Processo nº 0808045-22.2025.8.14.0000
ID: 259789635
Tribunal: TJPA
Órgão: 2ª Turma de Direito Privado - Desembargadora MARGUI GASPAR BITTENCOURT
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 0808045-22.2025.8.14.0000
Data de Disponibilização:
24/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DIOGO DE AZEVEDO TRINDADE
OAB/PA XXXXXX
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PROCESSO Nº 0808045-22.2025.8.14.0000 ÓRGÃO JULGADOR: 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO PROCESSO DE REFERÊNCIA: 0824287-26.2025.8.14.0301 COMARCA: BELÉM/PA (3ª VARA CÍVEL E EM…
PROCESSO Nº 0808045-22.2025.8.14.0000 ÓRGÃO JULGADOR: 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO PROCESSO DE REFERÊNCIA: 0824287-26.2025.8.14.0301 COMARCA: BELÉM/PA (3ª VARA CÍVEL E EMPRESARIAL) AGRAVANTE: SULIVAN RODRIGUES TRINDADE ADVOGADO: RAFAEL AIRES DA SILVA COSTA ADVOGADA: LARISSA DAS GRAÇAS FREITAS SALES AGRAVADA: UNIMED DE BELÉM – COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO ADVOGADO: SEM ADVOGADO CONSTITUÍDO NOS AUTOS RELATORA: DESEMBARGADORA MARGUI GASPAR BITTENCOURT DECISÃO INTERLOCUTÓRIA Recebido hoje. Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de liminar, interposto por Sulivan Rodrigues Trindade, contra decisão proferida pelo Juízo de Direito da 3ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Belém/PA que indeferiu – nos autos da ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais (Processo nº 0824287-26.2025.8.14.0301), ajuizado em face da Unimed Belém – Cooperativa de Trabalho Médico –, “a antecipação dos efeitos da tutela liminar pretendida, para não concessão imediata da obrigação de fornecimento imediato pela requerida do medicamento Dasatinibe para o requerente, em razão de que embora comprovação do eventual risco de dano a saúde do autor para a continuidade do tratamento adequado ao restabelecimento da saúde do postulante, não ficou a priori, demonstrada a probabilidade da existência do direito pleiteado”. Em suas razões, sustenta que a decisão de primeiro grau põe em risco iminente sua vida e saúde, dado o caráter essencial e contínuo do tratamento, como atestado em laudos médicos anexados. Argumenta que estão presentes os requisitos do art. 300 do CPC – verossimilhança das alegações e perigo de dano irreparável –, sendo o medicamento prescrito por profissional especializado e autorizado pela ANVISA. Defende o direito fundamental à saúde, previsto no art. 6º e art. 196 da Constituição Federal, além da obrigação contratual da operadora de plano de saúde de cobrir tratamento prescrito, independentemente de sua presença no rol da ANS, conforme entendimento do STJ (EREsp 1.886.929/SP). Pede a concessão de tutela recursal para compelir a Unimed Belém ao fornecimento imediato do fármaco sob pena de multa, e ao final, a reforma da decisão agravada. É o relatório do necessário. Decido. Como é de conhecimento geral, o agravo de instrumento é recurso secundum eventum litis, cabendo ao órgão revisor analisar o acerto ou desacerto da decisão objurgada, vedado o pronunciamento acerca de matéria que não foi objeto do decisum, sob pena de supressão de instância. Acerca do tema, oportunas se fazem as preciosas lições do eminente Ministro Luiz Fux, do excelso Supremo Tribunal Federal: “O efeito devolutivo importa devolver ao órgão revisor da decisão a matéria impugnada nos seus limites e fundamentos. Toda questão decidida tem uma extensão e suas razões. Em face do princípio do duplo grau, o órgão revisor da decisão deve colocar-se nas mesmas condições em que se encontrava o juiz, para aferir se julgaria da mesma forma e, em consequência, verificar se o mesmo incidiu nos vícios da injustiça e da ilegalidade. Por essa razão, e para obedecer essa identidade, é que se transfere ao tribunal (devolve-se) a matéria impugnada em extensão e profundidade.” (in Curso de Direito Processual Civil: Processo de Conhecimento, 4ª ed., Forense: 2008, p. 753). Assim, pode-se afirmar que o órgão ad quem está adstrito ao exame, no agravo de instrumento, dos elementos que foram objeto de análise pelo Juízo de origem. Não se admite o conhecimento originário pelo órgão revisor de nenhuma outra matéria, haja vista que suprime do Juízo de 1º grau a possibilidade de analisá-la, em manifesta ofensa ao sistema processual vigente, ainda que a matéria suscitada seja de ordem pública. Nesse diapasão, revela-se imperiosa a transcrição, de parte específica, do ato recorrido (PJe ID nº 26.331.339 – p. 42/47): “Tratam os autos de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA proposta por SULIVAN RODRIGUES TRINDADE em face de UNIMED BELEM COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO. O autor comprovou que está vinculado ao plano de saúde oferecido pela parte requerida (140234677 - Pág. 1) e, ainda, que está em dia com o pagamento mensal da mensalidade pertinente (140234678 - Pág. 1). A parte autora relatou que, em Fevereiro/2025, submeteu-se a uma cirurgia para retirada de apêndice; nessa ocasião, houve a suspeita de leucemia pelo Setor de Hematologia, que passou diversos exames para o fechamento do diagnóstico. Ocorre que nem todos os exames foram de pronto autorizados pela parte requerida consoante Documentos de ID nº 140234674 - Pág. 1 e ID nº 140234676 - Pág. 1. Esse exame, segundo o autor, era primordial para o fechamento do diagnóstico. Em 15/03/2025, o autor internou-se, já em estado grave (febre, anemia etc.), no Hospital Beneficente, quando foi submetido a exames (inclusive, aquele referido como essencial ao fechamento do diagnóstico); nessa ocasião, foi confirmado o quadro de LLA - Leucemia Linfocítica (Linfoblástica) Aguda com a presença do Cromossomo Ph+. Em 20/03/2025, pela gravidade da situação, o postulante foi transferido para o Hospital Porto Dias, no qual se encontra internado até os dias atuais. O médico responsável pelo atual tratamento do requerente requisitou da parte postulada medicamento Dasatinibe, o qual se demonstra como melhor em se tratando de sucesso terapêutico em relação aos medicamentos de primeira geração (Recomendação 1C - Haddad. F.G et all 2022). Além disso, afirmou que o sucesso de sua utilização chegaria em torno de um aumento de 40% a 60% de sobrevida (Laudo de ID nº 140234669, da lavra de Dr. João Maravalhas Barros, CRM 13.328, responsável pelo setor de Hematologia do respectivo hospital). A parte postulada, porém, consoante Documento de ID nº 140234671 - Pág. 1, negou a liberação do medicamento “Desfavorável. Fora da DUT64. Conforme a mesma, indicação de dasatinibe: LLA - Leucemia Linfocítica (Linfoblástica) Aguda: Cromossomo Ph+ com resistência ou intolerância à terapia anterior.”. A parte autora postulou, com fulcro nos artigos 300 do CPC e 84, § 3º, da Lei nº 8.078/90, a ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA PRETENDIDA, para que determine ao Plano de Saúde requerido que, no prazo de 48 h, autorize e/ou forneça o remédio referido. É o relatório. Decido. DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA DEFIRO a gratuidade postulada. DO PEDIDO ANTECIPATÓRIO O artigo 300 do Código de Processo Civil (CPC) prevê, como requisitos necessários à concessão da tutela de urgência antecipatória, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Ademais, no artigo 300, § 3º, do CPC, dispõe que a medida não será concedida caso haja a irreversibilidade dos efeitos da decisão. a) Quanto à urgência e ao risco de dano irreversível Por se tratar de caso de tratamento de saúde, no qual existem laudos médicos comprovando o delicado estado de saúde do autor que testificam a necessidade de o mesmo permanecer internado e, ainda, a essencialidade de ser realizado tratamento adequado, entendo como incontestável a existência de perigo de dano irreversível à vida e à saúde do paciente autor. Dessa forma, o risco de dano atual ou iminente irreparável ou de difícil reparação ao direito à prestação de serviços de saúde ao autor está evidenciado, por se tratar de grave estado de saúde de pessoa internada desde 15/03/2025. Com isso, entendo como configurada a existência de dano irreparável ou de difícil reparação, uma vez que o estado de saúde da paciente já é crítico e a falta do tratamento adequado poderá lhe causar graves sequelas ou até mesmo com risco atual ou iminente de morte, não podendo aguardar a dilação probatória exauriente até o final do processo. Assim, passo à análise da probabilidade do direito. b) Quanto à probabilidade do direito postulado Sobre a probabilidade do direito postulado, importa salientar que restou comprovado nos autos que o postulante está legalmente vinculado ao plano de saúde requerido e que o pagamento de sua mensalidade está em dia. Além disso, restou comprovado por laudo médico e documentos referentes às internações do autor, que o mesmo se encontra diagnosticado com LLA - Leucemia Linfocítica (Linfoblástica) Aguda com a presença do Cromossomo Ph+. Pelo laudo constante do processo, entendo como comprovada a necessidade de o autor receber tratamento adequado da prestadora requerida de acordo com a prescrição médica. No tema, porém, deve-se salientar que a parte postulada indeferiu o medicamento com base na DUT 64 (RN 465/2021 e suas alterações), da lavra da Agência Nacional de Saúde (ANS). Segundo a norma referida, a ANS somente considera como imperativa a concessão do medicamento Dasatinibe quando comprovadamente existir “resistência ou intolerância à terapia anterior”. (Disponível em https://www.ans.gov.br/images/stories/Legislacao/rn/Anexo_II_DUT_2021_RN_465.2021_RN610_RN611_RN612.pdf). No caso, todavia, não há a comprovação dessa resistência ou intolerância a tratamento anterior; sobre o tema, a parte autora somente afirma, na exordial, que “a ré deu como opção ao autor a demanda judicial (parecer da auditoria da ré) e remédio muito inferior que não tem a eficácia ao caso concreto, apenas pelo motivo de ser mais barato que o receituado pelos médicos no caso do autor.”. Sobre a obrigatoriedade de prestação de medicamento não previsto no rol da ANS, importante salientar que a jurisprudência majoritária entende pela impossibilidade de impingir às prestadoras de planos de saúde a concessão de medicamentos que não se encontram arrolados no DUT 64 da (RN 465/2021 e suas alterações), da lavra da Agência Nacional de Saúde (ANS). Compreensível esse posicionamento, já que é verídica a limitação da cobertura dos tratamentos pelos planos de saúde, até para manter viável o sistema que os sustenta baseado na solidariedade, e ainda em vista das consequências das coberturas indiscriminadas para tratamentos, o que pode levar ao aumento da sinistralidade e, por conseguinte, ao reajuste das mensalidades penalizando todos os participantes de planos. Sob estes fundamentos, considerando que o medicamento vindicado encontra-se previsto no rol da ANS, desde que haja “resistência ou intolerância à terapia anterior” e, no caso em comento, não houve a comprovação dessa resistência e/ou intolerância, não há como exigir a concessão do medicamento da prestadora requerida. Transcrevem-se jurisprudências correlatas: APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. FISIOTERAPIA PELO MÉTODO THERASUIT. ROL DA ANS. AUSÊNCIA DE OBRIGATORIEDADE DE COBERTURA. DANO MORAL AFASTADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO, À UNANIMIDADE. 1. Plano de saúde. Tratamento TheraSuit. Método não previsto no Rol da ANS. Ausência de comprovação científica acerca da superioridade do método em relação ao tratamento convencional. Inexistência de cobertura obrigatória. Jurisprudência do STJ e deste TJPA. Reforma da sentença que se impõe. (...). (TJPA – APELAÇÃO CÍVEL – Nº 0807696-62.2020.8.14.0301 – Relator(a): RICARDO FERREIRA NUNES – 2ª Turma de Direito Privado – Julgado em 24/09/2024 ) Direito civil e consumidor. Apelação cível. Plano de saúde. Ação de obrigação de fazer. Tratamento pelo método therasuit. Ausência de cobertura contratual obrigatória. Provimento. (...). 2. A questão em discussão consiste em saber se é obrigatório ao plano de saúde fornecer o procedimento fisioterápico de reabilitação pelo método Therasuit indicado ao autor pelo seu médico assistente, o qual não estaria previsto no Rol de Procedimentos da ANS. (...). 4. Jurisprudência do STJ e deste Tribunal no sentido de ausência de obrigatoriedade de cobertura do tratamento, considerando parecer desfavorável do NAT-JUS NACIONAL e do Conselho Federal de Medicina. (...). Tese de julgamento: “Não é abusiva a negativa de cobertura de procedimento fisioterápico de reabilitação pelo método THERASUIT por operadora de plano de saúde, ante a ausência de previsão no Rol de Procedimentos da ANS e não enquadramento nas exceções legais”. ___________ Dispositivos relevantes citados: Lei nº 9.656/1998, art. 10, §13º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 2.024.997/SC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 12.12.2023. (TJPA – APELAÇÃO CÍVEL – Nº 0837126-93.2019.8.14.0301 – Relator(a): RICARDO FERREIRA NUNES – 2ª Turma de Direito Privado – Julgado em 24/09/2024) EMENTA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PACIENTE PORTADOR DE SÍNDROME ARTROGRIPOTICA E PÉ TORTO. TRATAMENTO THERASUIT. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NO ROL DA ANS. ROL TAXATIVO. EXCEÇÃO PREVISTA NA LEI 14.454/2022 NÃO COMPROVADA NOS AUTOS. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O rol de cobertura previsto pela ANS é taxativo, porém a Lei nº 14.454/2022 prevê duas exceções para cobertura caso o tratamento ou procedimento prescrito pelo médico não estejam previstos. 2. A fim de que seja devida a cobertura pela operadora do plano de saúde, deve a parte interessada comprovar que o procedimento prescrito se enquadra nas exceções previstas nos incisos I e II, do § 13º, do art. 10 da Lei 9.656/1998. 3. Não restando devidamente comprovado o enquadramento nas exceções previstas no dispositivo legal, não incide a obrigatoriedade da operadora do plano de saúde em custear o tratamento pelo método therasuit, prescrito pelo médico assistente do paciente. 4. Recurso conhecido e provido. (TJPA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – Nº 0808726-60.2023.8.14.0000 – Relator(a): AMILCAR ROBERTO BEZERRA GUIMARAES – 2ª Turma de Direito Privado – Julgado em 28/11/2023) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. CUSTEIO DE MEDICAMENTO OMALIZUMABE PARA TRATAMENTO DE URTICÁRIA CRÔNICA ESPONTÂNEA IDIOPÁTICA (CID 10 L50.1). TAXATIVIDADE MITIGADA DO ROL DA ANS. SÚMULA N. 283/STJ. REQUISITOS PREENCHIDOS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. ASTREINTES. SÚMULA N. 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. (...) A Segunda Seção do STJ, no julgamento dos EREsps n. 1.886.929/SP e 1.889.704/SP, consolidou orientação no sentido da taxatividade mitigada do rol de procedimento e eventos em saúde suplementar da ANS, admitindo flexibilização em situações excepcionais, cabalmente demonstradas. Colhe-se do julgado o seguinte excerto: 1 - o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar é, em regra, taxativo; 2 - a operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do Rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao Rol; 3 - é possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extra Rol; 4 - não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do Rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao Rol da Saúde Suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como CONITEC e NATJUS) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS. Posteriormente, em 22/9/2022, entrou em vigor a Lei n. 14.454/2022, estabelecendo, no § 13 do art. 10 da Lei n. 9.656/1998, as condições para a cobertura obrigatória, pelas operadoras de planos de saúde, de procedimentos e eventos não listados naquele rol, a saber: I - exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou II - existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais. (...). Diante desse entendimento, a necessidade de cobertura de procedimentos ou medicamentos não previstos no rol da ANS deve ser analisada em cada caso, podendo ser admitida, de forma excepcional, desde que esteja amparada em critérios técnicos. (...). AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA. VÁLVULA TAVI. NATUREZA TAXATIVA DO ROL DA ANS. MITIGAÇÃO DA TAXATIVIDADE. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar da ANS é de taxatividade mitigada em situações excepcionais, devidamente demonstradas (EREsp n. 1.886.929/SP e EREsp n. 1.889.704/SP, Segunda Seção). 2. Aplicam-se as Súmulas n. 5 e 7 do STJ ao caso em que o acolhimento da tese defendida no recurso especial reclama a análise de cláusulas contratuais e dos elementos probatórios produzidos ao longo da demanda. 3. Agravo interno parcialmente provido. (AgInt no REsp n. 2.012.349/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 12/8/2024, DJe de 15/8/2024.) (...). (AREsp n. 2.511.671, Ministro Humberto Martins, DJEN de 02/04/2025) c) Da irreversibilidade da medida Sublinha-se que a concessão do medicamento neste momento ou em momento posterior à comprovação da indicação da ANS, qual seja, “resistência ou intolerância à terapia anterior”, não se aplica a regra processual da não concessão em caso de irreversibilidade da medida. DISPOSITIVO Ante o exposto, por conta das razões expostas, ausente os pressupostos legais do art. 300 do CPC,INDEFIRO a antecipação dos efeitos da tutela liminar pretendida, para não concessão imediata da obrigação de fornecimento imediato pela requerida do medicamento Dasatinibe para o requerente , em razão de que embora comprovação do eventual risco de dano a saude do autor para a continuidade do tratamento adequado ao restabelecimento da saúde do postulante, não ficou a priori, demonstrada a probabilidade da existencia do direito pleiteado pelas razões e fundamentos já expostos. CITE-SE a parte requerida para apresentar contestação no prazo legal de 15 dias, sob pena de revelia e confissão a matéria fática. INTIME-SE a parte requerida acerca do conteúdo desta decisão. Servirá a presente decisão, por cópia digitalizada, como MANDADO DE CITAÇÃO/INTIMAÇÃO/AR/OFÍCIO/CARTA PRECATORIA, nos termos do Provimento nº 003/2009, com a redação dada pelo Provimento nº 11/2009, ambos da CJRMB. Cumpra-se com URGÊNCIA, em PLANTÃO JUDICIAL, na forma e sob as penas da lei. Após, deve o presente processo ter seguimento na Vara de Origem”. Pois bem. Como se observa, apesar de o Juízo a quo reconhecer a existência de risco de dano irreparável à saúde do autor, internado desde 15/03/2025 em estado grave, e a necessidade de tratamento urgente, a tutela foi indeferida por ausência de probabilidade do direito, sob o argumento de que: 1) a inexistência de comprovação da exceção prevista no DUT 64 da ANS; e 2) a necessidade de se observar a taxatividade do rol da Agência Nacional de Saúde como parâmetro. Passo a análise do pedido de implementação de tutela de urgência recursal. Para fins de concessão de tutela de urgência, pautada pelo juízo da aparência, necessário, além da probabilidade do direito e do risco de dano de difícil reparação, prudência e comedimento, para que não se infrinjam os princípios do devido processo legal, contraditório e da ampla defesa, a serem respeitados no curso do processo de conhecimento. A respeito da tutela de urgência, dispõe o artigo 300 do CPC: "Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. § 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia. § 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão." Nesse aspecto, relevantes as considerações tecidas por Cássio Scarpinella Bueno: "A concessão da tutela de urgência pressupõe: (a) probabilidade do direito e (b) perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (art. 300, caput ). São expressões redacionais do que é amplamente consagradas as expressões latinas fumus bonis iuris e periculum in mora , respectivamente." ( Novo Código de Processo Civil Anotado, Editora Saraiva, 2015, p. 219). Na mesma linha, "(...) Também é preciso que a parte comprove a existência da plausibilidade do direito por ela afirmado (fumus boni iuris). Assim, a tutela de urgência visa assegurar a eficácia do processo de conhecimento ou do processo de execução (...)" (Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil Comentado, 16a ed., Editora Revista dos Tribunais, p. 931). Na hipótese, é incontroverso o contrato firmado entre as partes, o diagnóstico recebido pelo paciente agravante, de Leucemia Linfocítica (Linfoblástica) Aguda com a presença do Cromossomo Ph+ (Philadelphia positivo CID c91.0) e a prescrição médica de fármacos oncológicos para o tratamento da doença, com a inclusão de dasatinibe 100mg, 1x ao dia, por uso contínuo (PJe Id nº 26.331.339). A ANS tem a diretriz de utilização n. 64, regulamentando a cobertura do fármaco DASATINIBE para tratamento de leucemia linfocítica (linfoblástica) aguda com presença do cromossomo Filadélfia positivo e resistência/intolerância à terapia anterior, conforme consta no anexo II da RN 465/2021. Ao menos em um primeiro momento, a indicação do medicamento parece atender à DUT, com exceção apenas da informação quanto à intolerância ou resistência à terapia anterior. Isso não impede o reconhecimento do dever de fornecimento, tendo em vista que o Superior Tribunal de Justiça reafirmou jurisprudência para que, em casos de oncologia (área altamente dinâmica na evolução de tratamentos médicos), haja relativização maior das Diretrizes de Utilização da ANS: “CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS . CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO DE CÂNCER. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PRESCRITO POR MÉDICO ASSISTENTE. ROL DE PROCEDIMENTOS DA ANS . DESIMPORTÂNCIA. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1 . Nos termos da jurisprudência deste Corte, a natureza taxativa ou exemplificativa do rol da ANS é desimportante à análise do dever de cobertura de medicamentos para o tratamento de câncer, em relação aos quais há apenas uma diretriz na resolução normativa. Precedentes. 2. Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos . 3. Agravo interno não provido”. (STJ - AgInt no REsp: 2057814 SP 2023/0077563-6, Relator.: MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 29/05/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 31/05/2023). De mais a mais, eventuais diretrizes do órgão regulador (DUT64) devem ser interpretadas de forma sistemática, na perspectiva do conjunto das normas de regência, pelo que no caso não se pode excluir o tratamento prescrito. Não se pode perder de vista que a Lei n. 14.454/2022, introduziu o § 13 ao art. 10 da Lei n. 9.656/1998, e exige que seja autorizado o tratamento de saúde não previsto no rol da ANS, desde que: “Art. 10. [...] § 13. Em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam previstos no rol referido no § 12 deste artigo, a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, desde que: I - exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou II - existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais”. Paralelamente, conquanto seja possível a exclusão no que concerne a medicamentos de uso domiciliar, a incidência do art. 10, VI, da Lei n. 9.656/98 está aberta à interpretação analógica, visto que o fato de o tratamento se realizar em domicílio, em razão do avanço científico, não pode servir para progressivamente afastar a responsabilidade das operadoras pelo seu custeio. Nesse aspecto, ao menos em um primeiro momento, a prescrição médica parece pertinente no tratamento do câncer apresentado pelo autor, pois fundamentada em medicamento que pode promover sobrevida, com melhor qualidade, ao paciente, ora agravante. Se o médico que acompanha de perto o caso entende que é melhor iniciar a terapia com o DASATINIBE, parece deletério ter que obrigar o paciente a tentar outra linha de tratamento oncológico para, só então, em caso de falha, introduzir o medicamento. No mais, não é razoável que a agravada tenha que aguardar a solução de controvérsia acerca da possibilidade de custeio de seu tratamento, pautada em alegação de ineficácia que pode ser dirimida ao longo da instrução processual, sob risco de agravamento de seu quadro clínico, mormente em se tratando de doença agressiva, em fase aguda, e de alto percentual de letalidade. Por fim, a reversibilidade no caso não tem relação com a concretização do tratamento prescrito, mas com o dispêndio patrimonial da agravante para a cobertura, que pode ser, caso improcedente a pretensão ao final do processo, objeto do devido ressarcimento financeiro. Logo, a probabilidade do direito e o perigo de dano aparentam estar com o paciente e não com a operadora. Por todo o exposto, sendo o caso de incidência do inciso I do artigo 1019 do CPC, defiro, em antecipação de tutela, a pretensão recursal, no sentido de determinar que a parte agravada, no prazo de 48h (quarenta e horas), autorize/forneça o medicamento Dadatinibe 100mg, conforme prescrito no Laudo Médico (PJe Id nº 26.331.339), sob pena de multa diária de quinhentos reais, limitada a cem mil reais. Comunique o conteúdo desta decisão ao Juízo de Direito da 3ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Belém/PA. Intime-se a parte agravada para que, desejando, se manifeste no prazo de 15 dias. Servirá a presente decisão como mandado/ofício. Belém – PA, 23 de abril de 2025. Desembargadora MARGUI GASPAR BITTENCOURT Relatora
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