Processo nº 0008045-51.2023.8.17.2810
ID: 256471073
Tribunal: TJPE
Órgão: 5ª Vara Cível da Comarca de Jaboatão dos Guararapes
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0008045-51.2023.8.17.2810
Data de Disponibilização:
14/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DIOGO DANTAS DE MORAES FURTADO
OAB/PE XXXXXX
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VALDIRA DE MENEZES CARVALHO
OAB/PE XXXXXX
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Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 5ª Vara Cível da Comarca de Jaboatão dos Guararapes ROD BR-101 SUL KM 80, S/N, - do km 86,007 ao km 88,000, PRAZERES, JABOATÃO DOS GUARARAPES - PE -…
Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 5ª Vara Cível da Comarca de Jaboatão dos Guararapes ROD BR-101 SUL KM 80, S/N, - do km 86,007 ao km 88,000, PRAZERES, JABOATÃO DOS GUARARAPES - PE - CEP: 54345-160 - F:(81) 34615600 Processo nº 0008045-51.2023.8.17.2810 AUTOR(A): CONDOMINIO DO EDIFICIO VIVIANE RÉU: NEONERGIA PERNAMBUCO - CIA ENERGETICA DE PERNAMBUCO SENTENÇA Vistos etc. I – RELATÓRIO O CONDOMINIO DO EDIFICIO VIVIANE, qualificado nos autos, por intermédio de advogados constituídos, propôs a presente “Acão declaratória de Inexistência de débito c/c Pedido de Indenização por Danos Morais, Pedido de Antecipação de Tutela e Repetição do Indébito”, em desfavor da COMPANHIA ENERGÉTICA DO ESTADO DE PERNAMBUCO - CELPE, também qualificada. Em resumo, o demandante solicitou a gratuidade da Justiça; depois, alegou que que a promovida negativou o nome do autor pelas dívidas “no valor de R$ 2.407,81 (dois mil quatrocentos e sete reais e oitenta e um centavos) e outra no valor de R$ 1.756,66 (um mil setecentos e cinquenta e seis reais e sessenta e seis centavos) que juntas totalizam o importe de R$ 4.164,47 (quatro mil cento e sessenta e quatro reais e quarenta e sete centavos”, eis que “no dia 04/04/2019, uma equipe técnica da concessionária de serviços de energia elétrica compareceu ao Condomínio com a finalidade de verificar o medidor de consumo de energia daquela unidade consumidora, de conta contrato nº 7016431251. Na ocasião, os técnicos da concessionária de serviços de energia elétrica, acompanhados pelo zelador do Condomínio, pessoa de pouquíssima instrução e sem respaldo legal para realizar o acompanhamento do ato, dirigiram-se (sic) até o local onde se encontrava instalado medidor de consumo de energia, acessaram o equipamento e realizaram de maneira ‘unilateral’ o procedimento de troca do mesmo, registrando o Termo de Ocorrência de Inspeção – TOI, sob o nº 1771199”. Ainda, disse que “o síndico procurou a concessionária de serviços de energia elétrica Ré e protocolou em 30/05/2019, um recurso administrativo, porém não obteve nenhuma resposta por parte da Companhia. Sem respostas, o Condomínio novamente foi surpreendido, dessa vez com negativação nos órgãos de crédito!”. Argumentou pela ilegalidade do Termo de Ocorrência e Inspeção, e que a negativação lhe causa abalo moral. Dessa forma, requereu a tutela de urgência para a exclusão da negativação; a nulidade das cobranças e a ilegalidade do TOI, a declaração de inexigibilidade do débito, a repetição em dobro do valor da cobrança, além de danos morais de R$ 10.000,00, e a inversão do ônus da prova. Atribuiu à causa o valor de R$ 22.493,41. Anexou documentos. Logo após, o promovente juntou a ata da assembleia de eleição do síndico e outros documentos. Ao receber a petição inicial, este Juízo negou a antecipação da tutela, mas deferiu a Justiça gratuita e impulsionou o processo. Inconformado, o requerente noticiou a interposição de agravo de instrumento. A Celpe contestou, alegando, em suma, que a sua inspeção verificou a existência de irregularidade na unidade consumidora da parte autora, gerando o Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI), cujo procedimento foi realizado dentro da legalidade, inclusive o critério que se utilizou para o cálculo da cobrança efetivada, e argumentou pela improcedência do pleito autoral. Juntou documentos. O autor replicou a peça de bloqueio, reforçando o seu pedido. Intimadas as partes para a especificação das provas, a ré concordou com o julgamento antecipado, e o autor reiterou o seu argumento de inversão do ônus da prova, ou a realização de perícia no medidor que foi retirado pela Celpe. O TJPE comunicou que deferiu a antecipação da tutela recursal para a exclusão da negativação do nome do demandante, até ulterior manifestação mérito deste Juízo quanto ao débito questionado. Na decisão do id. 178936097, foi anunciado o julgamento antecipado, com o indeferimento da realização da prova pericial. É o que de relevante havia para relatar. Decido. II – FUNDAMENTOS Inicialmente, cumpre destacar que na chamada emenda da reforma do Poder Judiciário, a EC nº 45/04, foi acrescentado entre os direitos e garantias fundamentais um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas (CF, art. 5º, LXXVIII). A irregularidade apontada pela Celpe no TOI é resultante de “intervenção interna, disco ciclométrico girando com dificuldade” (id. 134717033 - Pág. 7). Ou seja, a aferição do consumo era inferior que a real ante o obstáculo colocado no medidor de energia, que foi retirado com a inspeção da demandada. Logo, não há que se falar em perícia, eis a irregularidade apontada pela ré foi desfeita. O STJ entende que, “não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o julgador entender substancialmente instruído o feito, declarando a prescindibilidade de produção probatória, por se tratar de matéria eminentemente de direito ou de fato já provado documentalmente”. (STJ. AgRg no AREsp 20543/PR. Relator: Ministro Raul Araújo. Órgão julgador: Quarta Turma. Julgamento: 18.08.2015. Publicação: DJe 02.09.2015). O TJPE no julgamento da Apelação Cível nº 0049486-80.2021.8.17.2810, originária da 6ª Vara Cível da Comarca de Jaboatão dos Guararapes, decidiu que não constitui cerceamento de defesa quando o magistrado afasta o pedido de produção probatória, ante a convicção firmada diante do plexo fático-probatório contido nos autos, observe-se: “Argui a parte apelante preliminar de cerceamento de defesa, ante o indeferimento de produção de prova pericial contábil. No ponto, dispõe o Código de Processo Civil, in verbis: Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Pois bem. Sem necessidade de profundas digressões, registro que ao magistrado é dado afastar o pedido de produção probatória quando já houver convicção firmada diante do plexo fático-probatório contido nos autos, verificando-se o caso de diligências inúteis ou protelatórias, em avaliação a ser efetuada a seu critério”. (Segunda Câmara Cível do TJPE, Apelação Cível N. 0049486-80.2021.8.17.2810, Juízo de Origem: 6ª Vara Cível da Comarca de Jaboatão dos Guararapes, APELANTE: BANCO ITAU CONSIGNADO S/A, APELADA: MARIA DAS MERCES SANTOS DA SILVA, RELATOR: DESEMBARGADOR RUY TREZENA PATU JÚNIOR). Assim, em razão dos documentos anexados aos autos, o processo comporta o julgamento antecipado do mérito, a teor do disposto no art. 355, I, CPC. Estabelecidas essas premissas, cumpre recordar que, segundo o STJ, “ao juiz cabe apreciar a questão de acordo com o que entender atinente à lide. Não está obrigado a julgá-la conforme o pleiteado pelas partes, mas sim com seu livre convencimento, usando fatos, provas, jurisprudência, aspectos atinentes ao tema e legislação que entender aplicáveis ao caso”. (AgRg no Recurso Especial Nº 902.242/RS (2006/0251682-4) Relator: Eliana Calmon, Dj 04.11.2008). Na hipótese vertente, tenho que o pleito autoral não merece prosperar. Veja-se. Afirma a demandada que o medidor de energia não estava aferindo o consumo real da parte demandante, porque havia intervenção interna no aparelho. Para a resolução da questão em foco, é preciso ter em mente que, na condição de prestadora de serviço público, a demandada tem o poder-dever de observar se o usuário preenche os requisitos técnicos para o fornecimento de energia elétrica e de envidar diligências no sentido de coibir práticas atentatórias ao seu bom funcionamento. Nada há de ilegal nesse aspecto. Remunerado por preço público, o serviço pode ser suspenso diante do inadimplemento do consumidor; afinal, a empresa prestadora não pode ser compelida a fornecê-lo, sem a devida contraprestação, sob pena de pôr em risco o equilíbrio econômico-financeiro que lhe é assegurado pelo contrato de concessão. Condiciona-se a interrupção apenas ao aviso prévio. Como se nota, a ré detém poder de polícia ínsito ao serviço público delegado e sua atividade administrativa fiscalizadora independe de participação do consumidor para ter validade jurídica. Constatado pela equipe técnica que houve manipulação nas fiações, resultando na ausência ou diminuição do registro do real consumo de energia elétrica da unidade, é acertada a conduta da concessionária de fazer o refaturamento e trocar imediatamente o instrumento prejudicado. A subtração de energia constitui ato ilícito imputável ao usuário. É conduta reprovável que causa danos à sociedade, na medida em que os demais consumidores terão de arcar com os custos daquilo clandestinamente desviado. Como dito, verificada a derivação clandestina, é correto o refaturamento do consumo não registrado. O disposto acima não vai de encontro à Súmula 13 do TJPE, a qual determina como abusiva a suspensão do fornecimento por inadimplemento de débito apurado unilateralmente, decorrente de fraude no medidor. Isto porque a referida Súmula cuida de casos em que há irregularidade no aparelho de medição, o que exige perícia para que se comprove o benefício em favor do consumidor, bem como prova da conduta dolosa na adulteração do equipamento. Mas no presente caso, as fotografias anexadas pela demandada demonstram que havia desvio interno no medidor (e não defeito intrínseco deste aparelho), ou seja, a requerida provou fato modificativo do direito da parte autora, e que o TOI foi acompanhado por pessoa que estava responsável pelo imóvel no momento da inspeção (art. 373, II, CPC). Relativamente à desconstituição do débito e restituição de valores (não pagos), o pleito não merece guarida. O faturamento da recuperação do consumo seria devido ainda que não houvesse fraude ou má-fé do demandante. Ele deve arcar com a energia efetivamente utilizada, sob pena de enriquecimento injustificado, o que o ordenamento jurídico não permite (art. 884 do Código Civil). Para o arbitramento da recuperação de gasto não medido, quando há desvio de energia, os critérios são os fixados no art. 130 da Resolução Normativa n. 414/2010 da Aneel, a saber: a) medição fiscalizadora; b) fator de correção a partir da avaliação técnica do erro de medição; c) média dos três maiores valores de consumo até 12 ciclos completos de medição normal imediatamente anteriores ao início da irregularidade; d) carga desviada ou carga instalada no momento da constatação da irregularidade; e) valores máximos de consumo. A demandada utilizou o critério de carga instalada no momento da constatação da irregularidade, justificando a não utilização dos critérios anteriores. Tratando-se de critério prevista na resolução aplicável ao caso, nada há de ilegal em sua utilização. Não há qualquer nulidade na atuação administrativa da concessionária pública. Por estes motivos, improcede o pedido autoral. Além do mais, o STJ no julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.412.433/RS, da relatoria do Ministro Herman Benjamin, legitimou a conduta da ré nas suas inspeções. Observe-se: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036 DO CPC/2015) E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. SERVIÇOS PÚBLICOS. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. FRAUDE NO MEDIDOR DE CONSUMO. CORTE ADMINISTRATIVO DO SERVIÇO. DÉBITOS DO CONSUMIDOR. CRITÉRIOS. ANÁLISE DA CONTROVÉRSIA SUBMETIDA AO RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036 DO CPC/2015) 1. A concessionária sustenta que qualquer débito, atual ou antigo, dá ensejo ao corte administrativo do fornecimento de energia elétrica, o que inclui, além das hipóteses de mora do consumidor, débitos pretéritos relativos à recuperação de consumo por fraude do medidor. In casu, pretende cobrar débito oriundo de fraude em medidor, fazendo-o retroagir aos cinco anos antecedentes. TESE CONTROVERTIDA ADMITIDA 2. Sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (atualmente 1036 e seguintes do CPC/2015), admitiu-se a seguinte tese controvertida: "a possibilidade de o prestador de serviços públicos suspender o fornecimento de energia elétrica em razão de débito pretérito do destinatário final do serviço". PANORAMA GERAL DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ SOBRE CORTE DE ENERGIA POR FALTA DE PAGAMENTO 3. São três os principais cenários de corte administrativo do serviço em decorrência de débitos de consumo de energia elétrica por inadimplemento: a) consumo regular (simples mora do consumidor); b) recuperação de consumo por responsabilidade atribuível à concessionária; e c) recuperação de consumo por responsabilidade atribuível ao consumidor (normalmente, fraude do medidor). 4. O caso tratado no presente recurso representativo da controvérsia é o do item "c" acima, já que a apuração de débitos pretéritos decorreu de fato atribuível ao consumidor: fraude no medidor de consumo. 5. Não obstante a delimitação supra, é indispensável à resolução da controvérsia fazer um apanhado da jurisprudência do STJ sobre a possibilidade de corte administrativo do serviço de energia elétrica. (...) 7. Quanto a débitos pretéritos, sem discussão específica ou vinculação exclusiva à responsabilidade atribuível ao consumidor pela recuperação de consumo (fraude no medidor), há diversos precedentes no STJ que estipulam a tese genérica de impossibilidade de corte do serviço: (...) CORTE ADMINISTRATIVO POR FRAUDE NO MEDIDOR 8. Relativamente aos casos de fraude do medidor pelo consumidor, a jurisprudência do STJ veda o corte quando o ilícito for aferido unilateralmente pela concessionária. A contrario sensu, é possível a suspensão do serviço se o débito pretérito por fraude do medidor cometida pelo consumidor for apurado de forma a proporcionar o contraditório e a ampla defesa. (...) RESOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA 9. Como demonstrado acima, em relação a débitos pretéritos mensurados por fraude do medidor de consumo causada pelo consumidor, a jurisprudência do STJ orienta-se no sentido do seu cabimento, desde que verificada com observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. 10. O não pagamento dos débitos por recuperação de efetivo consumo por fraude ao medidor enseja o corte do serviço, assim como acontece para o consumidor regular que deixa de pagar a conta mensal (mora), sem deixar de ser observada a natureza pessoal (não propter rem) da obrigação, conforme pacífica jurisprudência do STJ. 11. Todavia, incumbe à concessionária do serviço público observar rigorosamente os direitos ao contraditório e à ampla defesa do consumidor na apuração do débito, já que o entendimento do STJ repele a averiguação unilateral da dívida. 12. Além disso, o reconhecimento da possibilidade de corte de energia elétrica deve ter limite temporal de apuração retroativa, pois incumbe às concessionárias o dever não só de fornecer o serviço, mas também de fiscalizar adequada e periodicamente o sistema de controle de consumo. 13. Por conseguinte e à luz do princípio da razoabilidade, a suspensão administrativa do fornecimento do serviço - como instrumento de coação extrajudicial ao pagamento de parcelas pretéritas relativas à recuperação de consumo por fraude do medidor atribuível ao consumidor - deve ser possibilitada quando não forem pagos débitos relativos aos últimos 90 (noventa) dias da apuração da fraude, sem prejuízo do uso das vias judiciais ordinárias de cobrança. 14. Da mesma forma, deve ser fixado prazo razoável de, no máximo, 90 (noventa) dias, após o vencimento da fatura de recuperação de consumo, para que a concessionária possa suspender o serviço. TESE REPETITIVA 15. Para fins dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015, fica assim resolvida a controvérsia repetitiva: Na hipótese de débito estrito de recuperação de consumo efetivo por fraude no aparelho medidor atribuída ao consumidor, desde que apurado em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, é possível o corte administrativo do fornecimento do serviço de energia elétrica, mediante prévio aviso ao consumidor, pelo inadimplemento do consumo recuperado correspondente ao período de 90 (noventa) dias anterior à constatação da fraude, contanto que executado o corte em até 90 (noventa) dias após o vencimento do débito, sem prejuízo do direito de a concessionária utilizar os meios judiciais ordinários de cobrança da dívida, inclusive antecedente aos mencionados 90 (noventa) dias de retroação. RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 16. Na hipótese dos autos, o Tribunal Estadual declarou a ilegalidade do corte de energia por se lastrear em débitos não relacionados ao último mês de consumo. 17. Os débitos em litígio são concernentes à recuperação de consumo do valor de R$ 9.418,94 (nove mil, quatrocentos e dezoito reais e noventa e quatro centavos) por fraude constatada no aparelho medidor no período de cinco anos (15.12.2000 a 15.12.2005) anteriores à constatação, não sendo lícita a imposição de corte administrativo do serviço pela inadimplência de todo esse período, conforme os parâmetros estipulados no presente julgamento. 18. O pleito recursal relativo ao cálculo da recuperação de consumo não merece conhecimento por aplicação do óbice da Súmula 7/STJ. 19. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015. (STJ. REsp 1412433/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 25/04/2018, DJe 28/09/2018). Quanto aos danos morais, entendo-os inexistentes, porque a parte autora deu causa ao infortúnio que passou, fazendo intervenção no medidor da unidade consumidora. Do mesmo modo, não há que se falar em reparação material ou em repetição de valores ou da cobrança em dobro, posto que as multas e o débito do consumo pretérito são devidos. Nesse sentido, em processo originário da 6ª Vara Cível desta Comarca, na Apelação Cível n. 0011577-09.2018.8.17.2810, o TJPE entendeu pela improcedência total do pleito autoral, em caso semelhante, observe-se: TJPE: Consumidor. Apelação Cível. Corte de energia elétrica. Cobrança devida. Corte legítimo. Danos morais. Não verificados. Repetição do indébito. Indevida. Recurso interposto pela parte autora não provido à unanimidade. Recurso interposto pela parte ré provido à unanimidade. 1. Constitui poder-dever das concessionárias inspecionarem os equipamentos de medição periodicamente, especialmente quando se suspeita da ocorrência de fraude e desvio de energia. 2. Segundo as normas editadas pela ANEEL, na Resolução nº 414/2010, o consumidor torna-se responsável pela adequação técnica e segurança das instalações internas das unidades consumidoras, o que engloba os danos e defeitos nestas decorrentes da má utilização e conservação das instalações ou do uso inadequado de energia. 3. A assinatura do Termo de Inspeção e Ocorrência (TOI), configura respeito da companhia energética ao contraditório. Com efeito, a Celpe fez prova nesse sentido ao colacionar o aludido termo na sua contestação. Ademais, a parte apelada deixou de fazer prova de ter impugnado administrativamente o débito, medida necessária para se desincumbir minimamente do ônus de comprovar o seu direito. 4. Nos termos da tese fixada no julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.412.433/RS, a limitação temporal de 90 dias pretéritos à cobrança diz respeito tão somente à possibilidade de corte do fornecimento de energia elétrica e não dos débitos anteriores a esse período retroativo. 5. Diante da regularidade da não há a configuração de danos morais indenizáveis. 6. Recurso interposto pela parte autora não provido, por unanimidade. 7. Recurso interposto pela parte ré provido, por unanimidade. (Apelação Cível n. 0011577-09.2018.8.17.2810, apelante: Creuza Maria da Silva, Apelada: Celpe – Companhia Energética de Pernambuco, Relator: Des. Eduardo Sertório Canto, data do julgamento: 20/07/2021). Para melhor fundamentar, transcrevo parte do didático voto do eminente Desembargador Eduardo Sertório Canto: “Constitui um poder-dever das concessionárias inspecionarem os equipamentos de medição periodicamente, especialmente quando se suspeita da ocorrência de fraude e desvio de energia. O Termo de Ocorrência de Inspeção (TOI) é um procedimento de fiscalização essencial para conferir legalidade à atuação da empresa prestadora de serviço de energia elétrica quanto a supostas irregularidades perpetradas pelos consumidores. O referido ato administrativo reveste-se de presunção de legitimidade e veracidade, portanto, é considerado válido, salvo prova em contrário. Segundo as normas editadas pela ANEEL, na Resolução nº 414/2010, o consumidor torna-se responsável pela adequação técnica e segurança das instalações internas das unidades consumidoras, o que engloba os danos e defeitos nestas decorrentes da má utilização e conservação das instalações ou do uso inadequado de energia. O consumidor é responsável pelos danos causados aos equipamentos de medição de energia elétrica instalados em sua unidade, pois se encontra na qualidade de depositário do equipamento, conforme Resolução 414/2010 da ANEEL. No caso concreto, a Celpe procedeu de forma legal e amparada pelas disposições normativas que visam resguardar o interesse público. Dos autos, verifico ter a Celpe comprovado a irregularidade na medição da unidade consumidora. Apresentou fotos constatando as irregularidades, bem como o histórico de consumo da unidade. Além disso, procedeu com o cálculo do débito devido conforme determina a resolução da ANEEL. Assim, não há dúvida da ocorrência de desvio de energia, bem como de ter a consumidora se beneficiado da prestação do serviço. (...). Além disso, observo não ter ocorrido cobrança de débito apurado de forma unilateral. A Celpe obedeceu o princípio do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Explico: A assinatura do Termo de Inspeção e Ocorrência (TOI), configura respeito da companhia energética ao contraditório (ID 12092895 - p. 20). Por outro lado, a parte apelada deixou de fazer prova de ter impugnado administrativamente o débito, medida necessária para se desincumbir minimamente do ônus de comprovar o seu direito. Assim, não verifico a ocorrência de restrição ao direito de defesa da parte apelada, inclusive, poderia ela, na esfera administrativa, ter solicitado perícia, conforme art. 129, § 4o, da Resolução n° 414/2010 ANEEL. Portando o caso concreto não diz respeito à aplicação da sumula nº 13/TJPE, a qual estabelece: É abusiva a suspensão do fornecimento de energia elétrica, quando motivada pelo inadimplemento de debito unilateralmente arbitrado pela concessionaria, pelo critério de estimativa de carga, após a constatação de suspeita de fraude. É importante salientar, que a súmula nº 13/TJPE é anterior resolução da ANEEL nº 414/2010, a qual passou a prever a rígida observância ao contraditório por parte das empresas prestadoras de serviços de energia elétrica. Ademais, a súmula só teria aplicabilidade em casos de débito unilateralmente arbitrado pela concessionária, fato não ocorrido no caso concreto, pois foi concedida a parte direito ao contraditório. Dos autos, não resta dúvida o respeito ao contraditório no momento em que foi realizado o TOI na presença da responsável pela unidade consumidora, para, caso desejasse, fazer a impugnação. A concessionária ainda encaminhou carta à parte autora informando o ocorrido e oportunizando a apresentação de reclamação e questionamento do débito. Assim, não prospera a alegação de violação ao devido processo legal administrativo, ampla defesa e contraditório. Nesse sentido já se manifestou o TJPE: PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. IRREGULARIDADES NO MEDIDOR. RECUPERAÇÃO DE CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA. OBSERVÂNCIA DO PROCEDIMENTO ESTABELECIDO NA RESOLUÇÃO Nº 414/2010-ANEEL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL ADMINISTRATIVO, AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. PERÍODO DA IRREGULARIDADE IGNORADO. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA APENAS DOS 6 (SEIS) ÚLTIMOS CICLOS (ART. 132, §1º, REN 414/2010). DÉBITO PARCIALMENTE DESCONSTITUÍDO. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE.1. Havendo prova da violação ao aparelho medidor, ante a variação substancial do perfil de consumo, a concessionária tem o poder-dever de proceder à recuperação de consumo da energia utilizada e não faturada. 2. As provas documentais trazidas aos autos dão conta de que a CELPE obedeceu ao trâmite procedimental imposto pela ANEEL através da Resolução nº 414/2010, mormente em relação à publicidade dos atos e correta informação às consumidoras, pelo que não prospera a alegação de violação ao devido processo legal administrativo, ampla defesa e contraditório.3. Todavia, considerando que a concessionária afirma desconhecer o período em que a irregularidade ocorreu, a cobrança deve ser limitada aos 6 (seis) ciclos imediatamente anteriores ao da constatação da irregularidade. Inteligência do art. 132, §1º, da Resolução nº 414/2010-ANEEL.4. Considerando que a cobrança administrativa levou em conta os 36 (trinta e seis) ciclos anteriores à data da descoberta da irregularidade, impõe-se a desconstituição parcial da dívida - e não total como consignado na sentença -, sendo válida, apenas, a dívida referente dos seis meses anteriores ao da comprovação do desvio de consumo.5. Apelação parcialmente provida. (Apelação 375648-70010378-13.2013.8.17.0001, Rel. Roberto da Silva Maia, 1ª Câmara Cível, julgado em 23/02/2016, DJe 01/04/2016). Ademais, ao contrário do entendido pelo magistrado a quo, não houve desrespeito ao julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.412.433/RS. Afinal, a limitação temporal de 90 dias pretéritos à cobrança diz respeito tão somente à possibilidade de corte do fornecimento de energia elétrica e não dos débitos anteriores a esse período retroativo. Senão vejamos: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036 DO CPC/2015) E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. SERVIÇOS PÚBLICOS. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. FRAUDE NO MEDIDOR DE CONSUMO. CORTE ADMINISTRATIVO DO SERVIÇO. DÉBITOS DO CONSUMIDOR. CRITÉRIOS. ANÁLISE DA CONTROVÉRSIA SUBMETIDA AO RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036 DO CPC/2015). (...) RESOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA 9. Como demonstrado acima, em relação a débitos pretéritos mensurados por fraude do medidor de consumo causada pelo consumidor, a jurisprudência do STJ orienta-se no sentido do seu cabimento, desde que verificada com observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. [...]12. Além disso, o reconhecimento da possibilidade de corte de energia elétrica deve ter limite temporal de apuração retroativa, pois incumbe às concessionárias o dever não só de fornecer o serviço, mas também de fiscalizar adequada e periodicamente o sistema de controle de consumo. 13. Por conseguinte e à luz do princípio da razoabilidade, a suspensão administrativa do fornecimento do serviço - como instrumento de coação extrajudicial ao pagamento de parcelas pretéritas relativas à recuperação de consumo por fraude do medidor atribuível ao consumidor - deve ser possibilitada quando não forem pagos débitos relativos aos últimos 90 (noventa) dias da apuração da fraude, sem prejuízo do uso das vias judiciais ordinárias de cobrança. 14. Da mesma forma, deve ser fixado prazo razoável de, no máximo, 90 (noventa) dias, após o vencimento da fatura de recuperação de consumo, para que a concessionária possa suspender o serviço. TESE REPETITIVA 15. Para fins dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015, fica assim resolvida a controvérsia repetitiva: Na hipótese de débito estrito de recuperação de consumo efetivo por fraude no aparelho medidor atribuída ao consumidor, desde que apurado em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, é possível o corte administrativo do fornecimento do serviço de energia elétrica, mediante prévio aviso ao consumidor, pelo inadimplemento do consumo recuperado correspondente ao período de 90 (noventa) dias anterior à constatação da fraude, contanto que executado o corte em até 90 (noventa) dias após o vencimento do débito, sem prejuízo do direito de a concessionária utilizar os meios judiciais ordinários de cobrança da dívida, inclusive antecedente aos mencionados 90 (noventa) dias de retroação. RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 16. Na hipótese dos autos, o Tribunal Estadual declarou a ilegalidade do corte de energia por se lastrear em débitos não relacionados ao último mês de consumo. [...] (REsp 1412433/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/04/2018, DJe 28/09/2018) . Nesse contexto, observo não ter ocorrido cobrança de débito apurado de forma unilateral. Afinal, a Celpe obedeceu o princípio do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, em conformidade com o procedimento previsto no art. 129 da Resolução Normativa nº 414/10. Dessa forma, não há como se reputar que a averiguação da dívida tenha se dado de forma unilateral pela concessionária de energia elétrica, tampouco que houvera violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa, razão pela qual entendo como justa a cobrança realizada, restando legítimo e existente o débito. Diante da regularidade da cobrança, não há a configuração de danos morais indenizáveis. Também não há como determinar o ressarcimento em dobro do valor cobrado (repetição do indébito), pois, nos termos do art. 42 do CDC este só é cabível quando o consumidor efetivamente paga pelo valor cobrado e no caso não houve pagamento da cobrança questionada. Por consequência, não há plausibilidade no pedido de majoração dos honorários advocatícios feito por Creuza. Face ao exposto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto por Creuza Maria da Silva e em DAR PROVIMENTO ao recurso interposto pela Celpe – Companhia Energética de Pernambuco, para reformar a sentença e: a) considerar a licitude da cobrança do débito por parte da concessionária, bem como de eventual corte no fornecimento de energia; b) Diante da inversão do ônus da sucumbência, condenar a parte autora ao pagamento integral das custas e honorários advocatícios, (nos termos fixados pela sentença), cuja exigibilidade resta suspensa em razão da gratuidade da justiça”. Por fim, ressalto que, diante da improcedência do pleito autoral, a decisão do TJPE no agravo deixa de produzir os seus efeitos, porque foi deferida em sede de cognição sumária e provisória, e a sentença é proferida em sede de cognição exauriente. Observe-se o entendimento do STJ: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROPOSTA DE AFETAÇÃO COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. DEFERIMENTO. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA DE MÉRITO. PERDA DE OBJETO. PREJUDICIALIDADE. 1. A Corte Especial do STJ, no julgamento do EAREsp 488.188/SP, firmou o entendimento de que, na hipótese de deferimento ou indeferimento da antecipação de tutela, a prolação de sentença meritória implica a perda de objeto do agravo de instrumento por ausência superveniente de interesse recursal, uma vez que: a) a sentença de procedência do pedido - que substitui a decisão deferitória da tutela de urgência - torna-se plenamente eficaz ante o recebimento da apelação tão somente no efeito devolutivo, permitindo desde logo a execução provisória do julgado (art. 520, VII, do CPC/1973); e b) a sentença de improcedência do pedido tem o condão de revogar a decisão concessiva da antecipação, ante a existência de evidente antinomia entre elas. 2. Hipótese em que, uma vez proferida a sentença de mérito, de cognição exauriente, tem-se a perda superveniente do objeto do presente agravo, razão pela qual ele não deve ser submetido ao regime procedimental previsto no art. 1.036 do CPC/2015. 3. Proposta de afetação rejeitada. (PROAFR no Agravo em Recurso Especial nº 1.221.912/RJ (2017/0323126-2), 1ª Seção do STJ, Rel. Napoleão Nunes Maia Filho. j. 04.12.2018, DJe 25.02.2019). Da mesma forma, decidiu o TJDFT: “Com a cognição exauriente da sentença e a improcedência dos pedidos do autor, não há descumprimento de decisão proferida no agravo de instrumento, com imposição de multa ao réu, porquanto a decisão proferida em cognição sumária deixa de gerar efeitos em face da prolação da sentença, que julgou improcedentes os pedidos iniciais, com a consequente revogação da tutela de urgência anteriormente concedida. In casu, é indiscutível a provisoriedade da tutela antecipada que subsiste enquanto a tutela definitiva não a substituir, porquanto a permanência dos descontos no limite de 30% na conta-corrente, em razão de empréstimos realizados, é incompatível com o que fora decidido no mérito da demanda. (...). Agravo interno e recurso de apelação conhecidos e desprovidos”. (Processo nº 07046306220188070000 (1157810), 5ª Turma Cível do TJDFT, Rel. Silva Lemos. j. 14.03.2019, DJe 10.04.2019). Em suma, o pedido autoral é improcedente. Por conseguinte, a decisão do agravo de instrumento deixa de gerar efeitos a partir da publicação da sentença. III – DISPOSITIVO Diante do exposto, e por tudo que dos autos consta, nos termos do art. 487, inciso I, segunda parte, CPC, JULGO IMPROCEDENTE o pedido autoral. Em observância ao princípio da causalidade, condeno a parte demandante ao pagamento das custas processuais, e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (tabela do Encoge, desde a distribuição da ação), com base no art. 85, § 2°, CPC. No entanto, fica suspensa a exigibilidade das verbas sucumbenciais, na forma do art. 98. § 3º, CPC. Oficie-se ao Relator do agravo de instrumento (id. 165999138), com cópia desta sentença, para conhecimento. Havendo recurso de apelação, certifique-se sobre a tempestividade. Logo após, intime-se a parte recorrida para as contrarrazões em 15 dias. Da mesma forma, proceda-se caso apresentada preliminar recursal. Decorrido o prazo, com ou sem resposta, enviem-se os autos ao TJPE. Após o trânsito em julgado, ausente requerimento, arquivem-se os autos. P. R. I. CUMPRA-SE. Jaboatão dos Guararapes, 04/04/2025. José Carvalho de Aragão Neto Juiz de Direito
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