Processo nº 1000904-45.2023.8.11.0024
ID: 295399106
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1000904-45.2023.8.11.0024
Data de Disponibilização:
11/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MOSAR FRATARI TAVARES
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000904-45.2023.8.11.0024 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Busca e Apreensão, Requerimento de Apreensão de …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000904-45.2023.8.11.0024 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Busca e Apreensão, Requerimento de Apreensão de Veículo] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [DEOGENES PEREIRA DA SILVA - CPF: 496.176.721-20 (APELADO), MOSAR FRATARI TAVARES - CPF: 303.206.316-72 (ADVOGADO), ROSILENE BARBOSA DA COSTA - CPF: 919.719.341-00 (APELANTE), FERNANDA VAUCHER DE OLIVEIRA KLEIM - CPF: 007.471.911-40 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. LEGITIMIDADE PARA A POSSE DE VEÍCULO. UNIÃO ESTÁVEL E INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL. QUESTÃO PREJUDICIAL EXTERNA. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de entrega de veículo objeto de inventário extrajudicial, afastando a pretensão de indenização e rejeitando pedido de suspensão do feito com base em ação anulatória conexa. Aplicada multa de 2% por embargos declaratórios protelatórios. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) saber se deveria ter sido determinada a suspensão do processo por prejudicialidade externa, ante a existência de ação anulatória do inventário; (ii) saber se a companheira sobrevivente detém direito de posse ou propriedade sobre bem adquirido antes da união estável; e (iii) saber se é devida a multa por embargos manifestamente protelatórios. III. Razões de decidir 3. A ausência de pedido expresso de suspensão processual na contestação inviabiliza o exame da matéria como questão prejudicial, por configurar inovação recursal. 4. O inventário extrajudicial possui presunção de validade e eficácia até eventual anulação judicial, não havendo determinação de suspensão ou nulidade até o presente momento. 5. O veículo foi adquirido antes da união estável, razão pela qual não se comunica à relação, nos termos do art. 1.659, I, do CC. 6. Inexistente comprovação de esforço comum ou aquisição conjunta do bem, permanece hígida a titularidade do Apelado conforme partilha registrada. 7. Os embargos declaratórios opostos buscaram indevidamente suprir omissão inexistente, incidindo a multa prevista no art. 1.026, § 2º, do CPC. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso de apelação desprovido. Tese de julgamento: “1. A suspensão do processo com base em ação anulatória conexa depende de pedido expresso e de relação de prejudicialidade externa evidente. 2. Bens adquiridos antes da união estável não se comunicam ao companheiro sobrevivente, salvo prova de esforço comum. 3. Configura má-fé processual a oposição de embargos declaratórios que alegam omissão não arguida na fase postulatória.” Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 1.659, I, e 1.790; CPC, arts. 313, V, a; 373, II; 1.026, § 2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no CC nº 137.123/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 2ª Seção, j. 28.10.2015; STJ, EDcl no AgInt no REsp nº 2.106.279/DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, j. 20.5.2024; TJMT, N.U 1023517-18.2017.8.11.0041, Rel. Desa. Marilsen Andrade Addario, j. 6.9.2023. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação cível interposto por ROSILENE BARBOSA DA COSTA contra a sentença proferida pelo Dr. Leonísio Salles de Abre Júnior, Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Chapada dos Guimarães, que, nos autos da Ação de Procedimento Comum n. 1000904-45.2023.8.11.0024, ajuizada por DEÓGENES PEREIRA DA SILVA, julgou parcialmente procedente a pretensão deduzida na inicial, apenas para condenar a Apelante à entrega do veículo automotor Renault Oroch Exp 16 SCE, placa QBS 6641, cor vermelho, ano/modelo 2016/2017, com honorários de sucumbência fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, afastando a pretensão condenatória ao pagamento de danos, impostos, taxas, avarias, manutenção e conservação que teriam deixado de realizadas no veículo (ID. 286540854). Em suas razões recursais, a Apelante alega, em síntese, que a sentença deveria ter determinado a suspensão do processo até o julgamento da Ação Anulatória de Inventário Extrajudicial n. 1001540-11.2023.8.11.0024, por configurar questão prejudicial de mérito essencial ao deslinde da controvérsia, sustentando ser a única herdeira legítima do falecido Dário Pereira da Silva Filho, na condição de companheira sobrevivente reconhecida judicialmente, aplicando-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal no RE 878.694, que equiparou o regime sucessório entre cônjuges e companheiros, pugnando, ainda, seja afastada a multa de 2% do valor da causa aplicada na sentença dos embargos declaratórios, por não ter caráter protelatório o recurso interposto (ID. 286540862). O Apelado deixou transcorrer in albis o prazo para apresentar suas contrarrazões (ID. 286540864). Desnecessário o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, uma vez que ausente interesse público ou social que justifique a intervenção ministerial. Recurso tempestivo (ID. 286540863) e isento de preparo (ID. 287513850). É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Conforme relatado, ROSILENE BARBOSA DA COSTA pretende a reforma da sentença para que seja reconhecida a necessidade de suspensão do processo até o julgamento da ação anulatória de inventário como questão prejudicial de mérito, ou, subsidiariamente, que seja reconhecido seu direito como única herdeira legítima do falecido na qualidade de companheira sobrevivente, com a consequente improcedência dos pedidos autorais, além do afastamento da multa por litigância protelatória aplicada nos embargos declaratórios. Em que pese os argumentos vertidos no apelo, contudo, tenho que o recurso não comporta provimento. Vejamos. Constou da sentença recorrida, no que pertine: “(...) DEÓGENES PEREIRA DA SILVA, devidamente qualificado, ajuizou AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM, com pedidos condenatórios, contra ROSILENE BARBOSA DA SILVA, também qualificada e representada nos autos. O autor narra que é o proprietário do veículo Renault Oroch Exp 16 SCE, placa QBS 6641, cor vermelho, ano/modelo 2016/2017, chassi 93Y9SR3H5HJ667114, o qual foi adquirido por força da escritura pública de inventário de seu falecido irmão, Dário Pereira da Silva Filho, e ex-companheiro da ré, a qual se encontra na posse do bem e se recusa a entregá-lo, muito embora tenha sido notificada extrajudicialmente para tal fim. Diante disso, requer a concessão da tutela provisória de urgência de natureza antecipada para ordenar a expedição de mandado de busca e apreensão do veículo automotor de via terrestre em posse da ré, nomeando-o como depositário até o julgamento do mérito. Por fim, no mérito, pediu a confirmação em definitivo da tutela provisória alhures mencionada, bem como a condenação da ré ao pagamento de ( i ) danos; ( ii ) impostos; ( iii ) taxas; ( iv ) avarias; ( v ) manutenção; ( vi ) conservação que deixou de realizar no veículo; ( vii ) fixação de valor a título de diária de locação, além das verbas de sucumbência. (...) Citada, a ré apresentou contestação, requerendo os benefícios da gratuidade da justiça, bem como argumentou que foi companheira do irmão do autor, ora falecido, Dário Pereira da Silva, no período de fevereiro de 2018 a data do óbito (25/06/2020), cuja condição de convivente em união estável foi reconhecida pelo juízo da 3ª Vara Especializada de Família e Sucessões da Comarca de Cuiabá, nos autos da ação registrada sob nº 1058586-09.2020.8.11.0041. Diante disso, noticiou a existência de inventário extrajudicial dos bens deixados pelo seu ex-companheiro realizada pelos irmãos do falecido, a despeito de não ter participado da partilha, o que a motivou a propor ação anulatória registrada sob nº 1001540-11.2023.8.11.0024 que tramita na 2ª Vara da Comarca de Chapada dos Guimarães. (...) Nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, passo a proferir sentença, julgando-se antecipadamente o mérito, conforme o estado do processo, eis que as matérias de fundo são unicamente de direito, prescindindo, portanto, de dilação probatória. Diante disso, entendo que a produção de prova testemunhal em nada contribuirá para elucidação das questões de fundo, eis que os elementos de prova documental são suficientes para o exame do mérito, motivo pelo qual INDEFIRO a postulação deduzida no ID. 148695638. Pois bem. De início, DEFIRO a gratuidade da justiça em favor da ré, Rosilene Barbosa da Costa, nos termos do artigo 98 do CPC, considerando a demonstração de hipossuficiência financeira por meio dos documentos acostados nos autos (ID. 148695640 a 148697243 - Pág. 13). No mérito, os pedidos formulados pelo autor na petição inicial são parcialmente procedentes. Pois bem. É fato incontroverso que o veículo automotor de via terrestre, RENAULT - OROCH EXP 16 SCE, Placa QBS 6641, vermelho, 2016/2017, Chassi 93Y9SR3H5HJ667114, pertencia a Dário Pereira da Silva Filho, sendo adquirido por ele mediante alienação fiduciária em garantia junto ao Banco RCI Brasil S/A em 13/01/2017, conforme consta no documento de ID. 120638567. Neste contexto, em virtude do óbito de Dário Pereira da Silva Filho, realizou-se o inventário extrajudicial de seus bens e direitos por escritura pública, ficando deliberado no aludido documento público que o referido automóvel ingressaria, exclusivamente, no patrimônio do autor (ID. 120637274 - Pág. 4). Todavia, segundo relata o autor na inicial, o veículo em questão se encontra na posse da ré, a qual se nega a efetuar a entrega, embora tenha sido notificada extrajudicialmente (ID. 120638565). Por sua vez, a ré entende que o autor não é herdeiro, jamais possuindo direito sucessório, tampouco pode ser proprietário do automóvel, já que era seu o direito de sucessão devido à união estável que mantinha com o falecido no período de fevereiro de 2018 até a data do óbito (25/06/2020), conforme reconhecido por sentença proferida nos autos nº 1058586-09.2020.8.11.0041 pelo juízo da 3ª Vara Especializada de Família e Sucessões da Comarca de Cuiabá/MT. Examinando-se a peça de defesa, a ré não impugnou o fato de se encontrar na posse do veículo objeto da demanda, tampouco demonstrou eventual fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, uma vez que a escritura pública de inventário extrajudicial não foi anulada, encontrando-se produzindo seus efeitos legais. Logo, muito embora a ré entenda que o bem móvel lhe pertença ou que a sua pessoa tenha sido preterida na partilha extrajudicial, em razão da condição que possuía como convivente ao tempo do óbito com o autor da herança, fato é que, como dito alhures, o inventário extrajudicial não foi anulado, e, ainda, encontra-se perfeito e acabado. Por conseguinte, entendo restaram caracterizados e demonstrados os fatos constitutivos do direito do autor, “ex vi” do artigo 373, inciso I, do CPC, quanto ao fato de que o veículo automotor descrito na peça de ingresso, de fato, foi transmitido para o patrimônio do postulante em virtude da partilha extrajudicial de bens. Neste sentido: (...) (TJ-MG - AC: 10000205777212002 MG, Relator: Aparecida Grossi, Data de Julgamento: 22/06/2022, Câmaras Cíveis / 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 23/06/2022) - destaquei” Por fim, quanto aos demais pedidos autorais, notadamente relacionados à pretensão condenatória ao pagamento de ( i ) danos; ( ii ) impostos; ( iii ) taxas; ( iv ) avarias; ( v ) manutenção; ( vi ) conservação que deixou de realizar no veículo; ( vii ) fixação de valor a título de diária de locação, entendo que não ficou demonstrado e caracterizado o direito almejado pelo autor, por meio de quaisquer provas admitidas em direito, porquanto postulou o autor pelo julgamento antecipado do mérito, conforme o estado do processo, e, por consequência, a improcedência de tais pedidos é medida de rigor. Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE procedentes os pedidos formulados pelo autor na petição inicial, o que faço para extinguir o processo com resolução do mérito, e, por consequência, condenar à ré a entregar ao autor o veículo automotor Renault Oroch Exp 16 SCE, placa QBS 6641, cor vermelho, ano/modelo 2016/2017, chassi 93Y9SR3H5HJ667114, sob pena de ser fixada multa diária. Diante da sucumbência recíproca, CONDENO as partes ao pagamento de 50% (cinquenta por cento) das despesas de ingresso, nos termos do artigo 82, §2º, c/c artigo 86, “caput”, do CPC. CONDENO as partes a pagar honorários advocatícios de sucumbência em favor da parte contrária, no valor correspondente a 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, §2º, incisos I a IV, c/c artigo 86, “caput”, do CPC. Em virtude de a ré ostentar a condição de beneficiária da gratuidade da justiça, as obrigações pecuniárias decorrentes de sua sucumbência acima fixadas em seu desfavor ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade, na forma do §3º do artigo 98 do Código de Processo Civil. (...)” (ID. 286540854) (g.n.) Como visto, a controvérsia central gira em torno da legitimidade para a posse do veículo Renault Oroch, considerando a existência de inventário extrajudicial válido e ação anulatória pendente, bem como a aplicação dos princípios processuais pertinentes à questão prejudicial e ao exercício regular do direito de defesa. Pois bem. A ação teve origem na pretensão do Apelado de reaver veículo que alega ter adquirido por força de escritura pública de inventário extrajudicial de seu falecido irmão, Dário Pereira da Silva Filho, encontrando-se o bem na posse da Apelante, que era companheira do de cujus, sendo que esta sustenta ser a legítima herdeira do falecido em razão da união estável mantida com o autor da herança, razão pela qual defende que a sentença deveria ter determinado a suspensão do processo até o julgamento da Ação Anulatória de Inventário Extrajudicial n. 1001540-11.2023.8.11.0024, que tramita naquela mesma Comarca, com fundamento no art. 313, V, a, do CPC, sob o fundamento de que a validade do inventário constitui questão prejudicial de mérito essencial ao deslinde da controvérsia. Todavia, como bem fundamentado na decisão que rejeitou os embargos declaratórios (ID. 286540860), “na detida análise da contestação apresentada pelo embargante, verifica-se que em nenhum momento foi formulado pedido de suspensão do processo em razão da ação anulatória do inventário extrajudicial”, destacando ainda que “A peça contestatória limita-se a informar a existência da referida ação, sem qualquer exigência de sobrestamento do feito”. De fato, ao contrário do que sustenta a Apelante, não há nos autos qualquer demonstração de que tenha sido formulado, antes da sentença, pedido expresso de suspensão do processo em razão da referida ação anulatória. O que se observa, à luz dos documentos acostados e da própria sentença prolatada nos embargos de declaração, é que tal pretensão foi articulada apenas em sede de embargos de declaração, caracterizando nítida inovação recursal. Ora, é cediço que o princípio da demanda exige que as partes formulem pedidos claros e específicos, não podendo o julgador suprir omissões da parte quanto às pretensões não deduzidas, pois, como bem pontuado pelo magistrado, “não se pode alegar omissão sobre matéria que sequer foi objeto de pedido na fase postulatória”. De todo modo, é preciso anotar também que a simples existência de ação anulatória de inventário não possui aptidão, por si só, para suspender os efeitos da escritura pública de partilha, lavrada com todas as formalidades legais, a qual goza de presunção de validade e eficácia até que sobrevenha decisão judicial de sua anulação com trânsito em julgado (art. 215, §1º, do Código Civil). Em outras palavras, a questão da validade do inventário extrajudicial não impede o julgamento da presente ação que discute a posse do veículo, até porque, o inventário, enquanto não anulado por decisão transitada em julgado, produz todos os seus efeitos legais, inclusive a transmissão da propriedade aos herdeiros nele contemplados. Ou seja, o inventário extrajudicial realizado encontra-se perfeito e acabado, tendo sido lavrado por escritura pública com todas as formalidades legais, de modo que, enquanto não houver decisão judicial definitiva anulando-o, seus efeitos permanecem íntegros. Por sua vez, a simples pendência de ação anulatória não tem o condão de suspender os efeitos do ato jurídico questionado, especialmente nesta hipótese em que o processo n. 1001540-11.2023.8.11.0024 tramita desde 2023, sem que até o momento tenha havido sequer a determinação de citação da parte demandada, estando o feito no aguardo do cumprimento da decisão que determinou a intimação da parte autora para retificar o valor atribuído à causa (ID. 175236256 daqueles autos). Desse modo, ainda que se cogitasse a possibilidade de suspensão ex officio do processo, à luz do art. 313, V, a, do CPC, no caso concreto, tal medida mostra-se indevida, pois a eficácia da escritura pública de inventário não depende, para seus efeitos imediatos, da ausência de controvérsia futura ou de eventual ação anulatória ainda não recebida nem instruída, inexistindo, como ressaltado, relação de dependência lógica que torne imprescindível a solução da outra causa para julgamento da presente, o que afasta a configuração da prejudicialidade externa homogênea. Sobre a matéria, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é clara no sentido de que a suspensão por prejudicialidade externa somente é cabível quando a solução a ser dada no outro processo puder influenciar decisivamente no resultado da demanda. Nesse sentido: “É possível a suspensão de um dos processos em consequência do reconhecimento da prejudicialidade externa homogênea, quando a procedência de uma das ações influenciar diretamente o resultado da outra, como no caso em que a procedência da ação rescisória afetará necessariamente a apuração do valor a ser destinado à massa falida pelo juízo da execução fiscal. (...)” (STJ. AgRg no CC n. 137.123/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 2ª Seção, j. 28/10/2015, DJe 3/11/2015) (g.n.) Não bastasse isso, cumpre observar, ainda, que a sentença recorrida bem consignou que o veículo em litígio foi adquirido por Dário Pereira da Silva Filho em janeiro de 2017, conforme consta do documento de alienação fiduciária, sendo certo que a união estável mantida entre ele e a Apelante teve início apenas em fevereiro de 2018, conforme reconhecido por sentença judicial nos autos n. 1058586-09.2020.8.11.0041, fato este também incontroverso nos autos. Diante disso, em se tratando de união estável, ressalvada a existência de contrato escrito entre as partes - que não ocorreu na hipótese -, é aplicável o regime da comunhão parcial, em que são comunicáveis e partilháveis os bens adquiridos onerosamente na constância da sociedade conjugal, razão pela qual, a teor do que dispõe o art. 1.659, I, do Código Civil, os bens adquiridos por cada cônjuge ou companheiro antes do início da convivência integram o seu patrimônio exclusivo, não se comunicando à comunhão, conforme se vê: “Art. 1.659. Excluem-se da comunhão: I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; (...)” Assim, o reconhecimento judicial da união estável, embora produza efeitos sucessórios nos termos do art. 1.790 do Código Civil, exige, para surtir efeitos patrimoniais concretos, a demonstração da existência de bens comuns ou partilháveis, o que não se verifica em relação ao veículo em questão, já que a Apelante não demonstrou haver participado da aquisição nem provou sua inclusão em regime de comunhão, circunstâncias que reforçam a correção do julgado de primeiro grau ao reconhecer a propriedade exclusiva do Apelado, conforme a partilha homologada extrajudicialmente. Em casos análogos já decidiu este Sodalício: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PARTILHA DE BENS, GUARDA E ALIMENTOS - PARCIAL PROCEDÊNCIA - IRRESIGNAÇÃO QUANTO AO LAPSO TEMPORAL - DESCABIMENTO - DURAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA - REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS - PRETENDIDA PARTILHA DE BENS DESCRITOS NA INICIAL - IMPOSSIBILIDADE - INEXISTÊNCIA DE PROVAS CAPAZES DE DEMONTSRAR A EXISTÊNCIA DE BENS COMUNS A SEREM PARTILHADOS - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Delineada a duração temporal do vínculo conjugal, há que se analisar os efeitos do regime de comunhão, bem como a possibilidade de meação dos bens adquiridos na constância da união, consoante os artigos 1.658 e 1.725 do Código Civil, os quais levam à conclusão imediata de que, inexistindo contrato escrito entre os companheiros estabelecendo o regime de comunhão de bens, aplica-se às relações patrimoniais o regime da comunhão parcial de bens, comunicando-se os bens adquiridos na constância da união estável. Se no decorrer de todo o processado foi comprovado, através do conjunto fático probatório existente nos autos, que a união estável teve início no ano de 2006 e término em 2015, não há como acolher a irresignação da apelante. Não tendo a parte apelante logrado êxito em demonstrar a existência de patrimônio comum a ser partilhado durante esse período, há que ser mantida a sentença de improcedência.” (TJMT. N.U 1023517-18.2017.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Rel. Desa. Marilsen Andrade Addario, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 06/09/2023, DJe 11/09/2023) (g.n.) “AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PARTILHA DE BEM – ESCRITÓRIO DE CONTABILIDADE – BEM ADQUIRIDO ANTES DO PERÍODO DE CONVIVÊNCIA – AUTOMÓVEL – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO – ALEGAÇÃO DA RÉ – ÔNUS DA PROVA – ART. 373, II, CPC – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. É certo que os bens adquiridos durante a união estável, desde que com o esforço mútuo, comunicam-se aos companheiros, pertencendo ao casal, exceto se fizerem parte do rol descrito no art. 1.659, do CC. Cabe à parte ré apresentar provas hábeis a demonstrar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, consoante preceitua o art. 373, II, do CPC, ônus do qual não se libertou. Na hipótese dos autos, a apelante não logrou êxito em comprovar a aquisição do escritório de contabilidade no período de convivência, tampouco a posse ou propriedade do veículo, não havendo o que se falar em partilha.” (TJMT. N.U 0001416-92.2008.8.11.0049, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 05/07/2023, DJe 09/07/2023) (g.n.) Portanto, ausente prova de que a Apelante tenha contribuído com recursos próprios para a aquisição do veículo - o que sequer foi alegado com objetividade pela parte -, inexiste razão jurídica que justifique sua retenção ou posse sobre o bem transmitido validamente ao Apelado por força de inventário extrajudicial que, até o momento, permanece hígido e eficaz. Por fim, a Apelante questiona também a aplicação da multa de 2% do valor da causa imposta na sentença dos embargos declaratórios, sustentando que o recurso não teve caráter protelatório. A análise das razões dos embargos declaratórios, contudo, demonstra claramente a intenção de retardar o desfecho da demanda, uma vez que a Apelante alegou omissão quanto a matéria que sequer foi objeto de pedido na contestação, pretendendo que o julgador suprisse questão não deduzida pela própria parte. Como bem fundamentado pelo magistrado, “o comportamento processual adotado pelo embargante ao manejar o presente recurso de embargos de declaração demonstra sua má-fé processual com nítida intenção de procrastinar, de maneira totalmente infundada, o deslinde da demanda”. Nessa esteira, o §2º do art. 1.026 do CPC é expresso ao determinar a aplicação de multa quando os embargos declaratórios são manifestamente protelatórios, sendo que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, embora exija cautela na aplicação da penalidade, reconhece sua cabimento quando evidenciado o nítido propósito de procrastinar. Nesse sentido: “(...) Diante da manifesta improcedência dos embargos, que buscaram, tão somente, o reexame dos argumentos anteriormente formulados e devidamente analisados por esta eg. Terceira Turma, está caraterizado o caráter manifestamente procrastinatório do recurso integrativo, razão pela qual se aplica ao embargante a multa do art. 1.026, § 2º, do CPC, fixada em 2% sobre o valor atualizado da causa. 5. Embargos de declaração rejeitados, com aplicação de multa.” (STJ. EDcl no AgInt no REsp n. 2.106.279/DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, j. 20/5/2024, DJe 22/5/2024) (g.n.) Com tais considerações, verifica-se que a sentença apelada encontra-se em harmonia com os princípios da legalidade, da boa-fé objetiva e com a regra de exclusão de bens particulares do acervo comum estabelecida no art. 1.659, I, do Código Civil, devendo ser mantida íntegra, tal como proferida. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto por ROSILENE BARBOSA DA COSTA, mantendo incólume a sentença recorrida, por estes e por seus próprios fundamentos. Por conseguinte, com fulcro no art. 85, § 11, do CPC, majoro a condenação em honorários advocatícios de 10% para 15% (quinze por cento), em relação à fração da sucumbência recíproca que cabe à Apelante (art. 86 do CPC), mantendo a suspensão da exigibilidade por se tratar de beneficiária da justiça gratuita (art. 98, §3º, do CPC). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025
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