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Ricardo Vieira Grapiuna x Centro De Estudos Dos Beneficios Dos Aposentados E Pensionistas e outros

ID: 325480310

Tribunal: TRF1 Órgão: Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à Vara Federal da SSJ de Alagoinhas-BA Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1009527-03.2024.4.01.3314

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

RICARDO VIEIRA GRAPIUNA

Polo Passivo:

CENTRO DE ESTUDOS DOS BENEFICIOS DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Sentença Tipo A

Advogados:

MERILIQUELE COSTA DOS SANTOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

GEDALIO DA PIEDADE LIMA JUNIOR

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Alagoinhas-BA Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à Vara Federal da SSJ de Alagoinhas-BA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1009527-03.2024.4.01… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Alagoinhas-BA Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à Vara Federal da SSJ de Alagoinhas-BA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1009527-03.2024.4.01.3314 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) POLO ATIVO: RICARDO VIEIRA GRAPIUNA REPRESENTANTES POLO ATIVO: GEDALIO DA PIEDADE LIMA JUNIOR - BA61996 e MERILIQUELE COSTA DOS SANTOS - BA37320 POLO PASSIVO: CENTRO DE ESTUDOS DOS BENEFICIOS DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS e outros SENTENÇA - Mutirão 14 a 18/07/2025 - Pretende a parte autora a suspensão de empréstimo consignados em seu benefício previdenciário, sob a alegação de desconhecer a dívida, bem como indenização por danos morais e materiais. Decido. De início, declaro a perda do objeto do pedido de exclusão da consignação, pois a entidade consignatária informou a suspensão dos descontos (id 2169996366). Em seguida, observo que a entidade consignatária constitui pessoa jurídica de direito privado não relacionada no art. 109, I, da Constituição Federal e que não está presente hipótese de litisconsórcio necessário ou facultativo, afinal, a relação jurídica impugnada não envolve anuência ou participação da autarquia federal. Ainda que houvesse entre os requeridos alguma solidariedade decorrente da aplicação da legislação civil, por se tratar de responsabilidade disjuntiva, a Justiça Federal somente seria competente para apreciar os pedidos formulados em face da autarquia federal, como vem decidindo o Tribunal Regional Federal da 1ª Região: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA E MÚTUO PARA CONSTRUÇÃO. EMPREENDIMENTO DENOMINADO "PORTO MARINA RESIDENCE SERVICE". ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. SEGURO. CONCLUSÃO DA OBRA POR OUTRA CONSTRUTORA. AÇÃO PROPOSTA EM FACE DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, DA EMPRESA SEGURADORA E DA EMPRESA CONSTRUTORA. INEXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. CONEXÃO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA APRECIAR O PEDIDO FORMULADO EM FACE DA EMPRESA CONSTRUTORA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO (DANOS MATERIAIS E MORAIS) EM RELAÇÃO À CEF. 1. Na ação, objetivou-se condenação da ANDRADE MACÊDO CONSTRUÇÕES E INCORPORAÇÕES LTDA, da Caixa Econômica Federal e da Caixa Seguradora S.A, solidariamente, a indenizar a Autora: a) "pelos danos morais causados, caracterizado pela angústia e sofrimento decorrente da incerteza desse quanto ao recebimento ou não de suas unidades pretendidas"; e b) "pelas perdas sofridas, relativas aos lucros cessantes, desde dezembro de 2000 até a efetiva entrega do imóvel, tomando-se por base os valores atuais de mercado dos alugueres mensais para imóveis de características similares aos adquiridos". 2. A Justiça Federal é absolutamente incompetente para o processo e julgamento de pedidos formulados em face de pessoas não indicadas no art. 109 da Constituição Federal, salvo litisconsórcio necessário. 3. A competência absoluta não pode ser modificada por conexão ou continência, não sendo possível reunir ações, sob o fundamento de que o fato que as originou é o mesmo, se para uma delas a incompetência do Juízo é absoluta (STJ, AgRg no CC 92.346/RS, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Segunda Seção, DJe 03/09/2008). 4. Ainda que haja responsabilidade solidária, não podem as ações ser cumuladas uma vez que, podendo o credor formular o pedido contra qualquer um dos devedores (Código Civil, art. 942, parágrafo único, c/c art. 275), não há litisconsórcio necessário (Código de Processo Civil, art. 47). 5. A Caixa Econômica Federal tem legitimidade para figurar no polo passivo da ação em que se discute omissão no cumprimento de cláusula de contrato por ela celebrado. 6. "Se o contrato de compra e venda de terreno e de mútuo para construção de unidade habitacional previa cobertura securitária para a hipótese de não-conclusão da obra pela Construtora, o que, em realidade, veio a ocorrer, e tendo a Caixa Econômica Federal notificado a Seguradora para que fossem adotadas as providências necessárias ao término da obra, não se configurou a responsabilidade da empresa pública pela demora na entrega do imóvel" (EIAC n. 2001.33.00.006479-7/BA, 3ª Seção, e-DJF1 p. 10 de 19/05/2008). 7. Incompetência reconhecida, de ofício, para apreciar o pedido formulado em face da empresa Andrade Macedo Construções e Incorporações Ltda. 8. Apelação da autora a que se nega provimento, em relação à Caixa Econômica Federal. (TRF-1, AC 2002.33.00.028094-4, rel. Des. JOÃO BATISTA MOREIRA, e-DJF1 20/05/2011) Sendo assim, excluo da lide o CENTRO DE ESTUDOS DOS BENEFICIOS DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS - CEBAP, deixando, porém, de remeter dos autos a uma das Varas Cíveis da Justiça Comum (CPC, art. 64, § 3º), tendo em vista o prosseguimento da lide em face do INSS. Nada obstante, atribuo força de certidão a esta sentença para que a parte autora dê prosseguimento à demanda em face do particular perante a Justiça Estadual, a fim de preservar os atos já praticados e a data do ajuizamento. Em seguida, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pelo INSS porque a petição inicial lhe atribui a conduta de permitir a consignação supostamente indevida, fato que, à luz da teoria da asserção, justificaria eventual responsabilidade civil. Ademais, a discussão acerca da (in)existência de ato ilícito por parte do INSS se insere no mérito da demanda. Dito isso, recordo que a questão tratada nestes autos está amplamente sedimentada na jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, a qual firmou a seguinte tese: I - O INSS não tem responsabilidade civil pelos danos patrimoniais ou extrapatrimoniais decorrentes de “empréstimo consignado”, concedido mediante fraude, se a instituição financeira credora é a mesma responsável pelo pagamento do benefício previdenciário, nos termos do art. 6º, da Lei n. 10.820/03; II – O INSS pode ser civilmente responsabilizado por danos patrimoniais ou extrapatrimoniais, se demonstrada negligência, por omissão injustificada no desempenho do dever de fiscalização, se os “empréstimos consignados” forem concedidos, de forma fraudulenta, por instituições financeiras distintas daquelas responsáveis pelo pagamento dos benefícios previdenciários. A responsabilidade do INSS, nessa hipótese, é subsidiária em relação à responsabilidade civil da instituição financeira. (PEDILEF 0500796-67.2017.4.05.8307, Tema 183) Embora a tese se refira a empréstimo consignado, mesma lógica se aplica ao desconto de contribuições associativas, uma vez que o papel da autarquia, nos termos da Lei n. 10.820/2003 se limita ao credenciamento Art. 6º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social e do benefício de prestação continuada de que trata o art. 20 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, poderão autorizar que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) proceda aos descontos referidos no art. 1º desta Lei e, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam os seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, na forma estabelecida em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS e ouvido o Conselho Nacional de Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 14.431, de 2022) § 1o Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre: I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1o; II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento; II - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei; IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias; V - o valor dos encargos a serem cobrados para ressarcimento dos custos operacionais a ele acarretados pelas operações; e VI - as demais normas que se fizerem necessárias. § 2o Em qualquer circunstância, a responsabilidade do INSS em relação às operações referidas no caput deste artigo restringe-se à: (Redação dada pela Lei nº 10.953, de 2004) I - retenção dos valores autorizados pelo beneficiário e repasse à instituição consignatária nas operações de desconto, não cabendo à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos contratados pelo segurado; e(Incluído pela Lei nº 10.953, de 2004) II - manutenção dos pagamentos do titular do benefício na mesma instituição financeira enquanto houver saldo devedor nas operações em que for autorizada a retenção, não cabendo à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos contratados pelo segurado. (Incluído pela Lei nº 10.953, de 2004) Quanto ao procedimento de contestação dos descontos, foi editada a Instrução Normativa INSS/PRESS n. 28/2008 prevendo diversos canais para recebimento das reclamações, suspensão imediata dos descontos até a resposta da entidade consignatária e procedimento simplificado para análise dos pedidos: Art. 46. O beneficiário que, a qualquer momento, se sentir prejudicado por operações irregulares ou inexistentes ou que identificar descumprimento do contrato por parte da instituição financeira ou, ainda, de normas estabelecidas por esta IN, poderá registrar sua reclamação na OGPS, como segue: (Redação do caput dada pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018). I - no sítio eletrônico da Previdência Social (www.previdencia.gov.br); II - na Central de Atendimento da Previdência Social, pelo telefone número 135; ou (Revogado pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018): III - excepcionalmente, nas APS. (Revogado pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018): § 1º Na hipótese de o beneficiário apresentar a reclamação na APS, esta providenciará, de imediato, a sua inclusão on line no sistema da OGPS, fornecendo o código de registro ao beneficiário com os elementos necessários para viabilizar a análise e, quando for o caso, os dados para ressarcimento dos valores descontados indevidamente. Art. 47. As reclamações serão recebidas diariamente pela OGPS e serão adotadas as seguintes providências: I - a OGPS classifica as reclamações por instituição financeira e envia, por meio eletrônico, os respectivos registros à Dataprev, que suspenderá imediatamente os descontos; (Redação do inciso dada pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018). II - a Dataprev recepcionará os registros e aplicará fluxo automatizado para tratamento das manifestações apresentadas, solicitará às instituições financeiras os insumos necessários para avaliação, podendo, ainda, aplicar os tratamentos definidos pelo INSS; (Redação do inciso dada pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018). III - As instituições financeiras terão prazo de até dez dias úteis para envio das informações citadas no inciso II do caput; (Redação do inciso dada pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018). (Inciso acrescentado pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018): IV - a Dataprev, após recebimento das respostas encaminhadas pelas instituições financeiras, verificará: a) se a reclamação for improcedente, as informações e os documentos apresentados pelas instituições financeiras, bem como outras informações relevantes, serão incluídos no sistema da OGPS, que comunicará ao beneficiário; e b) se a reclamação for procedente, será efetuada a exclusão dos descontos, conforme definido no § 5º deste artigo. § 1º As instituições financeiras conveniadas deverão integrar seus canais de atendimento à plataforma disponibilizada pela Dataprev, de modo que as interações sejam realizadas de forma eletrônica. (Redação do parágrafo dada pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018). (Revogado pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018): (...) § 5º Caberá, exclusivamente à instituição financeira, a responsabilidade pela devolução do valor consignado/retido indevidamente, no prazo máximo de dois dias úteis da constatação da irregularidade, corrigido com base na variação da SELIC, desde a data de vencimento da parcela referente ao desconto indevido em folha, até o dia útil anterior ao da efetiva devolução, observada a forma disposta no art. 23, enviando comprovante à Dataprev. (Redação do parágrafo dada pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018). § 6º A margem consignável ficará bloqueada enquanto estiver pendente de decisão a reclamação de que trata este artigo. (Parágrafo acrescentado pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018). Art. 48. Quando a reclamação for considerada procedente por irregularidade na contratação ou consignação/averbação incorreta ou indevida em benefício, a instituição financeira deverá: I - enviar informação à Dataprev com vistas à exclusão da operação de crédito considerada irregular; e (Redação do inciso dada pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018). II - proceder ao ressarcimento dos valores descontados indevidamente ao beneficiário, no prazo e na forma estabelecidos no § 5º do art. 47, encaminhando o comprovante do depósito ou outro documento que comprove a quitação do valor à Dataprev. (Redação do inciso dada pela Instrução Normativa INSS Nº 100 DE 28/12/2018). Vale notar que o INSS não aufere lucro nestas operações ou obtém qualquer forma de benefício. Ao contrário, se limita a prestar serviço público voltado para ampliar o acesso de seus beneficiários ao crédito e viabilizar o associativismo, não sendo possível confundir o risco da atividade econômica (a cargo das entidades consignatárias) com o cumprimento de dever legal em benefício de interesses da coletividade. Sob este prisma, excetuada a prova de erro do INSS no processamento da contestação individual, descabe falar em responsabilidade civil por ato de terceiro. No caso concreto, inclusive, está demonstrado o dolo da entidade consignatária não comprovou a autorização para o desconto, fica evidente a fraude por ela cometida, porém, a parte autora não comprovou ter requerido o cancelamento da consignação, conforme procedimento previsto nos arts. 46/ss da Instrução Normativa INSS/PRES n. 28/2008 – o que lhe retira o interesse processual neste particular –, nem demonstrou culpa concreta da autarquia previdenciária na operação da consignação inserida em seu nome. Todavia, há um fato recente capaz de atrair a responsabilidade subsidiária do INSS no caso concreto. Após as recentes notícias de que autoridades de alto escalão do Governo Federal teriam negligenciado denúncias de fraudes cometidas de forma sistemática por associações que se credenciaram como entidades consignatárias, em 03/07/2025, o Supremo Tribunal Federal homologou acordo firmado entre a UNIÃO, o INSS, o MPF, a DPU e o CFOAB, no qual a autarquia previdenciária se comprometeu a ressarcir os valores indevidamente descontados de seus beneficiários, mediante comprovação da inexistência de autorização e inércia da consignatária em restituir os valores (ADPF 1236, DJe 04/07/2025) – rito que deve ser relativizado no caso concreto, afinal, esta ação judicial percorreu caminho mais longo do que aquele previsto no termo de acordo, tendo contado com a manifestação expressa de todos os envolvidos no rito sumário de contestação administrativa. Por outro lado, deve ser respeitado o compromisso homologado perante a Suprema Corte, permitindo-se à autarquia atender à elevada demanda ocasionada pela descoberta do esquema criminoso para fins de ressarcimento dos danos materiais sofridos pelos segurados que não forem reembolsados pelas consignatárias. Do mesmo modo, não será possível atribuir ao INSS a obrigação de pagar juros de mora senão após a comprovação da omissão do devedor principal e sua notificação para que examine o pedido de responsabilização subsidiária. Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido deduzido em face do INSS para condená-lo, de forma subsidiária, a restituir à parte autora os valores descontados na aposentadoria NB 157.191.306-5 sob a rubrica CONTRIB. CEBAP- 08007702070, corrigidas monetariamente desde a data de cada desconto e juros de mora a contar do 10º dia posterior à sua intimação para realizar o pagamento, tudo a ser apurado na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal. Para viabilizar a cobrança subsidiária, a parte autora deverá comprovar que realizou cobrança judicial em face da entidade consignatária e que não houve pagamento voluntário. Sem custas nem honorários em primeira instância. Defiro a gratuidade judiciária. Caso haja recurso, intime-se para contrarrazões e remetam-se os autos à segunda instância. Não havendo recurso, arquivem-se os autos, sem prejuízo de seu desarquivamento para execução subsidiária. Data e assinatura eletrônica no rodapé. ROBSON SILVA MASCARENHAS Juiz Federal Substituto

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Companhia Excelsior De Seguros e outros x Marina Porto Bonfim Ltda - Me

ID: 324017509

Tribunal: TJBA Órgão: 9ª V CÍVEL E COMERCIAL DE SALVADOR Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 8020935-43.2019.8.05.0001

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

COMPANHIA EXCELSIOR DE SEGUROS CORPO DE BOMBEIROS MILITAR DA BAHIA JULIO CESAR LOPES MACIEL MDM SERVICOS E TURISMO LTDA - ME

Polo Passivo:

MARINA PORTO BONFIM LTDA - ME

Sentença

Advogados:

MANFREDO LESSA PINTO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

SAULO VELOSO SILVA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

HERNANI LOPES DE SA NETO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 9ª V CÍVEL E COMERCIAL DE SALVADOR Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8020935-43.2019.8.05.0001 Órgão Julgador: 9ª V CÍVEL E COME… PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 9ª V CÍVEL E COMERCIAL DE SALVADOR Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8020935-43.2019.8.05.0001 Órgão Julgador: 9ª V CÍVEL E COMERCIAL DE SALVADOR AUTOR: JULIO CESAR LOPES MACIEL e outros Advogado(s): HERNANI LOPES DE SA NETO (OAB:BA15502), SAULO VELOSO SILVA (OAB:BA15028) REU: MARINA PORTO BONFIM LTDA - ME Advogado(s): MANFREDO LESSA PINTO registrado(a) civilmente como MANFREDO LESSA PINTO (OAB:BA10550) SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de Ação Indenizatória movida por JULIO CESAR LOPES MACIEL e MDM SERVIÇOS E TURISMO LTDA, inicialmente em face de MARINA PORTO BONFIM LTDA - ME, todos devidamente qualificados nestes autos. Inicialmente, requereu a parte Autora concessão do benefício da gratuidade de justiça em seu favor, considerando as dificuldades financeiras por ela enfrentadas, dadas as circunstâncias que deram origem a esta demanda. Alegou que, em 22/03/2018, por volta das 13 horas, um incêndio de grandes proporções ocorrido nas instalações da empresa Acionada atingiu dezenas de embarcações, dentre as quais se encontrava a lancha CEMINHA I, de propriedade dos Autores. Que além da perda total da lancha e acessórios existentes na embarcação, houve destruição completa também de todos os equipamentos de pesca que se encontravam sob as dependências da Acionada. Que tal fato é notório e fora publicamente veiculado em todas as mídias sociais e na imprensa local. Que o prejuízo da parte Autora alcançou seu meio de sustento, vez que a embarcação era utilizada no desenvolvimento de sua atividade econômica (pesca náutica e roteiros turísticos). Que sofreu drástico prejuízo, equivalente a RS 301.790,54 (trezentos e um mil e setecentos e nov enta reais e cinquenta e quatro centavos). Prosseguiu a parte Autora, argumentando que a legislação pátria prevê a responsabilidade pela guarda da coisa, na forma dos arts. 627 e 629 do Código Civil. Que as partes mantinham relação contratual há mais de dez anos. Que os danos materiais por ela sofridos abarcam tanto os danos emergentes quanto os lucros cessantes. Que o Réu faltou com o dever de vigilância, pois não havia adequado sistema para combate a incêndio nas suas instalações, contrariando a Lei Estadual nº 12.929 de 27 de dezembro de 2013, regulamentada por decreto n° 16.302 de 27 de agosto de 2015, bem como a Lei Federal nº 13.425, de 30 de março de 2017. Que os fatos em questão ocasionaram danos à esfera íntima do Autor, com reflexo em sua seara profissional e familiar, pois impedido de obter seu sustento, além de todo o abalo psicológico que o Acionante vem suportando. Pleiteou, em caráter liminar, pela concessão de tutela de urgência para bloqueio de valores que a Ré obteria a título de seguro. Em definitivo, pugnou pela confirmação da liminar; pela condenação da Acionada ao pagamento de todos os prejuízos causados à parte Autora, incluindo lucros cessantes desde março/2018 até o cumprimento integral da obrigação, do valor mensal de R$ 5.000,00 (cinco mil reais); pela condenação da Acionada ao pagamento da importância de R$317.933,25 (trezentos e dezessete mil, novecentos e trinta e três reais e vinte e cinco centavos), a título de danos materiais, na modalidade de danos emergentes; pela condenação da Ré ao pagamento do valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), a título de danos morais. A primeira Ré vem a juízo, espontaneamente, e colaciona sua Contestação no ID 29588124. Preliminarmente, requereu a concessão da justiça gratuita em seu favor, com fundamento na Súmula 481 do STJ, alegando condição de microempresa que sofreu redução considerável na receita bruta após o incêndio, conforme demonstrado pelos balanços e balancetes anexados. Que a relação entre as partes era de hangaragem (estacionamento de embarcações), não caracterizando relação de consumo, mas sim relação de natureza civil. Que requer a denunciação da lide à COMPANHIA EXCELSIOR DE SEGUROS, com fundamento no art. 125, II do CPC, por força de apólice que cobre veículos de terceiros até o limite de R$ 300.000,00. No mérito, a Ré, após impugnar o pedido de tutela antecipada, alegou que a MARINA foi vítima de um incêndio iniciado na lancha "Santinha III", causado por um marinheiro (de prenome Ricardo) que admitiu ter deixado ligado um ar-condicionado inadequado para embarcações. Que os funcionários da MARINA agiram prontamente, utilizando extintores de incêndio para tentar conter os danos. Que para haver responsabilidade civil seria necessária a comprovação de culpa, que afirma não existir no caso concreto, uma vez que o incêndio foi causado por terceiro (marinheiro de outra embarcação). Que todos os documentos juntados pelos autores, são de cunho unilateral e não comprovam: (i) que os bens estavam na MARINA ou na embarcação; (ii) que pertenciam aos autores; (iii) que valores em moeda estrangeira não podem ser aceitos como prova. Que não há prova de abalo moral apto a subsidiar o pedido indenizatório de R$ 30.000,00, pois o ocorrido não passou de mero aborrecimento, insuficiente para caracterizar dano moral. Requereu, ao final, além do julgamento de improcedência da demanda, a condenação do primeiro Autor por litigância de má-fé, por ter alterado a verdade dos fatos, ao afirmar estar sem fonte de renda após o incêndio, quando na verdade já adquiriu outra embarcação e continua exercendo sua atividade profissional. Reconhecida a incompetência da Vara Especializada de Consumo na decisão de ID 44950977. Decisão no ID 49964590, concedendo provisoriamente a gratuidade de justiça à parte Autora e indeferindo a tutela provisória requestada. Réplica à contestação consta do ID 58624808. Na oportunidade, a parte Autora impugnou o pedido de deferimento da gratuidade em favor da Ré, bem como anuiu ao pedido de denunciação da lide. No mais, reiterou os termos da inicial. Regularmente citada, a litisdenunciada COMPANHIA EXCELSIOR SEGUROS apresentou Defesa no ID 125783748. Preliminarmente, impugnou a concessão da gratuidade de justiça aos Autores, alegando que o autor Julio Cesar já havia adquirido outra embarcação e continuava exercendo suas atividades profissionais, inclusive como professor de línguas. Defendeu, noutro passo, a manutenção da decisão que indeferiu o pedido de gratuidade à Marina Porto Bonfim e concordou com a decisão que negou a tutela antecipada por ausência de probabilidade do direito. No mérito, argumentou não aceitar a denunciação à lide, pois os danos decorrentes da conservação de embarcações e da guarda de bens de terceiros em poder do segurado constituem risco expressamente excluído da cobertura (Cláusulas 5.1, alíneas "p" e "t" das Condições Gerais). Que a segurada perdeu o direito à cobertura por descumprir obrigação contratual relativa à colocação e manutenção de brigada de incêndio (Cláusula 3.1, alínea "f"). Que não incidem juros moratórios sobre a cobertura securitária, pois a obrigação da seguradora só surgirá com a responsabilização da segurada perante os Autores. No que tange à lide principal, a Litisdenunciada aduziu que o incêndio foi causado por culpa exclusiva de terceiro, especificamente de um marinheiro de outra embarcação (Santinha III), que deixou o ar-condicionado ligado, causando curto-circuito. Impugnou os documentos apresentados pelos Autores, alegando serem insuficientes para comprovar a existência e o valor dos bens supostamente perdidos, bem como para demonstrar que estes estavam na embarcação no momento do sinistro. Que não há cobertura contratada para lucros cessantes (Cláusula 5.2). Que os Autores não comprovaram a atividade econômica alegada e os rendimentos que deixaram de auferir. Que os Acionantes continuam exercendo a atividade de pesca náutica com outra embarcação. Que não há ato ilícito a ensejar reparação por danos morais, pois o sinistro decorreu de culpa de terceiro. Que não há relação de consumo entre as partes que justifique a inversão do ônus probatório. Requereu, ao final, a revogação da gratuidade da justiça concedida aos Autores; a manutenção do indeferimento da gratuidade à ré/Denunciante; pelo reconhecimento de improcedência da ação e da denunciação à lide; subsidiariamente, em caso de procedência parcial, pela limitação da responsabilidade da seguradora aos valores comprovados e aos limites do contrato, com o desconto da franquia (10% do prejuízo indenizável); da não incidência de juros sobre a importância segurada. Réplica à defesa da Litisdenunciada no ID 154900259. Argumentou a parte Autora que a alegação de capacidade para pagamento das custas processuais não se fez acompanhar por provas. Que a Ré e a Litisdenunciada realizaram acordo nos autos nº 0514983-65.2019.8.05.0001, perante a 1ª Vara de Relações de Consumo, envolvendo cobertura de danos do mesmo sinistro, razão pela qual a Seguradora também tem obrigação de cobrir os danos de terceiros, como é o caso da parte Autora. Que a incidência de juros deverá incidir a partir do comparecimento da litisdenunciada nos autos, qual seja, 09.08.2021. Decisão saneadora no ID 186209305. Remetida a análise da denunciação da lide para o momento da prolação da sentença e concedido prazo para que as partes manifestassem interesse na produção de provas. Confirmado o indeferimento da gratuidade de justiça à parte Ré no julgamento do Agravo (ID 152009178). Oficiado o Corpo de Bombeiros, este respondeu à comunicação no ID 350047285, aduzindo que não foram identificados registros de protocolo do Projeto de Segurança Contra Incêndio e Pânico para análise e aprovação do Corpo de Bombeiros Militar da Bahia. Por conseguinte, a empresa também não possui o Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB), licença pela qual a edificação é certificada de que cumpre as exigências previstas na Lei nº 12.929/2013 quanto à instalação das medidas de segurança contra incêndio e pânico. No mesmo sentido, informou-se que à época da ocorrência não foi solicitada perícia de incêndio e explosão, conforme prevê o Item 1.10.3 do Anexo II, da Lei 11.631/2009. Assim sendo, não foram emitidos laudos periciais da edificação/equipamentos sinistrados. Realizada audiência de instrução, conforme termo de ID 421714712. Após assistir aos vídeos da audiência, alguns pontos mereceram destaque: 1. a testemunha ADALBERTO AZEVEDO FIGUEIREDO, empregado da Marina, afirmou que só houve curso de brigada de incêndio para os trabalhadores após o incidente descrito na exordial; 2. a testemunha ANTÔNIO CARLOS CRESCÊNCIO DE SOUZA afirmou que, além de haver extintores de incêndio adequados na Marina, houve vistoria da Seguradora antes de realizado o contrato de seguro. Que por cerca de um ano o ar condicionado que deu causa ao incêndio havia sido instalado na embarcação que teria sido o foco do sinistro, sendo que a Marina não notificou o proprietário da embarcação quanto à irregularidade, porque não seria competência desta a fiscalização dos barcos; 3. a testemunha Paulo Francisco D'Onofrio Filho ouvida, cujo depoimento está registrado no vídeo com duração de 9min32seg, disse que o Autor lhe prestava serviços, num valor médio de R$ 8.000,00 por mês. Que o barco do Autor era um dos mais bem equipados de Salvador para a pesca e que somente um dos aparelhos, chamado "transducer", custava aproximadamente R$ 20.000,00. Que a embarcação do Autor possuía câmbio automático, o que era raro aqui na Bahia. Que sempre frequentou a Marina e nunca viu extintor, as mangueiras que ele via na Marina estavam sempre remendadas e eram de meia polegada, sem capacidade para ajudar em caso de incêndio. Que tinham muitos fios desencapados e com emendas, coisas que não cabiam em um lugar cheio de gasolina. Que os barcos eram abastecidos de forma inadequada. Razões finais reiterativas apresentadas pela parte Autora no ID 423346003. A parte Ré, por sua vez, colaciona seus memoriais no ID 424454472, onde afirmou que nenhuma das testemunhas ouvidas prestou depoimentos capazes de corroborar o alegado prejuízo patrimonial. A Litisdenunciada, em suas razões finais, invocou a resposta do Corpo de Bombeiros Militar da Bahia, confirmando que a Ré não possuía Projeto de Segurança Contra Incêndio e Pânico para análise e aprovação, nem Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB). Argumentou que a seguradora negou a cobertura após verificar o descumprimento das obrigações contratuais. É O QUE HAVIA A RELATAR. DECIDO. Inicialmente, confirmo a gratuidade de justiça concedida à parte Autora, vez que não há nos autos elementos capazes de infirmar a presunção de hipossuficiência para fins processuais. Note-se que o Acionante teve comprometido o desenvolvimento da sua atividade econômica como resultado do incidente descrito na exordial, situação que tenta remediar com a propositura desta demanda. Por conseguinte, mantenho a gratuidade de justiça concedida à parte Autora. Quanto à gratuidade requestada pela Ré, o tema fora superado com o julgamento do Agravo que confirmou o indeferimento do benefício (ID 152009178). No que tange à denunciação da lide, o tema será apreciado no decorrer desta fundamentação. Assim, superadas as preambulares, passemos à análise do mérito da demanda. Cumpre analisar, neste primeiro momento, a relação jurídica havida entre as partes. No caso em tela, resta configurado o contrato de depósito, na modalidade comercial, conforme preveem os artigos 627 e 629 do Código Civil: "Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame." "Art. 629. O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe pertence, bem como a restituí-la, com todos os frutos e acrescidos, quando o exija o depositante." Sendo assim, a obrigação da empresa MARINA PORTO BONFIM LTDA - ME, na qualidade de depositária, consistia em guardar e zelar pela embarcação pertencente aos Autores, com o mesmo cuidado que teria com os seus próprios bens, devendo devolvê-la quando solicitado, nas mesmas condições em que a recebeu. Tratava-se, portanto, de obrigação de resultado, não se esgotando no mero dever de vigilância, mas abrangendo a efetiva conservação do bem. Ocorre que, em 22/03/2018, fora registrado um incêndio de grandes proporções nas instalações da Ré, causando a destruição total da embarcação denominada CEMINHA I, bem como de todos os equipamentos de pesca que se encontravam sob sua guarda. Note-se que o incêndio, bem como a destruição da embarcação do Autor em decorrência deste evento, são fatos incontroversos nestes autos. A Ré alega, em sua defesa, que o sinistro decorreu de culpa exclusiva de terceiro, especificamente de um marinheiro (de prenome Ricardo) que teria deixado ligado um ar-condicionado inadequado para embarcações na lancha "Santinha III", o que teria causado um curto-circuito e, consequentemente, o incêndio. Tal argumento, contudo, não é suficiente para afastar a responsabilidade da Acionada. Cabia à empresa Ré o dever de garantir a integridade do bem enquanto ele estava sob sua guarda, respondendo objetivamente pelos danos ocorridos à embarcação, salvo demonstração de alguma excludente capaz de romper o nexo causal. A tese defensiva de que o incêndio teria se iniciado por curto circuito em uma embarcação não se presta para afastar a responsabilidade da Ré perante a parte Autora, afinal, cabe à Ré responder pelos riscos advindos/inerentes à atividade que exerce. De outra banda, não é possível afastar aqui a negligência da Ré, quando a narrativa Autoral encontra respaldo nos depoimentos das testemunhas e, especialmente, na comunicação enviada pelo Corpo de Bombeiros a este juízo. Conforme resposta do Corpo de Bombeiros Militar da Bahia, juntada no ID 350047285, a Ré não possuía Projeto de Segurança Contra Incêndio e Pânico para análise e aprovação, nem Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB), violando frontalmente a Lei Estadual nº 12.929 de 27 de dezembro de 2013, regulamentada pelo Decreto n° 16.302 de 27 de agosto de 2015, bem como a Lei Federal nº 13.425, de 30 de março de 2017. Em decorrência disto, sequer houve vistoria e laudo emitido pelo Corpo de Bombeiros após o incêndio, que notadamente tomou grandes proporções em razão da falta de recursos de prevenção a incêndios no estabelecimento da Ré. Como relatado acima, a testemunha Paulo Francisco D'Onofrio Filho declarou em audiência que sempre frequentou a Marina e nunca viu extintor, que as mangueiras que ele via na Marina estavam sempre remendadas e eram de meia polegada, sem capacidade para ajudar em caso de incêndio, que tinham muitos fios desencapados e com emendas, coisas que não cabiam em um lugar cheio de gasolina e que os barcos eram abastecidos de forma inadequada. A testemunha Adalberto Azevedo Figueiredo, empregado da Marina, por sua vez, afirmou que só houve curso de brigada de incêndio para os trabalhadores após o incidente descrito na exordial. Como bem pontuado na Réplica, há de se notar também que em nenhum momento de sua contestação a Ré apresenta seu plano de combate a incêndio, os nomes dos funcionários da sua brigada de combate a incêndio, e plano com a evacuação das embarcações. Tudo ficou apenas no plano das alegações, sem nenhum documento comprobatório. Desse modo, mesmo que o início do incêndio tenha se dado em outra embarcação, por ato de terceiro, resta evidente que a Marina não adotou as medidas de segurança legalmente exigidas para minimizar os riscos inerentes à atividade que desenvolvia, nem para combater eficientemente o fogo quando de sua ocorrência, demonstrando falha no dever de cuidado que lhe competia. Não merece prosperar, portanto, a alegação de culpa exclusiva de terceiro, uma vez que a responsabilidade da Ré, na qualidade de depositária, é objetiva, conforme inteligência do art. 642 do Código Civil: "O depositário não responde pelos casos de força maior; mas, para que lhe valha a escusa, terá de prová-los". Note-se que "força maior" é um conceito jurídico que se refere a eventos externos, imprevisíveis e inevitáveis, que impedem uma ou ambas as partes de cumprir com suas obrigações contratuais. Do quanto exposto na fundamentação desta decisão, resta preclaro que a Ré deixou de se cercar dos cuidados necessários para prevenir incêndios e reduzir os danos dele decorrentes, não sendo possível falar em inevitabilidade ou imprevisibilidade. Assim, vez que não caracterizada a ocorrência de força maior, a tese de responsabilidade objetiva se impõe. Neste sentido: Embarcação deixada em Yacht Club de Ilhabela. Remuneração mensal paga para a guarda e estadia da embarcação em poita. Contrato de depósito. Obrigação de restituição da coisa depositada incólume. Cabos de aço que, em decorrência de forte vendaval, se romperam e ocasionaram o deslocamento da estrutura flutuante da marina, danificando a embarcação. Rompimento do cabo de aço que não configura força maior. Estrutura que deveria suportar condições climáticas desfavoráveis. Dever de indenizar o prejuízo material, por inteligência dos artigos 629 e 642 do Código Civil. Existência de previsão no regulamento interno da associação de não responsabilidade por dano a embarcações. Estipulação que, ao caso concreto, é nula, por ofensa a norma legal. Dever da recorrida reparar o dano material suportado pelo recorrente.(TJ-SP - RI: 10095274720198260016 SP 1009527-47 .2019.8.26.0016, Relator.: Renato de Abreu Perine, Data de Julgamento: 18/11/2020, Nona Turma Cível, Data de Publicação: 23/11/2020) APELAÇÃO CÍVEL 0855193-45.2015.8.20.5001 EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - INCÊNDIO EM EMBARCAÇÃO QUE SE ENCONTRAVA EM MARINA - CONTRATO DE DEPÓSITO - ARTS. 627 E 629 DO CÓDIGO CIVIL - DEVER DE GUARDA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - ART 14 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR OU DE TERCEIRO NÃO COMPROVADA (ART. 14, § 3º, II DO CDC)- INOCORRÊNCIA DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR (ART. 393 DO CÓDIGO CIVIL)- FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO CONFIGURADA - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-RN - APELAÇÃO CÍVEL: 0855193-45.2015.8.20 .5001, Relator.: CORNELIO ALVES DE AZEVEDO NETO, Data de Julgamento: 07/10/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 08/10/2020) No que diz respeito a denunciação da lide à COMPANHIA EXCELSIOR DE SEGUROS, esta deve ser julgada procedente, a despeito da negativa apresentada pela Seguradora, pois, não há sentido em negar a cobertura a terceiros de acordo com as cláusulas securitárias (Cláusulas 5.1, alíneas 'p' e 't' das Condições Gerais), quando a atividade-fim da Ré é justamente a guarda de embarcações. Com efeito, a exclusão de cobertura para "danos decorrentes da conservação de embarcações e da guarda de bens de terceiros em poder do segurado" seria verdadeira contradição com o objeto do seguro, uma vez que a atividade principal da Ré é justamente a guarda de embarcações de terceiros. Ademais, a Litisdenunciada entabulou acordo com a Ré para pagamento da indenização contratada em outra ação judicial (autos nº 0514983-65.2019.8.05.0001), que tinha como causa de pedir o mesmo fato jurídico noticiado nesta demanda (sinistro causado por incêndio), o que demonstra reconhecimento tácito da obrigação de cobertura securitária. Quanto à alegação de perda de direito à cobertura por descumprimento de obrigação contratual relativa à colocação e manutenção de brigada de incêndio (Cláusula 3.1, alínea "f"), essa circunstância pode ensejar discussão em ação própria quanto ao direito de regresso da Seguradora contra a Segurada, mas não é oponível a terceiros prejudicados, máxime quando a Litisdenunciada, através de vistoria prévia, teve a oportunidade de constatar eventuais irregularidades nas instalações da segurada antes de firmar o contrato, conforme afirmado por prova testemunhal. No que tange aos danos materiais (via dano emergente) pleiteados pelos Autores, estes conseguiram comprovar, a contento, que sofreram prejuízo de ordem material, tanto pela perda da embarcação quanto dos equipamentos que nela se encontravam. As notas fiscais de ID 28619051, corroboram os custos despendidos com a embarcação e os equipamentos que se perderam no incêndio. Há ainda o depoimento da testemunha Paulo Francisco D'Onofrio Filho, que afirmou que o barco do Autor era um dos mais bem equipados de Salvador para a pesca e que somente um dos aparelhos, chamado 'transducer', custava aproximadamente R$ 20.000,00, bem como que a embarcação do Autor possuía câmbio automático, o que era raro aqui na Bahia. Há, portanto, prova documental e testemunhal para corroborar a regularidade do valor pleiteado a título de danos emergentes, no montante de R$ 317.933,25. No que tange aos danos materiais na modalidade lucros cessantes, resta preclaro nos autos que a atividade econômica da parte Autora restou prejudicada com o acidente relatado nesta ação. Independentemente de ter o Autor outra fonte de renda como professor e de ter conseguido no curso desta ação outro barco adequado para a pesca, tem-se como certo que qualquer empresário de pequeno porte teria sofrido nas mesmas condições para conseguir reerguer seu negócio. Observe-se que seis anos se passaram desde o incêndio sem que o Autor tivesse qualquer amparo financeiro dos responsáveis pela derrocada, ainda que temporária do seu empreendimento. O fato de ter conseguido se reerguer com recursos próprios não exime a parte Ré de assumir a responsabilidade pelos danos diretamente causados. No entanto, do compulsar do caderno processual, vê-se que não há elementos probatórios suficientes para fixar o montante devido quanto a esta parcela. Assim, quanto aos lucros cessantes, embora sejam devidos, entendo que o montante terá que ser apurado em liquidação de sentença, por arbitramento, com base na média dos rendimentos comprovadamente auferidos pelo Autor nos seis meses anteriores ao sinistro. No que concerne aos danos morais, entendo que a perda de um bem que constitui instrumento de trabalho do ofendido, privando-o de sua fonte de subsistência, ultrapassa o mero aborrecimento e configura dano moral indenizável. No caso dos autos, restou demonstrado que a embarcação CEMINHA I era utilizada pelo Autor como meio de sustento, ainda que não o único, na realização de atividades de pesca náutica e roteiros turísticos. A perda total da embarcação e de seus equipamentos, em razão de conduta negligente da Ré, causou ao Autor transtornos que extrapolam a esfera patrimonial, atingindo valores íntimos ligados à sua dignidade, autoestima e bem-estar psíquico. De fato, ver-se repentinamente privado de sua principal fonte de renda, tendo que suportar a frustração de expectativas e projetos profissionais, além do estresse financeiro e emocional decorrente da situação, caracteriza inequívoco dano moral. Para a fixação do quantum indenizatório, observo a extensão do dano e sua repercussão na vida do ofendido, o caráter pedagógico-punitivo para o ofensor, além dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, motivos pelos quais entendo que o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), requestado na inicial, mostra-se adequado à compensação do dano sofrido. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por JULIO CESAR LOPES MACIEL e MDM SERVIÇOS E TURISMO LTDA, em face de MARINA PORTO BONFIM LTDA - ME, para: CONDENAR a Ré ao pagamento de indenização por danos materiais, na modalidade de danos emergentes, no valor de R$ 317.933,25 (trezentos e dezessete mil, novecentos e trinta e três reais e vinte e cinco centavos), acrescido de correção monetária e juros de mora na forma do art. 398 e do art. 406 do Código Civil; CONDENAR a Ré ao pagamento de indenização por lucros cessantes, em valor a ser apurado em liquidação de sentença, com base na média dos rendimentos auferidos pelos autores nos seis meses anteriores ao sinistro, devidos desde a data do evento danoso (22/03/2018), até a data do efetivo pagamento da indenização por danos emergentes; CONDENAR a Ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), acrescido de correção monetária e juros de mora na forma do art. 389 e do art. 406 do Código Civil; correção monetária incidente desde a data do arbitramento (presente data) e juros de mora a partir da citação. JULGO PROCEDENTE, ainda, a denunciação da lide apresentada por MARINA PORTO BONFIM LTDA - ME em face de COMPANHIA EXCELSIOR DE SEGUROS, para condenar a Litisdenunciada, solidariamente, ao pagamento da indenização por danos materiais ao Autor, observado o limite da apólice (R$ 300.000,00), com o desconto da franquia (10% do prejuízo indenizável). Correção monetária e juros de mora na forma do art. 398 e do art. 406 do Código Civil. Em razão da sucumbência, condeno a Ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor do patrono dos Autores, que arbitro em 15% (dez por cento) sobre o valor da condenação, dada a complexidade da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil. Condeno a Litisdenunciada ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da Denunciante, que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da denunciação (ou seja, R$ 300.000,00), nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil. Mantenho a gratuidade da justiça concedida aos Autores, como suso fundamentado. P.I.C. Salvador-BA, 16 de abril de 2025. ANA KARENA NOBRE JUÍZA DE DIREITO

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