Processo nº 1030528-80.2024.8.11.0000
ID: 275517195
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 1030528-80.2024.8.11.0000
Data de Disponibilização:
21/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FLAVIA DA CAMARA SABINO PINHO MARINHO
OAB/RN XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1030528-80.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Práticas Abusivas, Tratamento médico-hos…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1030528-80.2024.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Práticas Abusivas, Tratamento médico-hospitalar, Fornecimento de medicamentos] RelatorA: EXMA. SRA. Dra. TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [EXMA. SRA. DESA. MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, EXMA. SRA. DESA. MARILSEN ANDRADE ADDARIO, EXMA. SRA. DRA. TATIANE COLOMBO] Parte(s): [JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (AGRAVANTE), KAMYLA ALVES FERREIRA - CPF: 045.351.161-99 (AGRAVADO), FLAVIA DA CAMARA SABINO PINHO MARINHO - CPF: 055.081.864-25 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência da EXMA. SRA. DESA. MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: “POR MAIORIA, RECURSO DESPROVIDO, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA”. E M E N T A AGRAVO DE INSTRUMENTO – PLANO DE SAÚDE – TUTELA DE URGÊNCIA – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO ESSENCIAL À GESTANTE COM GRAVIDEZ DE ALTO RISCO – ENOXAPARINA SÓDICA – NEGATIVA DE COBERTURA SOB A ALEGAÇÃO DE USO DOMICILIAR - URGÊNCIA COMPROVADA – ART. 35-C DA LEI 9.656/98 – MEDICAMENTO COM INCORPORAÇÃO NO SUS E PARECER FAVORÁVEL DA CONITEC – APLICAÇÃO DA LEI 14.307/2022 – DIREITO À VIDA E À SAÚDE – MANUTENÇÃO DA LIMINAR – RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto pela Unimed Cuiabá Cooperativa de Trabalho Médico contra decisão que concedeu tutela de urgência em ação ordinária, determinando o fornecimento de 273 unidades do medicamento Enoxaparina Sódica (Clexane) à autora, gestante de alto risco portadora de trombofilia, condição que impõe risco à gestação e à vida do nascituro. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em definir se o plano de saúde é obrigado a custear medicamento prescrito para uso domiciliar, não previsto no rol da ANS, quando essencial à preservação da saúde e da vida da beneficiária gestante de alto risco. III. Razões de decidir 3. A Lei nº 9.656/1998, art. 35-C, II, impõe cobertura obrigatória de atendimentos de urgência, abrangendo complicações no processo gestacional, como no caso em tela. 4. A Enoxaparina, ainda que autoadministrável, não possui caráter meramente domiciliar, integrando tratamento imprescindível e urgente para evitar riscos materno-fetais, especialmente considerando o histórico de abortos da gestante. 5. O Código de Defesa do Consumidor (CDC) rege a relação contratual, impondo a interpretação mais favorável à consumidora (art. 47), sendo abusiva a negativa de custeio sob o argumento de ausência de previsão contratual ou por se tratar de medicamento de uso domiciliar. 6. A Lei nº 14.307/2022 reforça a obrigatoriedade da cobertura quando o medicamento for incorporado ao SUS ou recomendado pela Conitec, o que se aplica à Enoxaparina. 7. Demonstrados o perigo de dano grave e a probabilidade do direito, restando configurados os requisitos para a manutenção da tutela de urgência deferida. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido. Tese de julgamento: "1. O plano de saúde tem o dever de custear medicamento prescrito como essencial para tratamento de gestante em gravidez de alto risco, ainda que de uso domiciliar, quando comprovada a urgência e a necessidade médica, independentemente da previsão no rol da ANS”. 2. “A negativa de cobertura, sob alegação de que se trata de medicamento de uso domiciliar, é abusiva quando demonstrado o risco grave à saúde da beneficiária e do nascituro." R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. Dra. TATIANE COLOMBO (RELATORA): Egrégia Câmara, Trata-se de Recurso de Agravo de Instrumento com pedido de liminar interposto por UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO contra a decisão proferida na Ação Ordinária Com Pedido de Tutela Antecipada c/c Danos Morais n°. 1046798-56.2024.8.11.0041, promovida por KAMYLA ALVES FERREIRA. A decisão agravada concedeu a tutela de urgência pleiteada pela Requerente, determinando, no prazo de 03 (três) dias, o custeio e/ou fornecimento do total de 273 (duzentos e setenta e três) unidades do medicamento Enoxaparina Sódica - Clexane. (ID. 172130523 – autos de origem). A Agravante alega que, no caso dos planos de seguros privados de assistência à saúde, existe norma específica, qual seja, a Lei 9.656 de 03 de junho de 1998, que estabelece as diretrizes, os direitos e os deveres dos consumidores e das Operadoras. Razão pela qual o Código de Defesa do Consumidor deve ser aplicado de forma subsidiária. Sustenta a inexistência da probabilidade do direito ante a ausência de obrigação legal e previsão contratual ao fornecimento de medicamento de uso domiciliar. Alega que a Lei Federal 9.656/1988, em seu artigo 10°, inciso VI, exclui a cobertura obrigatória pelos planos de saúde, o fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar. Defende que a medicação ENOXAPARINA não precisa de manipulação especial ou conhecimento técnico para administração. Isto é, não necessita de nenhum apoio domiciliar e/ou hospitalar, bem como não demanda assistência de profissional da saúde. Assim, o medicamento prescrito permite a administração em ambiente externo ao de unidade de saúde, contrapondo-se ao âmbito ambulatorial e hospitalar, e que pode ser facilmente ministrado pelo paciente. Logo, é um medicamento de uso domiciliar – não devendo ser custeado pelo plano de saúde. Afirma que a mera existência de prescrição médica não justifica a imposição de cobertura de todo e qualquer tratamento. Aduz que não é possível aferir a condição clínica da Agravada em relação ao grau de urgência/emergência do seu tratamento, não havendo como subsistir a manutenção da tutela de urgência. Diante dos fatos, requer a concessão de efeito suspensivo à decisão agravada, “sob pena de causar à Agravante lesão grave e de difícil reparação” – sic. E no mérito, pleiteia o provimento do recurso a fim de cassar a tutela de urgência concedida. (ID. 248461665) Efeito suspensivo indeferido conforme ID. 249152177 Contrarrazões pelo desprovimento do recurso no ID. 253995657. É o relatório. V O T O EXMA. SRA. Dra. TATIANE COLOMBO (RELATORA): Egrégia Câmara, A questão a ser decidida no mérito do presente Recurso de Agravo de Instrumento, diante de seus estreitos limites, envolve a análise da presença, ou não, dos requisitos autorizadores da tutela de urgência antecipada pelo juízo de origem, quais sejam: a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (artigo 300 do Código de Processo Civil). A controvérsia recursal cinge-se à obrigação da UNIMED CUIABÁ de fornecer o medicamento Enoxaparina Sódica à agravada, gestante de alto risco diagnosticada com trombofilia, sob o argumento de que se trata de medicação de uso domiciliar expressamente excluída da cobertura contratual e legal nos termos da Lei 9.656/98 e da Resolução Normativa ANS 465/2021. Os contratos de planos de saúde estão submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, conforme estabelece a Súmula 608 do STJ. Portanto, aplica-se, o artigo 47 do Código de Defesa do Consumidor, o qual determina a interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor. Extrai-se dos autos de origem que, a Autora, ora Agravada, encontra-se grávida e foi diagnosticada com Trombofilia (CID-10 D68.8). Em razão dessa condição, foi-lhe prescrito o uso do medicamento Enoxaparina Sódica 60mg. (ID 171484268 – autos de origem) Além disso, de acordo com os relatórios médicos apresentados, o medicamento é o mais adequado para o caso, sendo essencial para evitar graves complicações, uma vez que a gravidez é considerada de alto risco. Vejamos: (...) Declaro para os devidos fins que a paciente supracitada, gestante de alto risco de 4 semanas, necessita, com URGÊNCIA, de enoxoparina 60 mg, durante toda a gestação e 42 dias após o parto, por ser portadora de TROMBOFILIA, doença que pode causar fenômenos tromboembólicos, abortos de repetição, partos pré-termo, deslocamento de placenta, pré-eclâmpsia. O uso do drogáceo é indicado para salvaguardar a vida da gestante e de seu bebê. A medicação deve ser aplicada pela própria paciente em seu domicílio, haja vista que a gravidez é de alto risco e não pode a paciente ser expor diariamente a emergências hospitalares para fazer uso da medicação. Esclareço, ainda, que a paciente apresenta histórico de abortamentos de primeiro trimestre, necessitando do medicamento para evitar outras complicações. – sublinhei e destaquei Como visto, o caso trata de gestante diagnosticada com trombofilia, patologia que, se não tratada adequadamente, pode causar graves riscos à saúde materna e fetal, inclusive aborto e óbito, ainda mais no caso em exame, onde a agravada já sofreu abortamentos em gravidez anteriores. Assim, a prescrição médica para uso da Enoxaparina Sódica é clara ao indicar a necessidade do medicamento como medida preventiva imprescindível durante a gestação e o puerpério. Nesse contexto, a alegação da agravante, de que o medicamento possui natureza domiciliar e, por isso, estaria excluído da cobertura contratual e legal, não se sustenta diante da peculiaridade do caso concreto. O art. 35-C, inciso II, da Lei 9.656/98 impõe aos planos de saúde a cobertura obrigatória dos atendimentos de urgência, compreendendo complicações no processo gestacional, exatamente o quadro dos autos. Desse modo, o medicamento, ainda que autoadministrável, não possui caráter meramente domiciliar, pois está inserido no contexto de um tratamento de urgência para preservar a gestação de alto risco. Ademais, a Lei 14.307/2022 alterou a Lei dos Planos de Saúde para determinar que medicamentos incorporados ao SUS e com parecer favorável da CONITEC sejam automaticamente incluídos no rol de cobertura da ANS, situação na qual se enquadra a Enoxaparina. Logo, a referida legislação estabelece que a lista de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS possui caráter meramente exemplificativo, servindo como referência básica para a cobertura dos planos de saúde, de modo que as operadoras devem custear tratamentos não incluídos na lista, desde que comprovados cientificamente e recomendados pela Conitec ou por órgão de renome internacional. Portanto, resta evidenciada a presença da probabilidade do direito e do perigo de dano, requisitos autorizadores da concessão da tutela de urgência, uma vez que a negativa de fornecimento da medicação coloca em risco imediato a vida da agravada e do nascituro, violando os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito à saúde (art. 1º, III e art. 196 da CF). Nesse sentido, é o entendimento deste e. Câmara: AGRAVO INTERNO – DECISÃO MONOCRÁTICA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – PLANO DE SAÚDE – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO – ENOXAPARINA SÓDICA 40MG – RECOMENDAÇÃO MÉDICA – MEDICAMENTO DE USO DOMICILAR – EXCLUSÃO CONTRATUAL EXPRESSA – PERIGO DE DANO DEMONSTRADO – RECURSO DESPROVIDO. Havendo indicação médica para o uso do medicamento, deve o fornecimento do medicamento ser garantido, rol exemplificativo Lei n.14.454/22. A Lei n. 9.656/1998, em seu art. 35-C, inc. II, dispõe expressamente quanto à obrigatoriedade de cobertura quando caracterizada a urgência em complicações no processo gestacional, consoante visto na espécie. Presentes os requisitos necessários à concessão da tutela de urgência concedida na decisão agravada, notadamente a probabilidade do direito alegado pela parte autora. (N.U 1022229-85.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/06/2023, Publicado no DJE 23/06/2023) (Destaquei) Da mesma forma, cito diversos julgados de casos análogos oriundos deste e. Tribunal, in verbis: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – NEGATIVA DE COBERTURA DO MEDICAMENTO ‘ENOXAPARINA SÓDICA 40MG’ – EVIDENTE RISCO À GRAVIDEZ – URGÊNCIA/EMERGÊNCIA – PROTEÇÃO A BEM MAIOR – RELEVÂNCIA – DIREITO FUNDAMENTAL – TRATAMENTO PRESCRITO POR MÉDICO DA PACIENTE – RECUSA INDEVIDA – DECISÃO MANTIDA EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL – RECURSO DESPROVIDO. O plano de saúde não pode se recusar a custear o tratamento clínico prescrito pelo médico especialista que acompanha a paciente, ao fundamento de ausência de cobertura para medicamento de uso domiciliar, haja vista que não cabe à cooperativa delimitar o fármaco para a doença objeto da cobertura contratual, pois o tratamento adequado é atribuição do médico que assiste a paciente. (N.U 1000083-45.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/02/2025, Publicado no DJE 28/02/2025) (Destaquei) AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. PRESENÇA DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO ENOXAPARINA SÓDICA 40MG PARA PACIENTE GESTANTE. PREVISÃO LEGAL. MANUTENÇÃO DA DECISÃO VERGASTADA – RECURSO DESPROVIDO. Necessidade urgente de tratamento ininterrupto da agravada com medicamento ENOXAPARINA 40 mg (Clexane), considerando o risco de interrupção da gravidez, conforme laudo médico. Situação de urgência incontroversa, sendo certo que o artigo 35-C da Lei nº 9.656/98 e o artigo 3º, inciso XIV, da Resolução Normativa nº 259/2011 da ANS, determinam a cobertura obrigatória nos casos de urgência e emergência, na qual se insere o estado gestacional. Periculum in mora que restou evidenciado, considerando que a trombofilia pode gerar a interrupção da gestação, assim, risco à sua vida e do nascituro. Ausência de irreversibilidade da medida, porquanto, caso, ao final, o pedido seja julgado improcedente, a recorrente poderá cobrar os valores despendidos pelas vias próprias, não havendo que se falar em violação ao contrato, ao princípio da separação dos poderes e à liberdade econômica. (N.U 1005922-56.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 16/08/2022, Publicado no DJE 23/08/2022). DIREITO DO CONSUMIDOR E CONTRATUAL – APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER– COBERTURA DE TRATAMENTO – NEGATIVA DO PLANO DE SAÚDE – MEDICAMENTO PARA TRATAMENTO DE TROMBOFILIA – ENOXAPARINA SÓDICA 40MG – DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA E Á SAÚDE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por plano de saúde em face de sentença que julgou procedente o pedido de fornecimento do medicamento "enoxaparina sódica" 40 mg, prescrito para tratamento domiciliar de beneficiária gestante portadora de trombofilia, condição que impõe risco à vida do feto em caso de interrupção da medicação. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em saber se o plano de saúde tem a obrigação de custear medicamento prescrito para uso domiciliar, ainda que não previsto no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), quando essencial à preservação da saúde e da vida da beneficiária. III. RAZÕES DE DECIDIR O direito à saúde é garantido pela CF/1988, art. 196, cabendo aos planos de saúde o dever de cobertura integral de tratamentos necessários quando a doença é abrangida pelo contrato. A jurisprudência do STJ prevê que o rol da ANS é exemplificativo, sendo obrigação do plano de saúde fornecer o tratamento prescrito, especialmente em casos de risco grave. A negativa de custeio do tratamento domiciliar essencial para garantir a saúde do beneficiário configura prática abusiva, conforme CDC, art. 51, devendo prevalecer o princípio da interpretação mais favorável ao consumidor. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso conhecido e desprovido. Majoração dos honorários advocatícios para 20% sobre o valor da condenação, nos termos do CPC, art. 85, § 11. Tese de julgamento: “O plano de saúde deve fornecer medicamento prescrito para tratamento domiciliar essencial à saúde e à vida do beneficiário, independentemente da previsão no rol da ANS, quando a doença estiver coberta pelo contrato”. (N.U 1002455-15.2022.8.11.0018, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/11/2024, Publicado no DJE 10/11/2024). DIREITO DO CONSUMIDOR E CONTRATUAL – APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER– COBERTURA DE TRATAMENTO – NEGATIVA DO PLANO DE SAÚDE – MEDICAMENTO PARA TRATAMENTO DETROMBOFILIA–ENOXAPARINA SÓDICA 20MG OU 40MG– DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA E Á SAÚDE – INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS - RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por usuária de plano de saúde em face de sentença que julgou improcedente o pedido de fornecimento do medicamento "enoxaparina sódica" 20mg ou 40mg, prescrito para tratamento domiciliar de beneficiária gestante portadora de trombofilia, condição que impõe risco à vida do feto em caso de interrupção da medicação. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em saber se o plano de saúde tem a obrigação de custear medicamento prescrito para uso domiciliar, ainda que não previsto no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), quando essencial à preservação da saúde e da vida da beneficiária. III. RAZÕES DE DECIDIR O direito à saúde é garantido pela CF/1988, art. 196, cabendo aos planos de saúde o dever de cobertura integral de tratamentos necessários quando a doença é abrangida pelo contrato. A jurisprudência do STJ prevê que o rol da ANS é exemplificativo, sendo obrigação do plano de saúde fornecer o tratamento prescrito, especialmente em casos de risco grave. A negativa de custeio do tratamento domiciliar essencial para garantir a saúde do beneficiário configura prática abusiva, conforme CDC, art. 51, devendo prevalecer o princípio da interpretação mais favorável ao consumidor. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso conhecido e parcialmente provido. Majoração dos honorários advocatícios para 15% sobre o valor da condenação, nos termos do CPC, art. 85, § 11. Tese de julgamento: “O plano de saúde deve fornecer medicamento prescrito para tratamento domiciliar essencial à saúde e à vida do beneficiário, independentemente da previsão no rol da ANS, quando a doença estiver coberta pelo contrato”. (N.U 1008937-91.2024.8.11.0055, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/02/2025, Publicado no DJE 28/02/2025). APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – PACIENTE GESTANTE – PREVENÇÃO DE RISCO VASCULAR – NEGATIVA DE COBERTURA E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO ENOXAPARINA 60MG – TRATAMENTO PRESCRITO PELO MÉDICO DA PACIENTE – RECUSA INDEVIDA – ABUSIVIDADE CONSTATADA – SENTENÇA REFORMADA – CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Segundo orienta o Superior Tribunal de Justiça, o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura contratual, todavia, não lhe é permitido restringir o tipo de tratamento, medicamento ou procedimento indicado por médico considerado essencial para a cura de tais doenças. Em sendo comprovada a necessidade da beneficiária do plano de saúde em realizar o tratamento com utilização do fármaco Enoxaparina 60mg, cujo laudo médico é expresso no sentido de que sua utilização visa combater o risco de trombose, a manutenção da obrigação imposta ao plano de saúde no custeio do medicamento é medida que se impõe. Ressalte-se, ademais, que a obrigatoriedade do plano de saúde cobrir tratamentos caracterizados como de urgência e emergência está expressamente estabelecida no art. 35-C da Lei n° 9.656/98. “O argumento de que o tratamento não consta no rol de procedimentos da ANS não constitui óbice à pretensão da parte autora, tendo em vista que o aludido rol é meramente exemplificativo, contendo apenas o mínimo obrigatório de procedimentos a serem cobertos pela operadora do plano de saúde”. (N.U 1022086-87.2022.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 12/08/2024) Dessa forma, evidencia-se o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, considerando o relatório médico da Autora, ora Agravada, que demonstra a urgência do fornecimento e da utilização do medicamento, bem como sua comorbidade e o histórico gestacional. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo incólume a decisão agravada. É como voto. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARIA HELENA GARGAGLIONE PÓVOAS (1ª VOGAL): Acompanho o voto da relatora. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARILSEN ANDRADE ADDÁRIO (2ª VOGAL): Eminentes pares: Esta Câmara possui diversos precedentes no sentido de que a enoxaparina constitui medicamento de uso domiciliar e, segundo o entendimento firmado em recurso repetitivo pelo Superior Tribunal de Justiça, medicamentos domiciliares não integram o rol de procedimentos da ANS, razão pela qual não podem ser objeto de cobertura obrigatória pelo plano de saúde, salvo quando administrados em contexto de internação, o que não é o caso dos autos. Ainda que se reconheça que a enoxaparina está incorporada ao SUS e possui parecer favorável da CONITEC, entendo que tais fatores não vinculam a cobertura contratual no âmbito da saúde suplementar, especialmente quando se está diante de tratamento domiciliar não previsto contratualmente. Com efeito, com a máxima vênia, não há fundamento legal para impor à operadora de plano de saúde a cobertura de medicamento de uso domiciliar, na ausência de expressa previsão contratual, conforme dispõe o art. 10, inciso VI, da Lei nº 9.656/98, interpretação esta que encontra respaldo no Enunciado nº 117 da Jornada de Direito da Saúde (FONAJUS/CNJ), nos seguintes termos: “As alterações decorrentes da Lei n. 14.454/22, que incluiu o §13º ao art. 10 da Lei n. 9.656/98 e previu a cobertura excepcional não constante do Rol de Procedimentos e Eventos da ANS, não se aplicam às hipóteses elencadas no art. 10, inc. VI, da Lei n. 9.656/98, o qual exclui da saúde suplementar o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar, ressalvada a previsão contratual.” No mesmo sentido, colaciona-se recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, que reafirma o entendimento de que o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar está excluído da cobertura obrigatória dos planos de saúde, salvo nas hipóteses expressamente previstas em lei ou no contrato: “DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DOMICILIAR. EXCLUSÃO DE COBERTURA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso que manteve a condenação da operadora de plano de saúde ao fornecimento do medicamento enoxaparina, para tratamento de trombofilia gestacional, além de indenização por danos materiais e morais. 2. A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos, determinando o fornecimento do medicamento e fixando indenização por danos materiais e morais. A Corte estadual manteve a decisão, destacando a urgência do uso do medicamento, registrado na Anvisa, tendo em vista o risco de interrupção da gravidez e o histórico de abortamento da autora. II. Questão em discussão 3. Há duas questões em discussão: (i) saber se é devido o fornecimento de medicamento de uso domiciliar por operadora de plano de saúde, considerando a exclusão prevista na legislação; e (ii) saber se houve omissão no acórdão recorrido quanto ao fornecimento de medicamento de uso domiciliar. III. Razões de decidir 4. [...] 5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estabelece que é lícita a exclusão, na saúde suplementar, do fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, salvo exceções específicas como antineoplásicos orais e medicação assistida. 6. O medicamento enoxaparina, sendo de uso domiciliar e não se enquadrando nas exceções previstas, não deve ser coberto pelo plano de saúde. 7. A decisão do Tribunal de origem não está em harmonia com a jurisprudência do STJ, devendo ser reformada para afastar o dever de cobertura do medicamento em questão. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso parcialmente provido para afastar o dever de cobertura pela operadora do plano de saúde do fornecimento do medicamento enoxaparina, julgando-se improcedente o pleito inicial. Tese de julgamento: "1. É lícita a exclusão, na saúde suplementar, do fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, salvo exceções específicas previstas na legislação. 2. Medicamentos de uso domiciliar que não estão enquadrados nas exceções não devem ser cobertos por planos de saúde". [...]” (REsp n. 2.181.903/MT, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 17/3/2025, DJEN de 21/3/2025) (g.n.) Diante desse contexto, não se pode atribuir à iniciativa privada, representada pelo plano de saúde, o dever de custear todo e qualquer tratamento não previsto contratualmente, sobretudo quando se trata de medicamento de uso domiciliar. Com essas considerações, peço vênia à douta relatora e à eminente 1ª vogal para divergir e dar provimento ao recurso, para julgar improcedente o pedido de cobertura do medicamento enoxaparina, por tratar-se de medicamento de uso domiciliar excluído da cobertura contratual e legal. É como voto.- EXMA. SRA. DRA. TATIANE COLOMBO (RELATORA): Eminentes Pares, Senhor Presidente, Eminentes Pares, Apenas faço uma pontuação, para evitar qualquer interpretação de que este voto esteja dissonante do entendimento prevalente nesta Câmara. Embora reconheça a existência de um precedente repetitivo sobre a matéria, entendo que, em certas situações específicas, a análise detida do caso concreto se revela imprescindível. Na hipótese em apreço, a meu ver, o uso do medicamento em questão demonstrou-se necessário, justificando uma análise particularizada das circunstâncias. EXMA. SRA. DESA. MARIA HELENA GARGAGLIONE PÓVOAS (1ª VOGAL): Eminentes Pares, Confesso que estou em uma posição bastante desconfortável, porque tenho essa posição que a Desembargadora Marilsen Andrade Addário mencionou. Porém, em casos em que diz respeito a tratamento médico, penso que não é uma regra inquebrantável, é uma orientação, porque não se pode ter uma regra que possa alcançar todos os casos sem nenhuma deferência. E, como disse a Douta Relatora Tatiane, há situações que precisam ser analisadas no caso concreto. Pergunto à nobre relatora: no caso em julgamento, ficou comprovado que o uso foi domiciliar e não hospitalar? EXMA. SRA. DRA. TATIANE COLOMBO (RELATORA): Desembargadora Maria Helena, trata-se de um caso de gravidez com histórico de abortos espontâneos. A autora, ora agravada, é portadora de trombofilia, uma condição que impede e coloca em risco a gestação. É uma situação muito particular, na qual a utilização da enoxoparina sódica, em tese, não exigiria a internação da paciente. Apenas a utilização da medicação era essencial para preservar a vida dela e a continuidade da gravidez. Em suma, todas as circunstâncias relacionadas à trombofilia neste caso são bastante peculiares. Foi em razão dessas especificidades que abri uma exceção para apresentar o voto desta maneira, mesmo que se distancie do entendimento geral da nossa Câmara, com o qual, em outras situações, concordo. No entanto, a singularidade deste caso concreto justificou essa abordagem diferenciada. EXMA. SRA. DESA. MARILSEN ANDRADE ADDÁRIO (2ª VOGAL): Com a devida vênia à Relatora, registro que todos os casos de trombofilia que julgamos nesta Câmara envolviam gestantes. A situação era exatamente a mesma: o fornecimento da medicação para gestantes com trombofilia, visando evitar o aborto. Portanto, a situação fática não me parece peculiar a ponto de justificar o afastamento do entendimento já consolidado por este Colegiado.- EXMA. SRA. DESA. MARIA HELENA GARGAGLIONE PÓVOAS (1ª VOGAL): Desembargadora Marilsen, compreendo o ponto levantado. Contudo, em algumas situações específicas, como nos casos em que a paciente se encontra na iminência de um aborto, postergar o tratamento acredito que não seria a conduta mais adequada. No caso em apreço, acompanho integralmente o voto da Relatora, peço todas as vênias. Aproveito para indagar à Relatora: há outras situações clínicas, além da prevenção de aborto em gestantes com trombofilia, nas quais a utilização desse medicamento (enoxaparina sódica) se faz necessária? EXMA. SRA. DRA. TATIANE COLOMBO (RELATORA): Não, Excelência. A indicação principal é para casos de trombofilia, ou seja, risco aumentado de trombose. A trombofilia pode se manifestar durante a gestação, aumentando significativamente o risco devido às alterações na coagulação sanguínea características desse período. Portanto, o uso da enoxaparina sódica visa prevenir eventos tromboembólicos nesse contexto específico da gestação com trombofilia. Data da sessão: Cuiabá-MT, 23/04/2025
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