Processo nº 1020776-92.2023.8.11.0041
ID: 336412654
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1020776-92.2023.8.11.0041
Data de Disponibilização:
28/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
EDUARDO JANZON AVALLONE NOGUEIRA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1020776-92.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1020776-92.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de Contrato] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ISABEL EVELYN DE SOUZA PIZOTO - CPF: 051.260.381-25 (APELANTE), RAPHAEL ALVES RODRIGUES DOS SANTOS - CPF: 029.195.661-05 (ADVOGADO), RUBENS RODRIGUES DOS SANTOS - CPF: 314.595.791-00 (ADVOGADO), BANCO DO BRASIL SA - CNPJ: 00.000.000/0001-91 (APELADO), EDUARDO JANZON AVALLONE NOGUEIRA - CPF: 135.207.888-02 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE CONFIGURADA. LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO. HIPERVULNERABILIDADE. REVISÃO CONTRATUAL. REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedente ação revisional de contrato bancário referente à operação de crédito pessoal não consignado (BB Crédito Renovação nº 986262686), na qual se discute a abusividade dos juros remuneratórios pactuados em renegociação de dívida. II. Questão em discussão 2. A controvérsia consiste em saber: (i) se a taxa de juros remuneratórios estipulada no contrato (6,47% ao mês) é abusiva diante da taxa média de mercado vigente à época (3,37% ao mês); (ii) se há elementos que justifiquem a limitação dos encargos ao patamar médio praticado; e (iii) se é devida a restituição em dobro dos valores pagos a maior, nos termos do art. 42, p.u., do CDC. III. Razões de decidir 3. A jurisprudência do STJ admite a revisão das taxas de juros remuneratórios nos contratos bancários, desde que demonstrada a abusividade em concreto, sendo a taxa média de mercado um parâmetro de aferição. 4. A taxa contratada (6,47% ao mês) excede em mais de 1,5 vezes a média de mercado (3,37% ao mês), ultrapassando o patamar considerado tolerável pela jurisprudência, em especial diante da hipervulnerabilidade da parte consumidora, pessoa idosa e de baixa renda. 5. O reconhecimento da abusividade dos encargos descaracteriza a mora do devedor, conforme entendimento consolidado no REsp 1.061.530/RS (Tema 27). 6. Configurada a cobrança de encargos excessivos sem justificativa razoável e em descompasso com o dever de boa-fé objetiva, impõe-se a devolução em dobro dos valores pagos a maior, com base no art. 42, p.u., do CDC, à luz da tese fixada no EREsp 1.413.542/RS. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de apelação provido para limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado de 3,37% ao mês, afastar a mora e determinar a repetição em dobro dos valores pagos a maior, com correção monetária pelo INPC e juros de 1% ao mês, desde os desembolsos. Tese de julgamento: " "1. Configura abusividade a estipulação de juros remuneratórios que excedam em mais de 1,5 vezes a taxa média de mercado, especialmente em contratos celebrados com consumidores hipervulneráveis. 2. Reconhecida a abusividade dos encargos pactuados na fase de normalidade contratual, impõe-se o afastamento da mora. 3. A repetição do indébito em dobro é devida quando a cobrança indevida viola o dever de boa-fé objetiva, independentemente de má-fé do fornecedor, nos termos do art. 42, p.u., do CDC." Dispositivos relevantes citados CF/1988, art. 170; CDC, arts. 4º, 6º, III, e 42, p.u.; CC/2002, art. 421; CPC/2015, arts. 489 e 927. Jurisprudência relevante citada STJ, REsp 1.061.530/RS (Tema 27), Rel. Min. Nancy Andrighi, 2ª Seção, j. 22.10.2008; STJ, EREsp 1.413.542/RS, Rel. p/ Acórdão Min. Herman Benjamin, Corte Especial, j. 21.10.2020; STJ, AgInt no AREsp 447.560/RS, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª Turma, j. 27.04.2017. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Cuida-se de recurso de apelação cível interposto por ISABEL EVELYN DE SOUZA PIZOTO contra BANCO DO BRASIL S.A., visando à reforma da sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá, nos autos da ação revisional de contrato n.1020776-92.2023.8.0041, que julgou improcedente o pedido inicial de revisão das cláusulas contratuais firmadas entre as partes. Alega a recorrente que a sentença merece ser cassada, por nulidade, ante o cerceamento de defesa decorrente do indeferimento injustificado de prova pericial, a qual teria por objetivo demonstrar a abusividade da taxa de juros contratada. Argumenta que, conquanto o Juízo singular tenha afirmado ser desnecessária a perícia contábil, fundou a improcedência da ação na insuficiência da mera comparação das taxas de juros contratadas com a média de mercado, o que, na prática, inviabilizou a produção de prova técnica adequada para a elucidação do ponto controvertido. Sustenta, ainda, que o contrato objeto da demanda refere-se ao produto bancário denominado “BB Crédito Renovação n. 20222143993011732”, destinado à composição de dívidas anteriores, sendo, portanto, aplicável a ele a taxa de juros média de mercado relativa à modalidade “crédito pessoal não consignado vinculado à composição de dívidas”, conforme séries temporais 20743 e 25465 do Banco Central do Brasil. A taxa efetivamente aplicada, no valor de 6,47% ao mês e 77,64% ao ano, seria significativamente superior à média de mercado para a referida modalidade (3,37% ao mês e 48,78% ao ano), caracterizando abusividade contratual e infringência aos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato. Para reforçar sua alegação, argumenta que em contratos de composição de dívidas, a adoção de taxa de juros de operação distinta (empréstimo pessoal padrão) configura abusividade e enseja revisão contratual com possível repetição do indébito. Sustenta ainda que o valor das prestações foi artificialmente majorado em virtude da aplicação da taxa inadequada, ensejando a restituição em dobro das quantias pagas indevidamente. Isenta de preparo recursal, por ser beneficiária da gratuidade da justiça, id. 291495357. Em contrarrazões (Id. 297629392), o BANCO DO BRASIL S.A. alegou que não há que se falar em abusividade dos juros pactuados, uma vez que a taxa contratada (6,47% ao mês) estaria dentro dos parâmetros legais e abaixo do limite de uma vez e meia a média do mercado, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Destacou, ainda, que a operação foi celebrada por vontade livre da parte consumidora, que teve ciência plena das condições da contratação, inclusive do Custo Efetivo Total (CET), demonstrando o respeito ao dever de informação e à transparência. Rechaça o argumento de que tenha havido cerceamento de defesa, sustentando que a matéria é exclusivamente de direito e que a perícia seria desnecessária, conforme entendimento do TJMT. Reforça que, conforme jurisprudência dominante, não se pode considerar abusiva a taxa de juros apenas por estar acima da média do Bacen, sendo necessária demonstração inequívoca de onerosidade excessiva e desvantagem exagerada, o que não ocorreu. Ao final, pugna pelo desprovimento da apelação, com a manutenção da sentença. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Preambularmente, verifico que o recurso merece ser conhecido, pois presentes os pressupostos de admissibilidade. Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação interposto por ISABEL EVELYN DE SOUZA PIZOTO contra BANCO DO BRASIL S.A., com o objetivo de reformar a sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá, no bojo da ação revisional de contrato n.1020776-92.2023.8.0041, que julgou improcedente o pedido inicial de revisão das cláusulas contratuais firmadas entre as partes. O apelante firmou contrato de crédito pessoal sem consignação em folha de pagamento n. 20222143993011732 (Id. 290776930) na data de 21/11/2022 para a quitação de dívidas anteriores em 60 parcelas de R$ 399,29 com juros remuneratórios fixados em 6,47% ao mês e 77,64% ao ano. Cumpre salientar, de início, que é incontroverso que os fatos e direito apresentados envolvem relação de consumo, pois, nos termos do Súmula n. 297, do STJ, os contratos bancários estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor. DO ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA A parte recorrida suscita preliminarmente de defesa, ante o indeferimento de produção de prova pericial Tal argumento, contudo, não merece acolhimento. O feito versa sobre matéria unicamente de direito, eis que o debate cinge conforme a verificação de suposto excesso de cobrança fundado em alegada cobrança de juros remuneratórios superiores à média de mercado, prática esta que, segundo a tese defensiva, majoraria indevidamente o valor do empréstimo. Contudo, o feito foi devidamente instruído, com a juntada integral dos instrumentos contratuais, todos esses documentos suficientes à formação do convencimento do juízo sobre a matéria controvertida. O cerne da controvérsia repousa sobre cláusulas contratuais previamente estipuladas, e sobre a compatibilidade das taxas de juros com os parâmetros legais e jurisprudenciais vigentes, especialmente à luz da jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de Justiça quanto à limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central. O exame dessa alegação, portanto, prescinde de dilação probatória pericial, porquanto é possível a aferição da legalidade da cobrança com base nos elementos já constantes dos autos, mediante simples cotejo com os índices oficiais divulgados por entidade pública de notória confiabilidade (BACEN). Impende destacar que a legislação processual vigente, cabe ao magistrado, como condutor do processo e destinatário da prova, valorar a necessidade ou não da produção nos termos do art. 370, do CPC. O acervo probatório constante dos autos mostrou-se suficiente à formação do convencimento do juízo, notadamente diante da juntada do suposto contrato eletrônico pelo recorrido e da ausência de comprovação da entrega dos valores à conta bancária do apelante. A matéria, portanto, revelou-se de direito e de fato já suficientemente documentado, não havendo necessidade de dilação probatória adicional. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – CERCEAMENTO DE DEFESA – JULGAMENTO ANTECIPADO – MEROS CÁLCULOS ARITMÉTICOS – INOCORRÊNCIA – MÉRITO – EXCESSO DE EXECUÇÃO – TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA – A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO DA AÇÃO REVISIONAL – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Quando apurado o montante devido por meros cálculos aritméticos, desnecessária a realização de perícia contábil. Segundo delimitado na sentença proferida na ação revisional o termo inicial dos juros demora deve ocorrer a partir do seu trânsito em julgado.” (TJ/MT. RAC 10062066420208110055 MT. Relatora Desa. Antônia Siqueira Goncalves, Terceira Câmara de Direito Privado. Data de Julgamento: 09/02/2022, Data de Publicação: 18/02/2022 - grifo nosso). DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. ALEGAÇÕES DE ILIQUIDEZ DO TÍTULO, EXCESSO DE EXECUÇÃO, ABUSIVIDADE DOS ENCARGOS CONTRATUAIS E NECESSIDADE DE PERÍCIA CONTÁBIL. TAXA DE JUROS DENTRO DA MÉDIA DE MERCADO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS EXPRESSAMENTE PACTUADA. LEGALIDADE DA TABELA PRICE. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Recurso de Apelação interposto por Ronaldo da Silva Alencastro contra sentença que julgou improcedentes os Embargos à Execução opostos em face da Cooperativa de Crédito, Poupança e Investimento do Noroeste de Mato Grosso, Acre e Amazonas – Sicredi Biomas, nos quais o embargante pleiteava a revisão da Cédula de Crédito Bancário n. C20931341-9. O apelante sustentou, em síntese: (i) a iliquidez do título executivo; (ii) a existência de excesso de execução; (iii) a necessidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC); (iv) a abusividade dos encargos contratuais; e (v) a necessidade de realização de perícia contábil. II. Questão em discussão (...) 4. A realização de perícia contábil é desnecessária quando o excesso de execução pode ser aferido por cálculos aritméticos simples, o que foi possível no presente caso, dada a clareza dos documentos apresentados pela parte embargada. (...) (N.U 1005942-71.2023.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/01/2025, Publicado no DJE 27/01/2025 - grifo nosso) Desta feita, não há nenhuma ilegalidade no julgamento antecipado da lide promovido pelo juízo singular, inexistido cerceamento de defesa. Ante o exposto, rejeita-se a preliminar arguida. MÉRITO A controvérsia central cinge-se à alegada abusividade das cláusulas contratuais, especificamente quanto às taxas de juros aplicadas, supostamente em desconformidade com as disposições do Código de Defesa do Consumidor contrato de crédito pessoal sem consignação em folha de pagamento - BB Crédito Renovação n. 986262686 (Id.290776947) Dos juros remuneratórios De início, sobre o assunto, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que "A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que, nos contratos bancários, não se aplica a limitação da taxa de juros remuneratórios em 12% ao ano, e de que não se pode aferir a exorbitância da taxa de juros apenas com base na estabilidade econômica do país, sendo necessária a demonstração, no caso concreto, de que a referida taxa diverge da média de mercado" (STJ. AgRg no REsp 789.257/RS. Rel. Maria Isabel Gallotti. T4. Julg. 26.10.2010). Nesse sentido, cita-se ainda a súmula 382, do STJ: “A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”. Imperioso destacar o pacífico entendimento jurisprudencial acerca da possibilidade de revisão de taxas de juros remuneratórios, mas apenas em situações excepcionais, quando efetivamente demonstrada a abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada. Tal entendimento foi consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 1.061.530/RS, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 27). Contudo, é imprescindível ressaltar que a mera comparação com a taxa média de mercado, por si só, não é suficiente para caracterizar abusividade. A análise deve ser mais profunda, considerando as peculiaridades do caso concreto, conforme bem destacou a Ministra Nancy Andrighi no voto condutor do precitado recurso repetitivo: “esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos” (REsp n. 1.061.530/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 22/10/2008, DJe de 10/3/2009 - destaquei). Ressalte-se que o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que se deve observar, para a limitação dos juros remuneratórios, fatores como o custo de captação dos recursos, o spread da operação, a análise de risco de crédito do contratante, ponderando-se a caracterização da relação de consumo e eventual desvantagem exagerada do consumidor. Ademais, há de sopesar que “a circunstância de a taxa de juros remuneratórios praticada pela instituição financeira exceder a taxa média do mercado não induz, por si só, a conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa em um referencial a ser considerado, e não em um limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras” (STJ, AgInt no AREsp 447.560/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 27/04/2017, Dje 19/05/2017). Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros. A esse respeito, observa-se que o Colendo Superior Tribunal de Justiça considerou abusiva a incidência de taxas superiores a uma vez e meia a taxa média de mercado (REsp 271214/RS, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, Rel. p/ Acórdão Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO , SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/03/2003, DJ 04/08/2003, p. 216). No caso concreto, o contrato foi celebrado livremente entre as partes, sendo o apelante devidamente informado das condições pactuadas, inclusive quanto ao custo efetivo total do empréstimo, trata-se de renegociação de dívidas existentes como descrito no demonstrativo de Origem e Evolução de Dívida Crédito Direto ao Consumidor de Id. 290776930 – “contratos renovados”. O instrumento contratual celebrado apresenta a aplicação de juros remuneratórios fixados em 6,47% ao mês e 77,64% ao ano e o custo efetivo total (CET) de 6,49% ao mês e 112,19% ao ano: O exame da controvérsia sub judice demanda pormenorizada análise quanto à caracterização de eventual abusividade na pactuação de juros remuneratórios em operação de natureza bancária, à luz dos parâmetros normativos e jurisprudenciais consolidados na ordem jurídica pátria. Com efeito, a o contrato foi firmado emitida em 21/1/2022), a taxa média de juros praticada no mercado era de 3,37% ao mês, conforme dados oficiais do Banco Central do Brasil (https://calculojuridico.com.br/juros-bacen/) e Id. 290776931o que demonstra a imposição à consumidora de desvantagem exagerada, circunstância que autoriza a intervenção do Poder Judiciário para a readequação contratual. No caso, não há como aceitar a taxa de juros remuneratórios apresentados pelo recorrido em sua contrarrazões de 5,27% ao mês, por não se tratar do período da contratação (ago/2022) e se tratar de operação de crédito pessoal não consignado. No caso em tela, o crédito foi contratado para quitar dívidas existentes ou seja para composição de dívida. Aplicando-se o parâmetro jurisprudencial de 1,5 vezes a taxa média de mercado como limite a partir do qual haveria indício de abusividade, teríamos como teto aceitável o percentual de 5,055% ao mês. Como a taxa contratada foi de 6,47% ao ano, se verifica, no caso concreto, a alegada extrapolação dos limites razoáveis de mercado. Além disso, a ausência de critérios objetivos que justifiquem tamanha disparidade entre as taxas contratadas e aquelas usualmente praticadas no mercado reforçam a abusividade das cláusulas, especialmente diante da vulnerabilidade da parte autora. Nesse sentido já decidiu esta Câmara julgadora em um caso semelhante: “DIREITO CIVIL E PROCESSUALCIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS BANCÁRIOS. JUROS REMUNERATÓRIOS. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. REDISCUSSÃO DO MÉRITO. EMBARGOS REJEITADOS. I. Caso em exame 1. Embargos de declaração opostos pela CREFISA S/A contra acórdão que desproveu o recurso de apelação, mantendo a sentença que determinou a revisão dos contratos de empréstimo pessoal, limitando as taxas de juros à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central. II. Questão em discussão 2. A controvérsia consiste em verificar se há omissão no acórdão embargado quanto à aplicação do entendimento firmado no REsp 1.821.182/RS do STJ, o qual reconhece a especificidade do nicho de mercado da instituição financeira e o maior risco de inadimplência de seus clientes como justificativas para taxas diferenciadas, frente à jurisprudência consolidada sobre o REsp 1.061.530/RS utilizada no acórdão embargado. III. Razões de decidir 3. O acórdão embargado fundamentou adequadamente sua decisão na jurisprudência consolidada do STJ, especialmente no REsp 1.061.530/RS, que admite a revisão das taxas remuneratórias quando constatada abusividade, tomando como parâmetro a taxa média de mercado. 4. A alegação da embargante de que o risco da operação justificaria encargos superiores não se sobrepõe à orientação do STJ, segundo a qual não bastaria a mera alegação de risco, devendo ser demonstrada a abusividade em concreto. 5. No caso, os contratos celebrados apresentavam taxas de juros superiores a 500% da média de mercado, configurando onerosidade excessiva e violação ao princípio do equilíbrio contratual, justificando a limitação dos encargos ao patamar médio praticado. IV. Dispositivo e tese 6. Embargos de declaração rejeitados. Tese de julgamento: “Os embargos de declaração não se prestam à rediscussão do mérito quando o acórdão embargado já enfrentou de forma fundamentada as questões postas. A aplicação da taxa média de mercado como parâmetro de controle da abusividade dos juros remuneratórios é legítima quando demonstrada discrepância significativa entre os valores pactuados e os praticados no mercado.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 170; CDC, art. 51, IV; CPC/2015, art. 1.022. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.061.530/RS (Tema 27), Rel. Min. Nancy Andrighi, 2ª Seção, j. 22/10/2008; STJ, REsp 1.821.182/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j. 11/06/2019; STJ, AgInt no AREsp 2.175.102/MT, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, j. 23/05/2023.” (N.U 1004142-55.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/02/2025, Publicado no DJE 28/02/2025). (grifo nosso) “APELAÇÕES. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. PRELIMINARES. NULIDADE POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. AFASTADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. AFASTADO. DIALETICIDADE RECURSAL. AFASTADA. JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS. LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO. RESTITUIÇÃO SIMPLES. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS SOBRE O PROVEITO ECONÔMICO. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. I. CASO EM EXAME Apelações Cíveis interpostas contra sentença da 2ª Vara Cível de Sinop/MT, que julgou parcialmente procedente ação revisional de contrato bancário. A sentença declarou a abusividade da taxa de juros remuneratórios pactuada (22% ao mês e 987,22% ao ano), determinou sua limitação à taxa média de mercado (5,70% ao mês e 94,57% ao ano), autorizou a capitalização, reconheceu a descaracterização da mora e condenou a ré à restituição simples dos valores pagos a maior, com juros de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC, além de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o proveito econômico. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO As questões em discussão são: (i) verificar a existência de nulidades na sentença por ausência de fundamentação, cerceamento de defesa ou violação à dialeticidade recursal; (ii) examinar a validade da taxa de juros contratada e a adequação de sua limitação à taxa média de mercado; (iii) definir se é cabível a substituição do índice de correção monetária (INPC) pelo IGP-M e a fixação de honorários advocatícios com base na equidade. III. RAZÕES DE DECIDIR A sentença está devidamente fundamentada, com base em dispositivos legais e precedentes, atendendo ao art. 489 do CPC. A alegação de ausência de fundamentação não se sustenta, pois os fundamentos foram expostos de forma clara e específica quanto à controvérsia dos autos. Não houve cerceamento de defesa, pois a matéria debatida é essencialmente jurídica e documental. A prova oral requerida mostrou-se impertinente à análise da legalidade dos encargos contratuais, sendo legítima a opção do juízo pelo julgamento antecipado da lide com base no art. 355, I, do CPC. Rejeita-se a preliminar de ausência de dialeticidade recursal, uma vez que a apelação impugna especificamente os fundamentos da sentença, demonstrando o inconformismo da parte com os critérios de correção monetária e fixação dos honorários. Os juros remuneratórios pactuados (22% ao mês e 987,22% ao ano) revelam flagrante abusividade, por ultrapassarem em mais de 500% a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central. A jurisprudência do STJ, consolidada no REsp 1.061.530/RS, autoriza a revisão quando verificada discrepância relevante entre a taxa contratada e a taxa média de mercado. O nicho de atuação da CREFISA, voltado a consumidores de alto risco, não legitima a imposição de encargos desproporcionais, especialmente diante da vulnerabilidade da consumidora e da ausência de justificativa técnica para a onerosidade excessiva. É legítima a aplicação do INPC como índice de correção monetária, por refletir com maior precisão o custo de vida e a desvalorização da moeda, sendo o mais adequado à natureza da demanda consumerista. O IGP-M não é adotado pelos tribunais em hipóteses semelhantes. Não há cabimento na fixação dos honorários advocatícios por equidade, nos termos do art. 85, §8º do CPC, pois o proveito econômico é determinado e mensurável. A regra do art. 85, §2º, deve prevalecer, impondo-se a fixação do percentual sobre o valor obtido na condenação. IV. DISPOSITIVO E TESE Recursos conhecidos e desprovidos. Tese de julgamento: A existência de taxa de juros remuneratórios superior em mais de 500% à média de mercado justifica sua limitação com base nos princípios do CDC e na jurisprudência do STJ. A atuação em nicho de alto risco não afasta a incidência do controle de abusividade sobre cláusulas contratuais bancárias. O INPC é o índice de correção monetária adequado para ações de repetição de indébito de natureza consumerista. A fixação dos honorários advocatícios por equidade exige a presença cumulativa dos requisitos do art. 85, §8º, do CPC, não se aplicando quando o proveito econômico é definido e mensurável. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 170; CDC, art. 51, IV; CPC/2015, arts. 85, §§2º e 8º, 370, 489, 1.010, II, 355, I. CC/2002, art. 406. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.061.530/RS (Tema 27), Rel. Min. Nancy Andrighi, 2ª Seção, j. 22.10.2008; STJ, AgInt no AREsp 2.518.721/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 29.04.2024, DJe 02.05.2024; TJMT, Apelação Cível nº 1004142-55.2022.8.11.0041, Rel. Des. Marcos Regenold Fernandes, j. 25.02.2025; TJMT, Apelação Cível nº 1029298-74.2024.8.11.0041, Rel. Des. Sebastião de Arruda Almeida, j. 17.12.2024.” (N.U 1020041-40.2023.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 01/04/2025). (grifo nosso) Diante desse cenário, reconheço a abusividade da taxa de juros pactuada, determinando sua adequação à taxa média de mercado vigente no momento da contratação, qual seja, 3,37% ao mês ao mês. No que tange à configuração da mora do devedor, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp 1.061.530/RS, firmou entendimento no sentido de que “a abusividade dos encargos cobrados no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora”. No caso sub judice, tendo sido reconhecida a abusividade da taxa de juros remuneratórios durante a vigência regular da relação contratual, impõe-se, como consequência lógica, o afastamento da mora debendi, em conformidade com a jurisprudência já consolidada sobre a matéria. RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTADOS No que concerne à repetição do indébito, a devolução dos valores pagos a maior pelo consumidor, deve ser dobrada, sob o fundamento de ausência de comprovação de má-fé da instituição financeira. O art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, que assim dispõe: "Art. 42. (...) Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável." O referido dispositivo estabelece a regra geral da repetição em dobro, admitindo exceção apenas nos casos de engano justificável — o que constitui verdadeira cláusula de escape normativa, apta a afastar a sanção pecuniária na ausência de conduta reprovável por parte do fornecedor. Contudo, deve ser observado o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos EREsp 1413542/RS, no sentido de que a má-fé não é requisito necessário para a devolução em dobro, bastando a violação ao dever de boa-fé objetiva, a saber: "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC. REQUISITO SUBJETIVO. DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA. IRRELEVÂNCIA. PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA. ART. 927, § 3º, DO CPC/2015. IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA. 1. Trata-se de Embargos de Divergência que apontam dissídio entre a Primeira e a Segunda Seções do STJ acerca da exegese do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor - CDC. A divergência refere-se especificamente à necessidade de elemento subjetivo para fins de caracterização do dever de restituição em dobro da quantia cobrada indevidamente. 2. Eis o dispositivo do CDC em questão: "O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável"(art. 42, parágrafo único, grifo acrescentado)." (...)" 28. Com essas considerações, conhece-se dos Embargos de Divergência para, no mérito, fixar-se a seguinte tese: A REPETIÇÃO EM DOBRO, PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC, É CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA, OU SEJA, DEVE OCORRER INDEPENDENTEMENTE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. 29. Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público - se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão. RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 30. Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido fixou como requisito a má-fé, para fins do parágrafo único do art. 42 do CDC, em indébito decorrente de contrato de prestação de serviço público de telefonia, o que está dissonante da compreensão aqui fixada. Impõe-se a devolução em dobro do indébito. CONCLUSÃO 31. Embargos de Divergência providos." (Corte Especial, j. Em 21/10/2020, DJe 30/3/2021 – grifo nosso) Assim sendo, o Superior Tribunal de Justiça fixou tese jurídica pela Corte Especial sobre o assunto (EAREsp 600663/RS, EAREsp 622897/RS, EAREsp 664888/RS, EAREsp 676608/RS e EREsp 1413542/RS precedentes prévios necessários), no Tema 929: ''a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo.'' Porém, houve modulação daquele entendimento: " 29. Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão." A discussão foi recentemente revisitada pelo c. STJ no bojo do EREsp 1498617 MT 2014/0277943-9, de relatoria do Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, no qual assentou-se o seguinte: “Trata-se de embargos de divergência opostos pela Defensoria Pública de Mato Grosso ao acórdão da Terceira Turma, relatado pelo Ministro Marcos Aurélio Bellizze e ementado nestes termos: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. ADMISSIBILIDADE. SÚMULA 322/STJ. PROVA DO ERRO. PRESCINDIBILIDADE. REPETIÇÃO EM DOBRO. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. REPETIÇÃO DE FORMA SIMPLES. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é possível tanto a compensação de créditos quanto a devolução da quantia paga indevidamente, independentemente de comprovação de erro no pagamento, em obediência ao princípio que veda o enriquecimento ilícito. Inteligência da Súmula 322/STJ. Todavia, para se determinar a repetição do indébito em dobro deve estar comprovada a má-fé, o abuso ou leviandade, como determinam os arts. 940 do Código Civil e 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, o que não ficou comprovado na presente hipótese. 2. Agravo regimental desprovido.” Sustenta o embargante (fls. 935/958) que a matéria da controvérsia em questão trata especificamente da possibilidade de determinar a repetição do indébito em dobro, do valor indevidamente cobrado, independente comprovação de dolo ou da culpa, má-fé, abuso ou leviandade. Assevera que o entendimento exarado no acórdão embargado (necessidade da comprovação da má-fé) é contrário ao proferido julgamento do paradigma (AgRg no AREsp 610.885/MG, Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 21/5/2015), uma vez que se decidiu pela obrigatoriedade de restituição em dobro, do valor indevidamente cobrado, independentemente da existência de dolo ou culpa, exceto no caso de engano justificável. Eis a ementa do aresto paradigma: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS À UNIVERSIDADE. ALUNA DO CURSO DE MEDICINA JÁ GRADUADA EM BIOMEDICINA. DISPENSA DE MATÉRIAS JÁ CURSADAS NA MESMA INSTITUIÇÃO. EXIGÊNCIA DE EXAME DE PROFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE RAZOABILIDADE. COBRANÇA INDEVIDA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. 1. A jurisprudência desta Corte já se pacificou no sentido da obrigatoriedade de restituição, em dobro, do valor indevidamente cobrado, independentemente da existência de dolo ou culpa, nos termos do art. 42, parágrafo único, da Lei 8.078/1990, exceto no caso de engano justificável, circunstância não aventada pelas instâncias ordinárias. Nesse sentido: STJ, AgRg no REsp 1.229.773/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 5.2.2013; STJ, AgRg no AREsp 192.989/MS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 11.9.2012. 2. Agravo Regimental não provido. (...) O acórdão embargado é da Terceira Turma e o paradigma é da Segunda Turma. De início, importa delimitar a divergência existente nos aludidos julgados. O acórdão embargado foi categórico ao firmar entendimento de que para se determinar a repetição do indébito em dobro deve estar comprovada a má-fé, o abuso ou leviandade, como determinam os arts. 940 do Código Civil e 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. O acórdão paradigma, por sua vez, decidiu a controvérsia com entendimento contrário ao acórdão embargado. Em sentido oposto, o paradigma assentou a obrigatoriedade de restituição, em dobro, do valor indevidamente cobrado, independentemente da existência de dolo ou culpa , nos termos do art. 42, parágrafo único, da Lei 8.078/1990, exceto no caso de engano justificável. (...) Desse modo, as repetições de indébito relativas às cobranças discutidas nesta demanda e praticadas após 30/4/2008 e até 30/3/2021 deverão ser realizadas de modo simples. Por outro lado, se a cobrança da taxa de emissão de boleto for efetuada em momento posterior a 30/3/2021, a devolução será em dobro. O acórdão embargado, portanto, deve ser parcialmente reformado para enquadrar-se no decidido pela Corte Especial no EREsp n. 1.413.542/RS. (...)” (STJ - EREsp: 1498617 MT 2014/0277943-9, Relator.: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Julgamento: 05/06/2024, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 10/06/2024 – grifos e destaques nosso) Nesta ordem de ideias, prevalece o entendimento de que, para haver devolução em dobro, exige-se a cobrança de má-fé, mesmo nos contratos de consumo (quando não envolvido serviço público). Somente para cobranças após 30/03/2021, que é o caso dos autos, será aplicável a conclusão do referido acórdão de que para devolução em dobro (art. 42 CDC) bastará uma conduta contrária à boa-fé contratual, independente da natureza volitiva (dolo ou má-fé). E, a partir daquela data, será do fornecedor o ônus de demonstrar o engano justificável e de uma ação adequada à boa-fé objetiva. No caso em análise, a cobrança de juros remuneratórios em patamar que excede em a taxa média do mercado, caracteriza evidente conduta contrária à boa-fé objetiva, ainda mais considerando tratar-se de consumidor idoso, de baixa renda e em posição de hipervulnerabilidade. Importante destacar que a exigência de comprovação de má-fé para autorizar a repetição em dobro do indébito impõe ao consumidor um ônus probatório excessivo, denominado de "prova diabólica", contrariando a própria ratio do CDC, que busca equilibrar as relações jurídicas de consumo. O entendimento consolidado pelo STJ no EAREsp nº 676.608/RS representa um significativo avanço na tutela dos direitos dos consumidores, ao desvincular a repetição em dobro do indébito da comprovação da má-fé, bastando que a conduta seja contrária à boa-fé objetiva, como ocorre na hipótese dos autos. Essa compreensão já foi adotada por este Tribunal de Justiça, conforme se verifica: “RECURSOS DE APELAÇÃO CIVEL - Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Reparação de Danos Morais e Materiais – seguro não contratado – desconto indevido – devolução em dobro – dano moral configurado – recursos desprovidos. Nos termos do art. 14, do CDC, por ser objetiva a responsabilidade do prestador de serviço, como na espécie em julgamento, responde pelos danos causados ao consumidor, independentemente de culpa. Inexistindo prova da contratação válida, os descontos efetuados nos proventos de aposentadoria são irregulares, capaz de gerar danos de ordem moral, tendo em vista a privação de parte dos rendimentos. A fixação dos danos morais deve ser segundo os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, não podendo ser em valor irrisório, tampouco fonte de enriquecimento sem causa, exercendo função reparadora do prejuízo e de prevenção da reincidência da conduta lesiva. “1. "A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo" (EAREsp 600.663/RS, Rel. Min. MARIA TEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. para Acórdão Min. HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/03/2021).” (N.U 1000926-97.2019.8.11.0039, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/02/2024, Publicado no DJE 08/02/2024 – grifo nosso) RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA C/C INDENIZATÓRIA – CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO – ACORDO – QUITAÇÃO – PERMANÊNCIA DOS DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO – ILICITUDE - REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO – AUSÊNCIA DE ENGANO JUSTIFICÁVEL – CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA - EXEGESE DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC - DANO MORAL CONFIGURADO – VALOR ARBITRADO EM CONSONÂNCIA COM O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE – RECURSO DESPROVIDO. Demonstrado nos autos que a parte autora firmou acordo com a instituição bancária para quitação de dívida referente a contrato de cartão de crédito consignado e que mesmo depois do efetivo cumprimento permaneceram os descontos lançados na folha de pagamento do benefício previdenciário, deve ser mantida a sentença que declarou inexistente o débito e determinou a restituição dos valores cobrados indevidamente. A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. (EAREsp nº 676.608/RS). A falha na prestação do serviço bancário, consubstanciada no desconto do vencimento da parte autora de inúmeras parcelas indevidas referentes a contrato de cartão de crédito consignado já quitado, obrigando o consumidor a recorrer ao Poder Judiciário, caracteriza ato ilícito passível de indenização por danos morais. O valor da indenização por dano moral deve ser fixado proporcionalmente à intensidade e extensão da lesão causada ao consumidor, observada a conduta e o perfil das partes, e com atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10160758820238110041, Relator.: JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Data de Julgamento: 18/06/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/06/2024 – grifo nosso) “AÇÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE VALORES – CLONAGEM DE CARTÃO DE CRÉDITO – MOVIMENTAÇÃO ATÍPICA DO PERFIL DE COMPRAS DA CONSUMIDORA – AUTORIZAÇÃO DA COMPRA – FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM ADEQUADO – RESTITUIÇÃO DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE EM DOBRO MANTIDO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A inobservância do perfil de compras do consumidor constitui negligência interna independente da fraude perpetrada para a obtenção dos dados bancários sigilosos, nos termos do disposto no artigo 186 do Código Civil O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes, devendo ser mantido o valor arbitrado na sentença, quando se apresenta consentâneo com a realidade do caso concreto. In casu, a despeito de não identificado o elemento volitivo do banco recorrente, a cobrança de dívida não contratada pela correntista – que, adotados por ele métodos mais eficazes de segurança, nem sequer existiria – denota engano inescusável/conduta contrária à boa-fé objetiva, a autorizar a pretendida repetição dobrada.” (N.U 1000635-69.2023.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 03/04/2024, Publicado no DJE 06/04/2024 – grifo nosso) Dessa forma, a devolução dos valores pagos a maior pelo consumidor deve ocorrer na forma dobrada, nos termos do parágrafo único do art. 42 do CDC, com acréscimo de correção monetária pelo INPC e juros de mora de 1% ao mês, a partir da data do desembolso, facultada a dedução no saldo devedor do contrato, se houver. Ante o exposto, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação com o fim de reduzir dos juros remuneratórios à taxa média de mercado em 3,37% ao mês. Por conseguinte, determino o retorno dos autos ao juízo de origem para que seja realizado o recálculo do débito exequendo, observados os parâmetros ora fixados e no caso de devolução dos valores pagos a maior pelo apelante seja feita na forma dobrada, nos termos do parágrafo único do art. 42, do CDC, com acréscimo de correção monetária e juros de mora de 1% ao mês, a partir da data de desembolso, facultada a dedução do saldo devedor do contrato, se houve. Em razão do resultado do julgamento, inverto a condenação dos honorários advocatícios em benefício do recorrente e majoro de 10% para 15% sobre o valor atualizado da causa., É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/07/2025
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