Processo nº 8085489-11.2024.8.05.0001
ID: 282819975
Tribunal: TJBA
Órgão: Desa. Silvia Carneiro Santos Zarif
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 8085489-11.2024.8.05.0001
Data de Disponibilização:
29/05/2025
Polo Ativo:
Advogados:
DANIELLE BRAGA MONTEIRO
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Primeira Câmara Cível Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 8085489-11.2024.8.05.0001 Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível APELANTE: IVAN C…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Primeira Câmara Cível Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 8085489-11.2024.8.05.0001 Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível APELANTE: IVAN CLEI DE LIMA SANTOS Advogado(s): WALTER MOURA FILHO (OAB:BA5566-A), YURI MOURA RIBEIRO DE SA (OAB:BA45299-A) APELADO: FFA SOCIEDADE DE CREDITO AO MICROEMPREENDEDOR E A EMPRESA DE PEQUENO PORTE LTDA. Advogado(s): DANIELLE BRAGA MONTEIRO (OAB:BA46840-A) DECISÃO Trata-se de apelação cível interposta por IVAN CLEI DE LIMA SANTOS contra a sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara de Relações de Consumo da Comarca de Salvador/BA, na ação revisional de contrato movida em face de FFA SOCIEDADE DE CRÉDITO AO MICROEMPREENDEDOR E À EMPRESA DE PEQUENO PORTE LTDA., que julgou improcedentes os pedidos formulados pelo autor. Na origem, aduz o requerente que em abril de 2022 firmou contrato de empréstimo consignado, com valor líquido de R$ 8.700,00, a ser pago em 48 parcelas mensais de R$ 433,03. Alegou excessiva onerosidade e abusividade nas taxas de juros aplicadas, além da cobrança indevida de tarifa de cadastro no valor de R$ 1.740,00, bem como a existência de venda casada com a contratação compulsória de seguro. Requereu, ao final, a declaração de nulidade das cláusulas abusivas, a devolução em dobro dos valores pagos a maior e a condenação da ré ao pagamento de danos morais. O Juízo a quo, ao proferir a sentença de ID 74682657, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, reconhecendo a legitimidade das taxas de juros contratadas, considerando-as compatíveis com a média de mercado; afastou a abusividade da tarifa de cadastro, entendendo-a prevista em normativo padronizador e não excessiva; rejeitou a alegação de venda casada com o seguro, com base na documentação apresentada pela ré, que demonstraria contratação autônoma; e indeferiu o pedido de reparação por danos morais, ante a inexistência de ato ilícito configurado. Inconformado com a decisão, o apelante interpôs recurso (ID 74682660) alegando que a taxa de juros aplicada ao contrato está em significativo desacordo com os padrões de mercado, configurando prática abusiva que enseja a restituição em dobro dos valores pagos em excesso. Sustenta também a ilegitimidade da cobrança da tarifa de cadastro, por considerá-la desproporcional ao montante do empréstimo concedido, em violação aos princípios da proporcionalidade e da boa-fé objetiva. Ademais, contesta a alegada autonomia na contratação do seguro, caracterizando tal conduta como venda casada e requerendo, igualmente, a restituição em dobro dos respectivos valores. Por fim, postula o reconhecimento de danos morais em razão do pagamento de quantias que reputa indevidas. Instada a se manifestar, a parte apelada apresentou contrarrazões no ID 74682662, arguindo, em sede de preliminar, a ausência de dialeticidade. No mérito, defende a manutenção da sentença. É o relatório. Decido. Estando presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto, pontuando que o recorrente litiga sob o pálio da justiça gratuita. Considerando a simplicidade da matéria e a existência de orientação jurisprudencial dominante, vislumbro a possibilidade de resposta monocrática ao pedido, como forma de privilegiar o instituto dos precedentes, sua força normativa e garantir a celeridade processual, nos termos do art. 932, IV e V, do Código de Processo Civil (CPC). Em sede preliminar, o requerido sustenta em suas contrarrazões, a inadmissibilidade do recurso por alegada violação ao princípio da dialeticidade recursal. Argumenta, em síntese, que a peça recursal teria se limitado a reproduzir teses genéricas, sem atacar de forma específica e fundamentada os alicerces da decisão recorrida. A preliminar suscitada, todavia, não merece acolhimento. Da análise da peça recursal, verifica-se a presença de fundamentos jurídicos consistentes e argumentação fática suficiente, evidenciando a intenção de reformar a sentença impugnada. Assim, não há afronta ao princípio da dialeticidade recursal que justifique o não conhecimento do recurso, estando atendidos os requisitos mínimos de impugnação específica exigidos pela jurisprudência consolidada. Rejeito, portanto, a preliminar. No mérito, a controvérsia cinge-se à análise de quatro questões principais: - a legalidade da taxa de juros aplicada ao contrato, cotejando-a com a taxa média de mercado vigente à época da contratação; - a proporcionalidade da tarifa de contrato cobrada, que, segundo o apelante, representa 20% do valor do crédito concedido; - se a contratação de seguro juntamente com o contrato de mútuo configura prática de venda casada; e - a caracterização de danos morais decorrentes de falha na prestação do serviço. Inicialmente, insta pontuar que a jurisprudência pátria é uníssona no tocante à aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor nas relações bancárias, entendimento, inclusive, já consagrado pela Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, não havendo, assim, qualquer óbice à revisão de cláusulas consideradas abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, eis que incompatível com a boa-fé e a equidade. 1. Juros Remuneratórios Quanto aos juros remuneratórios, as instituições financeiras, ou entidades a elas equiparadas, não estão sujeitas ao limite imposto pela Lei da Usura (Decreto nº 22.262/1933) e nem sofrem as limitações de juros ao patamar de 12% ao ano, conforme entendimento jurisprudencial já consagrado nas súmulas 596 do Supremo Tribunal Federal (STF) e 382 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Conquanto possível que as taxas de juros sejam superiores a 12% ao ano, não é concebível que sejam estipuladas de modo a onerar excessivamente o consumidor. Neste sentido, o STJ, sob a sistemática dos recursos repetitivos, firmou o entendimento de que a revisão das taxas de juros remuneratórios ocorrerá apenas em situações excepcionais, quando houver a caracterização da relação de consumo somada à abusividade cabalmente demonstrada. Confira-se: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO . JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES .DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO.(...) ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art . 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (...) (STJ - REsp: 1061530 RS 2008/0119992-4, Relator.: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 22/10/2008, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/03/2009. RSSTJ vol . 34 p. 216 RSSTJ vol. 35 p. 48). Consoante decidido pela Corte Superior, os juros remuneratórios são considerados abusivos se superiores à taxa média de mercado praticada pelos integrantes do sistema financeiro nacional, observadas as circunstâncias de cada contratação. No mesmo sentido, a Súmula 13 deste Tribunal de Justiça da Bahia: "A abusividade do percentual da taxa de juros, aplicado em contratos bancários submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, deve ser apurada considerando as circunstâncias do caso concreto e com base no índice da taxa média de mercado para a mesma operação financeira, divulgado pelo Banco Central do Brasil ou outro órgão federal que venha substituí-lo para este fim." No caso em análise, de acordo com o contrato de ID 74682631, no dia 20/04/2022, a parte autora celebrou contrato de mútuo na modalidade consignada, no valor de R$ 8.700,00 (oito mil e setecentos reais), a ser pago em 48 (quarenta e oito) parcelas mensais e sucessivas de R$ 433,03 (quatrocentos e trinta e três reais e três centavos), totalizando o valor de R$ 18.620,29 (dezoito mil, seiscentos e vinte reais e vinte e nove centavos). Conforme se verifica, o valor total a ser pago pelo mutuário equivale a duas vezes e meia o valor por ele recebido com a realização do negócio, evidenciando uma situação de flagrante onerosidade excessiva para o consumidor. Incidiram sobre o negócio juros remuneratórios de 2,99% ao mês e 42,41% ao ano, enquanto a taxa média de mercado estimada pelo Banco Central do Brasil para contratações dessa natureza, na época da formalização do contrato, era de 2,65% ao mês e 36,81% ao ano para crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor privado (Séries: 20744 e 25466 - Disponível em: https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores). Percebe-se, pois, que os juros remuneratórios aplicados no contrato em tela são significativamente superiores à média de mercado divulgada pelo Banco Central para o período da contratação, razão pela qual há de se reconhecer a abusividade. Embora o recorrido defenda a legitimidade da taxa de juros aplicada, não se vislumbra, na relação negocial firmada entre as partes, qualquer peculiaridade que justifique a adoção de taxa de juros em patamar tão superior à média, considerando principalmente o baixo valor contratado. Corroborando o entendimento ora adotado, cito precedentes desta Primeira Câmara Cível reconhecendo a abusividade de juros remuneratórios que ultrapassem a média de mercado: AGRAVO INTERNO. REVISIONAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. TAXA QUE DEVE OBSERVAR A MÉDIA PRATICADA DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL. SÚMULA N. 13, DO TJ/BA. ABUSIVIDADE RECONHECIDA. SEGURO. CONTRATAÇÃO COM EMPRESA DO MESMO GRUPO ECONÔMICO. OPÇÃO PELO SEGURO GRIFADA, DIGITALMENTE, NO PRÓPRIO CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. NEGÓCIO ACESSÓRIO FIRMADO NO MESMO DIA E HORÁRIO DO PRINCIPAL. POSICIONAMENTO DO STJ. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJBA, Classe: Agravo, Número do Processo: 8137449-40.2023.8.05.0001,Relator(a): LIDIVALDO REAICHE RAIMUNDO BRITTO, Primeira Câmara Cível, Publicado em: 07/08/2024). AGRAVO INTERNO CONTRA DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO APELO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. COBRANÇA DE SEGURO PRESTAMISTA E TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADES CONSTATADAS. AGRAVO DESPROVIDO. DECISÃO MANTIDA. I. CASO EM EXAME 1.1. Agravo Interno interposto pela instituição financeira contra decisão monocrática que deu parcial provimento ao Apelo do autor, reformando a sentença para excluir a cobrança de seguro prestamista e ajustar a taxa de juros remuneratórios à taxa média de mercado, mantendo os demais pontos da sentença intactos. 1.2.O agravante sustenta a conformidade da taxa de juros com a média do Banco Central e defende a legalidade da contratação do seguro prestamista, argumentando que foi facultativo e conforme as normas aplicáveis. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2,1. A questão em discussão consiste em saber: (i) se a taxa de juros remuneratórios pactuada está de acordo com a taxa média de mercado e (ii) se a cobrança do seguro prestamista foi realizada de forma facultativa e legal. III. RAZÕES DE DECIDIR 3.2. A taxa de juros remuneratórios pactuada de 1,66% a.m. e 21,79% a.a. é superior à taxa média de mercado estabelecida pelo Banco Central para o período, que era de 1,64% a.m. e 21,59% a.a., caracterizando abusividade. Assim, impõe-se a limitação da taxa aos parâmetros da média de mercado. 3.3. A jurisprudência pacífica admite a revisão contratual em situações de flagrante abusividade, conforme precedentes do STJ e dos Tribunais de Justiça estaduais. 3.4. No que tange ao seguro prestamista, restou comprovado nos autos que a contratação foi imposta, sem oferecer ao consumidor a opção de escolha ou contratação com outra instituição, configurando venda casada e violando a jurisprudência do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 4.1. Agravo Interno desprovido, mantendo-se a decisão monocrática que deu parcial provimento ao Apelo. 4.2. Tese de julgamento: "É abusiva a cobrança de juros remuneratórios acima da taxa média de mercado fixada pelo Banco Central para o período da contratação. A imposição de seguro prestamista sem a possibilidade de escolha configura venda casada." (TJBA, Classe: Agravo, Número do Processo: 8058568-20.2021.8.05.0001,Relator(a): MARIO AUGUSTO ALBIANI ALVES JUNIOR, Primeira Câmara Cível, Publicado em: 06/11/2024). AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. TAXA MÉDIA DE MERCADO. APLICAÇÃO. POSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. DECISÃO MANTIDA. Não merece reparo a decisão vergastada em relação aos juros remuneratórios, uma vez que superiores à média de mercado prevista para o período da negociação deverão ser afastados, dando lugar à taxa média. (TJBA, Classe: Agravo,Número do Processo: 8103669-80.2021.8.05.0001,Relator(a): EDMILSON JATAHY FONSECA JUNIOR, Primeira Câmara Cível, Publicado em: 06/11/2024). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. FINANCIAMENTO DE IMÓVEL. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE BOA FÉ OBJETIVA REJEITADA. APLICAÇÃO DO CDC. RELATIVIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. POSSIBILIDADE DE REVISÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. ANÁLISE DOS ENCARGOS PREVISTOS NO CONTRATO. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE CONFIGURADA. TAXA DE JUROS DIVERGE DA MÉDIA APLICADA PELO BANCO CENTRAL NO PERÍODO DA CONTRATAÇÃO. REVISÃO DO CONTRATO DEVIDA.PRECEDENTES DO STJ. RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. VERIFICAÇÃO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.DESCUMPRIMENTO DE LIMINAR PELO APELADO. ANÁLISE PELO JUIZ DA CAUSA. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO IMPROVIDA. (TJBA, Classe: Apelação, Número do Processo: 8009367-30.2019.8.05.0001,Relator(a): JOSEVANDO SOUZA ANDRADE, Primeira Câmara Cível, Publicado em: 13/11/2024). Assim, impõe-se a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil para crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor privado à época da contratação, qual seja: 2,65% ao mês e 36,81% ao ano. 2. Tarifa da Cadastro Acerca da Tarifa de Cadastro, quando do julgamento dos Recursos Especiais nº 1.251.331/RS e 1.255.573/RS, os quais seguiram o rito dos recursos repetitivos, o STJ se posicionou pela validade do referido encargo, a partir da resolução CMN nº 3.518/2007, desde que expressamente tipificada no contrato e cobrada exclusivamente no início do negócio, consoante se infere do seguinte aresto: Tema 620: Permanece válida a tarifa de cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. Ademais, a referida tarifa é objeto da Súmula 566 do STJ: "Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira". A Resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) n. 3.919, editada em 25.11.2010 e vigente a partir de 1º.3.2011, prevê, na Tabela I de seu Anexo, que o fato gerador da tarifa de cadastro é a realização de pesquisa em serviços de proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados e informações necessários ao início de relacionamento decorrente da abertura de conta de depósitos à vista ou de poupança ou contratação de operação de crédito ou de arrendamento mercantil, não podendo ser cobrada cumulativamente. Assim, embora haja legalidade em abstrato na cobrança da Tarifa de Cadastro, sobre ela incidem as normas de Direito do Consumidor, por se tratar de contrato de adesão, especialmente quanto à proibição de cláusulas abusivas (art. 51, do CDC). Dessa forma, em caso de vantagem exagerada, desproporcional, é possível sua supressão ou redução judicial (art. 6º, V, do CDC). Nesse sentido é a jurisprudência: CONTRATO BANCÁRIO. Ação revisional - Sentença de improcedência - Inconformismo do autor - Aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao contrato bancário - Preliminar de não conhecimento afastada - Inconformismo quanto aos juros remuneratórios diversos do pactuado - Abusividade não configurada - Capitalização admitida - Medida Provisória nº 1.963-17/2000 (reeditada sob o nº 2.170-36/2001) - Aplicação da Súmula 541 do Superior Tribunal de Justiça - Encargos moratórios que revelam a cobrança da comissão de permanência não cumulada com outros encargos - Juros moratórios, todavia, que foram pactuados em 6% ao mês, comportando redução para 1% ao mês - Legitimidade da cobrança da tarifa de cadastro, conforme orientação do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 28/8/2013, do recurso repetitivo REsp nº 1 .251.331/RS Relatoria da E. Ministra Maria Isabel Gallotti - Súmula 56 do STJ - Apesar da legalidade da cobrança da tarifa, no início da relação contratual entre consumidor e a instituição financeira, o valor de R$ 845,00 se mostra abusivo, representando quase 100% de uma parcela mensal do mútuo, o que demonstra ser exorbitante - Abusividade reconhecida, conforme entendimento desta Câmara - Sentença reformada em parte para reconhecer a abusividade do valor da tarifa de cadastro, reduzindo-a para R$ 200,00 - Cabimento da cobrança da tarifa de registro de contrato, comprovada a averbação da alienação no documento do veículo - Abusividade da cobrança da tarifa de avaliação do bem e das despesas do emitente - Sentença reformada em parte para determinar a redução dos juros moratórios para 1% ao mês, reconhecer a abusividade na contratação da tarifa de avaliação e das despesas com emitente, determinando sua repetição singela, bem como reduzir a tarifa de cadastro para R$ 200,00 - Recurso parcialmente provido. (TJ-SP - Apelação Cível: 1008467-58 .2023.8.26.0223 Guarujá, Relator.: Helio Faria, 18ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/01/2024). AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. TARIFA DE REGISTRO DE CONTRATO. Insurgência contra a sua cobrança. INADMISSIBILIDADE: É legal a cobrança da mencionada tarifa, considerando-se o entendimento do STJ em recurso repetitivo, uma vez que o valor cobrado não é abusivo e existe comprovação de que o serviço foi prestado. Sentença mantida. TARIFA DE CADASTRO. Alegação da autora de abusividade. OCORRÊNCIA: A Súmula nº 566 do STJ pacificou a questão da tarifa de cadastro, considerando a sua legalidade se cobrada no início da relação contratual entre o consumidor e a instituição financeira, nos contratos bancários firmados depois da vigência da Resolução CMN nº 3.518/2007, ocorrida em 30.4.2008. Acontece que o valor cobrado pelo banco, de R$ 1.600,00, é abusivo porque equivale a quase o triplo do valor da parcela contratada de R$ 566,07 . Sentença reformada. SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA E TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM Pretensão de que seja afastada a sua cobrança. PEDIDO PREJUDICADO: O pedido restou prejudicado, porque não há no contrato em análise a previsão da cobrança desses encargos. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO NA PARTE CONHECIDA. (Apelação Cível 1073704-25.2020.8.26.0100; Relator (a): Israel Góes dos Anjos; Órgão Julgador: 18a Câmara de Direito Privado; Data do Julgamento: 01/06/2021). APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICAÇÃO - TARIFA DE CADASTRO - ABUSIVIDADE - TARIFA DE REGISTRO DE CONTRATO - COBRANÇA - AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. - É possível a revisão de contratos bancários, independentemente da ocorrência de fato imprevisível e inevitável, desde que haja demonstração de desequilíbrio entre as obrigações assumidas pelas partes contratantes (fornecedor e consumidor), conforme previsão do art. 6º, V, do CDC - Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira (Súmula nº 566 do STJ), ressalvada possibilidade de redução do valor do encargo, se este causar onerosidade excessiva ao consumidor (art. 51, IV, CDC). A tarifa relacionada ao ressarcimento de despesas registrais, que envolva contratos com instituições financeiras, pode ser cobrada, se o serviço foi efetivamente prestado e se não existir onerosidade excessiva (STJ, REsp nº 1.578.553/SP, julgado sob a ótica de recurso repetitivo) - V. .v.: A tarifa de cadastro, em contratos envolvendo instituições financeiras, pode ser cobrada, desde que na celebração do primeiro contrato entre as partes e a partir de 30/04/2008, data do início de vigência da Resolução-CMN 3.518/2007 (STJ, Súmula 566). (TJ-MG - Apelação Cível: 5016016-88.2021.8.13.0027, Relator: Des.(a) Ramom Tácio, Data de Julgamento: 07/02/2024, 16ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 15/02/2024). Na hipótese, o valor líquido do crédito é de R$ 8.700,00 (oito mil e setecentos reais) e a Tarifa de Cadastro corresponde a R$ 1.740,00 (mil setecentos e quarenta reais), que equivale a 20% (vinte por cento) do total liberado ao consumidor e quatro vezes o valor da parcela do mútuo. Trata-se de valor desproporcional, primeiramente por se tratar de taxa acessória, não essencial para a conclusão do contrato e ainda porque o valor cobrado está muito acima do custo real da operação para o banco (simples consulta), configurando, assim, enriquecimento sem causa, porquanto ultrapassa o necessário para o ressarcimento dos gastos com a operação. Cabível, portanto, não seu completo afastamento pela já mencionada regularidade da cobrança, mas sua redução para o valor equiparado de uma parcela do empréstimo, qual seja: R$ 433,03 (quatrocentos e trinta e três reais e três centavos), por reputar tal quantia como razoável e proporcional à contrapartida que se presta. 3. Seguro de Proteção Financeira Relativamente ao seguro proteção financeira, o STJ, ao julgar o Tema 972/STJ (REsp 1.639.320/SP), firmou a tese de que "nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada". No caso concreto, compulsando os documentos constantes no ID 74682631, verifica-se que consta no contrato a celebração de seguro prestamista com a USEBENS SEGURADORA S.A., CNPJ nº 09.180.505/0001-50. Contudo, tanto na ficha proposta, quanto no anexo III do referido contrato, verifica-se que não houve acréscimo de valor ao contrato, relativo ao custo do seguro. Desta forma, não há que se falar em devolução de valores pagos a título de seguro. 4. Indenização por danos morais No tocante ao pleito de indenização por danos morais, cumpre salientar que a mera cobrança de juros remuneratórios acima da média de mercado, bem como a inserção de tarifas ou encargos considerados abusivos, não configura, por si só, violação aos direitos da personalidade do contratante, apta a ensejar reparação civil. Conforme restou consignado na sentença de primeiro grau, a pretensão indenizatória exige a demonstração inequívoca de ato ilícito, dano e nexo de causalidade, conforme preceituam os artigos 186 e 927 do Código Civil, não sendo suficiente, para tanto, a constatação de eventual abusividade contratual ou desequilíbrio econômico-financeiro. Com efeito, a jurisprudência pátria é pacífica no sentido de que a revisão judicial de cláusulas contratuais bancárias visa o restabelecimento do equilíbrio entre as partes, não implicando, automaticamente, a ocorrência de dano moral indenizável. A caracterização do dano extrapatrimonial pressupõe a demonstração de efetiva ofensa à honra, imagem ou dignidade do contratante, o que não se presume nas hipóteses de simples discussão sobre encargos financeiros ou legalidade de cláusulas contratuais, sendo, portanto, indevida a pretendida reparação moral no caso em comento. 5. Compensação/repetição do indébito Com relação à compensação/repetição do indébito, trata-se de providência possível, na modalidade simples, relativamente aos juros remuneratórios, cuja cobrança vinha sendo efetuada com amparo no contrato firmado entre as partes, que somente por intermédio desta sentença foi readequado. Já quanto à cobrança relativa à Tarifa de Cadastro, a restituição do valor cobrado em excesso deverá ocorrer em dobro, tendo em vista que a conduta do acionado, ao estabelecer obrigação abusiva, onerando demasiadamente o consumidor, colidiu com norma legal expressa - art. 51, IV, do CDC -, não se fazendo presente hipótese de engano justificável. Oportuno invocar, ainda, o entendimento recentemente firmado pelo STJ, no julgamento do EAREsp 676.608 (Tema 929), no sentido de que, para a condenação na sanção prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, irrelevante se faz o elemento subjetivo, devendo ela ocorrer sempre que a cobrança violar a boa-fé objetiva. Veja-se: Tema 929: "a restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva". Os efeitos da sobredita decisão foram modulados para a aplicação apenas às cobranças realizadas após 30/03/2021, o que engloba o caso ora em discussão, já que o contrato fora celebrado em abril de 2022, sujeitando-se, portanto, ao novo entendimento jurisprudencial. Pelas razões acima expostas, CONHEÇO e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação, reformando parcialmente a sentença para: i. declarar abusiva e, consequentemente, nula a cláusula alusiva aos juros remuneratórios do período de normalidade contratual e juros moratórios, fixando-os em 36,81% a.a., equivalente à taxa média de mercado, verificada por ocasião da celebração do contrato - abril/2022. Deverá o Réu restituir ao Autor ou abater do saldo devedor de forma simples e devidamente atualizado pelo INPC, a contar de cada desembolso, os valores eventualmente pagos a maior em decorrência da cobrança do encargo ora readequado; ii. reduzir o valor da Tarifa de Cadastro para R$ 433,03 (quatrocentos e trinta e três reais e três centavos) e condenar o acionado na restituição, em dobro, do valor pago a maior pelo consumidor, dado o reconhecimento da cobrança abusiva, no importe de R$ 1.306,97 (R$ 1.740,00 - 433,03), totalizando R$ 2.613,94, atualizado pelo INPC a contar do desembolso e acrescido de juros de 1% a.m., a contar da citação. Dada a constatação de abusividade no período de normalidade contratual, fica afastada a mora da parte Autora até que a parte Ré promova as cobranças mensais nos moldes aqui postos, viabilizando os pagamentos mensais, pelo consumidor, das prestações readequadas na forma desta sentença; iii. adequar a fixação dos honorários advocatícios, em razão da sucumbência recíproca, condenando a parte autora/apelada ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido pela parte ré, suspensa a exigibilidade da verba, nos termos do art. 98, §3º, do Código de Processo Civil; e condenando a parte ré/apelante ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10% (dez por cento) do valor do proveito econômico auferido pela parte autora. Ficam mantidos os demais termos da sentença que não conflitem com esta decisão. Salvador - data registrada no sistema. Andrea Paula Matos Rodrigues de Miranda Juíza Substituta de 2º Grau
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