Processo nº 1000593-96.2025.8.11.0052
ID: 311269409
Tribunal: TJMT
Órgão: VARA ÚNICA DE RIO BRANCO
Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL
Nº Processo: 1000593-96.2025.8.11.0052
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE RIO BRANCO VARA ÚNICA PROCESSO N. 1000593-96.2025.8.11.0052 AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REQUERENTE: ANTONIO RODRIGUES DOS S…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE RIO BRANCO VARA ÚNICA PROCESSO N. 1000593-96.2025.8.11.0052 AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REQUERENTE: ANTONIO RODRIGUES DOS SANTOS NETO REQUERIDO: MUNICIPIO DE SALTO DO CEU, ESTADO DE MATO GROSSO Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA proposta pela MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, em favor de ANTONIO RODRIGUES DOS SANTOS NETO, em face do ESTADO DE MATO GROSSO e do MUNICÍPIO DE SALTO DO CÉU-MT. Partes qualificadas no feito. Narra a parte autora, em síntese, que o substituído, idoso de 70 anos de idade, é portador de quadro clínico de alta complexidade, inválido de forma permanente, com comprometimento integral das funções motoras e cognitivas essenciais para as atividades básicas da vida diária, o que lhe impõe absoluta dependência de terceiros para higiene, alimentação e mobilidade. Segundo relatórios técnicos subscritos por profissionais vinculados ao SUS, o autor da ação se alimenta exclusivamente por gastrostomia – procedimento pelo qual é introduzida uma sonda diretamente no estômago do paciente, geralmente por necessidade nutricional em casos de disfagia severa, lesões neurológicas ou impossibilidade de alimentação oral segura. A dieta enteral recomendada é de alto custo e requer administração e acompanhamento diário por equipe multidisciplinar, com suporte técnico especializado, sob pena de risco de agravamento de seu estado clínico e possível desnutrição. Consta, ainda, que o paciente necessita de cuidados contínuos prestados por: (i) médico, para ajuste terapêutico regular e monitoramento de comorbidades; (ii) enfermeiro e técnico de enfermagem, para administração de medicação, realização de curativos, manejo da gastrostomia e prevenção de lesões por pressão; (iii) fisioterapeuta, para prevenção de contraturas, manutenção da mobilidade residual e higidez do sistema respiratório; (iv) fonoaudiólogo, para avaliação das funções de deglutição e comunicação, prevenindo episódios de aspiração pulmonar; (v) nutricionista, para avaliação e prescrição da dieta enteral especializada, ajustada ao perfil clínico e metabólico do idoso. Tais condições exigem tratamento contínuo e domiciliar, o chamado home care, por se tratar da alternativa mais adequada, eficaz e digna para o paciente, que já se encontra desospitalizado e em ambiente doméstico, porém sem o suporte assistencial necessário. O Ministério Público narra, ainda, que a família do senhor ANTONIO não possui meios financeiros para custear tal assistência em rede privada, tendo solicitado o amparo da rede pública de saúde. Entretanto, tanto o Município de Salto do Céu quanto o Estado de Mato Grosso eximiram-se da responsabilidade, indicando um ao outro como ente competente para fornecer o suporte requisitado, fato que configura flagrante omissão estatal. Pleiteia-se, assim, concessão de tutela de urgência, inaudita altera pars, para compelir os entes públicos demandados a fornecerem o tratamento domiciliar multidisciplinar completo, bem como insumos indispensáveis, como fraldas geriátricas e dieta enteral, cominando-se multa pessoal aos gestores em caso de descumprimento, além de eventual bloqueio de valores. Com a inicial, juntou documentos. Após diligências pertinentes, adveio parecer técnico do Núcleo de Apoio Técnico – NAT favorável ao ID 198943119. Vieram os autos conclusos para deliberação. BREVE RELATO. FUNDAMENTO E DECIDO. Da antecipação da tutela. No que dispõe o art. 300 do CPC, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Ou seja, extrai-se do referido dispositivo que, havendo probabilidade de o direito existir, aliado ao perigo de dano, têm-se os requisitos suficientes para a concessão da tutela antecipada. Neste diapasão, as tutelas provisórias de urgência, sejam cautelares ou satisfativas, subordinam-se a dois pressupostos específicos: fundado receio de dano (periculum in mora) e probabilidade do direito vindicado (fumus boni iuris). Doravante, passo a analisá-los. Os laudos médicos juntados aos autos, bem como o diagnóstico das patologias, demonstram a fumaça do bom direito, ou seja, constata-se que o paciente necessita de cuidados, sobretudo, assistenciais por equipe multidisciplinar em regime domiciliar. Assim, o proponente alega que a documentação carreada evidencia a urgência da medida. Todavia, em que pese os argumentos narrados, os aludidos laudos não demonstram de maneira fundamentada e circunstanciada a imprescindibilidade do tratamento intensivo HOME CARE. Ademais, o parecer do NAT de ID 186241874 conclui (sic): – CONCLUSÃO: (...). Conclusão Justificada: Favorável Conclusão: 1. DE ACORDO COM OS DOCUMENTOS MÉDICOS DISPONÍVEIS NOS AUTOS, TRATA-SE DE REQUERENTE PORTADOR DE SEQUELAS NEUROLÓGICAS POR QUADRO VIRAL GRAVE COM SEQUELAS DEFINITIVAS MOTORAS E COGNITIVAS ACAMADO, DEPENDENTE, EM USO DE GASTROSTOMIA PARA ALIMENTAÇÃO, COM SARCOPENIA, INTENRAÇÕES REPETIDAS POR DESCOMPENSAÇÕES CLÍNICAS SENDO SOLICITADA INTERNAÇÃO DOMICILIAR COM VISITAS _MÉDICAS, DE FISIOTERAPIA, ENFERMAGEM 24HORAS, FONOAUDIOLOGO E NUTRIÇÃO. 2. A internação domiciliar, neste caso, pode ser instituida desde que haja condições mínimas estruturais no domicilio para colocação dos equipamentos necessários e condições multiprofissionais de atendimento, inclusive com retaguarda de suporte hospitalar adequado em caso de agravamento (insuficiência respiratória por acúmulo de secreções e UTI por exemplo). 3. A INTERNAÇÃO DOMICILIAR É DE CARÁTER ABSOLUTAMENTE ELETIVO, somente devendo ocorrer quando o paciente está em condição clinica estabilizada, com estrutura fisica e profissional de equipe de Home Care bem estabelecida. 4. Por todo o exposto e diante das indicações desta modalidade de internação, a instituição de cuidados domiciliares via Home Care poderá ser estabelecida e está indicada neste caso, havendo também neste caso necessidade indiscutivel de CUIDADOR. 5. As equipes assistenciais precisam estabelecer a necessidade do serviço e deverão elencar qual acompanhamento profissional será indicado para o caso (fisioterapeuta, nutricionista, médico, fonoaudiólogo e equipe de enfermagem etc) e quais os insumos médico-hospitalares serão necessários e a periodicidade de seu fornecimento. 6. Toda analise do nivel de assistência em home care depende de uma avaliação clínica presencial do paciente, além da avaliação dos exames complementares, da história dinica e social do paciente, além da avaliação do local (estrutura fisica e de pessoal) onde deverá ser instalado todo o aparato para a assistência domiciliar. Tal avaliação no Estado de Mato Grosso atualmente é realizada por equipe médica da Secretaria Estadual de Saúde em parceria com as secretarias municipais de saúde e, através de convênio entre ambos, determinar quais serão as responsabilidades assistenciais de cada gestor. 7. A determinação específica das necessidades do Requerente é incompativel com as atividades estabelecidas para este núcleo, o qual faz exclusivamente a avaliação da pertinéncia dos pedidos e da urgência dos mesmos através de analise documental. 8. O servico de Home Care não faz parte da lista de procedimentos do SUS e no estado de Mato Grosso é realizada apenas por ordem judicial, não há como realizar regulação do procedimento pelo SUS. 9. Não há qualquer urgência e/ou emergência no caso em tela. Trata-se de procedimento eminentemente eletivo e que necessita ser bem indicado e organizado a fim de proporcionar o melhor resultado possivel para o paciente. Há evidências científicas? Sim Justifica-se a alegação de urgência, conforme definição de Urgência e Emergência do CFM? Não Pois bem. Conforme consta no laudo médico da Dra. Juliana Parreira CRM 7626, emitido em 30/04/2025 (ID 185000406), relata: Paciente idoso, acamado, dependente total para atividades da vída diária (AVDs) e atividades instrumentais da vida diáría (AVDIs). Encontra-se em uso de gastrostomia (GTT) para alimentação, apresentando estado nutricional comprometido e mobilidade severamente reduzida. Apresenta confusão mental ocasional, com períodos de desorientação temporoespacial. Refere distúrbios do sono, con padrão fragmentado e redução da eficiência do sono além de RECIDIVAS INFECIOSAS DO TRATO URINARIO / RESPIRATORIO →, e RECIDIVAS INTERNAÇÃO HOSPITALAR Apresenta broncoaspiração salivar frequente - com necessidade de aspiração Apresenta HIPONATREMIA frequente com Necessidade de CORRECÃO POR BIC Apresenta Anemia severa com necessidade de transfusão sanguínea ( ultima necessidade foi 29/04 * 3 bolsas ) Apresenta Desidratação com necessidade de reposição de volume e estabilidade de sinais vitais . Escalas de Avaliação: Escala de Katz (AVDs): 0 - Dependente en todas as funções Escala de Lawton (AVDTs): 9 * Dependente total Nutricionista: Ajuste dieta parenteral Fonoaudiologia: Avaliação e acompanhamento das funções de deglutição e comunicação, prevenindo aspiração e complicações associadas. Anexo a este laudo, segue prescrição médica de uso contínuo, bem como a pontuação da tabela ABENID, evidenciando a necessidade de assistência home care. A referida profissional de saúde atesta que o paciente necessita de acompanhamento multidisciplinar contínuo, incluindo assistência de fonoaudiologia, fisioterapia, nutrição e enfermagem para adequação do manejo clínico e suporte familiar. Oportuno registrar que o tratamento home care nada mais é do que a assistência domiciliar, a qual é definida como um conjunto de procedimentos hospitalares possíveis de serem realizados na casa do paciente, que abrange ações desenvolvidas por uma equipe multiprofissional após a análise do diagnóstico de cada situação específica. A assistência domiciliar comporta três modalidades de serviços, a saber: · Visita domiciliar: restringe-se ao atendimento domiciliar realizado por uma equipe ou profissional para analisar e estabelecer um plano assistencial de saúde; · Atendimento domiciliar: refere-se à atividade assistencial formada por procedimentos técnicos mais orientações, a depender da complexidade do caso; · Internação domiciliar: consiste em um conjunto de atividades assistenciais prestadas por profissionais da saúde juntamente com equipamentos, materiais e medicamentos. O paciente deve passar por uma triagem a ser feita pelo médico, enfermeiro e assistente social a fim de se aferir se enquadra dentro dos critérios de elegibilidade ou não. Após essa triagem, o paciente recebe uma pontuação que servirá de base para saber o tipo de tratamento oferecido. Ressalta-se que, no caso em concreto, conforme consta na Tabela ABEMID, a pontuação varia de 0 (zero) ao máximo de 19 (dezenove), sendo que a pontuação abaixo de 7 (sete) significa que o paciente é inelegível para iniciar ou manter-se no programa de internação domiciliar, já a pontuação necessária para indicação de internação domiciliar precisa variar de 8 (oito) a 12 (doze) pontos (baixa complexidade), de 13 (treze) a 18 (dezoito) pontos (média complexidade) e acima de 19 (dezenove) pontos (alta complexidade). Destarte, no caso em concreto, a avaliação do médico do Município atestou que o paciente alcançou 20 (vinte) pontos na tabela da ABEMID (ID 196969561 – pág. 27/20), de modo que restou caracterizado como paciente de alta complexidade, alcançando o requisito de dependência total de cuidados técnicos e reabilitação, bem como terapia nutricional. Dessa maneira, é evidente no caso o risco à saúde do autor, tenho em vista a indicação médica da necessidade de assistência técnica especializada, cujo perigo de irreversibilidade é patente, já que sem o suporte pleiteado o requerente corre grande risco de evoluir a gravidade da patologia, conforme destacado no relatório médico, de modo que, para o tratamento da paciente, é necessário o deferimento da medida de urgência para compelir os requeridos a providenciarem a contratação ou custeio do Home Care. Ademais, o paciente é hipossuficiente, vez que assistido pela Ministério Público. Nessa ordem de ideias, não se mostra crível qualquer omissão da parte demandada frente à necessidade premente do indivíduo ao tratamento indicado. Nesse sentido, segue o entendimento jurisprudencial, in verbis: “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – REEXAME NECESSÁRIO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA – DIREITO À SAÚDE – DIREITO FUNDAMENTAL – ARTIGO 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - NECESSIDADE DE DISPONIBILIZAÇÃO À REQUERENTE DO TRATAMENTO DE SAÚDE VINDICADO NA INICIAL, QUAL SEJA, HOME CARE - SOLIDARIEDADE ENTRE OS ENTES PÚBLICOS NAS DEMANDAS RELATIVAS AO DIREITO À SAÚDE – CONDENAÇÃO DE APENAS UM DOS ENTES PÚBLICOS DEMANDADOS – IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO – SÚMULA N. 45 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – ISENÇÃO DE CUSTAS PROCESSUAIS PARA A FAZENDA PÚBLICA - INDEVIDOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS PARA A DEFENSORIA PÚBLICA – SENTENÇA RATIFICADA. 1 - Compete ao Poder Público velar pela integridade do direito subjetivo à saúde, constitucionalmente assegurado, disponibilizando meios a garantir a plena consecução dos objetivos proclamados no art. 196 da Constituição Federal de 1988. 2 - Verifica-se que restou demonstrado a necessidade de ser disponibilizado à Requerente o serviço de home care vindicado nos autos, eis que consta no feito documento médico e relatório de avaliação técnica, realizado pelo Núcleo de Apoio à Saúde da Família, da Secretaria Municipal de Saúde de Rondonópolis, atestando o quadro de saúde da menor, e indicando, para tanto, o seu tratamento pelo serviço de home care. 3 - Em que pese entender ser solidária a responsabilidade entre os entes públicos para o custeio da saúde pública, verifico que não houve a interposição de recurso voluntário das partes se insurgindo contra o decidido pelo Juízo singular, que impôs apenas ao Estado de Mato Grosso a obrigação de prestar o serviço de home care à paciente, apesar da parte Requerente ajuizar a demanda em face do Município de Rondonópolis e do ente público estadual condenado. Assim, considerando que, no reexame necessário, é defeso, ao Tribunal agravar a condenação imposta à Fazenda Pública, conforme disposto na súmula n. 45, do Superior Tribunal de Justiça, deve-se manter apenas o Estado de Mato Grosso como responsável por prestar o tratamento de saúde à Requerente. 4 - Nas condenações contra a Fazenda Pública, aplica-se a isenção do pagamento das custas e despesas processuais (artigo 3º, inciso I, da Lei Estadual n. 7.603/2001). 5 – Não cabe a fixação de honorários em favor da Defensoria Pública não só quando vencido o Estado de Mato Grosso, mas também quando sucumbiu o Município, após a Emenda Constitucional n. 80/2014”. (TJ-MT - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL: 00077711320188110003 MT, Relator: HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Data de Julgamento: 14/09/2020, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 21/09/2020) (negritei). "AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. AUTOR PORTADOR DE DISTROFIA MUSCULAR DE DUCHENE (CID10 G71.0), DEPENDÊNCIA DE OXIGÊNIO SUPLEMENTAR, ALIMENTAÇÃO POR CATETER NASOENTÉRICO, FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA E MOTORA E CUIDADOS DE ENFERMAGEM 24H. DEFERIMENTO DE TUTELA DE URGÊNCIA PARA DETERMINAR QUE A RÉ FORNEÇA SERVIÇO DE HOME CARE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ELEMENTOS CAPAZES DE DEMONSTRAR A VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES AUTORAIS. VERBETE SUMULAR Nº 59 DO TJRJ. 1. A tutela de urgência, prevista no artigo 300 do CPC/15, estabelece os requisitos para sua concessão, quais sejam, a probabilidade do direito, o perigo de dano ou risco de inutilidade do resultado do processo e não ser ela irreversível. 2. Obrigação solidária entre Estado, Município e União, consoante art. 23. Os entes não podem furta-se à obrigação, sob o argumento de falta de dotação orçamentária. Sendo a obrigação solidária, o agravado tem a faculdade de exigi-la de quaisquer das pessoas jurídicas de direito público. Até mesmo do Estado. fornecimento do serviço de home care custeado pelo Estado réu não viola o princípio da reserva do possível, nem as leis orçamentárias, por força da prevalência do princípio da dignidade humana. 3. Laudo médico que acompanha a inicial que atesta que o agravado é portador de distrofia muscular de Duchene (CID 10 G71.0), dependendo de oxigênio suplementar, alimentação por cateter nasoentérico, fisioterapia respiratória e motora e cuidados de enfermagem 24h, sendo certo que o documento médico afirma a necessidade de home care para a alta hospitalar, uma vez que há necessidade de assistência técnica especializada. 4. O fornecimento do serviço de home care custeado pelo Estado não viola o princípio da reserva do possível, nem as leis orçamentárias, por força da prevalência do princípio da dignidade humana. 5. Aplicação da Súmula 241 do TJERJ, in verbis: "Cabe ao ente público o ônus de demonstrar o atendimento à reserva do possível nas demandas que versem sobre efetivação de políticas públicas estabelecidas pela Constituição." Precedente: 0014458-27.2017.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO - Des (a). CONCEIÇÃO APARECIDA MOUSNIER TEIXEIRA DE GUIMARÃES PENA - Julgamento: 02/08/2017 - VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL 6. Presentes os elementos capazes de demonstrar a verossimilhança das alegações do autor, bem como o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 7. Aplicação do Verbete de Súmula nº 59 deste Tribunal, in verbis: "Somente se reforma a decisão concessiva ou não, da tutela de urgência, cautelar ou antecipatória, se teratológica, contrária à lei, notadamente no que diz respeito à probabilidade do direito invocado, ou à prova dos autos." 8. Recurso desprovido". (TJ-RJ - AI: 00008952920188190000 RIO DE JANEIRO SAO JOAO DE MERITI 3 VARA CIVEL, Relator: MARIANNA FUX, Data de Julgamento: 21/02/2018, VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL CONSUMIDOR, Data de Publicação: 22/02/2018) (negritei e sublinhei). A concessão da tutela antecipada prestigia, ainda, o princípio da proporcionalidade, decorrente do princípio do devido processo legal substancial, uma vez que a medida traz um caráter de urgência que sucumbe o interesse da parte adversa. Portanto, o seu deferimento vem ao encontro do próprio direito à vida, proporcionalmente superior aos interesses da Administração Pública. No presente caso, importa ressaltar que o ordenamento jurídico brasileiro, por meio da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), confere especial proteção ao idoso, disciplinando direitos fundamentais que asseguram o respeito à sua integridade física, moral e à preservação de sua dignidade, sendo o Estado e a família coobrigados por essa salvaguarda. O art. 2º do Estatuto do Idoso assevera com clareza meridiana: “O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.” Ademais, o art. 15, caput e § 1º da referida norma estatutária consagra: “Art. 15. É assegurada a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde - SUS, garantindo-se-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos.” § 1º: Incumbe ao poder público fornecer aos idosos, gratuitamente, medicamentos, especialmente os de uso continuado, próteses, órteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação de sua saúde.” No tocante à necessidade de fornecimento de fraldas geriátricas e fórmulas nutricionais enterais, cumpre observar que tais insumos não se tratam de itens acessórios ou dispensáveis, mas sim de elementos terapêuticos essenciais e diretamente vinculados ao êxito do plano de cuidados médicos e à garantia da dignidade e sobrevivência do paciente. O uso contínuo de fraldas geriátricas, no caso específico do assistido, encontra-se clinicamente justificado em virtude de sua incontinência urinária e fecal, associada ao seu estado acamado e dependência total de terceiros, conforme diagnosticado por laudos médicos presentes nos autos. Sua privação pode causar infecções urinárias, dermatites por contato, além de evidente agravo à dignidade humana. No que tange às fórmulas nutricionais enterais, o próprio Sistema Único de Saúde – SUS, por meio de normativas técnicas, reconhece a indicação de terapia nutricional especializada nos casos de pacientes com gastrostomia, como meio seguro, adequado e imprescindível para manutenção da vida. Negar o acesso a essas substâncias é, na prática, negar alimentação – direito fundamental protegido constitucionalmente. Ademais, os relatórios médicos (ID 196969561), são categóricos ao afirmar que o assistido encontra-se dependente para atividades básicas de vida diária, em regime de cuidados paliativos, e impossibilitada de se alimentar por via oral em razão das sequelas da patologia. Tal condição, por si só, já impõe vulnerabilidade extrema, potencializando o risco de inanição, agravamento do quadro clínico, infecções, perda ponderal severa, desnutrição proteico-calórica e morte. Ah de salientar que: · A dieta artesanal não supre adequadamente as necessidades calóricas e nutricionais; · Há risco de contaminação e complicações gastrointestinais graves, em razão da imunodepressão e da fragilidade orgânica da autora; · É imprescindível o uso de dieta industrializada hipercalórica, hiperproteica, com fibras e alta densidade energética; Por essa razão, a ausência da fórmula por apenas poucos dias pode gerar consequências irreversíveis à saúde da paciente, como desnutrição severa e falência orgânica progressiva. A situação demanda intervenção judicial, tendo em vista que a autora depende exclusivamente da via enteral para sobrevivência, o que torna inadmissível qualquer postergação no fornecimento do insumo. Assim, restam robustamente comprovadas a probabilidade do direito e o risco de dano irreparável, diante do estado gravíssimo da paciente, cuja vida depende de alimentação por sonda - uso de gastrostomia. Desse modo, verifica-se que inexistem dúvidas de que o assistido, estando em tratamento paliativo, necessita fazer uso do alimento por via gastrotomia, ante a impossibilitada de se alimentar por via oral, de acordo com o atestado subscrito pela profissional que a acompanha. Com efeito, evidente que o não fornecimento do complemento alimentar requerido em favor da idosa, implica, simplesmente, negativa do direito fundamental à saúde e à vida, consagrado na CRF. Importante destacar, ainda, que ficou demonstrada nos autos a hipossuficiência econômica da representada, porquanto o alto custo do alimento, em consonância com a renda da requerente, conforme se extrai dos documentos à inicial. De outro turno, a ausência do suplemento pleiteado na lista do SUS não deve servir de pretexto para o administrador público esquivar-se de seu dever de prestar a saúde, notadamente quando o insumo está autorizado pela ANVISA e se mostra essencial para o desenvolvimento da criança. A corroborar: TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL 25262520188110034 Jurisprudência • Acórdão • Data de publicação: 14/02/2023 E M E N T A APELAÇÃO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DIREITO À SAÚDE - FLUDROCORTISONA E SUPLEMENTO ALIMENTAR – LEITE NEOCAP LCP - PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA – COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DO ESTADO NÃO RECONHECIDA - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA - AUSÊNCIA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA - OBRIGAÇÃO DO ESTADO (LATO SENSU) – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO DISPONÍVEL NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – NECESSIDADE DEMONSTRADA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O dever de assegurar o direito à saúde caracteriza obrigação de responsabilidade solidária entre os entes federativos, o que não implica em obrigatoriedade de inclusão ou exclusão de um ou outro. Tese firmada no julgamento do RE 855178 RG/SE no Supremo Tribunal Federal. 2. Não há que falar em violação ao princípio constitucional da reserva do possível se não existe comprovação nos autos de que os entes demandados não possuem condições financeiras de custear o tratamento postulado. Ademais o direito à saúde é direito de todos e dever do Estado (lato sensu), nos moldes do artigo 196 da Constituição Federal . 3. A obrigação do Poder Público em fornecer medicamentos que não integram a lista do Sistema Único de Saúde ocorre somente nos casos em que ficar demonstrada a imprescindibilidade do remédio específico prescrito ao paciente, bem como a ausência de tratamento similar na rede pública. 4. Comprovada a necessidade de fornecimento do medicamento não constante da lista do SUS, impõe-se a manutenção da obrigação de fazer imposto ao ente público. 5. Recurso conhecido e desprovido. Ademais, a parte autora conta atualmente com 70 (setenta) anos de idade, conforme documentação médica acostada aos autos. Em função disso, insere-se na categoria de pessoa idosa para todos os fins legais, conforme definido no art. 1º da Lei n. 10.741/2003 – Estatuto do Idoso, que considera idosa a pessoa com idade igual ou superior a 60 anos. O Estatuto do Idoso, norma de índole cogente e de caráter protetivo, determina, em seu art. 3º, que: “É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar à pessoa idosa, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação (...), à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.” Já o art. 15 da mesma norma estabelece, de forma taxativa: “O idoso tem direito à saúde, mediante o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.” E, ainda: § 2º – Incumbe ao Poder Público proporcionar ao idoso, entre outros, acesso à assistência farmacêutica, com prioridade para medicamentos de uso continuado.” No mesmo sentido, o art. 2º do Estatuto é enfático ao afirmar que: “O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana (...), assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades para a preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.” O diploma legal também estabelece, em seu art. 71, que é crime "negar o acolhimento ou a permanência do idoso como beneficiário em instituição pública ou privada de saúde, por qualquer tipo de discriminação", o que amplia a compreensão de que a recusa do fornecimento da fórmula nutricional pela rede pública de saúde afronta diretamente a ordem jurídica vigente e o regime de proteção da pessoa idosa. Portanto, a negativa administrativa dos entes públicos demandados viola não apenas os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) e da proteção integral (CF, art. 230), como também infringe frontalmente os comandos legais específicos do Estatuto do Idoso, os quais impõem tratamento prioritário, célere e efetivo aos idosos em situação de vulnerabilidade. Assim, no presente caso, diante da gravidade do estado clínico da requerente, do risco iminente de dano irreversível à sua saúde e da proteção jurídica reforçada conferida pela legislação infraconstitucional específica (Estatuto do Idoso), é indispensável a pronta intervenção judicial como medida de salvaguarda do direito à vida e à saúde. Nestes termos, impõe-se a imediata atuação jurisdicional, sem qualquer entrave burocrático, em respeito ao princípio da máxima efetividade dos direitos fundamentais e da dignidade da pessoa humana. Portanto, estão presentes os requisitos da probabilidade do direito e do perigo na demora, suficientes a amparar a tutela de urgência pleiteada. Ante o exposto, DEFIRO a liminar, pelo que DETERMINO que os requeridos, Estado de Mato Grosso e Município de Salto do Céu/MT, no prazo de 05 (cinco) dias, PROVIDENCIE a contratação ou o custeio de Home Care, com equipe multidisciplinar e com equipe multiprofissional para atender às necessidades da paciente, para que seja efetivado o tratamento médico necessário ao quadro de saúde do substituído, nos termos descritos do relatório médico enquanto perdurar a necessidade médica, devendo ser apresentada, nos autos, prescrição médica atualizada a cada 90 (noventa) dias, sob pena de suspensão do fornecimento do tratamento. Ainda, considerando o estado de saúde do paciente e a necessidade de insumos essenciais ao seu tratamento, entendo ser cabível o DEFERIMENTO da tutela de urgência para, no prazo de 05 (cinco) dias, os requeridos, Estado de Mato Grosso e Município de Salto do Céu/MT, forneçam à parte autora fraldas geriátricas e as fórmulas nutricionais enterais prescritas, nos moldes indicados nos laudos médicos, devendo observância ao princípio ativo, sem indicação de marca comercial específica, enquanto perdurar a necessidade médica, devendo ser apresentada, nos autos, prescrição médica atualizada a cada 90 (noventa) dias, a fim de viabilizar a entrega respectiva, sob pena de suspensão do fornecimento. Intimem-se via sistema, bem como comuniquem-se a Secretarias de Saúde, ou quem lhe façam as vezes para que cumpram a presente decisão, devendo comunicar este Juízo das providencias adotadas, sob pena de caracterização de ato atentatório à dignidade da justiça, ficando autorizado o encaminhamento deste decisum por e-mail a Secretaria Estadual de Saúde (e-mail: gbses@ses.mt.gov.br)/ (apoiojudicialsaude@ses.mt.gov.br). No mais, deixo de aplicar astreintes, posto que elas não têm alcançado sua finalidade e destino no sentido de dar eficácia ao provimento, eis que os órgãos estatais dão de ombros à possibilidade de pagar multas pecuniárias ou até mesmo obedecer a comandos cominatórios, por isso, em caso de descumprimento da presente decisão, entendo ser possível o bloqueio de verbas estatais como medida coercitiva mais eficaz para assegurar o resultado útil da medida. Estando em termos, RECEBO a petição inicial e DETERMINO a citação do requerido para, querendo e no prazo legal, apresente defesa, indicando as provas que pretende produzir. Com a resposta, intime-se a parte autora para oferecimento da réplica, no prazo legal. Após, conclusos para decisão interlocutória de saneamento ou julgamento do processo no estado em que se encontra. Inobstante os preceitos trazidos pelo Código de Processo Civil envolvendo os métodos de solução consensual de conflitos, tenho que inaplicáveis e ineficientes aos casos envolvendo o órgão público em apreço. Cumpra-se, com urgência, servindo a presente decisão como mandado/ofício, no que couber. Às providências. Cumpra-se, expedindo o necessário. Às providências. Rio Branco/MT, datado e assinado digitalmente. LUCIANA SITTINIERI LEON Juíza de Direito Substituta
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