entrega de mercadorias; f) o motorista não recebia ordens diretas ou indiretas de nenhum funcionário da ré, nem era fiscalizado por qualquer preposto da demandada, sequer a título de prestação de contas ou sobre o resultado comercial da prestação dos serviços. Não bastasse, a parte autora arcava com praticamente todo o custo operacional da atividade, pois era o transportador quem pagava as despesas com a manutenção, limpeza (lavagem), seguro e combustível do veículo (item 3 da fundamentação da inicial, fl. 8), cabendo à ré apenas as despesas com a disponibilização da plataforma digital. Esta forma de contratação, na qual a parte trabalhadora absorve todo o custo operacional, é típica de parceria comercial. Noutro quadrante, o pagamento era efetuado pelos solicitantes das entregas na proporção em que os serviços eram executados, com valor variável e consentâneo com o serviço realizado, com repasse à demandada de apenas 1% a 30% da quantia paga pelos solicitantes. O fato de o preço da corrida ser previamente estipulado pela demandada não é suficiente para caracterizar a subordinação jurídica, uma vez que o entregador poderia recusar a corrida. De todo modo, os valores eram fixados com base na distância de deslocamento, assim como ocorre com as tarifas de táxis, que são , sendo que estes meios de transporte, apuradas por taxímetro à evidência, são conduzidos por motoristas profissionais autônomos. Também não havia avaliação do entregador, sequer pelo destinatário da mercadoria. Além disso, não havia processo seletivo para a escolha do motorista ou entrevista, bastando simples cadastro, envio de documentos e identificação do transportador por questões de segurança (foto do motorista, CNH e documento do veículo). O contato com os destinatários da entrega por intermédio do aplicativo (fl. 83) e a apuração de problemas no frete (fl. 85) ocorrem em qualquer tipo de contrato de natureza civil, pois os adquirentes do serviço desejam receber as mercadorias da forma mais rápida possível e sem intercorrências. Com esses argumentos, entendo que a parte autora atuou sem subordinação jurídica, pois ela detinha autonomia na prestação dos serviços e o pagamento era efetuado pelos solicitantes dos fretes (fls. 27-72), o que afasta a existência de relação jurídica de emprego pretendida neste feito. Mesmo que assim não se entenda, a forma de atuação do autor, arcando com os custos da sua prestação de serviços, sendo remunerado por frete e com atuação nos dias e horários que o próprio autor desejava laborar, indica a prestação de serviços na condição de transportador autônomo de carga, o que por igual afasta a existência de relação de emprego entre as partes, na esteira da decisão proferida pela Suprema Corte na ADC nº. 48. Julgo , assim, o pedido de declaração improcedente da existência de relação jurídica de emprego entre as partes (alínea a, parte inicial, do rol de pleitos - fl. 15). Ainda, por consequência lógica, na medida em que as demais pretensões formuladas na peça de ingresso são decorrentes da suposta existência de vínculo de emprego, julgo improcedentes os pedidos articulados nas alíneas a, parte final, do rol de pleitos (fl. 15), e alíneas b a h do rol de pleitos (fls. 15-6). Para que se reconheça o vínculo de emprego, necessária a prova dos requisitos elencados nos artigos 2º e 3º da CLT, quais sejam: pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação. Em especial, é necessária a prova da existência de trabalho subordinado, visto que, se assim não fosse, seria impossível distinguir o contrato de emprego de outros que possuem o mesmo objeto - trabalho. A subordinação é imprescindível para que se configure a relação de emprego e, como elemento tipificador do contrato de trabalho, consiste na atuação do empregador em dar a ordem (comando), acompanhar o cumprimento da ordem (controle) e punir o empregado pelo descumprimento da ordem (fiscalização). Pela distribuição do ônus da prova, quando negada a prestação de serviços incumbe ao autor o ônus de demonstrar os elementos caracterizadores do pacto laboral, fatos constitutivos do seu direito. A contrario sensu, admitida a prestação, mas negada a relação jurídica de emprego, inverte-se o onus probandi, que passa a ser do empregador, a teor dos artigos 818 da CLT e 373, II, do CPC. Na inicial (ID. e2486c6), o autor sustenta que estava vinculado a moderna modalidade de emprego, encontrando-se inserido na estrutura produtiva da empresa, de modo a se encontrar presente a subordinação estrutural. Além disso, afirma que os motoristas/entregadores se reuniam com os representantes da empresa para receberem instruções, recebendo avaliações dos consumidores como meio de fiscalização pelo empregador. Indica, também, que quando houvesse a prática de equívocos, como entrega de encomenda a terceiros, o motorista/entregador recebia penalidades, até mesmo resultando no seu bloqueio na plataforma digital. Ressalto que para a caracterização da relação de emprego faz-se necessária a presença da subordinação jurídica, não havendo falar em vínculo de emprego quando caracterizada apenas a subordinação estrutural. A participação do trabalhador autônomo na dinâmica produtiva do empreendimento, sem submeter-se ao poder diretivo do empregador, afasta o enquadramento da relação havida entre as partes no que dispõe os arts. 2º e 3º da CLT. Ademais, a aplicação da teoria da subordinação estrutural traria a conclusão de que qualquer trabalhador terceirizado manteria vínculo de emprego diretamente ao tomador de serviços, em violação à tese jurídica fixada pelo STF no tema 725 de repercussão geral. Portanto, rechaço de pronto o argumento tecido na inicial e na peça recursal do autor. Em contestação (ID. dfc057a), a ré sustenta que o autor aderiu aos termos e condições da reclamada, passando a utilizar a plataforma para prestar serviços. Defende que apenas fornece um ambiente virtual de aproximação de pessoas com objetivo de conectar entregadores autônomos de clientes que necessitem dos seus serviços, consolidando-se como empresa de tecnologia. Esclarece que o consumidor não realiza avaliações do serviço, mas apenas os solicitantes do frete. Reitera que não tem como atividade econômica a promoção e operacionalização de fretes, mas de fornecimento de tecnologia, disponibilizando aplicativos para smartphones. Pondera que o autor vinculou-se à demandada via CNPJ, mediante sua microempresa individual. Assevera que o autor "NUNCA prestou serviços à Reclamada, o Reclamante contratou os serviços da Loggi, aderindo aos termos da plataforma e o primeiro frete realizado por ele, por intermédio da plataforma Loggi" (contestação - fls. 123). Registra que, por diversos períodos o autor permaneceu sem prestar fretes utilizando o ambiente da Loggi, inclusive não realiza nenhum frete desde agosto de 2022, embora mantenha-se ativo perante a plataforma. A demandada acosta aos autos os termos e condições de uso de sua plataforma (ID. 8edd779), onde indica que a plataforma "tem por finalidade oferecer aos cadastrados ("Usuário") serviços que visam disponibilizar ao Usuário um ambiente virtual que o aproxime de prestadores autônomos ("Condutores autônomos") de serviços de transporte de pequenas cargas, documentos e produtos ("Frete"), por meio das tecnologias e ferramentas disponibilizadas pela Loggi" (item 1.2 - fls. 165). Esclarece que cada "serviço de Frete é contratado diretamente pelo Usuário contratante deste serviços de forma independente, sem que a Loggi participe do contrato de transporte ou por ele se responsabilize" (item 1.3 - fls. 165). Pontuo, ademais, que segundo o item 2.1.1, "Ao se cadastrarem na Plataforma Loggi, os Condutores autônomos declaram e (i) reconhecem que são independentes e autônomos, sem qualquer vínculo empregatício com a Loggi". A reclamada acosta aos autos print de seu site onde esclarece que os entregadores são autônomos e não há exigência de exclusividade, de modo que os motoristas são independentes e tem total liberdade para correr pelas ruas utilizando ou não outros aplicativos (ID. 755ce2a - fls. 186). A prova documental é robusta quanto à forma de constituição da empresa, sua finalidade e a relação autônoma/cível com os entregadores cadastrados na plataforma. Nada obstante, considerando que o contrato de trabalho é um contrato realidade (princípio da primazia da realidade), passo a análise dos depoimentos colhidos no presente feito. Em audiência, o preposto da ré afirma "que o autor era cliente da plataforma ré, recebendo as demandas de transporte de mercadoria via aplicativo, podendo aceitar ou recusar o transporte; que o reclamante recebia o pagamento correspondente a um percentual do valor sendo que o restante permanecia com a plataforma; que a plataforma recebia de 1 a 30% do valor e o reclamante ficava com o restante [...] que o aplicativo não organiza rota de entrega, cabendo ao reclamante fazer esta organização; que não sabe qual era a periodicidade de pagamento feito pela reclamada ao reclamante; que o aplicativo da ré utiliza dados de geolocalização do motorista". Não foi produzida prova oral, sendo colhido o depoimento de Renata tão somente na qualidade de informante. Informa que "para fazer transporte e ter cadastro no aplicativo da ré o entregador precisa ter cadastro de MEI, não sabendo por qual motivo; que o entregador não precisa fazer entrevista para efetuar o seu cadastro, basta enviar documentos; que o entregador precisa possuir veículo próprio; que o entregador pode recusar entregas, pois as ofertas são apontadas no aplicativo, cabendo a ele aceitaram ou não; que ao aceitar ou recusar, antes de fazer a escolha o motorista tem acesso ao valor que vai receber por cada frete e a distância a ser percorrida; que o entregador escolhe o horário e os dias da semana que quer trabalhar; que o entregador pode trabalhar para mais de um aplicativo; que todas as entregas são ofertadas e realizadas pelo aplicativo, nunca por fora do aplicativo; que não sabe o horário de trabalho que o reclamante fazia, nem em quais dias da semana ele trabalhava; que não sabe qual era o valor médio que o reclamante recebia no total no mês, mas ele podia escolher entre receber por semana ou por mês; que não sabe quantas entregas o reclamante fazia por semana ou por mês; que o autor podia simplesmente desligar o aplicativo, não fazer entregas, sem ter o cadastro cancelado ou bloqueado; que não há promessa nem garantia sobre a quantidade de entregas que a reclamada irá ofertar ao entregador; que atualmente há dois pontos de coleta em Porto Alegre, o entregador vai até o ponto de coleta, retira a mercadoria e entrega ao destinatário; que o aplicativo sugere um roteiro a ser efetuado, inclusive se o reclamante retirasse mais de uma mercadoria para entregar a mais de um cliente, mas o entregador não é obrigado a seguir esta rota; que não há a avaliação do entregador, sequer pelo destinatário final; que não sabe qual é o procedimento na hipótese de um motorista extraviar ou danificar alguma mercadoria; que a mercadoria chega no ponto de coleta proveniente de transportes realizados por caminhões da própria reclamada; que as mercadorias são de clientes da reclamada, inclusive Amazon e Mercado Livre, dentre outras; que a própria Loggi inclui no aplicativo as demandas a serem atendidas pelos motoristas; que o entregador tem até às 22 horas do dia da coleta para efetuar a entrega, caso não consiga devolve para o ponto de coleta; que o ponto de coleta tem horário para abrir e para fechar mas não sabe quais são estes horários, porém não trabalha 24 horas; que o tempo de trabalho do entregador é desde o momento em que ele aceita a entrega até realizar esta". Dos elementos dos autos é possível depreender que o autor, mediante abertura de microempresa individual, cadastrou-se no sistema da ré para realizar entregas de encomendas. Não há processo seletivo propriamente dito para admissão, mas qualquer cidadão pode cadastrar-se na plataforma com o preenchimento de seus dados e iniciar imediatamente a realizar as entregas. Mitigado, inclusive, o requisito da pessoalidade. Não está evidenciado nenhum tipo de cobrança para que os entregadores exerçam determinado número de entregas, porém, em sentido oposto, do parco cenário probatório dos autos, alcança-se a conclusão de que o autor detinha autonomia para escolher quais entregas realizar, os dias em que prestaria serviço e a quantidade de entregas que realizaria. Ademais, não pode ser observada a prática de poder diretivo/punitivo pela recorrida. Este Colegiado, em acórdão de lavra da Exma. Desª. Maria Cristina Schaan Ferreira, em julgamento do qual participei, analisou pedido de vínculo de emprego em ação proposta em face da mesma ré. Transcrevo a ementa do julgado: RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. MOTOBOY AUTÔNOMO. APLICATIVO DE ENTREGAS - LOGGI TECNOLOGIA LTDA. Uma vez admitida, pela parte reclamada, a prestação de serviços do reclamante em seu favor, atrai para si o ônus da prova quanto à inexistência de vínculo de emprego na relação havida, nos termos dos arts. 818 da CLT e 373, II, do CPC, encargo do qual se desincumbiu. (TRT da 4ª Região, 6ª Turma, 0020189-18.2023.5.04.0014 ROT, em 09/11/2024, Desembargadora Maria Cristina Schaan Ferreira) No precedente citado, da prova produzida concluiu-se que: [...] o reclamante trabalhava com autonomia, sem que houvesse subordinação à reclamada. Isso porque o próprio reclamante admite que Iniciava a jornada quando se logava e no final do dia se deslogava. Poderia deslogar durante o dia, mas não era recomendado porque poderia sofrer diminuição no recebimento de serviço. Havia a liberdade de inicial mais tarde (ou mais cedo) a jornada, sob pena de diminuição de oferta. Ou seja, o fato de deslogar o aplicativo não estava atrelado ao recebimento de alguma punição, mas na própria quantidade de entregas que seria claramente reduzida. Da mesma forma, não tinha qualquer penalidade para o caso de iniciar mais tarde a prestação de serviços, tendo a mesma consequência. Ainda, o autor declarou que permaneceu um dia sem se logar no aplicativo, sendo que não houve a necessidade de dar justificativa a alguém da empresa, assim como disse claramente que Poderia aceitar ou rejeitar a entrega. Também confirmou que poderia alterar a rota de emprega e Poderia acontecer de o reclamante não cumprir a meta de entrega. Além disso, relatou que A comunicação era via aplicativo com a empresa e haveria contato com o atendente de suporte em caso de insucesso na entrega, mas não sabe onde ficava este atendente. O mencionado contato tinha como objetivo especificar algum detalhe do endereço ou do recebedor, concluindo-se que a orientação do preposto da empresa ("atendente") dizia respeito apenas ao endereço para ser entregue a mercadoria. Por fim, o reclamante disse que a reclamada nunca emitiu nota fiscal, o que vai de encontro aos documentos juntados aos autos no ID cc5235a e seguintes. As declarações da testemunha Clairo Peron, que se mostram imprecisas, pois sequer soube indicar o período exato em que trabalhou para a empresa reclamada, corroboram o mencionado pela preposta da reclamada no sentido de que não havia qualquer controle por parte da reclamada quanto à jornada de trabalho, ao relatar que Não era exigido dia e horário para trabalhar e iam à reclamada pegar os pacotes para fazer a entrega. Além disso, confirmou a afirmação do reclamante de que, conforme chegavam mais cedo, mais entregas poderiam fazer, estando o início ou término da prestação de serviços associados ao interesse do entregador na quantidade de entregas, o que está intrinsecamente relacionado ao valor que perceberiam. Ao final, a testemunha expressamente declarou que A empresa não dizia que o depoente tivesse chegar em determinado horário. Portanto, tem-se que está caracterizado o trabalho autônomo, porque havia a prestação de serviços com liberdade e autonomia, sem qualquer controle ou fiscalização por parte do contratante, nos dias e horários em que melhor convém ao contratado, na forma que desejar, e por sua conta e risco. (TRT da 4ª Região, 6ª Turma, 0020189-18.2023.5.04.0014 ROT, em 09/11/2024, Desembargadora Maria Cristina Schaan Ferreira) O caso ora em análise é muito similar ao exposto acima, de modo que a conclusão mais razoável a ser alcançada, considerando a parca produção probatória neste autos, é de que o autor prestava serviços efetivamente na condição de trabalhador autônomo. No caso, é possível concluir que inexistia processo seletivo para admissão, tampouco controle de horários e de frequência, cobrança por cumprimento de resultados ou aplicação de penalidades. Não é possível observar a subordinação jurídica, sequer de forma diferida, já que os elementos demonstram que o demandante detinha suficiente poder de decisão sobre seu trabalho. Desse modo, ainda que incontroversa a prestação de serviço do reclamante para a reclamada, os elementos probatórios dos autos revelam que esta se deu de forma autônoma, em razão de vínculo de natureza cível, descabendo, portanto, a incidência das normas trabalhistas. Nessa mesma linha, cito o julgamento do recurso ordinário nos autos do processo nº 0020295-75.2023.5.04.0241, de relatoria da Exma. Desª. Ângela Rosi Almeida Chapper, em ação proposta em face da mesma ré, em que não foi reconhecido o vínculo de emprego com o autor, motorista/entregador. Em análogo sentido, cito decisão do Tribunal Superior trabalhista em ação proposta em face da mesma ré (Loggi Tecnologia) discutindo o mesmo pedido (vínculo de emprego): AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017 - RITO SUMARÍSSIMO - LOGGI TECNOLOGIA LTDA. - TRABALHO PRESTADO POR PLATAFORMAS DIGITAIS - INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO DE EMPREGO - TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA O trabalho desempenhado pelas plataformas digitais não cumpre os requisitos dos artigos 2º e 3º da CLT, não havendo vínculo de emprego entre os trabalhadores e a respectiva plataforma. Julgados de Turmas desta Eg. Corte Superior. Agravo de Instrumento a que se nega provimento" (AIRR-10689-80.2022.5.03.0016, 4ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 20/10/2023). Diante do exposto, coaduno com o entendimento declinado em sentença pelo Juízo de origem, razão pela qual nego provimento ao recurso ordinário do autor." Admito o recurso de revista no item. No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, são identificadas decisões que reconhecem o vínculo de emprego entre o motorista de aplicativo e a plataforma digital, por considerarem configurada a subordinação, reformando decisões regionais que haviam entendido pela não demonstração dos requisitos da relação de emprego. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECONHECIMENTO DE RELAÇÃO DE EMPREGO - MOTORISTA DE APLICATIVO - EMPRESA-PLATAFORMA DIGITAL - PRESENÇA DE ELEMENTOS FÁTICO-JURÍDICOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 2º E 3º DA CLT - REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. No presente caso, o Tribunal Regional entendeu que estava ausente a subordinação jurídica e, em razão disto, não reconheceu a relação de emprego entre as partes. A conclusão adotada levou em consideração, especialmente, as seguintes premissas fáticas, todas consignadas no acórdão recorrido: (i) "As declarações prestadas pelo autor evidenciam que ele detinha inteira autonomia para estabelecer sua jornada de trabalho, desenvolvendo sua atividade no interesse e conveniência própria. Ele podia trabalhar quando bem entendesse, recusar e cancelar viagens, sem que haja notícia de aplicação de qualquer punição por parte da reclamada"; (ii) "ao autor incumbia inteiramente dispor sobre sua meta e produtividade periódicas, constatando-se, ainda, que ele era remunerado pelo usuário e não pela demandada"; e (iii) "Não se verifica, por outro lado, a efetiva fiscalização de sua rotina laboral ou da qualidade de trabalho pelo reclamado, sendo que a avaliação do serviço prestado estava a cargo dos usuários". A decisão monocrática entendeu que "o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício", reformando o acórdão regional e reconhecendo o vínculo de emprego entre reclamante e reclamada. Como destacado na decisão agravada, o quadro fático consignado pelo TRT permite a esta Corte fazer o reenquadramento jurídico para reconhecer o vínculo de emprego vindicado, sem que se cogite do óbice previsto na Súmula/TST nº 126. Isso porque, a decisão, tal como prolatada, contraria precedente recente desta 2ª Turma, no sentido de que o modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo (gamificação) exige uma releitura dos requisitos da relação de emprego, à luz dos novos arranjos produtivos, que passa ao largo da conceituação clássica e tradicional considerada pela decisão recorrida para afastar o vínculo empregatício. Nesse sentido, cite-se nova modalidade de subordinação, denominada " subordinação pelo algoritmo ", que está presente no citado modelo de gestão do trabalho de empresas de plataforma-aplicativo. Agravo interno a que se nega provimento" (Ag-RR-10021-05.2022.5.03.0180, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 18/10/2024). Exemplificativamente, também reformando acórdão regional sobre o tema: RR-100353-02.2017.5.01.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 11/04/2022; RR-1000764-25.2021.5.02.0301, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 15/09/2023. Por outro lado, são encontrados acórdãos, no mesmo Tribunal Superior, com entendimento diverso, no sentido de que o trabalho realizado nesses moldes não acarreta o reconhecimento de relação de emprego, destacando que não restaria constatada a subordinação. Nessa linha: "DIREITO DO TRABALHO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. A questão jurídica que envolve o reconhecimento de vínculo de emprego de motorista de aplicativo tem transcendência jurídica. 2. A tese recursal independe do revolvimento de fatos e provas, na medida em que o vínculo empregatício foi reconhecido com base em subordinação algorítmica ou estrutural, tese que tem sido reiteradamente afastada pelo Supremo Tribunal Federal. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. MOTORISTA DE APLICATIVO. ENTREGADOR. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL OU ALGORÍTMICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A questão debatida nos autos diz respeito à natureza da relação jurídica que se forma entre empresas que exploram plataformas digitais e motoristas ou entregadores que se utilizam da tecnologia do aplicativo. 2. O Tribunal Regional reconheceu o vínculo empregatício fundamentado exclusivamente na existência de uma subordinação algorítmica, pois o trabalhador teria sua atividade controlada e fiscalizada por meio de sistemas de inteligência artificial. 3. A relação jurídica que envolve os motoristas de aplicativo e as empresas que gerem as plataformas digitais é fruto da revolução tecnológica que promove novas formas de prestação de serviços e novos formatos contratuais, muitas das quais ainda carecem de uma regulamentação legal específica. 4. A chamada subordinação algorítmica não encontra agasalho na ordem jurídica vigente e esse novo modelo contratual que envolve motoristas de aplicativos e empresas provedoras de plataformas digitais não se enquadra no modelo empregatício regulamentado pela Consolidação das Leis do Trabalho. 5. A observância de regras de conduta é inerente a qualquer modalidade contratual e ínsita a qualquer atividade profissional, seja ela subordinada ou não, de modo que as circunstâncias fáticas registradas no acórdão regional (impossibilidade de o motorista ditar o preço do serviço e a necessidade de observar regras de conduta) não são suficientes para caracterizar a relação empregatícia. 6. Não se desconhece a notória necessidade de proteção jurídica aos motoristas de aplicativo, porém, tal desiderato protetivo deve ser alcançado via legislativa, nada justificando trazê-los ao abrigo de uma relação de emprego que não foi pactuada. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-462-04.2022.5.13.0032, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 19/11/2024). Com posicionamento análogo: RRAg-0010190-80.2023.5.03.0107, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 21/11/2024; RRAg-1001341-61.2022.5.02.0044, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 28/10/2024; RRAg-1000446-50.2018.5.02.0009, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 18/03/2024. Além da controvérsia jurídica constatada, cabe destacar que a presente questão ainda será analisada pelo Supremo Tribunal Federal, em razão do Tema 1.291 de Repercussão Geral "Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 1º, IV; 5º, II, XIII; e 170, IV, da Constituição Federal, a possibilidade do reconhecimento de vínculo de emprego entre motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa criadora e administradora da plataforma digital intermediadora". Diante do quadro posto, e em se tratando de matéria que ainda pende de uniformização jurisprudencial, dá-se seguimento ao recurso de revista por possível afronta ao artigo 3º da CLT, com base no art. 896, alínea 'c', da CLT. 2.1 DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO (8826) / PARTES E PROCURADORES (8842) / SUCUMBÊNCIA (8874) / HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Não admito o recurso de revista no item. Em 12/12/2018, o Pleno deste TRT4 decidiu, por maioria, acolher parcialmente a arguição formulada nos autos do processo n. 0020024-05.2018.5.04.0124 para declarar incidentalmente a inconstitucionalidade da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa ", constante do § 4º do art. 791-A da CLT, com redação da Lei 13.467 de 13.07.2017. Posteriormente, no julgamento da ADI n. 5766 (ata de julgamento publicada em 05/11/2021, acórdão publicado em 03/05/2022), o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o art. 791-A, § 4º, da CLT, confirmando a diretriz constitucional adotada por este TRT4. No julgamento dos Embargos Declaratórios opostos pelo Advogado-Geral da União ao acórdão prolatado pelo STF na ADI n. 5766, publicado em 29/06/2022, esclareceu o Exmo. Ministro Relator que o comando de seu voto está estritamente limitado pelo teor do pedido formulado pelo Procurador-Geral da República, o qual se limitou a postular a declaração de inconstitucionalidade "da expressão 'desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa," do § 4 o do art. 791-A da CLT ". Assim, conclui-se que a declaração de inconstitucionalidade veiculada no julgamento da ADI n. 5766 se restringe apenas à expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa ," constante do § 4º do art. 791-A da CLT, exatamente como fixado por este TRT4 na Arguição de Inconstitucionalidade Incidental formulada no processo n. 0020024-05.2018.5.04.0124. Estando a decisão recorrida em consonância com a posição do Supremo Tribunal Federal, intérprete final da Constituição Federal, e com base no art. 102, § 2º, da Constituição da República, não se verifica violação constitucional ou legal. Nego seguimento. CONCLUSÃO Admito parcialmente o recurso. Intimem-se, inclusive a parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal quanto aos tópicos admitidos. (smz) PORTO ALEGRE/RS, 25 de maio de 2025. ALEXANDRE CORREA DA CRUZ Desembargador Federal do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - DOUGLAS FERNANDES RAMIRES

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Processo nº 1008477-97.2024.4.01.4200

ID: 312191954

Tribunal: TRF1 Órgão: 1ª Vara Federal Cível da SJRR Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1008477-97.2024.4.01.4200

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

MARIA APARECIDA TAUMATURGO

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

Advogados:

WANESSA FIGARELLA CANDIDO

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária de Roraima 1ª Vara Federal Cível da SJRR SENTENÇA TIPO A PROCESSO: 1008477-97.2024.4.01.4200 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: MARIA APAREC… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária de Roraima 1ª Vara Federal Cível da SJRR SENTENÇA TIPO A PROCESSO: 1008477-97.2024.4.01.4200 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: MARIA APARECIDA TAUMATURGO REU: UNIÃO FEDERAL SENTENÇA MARIA APARECIDA TAUMATURGO ajuizou ação ordinária em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a implantação do Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC) para fins de concessão da Retribuição por Titulação (RT), com fundamento na Lei nº 12.772/2012 (ID 2145389367). A autora narra que é professora aposentada vinculada aos quadros da União Federal, tendo ocupado o cargo de Professora do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (EBTT), aposentando-se em 03/07/2012. Alega ser portadora dos requisitos para o recebimento da Retribuição por Titulação estabelecidos nos artigos 17 e 18 da Lei nº 12.772/2012, tendo pleiteado administrativamente seu direito através do processo nº 19975.137277/2021-31. O requerimento administrativo foi indeferido em 08/02/2022, sob o fundamento de que a autora teria se aposentado antes da vigência da Lei nº 12.772/2012. A requerente sustenta ter direito à paridade constitucional, uma vez que sua aposentadoria ocorreu antes da EC nº 41/2003, sendo-lhe assegurada a extensão de quaisquer benefícios concedidos aos servidores em atividade. Pleiteia tutela de evidência para que a Administração proceda à avaliação dos requisitos necessários à obtenção do RSC no prazo de 60 dias, bem como a procedência do pedido para reconhecimento do direito à avaliação e eventual implementação dos valores correspondentes. O pedido de tutela de evidência foi indeferido (ID 2145519339). A UNIÃO FEDERAL apresentou contestação (ID 2149899352) alegando preliminarmente a prescrição do fundo de direito com base no Decreto-Lei 20.910/1932, considerando que a autora se aposentou há mais de 12 anos. No mérito, sustenta a impossibilidade de concessão do RSC aos inativos, por se tratar de vantagem destinada exclusivamente aos integrantes da carreira de magistério que estejam na ativa, configurando parcela propter laborem. Argumenta ainda sobre a vedação à extensão de vantagens pelo Poder Judiciário com base na Súmula Vinculante nº 37 do STF. A autora apresentou réplica (ID 2157134501) reiterando os termos da inicial e refutando as alegações da contestação, sustentando a jurisprudência do STJ favorável à concessão do RSC aos aposentados. Intimadas, as partes não manifestaram interesse em produzir novas provas. É o relatório. Decido. O feito está em condição imediata de julgamento. Por isso, anuncio o julgamento antecipado da lide (art. 355, I, do CPC). A controvérsia cinge-se à possibilidade de concessão do RSC ao professor aposentado com paridade, cuja inatividade é anterior à vigência da Lei 12.772/2012. A UNIÃO FEDERAL suscitou uma preliminar de prescrição do fundo do direito, sob o fundamento de que a autora teria se aposentado antes da vigência da Lei nº 12.772/2012, com requerimento administrativo datado de 2021 e ajuizamento da ação judicial em 2024. A preliminar não deve ser acolhida. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado no sentido de que “(...) não se opera a prescrição de fundo de direito nos casos em que se objetive a revisão dos proventos de aposentadoria, com base na paridade entre ativos e inativos, nos termos do art . 40, § 8º, da Constituição da Republica” (STJ - trecho da ementa do AgInt no AREsp: 2133645 RJ 2022/0152891-2, Data de Julgamento: 26/09/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/09/2022). Veja-se: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO. SERVIDOR PÚBLICO. PROFESSOR DO ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO . RETRIBUIÇÃO POR TITULAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SABERES E COMPETÊNCIA (RSC). EXTENSÃO AOS INATIVOS. VANTAGEM DE CARÁTER GENÉRICO . PAGAMENTO A SERVIDORES APOSENTADOS. DIREITO À PARIDADE. 1. A vantagem referente ao Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC) não corresponde à retribuição por produtividade alcançada durante o exercício da função, mas a uma verba paga de modo linear e genérico aos professores em atividade, de modo que deve ser reconhecido o direito dos servidores inativos, ainda que aposentados antes da vigência da Lei 12 .772/2012. Logo, não há falar em incidência da Súmula 7/STJ. 2. "A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que não se opera a prescrição de fundo de direito nos casos em que se objetive a revisão dos proventos de aposentadoria, com base na paridade entre ativos e inativos, nos termos do art . 40, § 8º, da Constituição da Republica. A propósito: AgInt no AREsp n. 1491611/PR, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 21/3/2022, DJe 23/3/2022; AgInt no REsp n. 1 .905.408/RS, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 3/5/2021, DJe 5/5/2021; AgInt no REsp n. 1.828 .964/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 28/9/2020, DJe 30/9/2020 e AgInt no REsp n. 1.809.613/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 21/11/2019, DJe 19/12/2019" ( AgInt no AREsp 1 .727.666/SC, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 18/5/2022) . 3. Agravo Interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 2133645 RJ 2022/0152891-2, Data de Julgamento: 26/09/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/09/2022) Entendimento amplamente aplicado pelo TRF-1. Confira-se: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. RECONHECIMENTO DE SABERES E COMPETÊNCIAS RSC. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. CERTIFICAÇÃO OU TÍTULO OBTIDO ANTES DA APOSENTADORIA E DA VIGÊNCIA DA LEI 12.772/2012. INGRESSO NO SERVIÇO PÚBLICO ANTES DA EC 41/2003. PARIDADE REMUNERATÓRIA ENTRE SERVIDORES ATIVOS E INATIVOS. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que não se opera a prescrição de fundo de direito nos casos em que se objetive a revisão dos proventos de aposentadoria, com base na paridade entre ativos e inativos, nos termos do art. 40, § 8º, da Constituição da República. (AgInt no AREsp n. 1491611/PR, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 21/3/2022, DJe 23/3/2022; AgInt no REsp n. 1.905.408/RS, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 3/5/2021, DJe 5/5/2021; AgInt no REsp n. 1.828.964/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 28/9/2020, DJe 30/9/2020 e AgInt no REsp n. 1.809.613/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 21/11/2019, DJe 19/12/2019" (AgInt no AREsp 1.727.666/SC, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 18/5/2022). 2. A Lei n. 12.772/2012 estruturou o Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal, instituindo a Retribuição por Titulação a título de Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC). 3. O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (Tema 139), fixou o entendimento de que os servidores que ingressaram no serviço público antes da EC 41/2003, mas que se aposentaram após a referida emenda, têm direito à paridade remuneratória com os servidores ativos. 4. Nessa linha, o STJ assentou o entendimento de que a Retribuição por Titulação a título de Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC) deve ser estendida ao servidor que se aposentou antes da reestruturação da Carreira de Magistério Superior, promovida pela Lei n. 12.772/2012, desde que o certificado ou o título tenham sido obtidos anteriormente à inativação. 5. No presente caso, a parte autora ingressou no serviço público antes da EC 41/2003, de modo que tem direito a que seu pedido de certificação acadêmica (RSC) seja examinado conforme os parâmetros estabelecidos pela Lei n. 12.772/2012, levando em consideração as experiências profissionais obtidas ao longo do exercício do cargo até sua inativação. 6. Comprovada a obtenção de certificado ou título anteriormente à aposentadoria, é devido o percebimento da Retribuição por Titulação a título de Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC), com o pagamento de parcelas pretéritas, observada a prescrição quinquenal. 7. A correção monetária e os juros de mora devem observar o disposto no Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do Tema 905 STJ, Tema 810 STF e art. 3º e conexos da EC 113/2021. 8. Honorários advocatícios recursais majorados em 1% (§11 do art. 85 do CPC/2015). 9. Apelação não provida. (AC 1000764-28.2024.4.01.3503, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 01/04/2025 PAG.) ** CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO. CARREIRA DE MAGISTÉRIO DO ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO. RETRIBUIÇÃO POR TITULAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SABERES E COMPETÊNCIAS (RSC). RETRIBUIÇÃO POR TITULAÇÃO (RT). LEI Nº 12.772/2012. PARIDADE REMUNERATÓRIA. POSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. SÚMULA 85/STJ. SEPARAÇÃO DOS PODERES. I - CASO EM EXAME 1. Apelação interposta pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano IFGoiano contra sentença que julgou procedente o pedido de servidor inativo para recebimento da vantagem denominada Reconhecimento de Saberes e Competências RSC, prevista na Lei nº 12.772/2012. 2. A autarquia recorrente sustentou que a aposentadoria do autor ocorreu antes da vigência da Lei nº 12.772/2012, o que inviabilizaria a concessão do benefício. Argumentou, ainda, a prescrição do fundo de direito, bem como a natureza propter laborem da vantagem. II - QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. A questão central é saber se servidor aposentado antes da vigência da Lei nº 12.772/2012 tem direito à Retribuição por Titulação (RT) com base no Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC), mesmo não estando em atividade à época de sua instituição. III - RAZÕES DE DECIDIR Preliminares 4. A preliminar de prescrição do fundo de direito foi afastada, pois se trata de obrigação de trato sucessivo, incidindo a Súmula 85 do STJ. O prazo prescricional quinquenal deve ser observado apenas para as parcelas anteriores ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação. Mérito 5. O Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC) é um critério de valorização acadêmica e profissional instituído pela Lei nº 12.772/2012 e integra a Retribuição por Titulação (RT), conforme previsto nos arts. 17 e 18 da referida norma. 6. O RSC pode ser concedido a servidores aposentados desde que tenham preenchido os requisitos legais antes da inativação, não havendo exigência de atividade no momento da concessão. 7. O servidor recorrido ingressou no serviço público antes da EC nº 41/2003 e aposentou-se com direito à paridade, o que assegura a extensão da vantagem, uma vez que a Lei nº 12.772/2012 não impõe restrição quanto aos inativos. 8. O princípio do tempus regit actum não impede a concessão do benefício, pois não se trata de aplicação retroativa da norma, mas da extensão de uma vantagem prevista em lei àqueles que já preenchiam os requisitos antes da aposentadoria e beneficiários do princípio da paridade. 9. A tese de afronta ao princípio da separação dos poderes não se sustenta, pois a decisão judicial apenas aplica a legislação vigente ao caso concreto, sem criar nova vantagem remuneratória. Inaplicável a súmula vinculante 37 ao caso. 10. O IFGoiano deverá proceder à análise do requerimento da parte autora de concessão do Reconhecimento de Saberes e Competências RSC, para fins de equivalência da Retribuição por Titulação RT, na forma prevista no art. 18 da Lei 12.772/12, partir de 01/03/2013, avaliando os títulos/certificados obtidos durante o exercício do cargo até a inativação. 11. O pagamento de valores eventualmente devidos (passíveis de apuração na via administrativa a partir dos títulos obtidos durante a atividade) deverá observar a prescrição quinquenal, contada do pedido administrativo, com atualização na forma prevista no Manual de Cálculos da Justiça Federal IV - DISPOSITIVO 12. Apelação não provida. (AC 1001326-71.2023.4.01.3503, DESEMBARGADOR FEDERA EULER DE ALMEIDA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 25/03/2025 PAG.) Portanto, rejeito a preliminar. No mérito, a autora pretende a concessão da Retribuição por Titulação na forma da Lei n. 12.772/12, que instituiu a Retribuição por Titulação aos ocupantes de cargos da Carreira de Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, considerando a equivalência da titulação exigida com o Reconhecimento de Saberes e Competências – RSC, com efeitos financeiros a contar de 01/03/2013 (art. 1º): Art. 17. Fica instituída a RT, devida ao docente integrante do Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal em conformidade com a Carreira, cargo, classe, nível e titulação comprovada, nos valores e vigência estabelecidos no Anexo IV. § 1º A RT será considerada no cálculo dos proventos e das pensões, na forma dos regramentos de regime previdenciário aplicável a cada caso, desde que o certificado ou o título tenham sido obtidos anteriormente à data da inativação. § 2º Os valores referentes à RT não serão percebidos cumulativamente para diferentes titulações ou com quaisquer outras Retribuições por Titulação, adicionais ou gratificações de mesma natureza. Art. 18. No caso dos ocupantes de cargos da Carreira de Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, para fins de percepção da RT, será considerada a equivalência da titulação exigida com o Reconhecimento de Saberes e Competências - RSC. § 1º O RSC de que trata o caput poderá ser concedido pela respectiva IFE de lotação do servidor em 3 (três) níveis: I - RSC-I; II - RSC-II; e III - RSC-III. § 2º A equivalência do RSC com a titulação acadêmica, exclusivamente para fins de percepção da RT, ocorrerá da seguinte forma: I - diploma de graduação somado ao RSC-I equivalerá à titulação de especialização; II - certificado de pós-graduação lato sensu somado ao RSC-II equivalerá a mestrado; e III - titulação de mestre somada ao RSC-III equivalerá a doutorado. § 3º Será criado o Conselho Permanente para Reconhecimento de Saberes e Competências no âmbito do Ministério da Educação, com a finalidade de estabelecer os procedimentos para a concessão do RSC. § 4º A composição do Conselho e suas competências serão estabelecidas em ato do Ministro da Educação. § 5º O Ministério da Defesa possuirá representação no Conselho de que trata o § 3º, na forma do ato previsto no § 4º. Consoante disposto no art. 17, § 1º, a Retribuição por Titulação integra os proventos de aposentadoria e pensão, de acordo com cada regime previdenciário, desde que o certificado ou o título tenham sido obtidos anteriormente à data da passagem do servidor para a inatividade. Com efeito, o indeferimento do requerimento administrativo fundamentou-se no fato de se tratar de servidora aposentada, com amparo na Nota n. 103/2015/CGAA/CONJUR-MEC/CGU/AGU (ID 2145389743), em que se estabeleceu orientação no sentido de que a concessão do RSC somente é devida aos servidores que se aposentaram a partir de 01/03/2013. Ou seja, não houve efetiva análise dos documentos apresentados para considerá-los idôneos ou não à concessão da gratificação. Por outro lado, a requerente afirma ter direito ao RSC em razão da paridade remuneratória a que se referia o art. 40, § 8º da CF, com a redação anterior à EC n. 41/2003. § 8º Observado o disposto no art. 37, XI, os proventos de aposentadoria e as pensões serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos aposentados e aos pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei. Uma vez que aposentadoria se deu sob o regime da EC n. 41/2003, há direito à paridade remuneratória no tocante às vantagens concedidas em caráter geral aos servidores públicos, independentemente do exercício efetivo de alguma atividade ou de outra circunstância pessoal, consoante decidido pelo STF no julgamento do RE n. 596.962/MT, com repercussão geral. E, no caso em análise, considerando que a Retribuição por Titulação tratada na Lei n. 12.772/12 é paga de acordo com a titulação do docente (aperfeiçoamento, especialização, mestrado e doutorado – Anexo IV), admitindo a equivalência da titulação de acordo com o RSC I, II ou III, a partir das atividades acadêmicas desenvolvidas, não configura vantagem de caráter propter laborem, tanto que considerada no cálculo dos proventos de aposentadoria e pensão (art. 17, § 1º). Nesse sentido, menciono o entendimento do TRF-1: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO. CARREIRA DE MAGISTÉRIO DO ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO. RECONHECIMENTO DE SABERES E COMPETÊNCIAS - RSC. RETRIBUIÇÃO DE TITULAÇÃO. LEI 12.772/2012. APOSENTADORIA ANTES DE 01/03/2013 COM GARANTIA DE PARIDADE. DIREITO À PERCEPÇÃO DA VANTAGEM. 1. Da análise da Lei 12.772/12 que disciplina o Regime de Saberes e Competências - RSC, é possível verificar que esta condiciona a concessão da rubrica pleiteada à obtenção do certificado ou do título anteriormente à data da inativação do servidor, não havendo determinação legal quanto à percepção da vantagem apenas para quem se tornou inativo a partir de março de 2013. 2.Considerando, portanto, que já houve uma análise administrativa dos títulos e critérios previstos na Lei 12.772/2012 e que, afastado o óbice da inatividade, o resultado seria favorável à apelada, mantém-se a sentença que determinou que lhe seja estendida, para fins de percepção da Retribuição por Titulação (RT), a equivalência da titulação exigida com o Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC-I), nos termos da Lei 12.772/2012. 3. Apelação da UFMA não provida. (AC 1000619-36.2019.4.01.3700, DESEMBARGADORA FEDERAL GILDA SIGMARINGA SEIXAS, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 07/07/2020) ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. MAGISTÉRIO FEDERAL. RETRIBUIÇÃO DE TITULAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SABERES E COMPETÊNCIAS (RSC). LEI 12.772/12. EXTENSÃO A SERVIDOR INATIVO COM GARANTIA DE PARIDADE REMUNERATÓRIA. EC 41/2003 E EC 47/2005. POSSIBILIDADE. CARÁTER GERAL E OBJETIVO DA VERBA. DIREITO À AVALIAÇÃO ADMINISTRATIVA. SENTENÇA REFORMADA. 1. Cinge-se a controvérsia na possibilidade de extensão da vantagem de retribuição de titulação denominada Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC), instituída pelo art. 18 da Lei 12.772/12, aos servidores inativos das carreiras de Magistério Federal que se aposentaram antes da vigência do novo Plano de Carreiras e Cargos instituído pelo referido diploma legal, que se deu em 01/03/2013. 2. No caso dos autos, os autores se aposentaram no cargo de docente junto à Instituição Federal de Ensino com direito à paridade remuneratória com os servidores da ativa, com fundamento na redação originária do art. 40, §4º da CRFB/88, preservada pelo art. 7º da EC 41/2003, ou com fundamento no art. 6º da EC 41/2003 c/c o art. 2º da EC 47/2005. A garantia abrange apenas vantagens concedidas de forma geral e impessoal, extensível a todos os servidores ativos com base em critérios objetivos, independentemente de circunstâncias pessoais ou funcionais individuais. 3. Da interpretação sistemática e teleológica dos artigos 16 a 18 da Lei 12.772/12, extrai-se que a RT RSC possui caráter geral e impessoal, pois pode ser pleiteada e obtida por qualquer docente do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, que, submetendo-se à análise curricular orientada por critérios objetivos, obtenha a pontuação mínima exigida para sua concessão, independendo do exercício habitual de atividade específica pelo servidor. Admissível, portanto, a extensão da RSC para os servidores aposentados antes da Lei 12.772/12 e que possuem direito à paridade remuneratória. 4. Não é dado ao Poder Judiciário, sob pena de violação do princípio constitucional da separação de poderes, substituir a Administração na realização da análise curricular dos servidores e do cumprimento de todos os demais requisitos fixados na Lei 12.772/12 para conceder-lhes de plano a vantagem sob análise, de forma que o provimento jurisdicional deve ser adequado para que seja determinada a submissão dos autores à avaliação administrativa para fins de concessão da RT - RSC 5. O termo a quo dos efeitos financeiros da RSC deve ser fixado na data em que os autores foram enquadrados na Carreira de Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico tratada pela Lei 12.772/12, sendo essa a data a partir da qual os autores passaram a fazer jus às vantagens criadas pelo referido diploma legal, uma vez que anteriormente pertenciam à Carreira de Magistério Federal, reestruturada e regida pela Lei 11.784/08, de forma que não se poderia falar em paridade remuneratória com servidores de outra carreira distinta. 6. Apelação parcialmente provida. (AC 1004246-12.2018.4.01.3400, DESEMBARGADORA FEDERAL SÔNIA DINIZ VIANA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 15/07/2021) Além disso, o art. 17, § 1º da Lei n. 12.772/12 exige apenas que o certificado ou o título tenham sido obtidos anteriormente à data da inativação. Mencione-se, de igual modo, que o STJ reconheceu o direito dos servidores inativos, embora aposentados anteriormente a 01/03/2013, à concessão do RSC, para fins de cálculo da Retribuição por Titulação – RT, decidindo que “a Lei 12.772/2012 não fez distinção entre o mecanismo a ser observado para o cálculo da Retribuição por Titulação, com base no RSC, pelo fato de o docente encontrar-se na ativa ou aposentado, de modo que revela-se manifestamente ilegal restringir a obtenção do nível de Reconhecimento de Saberes e Competência - RSC apenas aos servidores ativos” (STJ – trecho da ementa do REsp n. 1.679.551/PE, Primeira Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 25/06/2020). Assim, impõe-se reconhecer à autora, servidora aposentada com paridade remuneratória em relação aos servidores em atividade, o Reconhecimento de Saberes e Competências – RSC, previsto no art. 18 da Lei n. 12.772/12, de acordo com a análise a ser realizada pelo Núcleo competente, que deverá afastar a vedação de concessão da vantagem ao servidor aposentado antes de 01/03/2013, prevista na Nota n. 103/2015/CGAA/CONJURMEC/CGU/AGU. Isso porque não é autorizado ao Poder Judiciário substituir-se na análise do mérito administrativo e conceder de plano a vantagem pleiteada sem a submissão do servidor aposentado à análise técnica de comissão criada para esse fim, conforme determina o art. 18 da Lei n. 12.772/2012. Em amparo a todo o exposto, menciono o entendimento consolidado do TRF-1 sobre a matéria: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO. CARREIRA DE MAGISTÉRIO DO ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO. RETRIBUIÇÃO POR TITULAÇÃO. RECONHECIMENTO DE SABERES E COMPETÊNCIAS - RSC. LEI 12.772/2012. APOSENTADORIA ANTES DE 01/03/2013. PARIDADE. DIREITO À AVALIAÇÃO DO CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS. PRESCRIÇÃO NÃO CONFIGURADA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Cinge-se a demanda quanto ao reconhecimento do direito à concessão da vantagem remuneratória Reconhecimento de Saberes e Competências RSC aos servidores aposentados que possuem direito à paridade e se aposentaram antes de 01/03/2013 (produção dos efeitos financeiros da Lei nº 12.772/12, art. 1º). 2. A prescrição atinge as prestações anteriores ao quinquênio que antecedeu ao ajuizamento desta ação, nos termos da Súmula 85/STJ. 3. A vantagem remuneratória Reconhecimento de Saberes e Competências RSC foi instituída pela Lei nº 12.772/2012 aos servidores da carreira do magistério do ensino básico, técnico e tecnológico, com efeitos financeiros a contar de 01/03/2013 (art. 1º), constituindo-se em parcela de caráter permanente e que leva em consideração a experiência profissional e a titulação verificadas até a data da inativação. 4. Ao servidor inativo que possui direito à paridade nos termos do art. 7º da EC 41/2003, mesmo que aposentado antes da vigência da Lei n° 12.772 de 28/12/2012, deve ser-lhe assegurado o direito à avaliação do cumprimento dos requisitos necessários à percepção da vantagem denominada Reconhecimento de Saberes e Competências - RSC, para fins de acréscimo na Retribuição por Titulação - RT, levando-se em conta as experiências profissionais obtidas ao longo do exercício do cargo até a sua inativação, o que foi o caso dos autos. 5. In casu, a parte autora comprovou possuir certificado ou título anterior à data da aposentadoria, a qual foi concedida com proventos integrais e com direito à paridade, de sorte que ele faz jus, portanto, à avaliação de sua titulação e competências, conforme os critérios de concessão do Reconhecimento de Saberes e Competência (RSC), instituído pela Lei nº 12.772/2012, bem assim ao recebimento da referida vantagem desde a data do requerimento administrativo, independentemente do fato de ter sido aposentada antes de março/2013. 6. Imperativo reconhecer à parte autora, servidora aposentada com paridade remuneratória em relação aos servidores em atividade, o Reconhecimento de Saberes e Competências RSC, previsto no art. 18 da Lei n. 12.772/12, de acordo com a análise a ser realizada pelo Núcleo Permanente de Pessoal Docente do IFMT, que deverá afastar a vedação de concessão da vantagem ao servidor aposentado antes de 01/03/2013, prevista na Nota n. 103/2015/CGAA/CONJURMEC/CGU/AGU. Isso porque não é autorizado ao Poder Judiciário substituir-se na análise do mérito administrativo e conceder de plano a vantagem pleiteada sem a submissão do servidor aposentado à análise técnica de comissão criada para esse fim, conforme determina o art. 18 da Lei n. 12.772/2012. Caso preenchidos tais requisitos, os juros e correção monetária devem observar os termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. 7. Honorários recursais arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor/percentual a que foi condenada a parte ré na sentença, e sem prejuízo deste, observados os limites mínimo e máximo estabelecidos nos incisos do §3º do art. 85 do CPC 8. Apelação do IFMT desprovida. (AC 1015443-04.2022.4.01.3600, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 10/04/2025 PAG.) ** DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REMESSA NECESSÁRIA. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE SABERES E COMPETÊNCIAS (RSC). EXTENSÃO A SERVIDOR APOSENTADO ANTERIORMENTE À LEI Nº 12.772/2012. PARIDADE REMUNERATÓRIA. CABIMENTO. 1. A sentença foi proferida na vigência do CPC/2015 e não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC/2015. 2. Apelação interposta por entidade pública contra sentença que reconheceu o direito de servidor aposentado à avaliação do cumprimento dos requisitos necessários à percepção da vantagem denominada Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC), para fins de acréscimo na Retribuição por Titulação (RT). Determinação para prosseguimento do processo administrativo e inclusão da vantagem nos proventos vincendos, em caso de resultado positivo na avaliação. 3. A controvérsia consiste em verificar se o servidor aposentado anteriormente à edição da Lei nº 12.772/2012 tem direito à equivalência do Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC) para fins de Retribuição por Titulação (RT), considerando a paridade remuneratória estabelecida pela EC nº 41/2003 e ampliada pela EC nº 47/2005. 4. Os servidores que ingressaram no serviço público antes da EC 41/2003, mas que se aposentaram após a referida emenda, possuem direito à paridade remuneratória e à integralidade no cálculo de seus proventos, desde que observadas as regras de transição especificadas na EC 47/2005. 5. Para o cálculo dos proventos da parte autora com as respectivas RTs e RSCs é necessário apenas que os certificados ou títulos tenham sido obtidos antes da inativação (art. 17, § 1º, Lei 12.772/2012). A lei não estabeleceu limitação temporal quanto às aposentadorias ou pensões. 6. A União deverá proceder à análise do requerimento da parte autora de concessão do Reconhecimento de Saberes e Competências RSC, para fins de equivalência da Retribuição por Titulação RT, na forma prevista no art. 18 da Lei 12.772/12, partir de 01/03/2013, avaliando os títulos/certificados obtidos durante o exercício do cargo até a inativação. 7. Inaplicável a Súmula Vinculante nº 37 do STF, pois a decisão não amplia vantagens, mas assegura o recebimento de parcela prevista em lei e indeferida administrativamente. 8. O pagamento de valores eventualmente devidos (passíveis de apuração na via administrativa a partir dos títulos obtidos durante a atividade) deverá observar a prescrição quinquenal, contada do pedido administrativo, com atualização na forma prevista no Manual de Cálculos da Justiça Federal. 9. Honorários advocatícios de sucumbência na fase recursal majorados em 1% sobre a mesma base de cálculo da sentença recorrida, "levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal" (§11 do art. 85 do CPC). 10. Remessa necessária não conhecida. Apelação não provida. (AC 1025423-74.2024.4.01.3900, DESEMBARGADOR FEDERA EULER DE ALMEIDA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 25/03/2025 PAG.) ** DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO SERVIDOR PÚBLICO INATIVO. CARREIRA DE MAGISTÉRIO DO ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO. RETRIBUIÇÃO POR TITULAÇÃO (RT). RECONHECIMENTO DE SABERES E COMPETÊNCIAS (RSC). LEI Nº 12.772/2012. APOSENTADORIA ANTES DE 01/03/2013. PARIDADE. DIREITO À AVALIAÇÃO DO CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS. 1. Apelação interposta pela União contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos de servidora pública federal inativa, determinando a análise de seu requerimento administrativo e a eventual concessão da Retribuição por Titulação (RT), com base no Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC), instituído pela Lei nº 12.772/2012. 2. A questão em discussão consiste em definir se servidor público aposentado antes da vigência da Lei nº 12.772/2012 tem direito à avaliação para concessão do Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC), considerando a paridade constitucional entre ativos e inativos. 3. A Lei nº 12.772/2012 não estabelece vedação expressa à concessão do RSC a servidores aposentados antes de 01/03/2013, exigindo apenas que os certificados e títulos tenham sido obtidos antes da inativação. 4. O servidor que se aposentou sob as regras do art. 6º da Emenda Constitucional nº 41/2003 tem direito à paridade remuneratória, nos termos do art. 7º da referida emenda e do art. 2º da EC nº 47/2005, o que assegura a extensão do RSC. 5. O indeferimento administrativo do pedido da parte autora sem a devida análise dos requisitos para concessão do RSC viola a garantia constitucional da paridade, configurando ato ilegal passível de controle judicial. 6. Acolhimento dos fundamentos da sentença recorrida, no que compatíveis com o objeto da pretensão recursal. Aplicação dos precedentes jurisprudenciais mencionados no voto relator. 7. A obrigação de proceder à avaliação do requerimento administrativo deve ser cumprida pela Administração, observando-se a prescrição quinquenal e a devida atualização monetária, conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal. 8. Apelação não provida. (AC 1003765-35.2022.4.01.4200, JUIZ FEDERAL RAFAEL LIMA DA COSTA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 25/02/2025 PAG.) Logo, o pedido deve ser parcialmente acolhido. Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, nos termos do art. 487, I do CPC para condenar a UNIÃO FEDERAL a reapreciar o processo administrativo n. 19975.137277/2021-31, afastando-se a vedação de concessão da vantagem ao servidor aposentado antes de 01/03/2013, prevista na Nota n. 103/2015/CGAA/CONJURMEC/CGU/AGU e, caso preenchidos os requisitos da Lei n. 12.772/12, conceder à parte autora a vantagem Reconhecimento de Saberes e Competências – RSC e efetuar o pagamento, inclusive dos reflexos financeiros sobre as demais verbas remuneratórias, observada a prescrição quinquenal (Súmula 85 do STJ), com a incidência de juros a partir da citação e nos termos do art. 1º-F da Lei n. 9.494/95 e correção monetária desde quando devidas as prestações, na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal. Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios no percentual mínimo sobre o crédito principal, nos termos do art. 85, §3° do CPC, a ser liquidado em cumprimento de sentença. Isento das custas processuais. Publique-se e intimem-se. Na hipótese de recurso, à Secretaria para as providências de praxe. Boa Vista, data da assinatura eletrônica. JOSÉ VINICIUS PANTALEÃO GURGEL DO AMARAL Juiz Federal Substituto

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