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Processo nº 1001104-56.2025.8.11.0000

ID: 260825066

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1001104-56.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MARCOS AURELIO SINOPOLI

Acórdão

Advogados:

FRANCYS RICARDO MENEGON

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001104-56.2025.8.11.0000 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Cédula de Crédito Bancário, Busca… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001104-56.2025.8.11.0000 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Cédula de Crédito Bancário, Busca e Apreensão] Relator: Des(a). MARCIO VIDAL Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [FRANCYS RICARDO MENEGON - CPF: 805.618.290-04 (ADVOGADO), MARCOS AURELIO SINOPOLI - CPF: 792.390.481-20 (EMBARGADO), BANCO BRADESCO S.A. - CNPJ: 60.746.948/0001-12 (EMBARGANTE), FREDERICO DUNICE PEREIRA BRITO - CPF: 859.879.481-34 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, ACOLHEU PARCIALMENTE OS EMBARGOS. EMENTA DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CONSTITUIÇÃO EM MORA. ERRO MATERIAL. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO INEXISTENTES. PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS, SEM EFEITOS INFRINGENTES. I. Caso em exame 1. Embargos de Declaração opostos por Banco Bradesco S/A contra acórdão que deu provimento ao Agravo de Instrumento interposto por Marco Aurélio Sinopoli, reconhecendo a invalidade da constituição em mora e extinguindo a ação de busca e apreensão de bem objeto de alienação fiduciária. O embargante sustenta erro material, omissão, contradição e requer prequestionamento de dispositivos legais. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (I) saber se houve erro material no acórdão ao indicar incorretamente o autor da ação como sendo Banco Volkswagen S/A; (II) saber se houve omissão quanto à apreciação da tentativa de notificação extrajudicial ao endereço contratual antes do protesto; (III) saber se há contradição lógica no reconhecimento da insuficiência da constituição de mora; (IV) saber se mostra cabível o prequestionamento dos dispositivos legais indicados nos autos. III. Razões de decidir 3. Constatado erro material quanto à identificação da parte autora da ação originária, que deve ser corrigido de ofício, nos termos do art. 494, §1º, c/c art. 1.022, III, do CPC. 4. Não se verificam omissões no julgado, pois o voto condutor apreciou expressamente a ineficácia da notificação extrajudicial realizada após o ajuizamento da ação e a ausência de esgotamento dos meios de localização do devedor, conforme exigido pelo Tema 1.132 do STJ. 5. Inexistente contradição interna no acórdão, que apresentou fundamentação clara, coerente e compatível com os elementos probatórios e jurisprudência consolidada. 6. Para fins de acesso às instâncias superiores, acolhe-se parcialmente o recurso apenas para fins de prequestionamento, nos termos dos arts. 1.025 e 1.022, p.u., I, do CPC. IV. Dispositivo e tese 7. Embargos de Declaração parcialmente acolhidos, sem efeitos modificativos, apenas para correção de erro material e prequestionamento. Tese de julgamento: “1. É admissível a correção de erro material em acórdão mediante embargos de declaração, nos termos do art. 1.022, III, do CPC. 2. A oposição de embargos de declaração não é meio hábil para rediscutir matéria já decidida, salvo para sanar omissão, obscuridade, contradição ou erro material. 3. O protesto por edital não supre a ausência de esgotamento dos meios de localização do devedor para fins de constituição válida da mora em contrato de alienação fiduciária, nos termos do Tema 1.132 do STJ.” Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 1.022, I a III, p.u., I; 1.025; 494, §1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.951.662/RS (Tema 1.132); STJ, EDcl no AgInt no AREsp 2.650.290/SP, Rel. Min. Teodoro Silva Santos, 2ª Turma, j. 19.03.2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR) Egrégia Câmara, O aresto da 5ª Câmara de Direito Privado, à unanimidade, deu provimento ao Recurso de Agravo de Instrumento interposto por Marco Aurélio Sinopoli, em face do Banco Bradesco S/A, para reformar a decisão que havia deferido a busca e apreensão do veículo objeto de alienação fiduciária. O julgamento reconheceu a invalidade da constituição em mora, o que acarretou a extinção da ação originária e a consequente restituição do bem apreendido. A ementa restou assim grafada: EMENTA DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CONSTITUIÇÃO EM MORA. PROTESTO INSUFICIENTE. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA APÓS AJUIZAMENTO DA AÇÃO, INVALIDADE. EFEITO TRANSLATIVO. EXTINÇÃO DA AÇÃO. RESTITUIÇÃO DO BEM APREENDIDO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto por Marco Aurélio Sinopoli contra decisão do Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Diamantino, que deferiu liminarmente a busca e apreensão de maquinário agrícola objeto de garantia fiduciária, sem a devida comprovação da constituição em mora nos termos legais. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar a validade da constituição em mora do devedor fiduciante, considerando-se a ausência de comprovação do envio da notificação extrajudicial ao endereço indicado no contrato, por meio de carta registrada (AR) e a consequente notificação apenas com o protesto por edital, sem esgotar todos os meios de localização do devedor. III. Razões de decidir 3. O art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 911/69 exige que a constituição em mora do devedor fiduciante seja feita mediante envio de notificação extrajudicial ao endereço constante do contrato, dispensando-se a prova do recebimento, conforme fixado pelo STJ no Tema 1.132. 4. O credor fiduciário, ora Agravado, limitou-se a comprovar o protesto do título no ajuizamento da ação, sem demonstrar a adoção de medidas para esgotamento da localização do devedor antes da notificação ficta. Além disso, enviou notificação extrajudicial pelo cartório no curso da ação, o que se mostra invalido para constituição em mora do devedor. 5. A ausência da constituição válida da mora retira o pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo, ensejando a extinção da ação de busca e apreensão, nos termos do art. 485, IV, do CPC. IV. Dispositivo e tese 6. Dá-se provimento ao Agravo de Instrumento para atribuir efeito translativo ao recurso, cassar a decisão agravada e extinguir a ação de busca e apreensão sem resolução do mérito. 7. Determina-se a restituição do maquinário agrícola à parte agravante ou, se já alienado, a conversão em perdas e danos, nos termos do art. 3º, § 7º, do Decreto-Lei nº 911/69. 8. Condenação da parte sucumbente ao pagamento de honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor atualizado da causa, conforme os §§ 1º, 2º e 11 do art. 85 do CPC. Tese de julgamento: "A constituição em mora do devedor fiduciante exige o envio de notificação extrajudicial ao endereço constante do contrato, sendo inválido o protesto do título quando não esgotados os meios de localização do devedor." Dispositivos relevantes citados: Decreto-Lei nº 911/69, arts. 2º, § 2º, e 3º, § 7º; CPC, arts. 485, IV, e 85, §§ 1º, 2º e 11. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.951.662/RS (Tema 1.132); STJ, Súmula 72; TJ-MT, N.U 1026952-16.2023.8.11.0000, Rel. Des. Antônia Siqueira Gonçalves, j. 24/01/2024; TJ-MT, N.U 1005652-61.2024.8.11.0000, Rel. Des. José Zuquim Nogueira, j. 14/05/2024. Irresignado, o Banco Bradesco S/A opôs Embargos de Declaração alegando erro material no acórdão embargado ao atribuiu erroneamente o ajuizamento da ação ao Banco Volkswagen S/A, quando o autor é o Banco Bradesco S/A. Argui supostas omissões no julgado com relação à apreciação de que houve efetivo envio de notificação extrajudicial ao endereço constante no contrato antes da citação, com o retorno indicando que o devedor não residia mais no local, motivo pelo qual teria sido legitimado o protesto por edital. Sustenta, ainda, contradição no acórdão ao reconhecer a insuficiência do protesto e da notificação extemporânea, sem considerar a validade do conjunto probatório que comprovaria a mora nos autos, notadamente a mudança de endereço do devedor e a manifestação de reconhecimento do inadimplemento contratual. Aponta a supressão de instância, pois a extinção do processo originário foi determinada sem decisão de mérito em primeira instância. Prequestiona, ainda, os arts. 1º, §1º e §2º do Decreto-Lei 911/69, 389 e 395 do Código Civil, e dos arts. 489, §1º, IV e 1.022, II e III, do Código de Processo Civil. Ao final, pugna pelo provimento dos embargos declaratórios, para lhe atribuir efeitos infringentes no sentido de sanar os defeitos apontados, bem como prequestionar os dispositivos legais indicados (id. 273633876). O Embargado deixou transcorrer in albis o prazo para contrarrazoar o recurso (id. 276192362). É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR) Egrégia Câmara, Conforme relatório acima Banco Bradesco S/A opôs Embargos de Declaração, contra o acórdão que, à unanimidade, proveu recurso contra si interpostos, reformando a decisão agravada. Nos termos do artigo 1.022 e incisos, do Código de Processo Civil, a interposição dos embargos de declaração somente se justifica quando a decisão recorrida estiver maculada por obscuridade, omissão, contradição ou contiver erro material. Observa do fato processual que se não há nenhuma violação a regra matriz do Código de Processo Civil retromencionada, incabível a interposição de embargos de declaração. Cumpre consignar que a doutrina e a jurisprudência admitem, em situações excepcionalíssimas, a modificação dos julgados, mediante a simples oposição dos declaratórios, conferindo-lhes efeitos modificativos ou infringentes. Contudo, essa admissibilidade é restrita aos casos de correção de patente erro material ou quando, suprida uma omissão, ou extirpada uma contradição, a modificação for consequência lógica e inevitável do saneamento dos referidos vícios. No caso em análise, o Embargante, Banco Bradesco S/A, alega erro material no acórdão ao ser equivocadamente indicado o Banco Volkswagen S/A como autor da ação. Sustenta omissão quanto à análise da notificação extrajudicial enviada ao endereço contratual, cujo retorno indicou a mudança do devedor, legitimando o protesto por edital. Aponta contradição na desconsideração do conjunto probatório que demonstraria a mora. Alega, ainda, supressão de instância, porque a extinção do processo originário se deu sem julgamento do mérito em primeira instância, e prequestiona dispositivos do Decreto-Lei nº 911/69, do Código Civil e do Código de Processo Civil. Assiste, em parte, razão ao Embargante. 1. DO ERRO MATERIAL De fato, no relatório da decisão embargada, consta equivocadamente o Banco Volkswagen S/A como parte autora da ação de origem (processo nº 1003065-51.2024.8.11.0005). A autora correta é BANCO BRADESCO S.A.. A retificação do nome da parte autora configura erro material evidente, que deve ser corrigido de ofício, nos termos do §1º do art. 494 c/c art. 1.022, III, do CPC, sem prejuízo do mérito do julgamento. 2. DA ALEGADA OMISSÃO QUANTO À CONSTITUIÇÃO DA MORA Argumenta o embargante que o devedor fiduciante, embargado, foi protestado e a notificação extrajudicial realizada por meio de cartório no endereço contratual, sendo essa devolvida com informação de “desconhecido no local”, o que autorizaria a notificação ficta por edital. Ocorre que tais alegações foram apreciadas no voto condutor do acórdão embargado, o qual reconheceu expressamente que a notificação extrajudicial foi realizada, por meio do cartório, após o ajuizamento da ação, sendo ineficaz para fins de constituição de mora. Ademais, consignou-se que não houve demonstração do esgotamento dos meios para localização do devedor, exigência estabelecida no julgamento do Tema 1.132/STJ, antes do protesto em cartório. A propósito, cita-se o trecho do voto: “[...] Consta que o credor fiduciário, ora Agravado, juntou à petição inicial da ação de busca e apreensão apenas o protesto do título, como meio de comprovar a constituição em mora, o que inclusive foi consignado na decisão agravada. Com a contraminuta, o Agravado apresentou notificação extrajudicial do devedor acerca da inadimplência contratual, por meio de cartório de títulos e documentos, com data posterior à data da propositura da ação, ou seja, em 07/01/2025, enquanto a ação foi proposta em 05/11/2024 (id. 266934776). [...] No caso em questão, observa-se que o devedor não se constitui em mora, primeiro, porque a ação foi instruída apenas com o edital de protesto, sem que tivessem sido esgotados os meios de sua localização; e segundo, porque o credor fiduciário apresentou, no curso da ação, notificação extrajudicial expedida pelo cartório, ou seja, notificação extrajudicial posterior ao ajuizamento da ação. Desse modo, revela-se invalida a constituição em mora do devedor, ante a ausência de encaminhamento da notificação extrajudicial do devedor no endereço declinado no contrato, em consonância com o Tema 1.132 do Superior Tribunal de Justiça. [...] Não há, portanto, omissão a ser sanada. O que se verifica é a tentativa de rediscussão da matéria já decidida, o que não se coaduna com a via dos embargos de declaração, conforme orientação pacífica da jurisprudência: PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INEXISTÊNCIA DOS VÍCIOS DO ART. 1.022 DO CPC. REDISCUSSÃO DE MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE. MERO INCONFORMISMO. EMBARGOS REJEITADOS. 1. Nos termos do art. 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração têm por finalidade sanar obscuridade, contradição, omissão ou erro material no julgado, não se prestando à rediscussão do mérito da decisão recorrida.[...] (STJ, EDcl no AgInt no AREsp n. 2.650.290/SP, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, julgado em 19/3/2025, DJEN de 24/3/2025.) 3. DA ALEGADA CONTRADIÇÃO A contradição que autoriza embargos é entre proposições logicamente inconciliáveis na mesma decisão, o que não se verifica no caso. O voto condutor foi linear e coerente, analisando as provas documentais e a jurisprudência aplicável ao caso, destacando que a notificação enviada no curso da ação não satisfaz o requisito legal (DL 911/69, art. 2º, §2º), tampouco o protesto desacompanhado de comprovação de esgotamento dos meios para localização do devedor. Logo, não há contradição, mas inconformismo do Embargante com a conclusão adotada no acórdão recorrido, na medida que a questão (constituição em mora do devedor), inclusive os dispositivos prequestionados, matéria objeto de discussão, foi devidamente analisada e decidida. O que se nota é o inconformismo da parte com a decisão que lhe foi desfavorável, pretendendo, com a interposição dos embargos de declaração, estabelecer nova discussão a respeito da lide, a que não cabe acolhimento. Nesse caso, se a parte está insatisfeita com o resultado do julgamento, cabe-lhe interpor recurso às demais instâncias, dado que não servem os embargos de declaração como sucedâneo recursal. 4. DO PREQUESTIONAMENTO Requer o embargante o prequestionamento expresso dos dispositivos legais mencionados na peça, especialmente para fins de interposição de recurso especial. Vale ressaltar que o Código de Processo Civil, conforme previsto no art. 1.025, considera inclusos no acórdão os elementos que o Embargante suscitou, para fins de prequestionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados. Neste ponto, acolhem-se parcialmente os embargos, sem efeitos infringentes, apenas para fins de prequestionamento, com fundamento nos artigos 1.025 e 1.022, parágrafo único, I, do CPC, tendo em vista que as matérias foram objeto de fundamentação, ainda que de forma contrária à tese do Embargante. Forte nessas razões, ACOLHO, EM PARTE, os Embargos de Declaração, interposto pelo Banco Bradesco S/A, apenas para corrigir o erro material constante na ementa e no relatório do acórdão, onde consta indevidamente “Banco Volkswagen S/A” em vez de “Banco Bradesco S.A.” e, para fins de prequestionamento, nos moldes do art. 1.025 do CPC, mantendo-se inalterado o mérito da decisão que reconheceu a invalidade de constituição válida de mora. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/04/2025

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Processo nº 1028059-61.2024.8.11.0000

ID: 259239039

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1028059-61.2024.8.11.0000

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

BANCO VOLKSWAGEN S.A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOAO VICENTE BERRIEL NETTO

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RAFAEL BARROSO FONTELLES

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LUISA HIPPOLITO MOREIRA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028059-61.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Classificação de créditos] Relator: Des… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028059-61.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Classificação de créditos] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [LUISA HIPPOLITO MOREIRA - CPF: 146.318.197-31 (ADVOGADO), BANCO VOLKSWAGEN S.A. - CNPJ: 59.109.165/0001-49 (AGRAVANTE), RAFAEL BARROSO FONTELLES - CPF: 081.559.787-88 (ADVOGADO), JOAO VICENTE BERRIEL NETTO - CPF: 117.609.937-00 (ADVOGADO), VALDINEIA MARQUEZAN - CNPJ: 24.548.211/0001-21 (AGRAVADO), MARQUEZAN CONSTRUTORA LTDA - CNPJ: 40.312.636/0001-93 (AGRAVADO), ANTONIO FRANGE JUNIOR - CPF: 459.447.501-97 (ADVOGADO), YELAILA ARAUJO E MARCONDES - CPF: 024.664.281-56 (ADVOGADO), RAPHAELA PIZELLI DA SILVA - CPF: 431.077.748-12 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A Ementa: Direito empresarial e processual civil. Agravo de instrumento. Recuperação judicial. Essencialidade dos bens. Alienação fiduciária. Permanência na posse do devedor durante o stay period. Prevalência da função social da empresa. Ausência de comprovação de fraude. Recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão que deferiu tutela de urgência em sede de recuperação judicial para suspender a execução de bens alienados fiduciariamente e determinar a permanência dos devedores na posse dos bens. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se os bens alienados fiduciariamente podem ser considerados essenciais à atividade empresária e, portanto, se devem permanecer na posse da empresa recuperanda durante o stay period. III. Razões de decidir 3. Nos termos do art. 49, §3º, da Lei n. 11.101/2005, bens alienados fiduciariamente não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, salvo se demonstrada sua essencialidade para a continuidade das atividades da empresa devedora. 4. O laudo da administração judicial atestou a essencialidade dos bens ao funcionamento da empresa, demonstrando que sua retirada inviabilizaria a geração de receita e o cumprimento do plano de recuperação judicial. 5. A aquisição dos bens financiados em período prévio ao pedido de recuperação judicial não caracteriza, por si só, fraude ou abuso do direito. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso desprovido. Tese de julgamento: " A permanência dos bens alienados fiduciariamente na posse da empresa recuperanda durante o stay period é admissível quando demonstrada a sua essencialidade para a continuidade das atividades empresariais, sendo incabível a sua retirada pelo credor fiduciário enquanto subsistir essa condição. " _________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 170; Lei n. 11.101/2005, arts. 6º, §4º, e 49, §3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.954.239/MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 25/04/2022; TJMT, N.U 1024835-52.2023.8.11.0000, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 31/01/2024. R E L A T Ó R I O Cuida-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto pelo BANCO VOLKSWAGEN S.A. contra as r. decisões proferidas pela MMª. Juíza de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, que nos autos da Recuperação Judicial nº 1016337-21.2024.8.11.0003, ajuizada por VALDINEIA MARQUEZAN e MARQUEZAN CONSTRUTORA LTDA em face de seus credores, por entender que, “enquanto está transcorrendo o lapso temporal necessário para o desenvolvimento dos trabalhos periciais, é incontestável que os credores da parte requerente poderão se adiantar no ajuizamento de ações executivas individuais, com vistas a receberem seus créditos de forma antecipada, e, em tal contexto, a parte requerente corre o risco de ter o seu patrimônio esvaziado com o pagamento de alguns credores, em detrimento de toda a coletividade de credores que ainda deve receber seus créditos e em prejuízo total à qualquer possibilidade de continuidade da atividade empresarial e superação da crise”, deferiu o pedido de tutela de urgência formulado pelas devedoras/agravadas a fim de antecipar “os efeitos da blindagem, ordenando a suspensão do curso da prescrição e de todas as ações ou execuções contra a parte requerente (em especial as ações 1000780-49.2024.8.11.0017; 1000779-64.2024.8.11.0017; 1001536- 92.2023.8.11.0017; 1000770-05.2024.8.11.0017 em trâmite na 2ª Vara de São Felix do Araguaia – MT; a ação 1029399-68.2023.8.11.0002 em trâmite no Juizado Especial do Cristo Rei de Várzea Grande – MT; e a ação 1022975-07.2023.8.11.0003 em trâmite na 1 ª Vara Cível de Rondonópolis – MT); - até que seja deliberado acerca do processamento da recuperação judicial ou seja proferida outra decisão sobre o ponto”, e, ainda, ordenou a “manutenção provisória do grupo requerente na posse dos bens listados no ANEXO 01 da petição inicial”, sob o fundamento de que “os bens descritos pelas recuperandas (...) geram aparente presunção de que sejam, de fato, essenciais ao regular exercício das atividades da requerente – haja vista a natureza das operações desenvolvidas pela mesma”, e a “suspensão dos apontamentos do nome da parte requerente nos cartórios de protesto e órgão de restrição do crédito (SPC, Serasa, etc)” (cf. Id. nº 161959243), e, mais à frente, com os resultados da constatação prévia em mãos, deferiu o pedido de processamento da recuperação judicial formulado pelas ora agravadas (cf. Id. nº 165155655 e 168801549 dos autos de origem). O Banco/agravante afirma que “a decisão agravada partiu de premissa equivocada ao entender pela essencialidade de todos os bens que compõem a frota das RECUPERANDAS, posto que os bens de propriedade desse CREDOR são advindos de contratos garantidos por alienação fiduciária”, que “além de garantir a prevalência dos direitos de propriedade sobre a coisa do proprietário fiduciário, também discorre sobre a blindagem patrimonial dos bens de capital essencial à atividade empresarial, no período de 180 dias previsto no art. 6º, §4º da LRF, entretanto, para um bem ser considerado essencial deverá haver uma mínima comprovação da sua essencialidade” o que não se observa no presente caso, visto que “em nenhum momento a agravada se preocupa em demonstrar como cada veículo é útil para o exercício da atividade empresária (...) deveria ter demonstrado como usualmente suas atividades se dão (médias de viagens e de entregas, trechos, quantidade de mercadora transportada, tamanho total da frota, com que frequência toda frota é utilizada, qual a utilização de cada bem, relevância de tais bens em relação aos demais da frota, custo de terceirizar ou utilizar veículos alugados e interferência nos seus gastos mensais), pormenorizando de que modo tais bens precisam ser mantidos em seu domínio, ainda mais por se dizer respeito a veículos de passeio”. Aduz que a empresa agravada utilizou a recuperação judicial de forma fraudulenta, com o objetivo de suspender ações de credores extraconcursais, já que grande parte de suas dívidas são com instituições financeiras e possuem garantia fiduciária. Alega que a empresa agravada adquiriu veículos financiados com alienação fiduciária às vésperas do pedido de recuperação judicial, sem pagar nenhuma parcela, demonstrando má-fé e tentativa de calote programado. Pede, pois, o provimento do recurso, para reformar a decisão agravada para “requer o afastamento da declaração de essencialidade do bem do Banco Volkswagen, em razão da ausência de comprovação de essencialidade dos bens de sua propriedade”, ou alternativamente que “seja determinada a intimação da AGRAVADA para que descreva e comprove a essencialidade dos bens, sua relevância para manutenção da atividade empresária e alternativas para realização de suas atividades sem os veículos” se por eventualidade, ainda for mantida “que seja determinada expressamente, a posse da agravada sobre os bens apenas pelo exclusivo período de 180 dias, prorrogável por apenas mais 180 dias” de imediato, pede a concessão de efeito suspensivo ao recurso (cf. Id. nº 243534183). O pedido do agravante para suspender os efeitos da decisão foi negado (ID nº 244527159). Os agravados apresentaram suas respostas ao recurso, refutando os argumentos do agravante e pedindo que o recurso seja negado (ID nº 249264655). O parecer da Procuradoria Geral de Justiça é pelo desprovimento do agravo (Id. 257056152). É o relatório. Cuiabá, data registrada no sistema. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R O agravante alega, em síntese, que houve abuso de direito e fraude na utilização do instituto da recuperação judicial, uma vez que a maior parte dos créditos listados são extraconcursais, garantidos por alienação fiduciária. Sustenta que a declaração de essencialidade dos bens foi genérica e que os veículos foram adquiridos às vésperas do pedido de recuperação, caracterizando mero incremento da atividade econômica. Em contrarrazões, os agravados defenderam a manutenção da decisão agravada, argumentando que a essencialidade dos bens foi devidamente comprovada e que a recuperação judicial é um direito constitucionalmente garantido. A decisão recorrida declarou a essencialidade dos bens alienados fiduciariamente ao Banco Volkswagen com base em manifestação da administração judicial, registrada no parecer de ID. 249264661, que foi categórico ao afirmar que os referidos bens são indispensáveis para a preservação da atividade econômica da recuperanda. O parecer técnico ressaltou que: “[...] Os caminhões, as carretas e a retroescavadeira são fundamentais para as operações do Grupo Recuperando, pois são ativos indispensáveis para a execução de serviços de entrega de grande porte, como o transporte de materiais para obras da construtora. Eles são utilizados para buscar areia, brita e cascalho em diversas regiões, cidades e fazendas, além de repor mercadorias na loja. A retroescavadeira, especificamente, é utilizada para carregar areia, brita e cascalho, abrir fossas, realizar terraplenagem e realizar enchimentos em áreas de aterro nas obras. Com relação à retroescavadeira, não há outro bem similar que possa substituí-la. A ausência desses bens compromete diretamente a capacidade operacional e, consequentemente, a geração de receita necessária para alcançar a recuperação pretendida. Além disso, mesmo que quase todos os bens cuja declaração de essencialidade é requerida tenham sido adquiridos com garantia por alienação fiduciária, conforme apresentado nos documentos anexados à petição inicial, as garantias contratuais fornecidas são de suma importância para as operações da empresa em recuperação. É impossível dissociar a importância fundamental dos ativos em questão da recuperação judicial da empresa e de suas operações, pois esses ativos são responsáveis por gerar o fluxo de caixa necessário ao soerguimento da empresa em recuperação judicial”. A essencialidade dos bens deve ser aferida caso a caso, não podendo ser presumida, mas também não podendo ser descartada sem uma análise aprofundada da atividade desempenhada pela empresa e de sua dependência dos bens para continuar operando. Na hipótese dos autos, há um contexto fático amplamente favorável à manutenção dos bens na posse da recuperanda, sendo, inclusive, este o entendimento do administrador judicial. O agravante sustenta que os bens alienados fiduciariamente não estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial, conforme o artigo 49, §3º, da Lei 11.101/2005, o qual estabelece que: “Os credores titulares da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel, ou de proprietário em contrato de compra e venda com reserva de domínio, não se submetem aos efeitos da recuperação judicial.” De fato, a regra geral da LRF prevê que bens alienados fiduciariamente não integram o patrimônio da empresa recuperanda e, por consequência, não estão sujeitos à recuperação judicial. Todavia, o próprio dispositivo legal contém uma exceção expressa, ao dispor que bens de capital essenciais à atividade empresarial do devedor não podem ser retirados do estabelecimento durante o período de stay period (180 dias), conforme o artigo 6º, §4º, da LRF. Assim, a retirada dos bens pelo credor fiduciário pode ser obstada temporariamente, desde que seja demonstrada sua essencialidade para a manutenção da atividade produtiva. No presente caso, essa essencialidade foi reconhecida pela administração judicial, o que confere respaldo à decisão agravada. Nesse sentido, a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça: DE PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DEFERIDO – PRODUTOR RURAL – PRESCINDIBILIDADE DO REGISTRO MERCANTIL HÁ MAIS DE DOIS ANOS – COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL – PRECEDENTES DO STJ – FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO ATIVO - CONSOLIDAÇÃO SUBSTANCIAL VERIFICADA – ESSENCIALIDADE DE BENS CORRELACIONADOS À ATIVIDADE EMPRESARIAL DO GRUPO ECONÔMICO – DECISÃO MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO I - Em razão do entendimento firmado no âmbito da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, para efeitos do processamento da recuperação judicial, é prescindível o registro da condição de empresário na Junta Comercial, sendo bastante a prova de que os requerentes se dedicavam à atividade rural pelo lapso temporal exigido. II - Consoante se extrai dos autos de origem e do relatório da inspeção prévia, há prova suficiente para se estabelecer a consolidação substancial, em razão da atividade concentrada dos agravados, em torno de um mesmo objetivo econômico. III – Embora a decisão agravada não tenha pormenorizado a importância de cada um para o soerguimento da atividade recuperanda, note-se da relação de bens apresentada com o pedido inicial, tanto pelas empresas de transportes, quanto pelos produtores rurais, que se trata de equipamentos agrícolas e caminhões, os quais, a princípio, possuem relação direta com a atividade econômica desenvolvida. (N.U 1024835-52.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, NÃO INFORMADO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 31/01/2024, Publicado no DJE 03/02/2024) RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL – MAQUINÁRIOS AGRÍCOLAS – APREENSÃO NO PERÍODO DE BLINDAGEM DETERMINADA POR JUÍZO DIVERSO O JUIZO UNIVERSAL – DETERMINAÇÃO DE DEVOLUÇÃO – POSSIBILIDADE – RECURSO DESPROVIDO. Apreensão dos mesmos foi realizada no período de blindagem. Juízo competente para controle dos atos de constrição patrimonial e declaração essencialidade no stay period é do juízo universal. “4. Ainda que se trate de créditos garantidos por alienação fiduciária, compete ao juízo da recuperação judicial decidir acerca da essencialidade de determinado bem para fins de aplicação da ressalva prevista no art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005, na parte que não admite a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais ao desenvolvimento da atividade empresarial. (...) 6. Agravo interno não provido (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.954.239/MT, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 25/4/2022, DJe de 27/4/2022.)” (N.U 1013168-69.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 12/03/2024, Publicado no DJE 13/03/2024) Ademais, as alegações do agravante sobre a aquisição dos veículos às vésperas do pedido de recuperação não procedem. Conforme evidenciado pelas Cédulas de Crédito Bancário, trata-se de consolidação de termos de renegociação de dívida, e não de aquisição originária. Por fim, a recuperação judicial é um direito constitucionalmente garantido, e seu exercício não configura, por si só, conduta dolosa. Caso sejam evidenciadas irregularidades, caberá a adoção das medidas cabíveis para assegurar a higidez do processo. Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, nego provimento ao recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1028059-61.2024.8.11.0000

ID: 259239044

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1028059-61.2024.8.11.0000

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MARQUEZAN CONSTRUTORA LTDA VALDINEIA MARQUEZAN

Acórdão

Advogados:

RAPHAELA PIZELLI DA SILVA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ANTONIO FRANGE JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

YELAILA ARAUJO E MARCONDES

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028059-61.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Classificação de créditos] Relator: Des… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028059-61.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Classificação de créditos] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [LUISA HIPPOLITO MOREIRA - CPF: 146.318.197-31 (ADVOGADO), BANCO VOLKSWAGEN S.A. - CNPJ: 59.109.165/0001-49 (AGRAVANTE), RAFAEL BARROSO FONTELLES - CPF: 081.559.787-88 (ADVOGADO), JOAO VICENTE BERRIEL NETTO - CPF: 117.609.937-00 (ADVOGADO), VALDINEIA MARQUEZAN - CNPJ: 24.548.211/0001-21 (AGRAVADO), MARQUEZAN CONSTRUTORA LTDA - CNPJ: 40.312.636/0001-93 (AGRAVADO), ANTONIO FRANGE JUNIOR - CPF: 459.447.501-97 (ADVOGADO), YELAILA ARAUJO E MARCONDES - CPF: 024.664.281-56 (ADVOGADO), RAPHAELA PIZELLI DA SILVA - CPF: 431.077.748-12 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A Ementa: Direito empresarial e processual civil. Agravo de instrumento. Recuperação judicial. Essencialidade dos bens. Alienação fiduciária. Permanência na posse do devedor durante o stay period. Prevalência da função social da empresa. Ausência de comprovação de fraude. Recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão que deferiu tutela de urgência em sede de recuperação judicial para suspender a execução de bens alienados fiduciariamente e determinar a permanência dos devedores na posse dos bens. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se os bens alienados fiduciariamente podem ser considerados essenciais à atividade empresária e, portanto, se devem permanecer na posse da empresa recuperanda durante o stay period. III. Razões de decidir 3. Nos termos do art. 49, §3º, da Lei n. 11.101/2005, bens alienados fiduciariamente não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, salvo se demonstrada sua essencialidade para a continuidade das atividades da empresa devedora. 4. O laudo da administração judicial atestou a essencialidade dos bens ao funcionamento da empresa, demonstrando que sua retirada inviabilizaria a geração de receita e o cumprimento do plano de recuperação judicial. 5. A aquisição dos bens financiados em período prévio ao pedido de recuperação judicial não caracteriza, por si só, fraude ou abuso do direito. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso desprovido. Tese de julgamento: " A permanência dos bens alienados fiduciariamente na posse da empresa recuperanda durante o stay period é admissível quando demonstrada a sua essencialidade para a continuidade das atividades empresariais, sendo incabível a sua retirada pelo credor fiduciário enquanto subsistir essa condição. " _________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 170; Lei n. 11.101/2005, arts. 6º, §4º, e 49, §3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.954.239/MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 25/04/2022; TJMT, N.U 1024835-52.2023.8.11.0000, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 31/01/2024. R E L A T Ó R I O Cuida-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto pelo BANCO VOLKSWAGEN S.A. contra as r. decisões proferidas pela MMª. Juíza de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, que nos autos da Recuperação Judicial nº 1016337-21.2024.8.11.0003, ajuizada por VALDINEIA MARQUEZAN e MARQUEZAN CONSTRUTORA LTDA em face de seus credores, por entender que, “enquanto está transcorrendo o lapso temporal necessário para o desenvolvimento dos trabalhos periciais, é incontestável que os credores da parte requerente poderão se adiantar no ajuizamento de ações executivas individuais, com vistas a receberem seus créditos de forma antecipada, e, em tal contexto, a parte requerente corre o risco de ter o seu patrimônio esvaziado com o pagamento de alguns credores, em detrimento de toda a coletividade de credores que ainda deve receber seus créditos e em prejuízo total à qualquer possibilidade de continuidade da atividade empresarial e superação da crise”, deferiu o pedido de tutela de urgência formulado pelas devedoras/agravadas a fim de antecipar “os efeitos da blindagem, ordenando a suspensão do curso da prescrição e de todas as ações ou execuções contra a parte requerente (em especial as ações 1000780-49.2024.8.11.0017; 1000779-64.2024.8.11.0017; 1001536- 92.2023.8.11.0017; 1000770-05.2024.8.11.0017 em trâmite na 2ª Vara de São Felix do Araguaia – MT; a ação 1029399-68.2023.8.11.0002 em trâmite no Juizado Especial do Cristo Rei de Várzea Grande – MT; e a ação 1022975-07.2023.8.11.0003 em trâmite na 1 ª Vara Cível de Rondonópolis – MT); - até que seja deliberado acerca do processamento da recuperação judicial ou seja proferida outra decisão sobre o ponto”, e, ainda, ordenou a “manutenção provisória do grupo requerente na posse dos bens listados no ANEXO 01 da petição inicial”, sob o fundamento de que “os bens descritos pelas recuperandas (...) geram aparente presunção de que sejam, de fato, essenciais ao regular exercício das atividades da requerente – haja vista a natureza das operações desenvolvidas pela mesma”, e a “suspensão dos apontamentos do nome da parte requerente nos cartórios de protesto e órgão de restrição do crédito (SPC, Serasa, etc)” (cf. Id. nº 161959243), e, mais à frente, com os resultados da constatação prévia em mãos, deferiu o pedido de processamento da recuperação judicial formulado pelas ora agravadas (cf. Id. nº 165155655 e 168801549 dos autos de origem). O Banco/agravante afirma que “a decisão agravada partiu de premissa equivocada ao entender pela essencialidade de todos os bens que compõem a frota das RECUPERANDAS, posto que os bens de propriedade desse CREDOR são advindos de contratos garantidos por alienação fiduciária”, que “além de garantir a prevalência dos direitos de propriedade sobre a coisa do proprietário fiduciário, também discorre sobre a blindagem patrimonial dos bens de capital essencial à atividade empresarial, no período de 180 dias previsto no art. 6º, §4º da LRF, entretanto, para um bem ser considerado essencial deverá haver uma mínima comprovação da sua essencialidade” o que não se observa no presente caso, visto que “em nenhum momento a agravada se preocupa em demonstrar como cada veículo é útil para o exercício da atividade empresária (...) deveria ter demonstrado como usualmente suas atividades se dão (médias de viagens e de entregas, trechos, quantidade de mercadora transportada, tamanho total da frota, com que frequência toda frota é utilizada, qual a utilização de cada bem, relevância de tais bens em relação aos demais da frota, custo de terceirizar ou utilizar veículos alugados e interferência nos seus gastos mensais), pormenorizando de que modo tais bens precisam ser mantidos em seu domínio, ainda mais por se dizer respeito a veículos de passeio”. Aduz que a empresa agravada utilizou a recuperação judicial de forma fraudulenta, com o objetivo de suspender ações de credores extraconcursais, já que grande parte de suas dívidas são com instituições financeiras e possuem garantia fiduciária. Alega que a empresa agravada adquiriu veículos financiados com alienação fiduciária às vésperas do pedido de recuperação judicial, sem pagar nenhuma parcela, demonstrando má-fé e tentativa de calote programado. Pede, pois, o provimento do recurso, para reformar a decisão agravada para “requer o afastamento da declaração de essencialidade do bem do Banco Volkswagen, em razão da ausência de comprovação de essencialidade dos bens de sua propriedade”, ou alternativamente que “seja determinada a intimação da AGRAVADA para que descreva e comprove a essencialidade dos bens, sua relevância para manutenção da atividade empresária e alternativas para realização de suas atividades sem os veículos” se por eventualidade, ainda for mantida “que seja determinada expressamente, a posse da agravada sobre os bens apenas pelo exclusivo período de 180 dias, prorrogável por apenas mais 180 dias” de imediato, pede a concessão de efeito suspensivo ao recurso (cf. Id. nº 243534183). O pedido do agravante para suspender os efeitos da decisão foi negado (ID nº 244527159). Os agravados apresentaram suas respostas ao recurso, refutando os argumentos do agravante e pedindo que o recurso seja negado (ID nº 249264655). O parecer da Procuradoria Geral de Justiça é pelo desprovimento do agravo (Id. 257056152). É o relatório. Cuiabá, data registrada no sistema. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R O agravante alega, em síntese, que houve abuso de direito e fraude na utilização do instituto da recuperação judicial, uma vez que a maior parte dos créditos listados são extraconcursais, garantidos por alienação fiduciária. Sustenta que a declaração de essencialidade dos bens foi genérica e que os veículos foram adquiridos às vésperas do pedido de recuperação, caracterizando mero incremento da atividade econômica. Em contrarrazões, os agravados defenderam a manutenção da decisão agravada, argumentando que a essencialidade dos bens foi devidamente comprovada e que a recuperação judicial é um direito constitucionalmente garantido. A decisão recorrida declarou a essencialidade dos bens alienados fiduciariamente ao Banco Volkswagen com base em manifestação da administração judicial, registrada no parecer de ID. 249264661, que foi categórico ao afirmar que os referidos bens são indispensáveis para a preservação da atividade econômica da recuperanda. O parecer técnico ressaltou que: “[...] Os caminhões, as carretas e a retroescavadeira são fundamentais para as operações do Grupo Recuperando, pois são ativos indispensáveis para a execução de serviços de entrega de grande porte, como o transporte de materiais para obras da construtora. Eles são utilizados para buscar areia, brita e cascalho em diversas regiões, cidades e fazendas, além de repor mercadorias na loja. A retroescavadeira, especificamente, é utilizada para carregar areia, brita e cascalho, abrir fossas, realizar terraplenagem e realizar enchimentos em áreas de aterro nas obras. Com relação à retroescavadeira, não há outro bem similar que possa substituí-la. A ausência desses bens compromete diretamente a capacidade operacional e, consequentemente, a geração de receita necessária para alcançar a recuperação pretendida. Além disso, mesmo que quase todos os bens cuja declaração de essencialidade é requerida tenham sido adquiridos com garantia por alienação fiduciária, conforme apresentado nos documentos anexados à petição inicial, as garantias contratuais fornecidas são de suma importância para as operações da empresa em recuperação. É impossível dissociar a importância fundamental dos ativos em questão da recuperação judicial da empresa e de suas operações, pois esses ativos são responsáveis por gerar o fluxo de caixa necessário ao soerguimento da empresa em recuperação judicial”. A essencialidade dos bens deve ser aferida caso a caso, não podendo ser presumida, mas também não podendo ser descartada sem uma análise aprofundada da atividade desempenhada pela empresa e de sua dependência dos bens para continuar operando. Na hipótese dos autos, há um contexto fático amplamente favorável à manutenção dos bens na posse da recuperanda, sendo, inclusive, este o entendimento do administrador judicial. O agravante sustenta que os bens alienados fiduciariamente não estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial, conforme o artigo 49, §3º, da Lei 11.101/2005, o qual estabelece que: “Os credores titulares da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel, ou de proprietário em contrato de compra e venda com reserva de domínio, não se submetem aos efeitos da recuperação judicial.” De fato, a regra geral da LRF prevê que bens alienados fiduciariamente não integram o patrimônio da empresa recuperanda e, por consequência, não estão sujeitos à recuperação judicial. Todavia, o próprio dispositivo legal contém uma exceção expressa, ao dispor que bens de capital essenciais à atividade empresarial do devedor não podem ser retirados do estabelecimento durante o período de stay period (180 dias), conforme o artigo 6º, §4º, da LRF. Assim, a retirada dos bens pelo credor fiduciário pode ser obstada temporariamente, desde que seja demonstrada sua essencialidade para a manutenção da atividade produtiva. No presente caso, essa essencialidade foi reconhecida pela administração judicial, o que confere respaldo à decisão agravada. Nesse sentido, a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça: DE PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DEFERIDO – PRODUTOR RURAL – PRESCINDIBILIDADE DO REGISTRO MERCANTIL HÁ MAIS DE DOIS ANOS – COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL – PRECEDENTES DO STJ – FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO ATIVO - CONSOLIDAÇÃO SUBSTANCIAL VERIFICADA – ESSENCIALIDADE DE BENS CORRELACIONADOS À ATIVIDADE EMPRESARIAL DO GRUPO ECONÔMICO – DECISÃO MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO I - Em razão do entendimento firmado no âmbito da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, para efeitos do processamento da recuperação judicial, é prescindível o registro da condição de empresário na Junta Comercial, sendo bastante a prova de que os requerentes se dedicavam à atividade rural pelo lapso temporal exigido. II - Consoante se extrai dos autos de origem e do relatório da inspeção prévia, há prova suficiente para se estabelecer a consolidação substancial, em razão da atividade concentrada dos agravados, em torno de um mesmo objetivo econômico. III – Embora a decisão agravada não tenha pormenorizado a importância de cada um para o soerguimento da atividade recuperanda, note-se da relação de bens apresentada com o pedido inicial, tanto pelas empresas de transportes, quanto pelos produtores rurais, que se trata de equipamentos agrícolas e caminhões, os quais, a princípio, possuem relação direta com a atividade econômica desenvolvida. (N.U 1024835-52.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, NÃO INFORMADO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 31/01/2024, Publicado no DJE 03/02/2024) RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL – MAQUINÁRIOS AGRÍCOLAS – APREENSÃO NO PERÍODO DE BLINDAGEM DETERMINADA POR JUÍZO DIVERSO O JUIZO UNIVERSAL – DETERMINAÇÃO DE DEVOLUÇÃO – POSSIBILIDADE – RECURSO DESPROVIDO. Apreensão dos mesmos foi realizada no período de blindagem. Juízo competente para controle dos atos de constrição patrimonial e declaração essencialidade no stay period é do juízo universal. “4. Ainda que se trate de créditos garantidos por alienação fiduciária, compete ao juízo da recuperação judicial decidir acerca da essencialidade de determinado bem para fins de aplicação da ressalva prevista no art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005, na parte que não admite a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais ao desenvolvimento da atividade empresarial. (...) 6. Agravo interno não provido (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.954.239/MT, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 25/4/2022, DJe de 27/4/2022.)” (N.U 1013168-69.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 12/03/2024, Publicado no DJE 13/03/2024) Ademais, as alegações do agravante sobre a aquisição dos veículos às vésperas do pedido de recuperação não procedem. Conforme evidenciado pelas Cédulas de Crédito Bancário, trata-se de consolidação de termos de renegociação de dívida, e não de aquisição originária. Por fim, a recuperação judicial é um direito constitucionalmente garantido, e seu exercício não configura, por si só, conduta dolosa. Caso sejam evidenciadas irregularidades, caberá a adoção das medidas cabíveis para assegurar a higidez do processo. Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, nego provimento ao recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1000880-50.2025.8.11.0055

ID: 306377754

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000880-50.2025.8.11.0055

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

RICARDO NEVES COSTA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

FLAVIO NEVES COSTA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

RAPHAEL NEVES COSTA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000880-50.2025.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). MARCOS RE… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000880-50.2025.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELANTE), FLAVIO NEVES COSTA - CPF: 170.446.138-37 (ADVOGADO), IVANOR BARIVIERA - CPF: 016.999.659-00 (APELADO), RICARDO NEVES COSTA - CPF: 137.285.858-07 (ADVOGADO), RAPHAEL NEVES COSTA - CPF: 279.112.988-07 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PROPOSITURA CONTRA PESSOA FALECIDA. AUSÊNCIA DE CAPACIDADE PROCESSUAL DO RÉU. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL INEFICAZ. MORA NÃO CONFIGURADA. INVIABILIDADE DE SUCESSÃO PROCESSUAL. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação interposto por Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S.A. contra sentença que extinguiu, sem resolução de mérito, ação de busca e apreensão fundada no Decreto-Lei 911/69, proposta contra Ivanor Bariviera, falecido anteriormente à propositura da demanda. O juízo a quo reconheceu a ausência de pressuposto de constituição válida da relação processual e de constituição válida da mora. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) determinar se é válida a ação de busca e apreensão proposta contra pessoa já falecida; (ii) verificar se a notificação extrajudicial enviada após o óbito do devedor constitui validamente a mora. III. RAZÕES DE DECIDIR A ação foi proposta em 31/01/2025, sendo que o devedor havia falecido em 15/09/2024, impedindo a formação válida da relação jurídica processual por ausência de capacidade de ser parte. A notificação extrajudicial para constituição em mora foi enviada após o óbito e retornou com anotação de "endereço insuficiente", revelando-se ineficaz. A ausência de comprovação da mora inviabiliza o prosseguimento da ação de busca e apreensão, conforme exige a Súmula 72 do STJ. A substituição do polo passivo pelo espólio não é admitida quando o falecimento antecede a propositura da ação, nos termos do art. 110 do CPC e da jurisprudência consolidada do STJ. A constituição válida da mora é requisito de procedibilidade da ação fundada em alienação fiduciária. A ausência desse pressuposto compromete a própria admissibilidade do processo. A matéria relativa à ausência de pressupostos processuais é de ordem pública, podendo ser conhecida de ofício, sendo irrelevante a ausência de prévia intimação da parte para regularização do polo passivo. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A ação de busca e apreensão ajuizada contra pessoa já falecida é juridicamente impossível, por ausência de capacidade processual do réu, impondo-se a extinção do feito sem resolução de mérito. 2. A notificação extrajudicial realizada após o óbito do devedor é juridicamente ineficaz para fins de constituição em mora, nos termos da Súmula 72 do STJ. 3. A sucessão processual pelo espólio somente é cabível quando o falecimento ocorre no curso do processo, sendo inadmissível em caso de óbito anterior à propositura da ação.” R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação interposto por AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra/MT, que nos autos da presente Ação de Busca e Apreensão, julgou extinto o processo sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, IV, do CPC, por ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular da relação processual. O apelante sustenta, em síntese, que houve excesso de rigor na decisão que extinguiu o processo, argumentando a possibilidade de substituição do polo passivo. Assevera que, não tendo sido comunicado do falecimento, a notificação encaminhada ao endereço contratual seria suficiente para constituir a mora. Ante o exposto, requer o provimento do recurso para que seja reformada a sentença e autorizada a regularização do polo passivo, com a habilitação do Espólio de Ivanor Bariviera, permitindo o regular prosseguimento da demanda. Sem contrarrazões (parte falecida antes da propositura da ação, conforme ID 289779903). Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de apelação cível interposta por Banco Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S.A. contra sentença que julgou extinto o processo sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, IV do CPC, em razão da ausência de pressuposto processual. A instituição financeira apelante ajuizou ação de busca e apreensão com pedido liminar em face de Ivanor Bariviera, com fundamento no Decreto-lei 911/69, visando à apreensão de veículo alienado fiduciariamente em garantia de contrato de financiamento. Alegou que o requerido se tornou inadimplente a partir do vencimento da parcela em 27/09/2024 e que o constituiu em mora mediante notificação extrajudicial. O pedido liminar foi parcialmente deferido. Contudo, durante o processamento do feito, descobriu-se que o devedor fiduciante havia falecido em 15/09/2024, sendo que a ação foi ajuizada apenas em 31/01/2025. Verificou-se, ainda, que a notificação extrajudicial para constituição em mora foi enviada em 04/11/2024, mas retornou em 22/11/2024 com a anotação "endereço insuficiente", portanto após o óbito do devedor. A seguir, destaca-se a sentença prolatada pelo MM. Juiz de Direito Anderson Gomes Junqueira, da 3ª Vara Cível de Tangará da Serra, que julgou extinto o processo sem resolução de mérito nos seguintes termos: “[...] D E C I D O. Inicialmente, cumpre salientar que o falecimento do requerido se deu em circunstância trágica: conforme apurado nos autos, a morte foi consequência de crime de latrocínio (roubo seguido de morte). Na ocasião do delito, o veículo objeto da presente demanda – alienado fiduciariamente em garantia – foi localizado nas proximidades da comunidade Ariranha, tendo sido removido por guincho e encaminhado ao pátio da Delegacia Especializada de Roubos e Furtos de Tangará da Serra (DERF), situada na Avenida Brasil, n.º 79-N, Centro, Tangará da Serra/MT, CEP 78.300-000. Para maiores informações, a Delegacia pode ser contatada pelos telefones (65) 3902-1400 / 3902-1429. Superada essa importante contextualização fática, passa-se à análise jurídica. Nos termos do artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, o processo deve ser extinto sem resolução do mérito quando não preenchido pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular da relação processual. No caso concreto, restou cabalmente demonstrado que o falecimento do requerido ocorreu antes do ajuizamento da demanda. Assim, não houve formação válida da relação processual, uma vez que não é possível propor ação em face de pessoa falecida, por ausência de capacidade de ser parte no polo passivo. De acordo com o artigo 110 do Código de Processo Civil, a sucessão processual só é cabível quando o falecimento ocorre no curso do processo, ocasião em que o espólio ou os herdeiros assumem a posição processual da parte falecida. Não se trata da hipótese dos autos. Aqui, o requerido já havia falecido quando a ação foi proposta, o que inviabiliza qualquer substituição ou sucessão processual. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça confirma esse entendimento: [...] O Tribunal de Justiça de Mato Grosso também compartilha esse entendimento: [...] Além disso, embora o artigo 2º, § 2º, do Decreto-Lei n.º 911/1969 estabeleça que a mora decorre do simples vencimento da obrigação (mora ex re), o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a comprovação da mora por notificação extrajudicial é condição de procedibilidade da ação de busca e apreensão, conforme dispõe a Súmula 72 do STJ: “A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente.” No caso em análise, a notificação extrajudicial expedida pela instituição financeira retornou em 22 de novembro de 2024, com a anotação de “endereço insuficiente”, não se efetivando a constituição válida em mora do devedor. Ademais, é relevante reforçar que tal notificação foi posterior ao falecimento do requerido, ocorrido em 15 de setembro de 2024. Portanto, o ato de notificação, além de ineficaz do ponto de vista formal, foi dirigido a pessoa já falecida, o que o torna juridicamente nulo para fins de constituição em mora. Conjugando-se tais elementos – falecimento do requerido antes da propositura da ação e ausência de constituição válida da mora – resulta inequívoca a ausência de pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, impondo-se sua extinção, nos exatos termos do artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. Ante o exposto, julgo extinto o processo, sem resolução de mérito, com fundamento no artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular da relação processual. Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais remanescentes, se houver. Sem condenação em honorários, eis que não houve a triangularização processual. Transitada em julgado, certifique-se e arquive-se ao final, procedendo-se às baixas e anotações de estilo.” Contra esta sentença se insurge o Apelante, defendendo, em síntese, a possibilidade de substituição processual e a eficácia da notificação enviada antes da ciência do falecimento do devedor. In casu, cinge-se a controvérsia em verificar se houve a correta aplicação do instituto previsto no artigo 485, IV, do CPC, que prevê a possibilidade de o juiz não resolver o mérito de uma ação quando houver ausência de pressupostos de constituição e desenvolvimento válidos do processo. Pois bem. Sabe-se que a ação de busca e apreensão tem como requisito essencial e indispensável a demonstração da mora do devedor, nos termos da Súmula 72 do STJ, o que deve ser feito por meio de envio de notificação extrajudicial ao endereço indicado no contrato, a fim de dar ciência ao devedor e assegurar-lhe o devido processo legal antes da privação da posse direta do bem. É a jurisprudência: “[...] Para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é necessário o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual. A comprovação da mora é pressuposto de constituição válida e regular do processo em Ação de Busca e Apreensão fundada em alienação fiduciária. A comprovação da mora do devedor é requisito indispensável ao ajuizamento da ação de busca e apreensão com amparo no Decreto-Lei nº 911/1969. Se não foi comprovada a mora do devedor, há ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, que deve então ser julgado extinto o processo sem resolução de mérito.” (TJMT, AI 1005652-61.2024.8.11.0000, r. Jose Zuquim Nogueira, j. 14/05/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, p. 17/05/2024) (g.n) Na hipótese dos autos, observa-se que a tentativa de constituição em mora através da notificação extrajudicial se revela absolutamente ineficaz, tendo em vista que realizada quando o devedor já havia falecido, situação que não comporta controvérsia. Portanto, no momento do envio da notificação extrajudicial, em 04/11/2024 (ID 289778930), o devedor já havia falecido (data do óbito: 15/09/2024, conforme certidão de ID 289779903), tornando juridicamente impossível a constituição válida da mora. Isso porque a notificação é instrumento essencial para dar ciência ao devedor sobre a inadimplência, evitando surpresas e possibilitando eventual purgação da mora. No entanto, sendo inviável a constituição de mora de pessoa falecida, fica impossibilitado o prosseguimento da ação de busca e apreensão por ausência de pressuposto essencial. A jurisprudência é pacífica ao reconhecer a ineficácia de notificação extrajudicial enviada após o falecimento do devedor, extinguindo a ação de busca e apreensão ante a ausência de pressupostos processuais e de constituição válida da mora: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – NOTIFICAÇÃO ENVIADA APÓS A MORTE DO DEVEDOR – INEFICÁCIA DO ATO – CONSTITUIÇÃO EM MORA NÃO CONFIGURADA – TEMA 1.132 STJ – AFASTADO - EXTINÇÃO DA AÇÃO - SENTENÇA MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO. Para o ajuizamento da ação de busca e apreensão é imprescindível à comprovação da mora, nos termos da Súmula n. 72 do STJ . Verificada à ausência de pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, máxime pelo falecimento do devedor, é caso de manter a extinção da ação. O falecimento do devedor antes da propositura da ação afasta a incidência do TEMA 1.132.” (TJMT, ApCiv 1059020-95.2020.8.11.0041, r. Guiomar Teodoro Borges, j. 13/12/2023, Quarta Câmara de Direito Privado, p. 14/12/2023) "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. FALECIMENTO DO DEVEDOR ANTES DA CONSTITUIÇÃO EM MORA. NOTIFICAÇÃO POSTERIOR AO ÓBITO. INEXISTÊNCIA DE SUCESSÃO PROCESSUAL. IMPOSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO CONTRA O ESPÓLIO. RECURSO IMPROVIDO. [...] A constituição em mora é requisito essencial para a ação de busca e apreensão, conforme o Decreto-Lei n. 911/1969 e a Súmula 72 do STJ, exigindo-se a notificação válida do devedor fiduciante. A notificação extrajudicial realizada após o falecimento do devedor não constitui validamente a mora, pois é inviável presumir a constituição sem que o devedor tenha sido notificado em vida [...]” (TJES, ApCiv 5005498-97.2023.8.08.0030, j. 17/12/2024) Ademais, no que concerne à possibilidade de sucessão processual pelo espólio, esta só se justifica quando o devedor falece no curso do processo, o que não se verifica no presente caso. O falecimento do devedor ocorreu antes mesmo da constituição em mora e do ajuizamento da demanda, o que impede a possibilidade de redirecionamento ao espólio ou herdeiros, conforme pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça: “[...] A propositura de ação em face de réu preteritamente falecido não se submete à habilitação, sucessão ou substituição processual, nem tampouco deve ser suspensa até o processamento de ação de habilitação de sucessores, na medida em que tais institutos apenas são aplicáveis às hipóteses em que há o falecimento da parte no curso do processo judicial. Inteligência dos arts. 43, 265, I, e 1.055, todos do CPC/73.” (STJ, REsp 1559791/PB, r. Nancy Andrighi, j. 28/08/2018) “[...] O ajuizamento de execução contra pessoa já falecida não autoriza o redirecionamento ao espólio, dado que não se aperfeiçoou a relação processual.” (REsp 1.722.159/DF, r. Nancy Andrighi, j. 04/02/2020). Assim sendo, considerando que o ato destinado a constituir o devedor em mora foi praticado após seu óbito, resta evidenciada a ausência de pressuposto processual indispensável ao desenvolvimento válido e regular do processo, circunstância que impõe a manutenção da sentença extintiva. De mais a mais, conquanto a apelante sustente que "sequer foi intimada para regularizar o polo passivo da ação, tendo em vista que a notícia do falecimento não foi informada ao credor", tal alegação não afasta a extinção por ausência de pressuposto processual. A argumentação revela, na verdade, tentativa inadequada de transferir ao Poder Judiciário responsabilidade que incumbia ao próprio requerente. Não compete ao juízo informar às partes sobre fatos que deveriam ter sido verificados antes do ajuizamento da demanda, sendo certo que cabia à apelante, instituição financeira, diligenciar adequadamente antes de propor a ação, especialmente considerando o inadimplemento e o retorno da notificação extrajudicial. Ademais, nas próprias razões recursais, o apelante indica nominalmente a mãe do falecido (Gelssi Gema Bariviera) como representante do espólio, fornecendo inclusive seus dados pessoais completos, circunstância que evidencia acesso a informações sobre a situação familiar do devedor. De toda sorte, a matéria relativa aos pressupostos processuais é de ordem pública, devendo ser conhecida de ofício pelo magistrado, independentemente de provocação ou intimação prévia das partes. Quando há impossibilidade jurídica absoluta de desenvolvimento válido do processo, como na hipótese de ação proposta contra pessoa morta, a extinção se impõe como medida de rigor. A propósito: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL – PARCELA JÁ QUITADA – INEFICÁCIA DA MEDIDA – MORA NÃO CONFIGURADA – REQUISITO INDISPENSÁVEL AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO – SÚMULA 72 DO STJ – AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO VÁLIDA E REGULAR DO PROCESSO – MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA RECURSO PROVIDO – APLICAÇÃO DE EFEITO TRANSLATIVO – EXTINÇÃO DA AÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO (TJMT, AI 1015933-76.2024.8.11.0000, r. Guiomar Teodoro Borges, j. 31/07/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, p. 02/08/2024) Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo integralmente a sentença recorrida por seus próprios fundamentos. Deixo de majorar os honorários recursais, eis que condicionados à prévia fixação na origem, o que não ocorreu no caso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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Processo nº 1000880-50.2025.8.11.0055

ID: 306377762

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000880-50.2025.8.11.0055

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

IVANOR BARIVIERA

Acórdão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000880-50.2025.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). MARCOS RE… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000880-50.2025.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELANTE), FLAVIO NEVES COSTA - CPF: 170.446.138-37 (ADVOGADO), IVANOR BARIVIERA - CPF: 016.999.659-00 (APELADO), RICARDO NEVES COSTA - CPF: 137.285.858-07 (ADVOGADO), RAPHAEL NEVES COSTA - CPF: 279.112.988-07 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PROPOSITURA CONTRA PESSOA FALECIDA. AUSÊNCIA DE CAPACIDADE PROCESSUAL DO RÉU. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL INEFICAZ. MORA NÃO CONFIGURADA. INVIABILIDADE DE SUCESSÃO PROCESSUAL. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação interposto por Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S.A. contra sentença que extinguiu, sem resolução de mérito, ação de busca e apreensão fundada no Decreto-Lei 911/69, proposta contra Ivanor Bariviera, falecido anteriormente à propositura da demanda. O juízo a quo reconheceu a ausência de pressuposto de constituição válida da relação processual e de constituição válida da mora. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) determinar se é válida a ação de busca e apreensão proposta contra pessoa já falecida; (ii) verificar se a notificação extrajudicial enviada após o óbito do devedor constitui validamente a mora. III. RAZÕES DE DECIDIR A ação foi proposta em 31/01/2025, sendo que o devedor havia falecido em 15/09/2024, impedindo a formação válida da relação jurídica processual por ausência de capacidade de ser parte. A notificação extrajudicial para constituição em mora foi enviada após o óbito e retornou com anotação de "endereço insuficiente", revelando-se ineficaz. A ausência de comprovação da mora inviabiliza o prosseguimento da ação de busca e apreensão, conforme exige a Súmula 72 do STJ. A substituição do polo passivo pelo espólio não é admitida quando o falecimento antecede a propositura da ação, nos termos do art. 110 do CPC e da jurisprudência consolidada do STJ. A constituição válida da mora é requisito de procedibilidade da ação fundada em alienação fiduciária. A ausência desse pressuposto compromete a própria admissibilidade do processo. A matéria relativa à ausência de pressupostos processuais é de ordem pública, podendo ser conhecida de ofício, sendo irrelevante a ausência de prévia intimação da parte para regularização do polo passivo. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A ação de busca e apreensão ajuizada contra pessoa já falecida é juridicamente impossível, por ausência de capacidade processual do réu, impondo-se a extinção do feito sem resolução de mérito. 2. A notificação extrajudicial realizada após o óbito do devedor é juridicamente ineficaz para fins de constituição em mora, nos termos da Súmula 72 do STJ. 3. A sucessão processual pelo espólio somente é cabível quando o falecimento ocorre no curso do processo, sendo inadmissível em caso de óbito anterior à propositura da ação.” R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação interposto por AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra/MT, que nos autos da presente Ação de Busca e Apreensão, julgou extinto o processo sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, IV, do CPC, por ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular da relação processual. O apelante sustenta, em síntese, que houve excesso de rigor na decisão que extinguiu o processo, argumentando a possibilidade de substituição do polo passivo. Assevera que, não tendo sido comunicado do falecimento, a notificação encaminhada ao endereço contratual seria suficiente para constituir a mora. Ante o exposto, requer o provimento do recurso para que seja reformada a sentença e autorizada a regularização do polo passivo, com a habilitação do Espólio de Ivanor Bariviera, permitindo o regular prosseguimento da demanda. Sem contrarrazões (parte falecida antes da propositura da ação, conforme ID 289779903). Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de apelação cível interposta por Banco Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S.A. contra sentença que julgou extinto o processo sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, IV do CPC, em razão da ausência de pressuposto processual. A instituição financeira apelante ajuizou ação de busca e apreensão com pedido liminar em face de Ivanor Bariviera, com fundamento no Decreto-lei 911/69, visando à apreensão de veículo alienado fiduciariamente em garantia de contrato de financiamento. Alegou que o requerido se tornou inadimplente a partir do vencimento da parcela em 27/09/2024 e que o constituiu em mora mediante notificação extrajudicial. O pedido liminar foi parcialmente deferido. Contudo, durante o processamento do feito, descobriu-se que o devedor fiduciante havia falecido em 15/09/2024, sendo que a ação foi ajuizada apenas em 31/01/2025. Verificou-se, ainda, que a notificação extrajudicial para constituição em mora foi enviada em 04/11/2024, mas retornou em 22/11/2024 com a anotação "endereço insuficiente", portanto após o óbito do devedor. A seguir, destaca-se a sentença prolatada pelo MM. Juiz de Direito Anderson Gomes Junqueira, da 3ª Vara Cível de Tangará da Serra, que julgou extinto o processo sem resolução de mérito nos seguintes termos: “[...] D E C I D O. Inicialmente, cumpre salientar que o falecimento do requerido se deu em circunstância trágica: conforme apurado nos autos, a morte foi consequência de crime de latrocínio (roubo seguido de morte). Na ocasião do delito, o veículo objeto da presente demanda – alienado fiduciariamente em garantia – foi localizado nas proximidades da comunidade Ariranha, tendo sido removido por guincho e encaminhado ao pátio da Delegacia Especializada de Roubos e Furtos de Tangará da Serra (DERF), situada na Avenida Brasil, n.º 79-N, Centro, Tangará da Serra/MT, CEP 78.300-000. Para maiores informações, a Delegacia pode ser contatada pelos telefones (65) 3902-1400 / 3902-1429. Superada essa importante contextualização fática, passa-se à análise jurídica. Nos termos do artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, o processo deve ser extinto sem resolução do mérito quando não preenchido pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular da relação processual. No caso concreto, restou cabalmente demonstrado que o falecimento do requerido ocorreu antes do ajuizamento da demanda. Assim, não houve formação válida da relação processual, uma vez que não é possível propor ação em face de pessoa falecida, por ausência de capacidade de ser parte no polo passivo. De acordo com o artigo 110 do Código de Processo Civil, a sucessão processual só é cabível quando o falecimento ocorre no curso do processo, ocasião em que o espólio ou os herdeiros assumem a posição processual da parte falecida. Não se trata da hipótese dos autos. Aqui, o requerido já havia falecido quando a ação foi proposta, o que inviabiliza qualquer substituição ou sucessão processual. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça confirma esse entendimento: [...] O Tribunal de Justiça de Mato Grosso também compartilha esse entendimento: [...] Além disso, embora o artigo 2º, § 2º, do Decreto-Lei n.º 911/1969 estabeleça que a mora decorre do simples vencimento da obrigação (mora ex re), o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a comprovação da mora por notificação extrajudicial é condição de procedibilidade da ação de busca e apreensão, conforme dispõe a Súmula 72 do STJ: “A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente.” No caso em análise, a notificação extrajudicial expedida pela instituição financeira retornou em 22 de novembro de 2024, com a anotação de “endereço insuficiente”, não se efetivando a constituição válida em mora do devedor. Ademais, é relevante reforçar que tal notificação foi posterior ao falecimento do requerido, ocorrido em 15 de setembro de 2024. Portanto, o ato de notificação, além de ineficaz do ponto de vista formal, foi dirigido a pessoa já falecida, o que o torna juridicamente nulo para fins de constituição em mora. Conjugando-se tais elementos – falecimento do requerido antes da propositura da ação e ausência de constituição válida da mora – resulta inequívoca a ausência de pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, impondo-se sua extinção, nos exatos termos do artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. Ante o exposto, julgo extinto o processo, sem resolução de mérito, com fundamento no artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular da relação processual. Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais remanescentes, se houver. Sem condenação em honorários, eis que não houve a triangularização processual. Transitada em julgado, certifique-se e arquive-se ao final, procedendo-se às baixas e anotações de estilo.” Contra esta sentença se insurge o Apelante, defendendo, em síntese, a possibilidade de substituição processual e a eficácia da notificação enviada antes da ciência do falecimento do devedor. In casu, cinge-se a controvérsia em verificar se houve a correta aplicação do instituto previsto no artigo 485, IV, do CPC, que prevê a possibilidade de o juiz não resolver o mérito de uma ação quando houver ausência de pressupostos de constituição e desenvolvimento válidos do processo. Pois bem. Sabe-se que a ação de busca e apreensão tem como requisito essencial e indispensável a demonstração da mora do devedor, nos termos da Súmula 72 do STJ, o que deve ser feito por meio de envio de notificação extrajudicial ao endereço indicado no contrato, a fim de dar ciência ao devedor e assegurar-lhe o devido processo legal antes da privação da posse direta do bem. É a jurisprudência: “[...] Para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é necessário o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual. A comprovação da mora é pressuposto de constituição válida e regular do processo em Ação de Busca e Apreensão fundada em alienação fiduciária. A comprovação da mora do devedor é requisito indispensável ao ajuizamento da ação de busca e apreensão com amparo no Decreto-Lei nº 911/1969. Se não foi comprovada a mora do devedor, há ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, que deve então ser julgado extinto o processo sem resolução de mérito.” (TJMT, AI 1005652-61.2024.8.11.0000, r. Jose Zuquim Nogueira, j. 14/05/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, p. 17/05/2024) (g.n) Na hipótese dos autos, observa-se que a tentativa de constituição em mora através da notificação extrajudicial se revela absolutamente ineficaz, tendo em vista que realizada quando o devedor já havia falecido, situação que não comporta controvérsia. Portanto, no momento do envio da notificação extrajudicial, em 04/11/2024 (ID 289778930), o devedor já havia falecido (data do óbito: 15/09/2024, conforme certidão de ID 289779903), tornando juridicamente impossível a constituição válida da mora. Isso porque a notificação é instrumento essencial para dar ciência ao devedor sobre a inadimplência, evitando surpresas e possibilitando eventual purgação da mora. No entanto, sendo inviável a constituição de mora de pessoa falecida, fica impossibilitado o prosseguimento da ação de busca e apreensão por ausência de pressuposto essencial. A jurisprudência é pacífica ao reconhecer a ineficácia de notificação extrajudicial enviada após o falecimento do devedor, extinguindo a ação de busca e apreensão ante a ausência de pressupostos processuais e de constituição válida da mora: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – NOTIFICAÇÃO ENVIADA APÓS A MORTE DO DEVEDOR – INEFICÁCIA DO ATO – CONSTITUIÇÃO EM MORA NÃO CONFIGURADA – TEMA 1.132 STJ – AFASTADO - EXTINÇÃO DA AÇÃO - SENTENÇA MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO. Para o ajuizamento da ação de busca e apreensão é imprescindível à comprovação da mora, nos termos da Súmula n. 72 do STJ . Verificada à ausência de pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, máxime pelo falecimento do devedor, é caso de manter a extinção da ação. O falecimento do devedor antes da propositura da ação afasta a incidência do TEMA 1.132.” (TJMT, ApCiv 1059020-95.2020.8.11.0041, r. Guiomar Teodoro Borges, j. 13/12/2023, Quarta Câmara de Direito Privado, p. 14/12/2023) "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. FALECIMENTO DO DEVEDOR ANTES DA CONSTITUIÇÃO EM MORA. NOTIFICAÇÃO POSTERIOR AO ÓBITO. INEXISTÊNCIA DE SUCESSÃO PROCESSUAL. IMPOSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO CONTRA O ESPÓLIO. RECURSO IMPROVIDO. [...] A constituição em mora é requisito essencial para a ação de busca e apreensão, conforme o Decreto-Lei n. 911/1969 e a Súmula 72 do STJ, exigindo-se a notificação válida do devedor fiduciante. A notificação extrajudicial realizada após o falecimento do devedor não constitui validamente a mora, pois é inviável presumir a constituição sem que o devedor tenha sido notificado em vida [...]” (TJES, ApCiv 5005498-97.2023.8.08.0030, j. 17/12/2024) Ademais, no que concerne à possibilidade de sucessão processual pelo espólio, esta só se justifica quando o devedor falece no curso do processo, o que não se verifica no presente caso. O falecimento do devedor ocorreu antes mesmo da constituição em mora e do ajuizamento da demanda, o que impede a possibilidade de redirecionamento ao espólio ou herdeiros, conforme pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça: “[...] A propositura de ação em face de réu preteritamente falecido não se submete à habilitação, sucessão ou substituição processual, nem tampouco deve ser suspensa até o processamento de ação de habilitação de sucessores, na medida em que tais institutos apenas são aplicáveis às hipóteses em que há o falecimento da parte no curso do processo judicial. Inteligência dos arts. 43, 265, I, e 1.055, todos do CPC/73.” (STJ, REsp 1559791/PB, r. Nancy Andrighi, j. 28/08/2018) “[...] O ajuizamento de execução contra pessoa já falecida não autoriza o redirecionamento ao espólio, dado que não se aperfeiçoou a relação processual.” (REsp 1.722.159/DF, r. Nancy Andrighi, j. 04/02/2020). Assim sendo, considerando que o ato destinado a constituir o devedor em mora foi praticado após seu óbito, resta evidenciada a ausência de pressuposto processual indispensável ao desenvolvimento válido e regular do processo, circunstância que impõe a manutenção da sentença extintiva. De mais a mais, conquanto a apelante sustente que "sequer foi intimada para regularizar o polo passivo da ação, tendo em vista que a notícia do falecimento não foi informada ao credor", tal alegação não afasta a extinção por ausência de pressuposto processual. A argumentação revela, na verdade, tentativa inadequada de transferir ao Poder Judiciário responsabilidade que incumbia ao próprio requerente. Não compete ao juízo informar às partes sobre fatos que deveriam ter sido verificados antes do ajuizamento da demanda, sendo certo que cabia à apelante, instituição financeira, diligenciar adequadamente antes de propor a ação, especialmente considerando o inadimplemento e o retorno da notificação extrajudicial. Ademais, nas próprias razões recursais, o apelante indica nominalmente a mãe do falecido (Gelssi Gema Bariviera) como representante do espólio, fornecendo inclusive seus dados pessoais completos, circunstância que evidencia acesso a informações sobre a situação familiar do devedor. De toda sorte, a matéria relativa aos pressupostos processuais é de ordem pública, devendo ser conhecida de ofício pelo magistrado, independentemente de provocação ou intimação prévia das partes. Quando há impossibilidade jurídica absoluta de desenvolvimento válido do processo, como na hipótese de ação proposta contra pessoa morta, a extinção se impõe como medida de rigor. A propósito: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL – PARCELA JÁ QUITADA – INEFICÁCIA DA MEDIDA – MORA NÃO CONFIGURADA – REQUISITO INDISPENSÁVEL AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO – SÚMULA 72 DO STJ – AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO VÁLIDA E REGULAR DO PROCESSO – MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA RECURSO PROVIDO – APLICAÇÃO DE EFEITO TRANSLATIVO – EXTINÇÃO DA AÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO (TJMT, AI 1015933-76.2024.8.11.0000, r. Guiomar Teodoro Borges, j. 31/07/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, p. 02/08/2024) Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo integralmente a sentença recorrida por seus próprios fundamentos. Deixo de majorar os honorários recursais, eis que condicionados à prévia fixação na origem, o que não ocorreu no caso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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Processo nº 1033588-61.2024.8.11.0000

ID: 314214347

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1033588-61.2024.8.11.0000

Data de Disponibilização: 02/07/2025

Polo Ativo:

VIBRA ENERGIA S.A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MARIA LUCIA FERREIRA TEIXEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1033588-61.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Liquidação] Relator: Des(a). SEBASTIAO … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1033588-61.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Liquidação] Relator: Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [MARIA LUCIA FERREIRA TEIXEIRA - CPF: 851.633.257-87 (ADVOGADO), VIBRA ENERGIA S.A - CNPJ: 34.274.233/0001-02 (AGRAVANTE), LOUIZE HONORATO DE FREITAS - CPF: 438.972.311-15 (AGRAVADO), Espólio de Alexandre Augustim registrado(a) civilmente como ALEXANDRE AUGUSTIN - CPF: 575.844.351-49 (AGRAVADO), EUCLIDES RIBEIRO DA SILVA JUNIOR - CPF: 630.715.331-87 (ADVOGADO), EDUARDO HENRIQUE VIEIRA BARROS - CPF: 704.891.571-49 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO EMPRESARIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SOBERANIA DA ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES. LIMITES DO CONTROLE JUDICIAL DE LEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que manteve a homologação do plano de recuperação judicial aprovado em assembleia geral de credores no bojo da Ação de Recuperação Judicial nº 0014639-12.2015.8.11.0003, com fundamento na observância da legalidade e nas prerrogativas do juízo recuperacional. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se é possível ao Poder Judiciário revisar cláusulas do plano de recuperação judicial aprovado por assembleia geral de credores, sobretudo quanto a condições de pagamento como deságios e períodos de carência. III. Razões de decidir 3. A homologação do plano de recuperação judicial deve observar o controle de legalidade, competindo ao Judiciário apenas verificar sua conformidade com a Lei nº 11.101/2005. 4. A assembleia geral de credores é soberana para aprovar cláusulas que envolvam negociação, como deságios e prazos, desde que respeitadas as categorias legais de credores e os limites da lei de regência. 5. Não demonstrada ilegalidade no plano aprovado, inexiste margem para intervenção judicial. IV. Dispositivo e tese 6. Agravo de instrumento desprovido. Tese de julgamento: "1. A assembleia geral de credores é soberana para aprovar o plano de recuperação judicial, incluindo cláusulas de deságio e carência, desde que respeitadas as categorias de credores e os limites da Lei nº 11.101/2005. 2. O controle judicial se limita à legalidade, sendo vedado reexame de conveniência ou oportunidade." Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.101/2005, arts. 47, 53 e 58. Jurisprudência relevante: (STJ - Terceira Turma - REsp 1631762/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 19/06/2018, DJe 25/06/2018) e (STJ - Terceira Turma - REsp 1634844/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019). R E L A T Ó R I O Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, interposto por VIBRA ENERGIA S/A, em face de decisão exarada pelo Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis-MT que, nos autos de Ação de Recuperação Judicial nº. 0014639-12.2015.8.11.0003 código 800652, proposta por LOUIZE HONORATO DE FREITAS e ALEXANDRE AUGUSTIN, ambos em recuperação judicial, HOMOLOGOU o plano de recuperação judicial, aprovado em Assembleia Geral de Credores. Em síntese, após demonstrar o cabimento, defender a tempestividade do recurso e comprovar o recolhimento de custas, a Agravante alega que a decisão deve ser reformada, diante de diversas ilegalidades e irregularidades, dentre elas: condições de Pagamento para os credores de Classe III - quirografários- sacrifício desproporcional – conta com deságio de 90%, que demonstra que a empresa não pode se soerguer por conta própria, e sim mediante o sacrifício dos credores”; período de carência de 12 meses contados da homologação e pagamento parcelado (40 parcelas semestrais). Diz que “(...) a correção monetária incidindo sobre respectivo Crédito, correspondente à Taxa Referencial-TR, desde a Data de Homologação Judicial do Plano, traz um deságio implícito, não remunerando adequadamente o crédito não existe no plano de recuperação sequer a demonstração da fonte de obtenção dos recursos que farão frente às dívidas da recuperanda. Por outro lado, Credores da Classe IV, será aplicado o deságio de 60% (sessenta por cento) e o pagamento em 12 (doze) parcelas semestrais”. Defende a inviabilidade do plano de recuperação judicial, contrariando-se o artigo 53, da Lei n. 11.101/2005, ressaltando-se que “(...) os elevados deságios, configurando verdadeiro perdão de dívidas, contraria o artigo 47 da Lei 11.101/05, o qual dispõe acerca da preservação dos interesses dos credores, que devem ser equalizados com os do recuperando, não havendo que se falar em sobreposição de um interesse sobre o outro, ou seja, devem coexistir de forma harmônica e equânime”. Sustenta a viabilidade do controle de legalidade do plano aprovado em assembleia. Afirma que houve tratamento desigual entre credores, salientando que “(...) O plano cria uma diferença substancial entre os deságios aplicados a credores de diferentes classes (90% para quirografários e 60% para microempresas). O art. 45 da Lei 11.101/2005 exige que as condições sejam equilibradas, respeitando a proporcionalidade e a igualdade entre credores de mesma classe, o que não foi observado”; que “(...) Não se pode admitir que alguns credores quirografários tenham tratamento diferenciado, em detrimento de outros, sem a justificativa plausível, sob pena de afronta ao artigo 58, § 2º da Lei n. 11.101/2005 e violação ao princípio da “pars conditio creditorum””. Alegando estarem presentes os requisitos que justificariam o deferimento do pleito liminar, requer “(...) seja atribuída a TUTELA ANTECIPADA ao Agravo de Instrumento sob exame, inaudita altera pars, para suspender a r. decisão agravada, consubstanciado no artigo 1.019, I, do Código de Processo Civil; (...) c) seja, ao final, DADO PROVIMENTO ao presente agravo de instrumento, confirmando a tutela antecipada requerida, para reformar a r. decisão agravada, para que seja observado o disposto no artigo 47, 58, §2º da Lei nº. 11.101/2005 e art. 187 do Código Civil, que dispõe acerca da preservação dos interesses dos credores, que devem ser equalizados com os do recuperando, sem a imposição de deságios excessivos, que representa verdadeiro enriquecimento sem causa, bem como a observância do princípio ‘par conditio creditorum””. O pleito liminar foi indeferido. Em contrarrazões, pugna-se pelo desprovimento do agravo. A Procuradoria-Geral de Justiça, por meio de parecer da lavra do Dr. José Zuqueti – Procurador de Justiça – opina pelo desprovimento do agravo. É o relatório. V O T O R E L A T O R O objeto deste agravo consiste em analisar e decidir se merece ou não reforma a decisão que, nos autos de Ação de Recuperação Judicial nº. 0014639-12.2015.8.11.0003 código 800652, proposta por LOUIZE HONORATO DE FREITAS e ALEXANDRE AUGUSTIN, ambos em recuperação judicial, HOMOLOGOU o plano de recuperação judicial, aprovado em Assembleia Geral de Credores. Pois bem. Após a devida análise, verifica-se que o agravo não comporta o provimento almejado. É que não se verifica ilegalidade no plano homologado, após a aprovação pelos credores em assembleia geral, sendo os atos devidamente observados pelo judiciário, que detém o poder, juntamente com Ministério Público, para analisar os critérios estritamente legais, à luz da legislação pertinente. Dentro desse contexto, malgrado as alegações, é viável a negociação (próprio da assembleia de credores), respeitando-se as categorias de credores, quanto a deságios, carência e demais condições, a fim de que haja o soerguimento dos recuperandos, com o objetivo de continuidade das atividades empresariais. Assim, submetido ao plano da legalidade pelo Juízo singular, com a participação do “Parquet” Estadual, mostra-se soberana a decisão da assembleia e legal a homologação do plano de recuperação judicial. A esse respeito, ratifico a jurisprudência adotada quando da análise liminar: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – HOMOLOGAÇÃO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL APROVADO EM ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES – DESÁGIO, CARÊNCIA E PRAZO DE PAGAMENTO – INCONFORMISMO – AUSÊNCIA DE ABUSO E/OU ILEGALIDADE – NATUREZA NEGOCIAL – VIABILIDADE ECONÔMICA DO PLANO – SOBERANIA ASSEMBLEAR – JUÍZO – EXAME DOS REQUISITOS LEGAIS – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. As deliberações quanto ao deságio, a forma de pagamento do crédito e o prazo de carência, ostentam natureza negocial entre as partes, que levam em consideração a situação econômica financeira da empresa, de sorte que descabe o controle judicial sobre aspectos econômico-financeiros do plano. (N.U 1004957-78.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 29/06/2022, Publicado no DJE 01/07/2022) No mesmo sentido, está o parecer: “(...) Pois bem, em casos dessa espécie, sempre início frisando os princípios norteadores da preservação da empresa, para tanto, deixo claro que a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeiras do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica, a teor do art. 47, da Lei nº 11.101/05. Analisando o caso em testilha, de notar-se que, de fato, a assembleia de credores é soberana em suas decisões quanto aos planos de recuperação judicial. Contudo, tais deliberações estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, requisitos esses que estão sujeitos a controle judicial, como qualquer negócio jurídico está sujeito a controle quanto a licitude do pacto, mesmo no âmbito privado, dado que o negócio somente é válido se, nos termos do art. 104 do CC/02, contiver objeto lícito, possível, determinado ou determinável, na falta de tais requisitos, o negócio é inválido. Aliás, nesse sentido já decidiu o Eg. STJ: “RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. APROVAÇÃO DE PLANO PELA ASSEMBLEIA DE CREDORES. INGERÊNCIA JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CONTROLE DE LEGALIDADE DAS DISPOSIÇÕES DO PLANO. POSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. 1. A assembleia de credores é soberana em suas decisões quanto aos planos de recuperação judicial. Contudo, as deliberações desse plano estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, requisitos esses que estão sujeitos a controle judicial. 2. Recurso especial conhecido e não provido.” (REsp 1314209 / SP, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 01/06/2012) – grifei. Assim, vislumbro perfeitamente possível a análise, por parte do Judiciário, das providências tomadas em Assembleia Geral de Credores, mormente, quando já demonstrado que sua soberania não é absoluta, de sorte que a vontade dos credores, ao aprovarem o plano, deve ser respeitada nos limites da Lei, sendo papel do Estado, por intermédio do exercício da função jurisdicional, exercer o controle sobre a licitude do conteúdo disposta em decisão da Assembleia Geral de Credores, com vistas à recuperação de empresa em crise. (...) Diante disso, depreende-se que a decisão agravada não merece reparos, vez que analisou detidamente as questões no tocante da legalidade do plano, tendo inclusive analisado algumas ressalvas apresentadas pelos credores, bem como, no que diz respeito as demais premissas, prevaleceu a soberania da AGC. No tocante a questão atinente as cláusulas do plano como as condições de Pagamento para os credores de Classe III - quirografários, que conta com deságio de 90%, os argumentos da agravante não foram o bastante para obstar o processamento da recuperação, uma vez que a maioria dos credores de todas as classes, inclusive, a classe da recorrente, anuíram com a homologação, não havendo que se falar em reforma da r. decisão nessa parte. Portanto, uma vez aprovado o plano de recuperação judicial, todos os credores devem a ele se submeter, inclusive aqueles que votaram pela sua rejeição. (...) Desse modo, entendo que não há como acatar a premissa argumentativa da ora agravante, sobretudo, porque ataca tão somente a forma de pagamento proposta no plano de recuperação judicial, visto que, anular o ato eminente privativo quanto a forma de pagamento dos credores significa, no meu entendimento, o mesmo que adentrar nas estratégias de soerguimento da recuperanda, objeto de direito disponível, de natureza privativa dos credores e deliberado em Assembleia Geral, não sendo controle de legalidade do plano”. A propósito, colaciono julgado recente deste Tribunal: “Ementa: Direito Civil e empresarial. Agravo de Instrumento. Recuperação judicial. homologação do plano de recuperação judicial. controle judicial de legalidade do plano. violação ao princípio da paridade entre credores. inocorrência. possibilidade de tratamento diferenciado a credores da mesma classe. criação de subclasses com critérios objetivos. Impugnação às condições de pagamento estabelecidas no plano. Deságio e prazos para pagamento. Ausência de qualquer aspecto de ilegalidade. critérios econômico-financeiros. soberania da assembleia geral de credores para avaliar a viabilidade econômica da proposta. Recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que homologou o Plano de Recuperação Judicial aprovado pela maioria dos credores votantes durante a Assembleia Geral de Credores, com pontuais ressalvas no que toca à premissa relativa à supressão das garantias e o prazo de pagamento dos débitos trabalhistas. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em definir (i) se a criação e inclusão de subclasses no plano de recuperação judicial durante a assembleia de credores caracteriza violação ao princípio da paridade entre credores; (ii) se as tratativas individuais dos recuperandos com determinados credores e a alteração do plano durante o conclave constituem elementos suficientes à caracterização de conluio fraudulento e, consequentemente, invalidade da deliberação assemblear; (iii) se as condições de pagamento dispostas no plano aprovado durante a AGC caracterizam abuso de direito e/ou afronta aos princípios que regem a recuperação judicial. III. Razões de decidir 3. É da própria essência do processo de Recuperação Judicial, no momento da Assembleia Geral de Credores, a “ampla negociação entre os envolvidos” (COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – Direito e Empresa. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2014), sendo que concessões de prazos e/ou descontos para pagamento dos créditos, alteração ou ajustes de determinadas premissas, ou mesmo outras mudanças mais substanciais do plano originalmente, a exemplo da criação de subclasses, inserem-se, naturalmente, entre as tratativas negociais passíveis de deliberação entre devedores e credores durante a discussão assemblear. 4. Nos termos da jurisprudência do STJ, “a Lei de Recuperação de Empresas e Falências consagra o princípio da paridade entre credores. Apesar de se tratar de um princípio norteador da falência, seus reflexos se irradiam na recuperação judicial, permitindo o controle de legalidade do plano de recuperação sob essa perspectiva. A criação de subclasses entre os credores da recuperação judicial é possível desde que seja estabelecido um critério objetivo, justificado no plano de recuperação judicial, abrangendo credores com interesses homogêneos, ficando vedada a estipulação de descontos que impliquem verdadeira anulação de direitos de eventuais credores isolados ou minoritários” (STJ - Terceira Turma - REsp 1634844/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019). 5. “O plano de recuperação judicial, aprovado em assembleia pela vontade dos credores nos termos exigidos pela legislação de regência, possui índole marcadamente contratual, (e), como corolário, ao juízo competente não é dado imiscuir-se nas especificidades do conteúdo econômico do acordo estipulado entre devedor e credores”, sendo que “a concessão de prazos e descontos para pagamento dos créditos novados insere-se dentre as tratativas negociais passíveis de deliberação pelo devedor e pelos credores quando da discussão assemblear sobre o plano de recuperação apresentado” (STJ - Terceira Turma - REsp 1631762/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 19/06/2018, DJe 25/06/2018). 6. Não havendo previsão de descontos ou concessões que impliquem em verdadeira anulação de direitos de credores isolados ou minoritários, nem manifesto prejuízo aos interesses dos credores dissidentes, muitos menos indícios de fraude no processo de negociação/aprovação do plano, não há motivo a justificar a intromissão do Judiciário nos termos do plano regularmente aprovado. IV. Dispositivo 7. Recurso desprovido. (N.U 1018050-40.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO APARECIDO GUEDES, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/02/2025, Publicado no DJE 12/02/2025)”. Diante do exposto, em consonância com o parecer, NEGO PROVIMENTO ao agravo. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Processo nº 1033588-61.2024.8.11.0000

ID: 314214351

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1033588-61.2024.8.11.0000

Data de Disponibilização: 02/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ESPóLIO DE ALEXANDRE AUGUSTIM REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO ALEXANDRE AUGUSTIN LOUIZE HONORATO DE FREITAS

Acórdão

Advogados:

EUCLIDES RIBEIRO DA SILVA JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

EDUARDO HENRIQUE VIEIRA BARROS

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1033588-61.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Liquidação] Relator: Des(a). SEBASTIAO … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1033588-61.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Liquidação] Relator: Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [MARIA LUCIA FERREIRA TEIXEIRA - CPF: 851.633.257-87 (ADVOGADO), VIBRA ENERGIA S.A - CNPJ: 34.274.233/0001-02 (AGRAVANTE), LOUIZE HONORATO DE FREITAS - CPF: 438.972.311-15 (AGRAVADO), Espólio de Alexandre Augustim registrado(a) civilmente como ALEXANDRE AUGUSTIN - CPF: 575.844.351-49 (AGRAVADO), EUCLIDES RIBEIRO DA SILVA JUNIOR - CPF: 630.715.331-87 (ADVOGADO), EDUARDO HENRIQUE VIEIRA BARROS - CPF: 704.891.571-49 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO EMPRESARIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SOBERANIA DA ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES. LIMITES DO CONTROLE JUDICIAL DE LEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que manteve a homologação do plano de recuperação judicial aprovado em assembleia geral de credores no bojo da Ação de Recuperação Judicial nº 0014639-12.2015.8.11.0003, com fundamento na observância da legalidade e nas prerrogativas do juízo recuperacional. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se é possível ao Poder Judiciário revisar cláusulas do plano de recuperação judicial aprovado por assembleia geral de credores, sobretudo quanto a condições de pagamento como deságios e períodos de carência. III. Razões de decidir 3. A homologação do plano de recuperação judicial deve observar o controle de legalidade, competindo ao Judiciário apenas verificar sua conformidade com a Lei nº 11.101/2005. 4. A assembleia geral de credores é soberana para aprovar cláusulas que envolvam negociação, como deságios e prazos, desde que respeitadas as categorias legais de credores e os limites da lei de regência. 5. Não demonstrada ilegalidade no plano aprovado, inexiste margem para intervenção judicial. IV. Dispositivo e tese 6. Agravo de instrumento desprovido. Tese de julgamento: "1. A assembleia geral de credores é soberana para aprovar o plano de recuperação judicial, incluindo cláusulas de deságio e carência, desde que respeitadas as categorias de credores e os limites da Lei nº 11.101/2005. 2. O controle judicial se limita à legalidade, sendo vedado reexame de conveniência ou oportunidade." Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.101/2005, arts. 47, 53 e 58. Jurisprudência relevante: (STJ - Terceira Turma - REsp 1631762/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 19/06/2018, DJe 25/06/2018) e (STJ - Terceira Turma - REsp 1634844/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019). R E L A T Ó R I O Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, interposto por VIBRA ENERGIA S/A, em face de decisão exarada pelo Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis-MT que, nos autos de Ação de Recuperação Judicial nº. 0014639-12.2015.8.11.0003 código 800652, proposta por LOUIZE HONORATO DE FREITAS e ALEXANDRE AUGUSTIN, ambos em recuperação judicial, HOMOLOGOU o plano de recuperação judicial, aprovado em Assembleia Geral de Credores. Em síntese, após demonstrar o cabimento, defender a tempestividade do recurso e comprovar o recolhimento de custas, a Agravante alega que a decisão deve ser reformada, diante de diversas ilegalidades e irregularidades, dentre elas: condições de Pagamento para os credores de Classe III - quirografários- sacrifício desproporcional – conta com deságio de 90%, que demonstra que a empresa não pode se soerguer por conta própria, e sim mediante o sacrifício dos credores”; período de carência de 12 meses contados da homologação e pagamento parcelado (40 parcelas semestrais). Diz que “(...) a correção monetária incidindo sobre respectivo Crédito, correspondente à Taxa Referencial-TR, desde a Data de Homologação Judicial do Plano, traz um deságio implícito, não remunerando adequadamente o crédito não existe no plano de recuperação sequer a demonstração da fonte de obtenção dos recursos que farão frente às dívidas da recuperanda. Por outro lado, Credores da Classe IV, será aplicado o deságio de 60% (sessenta por cento) e o pagamento em 12 (doze) parcelas semestrais”. Defende a inviabilidade do plano de recuperação judicial, contrariando-se o artigo 53, da Lei n. 11.101/2005, ressaltando-se que “(...) os elevados deságios, configurando verdadeiro perdão de dívidas, contraria o artigo 47 da Lei 11.101/05, o qual dispõe acerca da preservação dos interesses dos credores, que devem ser equalizados com os do recuperando, não havendo que se falar em sobreposição de um interesse sobre o outro, ou seja, devem coexistir de forma harmônica e equânime”. Sustenta a viabilidade do controle de legalidade do plano aprovado em assembleia. Afirma que houve tratamento desigual entre credores, salientando que “(...) O plano cria uma diferença substancial entre os deságios aplicados a credores de diferentes classes (90% para quirografários e 60% para microempresas). O art. 45 da Lei 11.101/2005 exige que as condições sejam equilibradas, respeitando a proporcionalidade e a igualdade entre credores de mesma classe, o que não foi observado”; que “(...) Não se pode admitir que alguns credores quirografários tenham tratamento diferenciado, em detrimento de outros, sem a justificativa plausível, sob pena de afronta ao artigo 58, § 2º da Lei n. 11.101/2005 e violação ao princípio da “pars conditio creditorum””. Alegando estarem presentes os requisitos que justificariam o deferimento do pleito liminar, requer “(...) seja atribuída a TUTELA ANTECIPADA ao Agravo de Instrumento sob exame, inaudita altera pars, para suspender a r. decisão agravada, consubstanciado no artigo 1.019, I, do Código de Processo Civil; (...) c) seja, ao final, DADO PROVIMENTO ao presente agravo de instrumento, confirmando a tutela antecipada requerida, para reformar a r. decisão agravada, para que seja observado o disposto no artigo 47, 58, §2º da Lei nº. 11.101/2005 e art. 187 do Código Civil, que dispõe acerca da preservação dos interesses dos credores, que devem ser equalizados com os do recuperando, sem a imposição de deságios excessivos, que representa verdadeiro enriquecimento sem causa, bem como a observância do princípio ‘par conditio creditorum””. O pleito liminar foi indeferido. Em contrarrazões, pugna-se pelo desprovimento do agravo. A Procuradoria-Geral de Justiça, por meio de parecer da lavra do Dr. José Zuqueti – Procurador de Justiça – opina pelo desprovimento do agravo. É o relatório. V O T O R E L A T O R O objeto deste agravo consiste em analisar e decidir se merece ou não reforma a decisão que, nos autos de Ação de Recuperação Judicial nº. 0014639-12.2015.8.11.0003 código 800652, proposta por LOUIZE HONORATO DE FREITAS e ALEXANDRE AUGUSTIN, ambos em recuperação judicial, HOMOLOGOU o plano de recuperação judicial, aprovado em Assembleia Geral de Credores. Pois bem. Após a devida análise, verifica-se que o agravo não comporta o provimento almejado. É que não se verifica ilegalidade no plano homologado, após a aprovação pelos credores em assembleia geral, sendo os atos devidamente observados pelo judiciário, que detém o poder, juntamente com Ministério Público, para analisar os critérios estritamente legais, à luz da legislação pertinente. Dentro desse contexto, malgrado as alegações, é viável a negociação (próprio da assembleia de credores), respeitando-se as categorias de credores, quanto a deságios, carência e demais condições, a fim de que haja o soerguimento dos recuperandos, com o objetivo de continuidade das atividades empresariais. Assim, submetido ao plano da legalidade pelo Juízo singular, com a participação do “Parquet” Estadual, mostra-se soberana a decisão da assembleia e legal a homologação do plano de recuperação judicial. A esse respeito, ratifico a jurisprudência adotada quando da análise liminar: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – HOMOLOGAÇÃO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL APROVADO EM ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES – DESÁGIO, CARÊNCIA E PRAZO DE PAGAMENTO – INCONFORMISMO – AUSÊNCIA DE ABUSO E/OU ILEGALIDADE – NATUREZA NEGOCIAL – VIABILIDADE ECONÔMICA DO PLANO – SOBERANIA ASSEMBLEAR – JUÍZO – EXAME DOS REQUISITOS LEGAIS – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. As deliberações quanto ao deságio, a forma de pagamento do crédito e o prazo de carência, ostentam natureza negocial entre as partes, que levam em consideração a situação econômica financeira da empresa, de sorte que descabe o controle judicial sobre aspectos econômico-financeiros do plano. (N.U 1004957-78.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 29/06/2022, Publicado no DJE 01/07/2022) No mesmo sentido, está o parecer: “(...) Pois bem, em casos dessa espécie, sempre início frisando os princípios norteadores da preservação da empresa, para tanto, deixo claro que a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeiras do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica, a teor do art. 47, da Lei nº 11.101/05. Analisando o caso em testilha, de notar-se que, de fato, a assembleia de credores é soberana em suas decisões quanto aos planos de recuperação judicial. Contudo, tais deliberações estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, requisitos esses que estão sujeitos a controle judicial, como qualquer negócio jurídico está sujeito a controle quanto a licitude do pacto, mesmo no âmbito privado, dado que o negócio somente é válido se, nos termos do art. 104 do CC/02, contiver objeto lícito, possível, determinado ou determinável, na falta de tais requisitos, o negócio é inválido. Aliás, nesse sentido já decidiu o Eg. STJ: “RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. APROVAÇÃO DE PLANO PELA ASSEMBLEIA DE CREDORES. INGERÊNCIA JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CONTROLE DE LEGALIDADE DAS DISPOSIÇÕES DO PLANO. POSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. 1. A assembleia de credores é soberana em suas decisões quanto aos planos de recuperação judicial. Contudo, as deliberações desse plano estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, requisitos esses que estão sujeitos a controle judicial. 2. Recurso especial conhecido e não provido.” (REsp 1314209 / SP, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 01/06/2012) – grifei. Assim, vislumbro perfeitamente possível a análise, por parte do Judiciário, das providências tomadas em Assembleia Geral de Credores, mormente, quando já demonstrado que sua soberania não é absoluta, de sorte que a vontade dos credores, ao aprovarem o plano, deve ser respeitada nos limites da Lei, sendo papel do Estado, por intermédio do exercício da função jurisdicional, exercer o controle sobre a licitude do conteúdo disposta em decisão da Assembleia Geral de Credores, com vistas à recuperação de empresa em crise. (...) Diante disso, depreende-se que a decisão agravada não merece reparos, vez que analisou detidamente as questões no tocante da legalidade do plano, tendo inclusive analisado algumas ressalvas apresentadas pelos credores, bem como, no que diz respeito as demais premissas, prevaleceu a soberania da AGC. No tocante a questão atinente as cláusulas do plano como as condições de Pagamento para os credores de Classe III - quirografários, que conta com deságio de 90%, os argumentos da agravante não foram o bastante para obstar o processamento da recuperação, uma vez que a maioria dos credores de todas as classes, inclusive, a classe da recorrente, anuíram com a homologação, não havendo que se falar em reforma da r. decisão nessa parte. Portanto, uma vez aprovado o plano de recuperação judicial, todos os credores devem a ele se submeter, inclusive aqueles que votaram pela sua rejeição. (...) Desse modo, entendo que não há como acatar a premissa argumentativa da ora agravante, sobretudo, porque ataca tão somente a forma de pagamento proposta no plano de recuperação judicial, visto que, anular o ato eminente privativo quanto a forma de pagamento dos credores significa, no meu entendimento, o mesmo que adentrar nas estratégias de soerguimento da recuperanda, objeto de direito disponível, de natureza privativa dos credores e deliberado em Assembleia Geral, não sendo controle de legalidade do plano”. A propósito, colaciono julgado recente deste Tribunal: “Ementa: Direito Civil e empresarial. Agravo de Instrumento. Recuperação judicial. homologação do plano de recuperação judicial. controle judicial de legalidade do plano. violação ao princípio da paridade entre credores. inocorrência. possibilidade de tratamento diferenciado a credores da mesma classe. criação de subclasses com critérios objetivos. Impugnação às condições de pagamento estabelecidas no plano. Deságio e prazos para pagamento. Ausência de qualquer aspecto de ilegalidade. critérios econômico-financeiros. soberania da assembleia geral de credores para avaliar a viabilidade econômica da proposta. Recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que homologou o Plano de Recuperação Judicial aprovado pela maioria dos credores votantes durante a Assembleia Geral de Credores, com pontuais ressalvas no que toca à premissa relativa à supressão das garantias e o prazo de pagamento dos débitos trabalhistas. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em definir (i) se a criação e inclusão de subclasses no plano de recuperação judicial durante a assembleia de credores caracteriza violação ao princípio da paridade entre credores; (ii) se as tratativas individuais dos recuperandos com determinados credores e a alteração do plano durante o conclave constituem elementos suficientes à caracterização de conluio fraudulento e, consequentemente, invalidade da deliberação assemblear; (iii) se as condições de pagamento dispostas no plano aprovado durante a AGC caracterizam abuso de direito e/ou afronta aos princípios que regem a recuperação judicial. III. Razões de decidir 3. É da própria essência do processo de Recuperação Judicial, no momento da Assembleia Geral de Credores, a “ampla negociação entre os envolvidos” (COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – Direito e Empresa. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2014), sendo que concessões de prazos e/ou descontos para pagamento dos créditos, alteração ou ajustes de determinadas premissas, ou mesmo outras mudanças mais substanciais do plano originalmente, a exemplo da criação de subclasses, inserem-se, naturalmente, entre as tratativas negociais passíveis de deliberação entre devedores e credores durante a discussão assemblear. 4. Nos termos da jurisprudência do STJ, “a Lei de Recuperação de Empresas e Falências consagra o princípio da paridade entre credores. Apesar de se tratar de um princípio norteador da falência, seus reflexos se irradiam na recuperação judicial, permitindo o controle de legalidade do plano de recuperação sob essa perspectiva. A criação de subclasses entre os credores da recuperação judicial é possível desde que seja estabelecido um critério objetivo, justificado no plano de recuperação judicial, abrangendo credores com interesses homogêneos, ficando vedada a estipulação de descontos que impliquem verdadeira anulação de direitos de eventuais credores isolados ou minoritários” (STJ - Terceira Turma - REsp 1634844/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019). 5. “O plano de recuperação judicial, aprovado em assembleia pela vontade dos credores nos termos exigidos pela legislação de regência, possui índole marcadamente contratual, (e), como corolário, ao juízo competente não é dado imiscuir-se nas especificidades do conteúdo econômico do acordo estipulado entre devedor e credores”, sendo que “a concessão de prazos e descontos para pagamento dos créditos novados insere-se dentre as tratativas negociais passíveis de deliberação pelo devedor e pelos credores quando da discussão assemblear sobre o plano de recuperação apresentado” (STJ - Terceira Turma - REsp 1631762/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 19/06/2018, DJe 25/06/2018). 6. Não havendo previsão de descontos ou concessões que impliquem em verdadeira anulação de direitos de credores isolados ou minoritários, nem manifesto prejuízo aos interesses dos credores dissidentes, muitos menos indícios de fraude no processo de negociação/aprovação do plano, não há motivo a justificar a intromissão do Judiciário nos termos do plano regularmente aprovado. IV. Dispositivo 7. Recurso desprovido. (N.U 1018050-40.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO APARECIDO GUEDES, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/02/2025, Publicado no DJE 12/02/2025)”. Diante do exposto, em consonância com o parecer, NEGO PROVIMENTO ao agravo. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Processo nº 1013662-60.2025.8.11.0000

ID: 283637259

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1013662-60.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 29/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ZOOTEC INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS AGROPECUARIOS LTDA

Decisão

Advogados:

DUILIO PIATO JUNIOR

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DECIO CRISTIANO PIATO

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AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) 1013662-60.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: MARINA MOYSES AGRAVADO: ZOOTEC INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS AGROPECUARIOS LTDA Visto. Trata-se de Recurso de Agravo de Instrumento… AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) 1013662-60.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: MARINA MOYSES AGRAVADO: ZOOTEC INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS AGROPECUARIOS LTDA Visto. Trata-se de Recurso de Agravo de Instrumento interposto por MARINA MOYSES contra a decisão interlocutória proferida pelo Juízo da Segunda Vara Cível da Comarca de Rondonópolis nos autos da Ação de Execução Extrajudicial identificada pela numeração única: 0001408-78.2016.8.11.0003, movida por ZOOTEC INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS AGROPECUARIOS LTDA, que deferiu o pedido do exequente, ora agravado, determinando a penhora de 20% (vinte por cento) sobre o benefício previdenciário percebido pela parte executada, ora agravada, até a integral satisfação do débito, consistente em R$ 33.589,73 (trinta e três mil e quinhentos e oitenta e nove reais e setenta e três centavos – Id: 188761205 – Ação de Origem). Inconformada, a parte agravante argumenta que a decisão objurgada violou o artigo 833, inciso IV, do Código de Processo Civil, que prevê a impenhorabilidade dos vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões e valores afins. Continua afirmando que o entendimento consolidado na jurisprudência é o de que os benefícios previdenciários são absolutamente impenhoráveis. Ao final, pugna pelo recebimento e provimento do agravo de instrumento, para que seja reformada a decisão atacada, indeferindo o pedido de penhora sobre o benefício previdenciário da parte recorrente (Id: 283409372). Por sua vez, a parte agravada apresentou contrarrazões, alegando que agiu com acerto o Juízo de Origem, asseverando que inexiste provas de que a penhora prejudique a subsistência do devedor e requerendo o desprovimento do recurso (Id: 288487392). É o relatório. Decido. Preambularmente é importante destacar que a submissão do presente caso à Turma Julgadora deste e. TJMT não é necessária quando a decisão está em consonância ou em manifesto confronto com a jurisprudência uníssona do Superior Tribunal de Justiça, situação que autoriza o julgamento monocrático do recurso, conforme artigo 932, incisos IV e V, do Código de Processo Civil. Essas decisões visam desafogar os Órgãos Colegiados, dando efetividade aos princípios da celeridade e da economia processual, respeitando as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Sobre o tema, comenta Daniel Amorim Assumpção Neves que este dispositivo (artigo 932) deve ser interpretado ampliativamente, de forma a ser aplicável sempre que existir precedente sobre a matéria de tribunal superior, ainda que não exista Súmula sobre o tema e que a matéria não tenha sido objeto de julgamento de causas repetitivas ou do incidente de assunção de competência[1]. Conforme relatado anteriormente, trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por MARINA MOYSES contra a decisão interlocutória proferida nos autos da ação de execução de título extrajudicial movida por ZOOTEC INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS AGROPECUARIOS LTDA. A controvérsia restringe-se na legalidade ou ilegalidade da penhora de 20% (vinte por cento) sobre a aposentadoria da devedora, ora agravante. Inicialmente, faz-se necessário ressaltar que, nos termos do art. 833, IV, do Código de Processo Civil, são impenhoráveis: “Art. 833. São impenhoráveis: (...) IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º ;” Todavia, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem mitigado essa regra de impenhorabilidade, admitindo a constrição parcial de verbas de natureza alimentar em situações excepcionais, desde que observados cumulativamente os seguintes requisitos: a) esgotamento dos meios ordinários de execução; b) preservação do mínimo existencial do devedor; c) proporcionalidade da medida; d) razoabilidade do percentual constritado. Nesse sentido, confira-se: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ . REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. 1. Cuida-se, na origem, de ação de execução . 2. A regra geral da impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos, entre outros (art. 649, IV, do CPC/73 - art. 833, IV, do CPC/15), pode ser excepcionada quando for preservado percentual capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família . Precedentes. 3. O reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível. 4 . Agravo interno não provido.” (STJ - AgInt no REsp: 1948607 AC 2021/0215583-9, Relator.: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 29/11/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/12/2021)(destaquei) O mesmo entendimento encontra-se consolidado no 1.582.475/MG, que fixou a seguinte tese: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE VALORES EM CONTA SALÁRIO. EXCEPCIONAL POSSIBILIDADE. QUESTÃO A SER SOPESADA COM BASE NA TEORIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE SE EXCEPCIONAR A REGRA DO ARTIGO 649, IV, DO CPC/73, QUANDO O MONTANTE DO BLOQUEIO SE REVELE RAZOÁVEL EM RELAÇÃO À REMUNERAÇÃO PELO DEVEDOR PERCEBIDA, O QUE, NÃO AFRONTA A DIGNIDADE OU A SUBSISTÊNCIA DO DEVEDOR E DE SUA FAMÍLIA. PRECEDENTE ESPECÍFICO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.”(STJ - AgInt no REsp: 1582475 MG 2016/0041683-1, Relator.: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 07/03/2017, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/03/2017) (destaquei) Nesse sentido, vejamos como este e. Tribunal de Justiça tem decidido, “in verbis”: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA QUE RECAIU SOBRE PARTE DE VERBA DA NATUREZA SALARIAL/ALIMENTAR DO DEVEDOR. PENHORA DE 30% DA VERBA SALARIAL. PERCENTUAL QUE NÃO PREJUDICA A SUBSISTÊNCIA DO EXECUTADO. ENTENDIMENTO DO STJ. DECISÃO REFORMADA EM PARTE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de impenhorabilidade de valor bloqueado em conta bancária, sob a alegação de se tratar de verba salarial. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se é possível a penhora de valor oriundo de salário creditado em conta corrente da agravante. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. “A regra geral da impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos, entre outros (art. 649, IV, do CPC/73 - art. 833, IV, do CPC/15), pode ser excepcionada quando for preservado percentual capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família. Precedentes.” (AgInt no REsp 1948607/AC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 29/11/2021, DJe 01/12/2021). 4. O desbloqueio integral não é cabível, pois a retenção de 30% do salário mostra-se proporcional e razoável, compatível com os precedentes jurisprudenciais. 5. Deverá ser desbloqueado o valor que exceder os 30% da verba salarial, a ser apurado no juízo de origem. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. É possível a penhora de até 30% de valor depositado em conta corrente oriundo de verba salarial. 2. Deve ser desbloqueado o montante que exceder a esse percentual, mediante apuração no juízo de origem.” (N.U 1020555-04.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 20/05/2025, Publicado no DJE 21/05/2025) (destaquei) “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA DE SALÁRIO. RELATIVIZAÇÃO DA REGRA DE IMPENHORABILIDADE. POSSIBILIDADE. PRECLUSÃO TEMPORAL PARA IMPUGNAÇÃO DOS CÁLCULOS. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que acolheu parcialmente a exceção de pré-executividade oposta pelo executado, limitando a penhora de seus rendimentos a 30% do valor líquido recebido mensalmente. O recorrente sustenta a impenhorabilidade dos salários e a ausência de demonstrativo do crédito exigido no cumprimento de sentença. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é possível a penhora de 30% dos rendimentos do executado para a satisfação do crédito decorrente de sentença condenatória, mesmo não se tratando de obrigação alimentar; e (ii) estabelecer se a ausência de impugnação tempestiva aos cálculos do exequente configura preclusão temporal, impedindo a rediscussão do tema. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite a relativização da impenhorabilidade de salários quando a constrição não compromete a subsistência digna do devedor e de sua família. 4. No caso concreto, o percentual de 30% dos rendimentos líquidos do executado respeita o critério de razoabilidade e proporcionalidade, permitindo a satisfação do crédito sem prejuízo da manutenção digna do devedor. 5. O executado teve oportunidade de impugnar os cálculos apresentados no cumprimento de sentença, mas deixou transcorrer o prazo legal sem manifestação, caracterizando a preclusão temporal nos termos dos artigos 507 e 525 do Código de Processo Civil. 6. A exceção de pré-executividade não se presta a rediscutir questões preclusas, sendo cabível apenas para matérias de ordem pública ou que prescindam de dilação probatória. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Agravo de instrumento desprovido. Tese de julgamento: 1. É possível a penhora de até 30% dos rendimentos líquidos do devedor, ainda que de natureza salarial, desde que não comprometa sua subsistência e a de sua família. 2. A preclusão temporal impede a rediscussão de cálculos homologados quando a parte teve oportunidade de impugná-los e não o fez no prazo legal.” (N.U 1032133-61.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 16/04/2025, Publicado no DJE 22/04/2025) (destaquei) “Ementa: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPUGNAÇÃO À PENHORA. BLOQUEIO DE VALORES EM CONTA BANCÁRIA. NATUREZA SALARIAL. IMPENHORABILIDADE RELATIVA. POSSIBILIDADE DE PENHORA PARCIAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de Agravo de Instrumento interposto por Paula Duarte Pereira contra decisão do Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra, que rejeitou o pedido de impugnação à penhora de valores bloqueados em sua conta bancária no âmbito da Ação de Execução de Título Extrajudicial nº 0006674-89.2013.8.11.0055. A Recorrente alega que o montante de R$ 6.876,42 bloqueado possui natureza alimentar, por ser oriundo de salário recebido na conta mantida junto ao Banco Mercado Pago, sendo, portanto, impenhorável, conforme o art. 833, IV, do CPC. O pedido de efeito suspensivo foi deferido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se os valores bloqueados possuem natureza salarial e, portanto, são impenhoráveis nos termos do art. 833, IV, do CPC; e (ii) determinar se é possível admitir a penhora parcial sobre tais valores sem comprometer a subsistência da Recorrente. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O art. 833, IV, do CPC estabelece a impenhorabilidade de verbas de natureza alimentar, incluindo salários e remunerações destinadas à subsistência do devedor e de sua família. 4. No caso concreto, a Recorrente comprovou que o montante bloqueado possui natureza salarial, enquadrando-se na proteção prevista no art. 833, IV, do CPC. 5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite a penhora parcial de verbas salariais, desde que preservado percentual suficiente para garantir a dignidade do devedor e sua família (EREsp nº 1.582.475/MG e AgInt no AREsp nº 2.279.305/MG). 6. Considerando o princípio da proporcionalidade e a inexistência de prova de que o bloqueio parcial comprometeria a subsistência da Recorrente, entende-se que a penhora de 30% do valor constritado não viola os direitos fundamentais da parte agravante. 7. A penhora parcial equilibra os interesses do credor e do devedor, permitindo a satisfação parcial da dívida sem inviabilizar a subsistência da Recorrente e sua família. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. A impenhorabilidade de verbas salariais prevista no art. 833, IV, do CPC é relativa, sendo possível a penhora parcial, desde que preservado percentual suficiente para garantir a dignidade do devedor e de sua família. 2. A penhora parcial de 30% dos valores constritados é admissível quando não demonstrado que tal medida compromete a subsistência do devedor. Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 833, IV. Jurisprudência relevante citada: EREsp nº 1.582.475/MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Corte Especial, j. 03.10.2018; AgInt no AREsp nº 2.279.305/MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 14.08.2023.” (N.U 1003369-31.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 04/04/2025) (destaquei) “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL - PENHORA DE VALORES EM CONTA BANCÁRIA - IMPENHORABILIDADE DE VERBAS DE NATUREZA SALARIAL - RELATIVIZAÇÃO - POSSIBILIDADE - LIMITAÇÃO A 30%. - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que reconheceu a impenhorabilidade de valores bloqueados em conta bancária da executada, ao fundamento de que se tratavam de verbas salariais destinadas ao sustento da devedora e de sua família. 2. A decisão agravada determinou o desbloqueio integral dos valores penhorados. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. A questão em discussão consiste em saber se a impenhorabilidade de salários pode ser relativizada para permitir a constrição de parte dos rendimentos do devedor, desde que preservado montante suficiente para sua subsistência e de sua família. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A jurisprudência do STJ admite a relativização da regra de impenhorabilidade de salários quando a constrição não compromete a subsistência do devedor e de sua família. 5. No caso concreto, a executada aufere rendimentos mensais superiores à média nacional, circunstância que permite a penhora limitada a 30% dos valores depositados na conta bancária. 6. A decisão agravada deve ser reformada parcialmente, para possibilitar a penhora de 30% dos rendimentos líquidos da executada, garantindo o pagamento da dívida sem prejuízo de sua subsistência. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Agravo de instrumento conhecido e parcialmente provido para autorizar a penhora de 30% dos rendimentos líquidos da executada. Tese de julgamento: “É possível a penhora de até 30% dos rendimentos líquidos do devedor, ainda que de natureza salarial, desde que não comprometa sua subsistência e a de sua família.” Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 833, IV e § 2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 1.518.169/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Corte Especial, j. 03.10.2018, DJe 27.02.2019; STJ, REsp 1.658.069/GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 14.11.2017, DJe 20.11.2017.” (N.U 1036672-70.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 12/03/2025, Publicado no DJE 15/03/2025) (destaquei) No presente caso, conforme consta dos autos, foram esgotadas todas as diligências ordinárias de constrição patrimonial: pesquisas via SISBAJUD, consultas ao RENAJUD, diligências pelo INFOJUD, além de tentativas de localização de bens móveis e imóveis. Todas infrutíferas. Diante disso, está caracterizada a frustração dos meios típicos de execução, o que autoriza a análise da possibilidade de penhora atípica, inclusive sobre verbas em regra protegidas, como as de natureza alimentar. Contudo, a constrição de 20% (vinte por cento) dos proventos previdenciários da agravante exige temperamentos à luz das peculiaridades do caso concreto, notadamente: a) a agravante possui 61 anos de idade e é portadora de enfermidades, conforme laudos médicos anexos; b) sua renda líquida mensal, conforme extrato do INSS, gira em torno de R$ 3.025,45; c) possui dois empréstimos consignados ativos, com parcelas que, somadas, alcançam R$ 1.622,73, comprometendo mais de 50% da renda líquida. Desse modo, o bloqueio adicional de 20% (cerca de R$ 600,00) sobre os proventos, aliado ao já elevado comprometimento com consignações, pode representar comprometimento indevido da subsistência da agravante. A jurisprudência admite a penhora de até 30% (trinta por cento) sobre rendimentos de natureza alimentar, desde que demonstrada a preservação do mínimo existencial, o que não se confirma plenamente neste caso diante das condições financeiras e de saúde da recorrente. Nesse contexto, a redução do percentual de penhora para 10% (dez por cento) dos proventos líquidos da agravante atende ao princípio da proporcionalidade, garante a efetividade da execução e preserva a dignidade da devedora, como preconizado pelos precedentes do STJ e deste Tribunal. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, para reduzir o percentual de penhora dos proventos de aposentadoria da agravante de 20% (vinte por cento) para 10% (dez por cento), devendo o Juízo de Origem: a) Proceder à penhora de 10% (dez por cento) dos rendimentos líquidos mensais da agravante; b) Determinar a expedição de ofício ao INSS para a devida implementação do desconto em folha; c) Determinar que os valores sejam depositados em conta judicial vinculada ao processo executivo; d) Preservar 90% (noventa por cento) dos proventos para garantir a subsistência da executada. Publique-se. Intima-se. Cumpra-se. Após o transcurso do prazo legal, arquive-se com as baixas necessárias. Comunique-se o Juízo de Origem acerca do teor da decisão. Cuiabá-MT, data registrada no sistema. Des. Luiz Octávio O. Saboia Ribeiro Relator [1] NOVO Código de Processo Civil, p. 1513, 2016 a ed., Jus PODIVM

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Processo nº 1033477-77.2024.8.11.0000

ID: 259261850

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1033477-77.2024.8.11.0000

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

GONCALO PAPAZIAN

Acórdão

Advogados:

WANDER MARTINS BERNARDES

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1033477-77.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Esbulho / Turbação / Ameaça] Relator: De… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1033477-77.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Esbulho / Turbação / Ameaça] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [SAMIR NICOLA SADDI - CPF: 078.939.061-20 (AGRAVANTE), GONCALO PAPAZIAN - CPF: 111.175.241-91 (AGRAVADO), WANDER MARTINS BERNARDES - CPF: 004.163.961-86 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PROVIDO. UNANIME. E M E N T A AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO – LIMINAR DEFERIDA NA ORIGEM – REVOGAÇÃO – ARTIGO 561 DO CPC – AUSÊNCIA DE REQUISITOS PARA CONCESSÃO LIMINAR – DOCUMENTOS APRESENTADOS PELO AGRAVANTE COMPROVANDO POSSE ANTIGA – ESCRITURA DE 1974 E COMPROVANTES DE ITR – FATO CONTROVERTIDO – NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA – MEDIDA LIMINAR INCOMPATÍVEL COM A COMPLEXIDADE DO CASO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão proferida nos autos de ação de interdito proibitório, que concedeu liminar de proteção possessória em favor do agravado, relativamente a área de 1,5 hectares localizada na região conhecida como Várzea do Faval ou Carumbé, em Cuiabá/MT, sob a justificativa de ameaça à posse. II. Questão em discussão 2. A controvérsia consiste em verificar se estavam presentes os requisitos legais para concessão de liminar possessória em ação de interdito proibitório, especialmente à luz da existência de provas que indicam conflito possessório bilateral e da alegada ausência de demonstração inequívoca da posse e da ameaça concreta à sua manutenção. III. Razões de decidir 3. O interdito proibitório exige, nos termos do art. 561 e 567 do CPC, demonstração inequívoca da posse, da ameaça iminente, e da continuidade da posse pelo autor. 4. Embora o juízo de origem tenha concedido a liminar após audiência de justificação, desconsiderou relevantes provas documentais e circunstâncias fáticas apresentadas pelo agravante, que apontam exercício contínuo e antigo da posse, bem como ausência de comprovação da ameaça concreta. 5. O contexto fático aponta para situação de litígio possessório bilateral, em que não é possível, em sede de cognição sumária, aferir com segurança a titularidade da posse e a existência de ameaça atual, sendo imprescindível a dilação probatória, inclusive com eventual perícia técnica. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso provido. Revogação da decisão liminar que concedeu a tutela possessória. Tese de julgamento: "1. A concessão de tutela possessória liminar exige demonstração inequívoca da posse e da ameaça atual ou iminente à sua manutenção.” “2. Em caso de controvérsia fática complexa e bilateralidade possessória, impõe-se a produção de prova robusta em instrução processual, sendo inadequada a concessão de liminar em juízo de cognição sumária." R E L A T Ó R I O Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por Samir Nicola Saddi contra decisão interlocutória proferida em ID 171178021 nos autos da Ação de Interdito Proibitório n.º 1025616-14.2024.8.11.0041, em trâmite na 2ª Vara Especializada de Direito Agrário da Comarca de Cuiabá/MT, ajuizada por Gonçalo Papazian, ora agravado. A decisão agravada deferiu a liminar nos seguintes termos: “defiro o pedido liminar pretendido pela parte autora Gonçalo Papazian contra Samir Nicola Saddi, visando a proteção possessória da área de terras de 1,5 hectares desmembrado de uma área maior de 4 hectares e 1.500 M², denominado Várzea do Faval ou Carumbé (denominação dada pela Prefeitura), registrado na Matrícula nº 18.313, no Cartório do 7º Ofício da Comarca de Cuiabá/MT”. (SIC) Em suas razões de ID 254286197, o agravante sustenta, em síntese, que é possuidor legítimo e antigo do imóvel, exercendo posse pacífica e contínua há décadas, conforme comprovação documental. Alega ainda que o agravado teria praticado esbulho possessório, ao adentrar no imóvel e realizar troca de cadeados, sem amparo judicial e sem a presença de oficial de justiça, o que, segundo a tese recursal, caracterizaria exercício arbitrário das próprias razões. Argumenta, ademais, que a decisão liminar desconsiderou a inexistência de turbação ou ameaça real à posse do agravado, violando, portanto, o devido processo legal. Requer a concessão de efeito suspensivo ao agravo, a fim de sustar os efeitos da liminar até o julgamento definitivo do recurso. No mérito, pugna pela revogação da liminar. O pedido de efeito suspensivo foi indeferido em ID 256669698. O agravado não apresentou contrarrazões, conforme certidão acostada em ID 264533789. É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara. Como relatado, o agravante pretende a revogação de decisão interlocutória que, nos autos da Ação de Interdito Proibitório n.º 1025616-14.2024.8.11.0041, deferiu liminar de proteção possessória em favor do agravado, relativamente à área de terras de 1,5 hectares desmembrado de uma área maior de 4 hectares e 1.500 M², situada na localidade conhecida como “Várzea do Faval” ou “Carumbé”, em Cuiabá/MT. Portando, a controvérsia diz respeito à análise da concessão de liminar possessória em ação de interdito proibitório, sob a ótica da presença ou não dos requisitos exigidos em Lei. O interdito proibitório, que é ação tipicamente possessória, tem caráter preventivo, à medida que visa a impedir que se concretize uma ameaça à posse. Ou seja, tem a finalidade de evitar a consumação do esbulho ou da turbação, desde que provado o justo receio do possuidor em ser molestado na sua posse, nos termos do artigo 567 do CPC, in verbis: “O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de ser molestado na posse poderá requerer ao juiz que o segure da turbação ou esbulho iminente, mediante mandado proibitório em que se comine ao réu determinada pena pecuniária caso transgrida o preceito.” Por sua vez, para o deferimento da tutela possessória, em ação de interdito proibitório, deve a parte autora demonstrar, de forma inequívoca, a presença dos requisitos contidos no artigo 561 do CPC, quais sejam: I) sua posse; II) a turbação ou esbulho praticado pelo réu; III) a data da turbação ou esbulho; IV) a continuação da posse embora turbada (ação de manutenção) ou a perda da posse (ação de reintegração). E ainda, cumulativamente, os requisitos gerais da tutela provisória de urgência: probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, conforme dispõe o artigo 300 do CPC. Feitas as necessárias digressões, verifica-se dos autos que o juízo de primeiro grau determinou a realização de audiência de justificação prévia e, com base na instrução oral produzida, formou convicção quanto à existência dos requisitos exigidos para a concessão da medida liminar possessória. Vejamos a fundamentação da mencionada decisum (ID 171178021 dos autos de origem): “(...). Nos autos em comento, o exercício da posse restou satisfatoriamente demonstrado pelo autor, pelos menos para concessão do pleito liminar, conforme passo a esclarecer. Oportunizada a produção da prova testemunhal, foram ouvidas as testemunhas Francisco Leite da Silva e Clodoaldo Pavinato . Questionado sobre a forma como o autor exercia a posse, o Sr. Francisco Leite da Silva disse que é vizinho dá área há muitas décadas e que sua família vendeu o imóvel ao autor e que frequentemente ele visita a área. O Sr. Clodoaldo Pavinato por sua vez, embora tenha conseguido indicar qual seria o imóvel objeto do litígio deu a entender que possui interesse em explorar um empreendimento no local, tão logo encerrado o litígio com o réu. Além disso a inicial foi carreada de diversos documentos que indicam a propriedade do autor desde a década de 1980, como formal de partilha, matrícula e escritura pública, documentos que foram encartados do id. 159448254 ao id. 159448275, demonstrando a origem da posse se deu por aquisição onerosa. Em relação à ameaça, o autor registrou um boletim de ocorrência alegando que foi impedido de dar manutenção na sua área pelo réu e seus funcionários. Isto posto, em sendo as provas produzidas em cognição sumária, em juízo não exauriente, capazes de demonstrar os requisitos exigidos pelo art. 561 do CPC, defiro o pedido liminar pretendido pela parte autora Gonçalo Papazian contra Samir Nicola Saddi, visando a proteção possessória da área de terras de 1,5 hectares desmembrado de uma área maior de 4 hectares e 1.500 M², denominado Várzea do Faval ou Carumbé (denominação dada pela Prefeitura), registrado na Matrícula nº 18.313, no Cartório do 7º Ofício da Comarca de Cuiabá/MT, cumprindo-se as seguintes determinações: (...)”. (Sic) No presente caso, analisando minuciosamente as provas contidas nos autos, entendo que não se encontram suficientemente preenchidos tais requisitos legais e processuais, de modo a justificar, neste momento, a concessão da tutela liminar em favor do agravado, explico. Inicialmente, é importante ressaltar que a parte Agravante apresentou contestação (ID 170768216), acompanhada de vasta documentação, um dia antes da audiência de justificação ocorrida no dia 01/10/24 (ID 170966153). Destaco as seguintes provas juntadas pelo agravado nos autos de origem: - Escritura Pública de Compra e Venda, datada de 26/07/1974 (ID 170773174); - Matrícula da área com a devida anotação da escritura acima mencionada (ID 170773181); - Comprovantes de pagamento do Imposto Territorial Rural (ITR) desde 1992 até os dias atuais, acostados em ID 170773185 e ID 170773190 (abaixo cito alguns como exemplo); - Boletim de Ocorrência número 2023.23672, datado de 26/01/23, registrado pelo agravado, comunicando esbulho em sua propriedade (ID 170773172); - Áudios contendo supostas ameaças em desfavor do agravado, em tese, relativas a disputa pela área objeto dos autos (ID 170773184 e ID 170773186). Como se vê, tais documentos indicam a existência de posse antiga e presumidamente contínua por parte do agravante, lançando dúvida substancial sobre a narrativa constante da petição inicial do interdito proibitório. Destaca-se ainda que, conforme já transcrito acima, a decisão agravada sequer menciona as provas carreadas nos autos de origem pelo agravado, se limitando a mencionar as provas juntadas com a petição inicial e a prova produzida em audiência de justificação. Nesse contexto, a controvérsia instaurada entre as partes revela conflito possessório de complexidade fática, e a própria exordial do interdito proibitório admite que a área em questão corresponde a um desmembramento de terreno maior, o que, por si só, já indica a necessidade de dilação probatória mais robusta, inclusive com eventual produção de prova pericial, testemunhal e documentação complementar, para definição segura acerca da titularidade da posse. Assim, a situação retratada nos autos não autoriza o deferimento de tutela liminar possessória, eis que os fatos encontram-se controvertidos e dependem de dilação probatória robusta, o que é incompatível com o juízo de cognição sumária necessário à concessão de medida de urgência. Ademais, a liminar deferida atribui, ainda que provisoriamente, reconhecimento de posse ao agravado sem que haja, até o momento, demonstração inequívoca de que ele de fato exercia a posse de forma anterior e pacífica à suposta ameaça ou, de que o agravante tenha praticado atos concretos de esbulho ou turbação. Pelo contrário, os elementos dos autos indicam possível conflito possessório bilateral, que exige cuidadosa instrução processual. Nesse sentido, é o entendimento deste e. Tribunal de Justiça em casos análogos: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERDITO PROIBITÓRIO. REQUISITOS DA TUTELA POSSESSÓRIA. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto por José Afonso Fraga contra decisão da Vara Única de Arenápolis-MT que deferiu tutela de urgência ajuizado por Valdir da Silva Marques, visando obstar a turbação de sua posse por suposta invasão do agravante. II. Questão em discussão 2. A controvérsia reside na verificação dos requisitos para a concessão da tutela de urgência em ação possessória, notadamente quanto à comprovação da posse anterior do agravado e à existência de ameaça concreta de esbulho ou turbação. III. Razões de decidir 3. A posse alegada pelo agravado não restou suficientemente comprovada nos autos, sendo insuficiente a mera demonstração da propriedade do imóvel. 4. O boletim de ocorrência registrado não evidencia turbação recente, havendo indícios de que o agravante ocupa a área desde 2007, fato que demanda instrução probatória mais aprofundada. IV. Dispositivo e tese 5. Recurso provido para reformar a decisão e revogar a tutela de urgência concedida. Tese de julgamento: "A concessão de tutela de urgência em ação possessória exige a demonstração inequívoca da posse anterior e da turbação iminente, sendo insuficiente a mera titularidade do domínio e a ausência de prova robusta recomenda a dilação probatória." Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 561 e 567. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, n. 1019633-31.2022.8.11.0000, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, j. 16.11.2022. (N.U 1036234-44.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/02/2025, Publicado no DJE 28/02/2025). (Grifei) AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO – DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU QUE DEFERIU O PEDIDO LIMINAR DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE DO IMÓVEL EM LITÍGIO – INCONFORMISMO DA RÉ, SOB A ALEGAÇÃO QUE EXERCE A POSSE MANSA E PACÍFICA HÁ MAIS DE 05 ANOS – IMÓVEL ALIENADO POR UM DOS HERDEIROS HÁ APROXIMADAMENTE 10 (DEZ) ANOS – QUESTÃO FÁTICA CONTROVERTIDA – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 561 DO CPC – NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. “Para o deferimento da liminar nas ações possessórias, necessário se mostra a comprovação dos requisitos do artigo 561 do CPC, quais sejam: a posse do autor; a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; a data da turbação ou do esbulho; e, por fim, a continuidade da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração. Não evidenciados os requisitos mínimos para o deferimento de liminar, por demandar instrução processual a questão controvertida quanto à ocorrência da turbação à posse, a manutenção da decisão é medida que se impõe até que sobrevenham maiores elementos durante a instrução do processo.” (N.U 1024319-32.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/02/2024, Publicado no DJE 25/02/2024)” (N.U 1020202-61.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/11/2024, Publicado no DJE 13/11/2024). (Grifei) DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERDITO PROIBITÓRIO. GEORREFERENCIAMENTO. AUSÊNCIA DE PROVAS DE TURBAÇÃO. DILAÇÃO PROBATÓRIA NECESSÁRIA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão que indeferiu pedido de medida liminar em ação de interdito proibitório, em razão da ausência de comprovação suficiente de turbação ou ameaça concreta à posse da área de 183 hectares da Fazenda Campo Belo, em decorrência de georreferenciamento realizado pelos recorridos. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se o georreferenciamento realizado pelos recorridos caracteriza, por si só, ato de turbação à posse da recorrente, justificando a concessão de medida liminar em sede de interdito proibitório. III. Razões de decidir 3. O georreferenciamento de imóvel rural, em regra, constitui mero ato administrativo e não configura turbação da posse, salvo se comprovada sua utilização para prática de atos concretos que inviabilizem o exercício pleno da posse pelo titular. 4. A análise dos autos demonstra que o alegado ato de turbação fundamenta-se apenas na sobreposição de áreas decorrente do georreferenciamento, cuja regularidade está sendo discutida no âmbito administrativo, sem evidências de atos abusivos ou injustos por parte dos recorridos. 5. A pretensão da recorrente demanda dilação probatória, com realização de perícia técnica para apuração da sobreposição de matrículas e definição dos limites das áreas em litígio. IV. Dispositivo e tese 6. Agravo de Instrumento desprovido. Tese de julgamento: “O georreferenciamento de imóvel rural, por si só, não configura turbação da posse, sendo necessária a comprovação de atos concretos de obstrução ao exercício pleno da posse para justificar a concessão de medidas liminares em interdito proibitório”. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, arts. 561 e 567. Jurisprudência relevante citada: TJMT, AI nº 1001539-64.2024.8.11.0000, Rel. Desa. Nilza Maria Possas de Carvalho; TJMT, AI nº 1027682-27.2023.8.11.0000, Rel. Des. Dirceu dos Santos. (N.U 1020408-75.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/12/2024, Publicado no DJE 16/12/2024). (Grifei) Com efeito, a manutenção da liminar neste contexto violaria o princípio do contraditório e da ampla defesa, além de contrariar a exigência de certeza mínima que justifique a concessão de medidas liminares em lides possessórias. Ante o exposto, conheço do recurso e DOU-LHE PROVIMENTO, para revogar a decisão liminar proferida na origem (ID 171178021), permitindo que a situação possessória permaneça inalterada até o encerramento da fase instrutória na ação originária, preservando o equilíbrio entre as partes e a observância do devido processo legal. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/04/2025

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Processo nº 1036013-61.2024.8.11.0000

ID: 256481100

Tribunal: TJMT Órgão: Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 1036013-61.2024.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JUÍZO DO 1º JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE RONDONÓPOLIS

Acórdão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1036013-61.2024.8.11.0000 Classe: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Assunto: [Compet… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1036013-61.2024.8.11.0000 Classe: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Assunto: [Competência, Cirurgia] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). MARCOS AURELIO DOS REIS FERREIRA, DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). MARIA APARECIDA RIBEIRO, DES(A). MARIA EROTIDES KNEIP, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO] Parte(s): [NEUZA RAYMUNDO - CPF: 037.878.418-81 (IMPETRANTE), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0001-44 (TERCEIRO INTERESSADO), MUNICIPIO DE RONDONOPOLIS - CNPJ: 03.347.101/0001-21 (TERCEIRO INTERESSADO), JUIZ DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DE RONDONÓPOLIS - MT (IMPETRADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (TERCEIRO INTERESSADO), JUÍZO DO 1º JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE RONDONÓPOLIS (IMPETRADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A SEGURANÇA, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DES. LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO. E M E N T A DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PORTARIA TJMT/CGJ Nº 183/2024. JUÍZO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. DECLINAÇÃO DE COMPETÊNCIA PARA O NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DA SAÚDE PÚBLICA. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS. SEGURANÇA DENEGADA. I. Caso em exame 1. Mandado de segurança impetrado por Neuza Raymundo contra decisão do Juízo do 1º Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis que, com base na Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024, declinou da competência para o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP). 2. A impetrante sustenta que a referida Portaria viola normas constitucionais e infraconstitucionais, afetando o princípio do juiz natural e a competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, conforme a Lei 12.153/09. II. Questão em discussão 3. A controvérsia consiste em determinar se a remessa dos autos ao NJDSP fere a competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública e se a Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024 extrapola sua função normativa. III. Razões de decidir 4. A jurisprudência do STJ admite a impetração de mandado de segurança perante os Tribunais de Justiça para controle da competência dos Juizados Especiais, em situações excepcionais, notadamente quando há questionamento de normas infralegais que impactam a jurisdição. 5. Os Núcleos de Justiça 4.0, disciplinados pelo CNJ, não constituem novos órgãos jurisdicionais, mas mecanismos de apoio, sem modificação da competência originária do juízo natural. 6. A Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024 não viola a competência dos Juizados Especiais, pois não altera a competência material, limitando-se a disciplinar a gestão processual e a cooperação judiciária. 7. O princípio do juiz natural não restou afrontado, pois o NJDSP atua apenas como unidade de apoio, sem transferência de competência decisória. IV. Dispositivo e tese 8. Mandado de segurança denegado. Tese de julgamento: "A remessa de processos aos Núcleos de Justiça Digital não viola a competência absoluta dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, pois trata-se de medida de apoio jurisdicional sem alteração da competência originária." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LIII; Lei 12.153/2009, art. 2º, § 4º; Resolução CNJ nº 385/2021; Resolução CNJ nº 398/2021. Jurisprudência relevante citada: STJ, RMS 17.524/BA, Rel. Min. Nancy Andrighi; STJ, AgInt no RMS 57.649/SP, Rel. Min. Raul Araújo; STJ, AgInt no RMS 57.285/DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves; STJ, RMS 59.378/CE, Rel. Min. Herman Benjamin. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO (Relator) Egrégia Turma: Trata-se de Mandado de Segurança c/c Pedido Liminar n. 1036013-61.2024.8.11.0000 impetrado por NEUZA RAYMUNDO contra ato tido por ilegal praticado pelo Excelentíssimo Juiz de Direito do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis, que nos autos da Ação Cominatória de Obrigação de Fazer nº 1027890-65.2024.8.11.0003, declinou a competência para o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP), com fundamento na Portaria TJMT/CGJ nº 183, de 19 de novembro de 2024. A impetrante alega a ilegalidade e a inconstitucionalidade da referida Portaria, eis que violaria normas de competência previstas na Constituição Federal, na Lei nº 12.153/2009 (Juizados Especiais da Fazenda Pública) e na Lei nº 9.099/1995, além de afronta ao princípio do juiz natural (art. 5º, inciso LIII, da CF). Para tanto, argumenta que: · A Portaria nº 183/2024 extrapola sua função normativa ao modificar a competência absoluta atribuída por lei federal aos Juizados Especiais da Fazenda Pública, violando o princípio do juiz natural (art. 5º, LIII, da CF/88). · A Lei 12.153/09 estabelece que o Juizado Especial da Fazenda Pública possui competência absoluta nos foros onde está instalado, não cabendo portarias ou resoluções administrativas alterar essa previsão. · Decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como o RMS 64534/MT e o IAC nº 10, reforçam a ilegalidade de normas infralegais que alterem regras de competência material. Assim, pleiteia que seja “liminarmente SUSPENSA a decisão declinatória ora impugnada (id 176360921), determinando-se que o feito de nº. 1027890-65.2024.8.11.0003 permaneça tramitando perante o E. Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis-MT até a apreciação definitiva do presente writ of mandamus” – sic. No mérito, pugna pela concessão da segurança para “determinar a imediata anulação da r. decisão declinatória ora impugnada (id 176360921), proferida nos autos de nº 1027890-65.2024.8.11.0003 do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis – MT, em razão da manifesta inconstitucionalidade e ilegalidade da Portaria TJMT/CGJ n. 183, por ofensa ao art. 5º, LIII, e art. 22, I, ambos da CF, ao art. 2º, §4º, da Lei 12.153/09 e art. 3º, § 1º, inciso I da Lei 9.099/90, afirmando definitivamente a competência do E. Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis – MT para prosseguir com andamento e julgamento do feito” - sic. A liminar foi concedida a fim de suspender a remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital de Saúde Pública (NJDSP) – Id: 259133670. O Estado de Mato Grosso apresentou informações no Id: 264492777, suscitando preliminarmente: a) o não cabimento do mandado de segurança por falta de interesse jurídico-processual, inadequação da via eleita e supressão de instância, uma vez que a impetrante não teria apresentado oposição nos próprios autos antes de ajuizar o mandado de segurança; b) a remessa ao Núcleo de Justiça 4.0 com competência de Justiça Comum e Juizado Especial não configura "controle da competência do Juizado Especial", defendendo o não cabimento de mandado de segurança ao Tribunal de Justiça conforme Súmula 376/STJ e Tema 159/STF. No mérito, sustenta que o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública possui natureza jurídica de "Núcleo de apoio" e não de "Núcleo principal ou autônomo", conforme Resolução nº 5/2024 do Tribunal Pleno do TJMT, que prevê expressamente sua natureza "de apoio". Alega que tal natureza jurídica não desnatura a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, sendo preservada a competência originária. Argumenta ainda que a oposição à remessa aos Núcleos de apoio deve ser fundamentada com motivos concretos e relevantes, e não baseada em mero inconformismo. Em que pese reconhecida a incompetência para processar mandado de segurança que combate ato praticado por Juiz do Juizado Especial (id. 263143283), o posicionamento foi revisto por meio da decisão de Id. 265458782, tendo em vista que a impugnação não se limita somente ao declínio de competência pelo Juízo do Juizado Especial, pois também questiona a validade da Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024, que estabelece sistemática diferenciada visando dar prioridade às ações de saúde pública. Consoante certificado nos autos, a Procuradoria-Geral de Justiça deixou de se manifestar. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO (Relator) Egrégia Turma: Conforme relatado anteriormente, vislumbra-se nos autos que a impetrante, Neuza Raymundo, ajuizou Mandado de Segurança com pedido de liminar contra decisão do Juízo do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis, que declinou da competência para o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP), com base na Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024. A ação originária (Processo nº 1027890-65.2024.8.11.0003) trata de uma Ação Cominatória de Obrigação de Fazer, pleiteando tratamento médico-hospitalar, incluindo cirurgia. A impetrante sustenta que a redistribuição da demanda ao NJDSP violou normas constitucionais e infraconstitucionais, requerendo a manutenção do feito no Juizado Especial da Fazenda Pública. Sem mais delongas, passo à análise da preliminar e do mérito recursal. I - Da Preliminar De Cabimento Do Mandado De Segurança A análise da admissibilidade do presente mandado de segurança requer uma contextualização precisa acerca da excepcionalidade reconhecida pela jurisprudência para afastar a incidência da Súmula 376 do STJ, segundo a qual "Compete à turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial." Com efeito, o sistema dos Juizados Especiais foi concebido como um microssistema processual próprio, submetido a regras específicas e com regime recursal apartado da Justiça Comum, atribuindo-se às Turmas Recursais, como regra, a competência para o processamento e julgamento de todos os recursos e ações impugnativas de decisões proferidas nos Juizados Especiais, inclusive mandados de segurança. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça, a partir do julgamento do RMS 17.524/BA, relatado pela Ministra Nancy Andrighi, consolidou orientação no sentido de que compete aos Tribunais de Justiça realizar o controle da competência dos Juizados Especiais, em caráter excepcional. Esse entendimento foi reafirmado em diversos julgados posteriores, cabendo destacar: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. COMPETÊNCIA. ATOS DOS JUIZADOS ESPECIAIS . TRIBUNAL DE JUSTIÇA. POSSIBILIDADE. RMS 17.524/BA . VÍCIOS CONSTRUTIVOS. INTERESSE DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. 1. Na origem trata-se de Mandado de Segurança interposto contra atos dos juízes da 1ª e da 2ª Turmas Recursais da Justiça Estadual da Comarca de Governador Valadares/MG com a finalidade de ver definida a incompetência dos Juizados Especiais em causas que envolvam interesse da Caixa Econômica Federal, nas quais se buscam indenizações por danos morais e materiais em razão de vícios construtivos (falta de revestimento cerâmico em cômodos) em unidades habitacionais construídas pela impetrante por ocasião do Programa Minha Casa Minha Vida . 2. A impetrante busca o reconhecimento da competência da Justiça Federal para julgamento das referidas ações. 3. O Tribunal local reconheceu: "apesar de o empreendimento denominado 'Residencial Valadares' ter sido objeto de contrato entre a impetrante (Altho Empreendimentos e Construções Ltda .) e a Caixa Econômica Federal, por meio do Fundo de Arrendamento Residencial - FAR (documento 135) é vedado ao magistrado determinar a emenda da inicial para incluir a 'CEF' no polo passivo da relação processual, de modo a deslocar a competência para a Justiça Federal, como pretende a impetrante. Isso porque, de acordo com o princípio dispositivo, o juiz deve decidir a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte. (...) Com efeito, as questões relativas à ilegitimidade da impetrante para figurar no polo passivo das ações nominadas na petição inicial (documento nº 01, p. 09) e da imprescindibilidade da Caixa Econômica Federal atuar como litisconsorte passivo necessário, devem ser apreciadas naquelas ações propostas perante o Juizado Especial da Comarca de Governador Valadares, e não em sede de mandado de segurança, cujo rito não comporta dilação probatória". 4. O entendimento do STJ é pela competência dos Tribunais de Justiça para realizar o controle de competência de seus Juizados Especiais . Tal entendimento consiste numa excepcionalidade à Súmula 376/STJ, que define que: "Compete a turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial". Tratando-se de excepcionalidade, esta limita-se às hipóteses em que se pretende equacionar e fazer cumprir a competência dos Juizados segundo a definição dada pela Constituição Federal e disciplinada pelo art. 3º da Lei 9.099/1995, conforme se depreende do RMS 17 .524/BA. No mesmo sentido: AgInt no RMS 57.649/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 17 .12.2019, DJe 3.2.2020; AgInt no RMS 57 .285/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 16.9.2019, DJe 18 .9.2019; RMS 59.378/CE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 5 .9.2019, DJe 11.10.2019 . 5. O pedido da parte extrapola os limites da excepcionalidade permitida pelo STJ à sua Súmula 376. O que requer a impetrante é a definição da competência não entre os Juizados Especiais dentro do âmbito do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, mas o reconhecimento de eventual interesse da Caixa Econômica Federal na lide, para seu consequente ingresso no feito e deslocamento da competência para os Juizados Especiais Federais. 6 . No REsp 1.163.228/AM. traçaram-se as premissas para aferir a legitimidade da Caixa Econômica Federal nas ações que envolvam vícios em construções realizadas no âmbito de programas habitacionais dos quais é gestora . Assim, eventual interesse do ente público deve ser solucionado nas ações em que se discutam tais vícios, e não pela via do Mandado de Segurança. Precedentes: REsp 1.163.228/AM, Rel . Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 9.10.2012, DJe 31.10 .2012; AgInt no REsp 1.700.199/RN, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 20 .2.2020, DJe 3.3.2020; AgInt no AREsp 1 .456.292/PE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20.8 .2019, DJe 23.8.2019; AgRg no AREsp 642.349/PR, Rel . Ministro Paulo De Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 21.8.2018, DJe 31.8 .2018. 7. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança não provido.”(STJ - RMS: 61323 MG 2019/0197755-2, Relator.: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 26/05/2020, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/09/2020) (destaquei) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. COMPETÊNCIA. JUIZADOS ESPECIAIS . SÚMULA 376/STJ. CONTROLE DE MÉRITO DOS ATOS DE JUIZADO ESPECIAL. 1. Trata-se de Agravo Interno contra decisão que negou provimento ao Recurso Ordinário . 2. O Tribunal de origem, examinando a controvérsia e o acervo fático-probatório dos autos, entendeu que não tem competência revisora das decisões proferidas no âmbito dos Juizados Especiais, pelo que remanesce a competência do Juizado Especial para análise do mandamus. 3. Consoante a jurisprudência do STJ, admite-se a impetração de Mandado de Segurança perante os Tribunais de Justiça dos Estados para o exercício do controle de competência dos juizados especiais, ficando a cargo das Turmas Recursais, conforme dispõe a Súmula 376 do STJ, o Writ que tenha por escopo o controle de mérito dos atos de juizado especial . Precedente: RMS 46.955/GO, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, DJe 17/8/2015 . 4. A necessidade da realização de prova pericial, por si só, não afasta a competência dos Juizados Especiais. Confira-se: RMS 39.071/MG, Rel . Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 15/10/2018. 5. A averiguação quanto ao mérito (necessidade ou não de prova pericial) remete à solução da competência às Turmas recursais de acordo com a Súmula 376/STJ e com o decidido pelo Tribunal a quo . 6. Agravo Interno não provido.” (STJ - AgInt no RMS: 66360 SP 2021/0130003-1, Relator.: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 16/11/2021, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/12/2021) (destaquei) O caso em análise enquadra-se precisamente na exceção admitida pelo STJ, uma vez que a pretensão da impetrante é questionar a validade da decisão que determinou a remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública, sob o fundamento de que tal remessa viola as regras de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública estabelecidas na Lei 12.153/09. Além disso, a questão aqui debatida ultrapassa o mero controle da competência do juízo, envolvendo também a validade da Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024. Esse aspecto afasta a incidência automática da Súmula 376/STJ, justificando a análise da matéria por este Tribunal de Justiça. Quanto à alegada falta de interesse processual pela não utilização prévia da via de oposição em primeira instância, melhor sorte não assiste ao Estado. Isso porque o mandado de segurança, como garantia constitucional prevista no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, tem como requisito a existência de ato ilegal ou abusivo, não sendo exigível o esgotamento prévio de vias administrativas ou judiciais quando se questiona a própria validade do ato normativo que dá suporte à decisão judicial. Ademais, tratando-se de competência absoluta prevista em lei federal, sua violação pode ser impugnada de imediato por meio de mandado de segurança, independentemente de questionamento prévio no juízo de origem. Desse modo, REJEITO as preliminares suscitadas e reconheço o cabimento do presente mandado de segurança. II - DO MÉRITO A análise da pretensão da impetrante demanda um exame aprofundado sobre a natureza jurídica do Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP) e sua compatibilidade com o regime de competência estabelecido pela Lei 12.153/09 (Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública). II.1 - DO MARCO NORMATIVO DOS NÚCLEOS DE JUSTIÇA 4.0 O Conselho Nacional de Justiça, por meio da Resolução nº 385/2021, autorizou a criação pelos Tribunais dos denominados "Núcleos de Justiça 4.0", definindo-os como "unidades judiciárias especializadas que atuam em regime de cooperação por meio de plataformas eletrônicas (virtuais) para a tramitação de processos estratégicos ou complexos". Cito: “Art. 1º Os tribunais poderão instituir “Núcleos de Justiça 4.0” especializados em razão de uma mesma matéria e com competência sobre toda a área territorial situada dentro dos limites da jurisdição do tribunal. § 1º Os “Núcleos de Justiça 4.0” também poderão abranger apenas uma ou mais regiões administrativas do tribunal. § 2º Ressalvadas as disposições em contrário previstas neste ato normativo, nos “Núcleos de Justiça 4.0” tramitarão apenas processos em conformidade com o “Juízo 100% Digital”, disciplinado na Resolução CNJ nº 345/2020, notadamente o que previsto no seu art. 6º, no sentido de que o interesse do advogado de ser atendido pelo magistrado será devidamente registrado, com dia e hora, por meio eletrônico indicado pelo tribunal e de que a resposta sobre o atendimento deverá, ressalvadas as situações de urgência, ocorrer no prazo de até 48 horas. § 3º Cada “Núcleo de Justiça 4.0” deverá contar com um juiz, que o coordenará, e com, no mínimo, dois outros juízes. Art. 2º A escolha do “Núcleo de Justiça 4.0” pela parte autora é facultativa e deverá ser exercida no momento da distribuição da ação. § 1º O processo atribuído a um “Núcleo de Justiça 4.0” será distribuído livremente entre os magistrados para ele designados. § 2º É irretratável a escolha da parte autora pela tramitação de seu processo no “Núcleo de Justiça 4.0”. § 3º O demandado poderá se opor à tramitação do processo no “Núcleo de Justiça 4.0” até a apresentação da primeira manifestação feita pelo advogado ou defensor público. § 4º Havendo oposição da parte ré, o processo será remetido ao juízo físico competente indicado pelo autor, submetendo-se o feito à nova distribuição. § 5º A oposição do demandado à tramitação do feito pelo “Núcleo de Justiça 4.0” poderá ser feita na forma prevista no art. 340 do CPC. § 6º A não oposição do demandado, na forma dos parágrafos anteriores, aperfeiçoará o negócio jurídico processual, nos termos do art. 190 do CPC/15, fixando a competência no “Núcleo de Justiça 4.0”. Art. 3º Ato do Tribunal definirá a estrutura de funcionamento dos “Núcleos de Justiça 4.0”, de acordo com seu volume processual, bem como providenciará a designação de servidores para atuarem na unidade, o que poderá ocorrer cumulativamente às atividades desenvolvidas na sua lotação de origem ou com exclusividade no núcleo, observado, neste caso, o disposto na Resolução CNJ nº 227/2016, do Conselho Nacional de Justiça. Art. 4º A designação de magistrados para os “Núcleos de Justiça 4.0” dependerá dos seguintes requisitos cumulativos: I – publicação de edital pelo tribunal com a indicação dos “Núcleos de Justiça 4.0” disponíveis, com prazo de inscrição mínimo de cinco dias, e II – requerimento do magistrado interessado com indicação da ordem de prioridade da designação específica pretendida. § 1º A designação do magistrado para atuar nos “Núcleos de Justiça 4.0” obedecerá os critérios de antiguidade e merecimento dos inscritos. §2º Terão prioridade para designação em “Núcleos de Justiça 4.0” os magistrados que atendam cumulativamente aos requisitos insculpidos no art. 5º, incisos I e II, da Resolução CNJ nº 227/2016, do Conselho Nacional de Justiça. § 2o Terão prioridade para designação em "Núcleos de Justiça 4.0", em caso de empate no critério de merecimento, os magistrados que atendam cumulativamente aos requisitos insculpidos no art. 5o, incisos I e II, da Resolução CNJ no 227/2016. (redação dada pela Resolução n. 398, de 9.6.2021) §3º A designação de magistrados para atuar em “Núcleos de Justiça 4.0” poderá ser exclusiva ou cumulativa à atuação na unidade de lotação original. §4º O exercício cumulativo poderá ser convertido em exclusivo quando, a critério do tribunal, a distribuição média de processos ao Núcleo justificar. § 5º O magistrado designado de forma cumulativa poderá ser posto em regime de trabalho remoto parcial, dimensionado de forma a não prejudicar a realização de audiências, a prestação da jurisdição e nem a administração da unidade de lotação original. Art. 5º Ato do Tribunal poderá dispor sobre o prazo de designação de magistrado para atuar no “Núcleo de Justiça 4.0”, observado o limite mínimo de 1 (um) ano e máximo de 2 (dois) anos, permitindo-se reconduções desde que atendido o disposto no art. 4º. Parágrafo único. Na hipótese de o tribunal viabilizar a transformação de unidades jurisdicionais físicas em unidades jurisdicionais virtuais no âmbito do Núcleo de Justiça 4.0, poderá substituir o sistema de designação por tempo certo previsto no caput pelo de lotação permanente. Art. 6º Os tribunais deverão avaliar periodicamente, em prazo não superior a 1 (um) ano, a quantidade de processos distribuídos para cada juiz do “Núcleo de Justiça 4.0” e a de processos distribuídos para cada unidade jurisdicional física, bem como o volume de trabalho dos servidores, a fim de aferir a necessidade de transformação de unidades físicas em núcleos, readequação da sua estrutura de funcionamento ou de alteração da abrangência de área de atuação. § 1º Os tribunais deverão adotar medidas para manter uma correlação adequada entre o número de processos distribuídos para cada juiz do Núcleo de Justiça 4.0 e o número de processos distribuídos para cada juiz da mesma matéria e competência em uma unidade jurisdicional física. § 2º Dentre as medidas possíveis para o cumprimento da regra prevista no parágrafo anterior, o Tribunal poderá aumentar o número de magistrados designados para o Núcleo de Justiça 4.0 ou providenciar a transformação de unidades jurisdicionais físicas em núcleos. Art. 7º O §1º do art. 9º da Resolução CNJ n. 184/2013 passa a vigorar com a seguinte redação: “§ 1º Para os fins do caput, o tribunal pode transferir a jurisdição da unidade judiciária ou Comarca para outra, ou convertê-la em Núcleo de Justiça 4.0, de modo a propiciar aumento da movimentação processual para patamar superior”. Art. 8º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.” A referida Resolução estabeleceu, em seu art. 2º, que a escolha do "Núcleo de Justiça 4.0" pela parte autora é facultativa e deve ser exercida no momento da distribuição da ação, sendo irretratável. Previu ainda a possibilidade de oposição da parte demandada, hipótese em que o processo seria remetido ao juízo físico competente. Posteriormente, o CNJ editou a Resolução nº 398/2021, dispondo sobre a atuação dos "Núcleos de Justiça 4.0" em apoio às unidades jurisdicionais. Esta segunda normativa ampliou o escopo de atuação dos Núcleos, prevendo, em seu art. 1º, a possibilidade de processamento de questões especializadas em razão de sua complexidade, pessoa, fase processual, entre outros critérios, mantendo-se a possibilidade de oposição fundamentada das partes, a ser apreciada pelo juízo, vejamos: “Art. 1o Os “Núcleos de Justiça 4.0”, disciplinados pela Resolução CNJ no 385/2021, também podem ser instituídos pelos tribunais para atuarem em apoio às unidades judiciais, em todos os segmentos do Poder Judiciário, em processos que: I – abarquem questões especializadas em razão de sua complexidade, de pessoa ou de fase processual; II – abranjam repetitivos ou direitos individuais homogêneos; III – envolvam questões afetadas por precedentes obrigatórios, em especial definidos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV – estejam em situação de descumprimento de metas nacionais do Poder Judiciário; e V – encontrem-se com elevado prazo para a realização de audiência ou sessão de julgamento ou com elevado prazo de conclusão para sentença ou voto. § 1o Ato do tribunal definirá, com base nas características e visando a melhor gestão do acervo processual em tramitação na respectiva jurisdição, as classes, os assuntos e as fases dos processos que serão encaminhados para análise nos “Núcleos de Justiça 4.0”, bem como fixará as regiões de atuação destes e a composição. § 2o A remessa de processos para os “Núcleos de Justiça 4.0” em razão de pessoa somente poderá ser determinada nos feitos que contenham grande litigante, nos termos da regulamentação expedida pelos tribunais, em qualquer dos polos processuais. § 3o Após a publicação do ato do tribunal disciplinando os processos que poderão ser encaminhados aos “Núcleos de Justiça 4.0”, incumbirá aos Juízos em que os processos estejam tramitando efetuarem a remessa dos autos. § 4º Os tribunais que possuírem cargos de juiz substituto desvinculados de unidades judiciais ou juízes lotados em unidades judiciais com distribuição inferior aos parâmetros estabelecidos no art. 9o da Resolução CNJ no 184/2013 poderão, independentemente de edital, designar esses juízes para atenderem aos "Núcleos de Justiça 4.0" instituídos com a finalidade prevista no caput.” O Tribunal de Justiça de Mato Grosso, por sua vez, editou a Resolução nº 5/2024, que criou o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública, estabelecendo em seu art. 5º que este atuará "em apoio às unidades judiciárias do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso". A Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024, que regulamentou a matéria, previu a remessa facultativa de processos pelos magistrados ao referido Núcleo. II.2 - DA NATUREZA JURÍDICA DO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DA SAÚDE PÚBLICA A partir do exame dos atos normativos que regem o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP), é possível extrair que sua natureza jurídica é de unidade de apoio e cooperação judiciária, não configurando órgão jurisdicional autônomo com competência própria. Tal conclusão se evidencia pelo teor do art. 5º da Resolução nº 5/2024 do TJMT, que prevê expressamente que o Núcleo "atuará, nos limites da competência prevista no inciso I do art. 2º desta Resolução, em apoio às unidades judiciárias do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso". Do mesmo modo, a Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024 faculta aos juízes das unidades judiciárias do Estado de Mato Grosso a remessa de processos ao Núcleo. Trata-se, portanto, de instrumento de cooperação judiciária, prevista no art. 69 do Código de Processo Civil e estimulada pela Resolução CNJ nº 350/2020, que dispõe sobre a cooperação judiciária nacional. A cooperação judiciária, como é cediço, consiste na colaboração entre órgãos jurisdicionais para melhor gestão processual, sem implicar em alteração de competência em sentido estrito. II.3 - Da Compatibilidade Com O Regime De Competência Dos Juizados Especiais Da Fazenda Pública A Lei 12.153/09, em seu art. 2º, § 4º, estabelece que "no foro onde estiver instalado Juizado Especial da Fazenda Pública, a sua competência é absoluta." A impetrante alega que a remessa dos autos ao NJDSP violaria essa regra de competência absoluta. Ocorre que a competência absoluta prevista na Lei 12.153/09 não pode ser confundida com a organização interna do Poder Judiciário para fins de gestão processual e especialização de unidades auxiliares. O NJDSP não se constitui em um novo juízo ou órgão jurisdicional autônomo, mas em um núcleo de apoio ao próprio Juizado Especial da Fazenda Pública, sem modificação da competência originária para julgamento da ação. Além disso, o entendimento consolidado pelo STJ no Incidente de Assunção de Competência (IAC) nº 10 reforça que a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública não pode ser afastada por normas infralegais, vejamos: “Tese C) A instalação de vara especializada não altera a competência prevista em lei ou na Constituição Federal, nos termos da Súmula n. 206/STJ ("A existência de vara privativa, instituída por lei estadual, não altera a competência territorial resultante das leis de processo."). A previsão se estende às competências definidas no presente IAC n. 10/STJ.” Todavia, no caso concreto, não há deslocamento da competência para um órgão distinto, mas apenas um mecanismo de apoio e cooperação judiciária, o que não se confunde com a hipótese analisada no IAC nº 10. Nesse sentido, cabe destacar que os Núcleos de Justiça 4.0 não são Varas ou Juízos autônomos, mas cartórios ou estruturas de apoio ao juízo natural. Não há, portanto, conflito de competência, que somente seria possível entre órgãos julgadores, o que não é o caso. Esse entendimento tem sido adotado pelos Tribunais que já enfrentaram a questão, como se observa dos seguintes precedentes: "PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA 4.0. Agravo de instrumento contra a decisão proferida nos autos da ação de obrigação de fazer que determinou a remessa dos autos para um dos Núcleos da Justiça 4.0 de Saúde Pública e Juizado Especial da Fazenda Pública. Decisão agravada proferida com observância das normas que disciplinam o programa Justiça 4.0 no âmbito deste E. Tribunal de Justiça e buscam uma prestação jurisdicional mais célere e eficaz. Somente ocorre conflito de competência entre órgãos julgadores, característica ausente no Núcleo de Justiça 4.0, cuja atuação no âmbito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro se limita a auxiliar juízos e juizados. A remessa dos autos ao Núcleo independe de pedido expresso e pode ser adotada em qualquer fase de tramitação. Recurso desprovido." (TJRJ - 0015211-71.2023.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. Des(a). HENRIQUE CARLOS DE ANDRADE FIGUEIRA - Julgamento: 04/05/2023 - PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO) (destaquei) "AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA DOS AUTOS PARA O NÚCLEO DE JUSTIÇA 4.0. OPOSIÇÃO DA PARTE AUTORA. MANUTENÇÃO DO DECISUM. 1. Os Núcleos de Justiça 4.0 não são Varas ou Juízos da Justiça 4.0, mas sim Cartórios/Núcleos auxiliares ao Juízo natural, não havendo sequer declínio ou eventual conflito de competência, que somente seria possível entre órgãos julgadores, o que não ocorre no caso. 2. O CNJ editou a Resolução nº 398, de 9 de julho de 2021, para dispor a respeito da atuação dos "Núcleos de Justiça 4.0" em apoio às unidades jurisdicionais, preservando-se a possibilidade de oposição das partes à remessa do feito aos novos órgãos jurisdicionais, desde que fundamentada. 3. Na presente hipótese afirma a recorrente que a ação versa sobre tratamento médico e fornecimento de medicamentos/insumos, sendo a parte autora residente e domiciliada no Município de Cordeiro, distante cerca de 199 km da Capital, onde se situa o novel Juízo, o que prejudicaria sobremaneira o seu acesso à justiça. No entanto, tal justificativa não se afigura plausível, na medida em que os autos originários são eletrônicos (PJe), a parte autora continuará sendo assistida pela Defensoria Pública, sendo de conhecimento notório que a especialização da matéria no referido Núcleo de Justiça 4.0, para o qual o processo foi remetido, torna a prestação jurisdicional mais rápida e efetiva. 4. O Ato Normativo nº 19/2022 prevê que o 1º, o 3º e o 5º Núcleos de Justiça 4.0 devem auxiliar os Juízos com competência em matéria de Fazenda Pública nas ações que envolvam o direito à saúde pública, com a possibilidade de remessa de processos a qualquer tempo da tramitação. 5. Agravo de Instrumento desprovido." (TJ-RJ - AI: 00130655720238190000 202300218391, Relator: Des(a). JACQUELINE LIMA MONTENEGRO, Data de Julgamento: 05/09/2023, PRIMEIRA CAMARA DE DIREITO PUBLICO, Data de Publicação: 12/09/2023) (destaquei) II.4 - Da Compatibilidade Com O Princípio Da Legalidade E Hierarquia Normativa A impetrante sustenta que a Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024 extrapolou sua função normativa ao criar regra de competência sem previsão legal, violando o princípio da legalidade (art. 5º, II, CF). Embora seja certo que a organização do Poder Judiciário deve respeitar a hierarquia normativa, a Portaria TJMT/CGJ nº 183/2024 não cria nova competência jurisdicional, mas apenas regulamenta o funcionamento do NJDSP como órgão de apoio. Essa distinção é essencial para afastar a alegação de que a portaria teria usurpado a competência legislativa. O STJ já decidiu que normas infralegais não podem alterar regras de competência fixadas em lei, conforme a Súmula 206/STJ. No entanto, o caso em análise não trata da criação de uma nova vara ou juízo privativo, mas da implementação de uma estrutura de cooperação judiciária, sem interferência na competência originária. II.5 - DA COMPATIBILIDADE COM O DIREITO DE ACESSO À JUSTIÇA A impetrante sustenta, ainda, que a remessa dos autos ao NJDSP, sediado na capital, prejudicaria seu direito de acesso à justiça, uma vez que reside em Rondonópolis. Tal alegação, contudo, não se sustenta diante das circunstâncias do caso concreto. Primeiro, porque os autos tramitam eletronicamente pelo sistema PJe, permitindo o acompanhamento integral do processo de forma remota, sem necessidade de deslocamento físico da parte ou de seu procurador. Segundo, porque a impetrante é assistida pela Defensoria Pública, que mantém representação tanto em Rondonópolis quanto na capital, garantindo-se assim a efetividade de sua representação processual. Terceiro, porque a especialização do Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública em demandas de saúde pública potencializa, na verdade, a efetividade do acesso à justiça, ao proporcionar uma prestação jurisdicional mais célere e tecnicamente adequada, o que é especialmente relevante em se tratando de direito fundamental à saúde de pessoa idosa. Por fim, como já mencionado, o próprio sistema normativo prevê a possibilidade de oposição fundamentada à remessa dos autos ao Núcleo, que deve ser analisada pelo Juízo de Origem. A impetrante, todavia, não se valeu dessa prerrogativa no momento oportuno, nem demonstrou prejuízo concreto decorrente da atuação do Núcleo. II.6 - DA CONFORMIDADE COM O PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL O princípio do juiz natural, previsto no art. 5º, LIII, da Constituição Federal, assegura que "ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente". No caso em análise, não se vislumbra violação a tal princípio. Como já explicado, o Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública não se configura como um novo órgão jurisdicional, mas como estrutura de apoio ao juízo natural, no caso, o Juizado Especial da Fazenda Pública de Rondonópolis. A competência para julgamento da causa permanece sendo do juízo natural, ainda que com o auxílio operacional do Núcleo. Ademais, a criação do NJDSP se deu previamente à causa, por meio de ato normativo geral e abstrato (Resolução nº 5/2024 do TJMT), aplicável a todos os processos que versem sobre saúde pública, não havendo designação “post factum” ou casuística de órgão julgador, o que poderia, aí sim, caracterizar violação ao princípio do juiz natural. Por fim, cabe ressaltar que a criação de unidades especializadas para o processamento de determinadas matérias insere-se no poder de auto-organização do Poder Judiciário, reconhecido pelo art. 96, I, da Constituição Federal, não configurando criação de nova competência em sentido estrito, mas reorganização administrativa visando à eficiência e especialização da prestação jurisdicional. Ante todo o exposto, DENEGO A SEGURANÇA pleiteada, por não vislumbrar ilegalidade ou abusividade no ato da autoridade impetrada que determinou a remessa dos autos ao Núcleo de Justiça Digital da Saúde Pública (NJDSP). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/04/2025

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