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Processo nº 1014131-82.2022.8.11.0042

ID: 293954156

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA ESP. DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE CUIABÁ Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMáRIO Nº Processo: 1014131-82.2022.8.11.0042

Data de Disponibilização: 10/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

RUI MANUEL LONGO GOMES

Sentença

Advogados:

EDUARDO SANTOS DE PAULA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA ESP. DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1014131-82.2022.8.11.0042. VISTOS. O Ministério Público do Estado de… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA ESP. DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1014131-82.2022.8.11.0042. VISTOS. O Ministério Público do Estado de Mato Grosso ofereceu denúncia contra RUI MANUEL LONGO GOMES, pela prática, em tese, do delito previsto no art. 24-A (2x) da Lei n. 11.340/2006 c/c art. 61, inciso II, alínea “f”, todos do Código Penal, em desfavor da vítima MONICA MACIEL DE SENA CORTEZ. Narra a denúncia, em suma, que, nos dias 16 e 18 de junho de 2022, por intermédio de mensagens telefônicas, nesta Comarca de Cuiabá/MT, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, o denunciado RUI MANUEL LONGO GOMES descumpriu decisão judicial que deferiu medidas protetivas de urgência à vítima Monica Maciel de Sena Cortez, sua ex-companheira. Ressai dos autos que o denunciado é ex-marido da vítima e tiveram três filhos, mas na época dos fatos estavam separados. A denúncia foi recebida em 06/11/2023, consoante ID 133608743. O réu foi devidamente citado (ID 134497788). Resposta à acusação apresentada através da Defensoria Pública no ID 139169028. No ID 172096103, a Defensoria Pública manifestou a impossibilidade de atuar nos presentes autos. Foi designada audiência de instrução, qual fora realizada em 22/10/2024 (ID 173667074), ocasião em que foi colhido apenas o depoimento da vítima, onde foi nomeado advogado dativo, o Dr. Eduardo Santos de Paula – OAB MT20135-O, para atuar na defesa do acusado. Em continuidade, em 25/02/2025, foi redesignada audiência de instrução, onde foi realizada a oitiva da testemunha JUCILENE APARECIDA DA COSTA, bem como foi realizado o interrogatório do acusado. Em alegações finais orais, o Ministério Público pugnou pela PROCEDÊNCIA da denúncia com a condenação de RUI MANOEL LONGO GOMES nos termos da denúncia. A Defesa, em alegações finais orais, requereu em síntese a improcedência da denúncia, a fim de absolver o acusado do delito imputado na exordial, ante a insuficiência probatória. Vieram os autos conclusos para sentença. EIS O RELATO NECESSÁRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. O acusado responde perante este Juízo pela prática, em tese, do delito previsto no artigo 24-A da Lei 11.340/2006 c/c art. 61, inciso II, alínea “f”, todos do Código Penal, em desfavor da vítima MONICA MACIEL DE SENA CORTEZ. Os autos tramitaram regularmente, não havendo nenhuma irregularidade ou nulidade que impeça a prolação da sentença. Diante da incidência da Lei 11.340/06 este Juízo se torna competente para o presente julgamento. I. DO JULGAMENTO COM PERSPECTIVA DE GÊNERO Inicialmente, importante registrar que, conforme se extrai do conjunto probatório, o crime atribuído ao denunciado foi praticados no âmbito da violência doméstica contra a mulher, tendo como fator motivador questões de gênero. Assim, imprescindível o julgamento do caso com perspectiva de gênero, observando as desigualdades estruturais e não julgando de maneira abstrata, obtendo com isso, resultados judiciais o mais próximo possível da previsão de igualdade substantiva prevista na Constituição Federal e nos tratados internacionais dos quais o Brasil é parte em matéria de Direitos Humanos. Ressalta-se ainda que, durante a instrução processual, também ocorreu a condução do processo com perspectiva de gênero, evitando que se tornasse um ambiente de violência institucional e a revitimização da vítima, a qual somente foram facultadas perguntas essenciais para o esclarecimento dos fatos. Neste contexto e considerando a natureza dos delitos praticados no âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher, geralmente praticados com a ausência de testemunhas, a palavra da mulher deve ser especialmente valorada, desde que coerente e apresentada sem contradições. Por fim, registra-se que o Conselho Nacional de Justiça instituiu o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, no qual avança na interpretação do direito sob a lente de gênero, e com isso reforça-se que, no contexto doméstico, existem comportamentos que perpetuam a violência de gênero e que devem ser interrompidos por meio de decisão judicial, como nos autos. II. DO MÉRITO Trata-se de figura típica delituosa – descumprimento de medidas protetivas contra a vítima, previsto no artigo 24-A, da Lei nº 11.340/2006, incluído pela Lei nº 13.641, de 03/04/2018 – punida a título de dolo, ou seja, consistente na vontade livre e consciente de descumprir decisão judicial que defere medida protetiva com base na Lei Maria da Penha. Por primeiro, a materialidade está demonstrada através da portaria no ID 96030604; pelo boletim de ocorrência no ID 96030605; pela decisão que deferiu medidas protetivas em favor da vítima nos autos nº 1008647-86.2022.8.11.0042; certidão de intimação do réu no ID 96030609- fl. 03 e pelo depoimento da vítima. No que tange a autoria, esta está comprovada através dos depoimentos colhidos em Juízo que corroboram com as alegações prestadas em sede policial e com as provas juntadas nos autos, bem como diante da confissão do acusado em juízo. Durante a instrução processual, a vítima relatou em Juízo que entrou com pedido de medida protetiva depois que o acusado a agrediu no dia dos namorados, que posteriormente o acusado foi retirado da casa do casal por oficial de justiça, que ele foi notificado no dia 16/06/2022 de manhã da medida protetiva e no mesmo dia, ao fim do dia ele começou a me ligar e me mandar mensagem, sabendo que não podia fazer isso, mandado mensagem e fotos de uma das crianças falando que eu tinha agredido, que iria me denunciar que eu iria pagar pelo que eu estava fazendo, que eu tinha começado o circo e iria ver o que iria virar, que ficou com muito medo que não ficou em casa, que ficou uns quatro dias na casa de terceiros, que voltou pra casa com medo e ele continuou mandando mensagens e fotos me ridicularizando, e as pessoas começaram a entrar em contato comigo dizendo que aquelas fotos e aquelas figuras/memes de internet ele estava mandando para todo mundo, falando para as pessoas testemunharem contra mim, e a baba das crianças me ligou falando que ele estava ligando pra ela e falando que ela ia ter que testemunhar a favor dele, que estava se sentindo com muito medo do que ele pudesse fazer, com o mandado da medida protetiva que falava que era pra mim e extensivo as crianças, que o acusado foi na escola das crianças e tentou pegar as crianças na escola. Que no mesmo dia ele foi no Conselho Tutelar e fez uma denúncia contra a vítima. Que as crianças sofreram bastante por conta das agressões em casa, e ai quando ele se afastou com o trabalho de psicóloga e neuropsicóloga, as crianças foram se normalizando, que quem analisou que as crianças estavam em sofrimento foi a escola. A testemunha Jucilene Aparecida da Costa, afirmou em Juízo que depois que o acusado saiu do apartamento entrou em contato com ela por telefone falando que a patroa o tirou de dentro de casa, que ele queria que ela fosse a testemunha dele por bem ou por mal, que após essa conversa continuou ligando pra ela e mandado áudio, que encaminhou os áudios a vítima para eles se resolverem por lá, que não falou mais com ele. Que o relacionamento não era muito legal, que a vítima era uma excelente mãe que nunca deu um tampa em nenhuma das crianças dela, que era muito calada, que o acusado era muito agressivo dentro de casa, que xingava muito com as crianças. O acusado, quando interrogado em Juízo, confirmou as acusações, afirmando que enviou as mensagens a vítima. Pois bem, diante de todo o conjunto probatório, verifico que as afirmações da vítima e da testemunha não deixam margens de dúvidas quanto a autoria do delito de delito de descumprimento de medida protetiva. Importante ressaltar que em consulta ao sistema PJE, foi possível verificar que as Medidas Protetivas de n. 1008647-86.2022.8.11.0042, foram deferidas em favor da vítima em 15/06/2022, as quais determinavam: “(...) a- Determino o afastamento do suposto agressor do lar conjugal ou local de convivência; b- Determino que o requerido deverá manter distância da vítima no limite de 500 metros; c- Determino que o suposto agressor não mantenha contato com a ofendida por quaisquer meios de comunicação; d- Proíbo o acusado de frequentar a residência da ofendida, bem como seu local de trabalho. e- Determino que o agressor participe do grupo reflexivo “PAPO DE HOMEM PARA HOMEM” da Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso, cujas reuniões ocorrerão na Avenida Cel. Meireles, s/n, Bairro São João Del Rei, nesta Capital. O agendamento deverá ser feito no prazo de 05 (cinco) dias através do comparecimento pessoal no endereço citado ou via telefone (65) 3675-2649. Determino que o acusado comprove a sua participação nos autos, no prazo de 60 (sessenta) dias. (...) determino a suspensão de visitas do Requerido aos dependentes menores Joaquim Henry Gomes Cortez, Antônio Isaac Gomes Cortez e Milena Maria Gomes Cortez. Defiro o uso do aplicativo do SOS Mulher, pelo mesmo prazo das presentes medidas protetivas (seis meses). Determino o acompanhamento pela Patrulha Maria da Penha. (...)” Ademais, foi possível verificar naqueles autos (MPU - 1008647-86.2022.8.11.0042 – ID 87740471), que o acusado tomou ciência do deferimento das medidas supramencionadas em 16/06/2022. As provas constantes nos autos revelam, de maneira segura, que o acusado tinha plena ciência da existência da medida protetiva de urgência, regularmente deferida e por ele formalmente recebida, e, mesmo assim, desrespeitou suas condições, tentando manter contato com a vítima através de meios de comunicação. Portanto, como ficou constatado, mesmo ciente da decisão e estando ciente da proibição de se aproximar/comunicar com a vítima, o acusado descumpriu a medida protetiva, logo, sua conduta caracterizou o tipo penal previsto no art. 24-A da Lei nº 11.340/2006. A. Da circunstância agravante do art. 61, II, “f”, do Código Penal Deixo de aplicar a circunstância agravante do art. 61, II, “f”, do Código Penal, tendo em vista que configuraria o bis in idem, em razão de que a violência doméstica constitui elementar do crime. Nesse sentido, vejamos o julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. “No que se refere ao crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência, previsto no art. 24-A da Lei nº 11.340/2016, na primeira fase, dentre as circunstâncias judiciais elencadas no art. 59 do Código Penal, houve o reconhecimento da reincidência do réu (ID nº 21833704 - Páginas 2, 4 e 8), com base na qual o juízo a quo fixou a pena-base em 3 (três) meses e 11 (onze) dias de detenção. (...) Na segunda fase, o ilustre magistrado compensou a atenuante da confissão espontânea (ID nº 21836281 - Pág. 5) com a agravante, prevista no artigo 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal (violência contra a mulher). Contudo, a referida compensação merece reparo, considerando que é entendimento jurisprudencial deste Egrégio Tribunal de Justiça que configura bis in idem aplicar a agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal (violência contra a mulher) combinada com o artigo 24-A da Lei nº 11.340/2016, considerando que a violência doméstica já constitui elementar deste crime. (...) Diante disso, ausentes agravantes e presente a atenuante da confissão espontânea, reduzo a pena em 1/6, fixando-a no mínimo legal de 3 (três) meses." (grifamos) Acórdão 1322773, 07028020320208070019, Relator: Des. HUMBERTO ULHÔA, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 4/3/2021, publicado no PJe: 12/3/2021.” B. Da circunstância atenuante disposta no artigo 65, III, alínea “d”, do Código Penal Considerando a confissão do delito pelo acusado, o qual confirmou ter enviado as mensagens a vítima, o reconhecimento da atenuante da confissão, disposta no artigo 65, inciso III, alínea “d”, do CP, é medida que se impõe. III. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a denúncia para CONDENAR o réu RUI MANUEL LONGO GOMES, qualificado nos autos, nas sanções do artigo 24-A da Lei 11.340/06. No que concerne à reparação dos danos causados pela infração, observadas as circunstâncias do caso, considerando o princípio da proporcionalidade/razoabilidade e levando-se em conta os prejuízos experimentados pela vítima, a qual afirmou ter sentido medo após o ocorrido, com espeque no art. 91, inc. I, do CP; c/c 387, inc. IV, do CPP; e Tema Repetitivo 983, do STJ, fixo a INDENIZAÇÃO mínima no importe de R$ 1.000,00 (mil reais) à vítima. IV. DOSIMETRIA DE PENA Passo, pois, à dosimetria da condenação imposta pelo crime de descumprimento de medida protetiva, nos termos do artigo 68 do CP. 1.1. Dosimetria de pena em relação aos fatos de 16/06/2022 A pena prevista para o crime de descumprimento de medidas protetivas é de detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, nos termos do artigo 24-A da Lei n. 11.340/06 (Incluído pela Lei nº 13.641, de 2018 – Lei vigente à época dos fatos) Na primeira fase da dosimetria da pena a culpabilidade normal; antecedentes na data do fato inexistem; conduta social nada que agrave; personalidade do agente não há dados para mensurar; os motivos não há elementos que o prejudique; circunstâncias e consequência não existem dados que prejudiquem, quanto ao comportamento da vítima em nada influenciou na prática do crime. Assim, fixo a pena base em 03 (três) meses de detenção. No que tange à segunda fase, RECONHEÇO a agravante previstas no art. 61, inciso II, f, do Código Penal, bem como RECONHEÇO a atenuante da confissão, motivo pelo qual mantenho a pena em pena de 03 (três) meses de detenção. Por fim, na terceira fase por não existir majorante ou minorante, torno a PENA provisória em DEFINITIVA, correspondendo em 03 (três) meses de detenção, a ser cumprida, em regime aberto, segundo o artigo 33, §2º, alínea “c”, e §3°, do código penal. 1.2. Dosimetria de pena em relação aos fatos de 18/06/2022. A pena prevista para o crime de descumprimento de medidas protetivas é de detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, nos termos do artigo 24-A da Lei n. 11.340/06 (Incluído pela Lei nº 13.641, de 2018 – Lei vigente à época dos fatos) Na primeira fase da dosimetria da pena a culpabilidade normal; antecedentes na data do fato inexistem; conduta social nada que agrave; personalidade do agente não há dados para mensurar; os motivos não há elementos que o prejudique; circunstâncias e consequência não existem dados que prejudiquem, quanto ao comportamento da vítima em nada influenciou na prática do crime. Assim, fixo a pena base em 03 (três) meses de detenção. No que tange à segunda fase, RECONHEÇO a agravante previstas no art. 61, inciso II, f, do Código Penal, bem como RECONHEÇO a atenuante da confissão, motivo pelo qual mantenho a pena em 03 (três) meses de detenção. Por fim, na terceira fase por não existir majorante ou minorante, torno a PENA provisória em DEFINITIVA, correspondendo em 03 (três) meses de detenção, a ser cumprida, em regime aberto, segundo o artigo 33, §2º, alínea “c”, e §3°, do código penal. 2. DA PENA DEFINITIVA Considerando a dosimetria da pena aplicada de forma individualizada a cada crime, com a aplicação do artigo 69 do Código Penal, A PENA FINAL RESULTA em 06 (seis) meses de detenção, a ser cumprida em regime aberto, segundo o artigo 33, §2º, alínea “c”, e §3°, do Código Penal. Quanto a substituição da pena privativa de liberdade para pena restritiva de direitos, deixo de aplicar a hipótese do artigo 44 do Código Penal, uma vez que o delito fora praticado no âmbito da Lei 11.340/2006, conforme ADI 4424 e Súmula 588 do STJ. ISENTO o réu do pagamento das custas processuais por ser pobre na forma da lei. CIÊNCIA ao Ministério Público. INTIMEM-SE o réu através de sua defesa constituída nos autos, nos termos do art. 392, inciso II, do Código de processo Penal. INTIME-SE a vítima. Transitada em julgado, oficie-se à Justiça Eleitoral (art. 15, III da CF/88), forme-se o PEP, escrevendo-se o nome do réu no rol dos culpados. Expeça-se o necessário. Havendo objetos apreendidos, intimem-se os interessados para que manifestem interesse na sua restituição, em cinco dias. Nada sendo requerido, oficie-se a Diretoria do Foro desta Comarca para que adote as providências cabíveis quanto aos referidos objetos, a fim de que sejam destruídos/inutilizados, observado, no que couber, o disposto no art. 123 do Código de Processo Penal. Por fim, fixo a título de honorários ao Advogado Dativo Dr. Eduardo Santos de Paula, subscrito na OAB MT20135-O, o valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), devendo ser expedida a respectiva certidão de honorários em favor deste. Expeça-se o necessário. Registra-se. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT. Tatyana Lopes de Araújo Borges Juíza de Direito

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