Processo nº 5175726-44.2025.8.09.0051
ID: 331437435
Tribunal: TJGO
Órgão: Goiânia - 6ª UPJ Varas Cíveis: 26ª, 27ª, 28ª, 29ª, 30ª e 31ª
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5175726-44.2025.8.09.0051
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CELSO DE FARIA MONTEIRO
OAB/GO XXXXXX
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Comarca de Goiânia
27ª Vara Cível
E-mail: gab27varacivel@tjgo.jus.br
Gabinete Virtual: (62) 3018-6642
6ª UPJ das Varas Cíveis (6upj.civelgyn@tjgo.jus.br)
Autos: 5175726-44.2025.8.09.0051
Natureza:…
Comarca de Goiânia
27ª Vara Cível
E-mail: gab27varacivel@tjgo.jus.br
Gabinete Virtual: (62) 3018-6642
6ª UPJ das Varas Cíveis (6upj.civelgyn@tjgo.jus.br)
Autos: 5175726-44.2025.8.09.0051
Natureza: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimento Comum Cível
Requerente: Richard Lendow Silva
Requerido: Facebook Serviços Online do Brasil Ltda.
SENTENÇA
Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais e tutela de urgência ajuizada por Richard Lendow Silva em desfavor de Facebook Serviços Online do Brasil Ltda, ambos qualificados.
O autor alega que teve seu número de WhatsApp clonado por terceiro, que passou a utilizá-lo para aplicar golpes, solicitando transferências de valores indevidamente. Afirma ter sofrido grande transtorno, visto que teve sua imagem e dados pessoais utilizados para fins ilícitos. Diante da situação, o autor busca reaver o acesso ao seu número de WhatsApp, requerendo a imediata remoção da invasão perpetrada por terceiro. Alega ainda que a fraude lhe causou prejuízo, uma vez que teve gastos com tempo e dinheiro para tentar resolver a situação.
Por fim, o autor requereu a concessão da tutela de urgência antecipada para determinar que a requerida restabeleça o acesso do autor à sua conta de WhatsApp e impeça que o invasor continue utilizando indevidamente sua identidade. No mérito, requer a procedência dos pedidos para condenar o réu a reaver o acesso do autor ao seu número de WhatsApp e pagamento de indenização por danos morais no valor de
Juntou documentos.
Recebida a inicial, foram concedidas as benesses da gratuidade da justiça em favor do autor; deferido em parte o pedido de a fim de determinar ao requerido Facebook Serviços Online do Brasil Ltda, promova a suspensão da conta existente junto ao aplicativo WhatsApp, vinculada ao n. (92) 99963-7319, até que seja promovido o julgamento definitivo da lide ou até decisão em sentido contrário; invertido o ônus da prova e determinada a realização de audiência de conciliação e citação do requerido (mov. 11).
Citado, o requerido ofertou contestação no mov. 28, alegando, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, uma vez que o aplicativo WhatsApp pertence e é operado pela empresa norte-americana WhatsApp LLC. Argumenta que não possui poderes para adotar providências relacionadas ao aplicativo ou representá-lo em ações judiciais, sendo o Facebook Brasil uma empresa brasileira dedicada à prestação de serviços de publicidade. Sustenta, ainda, a necessidade de extinção do feito por ausência de documento comprobatório da titularidade da linha telefônica pelo autor. Aduz a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e a impossibilidade de inversão do ônus da prova, uma vez que não há relação de consumo entre as partes.
No mérito, alega inexistência de defeito na prestação de serviços e ausência de responsabilidade, argumentando que o acesso à conta do autor por terceiros pode ter ocorrido por clonagem da linha telefônica ou por fornecimento inadvertido do código de verificação pelo próprio autor. Aduz que o WhatsApp oferece ambiente seguro e ferramentas adequadas para evitar tais ocorrências, além de alertar seus usuários sobre medidas de segurança, como a confirmação em duas etapas. Destaca a realização de campanhas publicitárias de combate a golpes e a disponibilização de informações públicas sobre medidas a serem adotadas em caso de comprometimento de contas. Refuta a responsabilidade por danos morais, alegando que o autor não comprovou sua ocorrência e que o caso configura mero dissabor do cotidiano. Por fim, requer o acolhimento das preliminares com a extinção do feito sem resolução do mérito e, de forma subsidiária, improcedência da demanda.
Impugnação à contestação coligida no mov. 36.
Intimados para especificarem as provas que pretendem produzir, os sujeitos processuais pugnaram pelo julgamento antecipado do feito (movs. 42 e 44).
Os autos vieram-me conclusos.
É o relatório. Fundamento e decido.
1. Questões processuais pendentes, preliminares e prejudiciais.
1.1. Da alegada ilegitimidade passiva.
A ré alegou ilegitimidade passiva sob o argumento de que o aplicativo WhatsApp pertence à WhatsApp LLC, empresa norte-americana constituída no Estado de Delaware, não tendo qualquer ingerência sobre o referido aplicativo. Sustentou que, sendo empresas distintas com personalidade jurídica própria, não pode responder por obrigações de terceiros.
O art. 75, X, do Código de Processo Civil estabelece que “serão representados em juízo, ativa e passivamente, a pessoa jurídica estrangeira, pelo gerente, representante ou administrador de sua filiar, agência ou sucursal aberta ou instalada no Brasil”.
Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou quanto à necessidade de se conferir interpretação extensiva ao aludido dispositivo, abrangendo, inclusive, representante informal. A propósito:
[...] 9. As pessoas jurídicas em geral são representadas em juízo "por quem seus atos constitutivos designarem ou, não havendo essa designação, por seus diretores" (art. 75, VIII, do CPC).
10. Com o fim de facilitar a comunicação dos atos processuais às pessoas jurídicas estrangeiras no Brasil, o art. 75, X, do CPC prevê que a pessoa jurídica estrangeira é representada em juízo "pelo gerente, representante ou administrador de sua filial, agência ou sucursal aberta ou instalada no Brasil" e o parágrafo 3º do mesmo artigo estabelece que o "gerente de filial ou agência presume-se autorizado pela pessoa jurídica estrangeira a receber citação para qualquer processo".
11. Considerando-se que a finalidade destes dispositivos legais é facilitar a citação da pessoa jurídica estrangeira no Brasil, tem-se que as expressões "filial, agência ou sucursal" não devem ser interpretadas de forma restritiva, de modo que o fato de a pessoa jurídica estrangeira atuar no Brasil por meio de empresa que não tenha sido formalmente constituída como sua filial ou agência não impede que por meio dela seja regularmente efetuada sua citação.
12. Exigir que a qualificação daquele por meio do qual a empresa estrangeira será citada seja apenas aquela formalmente atribuída pela citanda inviabilizaria a citação no Brasil daquelas empresas estrangeiras que pretendessem evitar sua citação, o que importaria concordância com prática processualmente desleal do réu e imposição ao autor de óbice injustificado para o exercício do direito fundamental de acesso à ordem jurídica justa.
13. A forma como de fato a pessoa jurídica estrangeira se apresenta no Brasil é circunstância que deve ser levada em conta para se considerar regular a citação da pessoa jurídica estrangeira por meio de seu entreposto no Brasil, notadamente se a empresa estrangeira atua de fato no Brasil por meio de parceira identificada como representante dela, ainda que não seja formalmente a mesma pessoa jurídica ou pessoa jurídica formalmente criada como filial. [...] (STJ, HDE n. 410/EX, relator Ministro Benedito Gonçalves, Corte Especial, julgado em 20/11/2019, DJe de 26/11/2019). (negritei)
Nessa intelecção, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça sedimentou o entendimento de que o Facebook Brasil é parte legítima para representar, no Brasil, os interesses do WhatsApp Inc., subsidiária integral do Facebook Inc. Assim o fez quando do julgamento do Agravo Regimental em Recurso Especial n. 1975411, interposto pelo Facebook Serviços Online do Brasil LTDA, cuja ementa segue transcrita:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL PENAL. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. SOBRESTAMENTO. QUESTÃO PREJUDICIAL. INEXISTÊNCIA. FACEBOOK BRASIL. LEGITIMIDADE PARA REPRESENTAR A WHATSAPP APP INC. NO BRASIL. IMPOSIÇÃO DE MULTA. POSSIBILIDADE. ASTREINTES IMPOSTAS A TERCEIROS NO PROCESSO PENAL. LEGALIDADE. TERMO INICIAL. RESISTÊNCIA INJUSTIFICADA AO CUMPRIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL. VALOR DA MULTA DIÁRIA. PROPORCIONALIDADE. EXECUÇÃO DA MULTA. JUÍZO CRIMINAL. BLOQUEIO BACENJUD. POSSIBILIDADE. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. [...] 2. A Terceira Seção desta Corte Superior já sedimentou o entendimento de que o Facebook Brasil é parte legítima para representar, no Brasil, os interesses do WhatsApp Inc., subsidiária integral do Facebook Inc., sendo possível a aplicação da multa em face da representante em decorrência do descumprimento de obrigações judiciais impostas à representada, a fim de se conferir plena efetividade ao disposto no art. 75, inciso X e § 3.º, do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 3.º do Código de Processo Penal. [...] (STJ, RMS n. 61.717/RJ, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 2/3/2021, DJe de 11/3/2021). (negritei)
Na mesma toada, este Eg. Tribunal de Justiça Goiano e outros Tribunais pátrios têm se posicionado pela legitimidade do Facebook Serviços Online do Brasil LTDA para representar os interesses do WhatsApp Inc.:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CONCESSÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA. PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES PREVISTOS NO ARTIGO 300 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MULTA COMINATÓRIA FIXADA. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. DECISÃO ULTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. DECISÃO MANTIDA. 1. O Superior Tribunal de Justiça tem posicionamento firmado no sentido de que o Facebook Brasil é parte legítima para representar no Brasil os interesses do WhatsApp Inc, subsidiária integral do Facebook Inc, sendo possível a aplicação da multa em face da representante em decorrência do descumprimento de obrigações judiciais impostas à representada, a fim de se conferir plena efetividade ao disposto no art. 75, inciso X e § 3º, do Código de Processo Civil. 2. [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJGO, Agravo de Instrumento 5359002-09.2022.8.09.0011, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR REINALDO ALVES FERREIRA, 2ª Câmara Cível, julgado em 05/09/2022, DJe de 05/09/2022). (negritei)
APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO COMINATÓRIO. EXCLUSÃO DE PERFIL FALSO NO INSTAGRAM E WHATSAPP E DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÕES DO USUÁRIO. SENTENÇA ULTRA PETITA. DECOTE DO EXCESSO. FACEBOOK BRASIL. LEGITIMIDADE PARA REPRESENTAR A WHATSAPP APP INC. NO BRASIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DE PROVEDOR DE INTERNET. LIMITAÇÃO AOS CASOS DE INÉRCIA NA IDENTIFICAÇÃO DO OFENSOR OU NA RETIRADA DO CONTEÚDO OFENSIVO. ASTREINTES. LIMITAÇÃO. DANOS MORAIS. CONFIGURADOS. MONTANTE INDENIZATÓRIO. MAJORAÇÃO. 1. A sentença ultra petita é defeituosa porque o juiz, ao decidir o pedido, vai além dele e concede ao peticionário mais do que o requerido. Para a correção do vício deve ser decotado o excesso verificado. Na espécie, imperioso afastar da sentença a condenação do Facebook Brasil a indicar o registro de acesso (Protocolo IP) e demais informações referentes à conta de WhatsApp vinculada ao número +12605729466, por ser providência não requestada pelas autoras. 2. O Superior Tribunal de Justiça já sedimentou o entendimento de que o Facebook Brasil é parte legítima para representar, no Brasil, os interesses do WhatsApp Inc., subsidiária integral do Facebook Inc., sendo possível a aplicação da multa em face da representante em decorrência do descumprimento de obrigações judiciais impostas à representada, a fim de se conferir plena efetividade ao disposto no art. 75, inciso X e § 3.º, do Código de Processo Civil. 3. [...] APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. (TJGO, Apelação Cível 5331881-51.2020.8.09.0051, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR WILSON SAFATLE FAIAD, 3ª Câmara Cível, julgado em 25/02/2022, DJe de 25/02/2022). (negritei)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. DIREITO AUTORAL. REPRODUÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO DE MATERIAL SEM AUTORIZAÇÃO DO AUTOR POR MEIO DO APLICATIVO WHATSAPP E DO MERCADO PAGO. TUTELA DE URGÊNCIA. INTIMAÇÃO DAS EMPRESAS GESTORAS DOS APLICATIVOS PARA BLOQUEIO DA LINHA DE TELEFONE, BEM ASSIM DA OPERADORA DE TELEFONIA CELULAR PARA IDENTIFICAÇÃO DO TITULAR DA LINHA, SOB PENA DE ASTREINTES. MEDIDAS ADEQUADAS PARA SUSTAÇÃO DA VIOLAÇÃO DO DIREITO AFIRMADO PELA AUTORA. 1. A empresa Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. é responsável por representar, no âmbito local, a empresa WhatsApp LCC, sobretudo porque integram o mesmo grupo econômico. 2. [...] (TJDFT, Acórdão 1652189, 07044934120228070000, Relator: ARNOLDO CAMANHO, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 9/12/2022, publicado no DJE: 8/2/2023). (negritei)
Assim, REJEITO a preliminar de ilegitimidade passiva.
1.2. Da alegada ausência de documento comprobatório da titularidade da linha telefônica.
A ré sustentou ainda que o autor não comprovou a titularidade da linha telefônica (62) 99916-2909, sendo tal documento indispensável à propositura da ação, nos termos do art. 320 do CPC.
Todavia, a alegação não procede. Verifica-se nos autos que o autor juntou conta de telefone da operadora Vivo em seu nome (mov. 1, arquivo 5, fls. 32 a 35/pdf), referente ao número objeto da lide.
O documento comprova suficientemente a titularidade da linha telefônica, não havendo qualquer dúvida sobre a legitimidade do autor para pleitear a proteção de sua conta de WhatsApp vinculada ao referido número.
A ausência de instrução de documentos indispensáveis à propositura da ação é causa de extinção sem resolução do mérito, mas apenas quando efetivamente não apresentados. No caso, o documento existe e foi juntado aos autos, afastando a preliminar.
REJEITO a preliminar.
2. Julgamento antecipado.
O presente feito está em ordem e pronto para julgamento, não havendo necessidade de dilação probatória, uma vez que se trata de caso eminentemente documental.
Nos termos do art. 355 do Código de Processo Civil, o juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito quando não houver necessidade de produção de outras provas, o que acontece no caso em análise.
Nesse viés, segundo enunciado da súmula n. 28, do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, quando existir nos autos provas suficientes à formação do convencimento do juiz, o julgamento antecipado da lide não acarretará cerceamento de defesa.
3. Mérito.
3.1. Aplicação das disposições do Código de Defesa do Consumidor.
Conforme já consignado na decisão de mov. 11, resta incontroversa a existência de relação de consumo entre as partes. O autor figura como destinatário final dos serviços de comunicação digital prestados pela ré, enquanto esta atua como fornecedora de serviços no mercado de consumo brasileiro.
O WhatsApp é oferecido ao público em geral como serviço gratuito de mensagens instantâneas, sendo remunerado indiretamente através da coleta e utilização de dados dos usuários para fins publicitários. Trata-se, portanto, de relação de consumo, nos termos do art. 3º, § 2º, do CDC.
Aplicam-se, consequentemente, todas as disposições do Código de Defesa do Consumidor, incluindo a responsabilidade objetiva do fornecedor (art. 14), a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII) e os princípios da vulnerabilidade e hipossuficiência do consumidor.
A propósito:
APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. BANIMENTO DE CONTA DO WHATSAPP. LEGITIMIDADE DA FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA. RELAÇÃO DE CONSUMO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. NÃO COMPROVADA A VIOLAÇÃO AOS TERMOS DE USO. NÃO DEMONSTRADAS AS EXCLUDENTES DE RESPOSABILIDADE. CARACTERIZADO O DEVER DE INDENIZAR. QUANTUM PROPORCIONAL. SENTENÇA MANTIDA. 1. A empresa Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. é responsável por representar, no âmbito local, a empresa WhatsApp, sobretudo porque integram o mesmo grupo econômico. (Precedentes do STJ). 2. No contexto da relação consumerista entre as partes e invertido o ônus da prova, incumbia ao Facebook Brasil, representando o Whatsapp, comprovar a ocorrência de uma das excludentes de responsabilidades citadas no artigo 14, § 3º, do CDC e os elementos desconstitutivos do direito do autor. 3. O réu limitou-se a erguer conjecturas sobre possível violação dos termos de uso do Whatsapp, quando lhe incumbia evidenciar o conteúdo que violou suas normas e padrões. Como não o fez, conclui-se que o banimento da conta foi indevido. 4. O réu não se desincumbiu do ônus de comprovar que houve falha na prestação do serviço, de demonstrar culpa exclusiva do autor por eventual descumprimento dos termos de uso da plataforma, restando caracterizado a falha na prestação do serviço, a ensejar a reparação extrapatrimonial. 5. A interrupção abrupta, imotivada e não comunicada do aplicativo de Whatsapp, utilizada como ferramenta de trabalho, máxime diante das circunstâncias do mercado atual, em que os aplicativos de trocas de mensagens assumem relevante papel na comunicação entre partes contratantes, apontam para ofensa grave e de repercussão na esfera moral. 5. A verba indenizatória observa a gravidade do ato ilícito a as consequências dele derivadas na conformação social e comercial de larga utilização de aplicativo de troca de mensagens para alcançar o público-alvo de serviço oferecido. O retorno da operabilidade do perfil não tem o condão de interferir no valor fixado, notadamente ao se considerar que o quantum estabelecido já é diminuto em vista do poderio econômico do réu. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - AC: 55955957320198090006 ANÁPOLIS, Relator.: Des(a). DESEMBARGADOR MARCUS DA COSTA FERREIRA, Anápolis - 4ª Vara Cível, Data de Publicação: 27/03/2023). (negritei)
A natureza gratuita do serviço não afasta a incidência do CDC, uma vez que há contraprestação indireta através da monetização dos dados pessoais dos usuários. O modelo de negócio da plataforma baseia-se exatamente na coleta e utilização desses dados para direcionamento publicitário.
3.2. Da alegada falha na prestação do serviço e obrigação de fazer.
O autor demonstrou documentalmente o comprometimento de sua conta através das mensagens fraudulentas anexadas à inicial (mov. 1, arquivo 10, fls. 82 a 85/pdf). As conversas evidenciam que terceiros utilizaram sua identidade para solicitar transferências de dinheiro a seus contatos, configurando situação plausível e verossímil.
Por outro lado, a ré detém exclusivamente os meios técnicos, dados, logs e registros do sistema necessários para esclarecer as causas do comprometimento da conta. O consumidor não possui conhecimento técnico nem acesso aos sistemas internos da plataforma para demonstrar eventuais falhas de segurança.
A Lei n. 12.965/14, conhecida como Marco Civil da Internet, estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil, além de determinar as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria. Apoia-se no respeito à liberdade de expressão, comunicação e manifestação do pensamento (arts. 2º, 3º, I, 4º, II, e 8º), sem se olvidar da proteção à intimidade e à privacidade, resguardando eventual indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (arts. 3º, II, 7º, I e 8º).
Com fulcro no disposto no art. 5º, I, da legislação em referência, constata-se que os serviços disponibilizados pela plataforma Facebook / WhatsApp, se amolda ao conceito de aplicações de internet.
E, tratando de relação de consumo, como cediço, a responsabilidade do fornecedor por defeitos relativos à prestação do serviço é objetiva, nos moldes dispostos no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, esquivando-se de sua responsabilidade apenas se demonstrar que não houve defeito ou que este decorre de culpa exclusiva do consumidor.
Analisando-se a contestação e os documentos encartados ao feito, denota-se que restou comprovado o comprometimento da conta de WhatsApp do autor e sua utilização por terceiros para aplicação de golpes financeiros. Os documentos juntados à inicial demonstram inequivocamente que pessoas desconhecidas utilizaram a identidade do autor para solicitar dinheiro a seus contatos.
A ré, por sua vez, limitou-se a apresentar argumentos genéricos sobre possíveis causas do comprometimento, sem demonstrar concretamente que adotou as medidas de segurança adequadas e suficientes para proteger a conta do usuário. Não trouxe aos autos qualquer elemento probatório que comprove a regularidade do serviço prestado, conforme determina o art. 373, II, do Código de Processo Civil c/c art. 6°, VIII, do CDC.
É importante destacar que a mera disponibilização de recursos de segurança não exime o fornecedor de responsabilidade se tais recursos se mostrarem insuficientes ou inadequados, na prática. O dever de segurança deve ser efetivo, não meramente formal.
A responsabilidade objetiva do fornecedor no CDC baseia-se no risco criado pela atividade empresarial. Aquele que obtém lucro com determinada atividade deve suportar os riscos dela decorrentes, não podendo transferir ao consumidor vulnerável os ônus dos defeitos do serviço prestado.
Nesse passo, o § 1º do art. 14 do CDC estabelece que “o serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes”. No caso, evidencia-se claramente o defeito na prestação do serviço.
O serviço de mensagens instantâneas tem como pressuposto básico a segurança e a privacidade das comunicações. O consumidor legitimamente espera que sua conta seja protegida contra acessos indevidos e que sua identidade digital, não seja utilizada por terceiros para fins fraudulentos.
O comprometimento da conta do autor e sua utilização para aplicação de golpes demonstra falha grave nos sistemas de segurança da plataforma. A ré não conseguiu garantir a proteção básica da conta do usuário, permitindo que terceiros dela se apossassem e a utilizassem de forma criminosa.
A situação é ainda mais grave considerando que a conta foi utilizada especificamente para aplicação de golpes financeiros, o que evidencia não apenas falha técnica, mas também exposição do autor a constrangimento e abalo de sua reputação perante terceiros.
Assim, a procedência do pedido de obrigação de fazer é medida que se impõe.
3.3. Da alegada excludente de responsabilidade.
A ré alega culpa exclusiva de terceiro (fraudadores) ou do próprio consumidor (fornecimento do código de verificação), visando afastar sua responsabilidade pelos danos causados.
Contudo, tais argumentos não procedem. Primeiro, porque a ré não comprovou efetivamente nenhuma das hipóteses alegadas, limitando-se a levantar suposições sem qualquer substrato probatório. Segundo, porque a ocorrência de fraudes por terceiros é risco inerente à atividade de prestação de serviços digitais.
O comprometimento de contas por terceiros é evento previsível e que integra o risco da atividade desenvolvida pela ré. Cabe ao fornecedor implementar medidas de segurança robustas e eficazes para prevenir tais ocorrências, não sendo lícito transferir esse ônus ao consumidor hipossuficiente.
Mesmo que se admitisse eventual participação de terceiros no evento danoso, isso não afastaria a responsabilidade da ré, uma vez que se trata de fortuito interno, relacionado ao próprio serviço prestado. As excludentes de responsabilidade previstas no CDC são de interpretação restritiva.
A jurisprudência dos Tribunais de Justiça caminha na mesma direção, veja-se:
APELAÇÃO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – LINHA TELEFÔNICA CLONADA – "GOLPE DO WHATSAPP" – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – DANO MORAL CONFIGURADO – Autora que teve sua conta do WhatsApp hackeada, cujos dados foram utilizados de forma ilícita por indivíduo, que se passou pela demandante, aplicando golpes financeiros em terceiros - A relação entre as partes é de consumo. A autora se adapta perfeitamente à definição de consumidor e o réu, à de fornecedor. A hipossuficiência jurídica da parte requerente é incontestável. A prova está nas mãos do requerido, visto que ele é responsável pelo armazenamento, divulgação e manutenção dos dados de sua rede social utilizada pela autora recorrente. Cabendo ao demandado comprovar que a invasão ocorreu por culpa exclusiva da consumidora, entretanto não se desincumbiu desse ônus, deixando de fornecer detalhes de como ocorreu o ataque e sequer quais normas de segurança teriam sido violadas pela autora; – Dano moral configurado, cujo valor (R$5.000,00) não comporta redução, de modo que, a quantia fixada pela r. Primeira Instância é suficiente para amenizar o dano sofrido, acompanhando precedentes desta c. Câmara AP 1002052-74 .2022.8.26.0100, Rel . Dr. Lino Machado, j. 21.06 .2020; AP 1000809-14.2022.8.26 .0127; Rel. Dra. Maria Lúcia Pizzotti, j. 29 .07.2022, AP 1102274-84.2021.8 .26.0100, Rel. Dra. Maria Lúcia Pizzotti, j. 17.05.2022. RECURSO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível: 11946655320248260100 São Paulo, Relator.: Maria Lúcia Pizzotti, Data de Julgamento: 22/04/2025, 30ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/04/2025). (negritei)
APELAÇÃO. Prestação de serviços. Obrigação de fazer c.c. indenização. Autora que teve invadido o seu perfil em rede social (Facebook e Instagram) por terceiros. Responsabilidade objetiva da provedora da aplicação (art. 7º, XIII, do Marco Civil da Internet c/c art. 14 do CDC). Fortuito interno. Falha no dever de segurança dos serviços. Precedentes. Alegação atrelada à impossibilidade material de cumprimento da obrigação de restabelecimento de perfil excluído de rede social (Instagram) sem base fática-jurídica. Absoluta carência probatória. Conversão em perdas e danos que somente se justifica nas hipóteses de opção do credor ou quando demonstrada a impossibilidade de obtenção da tutela específica ou do resultado prático equivalente ao adimplemento voluntário (CPC, art. 499). Alegação rejeitada. DANOS MORAIS. Falha de segurança por parte da ré que apresenta três desdobramentos a serem examinados em face da suposta lesão a direito de personalidade: i) privação ao acesso da rede social; ii) esforços do consumidor para a recuperação da conta de usuário; e, iii) produção e divulgação de conteúdo pelo invasor por meio do perfil invadido. Lei nº 12 .965/14 que reconhece "o acesso à internet" como "essencial ao exercício da cidadania" em seu art. 7º, o qual estabelece os direitos e garantias dos usuários, prevendo a reparação de ordem moral na hipótese de violação da intimidade e da vida privada. Marco Civil da Internet que, portanto, não cria nova modalidade de direito de personalidade, mas busca constituir ferramentas adequadas à proteção do direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem dos indivíduos (art. 5º, X, CF/88) em tal meio, o que é reiterado por seu art. 10. Privação de acesso à conta de usuário que não é suficiente à configuração de dano moral na medida em que não malfere direito de personalidade. Rol de precedentes. Dano moral caracterizado. Compartilhamento de conteúdo destinado a aplicação de fraudes financeiras. Uso do perfil para a divulgação de conteúdo inadequado capaz de repercutir na honradez, credibilidade e confiabilidade da demandante. Circunstância que excede o mero incômodo, consubstanciando dano imaterial. Precedentes. Indenização ora fixada em R$ 7.000,00. Montante que se revela proporcional e compatível com a extensão do dano (art. 944 do Código Civil). Sentença reformada. Recurso da autora provido, rejeitado o apelo da ré. (TJ-SP - Apelação Cível: 10764468120248260100 São Paulo, Relator.: Rômolo Russo, Data de Julgamento: 26/02/2025, 34ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/02/2025). (negritei)
APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO DO USUÁRIO. GOLPE DO WHATSAPP. CLONAGEM. RISCOS INERENTES À ATIVIDADE ECONÔMICA LUCRATIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR. ARTIGO 14 DO CDC. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. FRAUDADORES QUE OBTIVERAM ACESSO AO APLICATIVO DO DEMANDANTE E ENVIARAM MENSAGENS A SEUS CONTATOS SOLICITANDO DINHEIRO. DEFEITO DE SEGURANÇA NA UTILIZAÇÃO DO SERVIÇO. DIFICULDADES PARA SOLUÇÃO DO PROBLEMA. FORTUITO INTERNO. DANO MORAL CONFIGURADO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. VERBA INDENIZATÓRIA FIXADA DE FORMA PRUDENTE NO PATAMAR DE R$15.000,00. SENTENÇA REFORMADA. 1- A simples clonagem do número de celular e do aplicativo de mensagens do consumidor demonstram a vulnerabilidade do sistema, a atrair a responsabilidade de toda a cadeia de consumo. 2- A possibilidade de ser alvo de falsários constitui risco interno decorrente da atividade da empresa, que deveria tomar as precauções necessárias para evitar fraudes. 3- Importa salientar a incidência da teoria do risco do empreendimento, pela qual todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no campo do fornecimento de bens e serviços, tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento, independentemente de culpa, pois a responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar a atividade de produzir, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. 4- A apelante é a titular da linha telefônica e do Whatsapp clonados, sofrendo angústias por ser vítima da fraude, e desabonos perante toda sua rede de contatos que recebeu a abordagem do fraudador em seu nome. 5- Para fixação do dano moral, deve-se obedecer ao critério da razoabilidade, objetivando o atendimento da sua dúplice função - compensatória dos sofrimentos infligidos à vítima e inibitória da contumácia do agressor - sem descambar para o enriquecimento sem causa da vítima. Deve-se considerar, portanto, para fins de fixação do dano moral, a intensidade da lesão, as condições socioeconômicas do ofendido e de quem deve suportar o pagamento dessa verba compensatória. Vistos, relatados e discutidos estes autos de n. 8039106-77.2021 .8.05.0001, em que figuram como apelante ELIELMA MARIA LUMES e como apelada FACEBOOK GLOBAL HOLDINGS II, LLC. ACORDAM os integrantes da Terceira Câmara Cível do Estado da Bahia, por #unanimidade em conhecer e DAR provimento ao presente recurso, nos termos do voto do relator. (TJ-BA - Apelação: 80391067720218050001, Relator.: REGINA HELENA SANTOS E SILVA, Data de Julgamento: 01/04/2024, TERCEIRA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 05/05/2024). (negritei)
Ademais, impende observar que a jurisprudência do STJ é firme no sentido de que “a responsabilidade objetiva prevista no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor é afastada quando provada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro” (REsp 365008/MG, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha). No caso, não houve tal prova.
3.4. Danos morais.
O comprometimento da conta de WhatsApp do autor e sua utilização para aplicação de golpes configura situação que inequivocamente ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano, caracterizando dano moral indenizável.
Na sociedade contemporânea, as contas de comunicação digital representam verdadeira extensão da identidade pessoal dos indivíduos. O WhatsApp, em particular, constitui um dos principais meios de comunicação interpessoal, sendo utilizado para contatos familiares, profissionais e sociais.
O comprometimento de tal conta e sua utilização por terceiros para fins fraudulentos atinge diretamente a honra, a imagem e a reputação da pessoa. No caso, o autor teve sua identidade digital sequestrada e utilizada para enganar seus próprios contatos, solicitando-lhes transferências de dinheiro.
Os documentos juntados aos autos comprovam que o invasor utilizou a foto do autor e seu número de telefone para contatar pessoas de seu círculo social, pedindo empréstimos e transferências. Tal situação evidentemente causou constrangimento, vexame e abalo psicológico ao autor.
A jurisprudência deste Eg. Tribunal de Justiça Goiano tem reconhecido consistentemente a existência de danos morais em casos similares:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO. RELAÇÃO DE CONSUMO. REDE SOCIAL INSTAGRAM. INVASÃO DA CONTA POR TERCEIROS (HACKERS). FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DO RÉU. RISCO DA ATIVIDADE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. VALOR DA INDENIZAÇÃO. 1. Constatada, a falha na prestação dos serviços do réu, porquanto não garantiu a proteção dos dados dos apelados, o que deveria ser intrínseco à sua atividade profissional, devendo o facebook/instagram responder pelos respectivos danos causados. 2. O dano moral é devido, uma vez que supera o mero aborrecimento cotidiano, visto que, a invasão das contas dos autores na rede social Instagram, os quais foram utilizados indevidamente por hackers, gera aos seus clientes uma falta de credibilidade., pois os perfis hackeados são usados para a promoção e venda de produtos da empresa. 3. O valor indenizatório fixado a título de danos morais deve apresentar caráter dúplice - compensatório para a vítima e punitivo para o ofensor - e atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - AC: 56873048320218090051 GOIÂNIA, Relator.: Des(a). VICENTE LOPES DA ROCHA JÚNIOR, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 09/10/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INVASÃO DO PERFIL EM REDE SOCIAL. FACEBOOK/INSTAGRAM. HACKER. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO DEVIDA. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO MAJORADOS. 1. 1. A responsabilidade civil incidente na espécie é a objetiva, incumbindo ao consumidor demonstrar apenas a conduta (ação ou omissão), o nexo causal e o dano resultante para fazer jus à reparação, segundo inteligência e interpretação extensiva do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. 2. Evidenciada a falha da empresa apelante no implemento das medidas acautelatórias que lhe cabiam para impedir a ocorrência da fraude/invasão no perfil do consumidor, responde pelos prejuízos causados de forma objetiva, sendo este o risco assumido quando do exercício da atividade, daí não poder esquivar-se das consequências da sua negligência, ex vi do artigo 14, § 1º do CDC, artigo 3º, incisos II, III e V da Lei nº 12.965/2014. 3. Constatado o dano moral sofrido pela vítima, o quantum indenizatório deve ser fixado levando em consideração não só a gravidade do fato, como também as consequências para a vítima, a intensidade do dolo ou grau de culpa do ofensor, sem descurar das condições econômicas deste e do próprio ofendido, atento aos critérios da razoabilidade, proporcionalidade e caráter pedagógico do instituto. 4. Descabida a majoração de honorários, porquanto inaplicável o art. 85, § 11, do CPC/2015, na hipótese de desprovimento parcial do recurso. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-GO - Apelação Cível: 5249826-38.2023.8.09 .0051 GOIÂNIA, Relator.: Des(a). DORACI LAMAR ROSA DA SILVA ANDRADE, 7ª Câmara Cível, Data de Publicação: 06/05/2024)
O dano moral, no caso, é presumível (in re ipsa), decorrendo da própria natureza do fato e de suas consequências naturais. A utilização indevida da identidade digital para aplicação de golpes é lesão evidente à dignidade da pessoa humana, dispensando prova específica do abalo psicológico.
No que pertine à quantificação dos danos morais, o Brasil adota a Teoria Pedagógica Mitigada, que aduz ter tal instituto um duplo viés: (i) o caráter compensatório da vítima; e (ii) o aspecto pedagógico-punitivo do ofensor.
O arbitramento do quantum compensatório sempre foi alvo de muitas celeumas, notadamente, em razão da inexistência de critérios minimamente objetivos que pudessem garantir segurança jurídica e justiça no caso concreto.
O Brasil adotou, durante muitos anos, a Teoria do Livre Arbitramento, pela qual o juiz é livre para arbitrar o valor da compensação pelos danos morais, mas, atualmente, o Superior Tribunal de Justiça tenta objetivar, ao máximo, a atividade jurisdicional de quantificar o valor da compensação por dano moral, de modo que estabeleceu, na jurisprudência, o método bifásico de avaliação, pelo qual o julgador, na 1ª fase, deve extrair parâmetros jurisprudenciais para o caso, e, na 2ª fase, deve realizar um sopesamento das circunstâncias do caso concreto.
Pelas circunstâncias do caso em exame, mostra-se adequada a fixação do montante compensatório pelos danos morais sofridos pelo consumidor em R$ 8.000,00 (oito mil reais), atendendo ao método bifásico de arbitramento e às duas vertentes da Teoria Pedagógica Mitigada, bem como inibindo o enriquecimento sem causa, em homenagem aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Destaca-se que sobre referido valor deve incidir juros de mora a partir da citação (arts. 405 e 406 do Código Civil e art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional) e correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento (Súmula n. 362/STJ).
DISPOSITIVO.
Ante o exposto, CONFIRMO a liminar e JULGO PROCEDENTE os pedidos formulados por Richard Lendow Silva em face de Facebook Serviços Online do Brasil Ltda, para CONDENAR a ré a(o):
a) RESTABELECER imediatamente o acesso do autor Richard Lendow Silva à sua conta de WhatsApp vinculada ao número de telefone (92) 99963-7319, removendo definitivamente qualquer bloqueio, suspensão ou restrição existente, garantindo a segurança e integridade de sua conta;
b) CUMPRIR a obrigação no prazo de 72 (setenta e duas) horas a contar do trânsito em julgado desta sentença, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), limitada ao valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais);
c) CONDENAR a ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), com correção monetária pelo INPC a partir desta data (Súmula 362/STJ) e juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação (arts. 405 e 406 do Código Civil c/c art. 161, §1º do CTN).
Tendo em vista a sucumbência integral da requerida, CONDENO-A ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Opostos embargos de declaração com efeitos infringentes, OUÇA-SE a parte embargada, no prazo legal e, conclusos.
Considerando que não há mais juízo de admissibilidade neste grau de jurisdição (art. 1.010, § 3º, Código de Processo Civil), havendo a interposição de recurso de apelação, INTIME-SE a parte recorrida para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias úteis.
Apresentadas preliminares nas contrarrazões acerca de matérias decididas no curso da lide que não comportavam recurso de agravo de instrumento, INTIME-SE a parte contrária para manifestar-se especificamente sobre esse ponto, no prazo de 15 (quinze) dias úteis (art. 1.009, § 2º, do Código de Processo Civil).
Escoado o prazo sem manifestação, após certificação pela UPJ das Varas Cíveis, ou juntadas as contrarrazões sem preliminares, ou sobre estas já tendo a parte contrária se manifestado, REMETAM-SE os autos ao egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, com nossas homenagens.
Após o trânsito em julgado e cumpridas as formalidades legais, ARQUIVEM-SE os presentes autos.
CONFIRO força de mandado/ofício a esta sentença, dispensada a geração de outro documento, bastando o cadastro em sistema próprio e/ou entrega ao Oficial de Justiça, ou destinatário, nos termos dos arts. 136 a 139 do Código de Normas e Procedimentos do Foro Judicial da CGJ-GO.
Cumpra-se.
Goiânia, data e hora do sistema.
(assinado eletronicamente)
Leonardo Naciff Bezerra
Juiz de Direito
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