Processo nº 0050298-15.2021.8.06.0164
ID: 310655897
Tribunal: TJCE
Órgão: 2ª Vara da Comarca de São Gonçalo do Amarante
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0050298-15.2021.8.06.0164
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CELSO DE FARIA MONTEIRO
OAB/CE XXXXXX
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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª VARA DA COMARCA DE SÃO GONÇALO DO AMARANTE PROCESSO: 0050298-15.2021.8.06.0164 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO: [Indenização p…
ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª VARA DA COMARCA DE SÃO GONÇALO DO AMARANTE PROCESSO: 0050298-15.2021.8.06.0164 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO: [Indenização por Dano Moral] AUTOR: MUNICIPIO DE SAO GONCALO DO AMARANTE REU: FACEBOOK SERVICOS ONLINE DO BRASIL LTDA., JUSSARA CAMELO DE SOUSA Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c tutela de urgência ajuizada por Município de São Gonçalo do Amarante em face de Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. Na exordial, o autor alega que o perfil @sgadadepressao na rede social Instagram tem publicado notícias falsas e inverídicas acerca de medidas adotadas pelos atuais gestores do Município, com o objetivo de macular a integridade da Administração Pública Municipal; que a ação trata especificamente de uma postagem de 22 de março de 2021 sobre uma suposta "seleção fraudulenta" de servidores temporários, na qual constavam nomes jocosos e ofensivos; que tal postagem gerou repercussão viral, causando danos à imagem, reputação e honra da edilidade. Requer a concessão de tutela de urgência para a remoção imediata da postagem, a suspensão do perfil @sgadadepressao ou a determinação para que se abstenha de publicações ofensivas, a identificação de quem criou o perfil e de seus administradores, e os números de IP das conexões usadas para cadastro e publicação. A parte requerente pediu a retificação do polo passivo para modificação para FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA - INSTAGRAM LLC e Jussara Camelo de Sousa. Despacho inicial determinou a realização de audiência de conciliação. Em sua contestação, o réu Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. aduz que a pretensão de remoção integral de uma conta é desproporcional, sendo suficiente a remoção pontual dos conteúdos considerados ilegais; que a proteção da liberdade de expressão e livre manifestação do pensamento é fundamental; que a Lei nº 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) exige ordem judicial específica com indicação clara e precisa da URL do conteúdo para sua remoção, não cabendo ao provedor realizar juízo de valor; que não há dever legal de monitoramento ou fiscalização prévia do conteúdo pelos provedores; que a obrigação se limita a armazenar e fornecer o número de IP e registros de acesso, conforme o Marco Civil da Internet; e que não deve haver condenação aos ônus sucumbenciais, pois a demanda decorre de uma necessidade legal e não de sua conduta ilícita. Em sua contestação, a ré Jussara Camelo de Sousa aduz que a postagem objeto da ação trata-se de mera transcrição de listagem disponibilizada pelo próprio Município em seu site oficial; que a postagem apenas deu visibilidade ao ocorrido e emitiu opinião sobre ato da gestão municipal, o que é cabível e garantido pelo ordenamento jurídico; que não houve ato ilícito, "fake news" ou alteração da verdade, sendo os erros na listagem culpa exclusiva do Município; que os pedidos do Município visam promover censura e atentar contra princípios constitucionais como a liberdade de expressão e fiscalização dos atos públicos. Em sua réplica, o requerente reitera os argumentos da inicial. As partes foram intimadas para especificarem as provas (ID 112581513), tendo a autora e a primeira requerida pedido o julgamento antecipado e a segunda, instrução. Na decisão saneadora, foi indeferido o pedido de instrução e determinado a intimação das partes para ciência do julgamento antecipado do mérito. Intimadas as partes para tomar ciência do julgamento antecipado do mérito e, querendo, manifestar-se, estas não apresentaram objeção ao julgamento do feito. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Diante da natureza da demanda e do comportamento processual das partes, que, mesmo intimadas, não requereram oportunamente a produção específica de provas, e considerando o entendimento de que preclui o direito à prova se a parte, intimada para especificar as que pretendia produzir, não se manifesta oportunamente, mesmo que haja pedido anterior, constata-se que se impõe o julgamento do feito no estado em que se encontra, haja vista os princípios da razoável duração do processo e da eficiência. Sem preliminares ou questões prejudiciais a serem analisadas, passa-se ao exame do mérito. Conforme dispõe o regramento do Código Civil, aquele que causar dano a outrem tem o dever de indenizá-lo, sendo necessário demonstrar (a) a conduta do agente (comissiva ou omissiva); (b) o dano; (c) o nexo de causalidade entre ambos e (d) o dolo ou culpa em se tratando de responsabilidade subjetiva. Eis os dispositivos legais pertinentes: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. A título ilustrativo do ponto, destaca-se o seguinte julgado: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ALEGAÇÃO DE COLISÃO TRASEIRA. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESSUPOSTOS NÃO PREENCHIDOS. AUSÊNCIA DE PROVAS. APELO NÃO PROVIDO. 1. Para que se reconheça a responsabilidade civil extracontratual e o consequente dever de indenizar, é necessária a presença dos seguintes elementos: (i) ato ilícito decorrente de conduta humana; (ii) resultado danoso; (iii) nexo causal e (iv) culpa lato sensu. 2. Em que pese o esforço argumentativo do apelante, no sentido de que houve colisão traseira na motocicleta do segurado, sem culpa exclusiva deste, vale esclarecer que, no caso em análise, o autor não logrou êxito em realizar tal demonstração, não tendo se desincumbido do ônus da prova previsto no art. 373, inciso I, do CPC. 3. APELO CONHECIDO NÃO PROVIDO (TJ-DF 00027172020178070001 DF 0002717-20.2017.8.07.0001, Relator: HUMBERTO ULHÔA, Data de Julgamento: 07/10/2020, 2ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 26/10/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.) (grifei) No tocante aos danos extrapatrimoniais, sabe-se que estes se configuram em caso de violação a direito da personalidade, como honra, imagem, privacidade, ou em face de abalo, sofrimento e angústia gerados à pessoa, que tem sua dignidade agredida em algum grau relevante de acordo com um juízo de sensibilidade ético-social razoável. Como se sabe, a Constituição da República assegura os direitos fundamentais à imagem, vida privada e honra no art. 5º, X, como se vê adiante: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; Nada obstante, a Carta Magna também garante os direitos fundamentais à liberdade de expressão, de informação e de imprensa em diversos dispositivos, consoante se ilustra abaixo: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […] IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; [...] IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; […] XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional […] Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística […] Havendo colisão entre direitos fundamentais, é necessário que a medida que promove um direito em detrimento do outro seja examinada à luz do princípio da proporcionalidade e de seus subprincípios: a) adequação; b) necessidade e c) proporcionalidade em sentido estrito (ponderação), que tem assento na dimensão substancial do devido processo legal (art. 5º, LIV, da CF), de modo a verificar se a restrição ao direito fundamental é proporcional, e, portanto, legítima, conforme reza o art. 489, § 2º, do Código de Processo Civil (CPC), bem como dispõem as máximas hermenêuticas da concordância prática, relatividade das liberdades públicas e máxima efetividade dos direitos fundamentais. Conquanto não haja hierarquia abstrata e absoluta entre os direitos fundamentais mencionados, segundo o entendimento do STF, o direito à liberdade de expressão goza de "posição preferencial" na ordem jurídica pátria, visto que é condição necessária para o exercício de outros direitos e liberdades democráticas, como detalhado no julgamento da Reclamação nº 22.328/RJ: DIREITO CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. DECISÃO JUDICIAL QUE DETERMINOU A RETIRADA DE MATÉRIA JORNALÍSTICA DE SÍTIO ELETRÔNICO. AFRONTA AO JULGADO NA ADPF 130. PROCEDÊNCIA. 1. O Supremo Tribunal Federal tem sido mais flexível na admissão de reclamação em matéria de liberdade de expressão, em razão da persistente vulneração desse direito na cultura brasileira, inclusive por via judicial. 2. No julgamento da ADPF 130, o STF proibiu enfaticamente a censura de publicações jornalísticas, bem como tornou excepcional qualquer tipo de intervenção estatal na divulgação de notícias e de opiniões. 3. A liberdade de expressão desfruta de uma posição preferencial no Estado democrático brasileiro, por ser uma pré-condição para o exercício esclarecido dos demais direitos e liberdades. 4. Eventual uso abusivo da liberdade de expressão deve ser reparado, preferencialmente, por meio de retificação, direito de resposta ou indenização. Ao determinar a retirada de matéria jornalística de sítio eletrônico de meio de comunicação, a decisão reclamada violou essa orientação. 5. Reclamação julgada procedente (STF - Rcl: 22328 RJ - RIO DE JANEIRO 0007915-89.2015.1.00.0000, Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 06/03/2018, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-090 10-05-2018). Em se tratando especificamente da colisão entre os direitos fundamentais à imagem, à honra e à vida privada, de um lado, e os direitos à liberdade de expressão, de informação e de imprensa de outro, na publicação de matérias jornalísticas, é preciso observar determinados critérios, formulados pela jurisprudência dos Tribunais e condensados pelo Ministro Luís Roberto Barroso no julgamento da aludida reclamação nº 22328/RJ (STF. 1ª Turma. Rcl 22328/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 6/3/2018): a) veracidade da informação noticiada; b) licitude do meio empregado na obtenção da informação; c) interesse público ou social na veiculação da informação à luz da natureza e do lugar do fato e dos atores envolvidos; d) inexistência de ofensa ou agressão moral a outrem na notícia, isto é, a presença do intuito informativo (animus narrandi), ainda que haja crítica contundente, ácida, irônica ou satírica (animus criticandi), e não do ânimo de ofender (animus injuriandi), de difamar (animus difamandi) ou de caluniar (animus caluniandi). A título ilustrativo, ressaltam-se os seguintes precedentes: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO DE DIREITO DE RESPOSTA. ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. ASSOCIAÇÃO. DEFESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. PERTINÊNCIA SUBJETIVA DA DEMANDA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. INVIABILIDADE DE REEXAME DAS PROVAS DOS AUTOS. MATÉRIA JORNALÍSTICA QUE ULTRAPASSOU A INFORMAÇÃO OBJETIVA. OFENSA AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE. APLICAÇÃO DAS SÚMULAS NºS 7 E 568 DO STJ. DIREITO DE RESPOSTA. PROPORCIONALIDADE AO AGRAVO NÃO OBSERVADA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7 DO STJ. NOVA PUBLICAÇÃO NA MESMA SEÇÃO DO PERIÓDICO, COM O MESMO DESTAQUE, PUBLICIDADE, PERIODICIDADE E DIMENSÃO. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO […] 3. O STF e o STJ entendem inexistir ato ilícito se os fatos divulgados forem verídicos ou verossímeis, ainda que eivados de opiniões severas, irônicas ou impiedosas, notadamente quando se tratar de figuras públicas que exerçam atividades típicas de estado, gerindo interesses da coletividade, e a notícia e a crítica dizerem respeito a fatos de interesse geral e conexos com a atividade desenvolvida pela pessoa noticiada. Além de verdadeira, a informação deve ser útil; isto é, deve haver interesse público no fato noticiado. Se uma notícia ou reportagem sobre determinada pessoa veicula um dado que, de fato, interessa à coletividade, a balança pende para a liberdade de imprensa. Do contrário, preservam-se os direitos da personalidade (REsp 1.297.660/RS). Somado à veracidade e ao interesse público, a mídia tem o dever de evitar que o conteúdo difundido afronte os direitos da personalidade de outrem. A liberdade de informação não pode ser exercida com o intuito de difamar, injuriar ou caluniar [...] (STJ - AgInt no AREsp: 1588394 SP 2019/0283720-0, Relator: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 08/06/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/06/2021). APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. INOVAÇÃO RECURSAL. ACOLHIMENTO. CONHECIMENTO PARCIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MERO EXERCÍCIO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO. MATÉRIA JORNALÍSTICA. ANIMUS NARRANDI. AUSÊNCIA DE LESÃO A DIREITOS DA PERSONALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. O pedido não é passível de apreciação em sede recursal se não houve discussão acerca do tema na origem, sob pena de supressão de instância e violação ao princípio do duplo grau de jurisdição. 2. Cinge-se a controvérsia à existência de danos morais decorrentes de matéria jornalística que narrou operação policial envolvendo o Autor como suspeito de participação no crime de latrocínio. 3. Na hipótese de colisão entre os direitos fundamentais de liberdade de expressão e de inviolabilidade da honra e imagem, deve-se examinar a situação concreta com base na proporcionalidade. 4.Tratando-se de matéria jornalística, importante verificar se a publicação narra fato de interesse social, verídico e que não ultrapasse a continência da narração, sem impor agressão moral aos envolvidos no fato noticiado. 5. Utilizado o vocabulário próprio, nos limites do direito de liberdade de expressão e do acesso à informação, no estrito exercício do animus narrandi, não se verifica lesão aos direitos da personalidade do Requerente. 6. Ausente o dano moral, não há que falar em indenização. 7. Apelação parcialmente conhecida e não provida (TJ-DF 07029325120198070011 DF 0702932-51.2019.8.07.0011, Relator: Robson Teixeira de Freitas, Data de Julgamento: 22/10/2020, 8ª Turma Cível, Data de Publicação: 06/11/2020). Conquanto o dano moral seja instituto mais ligado à proteção da pessoa física, as pessoas jurídicas podem sofrer dano moral por abalo à sua honra objetiva (reputação), como positivado na súmula nº 227 do STJ: "A pessoa jurídica pode sofrer dano moral." Nada obstante, em regra, as pessoas jurídicas de direito público não são suscetíveis de titularizar direitos fundamentais substanciais e de sofrer dano moral, visto que a própria natureza e propósito dos direitos fundamentais se ligam à proteção do particular em face do poder estatal, razão pela qual não poderia este se valer desses direitos contra os particulares, seus titulares naturais, no tocante à tutela de bens jurídicos substantivos. Conforme a jurisprudência das Cortes Superiores, as pessoas jurídicas de direito público, ao menos em regra, podem titularizar apenas "direitos fundamentais de caráter processual ou relacionados à proteção constitucional da autonomia, prerrogativas ou competência de entidades e órgãos públicos, ou seja, direitos oponíveis ao próprio Estado e não ao particular" (STJ - REsp: 1258389 PB 2011/0133579-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 17/12/2013, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/04/2014). Desse modo, o direito à liberdade de expressão terá maior peso, no caso concreto, se presentes os seguintes requisitos: (i) veracidade da informação noticiada; (ii) licitude do meio empregado na obtenção da informação; (iii) interesse público ou social na veiculação da informação à luz da natureza e do lugar do fato e dos atores envolvidos; (iv) inexistência de ofensa ou agressão moral a outrem na manifestação, isto é, a presença do intuito informativo (animus narrandi), ainda que haja crítica contundente, ácida, irônica ou satírica (animus criticandi), e não do ânimo de ofender (animus injuriandi), de difamar (animus difamandi) ou de caluniar (animus caluniandi). Ao contrário, se não estiverem presentes essas condições, ganhará força a tutela da honra, da privacidade e da imagem. Ademais, o Poder Público, diante de sua estrutura e arcabouço teleológico, coloca-se como alvo constante de críticas e manifestações dos particulares, além de possuir outros instrumentos e recursos adequados para coibir eventuais abusos à ordem pública e à manutenção do equilíbrio institucional. Sublinhe-se ainda que a proteção da honra objetiva da pessoa jurídica, positivada na aludida súmula nº 227 do STJ, se destina principalmente a tutelar a credibilidade mercadológica ou a reputação negocial da empresa, que poderiam ser prejudicadas com abalos à sua honra objetiva, de modo a afetar o exercício de sua atividade econômica e gerar prejuízo financeiro, todavia tais questões não se apresentam ao ente público, que exerce suas competências constitucionais de modo a prestar serviços públicos e a exercer poder de polícia, tutelando direitos fundamentais e promovendo bens jurídicos constitucionalmente tutelados sem ter o lucro como finalidade precípua. Sobre o ponto, vejam-se os seguintes precedentes: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. MEIO AMBIENTE. DIREITO DE INFORMAÇÃO. ART. 225, § 1º, VI, DA CONSTITUIÇÃO. ART. 4º, V, DA LEI 6.938/1981. PRINCÍPIO 10 DA DECLARAÇÃO DO RIO. DIREITO DE PARTICIPAÇÃO. ART. 2º, § 1º, DA LEI 10.650/2003. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. CULTURA DA TRANSPARÊNCIA AMBIENTAL. ART. 3º, IV, DA LEI 12.527/2011. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL. IBAMA VERSUS PARTICULAR. IMPOSSIBILIDADE. DIREITOS FUNDAMENTAIS. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. RECONHECIMENTO LIMITADO. 1. Trata-se, na origem, de Ação Ordinária ajuizada em desfavor da União e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama, na qual a Associação Brasileira da Indústria de Pneus Remoldados - ABIP e a BS Colway Pneus Ltda. postulam: a) declaração da ilegalidade de publicação de "cartilha" pelo Ibama contendo informações alegadamente inverídicas e prejudiciais às autoras; b) imposição de obrigação de fazer consistente no recolhimento do material impresso já distribuído e sua retirada dos meios de comunicação, sob pena de multa diária; c) condenação em obrigação de não fazer qualquer anúncio ou divulgação do conteúdo questionado; e d) pagamento por danos morais sofridos. Por sua vez, o Ibama, em Reconvenção, buscou indenização por danos morais, aduzindo que fora denegrida sua honra objetiva [...] 3. Nessa linha de raciocínio, mais do que poder ou faculdade, os órgãos ambientais portam universal e indisponível dever de informar clara, ativa, cabal e honestamente a população, "independentemente da comprovação de interesse específico" (Lei 10.650/2003, art. 2º, § 1º), para tanto utilizando-se de dados que gerem ou lhes aportem, mesmo quando ainda não detentores de certeza científica, pois uma das formas mais eloquentes de expressão do princípio da precaução ocorre precisamente no campo da transparência e da publicidade do Estado. A regra geral na Administração Pública do meio ambiente é não guardar nenhum segredo e tudo divulgar, exceto diante de ordem legal expressa em sentido contrário, que deve ser interpretada restritivamente pelo administrador e juiz. Além de objetivos estritamente ecológicos e sanitários, pretende-se também fomentar "o desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública" (Lei 12.527/2011, art. 3º, IV). 4. O acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento do STJ, consoante o qual é impossível à pessoa jurídica de Direito Público (Administração Pública direta, autarquias, fundações públicas), de índole não comercial ou lucrativa, ser vítima de dano moral por ofensa de particular, já que constituiria subversão da ordem natural dos direitos fundamentais. Precedentes [...] (STJ - REsp: 1505923 PR 2014/0338886-7, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 21/05/2015, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/04/2017). DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INFORMAÇÕES VEICULADAS EM REDE DE RÁDIO E TELEVISÃO. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL AJUIZADA POR MUNICÍPIO CONTRA O PARTICULAR. IMPOSSIBILIDADE. DIREITOS FUNDAMENTAIS. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. RECONHECIMENTO LIMITADO. 1. A tese relativa à indenização pelo dano moral decorrente de ofensa à honra, imagem, violação da vida privada e intimidade das pessoas somente foi acolhida às expressas no ordenamento jurídico brasileiro com a Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, incisos V e X), que o alçou ao seleto catálogo de direitos fundamentais. Com efeito, por essa ótica de abordagem, a indagação acerca da aptidão de alguém sofrer dano moral passa necessariamente pela investigação da possibilidade teórica de titularização de direitos fundamentais, especificamente daqueles a que fazem referência os incisos V e X do art. 5º da Constituição Federal. 2. A inspiração imediata da positivação de direitos fundamentais resulta precipuamente da necessidade de proteção da esfera individual da pessoa humana contra ataques tradicionalmente praticados pelo Estado. É bem por isso que a doutrina vem entendendo, de longa data, que os direitos fundamentais assumem "posição de definitivo realce na sociedade quando se inverte a tradicional relação entre Estado e indivíduo e se reconhece que o indivíduo tem, primeiro, direitos, e, depois, deveres perante o Estado, e que os direitos que o Estado tem em relação ao indivíduo se ordenam ao objetivo de melhor cuidar das necessidades dos cidadãos" (MENDES, Gilmar Ferreira [et. Al.]. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 222-223). 3. Em razão disso, de modo geral, a doutrina e jurisprudência nacionais só têm reconhecido às pessoas jurídicas de direito público direitos fundamentais de caráter processual ou relacionados à proteção constitucional da autonomia, prerrogativas ou competência de entidades e órgãos públicos, ou seja, direitos oponíveis ao próprio Estado e não ao particular. Porém, ao que se pôde pesquisar, em se tratando de direitos fundamentais de natureza material pretensamente oponíveis contra particulares, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nunca referendou a tese de titularização por pessoa jurídica de direito público. Na verdade, há julgados que sugerem exatamente o contrário, como os que deram origem à Súmula n. 654, assim redigida: "A garantia da irretroatividade da lei, prevista no art. 5º, XXXVI, da Constituição da República, não é invocável pela entidade estatal que a tenha editado". 4. Assim, o reconhecimento de direitos fundamentais - ou faculdades análogas a eles - a pessoas jurídicas de direito público não pode jamais conduzir à subversão da própria essência desses direitos, que é o feixe de faculdades e garantias exercitáveis principalmente contra o Estado, sob pena de confusão ou de paradoxo consistente em se ter, na mesma pessoa, idêntica posição jurídica de titular ativo e passivo, de credor e, a um só tempo, devedor de direitos fundamentais, incongruência essa já identificada pela jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão (BVerfGE 15, 256 [262]; 21, 362. Apud. SAMPAIO, José Adércio Leite. Teoria da Constituição e dos direitos fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2013 p. 639). 5. No caso em exame, o reconhecimento da possibilidade teórica de o município pleitear indenização por dano moral contra o particular constitui a completa subversão da essência dos direitos fundamentais, não se mostrando presente nenhum elemento justificador do pleito, como aqueles apontados pela doutrina e relacionados à defesa de suas prerrogativas, competência ou alusivos a garantias constitucionais do processo. Antes, o caso é emblemático e revela todos os riscos de se franquear ao Estado a via da ação indenizatória. 6. Pretende-se a responsabilidade de rede de rádio e televisão local por informações veiculadas em sua programação que, como alega o autor, teriam atingido a honra e a imagem da própria Municipalidade. Tal pretensão representa real ameaça a centros nervosos do Estado Democrático de Direito, como a imprensa livre e independente, ameaça que poderia voltar-se contra outros personagens igualmente essenciais à democracia. 7. A Súmula n. 227/STJ constitui solução pragmática à recomposição de danos de ordem material de difícil liquidação - em regra, microdanos - potencialmente resultantes do abalo à honra objetiva da pessoa jurídica. Cuida-se, com efeito, de resguardar a credibilidade mercadológica ou a reputação negocial da empresa, que poderiam ser paulatinamente fragmentadas por violações a sua imagem, o que, ao fim e ao cabo, conduziria a uma perda pecuniária na atividade empresarial. Porém, esse cenário não se verifica no caso de suposta violação à imagem ou à honra - se existente - de pessoa jurídica de direito público. 8. Recurso especial não provido (STJ - REsp: 1258389 PB 2011/0133579-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 17/12/2013, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/04/2014 RDDP vol. 136 p. 142 RSTJ vol. 234 p. 419). DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL - APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - MUNICÍPIO DE CARMO DO RIO CLARO - OFENSA À HONRA OBJETIVA - AUSÊNCIA DE PROVA - REPARAÇÃO INDEVIDA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Na esteira do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, às pessoas jurídicas de direito público só podem ser reconhecidos "direitos fundamentais de caráter processual ou relacionados à proteção constitucional da autonomia, prerrogativas ou competência de entidades e órgãos públicos, ou seja, direitos oponíveis ao próprio Estado e não ao particular", sendo que, "em se tratando de direitos fundamentais de natureza material pretensamente oponíveis contra particulares, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nunca referendou a tese de titularização por pessoa jurídica de direito público" ( REsp 1258389/PB, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/12/2013, DJe 15/04/2014). 2. Sendo assim, no caso dos autos, não restando comprovada a ofensa à honra objetiva da pessoa jurídica de direito público, em decorrência do ato de negativação de seu nome perante os órgãos de proteção ao crédito, impera-se a improcedência do pedido de condenação da empresa requerida ao pagamento de indenização por danos morais (TJ-MG - AC: 10144180039428001 Carmo do Rio Claro, Relator: Armando Freire, Data de Julgamento: 22/02/2022, Câmaras Cíveis / 1ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 24/02/2022). APELAÇÃO CÍVEL. Pessoa Jurídica de direito público - Autarquia - que pleiteia indenização por danos materiais e morais em virtude de postagens de Facebook do requerido que, ao seu ver, são difamatórias, caluniosas e inverídicas, gerando prejuízos à imagem do Complexo Turístico Cidade da Criança, do Autor e da Prefeitura Municipal de Presidente Prudente/SP. Pleito, ainda, de obrigações de fazer hábeis à reparação do suposto dano. R. sentença de improcedência - Recurso de apelação que devolveu à esta C. Corte tão somente o pleito de danos morais, aquiescendo a autarquia autora com a solução dada pela r. sentença quanto aos demais pedidos. A pessoa jurídica de direito público não tem direito à indenização por danos morais relacionados à violação da honra ou da imagem - Entendimento do STJ ( REsp nº 1.258.389-PB). Inaplicabilidade da Súmula 227 do STJ a pessoas jurídicas de Direito Público. Precedentes desta C. Corte. R. Sentença mantida, por fundamentos diversos [...] (TJ-SP - AC: 10080671920188260482 SP 1008067-19.2018.8.26.0482, Relator: Flora Maria Nesi Tossi Silva, Data de Julgamento: 02/12/2020, 13ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 03/12/2020). APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VEICULAÇÃO DE REPORTAGEM. AUSÊNCIA DE COMENTÁRIOS DESABONATÓRIOS. CRÍTICAS SOBRE A SITUAÇÃO DA SAÚDE NO MUNICÍPIO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. PESSOA JURIDICA DE DIREITO PÚBLICO. 1. Pleito indenizatório em que a parte autora busca a reparação de danos morais supostamente suportados em virtude veiculação de reportagem no periódico demandado, a qual não caracteriza a prática de ato ilícito, mas o mero exercício do direito de informar. 2. No caso dos autos deve ser sopesado as garantias constitucionais do direito de livre expressão à atividade de comunicação (art. 5º, IX e 220, §§ 1º e 2º, da CF) e da inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (art. 5º, X, da CF), em consonância com o princípio da proporcionalidade. 3. Publicação de reportagem jornalística, baseada em informações relatas por Vereador do local, que não excede a simples narrativa dos fatos, não deve ser entendida como causa jurídica suficiente para dar margem ao direito de indenização. 4. O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que à pessoa jurídica de direito público não se aplica à Súmula 227, razão pela qual não pode pleitear indenização por danos morais em face de particular, conforme se denota do julgamento do Recurso Especial nº 1.258.389 [...] (TJ-RS - AC: 70077039147 RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Data de Julgamento: 29/08/2018, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 05/09/2018). Ressalte-se, porém, que, em recente julgado, a Corte Superior entendeu que excepcionalmente é possível haver reparação por danos morais decorrente de violação à honra ou à imagem de pessoa jurídica de direito público desde que haja (i) forte abalo à sua credibilidade institucional e (ii) evidente dano reflexo sobre os demais jurisdicionados, notadamente nos casos em que tenha sido praticado crime contra o ente com grave repercussão institucional e social, consoante se vê a seguir: CIVIL E ADMINISTRATIVO. "CASO JORGINA DE FREITAS". LESÕES EXTRAPATRIMONIAIS CAUSADAS POR AGENTES DO ESTADO AO INSS. PREJUÍZOS INSUSCETÍVEIS DE APRECIAÇÃO ECONÔMICA E DE EXTENSÃO INCALCULÁVEL. DANOS EXTRAPATRIMONIAIS. INDENIZAÇÃO. CABIMENTO. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Trata-se, na origem, de demanda proposta pelo INSS com o fim de obter reparação por danos decorrentes de fraude praticada contra a autarquia no contexto do denominado "caso Jorgina de Freitas", cuja totalidade dos prejuízos, segundo as instâncias ordinárias, superou 20 (vinte) milhões de dólares. 2. Consignou-se no acórdão recorrido: "repetindo a sistemática empregada tantas outras vezes, a advogada requereu fossem preparados novos cálculos; o contador os elaborou, alcançando resultado claramente exagerado; o procurador autárquico anuiu prontamente com o mesmo; e o magistrado, em tempo bastante expedito, homologou as contas e determinou a expedição do alvará de levantamento em favor da advogada, fechando-se assim o ciclo - sendo certo que, via de regra, os segurados não chegavam a receber qualquer parcela do montante desviado, que era partilhado entre os membros da organização criminosa" (fl. 2.370, e-STJ). 3. O Tribunal de origem manteve a condenação à reparação dos danos materiais, mas afastou o "pagamento de uma compensação por danos morais, posto que inviável cogitar-se, diante da própria natureza das atividades desempenhadas pelo INSS, de impacto negativo correspondente a descrédito mercadológico" (fl. 2.392, e-STJ). RECONHECIMENTO DE DANO MORAL: DISTINÇÃO PRESENTE NO CASO DOS AUTOS 4. Embora haja no STJ diversas decisões em que se reconheceu a impossibilidade da pessoa jurídica de Direito Público ser vítima de dano moral, o exame dos julgados revela que essa orientação não se aplica ao caso dos autos. 5. Por exemplo, no Recurso Especial 1.258.389/PB, da relatoria do Min. Luis Felipe Salomão, o que estava sob julgamento era ação indenizatória ajuizada por município em razão de programas radiofônicos e televisivos locais que faziam críticas ao Poder Executivo. No Recurso Especial 1.505.923/PR, Relator Min. Herman Benjamin, a pretensão indenizatória se voltava contra afirmações de que autarquia federal teria produzido cartilha com informações inverídicas. No Recurso Especial 1.653.783/SP, Relator Min. Mauro Cambpell, discutiu-se o uso indevido de logotipo do Ibama. 6. Diversamente do que se verifica no caso dos autos, nesses precedentes estava em jogo a livre manifestação do pensamento, a liberdade de crítica dos cidadãos ou o uso indevido de bem imaterial do ente público. DANOS EXTRAPATRIMONIAIS 7. Também não afasta a pretensão reparatória o argumento de que as pessoas que integram o Estado não sofrem "descrédito mercadológico". 8. O direito das pessoas jurídicas à reparação por dano moral não exsurge apenas no caso de prejuízos comerciais, mas também nas hipóteses, mais abrangentes, de ofensa à honra objetiva. Nesse plano, até mesmo entidades sem fins lucrativos podem se atingidas. 9. Transcreve-se no acórdão recorrido trecho da condenação criminal, relativa aos mesmos fatos, em que o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro afirmou: "além do descrédito da Justiça, as conseqüências concretas dos delitos, representadas pelas perdas patrimoniais, foram extremamente graves. Somente pelas cifras apuradas nestes autos evidencia-se o colossal prejuízo causado ao erário, que será impossível reparar cabalmente, a despeito das medidas assecuratórias adotadas" (fl. 2.366, e-STJ). 10. Não se pode afastar a possibilidade de resposta judicial à agressão perpetrada por agentes do Estado contra a credibilidade institucional da autarquia. VOTO VOGAL DO MIN. OG FERNANDES 11. Quanto à imposição de condenação na instância superior, devem ser acolhidas as bem lançadas razões apresentadas pelo eminente Min. Og Fernandes. 12. Considerando que "o acórdão recorrido limitou-se a reconhecer a impossibilidade jurídica do pedido de indenização por danos morais", afirmou Sua Excelência que "o provimento jurisdicional a ser exarado na instância extraordinária deve apenas afastar tal premissa, não sendo possível reconhecer, desde logo, a procedência do pleito indenizatório". CONCLUSÃO 13. Recurso Especial provido, com determinação de retorno dos autos, para que, tendo como fixada a viabilidade jurídica da reparação por danos morais, o Tribunal de origem reaprecie a questão como entender de direito. (REsp 1722423/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/11/2020, DJe 18/12/2020). A presente demanda também envolve a responsabilidade civil de provedores de aplicação de internet por conteúdo gerado por terceiros, tema regido pela Lei nº 12.965/2014, o Marco Civil da Internet. Este diploma visa a assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura. Conforme o artigo 19, caput, do Marco Civil da Internet, o provedor de aplicações de internet somente será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente. O § 1º do mesmo artigo estabelece que a ordem judicial deve conter identificação clara e específica do conteúdo, permitindo sua localização inequívoca, o que, na prática, significa a indicação da URL. Sem a URL específica, a localização do conteúdo torna-se impossível, dada a dinâmica da internet. É pacífico o entendimento de que não cabe aos provedores de aplicação de internet exercer controle prévio sobre o conteúdo gerado por seus usuários, nem realizar monitoramento ou varredura em seus serviços para identificar publicações ilícitas, sob pena de configurar censura prévia e violar a liberdade de expressão. A responsabilidade do provedor surge apenas após a notificação judicial com a devida identificação do conteúdo, ressalvado o disposto no art. 21 do Marco Civil da Internet. Em se tratando do encargo probatório aplicável à espécie, sabe-se que, conforme reza o art. 373, I, do CPC, cabe ao demandante demonstrar o fato constitutivo de sua pretensão deduzida em juízo, isto é, a presença dos requisitos ensejadores da responsabilidade civil do réu, cabendo a este a comprovação de eventual fato modificativo, impeditivo ou extintivo do direito autoral na forma do art. 373, II, do CPC, como culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior. Na espécie, o Município de São Gonçalo do Amarante alega que o perfil @sgadadepressao publicou notícias falsas sobre uma suposta "seleção fraudulenta" de servidores realizada pelo Município com uma lista dos supostos "aprovados" em seleção pública realizada pela Secretaria de Planejamento, Administração e Gestão - SEPLAG do ente municipal, para a contratação de servidores temporários, dentre os quais "BABAO DO PREFEITO", "TESTE" e "TOM CRUISE". Afirma que as postagens em questão apresentam tom sensacionalista e vulgar, tendo sido feitas com o propósito de macular a imagem do ente público municipal, de modo que ganharam enorme repercussão e causaram danos à honra do autor. O próprio requerente, porém, admite que "a lista apresentada pelo perfil @sgadadepressao de fato foi divulgada no site oficial da Prefeitura Municipal de São Gonçalo do Amarante/CE", contudo alega que a "referida listagem não diz respeito aos servidores efetivamente aprovados e contratados para a prestação do serviço público, mas sim de todos os inscritos para participar da seleção." Aduz ainda que essa lista "é gerada automaticamente por sistema eletrônico, que seleciona - sem qualquer discriminação de nome, raça, gênero e afins - todas as inscrições que foram realizadas em conformidade com os critérios exigidos no documento editalício que rege o processo seletivo, para, somente após, ser realizada nova fase de triagem de candidatos." Alega ainda acreditar que "referidos 'candidatos' foram inscritos tão somente com o intuito de constranger este Ente Público e obstar o regular trâmite de referida seleção." Diante do exposto pelo próprio ente público, porém, observa-se que a publicação no perfil @sgadadepressao apenas deu visibilidade a um fato que, embora controverso em sua origem e intenção, teve como base um documento oficial divulgado pelo próprio Município. A ré Jussara Camelo de Sousa argumenta que o objeto da postagem questionada foi "uma listagem publicada pelo próprio Município Demandante, que continham erros e equívocos gravíssimos, que macularam, por si só, o processo de seleção pública realizado pelo ente municipal." Desse modo, verifica-se que o objeto da postagem questionada, em realidade, se vincula diretamente à postagem oficial do próprio ente público, de modo que não se vislumbra intuito de afronta à honra objetiva institucional do ente municipal, mas opinião crítica sobre lista apresenta pelo próprio autor, que é ato dotado de publicidade e sujeito à avaliação e ao debate públicos, ainda que haja crítica contundente, ácida, irônica ou satírica (animus criticandi), que é especialmente relevante em se tratando de fatos de natureza pública. Assim sendo, não se vislumbram os requisitos necessários à configuração excepcional de dano moral à pessoa jurídica de direito público, atinentes a forte abalo à sua credibilidade institucional e a evidente dano reflexo sobre os demais jurisdicionados, mas sim opinião crítica atinente a fato de alcance público, sujeito ao escrutínio e ao debate coletivos. Ademais, os pedidos de suspensão permanente do perfil e de abstenção de publicações futuras que envolvam a honra objetiva do ente público não encontram amparo, pois tais medidas drásticas terminariam por configurar censura prévia, em violação aos princípios da liberdade de expressão e de pensamento, que, embora não absolutos, exigem ponderação e restrição cautelosa à luz de fatos concretos e determinados. Desse modo, diante da ausência de comprovação de ato ilícito por parte do responsável pelo perfil questionado e diante do disposto no art. 19 do Marco Civil da Internet, à luz dos princípios da liberdade de expressão e de pensamento, notadamente no tocante à análise crítica ou mesmo irônica de fatos de interesse coletivo, constata-se que a pretensão autoral não merece acolhimento. Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão deduzida na inicial, extinguindo o processo com resolução de mérito, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil. Autor isento de custas na forma do art. 5º, I, da Lei Estadual nº 16.132/2016. Condeno a parte requerente ao pagamento de honorários de 10% sobre o valor atualizado da causa na forma do art. 85, §§ 2º e 3º, I, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Expedientes necessários. São Gonçalo do Amarante-CE, data da assinatura digital. VICTOR DE RESENDE MOTA JUIZ DE DIREITO [1]Marmelstein, George. Curso de Direitos Fundamentais. São Paulo: Editora Atlas, 2019, Capítulo 18.
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