Ministério Público Do Estado De Mato Grosso x Evandro Ribeiro De Souza
ID: 275734687
Tribunal: TJMT
Órgão: 13ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 1000826-94.2023.8.11.0042
Data de Disponibilização:
21/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 13ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ SENTENÇA Ação Penal n. 1000826-94.2023.8.11.0042 Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO Réu: EVANDRO RIBEIRO DE SOUZA Vi…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 13ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ SENTENÇA Ação Penal n. 1000826-94.2023.8.11.0042 Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO Réu: EVANDRO RIBEIRO DE SOUZA Vistos, etc. Trata-se de Ação Penal proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em desfavor de EVANDRO RIBEIRO DE SOUZA, brasileiro, solteiro, barbeiro, natural de Cuiabá/MT, nascido em 31/10/1990, filho de Ailon Ribeiro de Sousa e Adinalva Lemos da Silva Sousa, portador do RG n.º 21140316 SSP/MT, inscrito no CPF sob o n.º 746.691.411-04, residente e domiciliado na Rua Minas Gerais, nº. 648, bairro Jardim Novo Horizonte, em Cuiabá/MT – atualmente preso por outro processo na Penitenciária Central do Estado -, como incurso pela prática, em tese, do crime previsto no art. 33, “caput”, da Lei n. 11.343/06. Diz a peça acusatória, em síntese que: “No dia 17 de novembro de 2022, por volta das 18h50min, na residência situada na avenida Goiás, n.° 648, bairro Novo Horizonte, nesta cidade de Cuiabá-MT, o denunciado EVANDRO RIBEIRO DE SOUZA foi preso em flagrante delito por guardar e ter em depósito drogas, para outros fins que não o consumo próprio, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. “Consta que a equipe Raio 02 estava em moto patrulhamento tático pelo bairro Novo Horizonte, quando se deparou com o denunciado em frente a um salão/barbearia (foto - ID 107823350), sabidamente utilizado para o comércio e uso ilícito de drogas, momento em que o denunciado, ao perceber a presença dos policiais, rapidamente entrou para o interior do referido estabelecimento”. “Ato contínuo os policiais militares realizaram o acompanhamento e abordagem do denunciado, já no interior do estabelecimento, onde também é sua residência.” “Feita a revista pessoal, nada de ilícito foi encontrado em poder do denunciado, porém, na busca pelo local, os agentes encontraram próximo ao denunciado, no bolso de uma calça jogada no chão, 01 (uma) porção grande, em vários pedaços, de substância análoga a pasta base de cocaína e 01 (uma) porção pequena de substância análoga a cocaína, conforme foto juntada no ID 107822928; já em poder do denunciado, foi apreendida a quantia de R$ 365,00 (trezentos e sessenta e cinco reais), em notas trocadas.” “O laudo pericial preliminar n.° 2184/2022 e o laudo pericial definitivo n.º 3.14.2022.90321-01, ambos em anexo, concluíram que as porções apreendidas, sendo 01 (uma) porção de material de tonalidade esbranquiçada, na forma de pó, formando embalagem do tipo trouxa, com massa de 3,12 g (três gramas e doze centigramas), e 01 (uma) porção de material de tonalidade amarelada, na forma de pó, grânulos e várias pedras, formando embalagem do tipo trouxa, com massa de 25,11 g (vinte e cinco gramas e onze centigramas), apresentaram resultado POSITIVO para COCAÍNA, substância entorpecente, de uso proscrito no Brasil, considerada capaz de causar dependência física e psíquica, elencada na lista F1 da Portaria n.° 344/ANVISA/MS.” “Interrogado na delegacia (ID 107822935), o denunciado, contrariando todas as evidências, negou qualquer tipo de envolvimento com o tráfico de drogas, alegando que os entorpecentes apreendidos não lhe pertenciam (...)”. O acusado foi preso em flagrante delito na data de 17/11/2022 e na audiência de custódia foi relaxada a prisão em flagrante, consoante decisão proferida no APFD n. 1017310-24.2022.8.11.0042 (Id. 109607650, pág. 58/64), estando, pois, respondendo o processo em liberdade. A folha de antecedentes foi juntada no Id. 188931248 e 189081466. Foi certificado o esgotamento de endereços do acusado (Id. 123339895), ocasião que foi nomeada a Defensoria Pública para defesa do réu. A Defesa Prévia foi protocolada na data de 27/03/2024, oportunidade que arrolou as mesmas testemunhas da acusação (Id. 126043054). A denúncia foi recebida na data de 15/08/2024 (Id. 165800618), oportunidade que designou a audiência de instrução e julgamento para o dia 06/02/2025, às 15:10 horas. Na audiência de instrução e julgamento realizada pelo sistema de videoconferência no dia 06/02/2025 (Id. 183620742), procedeu-se com o interrogatório do réu e a oitiva de duas testemunhas arroladas em comum pelas partes. Por não haver outras provas pendentes, foi encerrada a instrução processual. O d. representante do Ministério Público apresentou seus memoriais finais no Id. 186212170, afirmando que ao final na instrução, persistem dúvidas acerca da finalidade mercantil da droga, requerendo, assim, a desclassificação para o delito descrito no artigo 28 da Lei de Drogas. A Defesa do acusado ofertou os memoriais finais no Id. 188461531, oportunidade em que requereu a desclassificação para o crime tipificado no artigo 28 da Lei de Drogas. Em seguida, vieram-me os autos conclusos para sentença em 15/04/2025. Eis a síntese do necessário relatório. FUNDAMENTO. DECIDO. DAS PRELIMINARES E QUESTÕES PREJUDICIAIS Não há preliminares ou questões prejudiciais a serem decididas, razão pela qual, passo à análise de mérito da causa. DO MÉRITO Pretende-se, nestes autos, atribuir a EVANDRO RIBEIRO DE SOUZA, a prática do delito capitulado no art. 33, “caput” da Lei n. 11.343/06, por estar no dia 17/11/2022 mantendo em depósito substância entorpecente, com fito mercantil, sem autorização e em desacordo com a determinação legal ou regulamentar. Em análise aos procedimentos realizados durante a persecução criminal, nada há que se possa ter comprometido o bom andamento processual, ou mesmo, que porventura tenha gerado alguma nulidade passível de observância ex officio. A materialidade do crime tipificado na Lei de Tóxicos (art. 33, “caput”, da Lei de Drogas) encontra-se comprovada, inicialmente pelo auto de apreensão de Id. 107822927 e em seguida pelos laudos de constatação preliminar n. 2184/2022 (Id. 109607650, fls. 49/53) e laudo toxicológico definitivo n. 3.14.2022.90321-01 (Id. 109555548), não restando dúvidas que as substâncias apreendidas se tratavam de COCAÍNA, as quais eram ao tempo do fato e ainda são de uso, porte e comercialização proibida no Brasil, em conformidade com RDC n°. 13 de 26.03.2010, o qual regulamenta a Portaria n°. 344/98, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, sendo inclusa na lista “F1”, de substâncias proscritas. No que concerne à autoria delitiva vejamos o que as provas colhidas na audiência instrutória subsidiam a respeito: O réu EVANDRO RIBEIRO DE SOUZA quando interrogado em juízo declarou o seguinte: “(Lida a denúncia) E de quem pertence a essa droga que foi encontrada lá dentro? Eu desconheço essa droga. No momento da abordagem, eu estava cortando o cabelo da criança, eu não estava na frente da barbearia, eu nem vi a hora que eles parou, eu vi que era o farol dele, na hora que eu estava atendendo, e tinha mais de sete clientes esperando. Não corri pra dentro, nenhum momento eu corri pra dentro, nenhum momento eu fiz qualquer coisa pra eles querem entrar dentro da barbearia. Eu estava ocupado, estava trabalhando nesse momento, eu desconheço essa droga. O senhor estava trabalhando ou estava cortando o cabelo? Eu não entendi até agora. Cortando o cabelo. O senhor estava no salão? Sim, eu estava cortando o cabelo. (inaudível) É só o senhor que é o cabeleireiro lá, ou tem mais gente? Só eu. E essa droga, então, não foi encontrada no seu salão? Não, senhor. (...) Teria algum motivo, o senhor imagina, por que os policiais iam inventar uma história dessa contra o senhor? Não sei dizer, eu não sei dizer. O senhor tem algum problema com a polícia? Não, não. Eu tenho 33 anos, mas com 33 anos, não conhecia nenhuma delegacia, não tenho nenhum passado, não tenho nenhum motivo pra isso. E esses policiais, o senhor conhecia eles ou não? Não. (...) Anteriormente a esses fatos já tinham ido na sua barbearia? Não. Essa foi a primeira vez? Que eles pararam lá, foi assim. Há quanto tempo você estava morando naquela localidade, estava trabalhando e morando naquela localidade? Olha, já tinha cinco anos.(...)” (Id. 183630043). A testemunha arrolada pela acusação, policial militar MAKSON TAVARES CAMPOS DE ARAÚJO, quando depôs em juízo declarou o seguinte: “(Lida a denúncia) Ele assustou a minha viatura entrou, foi isso? Acho que percebeu que a gente tava chegando próximo dele, né? Aí adentrou tentando (inaudível). Certo, e se vocês fizeram o acompanhamento? Sim. Dentro do salão tinha cliente, tinha bastante cliente? Acho que os 2 rapazes, eu acho, mais a criança. Mas estava tinha alguém sentado para cortar cabelo ou estava numa recepção só, como é que é? Uma criança, uma criança, estava na cadeira. Tá, e aí? (...) E na hora que ele entrar, ele estava cortando o cabelo de alguém ou não? Não, estava ele estava lá de fora. Não, ai entrou né? Isso, aí entrou e começou a cortar a criança. Busca pessoal parece que nada de ilícito foi encontrando, e essa droga foi encontrado aonde, o senhor se lembra? No chão próximo dele tinha uma calça que estava a droga dentro. O dinheiro estava com ele, no bolso dele, apenas a droga estava na calça no chão. (...) Deu tempo dele entrar e já começar a cortar o cabelo de uma criança que estava lá, vocês estavam, vocês não estavam indo atrás dele? Tipo em perseguição? Não, não, é uma rua.(inaudível) ai quando avisou a gente entrou rapidamente para dentro. Certo, e daí, quanto tempo vocês entraram lá atrás dele? Então, segundo segundos. E deu tempo dele já chegar e fingir que estava cortando o cabelo ali de uma criança? Então ele estava, ele estava apoiando ali, não sei como é que se chama (...) Tinha assim, tinha mais pessoas ali, tinha só essa criança e quem estava acompanhando essa criança tinha adulto acompanhado, o senhor lembra? Não, o pai dele chegou logo após (...)” (Id. 183630054). A testemunha arrolada pela acusação, policial militar ROSIEL BARBOSA DE SOUZA, quando depôs em juízo declarou o seguinte: “(Lida a denúncia) O senhor lembra onde era essa abordagem, essa ocorrência? Sim, senhor, eu lembro, sim. A nossa equipe estava em modo patrulhamento ali no bairro Novo Horizonte, onde nós fomos fazer o patrulhamento próximo a uma barbearia, que é um ponto conhecido de venda e uso de entorpecentes. Ao visualizar esse cidadão, ao visualizar a equipe, empreendeu fuga para dentro do estabelecimento, onde foi feito o acompanhamento, descemos da motocicleta e adentramos ao estabelecimento. Foi feita a busca pessoal nele, mais dois que estavam lá junto com ele. Nada disso foi encontrado, porém, ao olhar uma calça que estava próxima à cadeira de cortar cabelo, de fazer cabelo lá, cortar cabelo, foi encontrada uma calça, onde ele disse que a calça seria dele, foi encontrada uma porção grande de pasta base, de cocaína e em farelo, e com ele foi encontrado um valor, uma certa quantia em dinheiro. E nesse dia, seria uma criança, que ele supostamente estaria cortando o cabelo dessa criança, onde o pai chegou lá e pegou a criança e levou embora. E aí a gente encaminhou para a delegacia e colocou ele dentro da cadeira. Então, passando em frente ao salão, o senhor visualizou ele colado dentro ou fora do salão? Fora do salão. E ele entrou, rapidamente? Aí, a hora que ele avistou a equipe, ele entrou para dentro. E lá, lá dentro, durante a sua entrada, ele estava já cortando o cabelo de alguém, preparando, pegou pelo menos alguém? Tinha uma criança sentada na cadeira. Certo mas já estava cortando ou só estava preparando? Estava preparando ali o corte. Estava preparando, porque eu não vi nada cortado ainda. O senhor tem costume de fazer patrulhamento na região, ali em Novo Horizonte, na época? Sim, senhor. E já conhecia de envolvimento? Porque aqui fala denúncia que o salão era conhecido como ponto de venda de drogas, uso de drogas. Sim, senhor. Por várias vezes, a gente passou nesse salão lá, abordamos, encontrava o usuário lá, aconselhava ele para ele sair dessa vida mas nada de ilício encontrava. Mas nesse dia aí, nós encontramos, encaminhamos ele para a delegacia (...) Ali do lado de fora, tinha mais alguém com ele ou ele estava sozinho? Sim, tinha o pai da criança. O pai da criança estava do lado de fora, ele estava passando alguma coisa, ele estava conversando? Não, senhor. O pai da criança estava lá do lado de fora, juntamente com outros rapazes. Aí, depois, ele entrou para dentro, nós abordamos ele lá dentro, que o pai chegou para retirar a criança. Então, tinha mais que um amigo aguardando? Sim, tinha dois lá dentro do salão, dois lá dentro do salão e mais gente por fora, porque é ao lado de um bar também. E essa calça que foi encontrada lá, estava jogada no salão? Estava jogada lá no salão, próximo à cadeira dele, cortando cabelo. E nesse dia ali da abordagem dele, alguém tinha passado uma denúncia anônima por alguém? Não, senhor. Para nós, não, senhor (...)” (Id. 183630053). No caso em análise, andou bem o cauteloso “Parquet” em reconhecer a precariedade de provas quanto a finalidade mercantil do narcótico apreendido com acusado EVANDRO RIBEIRO DE SOUZA, requerendo a desclassificação para o art. 28 da Lei de Tóxico. Ainda que o réu tenha negado a propriedade do entorpecente, tal alegação contraria a versão apresentada pelos policiais militares, seja prestada durante o inquérito policial quanto em juízo. Conforme relataram os agentes, durante patrulhamento, o réu, ao avistar a viatura, adentrou repentinamente um salão de cabeleireiro, demonstrando comportamento suspeito. Diante disso, os policiais procederam com o acompanhamento e a abordagem do acusado. Na busca pessoal, nada de ilícito foi encontrado, contudo, ao seu lado, foi localizada uma calça jogada no chão, em cujo interior havia substâncias entorpecentes. Assim, não há como rechaçar a vinculação do acusado com o material apreendido. Por outro lado, bem constou do laudo pericial de constatação preliminar n. 2184/2022 (Id. 109607650, fls. 49/53) e laudo toxicológico definitivo n. 3.14.2022.90321-01 (Id. 109555548) que referida droga apresentou massa total de 28,23g (vinte e oito gramas e vinte e três centigramas) de COCAÍNA, quantidade compatível com o consumo pessoal e exclusivo, tal como sugerido pelo §2º, do art. 28, da Lei de Tóxico. Registre-se que em nenhum momento foi relatado pelos policias que havia denúncia prévia que estaria ocorrendo o tráfico no local, pairando, assim, dúvida acerca da finalidade mercantil. Ainda que seja pacífico o entendimento de que a condição de usuário de drogas não afasta o crime de tráfico, o cenário delineado no caso dos autos pressupõe muito mais a posse para consumo do que para o tráfico, já que a pequena quantidade de COCAÍNA (28,23g) se mostra compatível com o consumo pessoal e exclusivo. Desse modo, ao final da instrução, restam dúvidas se a droga se destinava de fato à comercialização ilícita. Em vista disso e avaliando todas as circunstâncias do flagrante e as provas produzidas em juízo, tenho comigo que a dúvida acerca da finalidade mercantil, deve ser interpretada em benefício do réu, sob pena de vulnerar a um só tempo, os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório e aquele oriundo do brocardo latino in dubio pro reo. Desse modo, conclui-se que o que se tem contra o acusado é meros indícios de traficância e quanto isto, nosso Mestre Nelson Hungria assim adverte: “A verossimilhança, por maior que seja, não é jamais a verdade ou a certeza, e somente esta autoriza uma sentença condenatória. Condenar um possível delinquente é condenar um possível inocente” (in COMENTÁRIOS AO CÓDIGO PENAL, vol. V, Ed. Forense, p. 65). Nessa esteira, traz-se a lição de Heleno Cláudio Fragoso, para quem “a condenação exige a certeza e não basta, sequer, a alta probabilidade, que é apenas um juízo de incerteza de nossa mente em torno à existência de certa realidade”. (in Jurisprudência Criminal, vol. 2, Ed. Bushatsky, 3ª ed., p. 806). É cediço que para haver uma condenação penal é necessária prova certa e segura, não existindo lugar para condenação com base tão-somente em presunções. Nesse sentido, segue o julgado do STJ: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONDUTA DE PORTE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE PARA CONSUMO PRÓPRIO. EXCEPCIONALIDADE DO CASO DOS AUTOS. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A Lei n. 11.343/2006 não determina parâmetros seguros de diferenciação entre as figuras do usuário e a do pequeno, médio ou grande traficante, questão essa, aliás, que já era problemática na lei anterior (Lei n. 6.368/1976). 2. Na espécie em julgamento, não constam dos autos elementos mínimos capazes de embasar a condenação por tráfico de drogas, haja vista a pequena quantidade de substância entorpecente apreendida com os acusados, bem como a ausência de provas concretas sobre a traficância, na medida em que os policiais não presenciaram nenhum ato concreto de mercancia. Os réus não foram pegos fornecendo nem negociando drogas com terceiros. Também não foi encontrado em poder deles nenhum apetrecho ligado à narcotraficância, tal como balança de precisão ou material para embalar drogas. 3. Especificamente no caso dos autos, a conclusão pela desclassificação da conduta imputada ao réu para o delito descrito no art. 28 da Lei n. 11.343/2006 não demanda o revolvimento de matéria fático-probatória. O caso em análise, diversamente, requer apenas a revaloração de fatos incontroversos e das provas que já foram devidamente colhidas ao longo de toda a instrução probatória. Depende, ademais, da definição, meramente jurídica, acerca da interpretação a ser dada sobre os fundamentos apontados pelas instâncias de origem para condenar o réu pela prática do crime de tráfico de drogas, vis-à-vis os elementos (subjetivos e objetivos) do tipo penal respectivo. 4. Agravo regimental não provido.”(AgRg no HC n. 782.585/RS, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 8/5/2023, DJe de 11/5/2023) (negritei). Aliás, entendimento nesse sentido já foi adotado por nosso Egrégio Tribunal de Justiça, senão vejamos: “(...) Impõe-se a desclassificação da conduta perpetrada pelo apelante para a de uso próprio (LD, art. 28), porquanto das circunstâncias fáticas reveladas nos autos não se pode concluir que o acusado exercia a traficância, devendo-se invocar, portanto, o princípio do in dubio pro reo. Quando as provas dos autos geram dúvidas em relação à conduta do tráfico, mas é clara em relação à posse de droga para uso próprio, correta é a desclassificação para o delito previsto no art. 28 da Lei de Drogas (...) (TJMT, N.U 0009368-65.2016.8.11.0042)” (N.U 0021388-54.2017.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 24/05/2022, Publicado no DJE 02/06/2022) (negritei). “APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – SENTENÇA CONDENATÓRIA – INSUFICIÊNCIA DE PROVAS, CONDIÇÃO DE USUÁRIO – PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO PARA POSSE DE DROGAS PARA USO PESSOAL – APREENSÃO PASTA-BASE DE COCAÍNA – DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS MILITARES – INSUFICIÊNCIA – ATOS DE COMÉRCIO NÃO PRESENCIADOS – AUSÊNCIA APETRECHOS COMUMENTE UTILIZADOS NA TRAFICÂNCIA – CONDIÇÃO DE USUÁRIO FACTÍVEL – JULGADOS DO STJ E PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL DO TJMT – RECURSO PROVIDO PARA DESCLASSIFICAR O TRÁFICO PARA USO DE DROGAS E EXTINGUIR A PUNIBILIDADE DO APELANTE. A apreensão de porções individuais de pasta-base de cocaína não configura, por si só, o tráfico de drogas quando ausentes evidências do comércio ilícito, seja pela insuficiência dos depoimentos policiais, não localização de apetrechos comuns a essa prática, pequena quantidade apreendida e/ou ausência de investigações (STJ, HC nº 497.023/ES). “Não restando suficientemente comprovado que o entorpecente apreendido em poder do agente seria destinado à comercialização, impõe-se desclassificar o crime de tráfico de drogas para o delito previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006.” (TJMT, AP N.U 0026782-13.2015.8.11.0042)” (N.U 0001129-56.2019.8.11.0078, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 16/05/2023, Publicado no DJE 22/05/2023) (negritei). Assim, considerando a precariedade de provas de que o entorpecente apreendido destinava-se à comercialização e não ao consumo próprio, a dúvida deve ser interpretada em favor do denunciado, como bem reconheceu o próprio representante do Ministério Público em seus memoriais finais. ISTO POSTO e por tudo mais que dos autos consta, com as fundamentações necessárias, nos moldes do art. 5º, inciso IX, da Constituição Federal, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A DENÚNCIA para DESCLASSIFICAR para o art. 28 da Lei n. 11.343/06 a conduta imputada ao réu EVANDRO RIBEIRO DE SOUZA, brasileiro, solteiro, barbeiro, natural de Cuiabá-MT, nascido em 31/10/1990, filho de Ailon Ribeiro de Sousa e Adinalva Lemos da Silva Sousa, portador do RG n.º 21140316 SSP/MT, inscrito no CPF sob o n.º 746.691.411-04, residente e domiciliado na Rua Minas Gerais, nº 648, bairro Jardim Novo Horizonte, Cuiabá/MT – atualmente preso por outro processo na Penitenciária Central do Estado. Considerando que o réu EVANDRO RIBEIRO DE SOUZA responde ao processo em liberdade, PERMITO-LHE aguardar também em liberdade o processo e julgamento de eventual recurso. Nos termos do art. 383, §2º, do Código de Processo Penal, DETERMINO o encaminhamento dos autos ao Juizado Especial Criminal desta Capital para que aplique a medida cabível em relação ao réu em decorrência do delito tipificado no art. 28, “caput”, da lei 11.343/06. DETERMINO a incineração da substância entorpecente apreendidos. Com relação aos valores apreendidos (R$365,00), ante a ausência de comprovação lícita pelo acusado e com fundamento no Tema 0647 - STF[1], DECRETO o perdimento em favor do Fundo Estadual sobre Drogas - FUNESD, a ser creditada na conta do Banco do Brasil (001), agência: 3834-2, Conta Corrente: 1042841-0; CNPJ: 03.507.415/0028-64. Em relação ao aparelho celular Marca Motorola, por não haver relação com o ilícito, DEFIRO a restituição, a serem retirada no prazo de 90 (noventa dias). Decorrido o prazo e não havendo reclamação, desde já, DECRETO o perdimento em favor da União. Sobre comprovante de RG, por não haver relação com o ilícito, DEFIRO a restituição, a serem retirada no prazo de 90 (noventa dias). Da sentença, intimem-se o Ministério Público e a Defesa, nos termos que prescreve o art. 369, §3º, da CNGC. Custas pelo condenado (CPP, art. 804), não cobráveis no momento, na forma do §3º, do art. 98, do Código de Processo Civil. P.R.I.C. Cuiabá/MT, data e hora do sistema. Francisco Alexandre Ferreira Mendes Neto JUIZ DE DIREITO (documento assinado digitalmente) [1] “É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles previstos expressamente no art. 243, parágrafo único, da Constituição Federal.”
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