Processo nº 5010888-63.2025.4.04.7001
ID: 335756424
Tribunal: TRF4
Órgão: 3ª Vara Federal de Londrina
Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL
Nº Processo: 5010888-63.2025.4.04.7001
Data de Disponibilização:
28/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RODRIGO OTAVIO ACCETE BELINTANI
OAB/PR XXXXXX
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MANDADO DE SEGURANÇA Nº 5010888-63.2025.4.04.7001/PR
IMPETRANTE
: SUPERMERCADOS BAZA LTDA
ADVOGADO(A)
: RODRIGO OTAVIO ACCETE BELINTANI (OAB PR027739)
DESPACHO/DECISÃO
1. RELATÓRIO
Trata-se de manda…
MANDADO DE SEGURANÇA Nº 5010888-63.2025.4.04.7001/PR
IMPETRANTE
: SUPERMERCADOS BAZA LTDA
ADVOGADO(A)
: RODRIGO OTAVIO ACCETE BELINTANI (OAB PR027739)
DESPACHO/DECISÃO
1. RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por
SUPERMERCADO BAZA LTDA
contra ato do
DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - UNIÃO - FAZENDA NACIONAL - LONDRINA
, objetivando a concessão de segurança destinada a que
"(...) (i) seja reconhecido o direito líquido e certo da Impetrante à não incidência da Contribuição ao PIS e da COFINS sobre os descontos comerciais recebidos pela Impetrante de seus fornecedores (descontos prefixados em acordos comerciais e liquidados quando do pagamento de duplicatas, cujos valores não constituem receita da Impetrante, mas mero redutores do custo das mercadorias por ela adquiridas), isto é, o direito de excluir os valores recebidos a título de descontos comerciais das bases de cálculo da Contribuição ao PIS e da COFINS; e (ii) seja declarado do direito da Impetrante à compensação administrativa do indébito tributário correlacionado, nos termos dos arts. 73 e 74, da Lei n.º 9.430/1996, e 39, § 4.º, da Lei n.º 9.250/1995"
.
Em síntese, a Impetrante pretende que seja reconhecido seu direito de não sofrer tributação pelo PIS e COFINS sobre os valores relativos a descontos que recebe de seus fornecedores na aquisição das mercadorias revendidas.
Para tanto, sustenta que a obtenção dos descontos não implica qualquer forma de receita a ser tributada pelo PIS e pela COFINS, mas apenas redução no custo de aquisição dos produtos. Ainda que não fosse assim, diz que os descontos seriam incondicionados, a despeito de constarem ou não nas notas fiscais. Por isso, mesmo na hipótese de serem considerados receitas, estariam livres da tributação, conforme a legislação de regência.
Requer a concessão de medida liminar.
Juntou documentos (eventos 1 e 20).
Vieram conclusos.
É o breve relato.
Decido.
2. FUNDAMENTAÇÃO
Para o deferimento do pedido liminar é preciso que estejam preenchidos os requisitos previstos no art. 7°, III, da Lei nº 12.016/2009, nomeadamente (i) o fundamento relevante e que (ii) do ato impugnado (ou da ausência de sua prática) possa resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida.
A Impetrante alega que os descontos que recebe de seus fornecedores por ocasião da aquisição de mercadorias para revenda não se caracterizam como faturamento e, consequentemente, não podem tributados pelo PIS e pela COFINS.
Vejamos.
As Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003 estabelecem que o fato gerador do PIS e da COFINS é o faturamento mensal, compreendendo o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação fiscal.
Eis o teor do artigo 1º da Lei nº 10.637/2002:
Artigo 1º A Contribuição para o PIS/Pasep, com a incidência não cumulativa, incide sobre o
total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica
, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.
§ 1
o
Para efeito do disposto neste artigo, o total das receitas compreende a receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei n
o
1.598, de 26 de dezembro de 1977, e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica com os respectivos valores decorrentes do ajuste a valor presente de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei n
o
6.404, de 15 de dezembro de 1976.
§ 2
o
A base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep é o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, conforme definido no caput e no § 1
o
.
§ 3
o
Não integram a base de cálculo a que se refere este artigo, as receitas:
I - decorrentes de saídas isentas da contribuição ou sujeitas à alíquota zero;
II - (VETADO)
III - auferidas pela pessoa jurídica revendedora, na revenda de mercadorias em relação às quais a contribuição seja exigida da empresa vendedora, na condição de substituta tributária;
(...)
V - referentes a:
a) vendas canceladas e aos descontos incondicionais concedidos;
b) reversões de provisões e recuperações de créditos baixados como perda, que não representem ingresso de novas receitas, o resultado positivo da avaliação de investimentos pelo valor do patrimônio líquido e os lucros e dividendos derivados de participações societárias, que tenham sido computados como receita;
VI - de que trata o inciso IV do caput do art. 187 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, decorrentes da venda de bens do ativo não circulante, classificado como investimento, imobilizado ou intangível;
VII - decorrentes de transferência onerosa a outros contribuintes do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS de créditos de ICMS originados de operações de exportação, conforme o disposto no inciso II do § 1o do art. 25 da Lei Complementar no 87, de 13 de setembro de 1996.
VIII - financeiras decorrentes do ajuste a valor presente de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, referentes a receitas excluídas da base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep;
IX - relativas aos ganhos decorrentes de avaliação de ativo e passivo com base no valor justo;
X - de subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e de doações feitas pelo poder público;
XI - reconhecidas pela construção, recuperação, reforma, ampliação ou melhoramento da infraestrutura, cuja contrapartida seja ativo intangível representativo de direito de exploração, no caso de contratos de concessão de serviços públicos;
XII - relativas ao valor do imposto que deixar de ser pago em virtude das isenções e reduções de que tratam as alíneas “a”, “b”, “c” e “e” do § 1
o
do art. 19 do Decreto-Lei n
o
1.598, de 26 de dezembro de 1977; e
XIII - relativas ao prêmio na emissão de debêntures.
Nesse mesmo sentido, o artigo 1º da Lei nº 10.833/2003 traz a seguinte disposição:
Artigo 1
o
A Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins, com a incidência não cumulativa,
incide sobre o total das receitas auferidas no mês
pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.
§ 1
o
Para efeito do disposto neste artigo, o total das receitas compreende a receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei n
o
1.598, de 26 de dezembro de 1977, e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica com os seus respectivos valores decorrentes do ajuste a valor presente de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei n
o
6.404, de 15 de dezembro de 1976.
Assim, para apurar se os descontos obtidos pela Impetrante junto aos seus fornecedores devem ou não ser tributados pelo PIS e COFINS, é necessário aferir se eles se enquadram no conceito de receita definido na legislação.
A Receita Federal do Brasil entende que os descontos obtidos pelas empresas junto aos seus fornecedores de mercadorias podem ou não configurar receita, conforme eles sejam condicionados ou não à implementação de alguma contraprestação.
A Solução de Consulta COSIT 531, de 22/12/2017, expõe os fundamentos para tanto utilizados pelo fisco no sentido de que os descontos incondicionais lançados na nota fiscal de aquisição de mercadorias não se sujeitariam à tributação pelo PIS e COFINS em relação ao adquirente, enquanto aqueles condicionados a alguma contraprestação do adquirente das mercadorias configurariam receita na medida em que representariam ingresso financeiro posterior decorrente da redução do montante devido a fornecedores (redução de passivo).
Eis a ementa da Solução de Consulta COSIT 531/2017:
EMENTA: INCIDÊNCIA NÃO CUMULATIVA. DESCONTOS CONDICIONAIS OBTIDOS. RECEITA TRIBUTÁVEL.
Os descontos incondicionais são aqueles que constam da nota fiscal de venda dos bens ou da fatura de serviços e não dependem de evento posterior à emissão desses documentos.
Somente os descontos considerados incondicionais podem ser excluídos da base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep apurada no regime não cumulativo.
Os descontos condicionais obtidos pela pessoa jurídica configuram receita sujeita à incidência da Contribuição para o PIS/Pasep apurada no regime não cumulativo, que não pode ser excluída da base de cálculo da referida contribuição.
Inaplicável a alíquota zero prevista no art. 2º da Lei nº 10.147, de 2000, tendo em vista que as receitas relativas aos descontos condicionais obtidos não decorrem da venda de produtos sujeitos à tributação concentrada, mas sim da implementação de determinada condição que permite à pessoa jurídica reduzir o montante devido a seus fornecedores.
Desde 1º de julho de 2015, aplicam-se as alíquotas de que trata o Decreto nº 8.426, de 2015, às receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não cumulativa da Contribuição para o PIS/Pasep.
Para fins de determinação da alíquota da Contribuição para o PIS/Pasep incidente sobre o desconto condicional, deve-se determinar a natureza da receita decorrente desse desconto, a qual depende da caracterização do negócio jurídico firmado entre as partes, nos termos das condições contratuais pactuadas.
Dispositivos Legais: Lei nº 10.147, de 2000, arts. 1º e 2º; Lei nº 10.637, de 2002, art. 1º; Decreto nº 8.426, de 2015, art. 1º.
Especificamente no que importa para a compreensão da lide, consta da fundamentação da Solução de Consulta COSIT nº 531/2017 que
"os descontos condicionais obtidos pela interessada configuram receita, na medida em que representam ingresso de benefício econômico decorrente da redução do montante devido a fornecedores (redução de passivo)".
1
O raciocínio utilizado pela Autoridade fiscal não observa com fidelidade a definição da base de cálculo do PIS e da COFINS trazida pelo art. 1º das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, segundo os quais somente são tributadas as
"receitas auferidas"
pelas empresas contribuintes.
O verbo
"auferir"
significa obter resultado, ter proveito.
Assim, receitas auferidas são aquelas que ingressam no caixa da empresa. São recursos obtidos por ela. Vale trazer a lume, aqui, o conceito de
receita
de Geraldo Ataliba,
'in verbis'
:
O
conceito de receita refere-se a uma espécie de entrada. Entrada é todo o dinheiro que ingressa nos cofres de uma entidade
. Nem toda entrada é uma receita. Receita é a entrada que passa a pertencer à entidade. Assim, só
se considera receita o ingresso de dinheiro que venha a integrar o patrimônio da entidade que o recebe
. As receitas devem ser escrituradas separadamente das meras entradas. É que estas não pertencem à entidade que as recebe. Têm caráter eminentemente transitório. Ingressam a título provisório, para saírem, com destinação certa, em breve lapso de tempo. (Estudos e Pareceres de Direito Tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, Vol. 1, p. 85)(grifei)
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 606.107 (Tema 283 de Repercussão Geral), que tratou da inclusão de créditos do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS, seguiu essa mesma trilha ao assim definir o conceito de receita bruta:
O conceito de receita, acolhido pelo art. 195, I, 'b', da Constituição Federal, não se confunde com o conceito contábil. Entendimento, aliás, expresso nas Leis 10.637/02 (art. 1º) e Lei 10.833/03 (art. 1º), que determinam a incidência da contribuição ao PIS/PASEP e da COFINS não cumulativas sobre o total das receitas, 'independentemente de sua denominação ou classificação contábil'. Ainda que a contabilidade elaborada para fins de informação ao mercado, gestão e planejamento das empresas possa ser tomada pela lei como ponto de partida para a determinação das bases de cálculo de diversos tributos, de modo algum subordina a tributação. A contabilidade constitui ferramenta utilizada também para fins tributários, mas moldada nesta seara pelos princípios e regras próprios do Direito Tributário. Sob o específico prisma constitucional,
receita bruta pode ser definida como o ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições
. (STF, Tema n. 283, RE 606.107/RS, Rel. Ministra ROSA WEBER, TRIBUNAL PLENO, julgado em 22/05/2013, DJe 22/11/2013) (grifei)
Chama a atenção o alerta feito pelo STF de que conceitos ou noções contábeis não podem pautar a definição de
receita
adotada pela lei tributária. Com efeito, cabe à lei definir as bases de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS (art. 97, III e IV do CTN
2
). As Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, como visto, delimitaram a noção de receita bruta
"independentemente de sua denominação ou classificação contábil"
A receita, portanto, segundo a lei, consiste em um ingresso financeiro positivo que se incorpora ao patrimônio do contribuinte.
A partir daí, percebe-se que os descontos obtidos pela empresa junto a seus fornecedores não se configuram como receita auferida, pois não representam nenhum ingresso financeiro no caixa do contribuinte. O desconto consiste apenas em uma redução do preço original de determinada mercadoria. O adquirente que compra com desconto não obtém nenhum ingresso de valores. Pelo contrário, ele tem uma despesa, cujo montante, no entanto, em razão do desconto concedido, acaba por ser menor do que a originalmente esperada.
Ainda que a redução da despesa possa gerar um efeito positivo na variação patrimonial do contribuinte, vale repisar que o PIS e a COFINS não incidem sobre o patrimônio, mas sobre a receita bruta. Por isso, o proveito indireto do adquirente com a aquisição de um produto com valor inferior ao originalmente previsto ou o recebimento de uma quantidade maior de mercadorias sem acréscimo no preço, ainda que lhe proporcione vantagem patrimonial ou incremento no lucro, em nada interferem na receita, que somente é gerada por ocasião da venda das mercadorias ou da prestação de serviços.
Por outro lado, não cabe ao fisco estabelecer presunções de que a concessão de descontos, bonificações ou quaisquer espécies de vantagens pelo fornecedor em troca de outras vantagens obtidas junto ao adquirente implicariam uma suposta prestação de serviços remunerada deste último, caracterizando-se a remuneração como receita.
Neste sentido, por exemplo, se o fornecedor oferecesse um desconto ou uma bonificação na venda de produtos em troca da realização de propaganda dessas mercadorias pelo adquirente ou de sua disponibilização para venda pelo varejista em locais favorecidos com maior visibilidade, haveria, para a Receita Federal do Brasil, um serviço do adquirente (propaganda) em troca de uma remuneração indireta (desconto ou bonificação) que caracterizaria receita.
Trata-se de um esforço interpretativo desarrazoado do negócio jurídico que parece ter o propósito específico de buscar qualquer caracterização que pudesse dar ensejo à tributação.
A troca de vantagens entre as partes negociantes é prática empresarial comum para a composição de preço nos contratos de compra e venda. Isso não significa que qualquer vantagem obtida pelo vendedor signifique um serviço remunerado, mesmo indiretamente, disponibilizado pelo comprador.
Se o varejista se propõe a disponibilizar para os consumidores em locais de maior visibilidade os produtos adquiridos do fornecedor, ou se se compromete a adotar medidas especiais de publicidade ou
marketing,
tudo isso em troca de condições favorecidas de compra, essas tratativas são inerentes à negociação do preço no contrato de compra e venda, no qual podem ser pactuadas as condições definidas pelos negociantes.
Ainda que o fornecedor e o varejista, como opção, pudessem negociar contratos separados - um de compra e venda e outro de prestação de serviços pelo qual o varejista, por exemplo, se comprometeria a adotar providências específicas para a divulgação dos bens adquiridos mediante contraprestação pecuniária que caracterizasse receita -, a preferência pela celebração de um único contrato em que as vantagens mútuas impliquem redução do preço dos produtos adquiridos ou bonificação para o varejista também é uma alternativa válida.
Cabe aos contribuintes, dentro das legítimas alternativas autorizadas pelo ordenamento jurídico, optar por aquelas que sejam mais vantajosas em termos de tributação. É nisso que consiste, aliás, o planejamento tributário lícito.
A evasão fiscal - essa, sim, passível de atuação repressiva da Receita Federal Brasil - somente ocorre quando se busca ocultar ou dissimular a ocorrência do fato gerador ou a natureza dos elementos da obrigação tributária, hipótese que atrai a incidência do art. 116, parágrafo único, do Código Tributário Nacional:
Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:
I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios;
II - tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos têrmos de direito aplicável.
Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.
(Incluído pela Lcp nº 104, de 2001)
No caso em exame, como visto, a opção pela redução no preço de aquisição das mercadorias ou pela bonificação
in natura
ao varejista em troca de vantagens oferecidas por este é uma das alternativas legítimas de negociação e um método de composição do preço. Por isso, não se pode tolher o contribuinte de planejar suas atividades de forma a atrair o regime de tributação mais favorável, a menos que isso configure ocultação do fato gerador ou dissimulação de negócio jurídico, o que não ocorre no caso concreto.
Cabe lembrar, neste ponto, que o Código Tributário Nacional veda a alteração de conceitos de direito privado empregados para a definição de competências tributárias:
Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
Importa referir, ainda, que os descontos condicionais concedidos pelo fornecedor na venda de seus produtos já são incluídos na base de cálculo do PIS e da COFINS por ele devidos (art. 1º, §3º, V, "a", da Lei nº 10.637/2002 e da Lei nº 10.833/2003). Por isso, nova incidência das mesmas contribuições devidas pelo varejista em razão dos mesmos descontos implicaria considerar os mesmos valores como receitas tanto do vendedor como do comprador.
Por todas essas razões, não é possível equiparar a
receita
situações em que não há efetivo ingresso financeiro positivo no patrimônio do contribuinte.
Diante disso, não há necessidade de adentrar na distinção entre descontos condicionados e incondicionados no que diz respeito ao adquirente dos produtos, porque de qualquer forma a redução no valor do preço por eles acarretada não se caracteriza como receita. Essa diferenciação somente é pertinente quando se discute a tributação do vendedor de mercadorias oferecidas com desconto, caso em que incidem as normas do art. 1º, § 3º, V, "a", da Lei nº 10.637/2002 e da Lei nº 10.833/2003.
A corroborar tudo o que foi dito, cito os seguintes acórdãos do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, este último com jurisprudência já sedimentada em ambas as turmas competentes para o julgamento da matéria:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 1.022 DO CPC/2015. INOCORRÊNCIA. ARTS. 1º, CAPUT, § 3º, V, A, DAS LEIS NS. 10.637/2002 E 10.883/2003. BASE DE CÁLCULO DA CONTRIBUIÇÃO AO PIS E DA COFINS. INGRESSO PATRIMONIAL NOVO. AQUISIÇÃO DE PRODUTOS POR VAREJISTA COM DESCONTO CONCEDIDO POR FORNECEDORES. PARCELA REDUTORA DO CUSTO QUE NÃO CARACTERIZA RECEITA DO COMPRADOR. CONTRAPARTIDA DO ADQUIRENTE PARA OBTENÇÃO DO ABATIMENTO NÃO CONSTITUI PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO.
I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015.
II - O tribunal de origem apreciou todas as questões relevantes apresentadas com fundamentos suficientes, mediante apreciação da disciplina normativa e cotejo ao posicionamento jurisprudencial aplicável à hipótese. Não existência de omissão, contradição ou obscuridade.
III - Consoante previsto nos arts. 1º, § 3º, V, a, das Leis ns.
10.637/2002 e 10.883/2003, a base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, no regime não cumulativo, consiste no total de receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, razão pela qual o conceito jurídico de receita não se vincula àquele veiculado pela ciência das finanças. Precedente do STF.
IV - Nas relações comerciais entre agentes econômicos, o adquirente de mercadorias para revenda despende valores com a compra de produtos para desempenho de sua atividade empresarial, sendo desinfluente a natureza jurídica dos descontos obtidos do fornecedor para a incidência das contribuições em exame quanto ao varejista, porquanto rubrica modificadora da receita de quem vende e redutora dos custos do comprador.
V - A pactuação de contrapartida a cargo do revendedor para a redução da quantia paga ao fornecedor constitui forma de composição do preço acordado na transação mercantil, motivo pelo qual não pode ser dissociada desse contexto para figurar, autonomamente, como a contraprestação por um serviço.
VI - Os descontos concedidos pelo fornecedor ao varejista, mesmo quando condicionados a contraprestações vinculadas à operação de compra e venda, não constituem parcelas aptas a possibilitar a incidência da contribuição ao PIS e da COFINS a cargo do adquirente.
VII - Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.
(REsp n. 1.836.082/SE, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 11/4/2023, DJe de 12/5/2023.)
TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES AO PIS E COFINS. APURAÇÃO DE DÉBITOS. BONIFICAÇÕES E DESCONTOS NA AQUISIÇÃO DE MERCADORIAS PARA REVENDA.1. Ao comprar com desconto, o contribuinte reduz o seu custo de aquisição e isso não tem a natureza jurídica de receita para efeitos de incidência das contribuições ao PIS/COFINS. O fato de a redução do custo de aquisição aumentar o patrimônio líquido não tem relevância porque não se está diante de tributos que incidem sobre variação patrimonial positiva, mas sobre receitas. 2. Os descontos e as bonificações em mercadorias obtidas pelo comprador não constituem receitas passíveis de incidência das contribuições ao PIS e da COFINS.3. Manutenção da decisão monocrática sobre a possibilidade da impetrante excluir da base de cálculo de PIS/COFINS o valor das bonificações e descontos recebidos na forma de mercadorias, com ou sem destaque nas notas fiscais, porquanto é convergente à jurisprudência atual desta Corte. (TRF4, ApRemNec 5006740-46.2024.4.04.7000, 1ª Turma, Relatora para Acórdão LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH, julgado em 21/05/2025)
TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES AO PIS/COFINS. APURAÇÃO DE DÉBITOS. BONIFICAÇÕES E DESCONTOS NA AQUISIÇÃO DE MERCADORIAS PARA REVENDA.1. A circunstância de o desconto ser condicional ou incondicional diz respeito à relação jurídico-tributária da União com o vendedor que auferiu a receita, e não com a menor despesa que o contribuinte teve ao adquirir as mercadorias para revenda. Ao comprar com desconto, o contribuinte reduz o seu custo de aquisição e isso não tem a natureza jurídica de receita para efeitos de incidência das contribuições ao PIS/COFINS. O fato de a redução do custo de aquisição aumentar o patrimônio líquido não tem relevância porque não se está diante de tributos que incidem sobre variação patrimonial positiva, mas sobre receitas.2. Os descontos e as bonificações em mercadorias obtidas pelo comprador não constituem receitas passíveis de incidência das contribuições ao PIS/COFINS.3. As bonificações em dinheiro que o comprador recebe do fornecedor da mercadoria são receitas que devem ser computadas na base de cálculo do PIS/COFINS apuradas pelo sistema não cumulativo.4. Apelação e remessa necessária parcialmente providas. (TRF4, ApRemNec 5052835-04.2019.4.04.7100, 2ª Turma, Relator para Acórdão ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA, julgado em 04/08/2022)
Por essas razões, os descontos ou bonificações em mercadorias obtidos pelo contribuinte na aquisição de produtos para revenda não constituem receita passível de tributação pelo PIS e COFINS, independentemente de serem condicionados ou não a alguma contraprestação, em razão de não se enquadrarem na hipótese de incidência tributária.
Para finalizar, cumpre apenas ressalvar as situações em que não ocorre um
abatimento de preço
propriamente dito, mas sim uma
bonificação em pecúnia
paga pelo fornecedor ao adquirente das mercadorias como contrapartida a alguma prestação deste último. Em tais casos, diferentemente de tudo o que foi abordado, o adquirente não obtém um desconto sobre os produtos adquiridos, mas um verdadeiro pagamento pela realização de um serviço.
Nesses casos, o pagamento realizado em pecúnia enquadra-se perfeitamente no conceito de receita trazido no art. 1º das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, sujeitando-se assim à incidência tributária segundo as normas de regência.
Demonstrada a presença do fundamento (
fumus boni juris
) alegado pela Impetrante, o
'periculum in mora'
, por seu turno, decorre do fato de que, sem a concessão de medida liminar, a parte seria obrigada a submeter-se ao
'solve et repete'
, sujeitando-se à demora na restituição dos valores que venha a recolher ilegalmente, permanecendo no exercício de suas atividades empresariais com um ônus tributário indevido.
3. DECISÃO
Ante o exposto,
DEFIRO
O PEDIDO LIMINAR
para
DECLARAR SUSPENSA A EXIGIBILIDADE
(artigo 151, IV, do Código Tributário Nacional) do PIS e da COFINS devidos pela impetrante sobre os valores relativos a descontos comerciais concedidos pelos seus fornecedores por ocasião da aquisição de mercadorias destinadas à revenda. Ressalvam-se, porém, as situações em que não ocorre um abatimento de preço propriamente dito, mas sim uma bonificação em pecúnia paga pelo fornecedor das mercadorias como contrapartida a alguma prestação da impetrante.
4.
Notifique-se a Autoridade Impetrada sobre a presente decisão liminar e para que preste informações, no prazo de 10 (dez) dias.
5.
Cientifique-se o União (PFN) sobre a presente ação (artigo 7º, inciso II, da Lei nº 12016/2009).
6.
Oportunamente, abra-se vista ao Ministério Público Federal, pelo prazo de 10 (dez) dias, para apresentação de seu parecer.
7.
Por fim, registrem-se para sentença.
8. Intimem-se.
1. https://normasinternet2.receita.fazenda.gov.br/#/consulta/externa/88846
2. Art. 97. Sòmente a lei pode estabelecer: (...) III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do art. 52, e do seu sujeito passivo; IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos arts. 21, 26, 39, 57 e 65;
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