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Processo nº 0003059-45.2014.8.11.0059

ID: 317503544

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0003059-45.2014.8.11.0059

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

BANCO BRADESCO S.A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0003059-45.2014.8.11.0059 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cédula de Crédito Rural] Relator: Des(a). MARC… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0003059-45.2014.8.11.0059 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cédula de Crédito Rural] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [BANCO BRADESCO S.A. - CNPJ: 60.746.948/0001-12 (APELANTE), MARCELO ALVARO CAMPOS DAS NEVES RIBEIRO - CPF: 019.804.741-09 (ADVOGADO), ANDRE LUIZ CAMPOS DAS NEVES RIBEIRO - CPF: 998.649.241-68 (ADVOGADO), MARCOS ANTONIO DE ALMEIDA RIBEIRO - CPF: 322.686.881-00 (ADVOGADO), VITORIA NASCIMENTO MOLINA - CPF: 019.557.981-09 (ADVOGADO), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), LUIZ DONIZETE DA SILVA - CPF: 137.845.521-53 (APELADO), DEUSELIA FREITAS DA SILVA - CPF: 000.490.661-61 (APELADO), GIORGY WILLIAN GOMES LUZ - CPF: 039.998.531-07 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Ementa: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. PRESCRIÇÃO DIRETA. INÉRCIA DO EXEQUENTE. CITAÇÃO APÓS O PRAZO PRESCRICIONAL. IRREGULARIDADE NA INTERRUPÇÃO. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 106 DO STJ. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação Cível interposta contra sentença que, nos autos da execução de título extrajudicial ajuizada em 2014, extinguiu o processo com resolução de mérito, com fundamento na prescrição intercorrente. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se o prazo prescricional de três anos, previsto para a execução da cédula de crédito rural, foi corretamente aplicado; (ii) saber se a citação válida da devedora solidária ocorrida em 2019 teria o condão de interromper o prazo prescricional; (iii) saber se houve inércia injustificada do exequente entre 2014 e 2016, especialmente após a tentativa frustrada de citação do executado falecido; (iv) saber se a Súmula 106 do STJ é aplicável à hipótese em que a demora decorre de omissão da parte autora. III. Razões de decidir 3. O prazo prescricional aplicável às cédulas de crédito rural é trienal, nos termos do art. 60 do Decreto-Lei nº 167/1967 e art. 70 do Decreto nº 57.663/1966. 4. A ação foi ajuizada em 06/08/2014 e a citação da única parte válida, a executada, ocorreu apenas em 04/04/2019, quando o prazo prescricional já havia se esgotado desde 20/11/2016. 5. A primeira tentativa de citação do executado deu-se em novembro de 2014, e a parte autora permaneceu inerte por dois anos, sem providenciar a citação do espólio ou buscar novas diligências. 6. A interrupção da prescrição exige citação dentro do prazo legal (art. 240, §2º, do CPC), não se aplicando a Súmula 106 do STJ quando a demora decorre da inércia da parte, e não de entraves do Poder Judiciário. 7. A alegação de que a citação da coexecutada interromperia a prescrição de ambos os devedores solidários não subsiste quando realizada após a consumação do prazo prescricional. A citação tardia não revigora prescrição consumada IV. Dispositivo e tese 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A execução de cédula de crédito rural está sujeita ao prazo prescricional de três anos, contados do vencimento da dívida. 2. A citação válida realizada após o escoamento do prazo prescricional não tem efeito interruptivo, sendo inaplicável a Súmula 106 do STJ quando a inércia é imputável à parte exequente.” Dispositivos relevantes: CPC, arts. 240, §2º, e 921, §4º; CC, art. 206, §3º, VIII; Decreto-Lei nº 167/1967, art. 60; Decreto nº 57.663/1966, art. 70. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.992.331/MG, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 13/03/2023; TJMT, N.U 0000935-03.2015.8.11.0044, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, j. 06/09/2024. R E L A T Ó R I O Cuida-se de Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por BANCO BRADESCO S.A., contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara de Porto Alegre do Norte, que nos autos da ação de execução de título extrajudicial (Proc. nº 0003059-45.2014.8.11.0059), ajuizada pela apelante contra LUIZ DONIZETE DA SILVA e DEUSELIA FREITAS DA SILVA, reconheceu a prescrição intercorrente e extinguiu o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso II, do CPC. No recurso, a Apelante alega inexistência de prescrição intercorrente, sustentando a irretroatividade da Lei nº 14.195/2021, aplicação da Súmula 106 do STJ, ausência de inércia do exequente e interrupção da prescrição pela citação da devedora solidária. Pede o provimento do recurso para afastar a prescrição intercorrente. Não há contrarrazões ou parecer ministerial nos autos analisados. É o relatório. Cuiabá, data registrada no sistema. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Conforme relatado, cuida-se de Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por BANCO BRADESCO S.A., contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara de Porto Alegre do Norte, que nos autos da ação de execução de título extrajudicial, ajuizada pela apelante contra LUIZ DONIZETE DA SILVA e DEUSELIA FREITAS DA SILVA, julgou improcedentes os pedidos iniciais para reconhecer a prescrição intercorrente e extinguir o processo com resolução de mérito (cf. id. nº 273646361). Extrai-se da inicial que BANCO BRADESCO S.A. ajuizou a presente demanda em desfavor de LUIZ DONIZETE DA SILVA e DEUSELIA FREITAS DA SILVA, requerendo a execução de Cédula de Crédito Rural. (cf. Id. nº 273645933- Página 26) Devidamente processado o feito, após múltiplas tentativas de citação, o executado LUIZ veio a óbito, sendo posteriormente citada apenas a executada DEUSELIA em 04/04/2019, que apresentou embargos à execução. Após regular trâmite do feito, o Magistrado de primeiro grau proferiu sentença nos seguintes termos: “A prescrição intercorrente ocorre nos casos em que há inércia injustificada da parte exequente em adotar as providências necessárias ao prosseguimento do feito e na ausência de diligências eficazes para viabilizar a citação dos executados, configurando-se a extinção do processo com resolução de mérito, nos termos do art. 924, § 4º, do Código de Processo Civil (CPC). No caso em análise, embora tenham sido requeridas e realizadas diversas diligências nos endereços indicados pela exequente, as tentativas de citação dos executados foram infrutíferas, e não se obteve êxito em citá-los antes do transcurso do prazo prescricional de 03 anos, aplicável às cédulas de crédito rural, conforme os artigos 60 do Decreto-Lei n. 167/67 e 70 do Decreto-Lei n. 57.663/66 (Lei Uniforme de Genebra). A jurisprudência consolidada estabelece que a simples propositura da ação e a realização de diligências que não resultem na citação válida não constituem causas interruptivas do prazo prescricional: No caso em tela, verifica-se que: a) A ação foi proposta em 06/08/2014, mas a parte exequente não promoveu a citação válida dos executados dentro do prazo prescricional de 03 anos. b) A executada DEUSELIA foi citada apenas em 04/04/2019, quando o prazo prescricional já estava superado. c) Com relação ao falecimento do executado LUIZ DONIZETE DA SILVA, a parte exequente não adotou diligências eficazes para promover a regularização do polo passivo, como a habilitação do espólio ou herdeiros, mesmo após ser intimada para tanto. Considerando esses elementos, resta configurada a inércia injustificada da parte exequente e a ausência de diligências eficazes para viabilizar a citação dos executados dentro do prazo prescricional. Assim, impõe-se o reconhecimento da prescrição intercorrente. Ante o exposto, com fundamento no artigo 921, § 4º, do Código de Processo Civil, RECONHEÇO a prescrição intercorrente e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso II, do Código de Processo Civil.” Inconformado com o desfecho dado à lide, BANCO BRADESCO S.A. interpôs o presente Apelo, o qual se passa à análise. Cinge-se a controvérsia em definir se houve prescrição intercorrente em execução de cédula de crédito rural, considerando a aplicação temporal da Lei 14.195/2021, a caracterização de inércia do exequente, os efeitos da citação de devedor solidário e a incidência da Súmula 106 do STJ. DA PRESCRIÇÃO Inicialmente, importante diferenciar a prescrição intercorrente da prescrição direta: A prescrição direta ocorre quando o prazo prescricional da ação não é interrompido com a citação válida, enquanto a prescrição intercorrente, ocorre durante a tramitação do processo, quando há paralisação da ação pelo prazo prescricional devido à inércia injustificada do autor. Como sabido, em se tratando de Cédula de Crédito Bancário, tem-se que o prazo prescricional é de 03 (três anos), uma vez que a lei que a rege (Lei nº. 10.931/2004), embora não estabeleça prazo diferente, autoriza a aplicação da lei cambial, conforme artigo 44, que assim dispõe: “Art. 44. Aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que não contrariar o disposto nesta Lei, a legislação cambial, dispensado o protesto para garantir o direito de cobrança contra endossantes, seus avalistas e terceiros garantidores”. Nesse sentido, o prazo de prescricional da Cédula de Crédito Bancário é aquele previsto no artigo 70 do Decreto nº. 57.663/66 (Lei Uniforme de Genebra), que possui a seguinte redação: “Art. 70. Todas as ações contra o aceitante relativas a letras prescrevem em 3 (três) anos a contar do seu vencimento”. Em complemento, o artigo 206, §3º, VIII, do Código Civil institui que a pretensão de execução para recebimento de título de crédito prescreve em três anos. “Art. 206. Prescreve: § 3º Em três anos: VIII - a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar do vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial;” Acerca do prazo prescricional trienal inerente às cédulas de crédito bancário, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já assentou o entendimento no sentido de que: “DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. PRESCRIÇÃO TRIENAL. REVISÃO DO JULGADO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA DA LIDE. SÚMULA 7 DO STJ. NÃO PROVIMENTO. 1. Conforme estabelece o art. 44 da Lei n. 10.931/2004, aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que couber, a legislação cambial, de modo que se mostra de rigor a incidência do art. 70 da Lei Uniforme de Genebra, que prevê o prazo prescricional de 3 (três) anos a contar do vencimento da dívida. Precedentes. 2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula 7/STJ). 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 1.992.331/MG, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 13/3/2023, DJe de 16/3/2023.) Uma vez estabelecido o prazo prescricional aplicável à ação, torna-se essencial determinar o marco inicial da contagem para cada uma das modalidades de prescrição. No caso da prescrição direta, o prazo prescricional tem início a partir do vencimento da última parcela do contrato, independentemente de eventual vencimento antecipado da dívida. Vejamos a jurisprudência de caso semelhante: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. NOTA DE CRÉDITO RURAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. PRESCRIÇÃO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. COGNIÇÃO EX OFFICIO. REFORMA DA SENTENÇA. (...) II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (...) (ii) verificar qual o prazo prescricional aplicável à execução fundada em cédula de crédito rural, bem como seu termo inicial de contagem. III. Razões de decidir (...) 5. Ao crédito rural aplica-se a legislação específica, sendo que o prazo prescricional da ação de execução de cédula de crédito rural é de 3 (três) anos, contados da data do vencimento do título, conforme art. 60 do Decreto-Lei nº 167/67 c/c art. 70 do Decreto nº 57.663/66 (Lei Uniforme de Genebra). 6. No caso concreto, a última parcela da cédula rural venceu em 30/06/2012 e a execução foi ajuizada em 23/06/2015, dentro do prazo prescricional trienal. IV. Dispositivo e tese (...) Tese de julgamento: "1. O prazo prescricional da ação de execução de cédula de crédito rural é de 3 (três) anos, contados da data do vencimento do título, nos termos do art. 60 do Decreto-Lei nº 167/67 c/c art. 70 do Decreto nº 57.663/66. 2. O vencimento antecipado da dívida não altera o termo inicial do prazo prescricional, que continua sendo a data do vencimento da última parcela." (...) (N.U 1000659-16.2023.8.11.0030, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, Publicado no DJE 30/04/2025))” Por sua vez, a prescrição intercorrente começa a fluir após o transcurso do prazo de suspensão da execução por um ano, conforme previsto no art. 921, § 4º, do Código de Processo Civil, que assim dispõe: "§4º O termo inicial da prescrição no curso do processo será a ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis, e será suspensa, por uma única vez, pelo prazo máximo previsto no § 1º deste artigo." É perceptível que a prescrição intercorrente pressupõe que o processo já esteja em regular tramitação, com citação válida realizada dentro do prazo prescricional, sendo que a paralisação posterior por período superior ao prazo prescricional é que ocasiona a extinção do feito, situação processual não observada no presente caso. Por sua vez, a prescrição direta ocorre quando o prazo prescricional se esgota antes mesmo da realização da citação válida, impedindo que o processo produza seus efeitos interruptivos. Sobre a citação regular e a interrupção da prescrição direta, prescreve esse Egrégio Tribunal: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE EXECUÇÃO – NOTA DE CRÉDITO RURAL – PRESCRIÇÃO TRIENAL – DEMORA NA CITAÇÃO – TRANSCURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL DO TÍTULO – CITAÇÃO NÃO EFETIVADA DENTRO DO PRAZO LEGAL – AUSÊNCIA DE DEMORA IMPUTÁVEL AO MECANISMO DA JUSTIÇA – DILIGÊNCIAS INÓCUAS – PERPETUAÇÃO DO ANDAMENTO PROCESSUAL – PRESCRIÇÃO CONFIGURADA – DEVIDA A CONDENAÇÃO DO EXECUTADO AO ÔNUS SUCUMBENCIAL – PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, o prazo prescricional da ação de execução de cédula de crédito rural é de 3 (três) anos, a contar da data do vencimento do título, nos termos do art. 60 do Decreto-Lei n.º 167/67 e do art. 70 do Decreto n.º 57.663/66. Precedentes 2. A efetivação da citação é imprescindível para o desenvolvimento regular da lide e o despacho que recebe a petição inicial somente interrompe a prescrição, caso a citação seja realizada dentro do prazo legal, o que não aconteceu neste caso, incidindo a parte final do §2º do art. 240 do CC. 3. Não efetivada a citação tradicional, não tendo o credor realizado a citação por edital no prazo prescricional, vê-se que transcorreu sem interrupção da prescrição o prazo. (N.U 0000935-03.2015.8.11.0044, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Vice-Presidência, Julgado em 06/09/2024, Publicado no DJE 06/09/2024)” (grifo nosso) Assim, embora o magistrado de primeiro grau tenha fundamentado sua decisão no reconhecimento da prescrição intercorrente, a análise dos autos revela que o caso em exame configura, na verdade, hipótese de prescrição direta, e não intercorrente, como se passa a demonstrar. Pois bem. Analisando o conjunto processual, verifica-se que o vencimento da parcela única ocorreu em 19/11/2013 (cf. Id. nº 273645933 – Página 44), iniciando-se a contagem do prazo de 03 anos, que se encerrou em 20/11/2016. A citação do executado ocorreu apenas em 08/04/2019 (cf. Id. nº 273645934 – Página 48), portanto, alcançada pela prescrição direta. É fundamental destacar que não houve qualquer causa suspensiva do prazo prescricional, tampouco se pode atribuir ao Poder Judiciário a morosidade na citação do executado, sendo, portanto, inaplicável a súmula 106 do STJ no presente caso. Diferentemente do sustentado pelo apelante, a análise detalhada dos autos revela inércia injustificada e reiterada do exequente em diversos momentos processuais críticos. A ação de execução foi distribuída em 06 de agosto de 2014, sendo que a primeira tentativa de citação dos executados resultou infrutífera, conforme certificado em 25 de novembro de 2014 (cf. Id. nº 47308928 - Pág. 59). Após esta primeira tentativa malograda, o exequente foi devidamente intimado para se manifestar sobre a tentativa infrutífera e indicar providências para dar prosseguimento ao feito (cf. Id. nº 273645933 - Pág. 62). Contudo, manteve-se absolutamente silente por aproximadamente dois anos, caracterizando período de inércia que se estendeu de novembro de 2014 a novembro de 2016, sem adotar qualquer providência para localização dos executados ou viabilização da citação. Durante este período crítico de aproximadamente 24 meses, o exequente não requereu citação por edital, não solicitou diligências complementares junto a órgãos de proteção ao crédito, não forneceu endereços alternativos dos devedores, nem tampouco demonstrou qualquer iniciativa para impulsionar o processo. Tal conduta configura flagrante desídia processual, especialmente grave quando considerado que o prazo prescricional de três anos já estava em curso desde a distribuição da ação em 2014. Somente após quase três anos de inércia, em 16 de novembro de 2017, o exequente finalmente se manifestou nos autos requerendo nova tentativa de citação (cf. Id. nº 273645934 - Pág. 6). Todavia, esta segunda diligência também resultou infrutífera, conforme certificado em 23 de outubro de 2017 (cf. Id. nº 273645934 - Pág. 12). A citação efetiva ocorreu apenas em 04 de abril de 2019, quando foi citada exclusivamente a executada DEUSELIA (cf. Id. nº 273645934 - Pág. 48), momento em que a prescrição trienal já havia se consumado. O apelante sustenta que a citação de DEUSELIA em abril de 2019 teria interrompido a prescrição quanto a ambos os devedores, com fundamento no artigo 204, parágrafo primeiro, do Código Civil, que dispõe sobre os efeitos da interrupção da prescrição entre devedores solidários. Contudo, tal argumento não prospera quando submetido ao crivo da análise jurídica adequada, uma vez que a citação ocorreu após o transcurso completo do prazo prescricional. A eficácia interruptiva da citação de devedor solidário pressupõe necessariamente que a prescrição ainda esteja em curso no momento da citação. Não se pode admitir que a citação de um devedor solidário tenha o condão de ressuscitar prescrição já consumada, uma vez que a interrupção pressupõe a existência de um prazo prescricional em andamento. Admitir-se o contrário implicaria subversão completa do instituto da prescrição e violação aos princípios da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais. A jurisprudência tem sido clara no sentido de que não sendo promovida a citação da parte requerida dentro do prazo prescricional, bem como decorrido o prazo de dez dias para diligenciar neste sentido, não há interrupção da prescrição nos termos do artigo 202, inciso I, do Código Civil combinado com o artigo 240, parágrafos primeiro e segundo, do Código de Processo Civil. No caso concreto, o prazo prescricional de três anos esgotou-se em novembro de 2016, sendo que a citação de DEUSELIA somente ocorreu em abril de 2019, quando a prescrição já estava consumada há mais de dois anos. Como bem observado em precedente desta Corte sobre situação análoga: “E M E N T A ;APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – SENTENÇA QUE JULGOU EXTINTO O FEITO PELO RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DIRETA – IRRESIGNAÇÃO DA EXEQUENTE – NULIDADE DA CITAÇÃO – QUESTÃO DECIDIDA EM DECISÃO INTERLOCUTÓRIA NÃO IMPUGNADA OPORTUNAMENTE – MATÉRIA ALCANÇADA PELA PRECLUSÃO PRO JUDICATO – IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO EM SEDE DE APELAÇÃO – INTELIGÊNCIA DO ART. 505 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – PRESCRIÇÃO DIRETA – AUSÊNCIA DE CITAÇÃO VÁLIDA DA PARTE EXECUTADA – INEXISTÊNCIA DE CAUSA INTERRUPTIVA DO PRAZO PRESCRICIONAL – TRANSCURSO DO LAPSO QUINQUENAL PREVISTO NO ART. 206, § 5º, I, DO CÓDIGO CIVIL – INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 106 DO STJ – DEMORA NA CITAÇÃO NÃO IMPUTÁVEL AO MECANISMO JUDICIÁRIO – DESÍDIA DA PARTE EXEQUENTE EM PROMOVER OS ATOS NECESSÁRIOS À CITAÇÃO – SENTENÇA ESCORREITA – RECURSO DESPROVIDO. (...) Uma vez que não ocorreu a citação válida em tempo hábil, o despacho que a determinou perde sua eficácia interruptiva, não afetando o curso da prescrição. A interrupção da prescrição só retroage à data da propositura da ação se o autor promover a citação no prazo e na forma da lei, conforme o art. 240, § 2º, do CPC. A Súmula 106 do STJ não se aplica ao caso, pois a demora na citação não pode ser imputada a falhas nos serviços judiciários. A responsabilidade pelo sucesso da citação recai sobre a parte exequente, que deve diligenciar para assegurar a interrupção da prescrição. (...) (N.U 0000343-73.2007.8.11.0032, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/06/2025, Publicado no DJE 11/06/2025)” Desse modo, a inércia prolongada do exequente configura evidente descumprimento do ônus de impulsionar o processo, bem como violação do dever de lealdade processual. Tal comportamento processual inadequado não pode ser premiado com a aplicação de institutos protetivos como a Súmula 106 do Superior Tribunal de Justiça, que pressupõe diligência da parte interessada. Verifica-se, portanto, que o prazo prescricional de três anos se esgotou durante o período de inércia do exequente, entre 2013 e 2016, quando a citação ainda não havia sido efetivada. A posterior citação de DEUSELIA em 2019 ocorreu após o transcurso do prazo prescricional, sendo juridicamente ineficaz para interromper prescrição já consumada, uma vez que a interrupção pressupõe que o prazo prescricional ainda esteja em curso. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao Recurso de Apelação Cível interposto pelo Banco Bradesco S.A., mantendo inalterada a respeitável sentença proferida pelo Juízo singular que reconheceu a prescrição intercorrente e extinguiu o processo com resolução de mérito. Custas pelo apelante. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Processo nº 0003059-45.2014.8.11.0059

ID: 317503551

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0003059-45.2014.8.11.0059

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DEUSELIA FREITAS DA SILVA LUIZ DONIZETE DA SILVA

Acórdão

Advogados:

GIORGY WILLIAN GOMES LUZ

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0003059-45.2014.8.11.0059 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cédula de Crédito Rural] Relator: Des(a). MARC… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0003059-45.2014.8.11.0059 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cédula de Crédito Rural] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [BANCO BRADESCO S.A. - CNPJ: 60.746.948/0001-12 (APELANTE), MARCELO ALVARO CAMPOS DAS NEVES RIBEIRO - CPF: 019.804.741-09 (ADVOGADO), ANDRE LUIZ CAMPOS DAS NEVES RIBEIRO - CPF: 998.649.241-68 (ADVOGADO), MARCOS ANTONIO DE ALMEIDA RIBEIRO - CPF: 322.686.881-00 (ADVOGADO), VITORIA NASCIMENTO MOLINA - CPF: 019.557.981-09 (ADVOGADO), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), LUIZ DONIZETE DA SILVA - CPF: 137.845.521-53 (APELADO), DEUSELIA FREITAS DA SILVA - CPF: 000.490.661-61 (APELADO), GIORGY WILLIAN GOMES LUZ - CPF: 039.998.531-07 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Ementa: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. PRESCRIÇÃO DIRETA. INÉRCIA DO EXEQUENTE. CITAÇÃO APÓS O PRAZO PRESCRICIONAL. IRREGULARIDADE NA INTERRUPÇÃO. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 106 DO STJ. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação Cível interposta contra sentença que, nos autos da execução de título extrajudicial ajuizada em 2014, extinguiu o processo com resolução de mérito, com fundamento na prescrição intercorrente. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se o prazo prescricional de três anos, previsto para a execução da cédula de crédito rural, foi corretamente aplicado; (ii) saber se a citação válida da devedora solidária ocorrida em 2019 teria o condão de interromper o prazo prescricional; (iii) saber se houve inércia injustificada do exequente entre 2014 e 2016, especialmente após a tentativa frustrada de citação do executado falecido; (iv) saber se a Súmula 106 do STJ é aplicável à hipótese em que a demora decorre de omissão da parte autora. III. Razões de decidir 3. O prazo prescricional aplicável às cédulas de crédito rural é trienal, nos termos do art. 60 do Decreto-Lei nº 167/1967 e art. 70 do Decreto nº 57.663/1966. 4. A ação foi ajuizada em 06/08/2014 e a citação da única parte válida, a executada, ocorreu apenas em 04/04/2019, quando o prazo prescricional já havia se esgotado desde 20/11/2016. 5. A primeira tentativa de citação do executado deu-se em novembro de 2014, e a parte autora permaneceu inerte por dois anos, sem providenciar a citação do espólio ou buscar novas diligências. 6. A interrupção da prescrição exige citação dentro do prazo legal (art. 240, §2º, do CPC), não se aplicando a Súmula 106 do STJ quando a demora decorre da inércia da parte, e não de entraves do Poder Judiciário. 7. A alegação de que a citação da coexecutada interromperia a prescrição de ambos os devedores solidários não subsiste quando realizada após a consumação do prazo prescricional. A citação tardia não revigora prescrição consumada IV. Dispositivo e tese 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A execução de cédula de crédito rural está sujeita ao prazo prescricional de três anos, contados do vencimento da dívida. 2. A citação válida realizada após o escoamento do prazo prescricional não tem efeito interruptivo, sendo inaplicável a Súmula 106 do STJ quando a inércia é imputável à parte exequente.” Dispositivos relevantes: CPC, arts. 240, §2º, e 921, §4º; CC, art. 206, §3º, VIII; Decreto-Lei nº 167/1967, art. 60; Decreto nº 57.663/1966, art. 70. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.992.331/MG, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 13/03/2023; TJMT, N.U 0000935-03.2015.8.11.0044, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, j. 06/09/2024. R E L A T Ó R I O Cuida-se de Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por BANCO BRADESCO S.A., contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara de Porto Alegre do Norte, que nos autos da ação de execução de título extrajudicial (Proc. nº 0003059-45.2014.8.11.0059), ajuizada pela apelante contra LUIZ DONIZETE DA SILVA e DEUSELIA FREITAS DA SILVA, reconheceu a prescrição intercorrente e extinguiu o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso II, do CPC. No recurso, a Apelante alega inexistência de prescrição intercorrente, sustentando a irretroatividade da Lei nº 14.195/2021, aplicação da Súmula 106 do STJ, ausência de inércia do exequente e interrupção da prescrição pela citação da devedora solidária. Pede o provimento do recurso para afastar a prescrição intercorrente. Não há contrarrazões ou parecer ministerial nos autos analisados. É o relatório. Cuiabá, data registrada no sistema. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Conforme relatado, cuida-se de Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por BANCO BRADESCO S.A., contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara de Porto Alegre do Norte, que nos autos da ação de execução de título extrajudicial, ajuizada pela apelante contra LUIZ DONIZETE DA SILVA e DEUSELIA FREITAS DA SILVA, julgou improcedentes os pedidos iniciais para reconhecer a prescrição intercorrente e extinguir o processo com resolução de mérito (cf. id. nº 273646361). Extrai-se da inicial que BANCO BRADESCO S.A. ajuizou a presente demanda em desfavor de LUIZ DONIZETE DA SILVA e DEUSELIA FREITAS DA SILVA, requerendo a execução de Cédula de Crédito Rural. (cf. Id. nº 273645933- Página 26) Devidamente processado o feito, após múltiplas tentativas de citação, o executado LUIZ veio a óbito, sendo posteriormente citada apenas a executada DEUSELIA em 04/04/2019, que apresentou embargos à execução. Após regular trâmite do feito, o Magistrado de primeiro grau proferiu sentença nos seguintes termos: “A prescrição intercorrente ocorre nos casos em que há inércia injustificada da parte exequente em adotar as providências necessárias ao prosseguimento do feito e na ausência de diligências eficazes para viabilizar a citação dos executados, configurando-se a extinção do processo com resolução de mérito, nos termos do art. 924, § 4º, do Código de Processo Civil (CPC). No caso em análise, embora tenham sido requeridas e realizadas diversas diligências nos endereços indicados pela exequente, as tentativas de citação dos executados foram infrutíferas, e não se obteve êxito em citá-los antes do transcurso do prazo prescricional de 03 anos, aplicável às cédulas de crédito rural, conforme os artigos 60 do Decreto-Lei n. 167/67 e 70 do Decreto-Lei n. 57.663/66 (Lei Uniforme de Genebra). A jurisprudência consolidada estabelece que a simples propositura da ação e a realização de diligências que não resultem na citação válida não constituem causas interruptivas do prazo prescricional: No caso em tela, verifica-se que: a) A ação foi proposta em 06/08/2014, mas a parte exequente não promoveu a citação válida dos executados dentro do prazo prescricional de 03 anos. b) A executada DEUSELIA foi citada apenas em 04/04/2019, quando o prazo prescricional já estava superado. c) Com relação ao falecimento do executado LUIZ DONIZETE DA SILVA, a parte exequente não adotou diligências eficazes para promover a regularização do polo passivo, como a habilitação do espólio ou herdeiros, mesmo após ser intimada para tanto. Considerando esses elementos, resta configurada a inércia injustificada da parte exequente e a ausência de diligências eficazes para viabilizar a citação dos executados dentro do prazo prescricional. Assim, impõe-se o reconhecimento da prescrição intercorrente. Ante o exposto, com fundamento no artigo 921, § 4º, do Código de Processo Civil, RECONHEÇO a prescrição intercorrente e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso II, do Código de Processo Civil.” Inconformado com o desfecho dado à lide, BANCO BRADESCO S.A. interpôs o presente Apelo, o qual se passa à análise. Cinge-se a controvérsia em definir se houve prescrição intercorrente em execução de cédula de crédito rural, considerando a aplicação temporal da Lei 14.195/2021, a caracterização de inércia do exequente, os efeitos da citação de devedor solidário e a incidência da Súmula 106 do STJ. DA PRESCRIÇÃO Inicialmente, importante diferenciar a prescrição intercorrente da prescrição direta: A prescrição direta ocorre quando o prazo prescricional da ação não é interrompido com a citação válida, enquanto a prescrição intercorrente, ocorre durante a tramitação do processo, quando há paralisação da ação pelo prazo prescricional devido à inércia injustificada do autor. Como sabido, em se tratando de Cédula de Crédito Bancário, tem-se que o prazo prescricional é de 03 (três anos), uma vez que a lei que a rege (Lei nº. 10.931/2004), embora não estabeleça prazo diferente, autoriza a aplicação da lei cambial, conforme artigo 44, que assim dispõe: “Art. 44. Aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que não contrariar o disposto nesta Lei, a legislação cambial, dispensado o protesto para garantir o direito de cobrança contra endossantes, seus avalistas e terceiros garantidores”. Nesse sentido, o prazo de prescricional da Cédula de Crédito Bancário é aquele previsto no artigo 70 do Decreto nº. 57.663/66 (Lei Uniforme de Genebra), que possui a seguinte redação: “Art. 70. Todas as ações contra o aceitante relativas a letras prescrevem em 3 (três) anos a contar do seu vencimento”. Em complemento, o artigo 206, §3º, VIII, do Código Civil institui que a pretensão de execução para recebimento de título de crédito prescreve em três anos. “Art. 206. Prescreve: § 3º Em três anos: VIII - a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar do vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial;” Acerca do prazo prescricional trienal inerente às cédulas de crédito bancário, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já assentou o entendimento no sentido de que: “DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. PRESCRIÇÃO TRIENAL. REVISÃO DO JULGADO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA DA LIDE. SÚMULA 7 DO STJ. NÃO PROVIMENTO. 1. Conforme estabelece o art. 44 da Lei n. 10.931/2004, aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que couber, a legislação cambial, de modo que se mostra de rigor a incidência do art. 70 da Lei Uniforme de Genebra, que prevê o prazo prescricional de 3 (três) anos a contar do vencimento da dívida. Precedentes. 2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula 7/STJ). 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 1.992.331/MG, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 13/3/2023, DJe de 16/3/2023.) Uma vez estabelecido o prazo prescricional aplicável à ação, torna-se essencial determinar o marco inicial da contagem para cada uma das modalidades de prescrição. No caso da prescrição direta, o prazo prescricional tem início a partir do vencimento da última parcela do contrato, independentemente de eventual vencimento antecipado da dívida. Vejamos a jurisprudência de caso semelhante: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. NOTA DE CRÉDITO RURAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. PRESCRIÇÃO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. COGNIÇÃO EX OFFICIO. REFORMA DA SENTENÇA. (...) II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (...) (ii) verificar qual o prazo prescricional aplicável à execução fundada em cédula de crédito rural, bem como seu termo inicial de contagem. III. Razões de decidir (...) 5. Ao crédito rural aplica-se a legislação específica, sendo que o prazo prescricional da ação de execução de cédula de crédito rural é de 3 (três) anos, contados da data do vencimento do título, conforme art. 60 do Decreto-Lei nº 167/67 c/c art. 70 do Decreto nº 57.663/66 (Lei Uniforme de Genebra). 6. No caso concreto, a última parcela da cédula rural venceu em 30/06/2012 e a execução foi ajuizada em 23/06/2015, dentro do prazo prescricional trienal. IV. Dispositivo e tese (...) Tese de julgamento: "1. O prazo prescricional da ação de execução de cédula de crédito rural é de 3 (três) anos, contados da data do vencimento do título, nos termos do art. 60 do Decreto-Lei nº 167/67 c/c art. 70 do Decreto nº 57.663/66. 2. O vencimento antecipado da dívida não altera o termo inicial do prazo prescricional, que continua sendo a data do vencimento da última parcela." (...) (N.U 1000659-16.2023.8.11.0030, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, Publicado no DJE 30/04/2025))” Por sua vez, a prescrição intercorrente começa a fluir após o transcurso do prazo de suspensão da execução por um ano, conforme previsto no art. 921, § 4º, do Código de Processo Civil, que assim dispõe: "§4º O termo inicial da prescrição no curso do processo será a ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis, e será suspensa, por uma única vez, pelo prazo máximo previsto no § 1º deste artigo." É perceptível que a prescrição intercorrente pressupõe que o processo já esteja em regular tramitação, com citação válida realizada dentro do prazo prescricional, sendo que a paralisação posterior por período superior ao prazo prescricional é que ocasiona a extinção do feito, situação processual não observada no presente caso. Por sua vez, a prescrição direta ocorre quando o prazo prescricional se esgota antes mesmo da realização da citação válida, impedindo que o processo produza seus efeitos interruptivos. Sobre a citação regular e a interrupção da prescrição direta, prescreve esse Egrégio Tribunal: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE EXECUÇÃO – NOTA DE CRÉDITO RURAL – PRESCRIÇÃO TRIENAL – DEMORA NA CITAÇÃO – TRANSCURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL DO TÍTULO – CITAÇÃO NÃO EFETIVADA DENTRO DO PRAZO LEGAL – AUSÊNCIA DE DEMORA IMPUTÁVEL AO MECANISMO DA JUSTIÇA – DILIGÊNCIAS INÓCUAS – PERPETUAÇÃO DO ANDAMENTO PROCESSUAL – PRESCRIÇÃO CONFIGURADA – DEVIDA A CONDENAÇÃO DO EXECUTADO AO ÔNUS SUCUMBENCIAL – PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, o prazo prescricional da ação de execução de cédula de crédito rural é de 3 (três) anos, a contar da data do vencimento do título, nos termos do art. 60 do Decreto-Lei n.º 167/67 e do art. 70 do Decreto n.º 57.663/66. Precedentes 2. A efetivação da citação é imprescindível para o desenvolvimento regular da lide e o despacho que recebe a petição inicial somente interrompe a prescrição, caso a citação seja realizada dentro do prazo legal, o que não aconteceu neste caso, incidindo a parte final do §2º do art. 240 do CC. 3. Não efetivada a citação tradicional, não tendo o credor realizado a citação por edital no prazo prescricional, vê-se que transcorreu sem interrupção da prescrição o prazo. (N.U 0000935-03.2015.8.11.0044, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Vice-Presidência, Julgado em 06/09/2024, Publicado no DJE 06/09/2024)” (grifo nosso) Assim, embora o magistrado de primeiro grau tenha fundamentado sua decisão no reconhecimento da prescrição intercorrente, a análise dos autos revela que o caso em exame configura, na verdade, hipótese de prescrição direta, e não intercorrente, como se passa a demonstrar. Pois bem. Analisando o conjunto processual, verifica-se que o vencimento da parcela única ocorreu em 19/11/2013 (cf. Id. nº 273645933 – Página 44), iniciando-se a contagem do prazo de 03 anos, que se encerrou em 20/11/2016. A citação do executado ocorreu apenas em 08/04/2019 (cf. Id. nº 273645934 – Página 48), portanto, alcançada pela prescrição direta. É fundamental destacar que não houve qualquer causa suspensiva do prazo prescricional, tampouco se pode atribuir ao Poder Judiciário a morosidade na citação do executado, sendo, portanto, inaplicável a súmula 106 do STJ no presente caso. Diferentemente do sustentado pelo apelante, a análise detalhada dos autos revela inércia injustificada e reiterada do exequente em diversos momentos processuais críticos. A ação de execução foi distribuída em 06 de agosto de 2014, sendo que a primeira tentativa de citação dos executados resultou infrutífera, conforme certificado em 25 de novembro de 2014 (cf. Id. nº 47308928 - Pág. 59). Após esta primeira tentativa malograda, o exequente foi devidamente intimado para se manifestar sobre a tentativa infrutífera e indicar providências para dar prosseguimento ao feito (cf. Id. nº 273645933 - Pág. 62). Contudo, manteve-se absolutamente silente por aproximadamente dois anos, caracterizando período de inércia que se estendeu de novembro de 2014 a novembro de 2016, sem adotar qualquer providência para localização dos executados ou viabilização da citação. Durante este período crítico de aproximadamente 24 meses, o exequente não requereu citação por edital, não solicitou diligências complementares junto a órgãos de proteção ao crédito, não forneceu endereços alternativos dos devedores, nem tampouco demonstrou qualquer iniciativa para impulsionar o processo. Tal conduta configura flagrante desídia processual, especialmente grave quando considerado que o prazo prescricional de três anos já estava em curso desde a distribuição da ação em 2014. Somente após quase três anos de inércia, em 16 de novembro de 2017, o exequente finalmente se manifestou nos autos requerendo nova tentativa de citação (cf. Id. nº 273645934 - Pág. 6). Todavia, esta segunda diligência também resultou infrutífera, conforme certificado em 23 de outubro de 2017 (cf. Id. nº 273645934 - Pág. 12). A citação efetiva ocorreu apenas em 04 de abril de 2019, quando foi citada exclusivamente a executada DEUSELIA (cf. Id. nº 273645934 - Pág. 48), momento em que a prescrição trienal já havia se consumado. O apelante sustenta que a citação de DEUSELIA em abril de 2019 teria interrompido a prescrição quanto a ambos os devedores, com fundamento no artigo 204, parágrafo primeiro, do Código Civil, que dispõe sobre os efeitos da interrupção da prescrição entre devedores solidários. Contudo, tal argumento não prospera quando submetido ao crivo da análise jurídica adequada, uma vez que a citação ocorreu após o transcurso completo do prazo prescricional. A eficácia interruptiva da citação de devedor solidário pressupõe necessariamente que a prescrição ainda esteja em curso no momento da citação. Não se pode admitir que a citação de um devedor solidário tenha o condão de ressuscitar prescrição já consumada, uma vez que a interrupção pressupõe a existência de um prazo prescricional em andamento. Admitir-se o contrário implicaria subversão completa do instituto da prescrição e violação aos princípios da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais. A jurisprudência tem sido clara no sentido de que não sendo promovida a citação da parte requerida dentro do prazo prescricional, bem como decorrido o prazo de dez dias para diligenciar neste sentido, não há interrupção da prescrição nos termos do artigo 202, inciso I, do Código Civil combinado com o artigo 240, parágrafos primeiro e segundo, do Código de Processo Civil. No caso concreto, o prazo prescricional de três anos esgotou-se em novembro de 2016, sendo que a citação de DEUSELIA somente ocorreu em abril de 2019, quando a prescrição já estava consumada há mais de dois anos. Como bem observado em precedente desta Corte sobre situação análoga: “E M E N T A ;APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – SENTENÇA QUE JULGOU EXTINTO O FEITO PELO RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DIRETA – IRRESIGNAÇÃO DA EXEQUENTE – NULIDADE DA CITAÇÃO – QUESTÃO DECIDIDA EM DECISÃO INTERLOCUTÓRIA NÃO IMPUGNADA OPORTUNAMENTE – MATÉRIA ALCANÇADA PELA PRECLUSÃO PRO JUDICATO – IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO EM SEDE DE APELAÇÃO – INTELIGÊNCIA DO ART. 505 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – PRESCRIÇÃO DIRETA – AUSÊNCIA DE CITAÇÃO VÁLIDA DA PARTE EXECUTADA – INEXISTÊNCIA DE CAUSA INTERRUPTIVA DO PRAZO PRESCRICIONAL – TRANSCURSO DO LAPSO QUINQUENAL PREVISTO NO ART. 206, § 5º, I, DO CÓDIGO CIVIL – INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 106 DO STJ – DEMORA NA CITAÇÃO NÃO IMPUTÁVEL AO MECANISMO JUDICIÁRIO – DESÍDIA DA PARTE EXEQUENTE EM PROMOVER OS ATOS NECESSÁRIOS À CITAÇÃO – SENTENÇA ESCORREITA – RECURSO DESPROVIDO. (...) Uma vez que não ocorreu a citação válida em tempo hábil, o despacho que a determinou perde sua eficácia interruptiva, não afetando o curso da prescrição. A interrupção da prescrição só retroage à data da propositura da ação se o autor promover a citação no prazo e na forma da lei, conforme o art. 240, § 2º, do CPC. A Súmula 106 do STJ não se aplica ao caso, pois a demora na citação não pode ser imputada a falhas nos serviços judiciários. A responsabilidade pelo sucesso da citação recai sobre a parte exequente, que deve diligenciar para assegurar a interrupção da prescrição. (...) (N.U 0000343-73.2007.8.11.0032, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/06/2025, Publicado no DJE 11/06/2025)” Desse modo, a inércia prolongada do exequente configura evidente descumprimento do ônus de impulsionar o processo, bem como violação do dever de lealdade processual. Tal comportamento processual inadequado não pode ser premiado com a aplicação de institutos protetivos como a Súmula 106 do Superior Tribunal de Justiça, que pressupõe diligência da parte interessada. Verifica-se, portanto, que o prazo prescricional de três anos se esgotou durante o período de inércia do exequente, entre 2013 e 2016, quando a citação ainda não havia sido efetivada. A posterior citação de DEUSELIA em 2019 ocorreu após o transcurso do prazo prescricional, sendo juridicamente ineficaz para interromper prescrição já consumada, uma vez que a interrupção pressupõe que o prazo prescricional ainda esteja em curso. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao Recurso de Apelação Cível interposto pelo Banco Bradesco S.A., mantendo inalterada a respeitável sentença proferida pelo Juízo singular que reconheceu a prescrição intercorrente e extinguiu o processo com resolução de mérito. Custas pelo apelante. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Alcides Ascendino De Azevedo Neto e outros x G S Umbrella Natal Ltda

ID: 255778932

Tribunal: TRT21 Órgão: 11ª Vara do Trabalho de Natal Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO SUMARíSSIMO Nº Processo: 0000377-70.2024.5.21.0017

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO EMANUEL CAMPOS DOS SANTOS

Polo Passivo:

G S UMBRELLA NATAL LTDA

Notificação

Advogados:

ANNA CAROLINE RODRIGUES SILVA

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

LUCAS LEITE RANGEL DE PONTES

OAB/PB XXXXXX Desbloquear

CARLOS HENRIQUE DE CARVALHO E SILVA

OAB/RN XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO 11ª VARA DO TRABALHO DE NATAL 0000377-70.2024.5.21.0017 : ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO : G S UMBRELLA NATA… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO 11ª VARA DO TRABALHO DE NATAL 0000377-70.2024.5.21.0017 : ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO : G S UMBRELLA NATAL LTDA INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 21226c4 proferida nos autos. SENTENÇA Vistos, etc. I. Fundamentos da decisão 1. Mérito 1.1. Reconhecimento de vínculo. Marceneiro. Rescisão indireta. Verbas salariais e rescisórias. FGTS. Multas celetistas Em sua peça inicial, o autor informa que foi admitido pela parte ré em 20/10/2023 para exercer a função de marceneiro, com remuneração mensal de R$1.500,00. Diz que dormia no galpão onde ocorriam as produções, para evitar furtos/roubos. Contudo, relata que o alojamento possuía condições precárias, sem a oferta de produtos de higiene e alimentação. Ademais, informa que não teve sua CTPS assinada e, por conseguinte, não houve depósitos de FGTS. Desse modo, requer o reconhecimento do vínculo empregatício, com a consequente anotação em CTPS, bem como, em razão das atitudes da acionada em violação às normas trabalhistas, a declaração da rescisão indireta do contrato de trabalho, além do pagamento das seguintes parcelas: saldo de salário; aviso prévio; 13º salário proporcional; férias proporcionais + 1/3; FGTS e multa de 40%; multa do art. 467 da CLT. A parte acionada, por sua vez, diz que, sensibilizada com a situação de necessidades financeiras do autor, ajustou, por meio de empreitada, que o acionante realizaria o serviço de corte de madeiras utilizadas na fabricação de seus produtos, recebendo como contraprestação pecuniária o valor de R$1.500,00. Alega que nunca existiu quaisquer outras exigências sobre horários e dias a trabalhar, uma vez que lhe interessava somente o resultado final. Aduz também que o acionante solicitou à parte ré autorização para pernoitar em um pequeno galpão da fábrica, sob a alegação de que residia em cidade do interior, o que lhe foi concedido. Contudo, relata que, em véspera do Natal do ano de 2023, o acionante fez uso de bebida alcoólica e, assim, promoveu severo distúrbio naquele local, sendo, por este motivo, compelido a não mais comparecer ao local da fábrica. Passo à análise. Destaco que os elementos caracterizadores da relação de emprego encontram-se previstos nos artigos 2° e 3° da CLT, quais sejam, pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica. Tais indicadores devem estar claramente comprovados, mesmo porque, o reconhecimento de sua aplicação, ao caso concreto, produz efeitos nas esferas civil, tributária e previdenciária, por exemplo. Em outras palavras, para que exista uma relação de emprego, faz-se mister que o serviço seja prestado por pessoa física, de forma intuito personae, isto é, o próprio empregado que deve executar os serviços de maneira contínua e não habitual, recebendo remuneração como contraprestação e subordinado juridicamente a ordens e fiscalização do empregador. Ressalte-se que, para o reconhecimento do vínculo de emprego, os mencionados requisitos devem estar simultaneamente presentes. Nessa esteira caminha o posicionamento jurisprudencial: VÍNCULO DE EMPREGO. ALEGAÇÃO DE TRABALHO AUTÔNOMO. ÔNUS DA PROVA. Hipótese em que o reclamado nega vínculo de emprego e alega que o reclamante atuava como pedreiro autônomo, sem subordinação ou habitualidade. Nos termos do art. 3º da CLT, são requisitos para o vínculo de emprego a pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação. Cabe ao reclamado o ônus de comprovar a alegada autonomia, conforme art. 818, II, da CLT. Ausentes provas robustas de autonomia e não comprovados os valores pagos de forma diversa da sentença, mantém-se o reconhecimento do vínculo empregatício nos termos fixados pela Origem. Recurso ordinário a que se nega provimento. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (11ª Turma). Acórdão: 1000659-24.2024.5.02.0372. Relator(a): LIBIA DA GRACA PIRES. Data de julgamento: 11/11/2024. Juntado aos autos em 18/11/2024. Disponível em: CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. MULTA DO ART. 467 DA CLT. Carece o recorrente de interesse recursal quanto ao tópico de multa do art. 467 da CLT, uma vez que se trata de parcela que não consta da condenação. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. CONFIGURAÇÃO. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 3º DA CLT. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Presentes os requisitos necessários à configuração da relação de emprego, à luz do disposto no artigo 3º consolidado, deve-se manter o reconhecimento do vínculo empregatício pretendido pelo autor. MULTA DO ART. 477, §8º, DA CLT DEVIDA MESMO NO CASO DE CONTROVÉRSIA DA EXISTÊNCIA DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO. SÚMULA N. 462 DO C. TST. A quitação a menor das verbas devidas pela rescisão contratual, ainda que controversa a própria existência do vínculo empregatício, não tem o condão de isentar a reclamada do pagamento da multa rescisória do art. 477, § 8º, da CLT, sob pena de se premiar o mau empregador, na linha do posicionamento expresso na Súmula n. 462 do C. TST. HORAS EXTRAS. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DOS CARTÕES DE PONTO. SOBREJORNADA COMPROVADA PELO RECLAMANTE POR MEIO DOS DOCUMENTOS DE ACOMPANHAMENTO VEICULAR. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. No caso, além de o reclamado não ter satisfeito seu ônus de comprovar a jornada de trabalho realizada, diante da ausência de apresentação dos cartões de ponto, o reclamante trouxe aos autos fichas de acompanhamento veicular que atestam o labor em sobrejornada. Desse modo, deve ser mantida a condenação ao pagamento de horas extras, nos moldes da sentença. Recurso ordinário conhecido e desprovido. Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (Segunda Turma de Julgamento). Acórdão: 0000856-27.2023.5.21.0008. Relator(a): BENTO HERCULANO DUARTE NETO. Data de julgamento: 16/10/2024. Juntado aos autos em 23/10/2024. Disponível em: Uma vez admitida a prestação de serviços, mas negada a existência do vínculo empregatício, passa a ser da acionada o ônus probatório quanto à ausência de trabalho subordinado, fato impeditivo do direito vindicado pelo autor. Em seu depoimento, o proprietário da empresa ré negou que o autor tenha trabalhado para si em qualquer atividade, afirmando apenas que conhecia o autor. Disse que o acionante trabalhava com uma pessoa que fornecia madeiramento ao réu, chamado Flávio Artur, que também não trabalhava para o réu, acrescentando que o trabalhador nunca dormiu no galpão da empresa acionada, assim como nunca pernoitou. Ora, o depoimento da parte ré permite a verificação de evidente contradição entre suas alegações e o disposto em sua contestação, uma vez que a própria peça de defesa contradiz a sua narrativa, posto que reconhece a prestação de serviços, bem como a permanência do acionante no galpão da fábrica para pernoitar. Ademais, em que pese a parte ré ter demonstrado em seu depoimento não possuir proximidade com Flávio Artur, constatei, no curso da instrução, que referido senhor é pai do acionado, estando, inclusive, presente na sala de audiências. Por sua vez, em depoimento, o autor esclareceu que trabalhou por três meses, entre outubro e dezembro, em prol da acionada, na serragem, "virava os alumínios" e descarregava carros. Relatou que foi convidado para trabalhar pelo pai do réu, Flávio, efetivo proprietário da empresa. Ora, por todo o cenário delineado nos autos é possível concluir pela existência do vínculo empregatício, nos moldes do art. 3º da CLT, tendo o acionante prestado serviço de forma assídua (não-eventual) e pessoal (não se fazia substituir por outro empregado), mediante contraprestação pecuniária e com subordinação jurídica à parte ré (“era Flávio quem indicava todas as atividades a serem realizadas durante a semana”). Corrobora essa posição o fato de que o acionado, ouvido perante o Judiciário, omitir a informação de que Flávio Artur é seu genitor, assim como faltar com a verdade de forma que foi além até mesmo dos limites estabelecidos pela sua própria defesa, tanto, que sequer foi ouvida a sua testemunha, conforme seu próprio requerimento. Ademais, ante as condições precárias em que era submetido o autor, sem assinatura de CTPS, sem pagamento de FGTS, e se considerando que cabe ao empregador zelar pelas condições de segurança e saúde do empregado, fica configurada a falta grave por parte da acionada, nos termos das alíneas "c" e "d" do art. 483 da CLT, razão pela qual reconheço a rescisão indireta do contrato de trabalho do acionante ocorrida em 08/01/2024 (consoante indicado em petição inicial). Diante de tais aspectos verificados, reconheço a existência de vínculo de emprego entre as partes, com início em 20/10/2023, na função de marceneiro, remuneração mensal no valor de R$1.500,00, tendo ocorrido a rescisão indireta do contrato de trabalho em 08/01/2024, com projeção do aviso prévio para o dia 07/02/2024. Desse modo, determino que a parte acionada, no prazo de 15 (quinze) dias a contar da ciência desta decisão, efetue e comprove nos autos, as devidas anotações determinadas neste decisum, as quais deverão ser efetuadas, nos termos do §7º do art. 29 da CLT, nos sistemas informatizados da CTPS em meio digital, sob pena de multa única no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais) revertida em favor do trabalhador, e apenas em caso de descumprimento, quando então as anotações serão feitas pela Secretaria da Vara do Trabalho. Reconhecida a rescisão indireta do contrato de trabalho, condeno a acionada ao pagamento das seguintes parcelas: a) saldo de salário (8 dias); b) aviso prévio indenizado (30 dias); c) 13º salário proporcional; d) férias proporcionais; e) FGTS e multa de 40%; Ressalto que os valores do FGTS inadimplidos devem ser, inicialmente, recolhidos na respectiva conta vinculada, nos termos do art. 26, parágrafo único da Lei 8.036/90 ("Nas reclamatórias trabalhistas que objetivam o ressarcimento de parcelas relativas ao FGTS, ou que, direta ou indiretamente, impliquem essa obrigação de fazer, o juiz determinará que a empresa sucumbente proceda ao recolhimento imediato das importâncias devidas a tal título"), de modo a evitar duplicidade de cobrança, pela atuação do Órgão Gestor (Caixa Econômica Federal) e da União Federal nessa mesma esfera, com todos os custos, inclusive para a própria parte ré, na discussão da satisfação da obrigação neste feito (cf.: OfícioCircular TRT/SCR/N. 33/2015; Ofício n. 1870/2015/PGFN/PG e NOTA PGFN/CDA/CRJ n. 3/2015; RECOMENDAÇÃO TRT CR Nº 4/2019). Por fim, ante a controvérsia existente nos autos, indefiro o pagamento da multa prevista no art. 467 da CLT. 1.2. Adicional de insalubridade A parte autora sustenta que, durante todo o período em que perdurou o contrato de trabalho, manteve contato permanente com determinados agentes insalubres previstos na NR 15, jamais tendo recebido adicional correspondente. Ademais, acrescenta que não recebia nenhum equipamento de proteção individual para atenuar os fatores de danos à saúde. Diz que estava exposto a diversos fatores insalubres, tais como: ruído constante e intermitente, trabalho diretamente com manuseio de químicos, poeira de madeira, poeira de lixa, cola fórmica, solvente e materiais de corte. Analiso. O texto consolidado trata do tema nos artigos 189 e 192, que assim dispõem: Art. 189. Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos. O art. 192 da CLT determina que o exercício de trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura a percepção de adicional, respectivamente, de 40% (quarenta por cento), 20% (vinte por cento) e 10% (dez por cento) do salário-mínimo, segundo se classifiquem nos graus máximo, médio ou mínimo. De acordo com o anexo 14 da NR 15 da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho e Emprego, considera-se insalubridade em grau máximo o trabalho ou operações em contato permanente em: pacientes em isolamento por doenças infecto-contagiosas, bem como objetos de seu uso, não previamente esterilizados; carnes, glândulas, vísceras, sangue, ossos, couros, pêlos e dejeções de animais portadores de doenças infecto-contagiosas (carbunculose, brucelose, tuberculose); esgotos (galerias e tanques); e lixo urbano (coleta e industrialização). A constatação do trabalho em condições insalubres é realizada por meio de prova técnica pericial, com observância das normas emitidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, nos termos do artigo 195 da Consolidação das Leis do Trabalho. Com efeito, a perícia técnica possui o intuito de fornecer embasamento fático para as conclusões do órgão julgador, que, todavia, não está adstrito às conclusões do laudo pericial, mas pode, utilizando outros meios de prova admitidos em direito, e respeitando seus limites no que diz respeito a conhecimentos técnicos especializados, concluir da maneira que seja mais condizente com o ordenamento jurídico. No caso dos autos, foi produzida perícia técnica específica para os autos. Verifico no Laudo pericial juntado sob ID. f92383d , que o Expert judicial Emanuel Campos dos Santos concluiu que as atividades realizadas pelo trabalhador eram classificadas como SALUBRES, in verbis: “4 – CONCLUSÃO Diante das avaliações realizadas e anteriormente descritas e, de acordo com o que estabelece a NORMA REGULAMENTADORA Nº 15 e seus ANEXOS, fundamentada na Lei 6.514/77 e Portaria Ministerial nº3.214/78 do MT, e considerado que o TRABALHADOR NÃO ESTAVA EXPOSTO A AGENTES INSALUBRES, permite-se concluir que as atividades desenvolvidas pelo reclamante, Sr. ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO exercendo as atividades de MARCENEIRO para a reclamada G S UMBRELLA NATAL LTDA, durante o período 20/10/2023 – 07/02/2024 foram consideradas SALUBRES. Além das conclusões periciais acima, o Expert Judicial ainda respondeu aos diversos quesitos formulados pelas partes, onde esclareceu dúvidas e reafirmou que as atividades desenvolvidas pelo autor eram consideradas SALUBRES. Ora, sustento que a perícia técnica possui o intuito de fornecer embasamento fático para as conclusões do órgão julgador, que, todavia, não está adstrito às conclusões do laudo pericial, mas pode, utilizando-se de outros meios de prova admitidos em direito, e respeitando seus limites no que diz respeito a conhecimentos técnicos especializados, concluir da maneira que seja mais condizente com o ordenamento jurídico. Assim, em que pese o juízo não ficar adstrito ao laudo pericial para formar sua convicção, nos termos do art. 479 do CPC, não há elementos nos autos que descaracterize a conclusão esposada pelo perito, o qual analisou o meio ambiente de trabalho no qual estava o obreiro inserido, além de apontar a legislação pertinente. Logo, diante de todo o exposto, acolho a conclusão técnica do laudo pericial, bem como as pretensões autorais relacionadas ao recebimento do adicional de insalubridade. Assim, julgo improcedente o pedido. 1.3. Jornada de trabalho. Horas extras. Intervalo intrajornada Requer ainda a parte autora a condenação da acionada ao pagamento de horas extras sob o argumento de que cumpria jornada de trabalho de segunda a sábado, das 7h às 17h, com 30 minutos de intervalo para refeição. Diz que, além da supracitada jornada, fazia aproximadamente 2 horas extras por dia em pelo menos quatro dias por semana. Analiso. Adentrando-se na temática da jornada de trabalho, destaco que, consoante regramento contido no art. 7º, inc. XIII, da CF/88, a duração normal do trabalho, salvo os casos especiais, é de 8 horas diárias e 44 semanais. No tocante ao registro da jornada de trabalho, dispõe o §2º do art. 74 da CLT que os estabelecimentos que possuírem mais de 20 trabalhadores são obrigados a realizarem a anotação da jornada de trabalho em registro manual, mecânico ou eletrônico, consoante instruções expedidas pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, sendo permitida a pré-assinalação do período de repouso. No caso dos autos, por possuir menos de 20 empregados, a empresa fica dispensada da apresentação dos registros de ponto, transferindo-se o ônus da prova para o acionante quanto a comprovação do alegado labor extraordinário. Em depoimento pessoal, o autor declarou que “trabalhava das 6h45min às 11h30min, e das 13h às 17h30min. Alguns dias o réu pedia para fazer uma ‘horinha extra’ para adiantar o serviço, mas essas horas não eram acertadas”. No entanto, tratando-se de encargo probatório do acionante, este não produziu prova para substanciar suas alegações. Indefiro o pedido. 1.4. Dano moral Por fim, pretende o acionante o pagamento de indenização por danos morais em razão de que, além de não ter sua CTPS assinada e os direitos reflexos em dia, “morava em alojamento precário, sem higiene, alimentação, ventilação, cama adequada para dormir e local adequado para realizar as refeições”. Analiso. Prevalece, na literatura jurídica brasileira, o conceito de danos morais como lesão a direitos da personalidade. É certo que o que se busca não é a precificação da dor ou sofrimento, mas sim uma forma para reparar, em parte, as consequências advindas do prejuízo imaterial. Assim, a finalidade do dano moral não consiste em aumentar o patrimônio da vítima, mas compensar os males suportados. Consoante Enunciado nº 445 da V Jornada de Direito Civil, “o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento.” Desse modo, concebe-se como superado o entendimento segundo o qual o elemento balizador para comprovação do dano moral está amparado na comprovação do efetivo sofrimento, vexame, humilhação. Isso porque, se assim fosse, a aferição do dano moral seria eminentemente subjetiva, na medida em que de um mesmo fato pode gerar sofrimento totalmente diferenciado, a depender da carga emocional da vítima em relação ao fato danoso. Assim sendo, um dano aparentemente desprezível para o homem comum poderia ser capaz de repercutir drasticamente para outra pessoa, enquanto um fato substancialmente danoso para o homem médio poderia ser irrelevante para outro indivíduo. Nessa perspectiva, entende-se que a interpretação acerca da existência de dano moral requer, antes de tudo, uma análise incidente sobre o fato objetivamente considerado. Isso porque uma vez comprovado que o fato é danoso à esfera personalíssima do indivíduo, já se presume a provocação de transtornos na sua vida pessoal, do que resulta seu principal efeito, o dano moral, cuja existência independe, portanto, de prova pelo empregado do sofrimento de que se faz vítima. Percebe-se, assim, que a compreensão afeta à consumação do dano moral se dá por meio de uma averiguação objetiva em relação ao fato danoso e não sobre o subjetivismo inerente à dor, ao sofrimento. Por essa razão, é que há casos em que o dano moral ocorre in re ipsa, cuja comprovação requer apenas a prova inerente à conduta, ao nexo causal e ao prejuízo provocado, sendo prescindível a prova do sofrimento provocado. No caso dos autos, ficou evidenciado, mediante vários arquivos de vídeo colacionados pelo autor, a omissão da empresa ré no seu dever de zelar pela higidez da saúde do trabalhador, especificamente das condições da habitação por ela fornecida, em clara inobservância a NR-24 do MTE, posto que não propiciou ambiente adequado, espaçoso, limpo e suficientemente digno para realização de alimentação e satisfação das necessidades fisiológicas do obreiro. Ao revés, os vídeos juntados retrataram a clara precariedade das instalações do alojamento fornecido pela acionada. Assim, comprovada a existência de dano imaterial indenizável, é devida a correspondente reparação. Acerca da fixação do quantum reparatório, a Lei nº. 13.467/2017 trouxe uma parametrização, onde estabelece como medição de reparação ao dano moral o montante salarial da vítima. Não se está tratando de indenização por dano material, cuja análise e quantificação deve estar desvencilhada de qualquer sentimentalismo, mas, como já tratado, de direitos integrantes de patrimônio imaterial e que adentram à esfera mais profunda do ser humano, do contrário, configurando mero dissabor, não seria sequer passível de reparação. Tendo em vista que "a indenização mede-se pela extensão do dano" (artigo 944, do CCB), "caberá ao juiz, equitativamente, fixar o valor da indenização, na conformidade e nas circunstâncias do caso" (artigo 953, parágrafo único, do CCB). Desta forma, ponderando os critérios objetivos indicados nos incisos do artigo 223-G celetista, considerando que o bem jurídico tutelado consiste em diversos direitos de ordem constitucional; a intensidade do sofrimento; a extensão e a duração da dos efeitos da ofensa (o autor ficou no alojamento em condições precárias por mais ou menos 3 meses); as condições em que ocorreu a ofensa; o grau de culpa da acionada; a ausência de esforço para minimizar a ofensa; ausente perdão, ainda que tácito, por parte do demandante; a capacidade econômico-financeira da empresa acionada, havendo grande distância socioeconômica entre as partes; ainda, em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, reputo que a ofensa se enquadra como de natureza média, que autoriza a fixação da indenização em até 5 (cinco) vezes o salário contratual do ofendido. Assim, observando o salário do autor (R$1.500,00), condeno a acionada a pagar o valor de R$3.000,00 (três mil reais) a título de reparação por dano moral, valor razoável e que não permite o enriquecimento ilícito da parte, observadas ainda as funções punitiva e pedagógica da medida. 2. Justiça gratuita e honorários periciais A parte autora pugna pela concessão da Justiça Gratuita, alegando que não pode litigar sem prejuízo de seu sustento e de sua família. Pela nova sistemática imposta pela Reforma Trabalhista, para a concessão dos benefícios da justiça gratuita a parte requerente deverá possuir salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do teto do Regime Geral de Previdência Social, ou ainda, referido benefício poderá ser deferido à parte que, mesmo auferindo remuneração superior aos limites anteriormente citados, comprove a insuficiência de recursos. Na hipótese dos autos, verifico que as últimas remunerações mensais auferidas pelo autor não superavam o limite de 40% (quarenta por cento) do teto do Regime Geral de Previdência Social, assim como, também não há nos autos qualquer prova ou indícios de que o obreiro tenha alcançado novo posto de trabalho com uma remuneração que supere tal limite estabelecido na lei n.º 13.467 de 2017. Logo, defiro o pedido de benefício da justiça gratuita formulado pela parte autora, já que preenchidos os requisitos contidos no art. 790, §3º, da CLT. Ratifico o valor de R$1.000,00 (hum mil reais), a título de honorários periciais, arbitrado em ata de audiência (ID. f9883a8), em favor do expert EMANUEL CAMPOS DOS SANTOS. A parte ré foi sucumbente na pretensão objeto da perícia, devendo, portanto, arcar com os honorários periciais. 3. Honorários advocatícios sucumbenciais No presente caso, houve sucumbência recíproca das partes, de forma que, levando-se em consideração o grau de complexidade da causa e a diligência dos patronos, fixo os honorários que são devidos pela reclamada, ao advogado do reclamante, em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação. Da mesma forma, os honorários devidos pelo reclamante, ao advogado da reclamada, também fixo em 5% (cinco por cento), porém esses sobre a diferença entre a totalidade dos pleitos autorais pretendidos e aqueles que restaram deferidos. Ainda quanto aos valores devidos ao advogado da reclamada, como o autor é beneficiário da gratuidade de justiça, declaro suspensa a exigibilidade de pagamento dos honorários sucumbenciais pela parte autora, inclusive em harmonia com o que foi decidido pelo STF na ação declaratória de inconstitucionalidade nº 5766 – DF, de forma que somente poderão ser executados se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. 4. Correção monetária O Supremo Tribunal Federal (STF) assentou que é inconstitucional a aplicação da Taxa Referencial (TR) para a correção monetária de débitos trabalhistas e de depósitos recursais no âmbito da Justiça do Trabalho. Dessa forma, conforme decisão da Corte, até que o Poder Legislativo deliberasse sobre a questão, deveria ser aplicado o Índice Nacional de Preço ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), na fase pré-judicial, e, a partir da citação, com efeitos retroativos à propositura da ação, a taxa Selic, índices de correção monetária vigentes para as condenações cíveis em geral. Na oportunidade, o STF utilizou a regra geral prevista no art. 406 do Código Civil, que dispõe sobre a aplicação da taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional, sendo essa atualmente a taxa Selic. Como a taxa Selic engloba os juros moratórios e correção monetária, sua incidência impede a aplicação de outros índices de atualização. Neste cenário, diante da decisão do STF, com efeito vinculante e erga omnes, para efeitos de liquidação deste julgado, a contadoria judicial estava aplicando o índice de correção IPCA-E, a partir do fato gerador do crédito trabalhista até a data do ajuizamento da ação, sendo que, a partir daí, o débito seria necessariamente atualizado pela taxa Selic, sem incidência de juros. Ocorre que, em 25/10/2024, foi publicada a decisão proferida pela SDI-1 do TST nos autos dos Embargos de Declaração em Recurso de Revista n. TST-E-ED-RR-713-03.2010.5.04.0029, nos quais foi estabelecida a aplicabilidade das alterações da Lei n. 14.905/2024, vigente a partir de 30/08/2024, que modificou os artigos 389 e 406, e respectivos parágrafos, do Código Civil. Desse modo, no tocante à correção monetária e aos juros de mora, deverão ser seguidos os seguintes critérios: a) até 29/08/2024, aplicam-se as regras definidas nas ADCs 58 e 59. Assim, o IPCA-E incide a partir do primeiro dia útil do mês seguinte à prestação dos serviços (conforme a Súmula 381 do TST) até a data de ajuizamento da ação. A partir dessa data, aplica-se exclusivamente a taxa SELIC como índice unificado de correção monetária e juros de mora. Desse modo, será utilizado o IPCA-E cumulado com a TR desde o vencimento das obrigações até a véspera do ajuizamento da ação, e, posteriormente, a taxa SELIC, sem acréscimos ou deduções, até 29/08/2024. b) a partir de 30/08/2024, a atualização monetária será calculada conforme os artigos 389 e 406 do Código Civil, com a redação dada pela Lei 14.905/2024. Nesse caso, aplica-se o IPCA para correção monetária, e os juros serão equivalentes ao resultado da SELIC menos o IPCA (taxa legal), desde o vencimento das obrigações até sua quitação integral. Caso a taxa legal seja negativa, será considerada igual a zero. II. Dispositivo Posto isso, nos autos da Ação Trabalhista proposta por ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO em face de G S UMBRELLA NATAL LTDA, decido, no mérito, julgar PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos para condenar a acionada nas seguintes obrigações: 1. Obrigação de fazer: Deverá a parte acionada, no prazo de 15 (quinze) dias após o trânsito em julgado, efetuar e comprovar nos autos, as devidas anotações determinadas neste decisum, (admissão em 20/10/2023, na função de marceneiro, remuneração mensal no valor de R$1.500,00, tendo ocorrido a rescisão indireta do contrato de trabalho em 08/01/2024, com projeção do aviso prévio para o dia 07/02/2024), as quais deverão ser efetuadas, nos termos do §7º do art. 29 da CLT, nos sistemas informatizados da CTPS em meio digital, ou, nos termos do art. 7º da Portaria nº 1.065, de 23 de setembro de 2019, expedida pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, em CTPS física, caso o empregador não ainda não utilize o eSocial, sob pena de multa única no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais) revertida em favor do trabalhador, e apenas em caso de descumprimento, quando então as anotações serão feitas pela Secretaria da Vara do Trabalho. 2. Obrigação de pagar: a) saldo de salário (8 dias); b) aviso prévio indenizado (30 dias); c) 13º salário proporcional; d) férias proporcionais; e) FGTS e multa de 40%; g) indenização por danos morais em R$3.000,00 (três mil reais). Ressalto que os valores do FGTS inadimplidos devem ser, inicialmente, recolhidos na respectiva conta vinculada, nos termos do art. 26, parágrafo único da Lei 8.036/90 ("Nas reclamatórias trabalhistas que objetivam o ressarcimento de parcelas relativas ao FGTS, ou que, direta ou indiretamente, impliquem essa obrigação de fazer, o juiz determinará que a empresa sucumbente proceda ao recolhimento imediato das importâncias devidas a tal título"), de modo a evitar duplicidade de cobrança, pela atuação do Órgão Gestor (Caixa Econômica Federal) e da União Federal nessa mesma esfera, com todos os custos, inclusive para a própria parte ré, na discussão da satisfação da obrigação neste feito (cf.: OfícioCircular TRT/SCR/N. 33/2015; Ofício n. 1870/2015/PGFN/PG e NOTA PGFN/CDA/CRJ n. 3/2015; RECOMENDAÇÃO TRT CR Nº 4/2019). Tudo na forma da fundamentação supra, que integra o presente dispositivo para todos os efeitos legais. Concede-se à parte autora os benefícios da justiça gratuita. São devidos honorários sucumbenciais arbitrados da seguinte forma: fixo os honorários que são devidos pela reclamada, ao advogado do reclamante, em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação. Da mesma forma, os honorários devidos pelo reclamante, ao advogado da reclamada, também fixo em 5 % (cinco por cento), porém esses sobre a diferença entre a totalidade dos pleitos autorais pretendidos e aqueles que restaram deferidos. Ainda quanto aos valores devidos ao advogado da reclamada, como o autor é beneficiário da gratuidade de justiça, declaro suspensa a exigibilidade de pagamento dos honorários sucumbenciais pela parte autora, inclusive em harmonia com o que foi decidido pelo STF na ação declaratória de inconstitucionalidade nº 5766 – DF, de forma que somente poderão ser executados se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. Ratifico o valor de R$1.000,00 (hum mil reais), a título de honorários periciais, arbitrado em ata de audiência (ID. f9883a8), em favor do expert EMAUNEL CAMPOS DOS SANTOS. A parte ré foi sucumbente na pretensão objeto da perícia, devendo, portanto, arcar com os honorários periciais. Liquidação a ser providenciada mediante cálculos, no momento processual adequado, em razão das férias da calculista da Unidade Judiciária. Incidência de juros e correção monetária na forma da lei, e das Súmulas nº 200 e 381 do C. TST. Nos termos dos arts. 880 e 882 da CLT, fica desde já ciente a parte ré que deverá satisfazer a obrigação de pagar contida nesta Sentença no prazo de 15 dias a contar da ciência da conta homologada pelo Juízo. Inerte a Ré, será esta inscrita em órgãos de proteção ao crédito ou no Banco Nacional de Devedores Trabalhistas (BNDT), podendo a decisão transitada em julgado ser levada a protesto, nos termos do artigo 883-A. Eventual execução de crédito previdenciário dar-se-á de ofício, ficando ciente a parte autora que execução de seu crédito dependerá de requerimento nos autos, advertido dos termos dos artigos 11-A e 878 da CLT, prosseguindo em seguida todos os demais atos executórios pelo impulso oficial, conforme artigo 765 da CLT, à exceção da desconsideração da personalidade jurídica, cujo incidente observará o procedimento previsto no artigo 885-A e §§ da CLT. Contribuições previdenciárias sob a responsabilidade do empregador, autorizada a dedução da quota-parte relativa à parte autora, ressalvado o entendimento particular desta Magistrada, sob pena de execução, nestes autos, nos termos do art. 114, VIII, da Constituição Federal, Súmula nº 368 do TST e OJ nº 363 da SDI-1 do TST. Observe-se a incidência sobre as parcelas de natureza remuneratória, conforme art. 28, § 9º, da Lei n. 8.212/91. No que se refere às contribuições previdenciárias objeto de condenação, considerando-se a necessidade de preservação da contagem de tempo de contribuição para fins de benefícios previdenciários previstos em lei, em especial a aposentadoria, bem como a obrigação legal do empregador informar sobre os dados relativos à arrecadação da contribuição social à Receita Federal do Brasil (art. 32, IV, Lei n. 8.212/91), determino que a parte executada apresente nos autos a comprovação do envio das informações sociais pertinentes mediante Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social - GFIP Retificadora, por mês de competência e em relação à parte exequente, a qual deverá ser enviada, eletronicamente, pelo Sistema Empresa de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social - SEFIP, sob pena de aplicações das cominações previstas na legislação previdenciária, a cargo da RFB, que será, em caso de inobservância pela Ré do presente comando, cientificada para esse fim, sem prejuízo de aplicação de multa. Para tanto, cabe ao Réu observar o conteúdo do art. 105 da Instrução Normativa n. 971/2009, da Secretaria da Receita Federal do Brasil, que estabelece a obrigação de informar os recolhimentos previdenciários por meio de GFIP, bem como o Provimento nº. 04/2008, da Corregedoria Regional do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região. Ressalto que a inadimplência da Ré sobre o crédito previdenciário resultará na aplicação da multa prevista no artigo 35, da lei nº. 8.212/1991. Os descontos fiscais se darão de acordo com a Lei 10.833/2003, com a OJ 400 e a Instrução Normativa nº 1.500, de 29/10/2014, da Receita Federal do Brasil. Observe-se a Portaria Normativa PGF/AGU nº 47, de 07.07.2023, em relação à intimação da União Federal (Autarquia Previdenciária). Custas, pela ré, calculadas em 2% sobre o valor da condenação, arbitrado em R$ 10.000,00. Intimem-se as partes. NATAL/RN, 11 de abril de 2025. DANIELA LUSTOZA MARQUES DE SOUZA CHAVES Juíza do Trabalho Titular Intimado(s) / Citado(s) - ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO

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Alcides Ascendino De Azevedo Neto e outros x G S Umbrella Natal Ltda

ID: 255778959

Tribunal: TRT21 Órgão: 11ª Vara do Trabalho de Natal Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO SUMARíSSIMO Nº Processo: 0000377-70.2024.5.21.0017

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO EMANUEL CAMPOS DOS SANTOS

Polo Passivo:

G S UMBRELLA NATAL LTDA

Notificação

Advogados:

ANNA CAROLINE RODRIGUES SILVA

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

LUCAS LEITE RANGEL DE PONTES

OAB/PB XXXXXX Desbloquear

CARLOS HENRIQUE DE CARVALHO E SILVA

OAB/RN XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO 11ª VARA DO TRABALHO DE NATAL 0000377-70.2024.5.21.0017 : ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO : G S UMBRELLA NATA… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO 11ª VARA DO TRABALHO DE NATAL 0000377-70.2024.5.21.0017 : ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO : G S UMBRELLA NATAL LTDA INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 21226c4 proferida nos autos. SENTENÇA Vistos, etc. I. Fundamentos da decisão 1. Mérito 1.1. Reconhecimento de vínculo. Marceneiro. Rescisão indireta. Verbas salariais e rescisórias. FGTS. Multas celetistas Em sua peça inicial, o autor informa que foi admitido pela parte ré em 20/10/2023 para exercer a função de marceneiro, com remuneração mensal de R$1.500,00. Diz que dormia no galpão onde ocorriam as produções, para evitar furtos/roubos. Contudo, relata que o alojamento possuía condições precárias, sem a oferta de produtos de higiene e alimentação. Ademais, informa que não teve sua CTPS assinada e, por conseguinte, não houve depósitos de FGTS. Desse modo, requer o reconhecimento do vínculo empregatício, com a consequente anotação em CTPS, bem como, em razão das atitudes da acionada em violação às normas trabalhistas, a declaração da rescisão indireta do contrato de trabalho, além do pagamento das seguintes parcelas: saldo de salário; aviso prévio; 13º salário proporcional; férias proporcionais + 1/3; FGTS e multa de 40%; multa do art. 467 da CLT. A parte acionada, por sua vez, diz que, sensibilizada com a situação de necessidades financeiras do autor, ajustou, por meio de empreitada, que o acionante realizaria o serviço de corte de madeiras utilizadas na fabricação de seus produtos, recebendo como contraprestação pecuniária o valor de R$1.500,00. Alega que nunca existiu quaisquer outras exigências sobre horários e dias a trabalhar, uma vez que lhe interessava somente o resultado final. Aduz também que o acionante solicitou à parte ré autorização para pernoitar em um pequeno galpão da fábrica, sob a alegação de que residia em cidade do interior, o que lhe foi concedido. Contudo, relata que, em véspera do Natal do ano de 2023, o acionante fez uso de bebida alcoólica e, assim, promoveu severo distúrbio naquele local, sendo, por este motivo, compelido a não mais comparecer ao local da fábrica. Passo à análise. Destaco que os elementos caracterizadores da relação de emprego encontram-se previstos nos artigos 2° e 3° da CLT, quais sejam, pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica. Tais indicadores devem estar claramente comprovados, mesmo porque, o reconhecimento de sua aplicação, ao caso concreto, produz efeitos nas esferas civil, tributária e previdenciária, por exemplo. Em outras palavras, para que exista uma relação de emprego, faz-se mister que o serviço seja prestado por pessoa física, de forma intuito personae, isto é, o próprio empregado que deve executar os serviços de maneira contínua e não habitual, recebendo remuneração como contraprestação e subordinado juridicamente a ordens e fiscalização do empregador. Ressalte-se que, para o reconhecimento do vínculo de emprego, os mencionados requisitos devem estar simultaneamente presentes. Nessa esteira caminha o posicionamento jurisprudencial: VÍNCULO DE EMPREGO. ALEGAÇÃO DE TRABALHO AUTÔNOMO. ÔNUS DA PROVA. Hipótese em que o reclamado nega vínculo de emprego e alega que o reclamante atuava como pedreiro autônomo, sem subordinação ou habitualidade. Nos termos do art. 3º da CLT, são requisitos para o vínculo de emprego a pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação. Cabe ao reclamado o ônus de comprovar a alegada autonomia, conforme art. 818, II, da CLT. Ausentes provas robustas de autonomia e não comprovados os valores pagos de forma diversa da sentença, mantém-se o reconhecimento do vínculo empregatício nos termos fixados pela Origem. Recurso ordinário a que se nega provimento. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (11ª Turma). Acórdão: 1000659-24.2024.5.02.0372. Relator(a): LIBIA DA GRACA PIRES. Data de julgamento: 11/11/2024. Juntado aos autos em 18/11/2024. Disponível em: CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. MULTA DO ART. 467 DA CLT. Carece o recorrente de interesse recursal quanto ao tópico de multa do art. 467 da CLT, uma vez que se trata de parcela que não consta da condenação. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. CONFIGURAÇÃO. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 3º DA CLT. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Presentes os requisitos necessários à configuração da relação de emprego, à luz do disposto no artigo 3º consolidado, deve-se manter o reconhecimento do vínculo empregatício pretendido pelo autor. MULTA DO ART. 477, §8º, DA CLT DEVIDA MESMO NO CASO DE CONTROVÉRSIA DA EXISTÊNCIA DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO. SÚMULA N. 462 DO C. TST. A quitação a menor das verbas devidas pela rescisão contratual, ainda que controversa a própria existência do vínculo empregatício, não tem o condão de isentar a reclamada do pagamento da multa rescisória do art. 477, § 8º, da CLT, sob pena de se premiar o mau empregador, na linha do posicionamento expresso na Súmula n. 462 do C. TST. HORAS EXTRAS. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DOS CARTÕES DE PONTO. SOBREJORNADA COMPROVADA PELO RECLAMANTE POR MEIO DOS DOCUMENTOS DE ACOMPANHAMENTO VEICULAR. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. No caso, além de o reclamado não ter satisfeito seu ônus de comprovar a jornada de trabalho realizada, diante da ausência de apresentação dos cartões de ponto, o reclamante trouxe aos autos fichas de acompanhamento veicular que atestam o labor em sobrejornada. Desse modo, deve ser mantida a condenação ao pagamento de horas extras, nos moldes da sentença. Recurso ordinário conhecido e desprovido. Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (Segunda Turma de Julgamento). Acórdão: 0000856-27.2023.5.21.0008. Relator(a): BENTO HERCULANO DUARTE NETO. Data de julgamento: 16/10/2024. Juntado aos autos em 23/10/2024. Disponível em: Uma vez admitida a prestação de serviços, mas negada a existência do vínculo empregatício, passa a ser da acionada o ônus probatório quanto à ausência de trabalho subordinado, fato impeditivo do direito vindicado pelo autor. Em seu depoimento, o proprietário da empresa ré negou que o autor tenha trabalhado para si em qualquer atividade, afirmando apenas que conhecia o autor. Disse que o acionante trabalhava com uma pessoa que fornecia madeiramento ao réu, chamado Flávio Artur, que também não trabalhava para o réu, acrescentando que o trabalhador nunca dormiu no galpão da empresa acionada, assim como nunca pernoitou. Ora, o depoimento da parte ré permite a verificação de evidente contradição entre suas alegações e o disposto em sua contestação, uma vez que a própria peça de defesa contradiz a sua narrativa, posto que reconhece a prestação de serviços, bem como a permanência do acionante no galpão da fábrica para pernoitar. Ademais, em que pese a parte ré ter demonstrado em seu depoimento não possuir proximidade com Flávio Artur, constatei, no curso da instrução, que referido senhor é pai do acionado, estando, inclusive, presente na sala de audiências. Por sua vez, em depoimento, o autor esclareceu que trabalhou por três meses, entre outubro e dezembro, em prol da acionada, na serragem, "virava os alumínios" e descarregava carros. Relatou que foi convidado para trabalhar pelo pai do réu, Flávio, efetivo proprietário da empresa. Ora, por todo o cenário delineado nos autos é possível concluir pela existência do vínculo empregatício, nos moldes do art. 3º da CLT, tendo o acionante prestado serviço de forma assídua (não-eventual) e pessoal (não se fazia substituir por outro empregado), mediante contraprestação pecuniária e com subordinação jurídica à parte ré (“era Flávio quem indicava todas as atividades a serem realizadas durante a semana”). Corrobora essa posição o fato de que o acionado, ouvido perante o Judiciário, omitir a informação de que Flávio Artur é seu genitor, assim como faltar com a verdade de forma que foi além até mesmo dos limites estabelecidos pela sua própria defesa, tanto, que sequer foi ouvida a sua testemunha, conforme seu próprio requerimento. Ademais, ante as condições precárias em que era submetido o autor, sem assinatura de CTPS, sem pagamento de FGTS, e se considerando que cabe ao empregador zelar pelas condições de segurança e saúde do empregado, fica configurada a falta grave por parte da acionada, nos termos das alíneas "c" e "d" do art. 483 da CLT, razão pela qual reconheço a rescisão indireta do contrato de trabalho do acionante ocorrida em 08/01/2024 (consoante indicado em petição inicial). Diante de tais aspectos verificados, reconheço a existência de vínculo de emprego entre as partes, com início em 20/10/2023, na função de marceneiro, remuneração mensal no valor de R$1.500,00, tendo ocorrido a rescisão indireta do contrato de trabalho em 08/01/2024, com projeção do aviso prévio para o dia 07/02/2024. Desse modo, determino que a parte acionada, no prazo de 15 (quinze) dias a contar da ciência desta decisão, efetue e comprove nos autos, as devidas anotações determinadas neste decisum, as quais deverão ser efetuadas, nos termos do §7º do art. 29 da CLT, nos sistemas informatizados da CTPS em meio digital, sob pena de multa única no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais) revertida em favor do trabalhador, e apenas em caso de descumprimento, quando então as anotações serão feitas pela Secretaria da Vara do Trabalho. Reconhecida a rescisão indireta do contrato de trabalho, condeno a acionada ao pagamento das seguintes parcelas: a) saldo de salário (8 dias); b) aviso prévio indenizado (30 dias); c) 13º salário proporcional; d) férias proporcionais; e) FGTS e multa de 40%; Ressalto que os valores do FGTS inadimplidos devem ser, inicialmente, recolhidos na respectiva conta vinculada, nos termos do art. 26, parágrafo único da Lei 8.036/90 ("Nas reclamatórias trabalhistas que objetivam o ressarcimento de parcelas relativas ao FGTS, ou que, direta ou indiretamente, impliquem essa obrigação de fazer, o juiz determinará que a empresa sucumbente proceda ao recolhimento imediato das importâncias devidas a tal título"), de modo a evitar duplicidade de cobrança, pela atuação do Órgão Gestor (Caixa Econômica Federal) e da União Federal nessa mesma esfera, com todos os custos, inclusive para a própria parte ré, na discussão da satisfação da obrigação neste feito (cf.: OfícioCircular TRT/SCR/N. 33/2015; Ofício n. 1870/2015/PGFN/PG e NOTA PGFN/CDA/CRJ n. 3/2015; RECOMENDAÇÃO TRT CR Nº 4/2019). Por fim, ante a controvérsia existente nos autos, indefiro o pagamento da multa prevista no art. 467 da CLT. 1.2. Adicional de insalubridade A parte autora sustenta que, durante todo o período em que perdurou o contrato de trabalho, manteve contato permanente com determinados agentes insalubres previstos na NR 15, jamais tendo recebido adicional correspondente. Ademais, acrescenta que não recebia nenhum equipamento de proteção individual para atenuar os fatores de danos à saúde. Diz que estava exposto a diversos fatores insalubres, tais como: ruído constante e intermitente, trabalho diretamente com manuseio de químicos, poeira de madeira, poeira de lixa, cola fórmica, solvente e materiais de corte. Analiso. O texto consolidado trata do tema nos artigos 189 e 192, que assim dispõem: Art. 189. Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos. O art. 192 da CLT determina que o exercício de trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura a percepção de adicional, respectivamente, de 40% (quarenta por cento), 20% (vinte por cento) e 10% (dez por cento) do salário-mínimo, segundo se classifiquem nos graus máximo, médio ou mínimo. De acordo com o anexo 14 da NR 15 da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho e Emprego, considera-se insalubridade em grau máximo o trabalho ou operações em contato permanente em: pacientes em isolamento por doenças infecto-contagiosas, bem como objetos de seu uso, não previamente esterilizados; carnes, glândulas, vísceras, sangue, ossos, couros, pêlos e dejeções de animais portadores de doenças infecto-contagiosas (carbunculose, brucelose, tuberculose); esgotos (galerias e tanques); e lixo urbano (coleta e industrialização). A constatação do trabalho em condições insalubres é realizada por meio de prova técnica pericial, com observância das normas emitidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, nos termos do artigo 195 da Consolidação das Leis do Trabalho. Com efeito, a perícia técnica possui o intuito de fornecer embasamento fático para as conclusões do órgão julgador, que, todavia, não está adstrito às conclusões do laudo pericial, mas pode, utilizando outros meios de prova admitidos em direito, e respeitando seus limites no que diz respeito a conhecimentos técnicos especializados, concluir da maneira que seja mais condizente com o ordenamento jurídico. No caso dos autos, foi produzida perícia técnica específica para os autos. Verifico no Laudo pericial juntado sob ID. f92383d , que o Expert judicial Emanuel Campos dos Santos concluiu que as atividades realizadas pelo trabalhador eram classificadas como SALUBRES, in verbis: “4 – CONCLUSÃO Diante das avaliações realizadas e anteriormente descritas e, de acordo com o que estabelece a NORMA REGULAMENTADORA Nº 15 e seus ANEXOS, fundamentada na Lei 6.514/77 e Portaria Ministerial nº3.214/78 do MT, e considerado que o TRABALHADOR NÃO ESTAVA EXPOSTO A AGENTES INSALUBRES, permite-se concluir que as atividades desenvolvidas pelo reclamante, Sr. ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO exercendo as atividades de MARCENEIRO para a reclamada G S UMBRELLA NATAL LTDA, durante o período 20/10/2023 – 07/02/2024 foram consideradas SALUBRES. Além das conclusões periciais acima, o Expert Judicial ainda respondeu aos diversos quesitos formulados pelas partes, onde esclareceu dúvidas e reafirmou que as atividades desenvolvidas pelo autor eram consideradas SALUBRES. Ora, sustento que a perícia técnica possui o intuito de fornecer embasamento fático para as conclusões do órgão julgador, que, todavia, não está adstrito às conclusões do laudo pericial, mas pode, utilizando-se de outros meios de prova admitidos em direito, e respeitando seus limites no que diz respeito a conhecimentos técnicos especializados, concluir da maneira que seja mais condizente com o ordenamento jurídico. Assim, em que pese o juízo não ficar adstrito ao laudo pericial para formar sua convicção, nos termos do art. 479 do CPC, não há elementos nos autos que descaracterize a conclusão esposada pelo perito, o qual analisou o meio ambiente de trabalho no qual estava o obreiro inserido, além de apontar a legislação pertinente. Logo, diante de todo o exposto, acolho a conclusão técnica do laudo pericial, bem como as pretensões autorais relacionadas ao recebimento do adicional de insalubridade. Assim, julgo improcedente o pedido. 1.3. Jornada de trabalho. Horas extras. Intervalo intrajornada Requer ainda a parte autora a condenação da acionada ao pagamento de horas extras sob o argumento de que cumpria jornada de trabalho de segunda a sábado, das 7h às 17h, com 30 minutos de intervalo para refeição. Diz que, além da supracitada jornada, fazia aproximadamente 2 horas extras por dia em pelo menos quatro dias por semana. Analiso. Adentrando-se na temática da jornada de trabalho, destaco que, consoante regramento contido no art. 7º, inc. XIII, da CF/88, a duração normal do trabalho, salvo os casos especiais, é de 8 horas diárias e 44 semanais. No tocante ao registro da jornada de trabalho, dispõe o §2º do art. 74 da CLT que os estabelecimentos que possuírem mais de 20 trabalhadores são obrigados a realizarem a anotação da jornada de trabalho em registro manual, mecânico ou eletrônico, consoante instruções expedidas pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, sendo permitida a pré-assinalação do período de repouso. No caso dos autos, por possuir menos de 20 empregados, a empresa fica dispensada da apresentação dos registros de ponto, transferindo-se o ônus da prova para o acionante quanto a comprovação do alegado labor extraordinário. Em depoimento pessoal, o autor declarou que “trabalhava das 6h45min às 11h30min, e das 13h às 17h30min. Alguns dias o réu pedia para fazer uma ‘horinha extra’ para adiantar o serviço, mas essas horas não eram acertadas”. No entanto, tratando-se de encargo probatório do acionante, este não produziu prova para substanciar suas alegações. Indefiro o pedido. 1.4. Dano moral Por fim, pretende o acionante o pagamento de indenização por danos morais em razão de que, além de não ter sua CTPS assinada e os direitos reflexos em dia, “morava em alojamento precário, sem higiene, alimentação, ventilação, cama adequada para dormir e local adequado para realizar as refeições”. Analiso. Prevalece, na literatura jurídica brasileira, o conceito de danos morais como lesão a direitos da personalidade. É certo que o que se busca não é a precificação da dor ou sofrimento, mas sim uma forma para reparar, em parte, as consequências advindas do prejuízo imaterial. Assim, a finalidade do dano moral não consiste em aumentar o patrimônio da vítima, mas compensar os males suportados. Consoante Enunciado nº 445 da V Jornada de Direito Civil, “o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento.” Desse modo, concebe-se como superado o entendimento segundo o qual o elemento balizador para comprovação do dano moral está amparado na comprovação do efetivo sofrimento, vexame, humilhação. Isso porque, se assim fosse, a aferição do dano moral seria eminentemente subjetiva, na medida em que de um mesmo fato pode gerar sofrimento totalmente diferenciado, a depender da carga emocional da vítima em relação ao fato danoso. Assim sendo, um dano aparentemente desprezível para o homem comum poderia ser capaz de repercutir drasticamente para outra pessoa, enquanto um fato substancialmente danoso para o homem médio poderia ser irrelevante para outro indivíduo. Nessa perspectiva, entende-se que a interpretação acerca da existência de dano moral requer, antes de tudo, uma análise incidente sobre o fato objetivamente considerado. Isso porque uma vez comprovado que o fato é danoso à esfera personalíssima do indivíduo, já se presume a provocação de transtornos na sua vida pessoal, do que resulta seu principal efeito, o dano moral, cuja existência independe, portanto, de prova pelo empregado do sofrimento de que se faz vítima. Percebe-se, assim, que a compreensão afeta à consumação do dano moral se dá por meio de uma averiguação objetiva em relação ao fato danoso e não sobre o subjetivismo inerente à dor, ao sofrimento. Por essa razão, é que há casos em que o dano moral ocorre in re ipsa, cuja comprovação requer apenas a prova inerente à conduta, ao nexo causal e ao prejuízo provocado, sendo prescindível a prova do sofrimento provocado. No caso dos autos, ficou evidenciado, mediante vários arquivos de vídeo colacionados pelo autor, a omissão da empresa ré no seu dever de zelar pela higidez da saúde do trabalhador, especificamente das condições da habitação por ela fornecida, em clara inobservância a NR-24 do MTE, posto que não propiciou ambiente adequado, espaçoso, limpo e suficientemente digno para realização de alimentação e satisfação das necessidades fisiológicas do obreiro. Ao revés, os vídeos juntados retrataram a clara precariedade das instalações do alojamento fornecido pela acionada. Assim, comprovada a existência de dano imaterial indenizável, é devida a correspondente reparação. Acerca da fixação do quantum reparatório, a Lei nº. 13.467/2017 trouxe uma parametrização, onde estabelece como medição de reparação ao dano moral o montante salarial da vítima. Não se está tratando de indenização por dano material, cuja análise e quantificação deve estar desvencilhada de qualquer sentimentalismo, mas, como já tratado, de direitos integrantes de patrimônio imaterial e que adentram à esfera mais profunda do ser humano, do contrário, configurando mero dissabor, não seria sequer passível de reparação. Tendo em vista que "a indenização mede-se pela extensão do dano" (artigo 944, do CCB), "caberá ao juiz, equitativamente, fixar o valor da indenização, na conformidade e nas circunstâncias do caso" (artigo 953, parágrafo único, do CCB). Desta forma, ponderando os critérios objetivos indicados nos incisos do artigo 223-G celetista, considerando que o bem jurídico tutelado consiste em diversos direitos de ordem constitucional; a intensidade do sofrimento; a extensão e a duração da dos efeitos da ofensa (o autor ficou no alojamento em condições precárias por mais ou menos 3 meses); as condições em que ocorreu a ofensa; o grau de culpa da acionada; a ausência de esforço para minimizar a ofensa; ausente perdão, ainda que tácito, por parte do demandante; a capacidade econômico-financeira da empresa acionada, havendo grande distância socioeconômica entre as partes; ainda, em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, reputo que a ofensa se enquadra como de natureza média, que autoriza a fixação da indenização em até 5 (cinco) vezes o salário contratual do ofendido. Assim, observando o salário do autor (R$1.500,00), condeno a acionada a pagar o valor de R$3.000,00 (três mil reais) a título de reparação por dano moral, valor razoável e que não permite o enriquecimento ilícito da parte, observadas ainda as funções punitiva e pedagógica da medida. 2. Justiça gratuita e honorários periciais A parte autora pugna pela concessão da Justiça Gratuita, alegando que não pode litigar sem prejuízo de seu sustento e de sua família. Pela nova sistemática imposta pela Reforma Trabalhista, para a concessão dos benefícios da justiça gratuita a parte requerente deverá possuir salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do teto do Regime Geral de Previdência Social, ou ainda, referido benefício poderá ser deferido à parte que, mesmo auferindo remuneração superior aos limites anteriormente citados, comprove a insuficiência de recursos. Na hipótese dos autos, verifico que as últimas remunerações mensais auferidas pelo autor não superavam o limite de 40% (quarenta por cento) do teto do Regime Geral de Previdência Social, assim como, também não há nos autos qualquer prova ou indícios de que o obreiro tenha alcançado novo posto de trabalho com uma remuneração que supere tal limite estabelecido na lei n.º 13.467 de 2017. Logo, defiro o pedido de benefício da justiça gratuita formulado pela parte autora, já que preenchidos os requisitos contidos no art. 790, §3º, da CLT. Ratifico o valor de R$1.000,00 (hum mil reais), a título de honorários periciais, arbitrado em ata de audiência (ID. f9883a8), em favor do expert EMANUEL CAMPOS DOS SANTOS. A parte ré foi sucumbente na pretensão objeto da perícia, devendo, portanto, arcar com os honorários periciais. 3. Honorários advocatícios sucumbenciais No presente caso, houve sucumbência recíproca das partes, de forma que, levando-se em consideração o grau de complexidade da causa e a diligência dos patronos, fixo os honorários que são devidos pela reclamada, ao advogado do reclamante, em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação. Da mesma forma, os honorários devidos pelo reclamante, ao advogado da reclamada, também fixo em 5% (cinco por cento), porém esses sobre a diferença entre a totalidade dos pleitos autorais pretendidos e aqueles que restaram deferidos. Ainda quanto aos valores devidos ao advogado da reclamada, como o autor é beneficiário da gratuidade de justiça, declaro suspensa a exigibilidade de pagamento dos honorários sucumbenciais pela parte autora, inclusive em harmonia com o que foi decidido pelo STF na ação declaratória de inconstitucionalidade nº 5766 – DF, de forma que somente poderão ser executados se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. 4. Correção monetária O Supremo Tribunal Federal (STF) assentou que é inconstitucional a aplicação da Taxa Referencial (TR) para a correção monetária de débitos trabalhistas e de depósitos recursais no âmbito da Justiça do Trabalho. Dessa forma, conforme decisão da Corte, até que o Poder Legislativo deliberasse sobre a questão, deveria ser aplicado o Índice Nacional de Preço ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), na fase pré-judicial, e, a partir da citação, com efeitos retroativos à propositura da ação, a taxa Selic, índices de correção monetária vigentes para as condenações cíveis em geral. Na oportunidade, o STF utilizou a regra geral prevista no art. 406 do Código Civil, que dispõe sobre a aplicação da taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional, sendo essa atualmente a taxa Selic. Como a taxa Selic engloba os juros moratórios e correção monetária, sua incidência impede a aplicação de outros índices de atualização. Neste cenário, diante da decisão do STF, com efeito vinculante e erga omnes, para efeitos de liquidação deste julgado, a contadoria judicial estava aplicando o índice de correção IPCA-E, a partir do fato gerador do crédito trabalhista até a data do ajuizamento da ação, sendo que, a partir daí, o débito seria necessariamente atualizado pela taxa Selic, sem incidência de juros. Ocorre que, em 25/10/2024, foi publicada a decisão proferida pela SDI-1 do TST nos autos dos Embargos de Declaração em Recurso de Revista n. TST-E-ED-RR-713-03.2010.5.04.0029, nos quais foi estabelecida a aplicabilidade das alterações da Lei n. 14.905/2024, vigente a partir de 30/08/2024, que modificou os artigos 389 e 406, e respectivos parágrafos, do Código Civil. Desse modo, no tocante à correção monetária e aos juros de mora, deverão ser seguidos os seguintes critérios: a) até 29/08/2024, aplicam-se as regras definidas nas ADCs 58 e 59. Assim, o IPCA-E incide a partir do primeiro dia útil do mês seguinte à prestação dos serviços (conforme a Súmula 381 do TST) até a data de ajuizamento da ação. A partir dessa data, aplica-se exclusivamente a taxa SELIC como índice unificado de correção monetária e juros de mora. Desse modo, será utilizado o IPCA-E cumulado com a TR desde o vencimento das obrigações até a véspera do ajuizamento da ação, e, posteriormente, a taxa SELIC, sem acréscimos ou deduções, até 29/08/2024. b) a partir de 30/08/2024, a atualização monetária será calculada conforme os artigos 389 e 406 do Código Civil, com a redação dada pela Lei 14.905/2024. Nesse caso, aplica-se o IPCA para correção monetária, e os juros serão equivalentes ao resultado da SELIC menos o IPCA (taxa legal), desde o vencimento das obrigações até sua quitação integral. Caso a taxa legal seja negativa, será considerada igual a zero. II. Dispositivo Posto isso, nos autos da Ação Trabalhista proposta por ALCIDES ASCENDINO DE AZEVEDO NETO em face de G S UMBRELLA NATAL LTDA, decido, no mérito, julgar PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos para condenar a acionada nas seguintes obrigações: 1. Obrigação de fazer: Deverá a parte acionada, no prazo de 15 (quinze) dias após o trânsito em julgado, efetuar e comprovar nos autos, as devidas anotações determinadas neste decisum, (admissão em 20/10/2023, na função de marceneiro, remuneração mensal no valor de R$1.500,00, tendo ocorrido a rescisão indireta do contrato de trabalho em 08/01/2024, com projeção do aviso prévio para o dia 07/02/2024), as quais deverão ser efetuadas, nos termos do §7º do art. 29 da CLT, nos sistemas informatizados da CTPS em meio digital, ou, nos termos do art. 7º da Portaria nº 1.065, de 23 de setembro de 2019, expedida pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, em CTPS física, caso o empregador não ainda não utilize o eSocial, sob pena de multa única no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais) revertida em favor do trabalhador, e apenas em caso de descumprimento, quando então as anotações serão feitas pela Secretaria da Vara do Trabalho. 2. Obrigação de pagar: a) saldo de salário (8 dias); b) aviso prévio indenizado (30 dias); c) 13º salário proporcional; d) férias proporcionais; e) FGTS e multa de 40%; g) indenização por danos morais em R$3.000,00 (três mil reais). Ressalto que os valores do FGTS inadimplidos devem ser, inicialmente, recolhidos na respectiva conta vinculada, nos termos do art. 26, parágrafo único da Lei 8.036/90 ("Nas reclamatórias trabalhistas que objetivam o ressarcimento de parcelas relativas ao FGTS, ou que, direta ou indiretamente, impliquem essa obrigação de fazer, o juiz determinará que a empresa sucumbente proceda ao recolhimento imediato das importâncias devidas a tal título"), de modo a evitar duplicidade de cobrança, pela atuação do Órgão Gestor (Caixa Econômica Federal) e da União Federal nessa mesma esfera, com todos os custos, inclusive para a própria parte ré, na discussão da satisfação da obrigação neste feito (cf.: OfícioCircular TRT/SCR/N. 33/2015; Ofício n. 1870/2015/PGFN/PG e NOTA PGFN/CDA/CRJ n. 3/2015; RECOMENDAÇÃO TRT CR Nº 4/2019). Tudo na forma da fundamentação supra, que integra o presente dispositivo para todos os efeitos legais. Concede-se à parte autora os benefícios da justiça gratuita. São devidos honorários sucumbenciais arbitrados da seguinte forma: fixo os honorários que são devidos pela reclamada, ao advogado do reclamante, em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação. Da mesma forma, os honorários devidos pelo reclamante, ao advogado da reclamada, também fixo em 5 % (cinco por cento), porém esses sobre a diferença entre a totalidade dos pleitos autorais pretendidos e aqueles que restaram deferidos. Ainda quanto aos valores devidos ao advogado da reclamada, como o autor é beneficiário da gratuidade de justiça, declaro suspensa a exigibilidade de pagamento dos honorários sucumbenciais pela parte autora, inclusive em harmonia com o que foi decidido pelo STF na ação declaratória de inconstitucionalidade nº 5766 – DF, de forma que somente poderão ser executados se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. Ratifico o valor de R$1.000,00 (hum mil reais), a título de honorários periciais, arbitrado em ata de audiência (ID. f9883a8), em favor do expert EMAUNEL CAMPOS DOS SANTOS. A parte ré foi sucumbente na pretensão objeto da perícia, devendo, portanto, arcar com os honorários periciais. Liquidação a ser providenciada mediante cálculos, no momento processual adequado, em razão das férias da calculista da Unidade Judiciária. Incidência de juros e correção monetária na forma da lei, e das Súmulas nº 200 e 381 do C. TST. Nos termos dos arts. 880 e 882 da CLT, fica desde já ciente a parte ré que deverá satisfazer a obrigação de pagar contida nesta Sentença no prazo de 15 dias a contar da ciência da conta homologada pelo Juízo. Inerte a Ré, será esta inscrita em órgãos de proteção ao crédito ou no Banco Nacional de Devedores Trabalhistas (BNDT), podendo a decisão transitada em julgado ser levada a protesto, nos termos do artigo 883-A. Eventual execução de crédito previdenciário dar-se-á de ofício, ficando ciente a parte autora que execução de seu crédito dependerá de requerimento nos autos, advertido dos termos dos artigos 11-A e 878 da CLT, prosseguindo em seguida todos os demais atos executórios pelo impulso oficial, conforme artigo 765 da CLT, à exceção da desconsideração da personalidade jurídica, cujo incidente observará o procedimento previsto no artigo 885-A e §§ da CLT. Contribuições previdenciárias sob a responsabilidade do empregador, autorizada a dedução da quota-parte relativa à parte autora, ressalvado o entendimento particular desta Magistrada, sob pena de execução, nestes autos, nos termos do art. 114, VIII, da Constituição Federal, Súmula nº 368 do TST e OJ nº 363 da SDI-1 do TST. Observe-se a incidência sobre as parcelas de natureza remuneratória, conforme art. 28, § 9º, da Lei n. 8.212/91. No que se refere às contribuições previdenciárias objeto de condenação, considerando-se a necessidade de preservação da contagem de tempo de contribuição para fins de benefícios previdenciários previstos em lei, em especial a aposentadoria, bem como a obrigação legal do empregador informar sobre os dados relativos à arrecadação da contribuição social à Receita Federal do Brasil (art. 32, IV, Lei n. 8.212/91), determino que a parte executada apresente nos autos a comprovação do envio das informações sociais pertinentes mediante Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social - GFIP Retificadora, por mês de competência e em relação à parte exequente, a qual deverá ser enviada, eletronicamente, pelo Sistema Empresa de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social - SEFIP, sob pena de aplicações das cominações previstas na legislação previdenciária, a cargo da RFB, que será, em caso de inobservância pela Ré do presente comando, cientificada para esse fim, sem prejuízo de aplicação de multa. Para tanto, cabe ao Réu observar o conteúdo do art. 105 da Instrução Normativa n. 971/2009, da Secretaria da Receita Federal do Brasil, que estabelece a obrigação de informar os recolhimentos previdenciários por meio de GFIP, bem como o Provimento nº. 04/2008, da Corregedoria Regional do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região. Ressalto que a inadimplência da Ré sobre o crédito previdenciário resultará na aplicação da multa prevista no artigo 35, da lei nº. 8.212/1991. Os descontos fiscais se darão de acordo com a Lei 10.833/2003, com a OJ 400 e a Instrução Normativa nº 1.500, de 29/10/2014, da Receita Federal do Brasil. Observe-se a Portaria Normativa PGF/AGU nº 47, de 07.07.2023, em relação à intimação da União Federal (Autarquia Previdenciária). Custas, pela ré, calculadas em 2% sobre o valor da condenação, arbitrado em R$ 10.000,00. Intimem-se as partes. NATAL/RN, 11 de abril de 2025. DANIELA LUSTOZA MARQUES DE SOUZA CHAVES Juíza do Trabalho Titular Intimado(s) / Citado(s) - G S UMBRELLA NATAL LTDA

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