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Moacir Paulo Diniz x Omni S/A Credito Financiamento E Investimento

ID: 262965134

Tribunal: TJMG Órgão: 2ª Vara Cível da Comarca de Sete Lagoas Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5000921-18.2024.8.13.0672

Data de Disponibilização: 30/04/2025

Polo Ativo:

MOACIR PAULO DINIZ

Polo Passivo:

OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

Intimação

Advogados:

JULIANO RICARDO SCHMITT

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

JAISSON FELIPE DE SOUZA

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Sete Lagoas / 2ª Vara Cível da Comarca de Sete Lagoas Rua José Duarte de Paiva, 715, Jardim Cambuí, Centro, Sete La… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Sete Lagoas / 2ª Vara Cível da Comarca de Sete Lagoas Rua José Duarte de Paiva, 715, Jardim Cambuí, Centro, Sete Lagoas - MG - CEP: 35700-059 PROCESSO Nº: 5000921-18.2024.8.13.0672 CLASSE: [CÍVEL] PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO: [Cédula de Crédito Bancário, Tarifas] AUTOR: MOACIR PAULO DINIZ CPF: 083.177.496-73 RÉU: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO CPF: 92.228.410/0001-02 SENTENÇA Vistos, etc. MOACIR PAULO DINIZ, devidamente qualificada, ajuizou a presente AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO contra OMNI S.A, também qualificado, sob o argumento de que firmou com a parte requerida um contrato de financiamento para aquisição de um veículo. Entretanto, afirma que tal contrato está eivado de cláusulas abusivas. Assim, após vasta explanação sobre o cabimento jurídico da pretensão, requer: a limitação da taxa de juros remuneratórios à média do mercado; a redução do valor cobrado a título de Tarifa de Cadastro, para a média praticada divulgada pelo BACEN; sejam decotadas do contrato as cláusulas abusivas referentes às tarifas de “Avaliação do Bem”, “Seguro” e “Assistência Veicular”; sejam restituídos em dobro os valores cobrados a maior. Com a petição inicial vieram documentos. Devidamente citada, a ré apresentou contestação. Preliminarmente, impugna a gratuidade de justiça concedida ao autor.No mérito, defende a legalidade dos encargos contratuais impugnados. Impugnação apresentada. As partes não manifestarem interesse na produção de outras provas. A ré desistiu da impugnação à gratuidade de justiça. É o relatório. Decido. Processo em ordem, sem vício que possa inquiná-lo de nulidade. Inicialmente, quanto à impugnação à gratuidade de justiça, deve ser rejeitada, uma vez que o autor, quando instado por este juízo, comprovou satisfatoriamente a sua hipossuficiência financeira, juntando carteira de trabalho, extrato bancário e comprovante de ausência de declaração de imposto de renda. Rejeito, portanto, a preliminar arguida. Os pedidos comportam julgamento antecipado, uma vez que a matéria é nitidamente interpretativa, sem necessidade de outras provas para fins de prestação jurisdicional completa, bastando os documentos já juntados. A rigor, a prova pericial deverá ser feita em eventual liquidação de sentença, ou seja, na hipótese de procedência – parcial ou total – do pedido. Isso porque antes de se efetuarem os cálculos, impõe-se o julgamento de matéria de direito com apreciação dos pedidos de revisão das cláusulas, sob pena de o perito não ter parâmetros para a elaboração de seus cálculos. Indefiro, portanto, a produção de prova pericial. Passa-se à análise dos pedidos. LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS Consoante proclamam as Súmulas Vinculantes nº 07 e 596 do excelso Supremo Tribunal Federal, as instituições financeiras não estão sujeitas à limitação das taxas de juros remuneratórios prevista no Decreto nº 22.626/33. A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade, como dispõe a Súmula 382 do C.STJ. Contudo, eventual cobrança de taxa de juros abusivos poderá sofrer limitação pelo Banco Central ou a revisão do contrato perante o Poder Judiciário. Compete, pois, verificar, caso a caso, a abusividade da cobrança. Pois bem. O Colendo STJ, ao julgar o REsp. nº. 1.061.530/RS, sob a forma de recurso repetitivo, expediu orientação no sentido de que: “ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.” Da referida orientação, verifica-se que os juros remuneratórios não estão sujeitos a qualquer limitação a princípio, podendo ser cobrados da forma como ajustados entre os próprios contratantes, salvo abusividade devidamente comprovada. A jurisprudência tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média Utilizando-se a taxa média de mercado dos juros cobrados nos contratos de financiamento de veículos, divulgada pelo Banco Central do Brasil para o período em que a contratação se consumou, a taxa de juros mensal era de 1,95%, enquanto a anual era de 26,06% (extrato anexo). Por assim ser, resta configurada a abusividade na cobrança dos juros remuneratórios pela ré, uma vez que a taxa cobrada superou a média do mercado existente à época da contratação, cuja consequência não é outra senão na redução da taxa para uma vez e meia a média de mercado. REDUÇÃO DA TARIFA DE CADASTRO Acerca da tarifa de cadastro, o STJ decidiu por sua licitude em sede de julgamento de Recurso Especial repetitivo 1.251.331/RS e REsp 1.255.573-RS (art. 543-C do CPC, incluído pela Lei 11.672/2008) que não permite julgamento diverso pelos Tribunais Estaduais. Além disso, de acordo com a súmula 566, “nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira”. No caso, a parte autora questiona o valor cobrado a título de cadastro. Entretanto, apesar da cobrança excessiva, não resta evidenciado que a parte autora está em desvantagem exagerada, a ponto de recomendar a intervenção judicial no contrato firmado, de modo que segue o valor tal como cobrado. Nesse sentido: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - PRETENSÃO REVISIONAL DE CONTRATO IMOBILIÁRIO - COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE LOTE - ALEGAÇÃO DE ERRO SUBSTANCIAL - CAUSA DE PEDIR INCOMPATÍVEL COM A PRETENSÃO REVISIONAL DE CONTRATO - CLÁUSULA DE REAJUSTE DAS PARCELAS - DISPOSIÇÃO CLARA E SUFICIENTE - PRÉVIO CONHECIMENTO DO PROMISSÁRIO COMPRADOR - CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IGPM - POSSIBILIDADE - ONEROSIDADE EXCESSIVA DO CONTRATO - NÃO VERIFICADA. [...] 5. A intervenção do Poder Judiciário nas relações contratuais deve ser mínima, justificável apenas em excepcionais situações de defeitos e dificuldades insuperáveis e justificadas no cumprimento da obrigação, ou seja, situações comprovadamente de intensa perturbação por fatos imprevistos e supervenientes. 6. Inexistindo vantagem exagerada para um dos contratantes, em detrimento do outro, não há que se falar em limitação do índice de reajuste. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.21.073197-2/003, Relator(a): Des.(a) Marcelo de Oliveira Milagres , 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 25/07/2023, publicação da súmula em 25/07/2023) TARIFAS DE AVALIAÇÃO, SEGURO E ASSISTÊNCIA VEICULAR Relativamente à tarifa de Avaliação do Bem, ao julgar o REsp. nº. 1578553/SP, sob a forma de recurso repetitivo, o c.STJ firmou tese acerca da validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, ressalvadas a i) abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a ii) possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto. […] (REsp 1578553 SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/11/2018, DJe 06/12/2018). No caso concreto, deve ser reconhecida a legalidade da cobrança de tal encargo, uma vez que existe prova de que o respectivo serviço foi prestado, de acordo com os documentos que acompanham a contestação. No que se refere ao seguro, o Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento de que o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira e/ou com seguradora por ela indicada. Eis a tese fixada pelo STJ, em julgamento do Recurso Especial nº 1.639.320/SP, sob a ótica de Recurso Repetitivo: 2.2 - Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada. Dessa forma, a cobrança de seguros em contratos de financiamento só será reputada legal quando o consumidor for livre para optar por sua contratação, bem como para escolher a seguradora, pois não pode ser compelido a contratar com seguradora indicada pela instituição financeira. No caso dos autos, ao analisar o instrumento contratual, pode-se constatar que ele não dispôs sobre a possibilidade de o consumidor optar pela contratação do seguro, pelo que deve ser declarada a nulidade da respectiva cobrança. Pelos mesmos fundamentos, deve ser declarado abusivo o encargo “Assistência Veicular”. RESTITUIÇÃO DOS VALORES Constatada a incidência de encargos abusivos, é devida a repetição do indébito dos valores indevidamente cobrados, sem prejuízo da compensação de valores, nos termos do artigo 368 do Código Civil. Nos termos do artigo 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor, o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais. O Superior Tribunal de Justiça fixo tese segundo a qual: ''a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo." (Tema 929) Entretanto, houve modulação daquele entendimento: "Impõe-se modular os efeitos da presente decisão para que o entendimento aqui fixado quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão." (EAREsp n. 676.608/RS) Dessa maneira, para devolução em dobro, exige-se a cobrança de má-fé, mesmo nas relações de consumo. Somente para cobranças após 30/03/2021, data de publicação do acórdão, será aplicável a conclusão de que, para devolução em dobro (art. 42 CDC), bastará uma conduta contrária à boa-fé contratual, independente da natureza volitiva (dolo ou má-fé). MORA De acordo com o entendimento jurisprudencial predominante no Superior Tribunal de Justiça, o afastamento da mora poderá ocorrer com o reconhecimento de abusividade contratual em relação aos encargos da normalidade, especificamente a taxa dos juros remuneratórios e a capitalização deste encargo Nesse sentido, o REsp 1.061.530 - RS, julgado sob a ótica dos recursos repetitivo, assim ementado: "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. (...). ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora;b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual.(...)." (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009). Pelo que se vê, o reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora. No caso, restou incontroversa a abusividade quanto aos juros remuneratórios, o que leva à descaracterização da mora. Não obstante, descabe deferir a tutela de urgência, uma vez que, embora incontroversa a cobrança de juros abusivos, não consta informação de que o autor foi constituído em mora e de que há ação de busca e apreensão em andamento, bem como não foi demonstrada a inscrição do nome do autor junto ao cadastro de restrição ao crédito. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para: i) limitar a taxa mensal e anual de juros remuneratórios a uma vez e meia a média do mercado à época da contratação, precisamente para 2,92% ao mês e 39,09% ao ano; ii) declarar a abusividade na cobrança de seguro e assistências, afastando, via de consequência, a respectiva exigibilidade; iii) afastar eventual mora que o autor tenha incorrido; Por consequência, condeno a ré na repetição, em dobro, do indébito do excedente das parcelas, restrito aos descontos ocorridos após 30/03/2021, com correção monetária, segundo os índices da Corregedoria-Geral de Justiça deste Tribunal, desde o pagamento, e juros de mora de 1% ao mês, contados da citação, até a entrada em vigor da Lei nº 14.905/24 (01/09/2024), a partir da qual deverá ser aplicada a taxa Selic para os juros e o IPCA para a correção monetária, na forma prevista pela nova redação dos artigos 389 e 406 do CC, observada a dedução do índice de atualização monetária da taxa Selic prevista no art. 406, § 1º do CC. Diante da sucumbência recíproca, condeno o autor ao pagamento de 35% das custas processuais, ficando os outros 65% a cargo do réu. Fixo honorários advocatícios em 10% sobre o valor atribuído à causa, que vão divididos entre as partes na mesma proporção das custas. Em relação ao autor, a exigibilidade do pagamento está suspensa, pois amparado pela gratuidade de justiça. PRI. Sete Lagoas, data da assinatura eletrônica. CARLOS ALBERTO DE FARIA Juiz(íza) de Direito 2ª Vara Cível da Comarca de Sete Lagoas

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Comercial Extra Ltda - Me x Banco Mercedes-Benz Do Brasil S/A

ID: 317746237

Tribunal: TJMG Órgão: Unidade Jurisdicional - 1º JD da Comarca de Sete Lagoas Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 5029827-18.2024.8.13.0672

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

COMERCIAL EXTRA LTDA - ME

Polo Passivo:

BANCO MERCEDES-BENZ DO BRASIL S/A

Intimação

Advogados:

DEBORA CARVALHO DA SILVA BARBOSA

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

JOAO LEONELHO GABARDO FILHO

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Sete Lagoas / Unidade Jurisdicional - 1º JD da Comarca de Sete Lagoas Rua Senhor dos Passos, 95, Centro, Sete Lagoa… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Sete Lagoas / Unidade Jurisdicional - 1º JD da Comarca de Sete Lagoas Rua Senhor dos Passos, 95, Centro, Sete Lagoas - MG - CEP: 35700-016 PROCESSO Nº: 5029827-18.2024.8.13.0672 CLASSE: [CÍVEL] PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) ASSUNTO: [Inclusão Indevida em Cadastro de Inadimplentes] AUTOR: COMERCIAL EXTRA LTDA - ME CPF: 71.329.999/0001-65 RÉU: BANCO MERCEDES-BENZ DO BRASIL S/A CPF: 60.814.191/0001-57 SENTENÇA I. R E L A T Ó R I O Trata-se de Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais e Pedido de Tutela de Urgência ajuizada por COMERCIAL EXTRA LTDA. - ME em face de BANCO MERCEDES-BENZ DO BRASIL S/A, ambos devidamente qualificados nos autos. A parte autora narrou, em sua petição inicial (Id. 10354734478 - Pág. 3-6), que celebrou com a instituição financeira ré contratos de cédulas de crédito bancário, identificados pelos números 1290280177 e 1290280169, os quais tinham como garantia uma carroceria Mercedes-Benz Multiflex e um caminhão Mercedes-Benz Axor 3131 6X4 3E Dies 2P Básico, ambos com placa RVY-6C76, ano/modelo 2022/2022. Sustentou que, em razão de dificuldades financeiras que a impediram de honrar os pagamentos, os bens objeto dos contratos foram apreendidos e devolvidos à parte requerida por meio do processo de Busca e Apreensão nº 1037284-79.2023.8.26.0564, que tramita perante a 8ª Vara Cível de São Bernardo do Campo – SP. A autora alegou que, com a apreensão dos bens, a dívida seria considerada integralmente quitada, visto que não recebeu mais nenhuma cobrança, nem foi apresentado qualquer saldo devedor remanescente. Não obstante a perda definitiva da posse dos bens, a autora afirmou que a ré continuou a manter restrições em seu nome junto aos cadastros de inadimplentes, o que reputou indevido e passível de indenização por danos morais. Ao final, requereu a declaração de inexistência do débito, a imediata retirada das restrições e a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). O pedido de tutela de urgência formulado na exordial para retirada das restrições foi indeferido (Id. 10356012028 - Pág. 1-2), sob o fundamento de que a parte autora possuía outra negativação em seu nome, efetuada por credor distinto (Banco Letsbank S.A.), o que afastaria o perigo de dano imediato. Devidamente citado, o BANCO MERCEDES-BENZ DO BRASIL S/A apresentou contestação (Id. 10442869462 - Pág. 1-18), arguindo, preliminarmente, a inépcia da petição inicial, sob a alegação de que a narrativa dos fatos se mostrava desconexa e com erros materiais, como a menção a "pedido de cartão de crédito" e "falsidade de assinaturas" em uma ação que discutia cédulas de crédito e saldo devedor remanescente, o que dificultaria a compreensão da real pretensão autoral. Também impugnou o pedido de justiça gratuita formulado pela autora, argumentando que a pessoa jurídica não comprovou sua hipossuficiência, tendo em vista que assumiu financiamentos de alto valor e declarou faturamento mensal elevado em seu cadastro. No mérito, defendeu a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à relação jurídica em questão, aduzindo que os veículos foram adquiridos como insumo para a atividade empresarial da autora, descaracterizando a figura de consumidor final. Consequentemente, sustentou a impossibilidade de inversão do ônus da prova. Argumentou que a apreensão dos bens não enseja a quitação automática do contrato, podendo haver saldo devedor remanescente, conforme previsão contratual e legal (art. 1.366 do Código Civil e art. 2º do Decreto-Lei nº 911/69). Afirmou ter notificado a autora e o avalista sobre a existência de saldo devedor remanescente, inclusive por mensagens de WhatsApp. Por fim, alegou a inexistência de dano moral in re ipsa para pessoa jurídica, pugnando pela improcedência dos pedidos. A autora, por sua vez, apresentou impugnação à contestação (Id. 10455427034 - Pág. 1-5), refutando as preliminares e reiterando os argumentos de sua inicial. Manteve a aplicabilidade do CDC, com base na Súmula 297 do STJ, e a necessidade de inversão do ônus da prova. Insistiu que a ré não comprovou a existência e o valor do saldo devedor remanescente após a apreensão e alienação dos bens, o que tornaria indevida a manutenção das restrições. Reafirmou a ocorrência de dano moral pela indevida manutenção da negativação. Posteriormente, tanto a parte ré (Id. 10463995078 - Pág. 1) quanto a parte autora (Id. 10464714586 - Pág. 1) manifestaram o desinteresse na produção de outras provas, pugnando pelo julgamento antecipado do mérito, por entenderem que a matéria em discussão seria exclusivamente de direito, ou, ao menos, a prova documental constante dos autos seria suficiente para a solução da lide. É o breve relato. II. F U N D A M E N T A Ç Ã O II.I. DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE O presente feito comporta julgamento antecipado do mérito, nos exatos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. A questão sub judice envolve matéria de fato e de direito que prescinde de dilação probatória, visto que as provas documentais colacionadas aos autos são suficientes para a formação do convencimento deste Juízo. Ambas as partes, aliás, expressamente pugnaram pelo julgamento antecipado, indicando a desnecessidade de produção de outras provas. II.II. DAS PRELIMINARES II.II.I. Da Inépcia da Inicial A parte ré arguiu a preliminar de inépcia da petição inicial, sustentando que a narrativa dos fatos apresentava incongruências e dificultava a compreensão da demanda. Alegou que a autora fez menção a um "pedido de cartão de crédito" e a "falsidade de assinaturas" em um contexto de cédulas de crédito e saldo devedor remanescente, o que, em tese, inviabilizaria a adequada defesa. Contudo, em uma análise detida dos autos, verifica-se que, apesar de algumas imprecisões redacionais ou equívocos pontuais na formulação da peça vestibular, a essência da pretensão autoral foi devidamente compreendida pela ré. A contestação apresentada (Id. 10442869462 - Pág. 1-18) demonstrou a plena capacidade da parte requerida em refutar os argumentos da autora, abordando todos os pontos controvertidos e apresentando sua própria versão dos fatos de forma clara e pormenorizada. Assim, ausente o efetivo prejuízo à parte adversa, não se justifica o indeferimento da petição inicial por inépcia. Por estas razões, rejeito a preliminar. II.II.II. Da Impugnação à Justiça Gratuita Não há interesse de agir para análise de requerimento de justiça gratuita neste grau de jurisdição, eis que não há custas ou honorários de sucumbência nesta instância. II.III. DO MÉRITO II.III.I. Da Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e da Inversão do Ônus da Prova A parte ré argumentou pela inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao caso concreto, sustentando que os financiamentos obtidos pela autora foram destinados ao fomento de sua atividade empresarial, configurando uma relação de insumo e não de consumo final. De fato, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao interpretar a figura do "consumidor final" prevista no artigo 2º do CDC, adotou a teoria finalista, mitigada em algumas situações para abranger pessoas jurídicas que demonstrem vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica. No presente caso, os bens financiados (caminhão e carroceria) são inequivocamente utilizados na atividade principal da empresa autora, que inclui "transporte rodoviário de carga" e "locação e leasing operacional de caminhões" (Id. 10354732986 - Pág. 1, Id. 10354734482 - Pág. 5). No entanto, a despeito da discussão acerca da qualificação da autora como consumidora no sentido estrito da lei consumerista, o cerne da controvérsia reside na comprovação da subsistência de um débito após a retomada dos bens pela ré. Neste particular, a hipossuficiência da autora em relação à ré é manifesta, sobretudo no que concerne à produção de provas relacionadas à efetiva alienação dos bens retomados, ao valor apurado nesta venda e à subsequente prestação de contas que determinaria a existência ou não de saldo devedor remanescente. O acesso a tais informações é, sem dúvida, unilateral, cabendo à instituição financeira, que detém o controle de todos os dados e documentos pertinentes à transação dos bens após a busca e apreensão, demonstrar a correção de seus atos. Assim, independentemente da aplicação irrestrita do Código de Defesa do Consumidor, a inversão do ônus da prova no presente caso é imperativa. Tal inversão encontra respaldo tanto no artigo 6º, inciso VIII, do CDC, caso se entenda pela aplicação da norma consumerista, quanto na distribuição dinâmica do ônus da prova prevista no artigo 373, § 1º, do Código de Processo Civil. Este último dispositivo permite ao juiz, em casos específicos, distribuir o ônus da prova de maneira diversa da regra geral, considerando as peculiaridades da causa e a maior facilidade de obtenção da prova por uma das partes. No presente cenário, é evidente que a ré, o BANCO MERCEDES-BENZ DO BRASIL S/A, possui os meios e o acesso irrestrito aos documentos que atestariam a alegada insuficiência da venda dos bens para a quitação do contrato e, consequentemente, a legitimidade da manutenção das restrições creditícias em nome da autora. A parte autora, por sua vez, já perdeu a posse definitiva dos bens e não detém controle sobre as operações subsequentes realizadas pela ré. Portanto, a inversão do ônus probatório, determinando-se à ré a comprovação do saldo devedor remanescente, é medida de justiça e equidade processual, essencial para o deslinde da controvérsia. II.III.II. Da Retomada dos Bens e do Saldo Devedor Remanescente Conforme amplamente demonstrado nos autos, os bens objeto dos contratos de financiamento, ou seja, o caminhão e a carroceria, foram efetivamente apreendidos e a posse e propriedade consolidadas em favor do BANCO MERCEDES-BENZ DO BRASIL S/A, por força de decisão proferida no Processo de Busca e Apreensão nº 1037284-79.2023.8.26.0564 (Id. 10354731586 - Pág. 1-2). A parte autora, COMERCIAL EXTRA LTDA - ME, perdeu, de forma definitiva, a posse dos referidos bens. É cediço que, em contratos de alienação fiduciária, a retomada do bem pelo credor e sua posterior alienação não implicam, necessariamente, na quitação integral da dívida. A própria legislação civil e o Decreto-Lei nº 911/69 preveem a possibilidade de subsistência de um saldo devedor remanescente, caso o produto da venda do bem não seja suficiente para cobrir o valor total do débito, acrescido das despesas inerentes ao processo de cobrança. O artigo 1.366 do Código Civil é expresso ao dispor que "Quando, vendida a coisa, o produto não bastar para o pagamento da dívida e das despesas de cobrança, continuará o devedor obrigado pelo restante". De igual modo, o artigo 2º do Decreto-Lei nº 911/69, em sua redação atual, estabelece que o credor fiduciário poderá vender a coisa a terceiros, aplicando o preço da venda no pagamento de seu crédito e despesas, "devendo aplicar o preço da venda no pagamento de seu crédito e das despesas decorrentes e entregar ao devedor o saldo apurado, se houver, com a devida prestação de contas." Nesse contexto, para justificar a manutenção da restrição do nome da autora nos cadastros de inadimplentes, seria indispensável que a ré, BANCO MERCEDES-BENZ DO BRASIL S/A, demonstrasse de forma cabal que a alienação dos bens retomados, após a busca e apreensão, não foi suficiente para a quitação integral do contrato, e, mais, que quantificasse o saldo devedor remanescente. Contudo, em que pese a ré ter alegado em sua contestação que houve notificação da autora e de seu avalista sobre a existência de saldo remanescente, e até mesmo ter feito menção a "imagens" de notificações extrajudiciais e mensagens de WhatsApp (Id. 10442869462 - Pág. 13-14), não juntou aos autos nenhum documento hábil ou demonstrativo contábil idôneo para comprovar sua tese. A simples alegação ou a exibição de meras capturas de tela, sem o acompanhamento de uma prestação de contas detalhada e transparente sobre a venda dos bens e a apuração do valor devido, não constitui prova suficiente para legitimar a manutenção de um apontamento restritivo em nome da devedora fiduciante que já perdeu seus bens. A ausência de tal comprovação, por parte da instituição credora que tem a prerrogativa e o dever de realizar a venda do bem e prestar contas de sua apuração, fragiliza a legitimidade da restrição. A requerida não se desincumbiu do ônus de provar a existência e o montante de qualquer saldo devedor remanescente, deixando a autora em uma situação de incerteza quanto à sua real condição de adimplência ou inadimplência após a retomada dos bens. Dessa forma, a manutenção do nome da autora nos cadastros de inadimplentes, sem a devida justificação e comprovação do débito remanescente, torna-se indevida, configurando um ato ilícito da ré. II.III.III. Dos Danos Morais A manutenção indevida do nome da parte autora nos cadastros de inadimplentes, após a perda definitiva dos bens objeto do contrato de financiamento e sem a comprovação efetiva de um saldo devedor remanescente pela instituição financeira, configura um ato ilícito passível de indenização. Embora a parte autora seja uma pessoa jurídica, a qual, conforme entendimento consolidado na Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça, “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”, é necessário demonstrar o abalo à sua honra objetiva, ou seja, à sua imagem, credibilidade ou reputação comercial. Diferentemente da pessoa física, para a qual o dano moral por negativação indevida é, via de regra, in re ipsa, para a pessoa jurídica, exige-se a prova do prejuízo à sua imagem ou nome empresarial no mercado. Neste caso específico, a instrução clara e a análise dos fatos demonstram que a manutenção das restrições creditícias em nome da COMERCIAL EXTRA LTDA - ME, empresa que já teve seus principais ativos (o caminhão e a carroceria) retomados e consolidados em favor do banco réu, e sem que este último tenha demonstrado a insuficiência da alienação dos bens para a quitação integral do débito, justifica a ocorrência de danos morais. A incerteza e a indevida persistência de um apontamento restritivo em seu nome, mesmo após a perda dos bens, indubitavelmente afetam a credibilidade da empresa no mercado, dificultando o acesso a novos créditos e parcerias comerciais, essenciais para a continuidade de suas atividades. Essa situação gera um impacto negativo em sua honra objetiva, que é o bem jurídico tutelado neste contexto. A ausência de justificativa para a manutenção da restrição, somada ao fato de que a autora já não dispõe dos bens financiados, ultrapassa o mero dissabor e acarreta um prejuízo à imagem da empresa perante terceiros (fornecedores, clientes e outras instituições financeiras). Assim, configurado o dano moral, e levando em consideração os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade que devem nortear a fixação do quantum indenizatório, bem como o caráter reparatório para a vítima e pedagógico para o ofensor, de modo a desestimular a reiteração de condutas semelhantes, arbitro a indenização por danos morais em R$ 8.000,00 (oito mil reais). Este valor visa compensar o abalo à imagem e reputação comercial da autora, sem implicar em enriquecimento sem causa, e, ao mesmo tempo, servir de alerta à instituição financeira quanto à necessidade de transparência e diligência na gestão de suas operações. III. D I S P O S I T I V O Ante o exposto, e por tudo o mais que dos autos consta, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: Rejeitar as preliminares de inépcia da inicial e de impugnação à justiça gratuita, pelos fundamentos expostos na fundamentação supra. Declarar a inexigibilidade do débito que supostamente remanesceria após a apreensão e consolidação da propriedade dos bens objeto dos contratos de cédulas de crédito números 1290280177 e 1290280169, haja vista a ausência de comprovação, pela ré, da insuficiência da alienação dos bens para a quitação integral do contrato e da efetiva apuração e comunicação de saldo devedor remanescente. Determinar a retirada de quaisquer restrições creditícias referentes aos contratos 1290280177 e 1290280169, bem como de eventuais débitos remanescentes a eles vinculados, dos cadastros de inadimplentes (tais como SPC, Serasa e outros órgãos de proteção ao crédito) em nome da COMERCIAL EXTRA LTDA - ME, no prazo de 5 (cinco) dias, a contar da intimação desta sentença, sob pena de multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais), limitada a R$ 10.000,00 (dez mil reais), deferindo-se, tutela de urgência, nesta sentença. Condenar o BANCO MERCEDES-BENZ DO BRASIL S/A ao pagamento de indenização por danos morais em favor da COMERCIAL EXTRA LTDA - ME, no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), corrigidos monetariamente pelo IPCA a partir da data desta sentença (Súmula 362 do STJ), e acrescidos de juros de mora pela SELIC deduzido o IPCA, a contar da citação. Sem custas e honorários advocatícios nesta instância, em conformidade com o disposto no artigo 55 da Lei nº 9.099/95, ressalvada a hipótese de recurso, quando então se aplicarão as regras de sucumbência específicas. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com as devidas baixas e anotações. Sete Lagoas, data da assinatura eletrônica. FREDERICO BITTENCOURT FONSECA Juiz(íza) de Direito Unidade Jurisdicional - 1º JD da Comarca de Sete Lagoas

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