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Ernesto Manoel Da Mata x Mt Cereais E Rações Eireli - Epp e outros

ID: 298418071

Tribunal: TJMT Órgão: 6ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1009239-07.2020.8.11.0041

Data de Disponibilização: 13/06/2025

Polo Ativo:

ERNESTO MANOEL DA MATA

Polo Passivo:

MT CEREAIS E RAÇÕES EIRELI - EPP PAULO SILVA SANCHES

Sentença

Advogados:

JOSE MARCIO DE OLIVEIRA

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JUCILENE PEDROSO FERREIRA REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO JUCILENE PEDROSO FERREIRA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 6ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Gabinete: e-mail - cba.gab6varacivel@tjmt.jus.br - telefone/whatsapp - (65) 3648-6334 Secretaria: e-mail - cba.6civel@tjmt.jus.br - tele… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 6ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Gabinete: e-mail - cba.gab6varacivel@tjmt.jus.br - telefone/whatsapp - (65) 3648-6334 Secretaria: e-mail - cba.6civel@tjmt.jus.br - telefone - (65) 3648-6327 Processo nº 1009239-07.2020.8.11.0041 Vistos, em correição. Grazielle Cristina Mesquita, representada por Ernesto Manoel da Mata, ajuizou ação de indenização por uso indevido de marca comercial cumulada com pedido de medida cautelar de busca e apreensão de bens móveis, indenização por danos materiais e morais, perdas e danos e enriquecimento ilícito, em face de Paulo da Silva Sanches e MT Cereais e Rações EIRELI, alegando que, após desfazer contrato de compra e venda celebrado com o primeiro réu, os bens móveis e a marca “Rações Casablanca” deveriam ter sido restituídos, o que não ocorreu. Aduziu que os bens foram alienados à segunda requerida, que os utiliza sem autorização, inclusive a marca registrada em nome da autora, conforme certificado do INPI. Relatou que tentou solução extrajudicial por meio de notificações, sem êxito, e que os bens, avaliados em R$ 637.500,00, seguem sendo explorados comercialmente, resultando em prejuízos financeiros. Pleiteou, em caráter de urgência, liminar de busca e apreensão dos bens, a condenação dos réus em danos materiais no valor mencionado, perdas e danos no montante de R$ 1.120.000,00, danos morais de R$ 41.800,00 e o reconhecimento do enriquecimento ilícito e do uso indevido de marca, com a devida abstenção. Requereu, ainda, a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Determinada emenda a petição inicial, a parte autora reiterou o pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita e requereu a inclusão da empresa MT Cereais e Rações EIRELI, inscrita no CNPJ nº 08.471.000/0001-81, no polo passivo da demanda, em razão de equívoco no cadastramento da parte requerida. Por fim, solicitou a reanálise do pedido de liminar para busca e apreensão dos bens móveis supostamente em posse indevida da referida empresa. Na decisão de ID 31604111, foi indeferido o pedido de tutela de urgência para busca e apreensão dos bens móveis especialmente diante da ausência de urgência justificada, considerando o lapso de quase dois anos entre a rescisão contratual e a propositura da ação. Determinou a citação e intimação da parte requerida e deferiu os benefícios da justiça gratuita à parte autora. Foi registrado a realização da audiência de conciliação no ID 48049360 e 53322470, contudo, o ato ficou prejudicado, razão da ausência da parte autora, na primeira audiência e por ausência do requerido Paulo na segunda. A parte requerida, MT Cereais e Rações EIRELI, apresentou contestação sob o ID 54602097, na qual suscitou preliminares de ausência de interesse processual e de ilegitimidade passiva, afirmando que não possui qualquer vínculo jurídico com a autora ou com o primeiro réu, e que não há elementos probatórios que justifiquem sua inclusão no polo passivo. Alegou, ainda, a inépcia da petição inicial pela ausência de individualização das responsabilidades dos réus e pela inexistência de pedido expresso de solidariedade. No mérito, sustentou que adquiriu os equipamentos de terceiro alheio à relação jurídica discutida e negou ter praticado qualquer ato ilícito, tampouco ter utilizado a marca “Rações Casablanca” após notificação extrajudicial, reiterando que tal marca não estava em uso desde 2008 e que não havia registro válido à época da aquisição. Impugnou os pedidos de indenização por danos materiais, morais e perdas e danos, bem como a medida de busca e apreensão, requerendo a extinção do feito sem resolução do mérito, a improcedência dos pedidos formulados na inicial e a condenação da parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios. A autora apresentou réplica impugnando integralmente os argumentos da contestação. Certificada a citação do requerido Paulo da Silva Sanches, este não apresentou resposta no prazo legal. A autora manifestou interesse na produção de prova testemunhal e depoimento pessoal. A ré MT Cereais informou não ter outras provas a produzir. Os autos vieram conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. Do julgamento antecipado da lide Nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, é cabível o julgamento antecipado da lide quando não houver necessidade de produção de outras provas. No caso em tela, a matéria controvertida é eminentemente de direito, sendo desnecessária a dilação probatória para o deslinde da questão. Da impugnação a gratuidade da justiça A segunda requerida, em sua contestação (ID 54602097), formulou pedido de revogação dos benefícios da gratuidade de justiça anteriormente concedidos à parte autora, sob o fundamento de que esta não preenche os requisitos legais para fruição do referido benefício. Alegou, para tanto, que a autora exerce atividade empresarial, é casada com engenheiro mecânico com alto padrão de vida, e reside em imóvel de alto valor localizado em bairro nobre da cidade, conforme documentos acostados aos autos. Apontou ainda a existência de outro imóvel de luxo financiado em nome da autora, no valor de R$ 1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil reais), indicando sua capacidade financeira. Acrescentou que os dados constantes da declaração de imposto de renda apresentada nos autos e a declaração de hipossuficiência firmada pela autora não condizem com sua realidade econômica, o que evidenciaria tentativa de obtenção indevida do benefício. Por fim, sustentou que o estilo de vida da autora, aliado à aprovação de elevado financiamento imobiliário, contradiz a alegação de insuficiência financeira, o que justificaria a revogação da gratuidade. Nos termos do artigo 99, §3º, do Código de Processo Civil, presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. Trata-se de presunção relativa (juris tantum), que pode ser afastada por prova idônea e suficiente em sentido contrário. O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema 1.178, fixou tese vinculante no sentido de que é vedada a adoção de critérios puramente objetivos para indeferir, de plano, o pedido de gratuidade de justiça, devendo o julgador considerar as particularidades do caso concreto e avaliar as condições econômicas da parte requerente de forma ampla e contextualizada. No caso dos autos, observa-se que o imóvel apontado pela parte requerida como indicativo de capacidade financeira é utilizado como residência familiar, estando gravado com dívida hipotecária no valor aproximado de R$ 930.000,00 (novecentos e trinta mil reais), circunstância que afasta qualquer presunção automática de disponibilidade patrimonial. Além disso, a existência de imóvel residencial financiado, por si só, não revela capacidade de suportar despesas processuais sem prejuízo do sustento próprio ou familiar, mormente quando não demonstrada renda compatível com os encargos do processo. Não se desconhece que o benefício da gratuidade da justiça se destina àqueles que comprovem a impossibilidade de arcar com os custos do processo, porém, no presente caso, os elementos trazidos pela requerida não se mostram suficientes para infirmar a presunção legal conferida à declaração de hipossuficiência apresentada pela autora, tampouco evidenciam, de forma inconteste, que ela disponha de recursos para custear o processo sem prejuízo de suas necessidades essenciais. Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial: PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DESPESAS PROCESSUAIS. INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS. EXISTÊNCIA DE IMÓVEL EM NOME DO BENEFICIÁRIO. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS DO BENEFÍCIO. COMPROVAÇÃO. DEFERIMENTO. 1. A assistência judiciária constitui um benefício assegurado às partes que demonstrem a insuficiência de recursos para o pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios. 2. O § 3º do art. 99 do CPC/15 estabelece presunção relativa à alegação de hipossuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural, podendo o magistrado afastá-la, independente de manifestação da parte contrária, se, diante do caso concreto, verificar a possibilidade de a parte arcar com o pagamento das verbas processuais. 3. A simples existência de bens móveis ou imóveis no nome do beneficiário não obsta a concessão da gratuidade de justiça. Precedentes do TJDFT. 4. Demonstrado nos autos que o Apelante aufere renda mensal módica, é isento de imposto de renda e que a propriedade do imóvel, por si só, não é suficiente para afastar a gratuidade de justiça, impõe-se reconhecer que ele não possui condições de arcar com as custas processuais, razão pela qual lhe deve ser concedido o benefício. 5 . Apelação conhecida e provida. (TJ-DF 07006057320238070018 1725081, Relator.: Robson Teixeira de Freitas, Data de Julgamento: 04/07/2023, 8ª Turma Cível, Data de Publicação: 14/07/2023) Diante disso, ausente prova concreta que infirme a presunção legal de veracidade da alegação de hipossuficiência, e considerando que a titularidade de imóvel financiado para fins residenciais não constitui, por si só, elemento hábil a afastar o benefício, mantenho a gratuidade de justiça anteriormente deferida à parte autora. Tal decisão encontra respaldo nos princípios constitucionais do acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal) e da dignidade da pessoa humana. Da preliminar de ilegitimidade passiva Primeiramente, passo a analisar a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela requerida MT Cereais e Rações Eireli. A legitimidade passiva configura-se quando há pertinência subjetiva entre o sujeito e a relação jurídica discutida, sendo necessário que a parte figure como sujeito da relação jurídica controvertida. No caso em exame, a autora fundamenta sua pretensão na alegação de que a requerida MT Cereais teria adquirido indevidamente os bens objeto do contrato rescindido e estaria utilizando irregularmente a marca "Rações Casablanca". Contudo, da análise dos autos, verifica-se que a relação jurídica originária estabeleceu-se exclusivamente entre a autora (vendedora) e o requerido Paulo da Silva Sanches (comprador). A rescisão contratual por inadimplemento gera efeitos apenas entre os contratantes originários. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL E REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CESSÃO DE DIREITOS DE IMÓVEL. INADIMPLEMENTO. ASSISTENTE LITISCONSORCIAL. NOTÍCIA DA AQUISIÇÃO DOS DIREITOS DO IMÓVEL POR NOVA CESSÃO. TERCEIRO DE BOA-FÉ. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. NÃO CABIMENTO. APURAÇÃO DE PERDAS E DANOS. SENTENÇA MANTIDA. 1. O terceiro de boa-fé que adquire imóvel, por meio de contrato de compra e venda de cessão de direitos, não tem obrigação de ter ciência quanto ao inadimplemento mantido na relação negocial que antecedeu à aquisição por ele levada a efeito. 2. Na ausência de prova cabal de conluio entre o comprador inadimplente e o terceiro de boa-fé que adquiriu o imóvel, inviável a reintegração de posse pretendida pelo vendedor originário. 3. Sendo o terceiro adquirente de boa-fé, a solução viável ao credor originário é aquela prevista na parte final do art. 475 do Código Civil, pela qual o contrato deve ser resolvido em perdas e danos. 4 . Apelação não provida. (TJ-DF 00046687120168070005 DF 0004668-71.2016.8 .07.0005, Relator.: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de Julgamento: 20/06/2018, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 30/07/2018. Pág.: Sem Página Cadastrada .) A eventual aquisição de bens pela MT Cereais de terceiro (Paulo da Silva Sanches) constitui negócio jurídico autônomo e independente, não havendo demonstração nos autos de que tal aquisição tenha ocorrido com conhecimento da origem viciosa dos bens ou em conluio fraudulento. O simples fato de a empresa ter adquirido bens de Paulo da Silva Sanches não a torna automaticamente responsável pelas obrigações decorrentes do contrato original entre a autora e aquele, mormente quando não há prova de má-fé ou conhecimento do vício. Ademais, no que tange ao uso da marca "Rações Casablanca", a requerida demonstrou que cessou tal utilização após notificação extrajudicial, evidenciando ausência de dolo ou persistência na conduta questionada. Dessa forma, não ficou caracterizada a pertinência subjetiva entre a MT Cereais e a relação jurídica originária discutida, motivo pelo qual acolho a preliminar de ilegitimidade passiva, determinando sua exclusão do polo passivo da demanda. Sendo assim condeno o requerente ao pagamento dos honorários advocatícios em favor da requerida MT Cereais e Rações Eireli que fixo no valor de 10% sobre o valor da causa, atento à natureza e importância da causa, o local da prestação do serviço, o grau do zelo profissional e o tempo em que a demanda se processou (CPC - §2º, art. 85), cuja exigibilidade fica suspensa em virtude de ser beneficiário da justiça gratuita. Da revelia Primeiramente, verifica-se que o requerido Paulo da Silva Sanches se manteve inerte apesar de ter sido devidamente citado (ID 64460756), fato este que caracteriza a sua revelia. Assim, decreto a revelia do requerido para que surta seus efeitos e passo ao julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, inciso II, do Código de Processo Civil. Esclarece o artigo 373, do Código de Processo Civil, que o ônus da prova incumbe: “I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor”. Nesse ensejo, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitiero, in Novo Código de Processo Civil Comentado, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 394/395, prescrevem: “o art. 373, caput, CPC, distribui o ônus da prova de acordo com a natureza da alegação de fato a provar: ao autor cumpre provar a alegação que concerne ao fato constitutivo do direito por ele afirmado; ao réu, a alegação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito afirmado pelo autor. As partes têm o ônus de alegar e o ônus de provar conforme nosso CPC. A atribuição do ônus da prova no direito brasileiro é realizada de maneira fixa pela nossa legislação”. Logo, a demandante é necessária a apresentação da prova pertinente às alegações e ao requerido os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor. Ressalta-se que o caso em questão não trata de fato notório, que dispensa prova para que seja aceito como verdadeiro. Por força da revelia, incumbe-se exclusivamente a este juízo avaliar se os fatos narrados nos autos condizem às consequências jurídicas descritas e pretendidas pela parte requerente, analisando a viabilidade do direito deduzido e o conjunto probatório constante, porquanto a presunção de veracidade é relativa, podendo sucumbir diante de outras circunstâncias dos autos. Do mérito Trata-se de ação de indenização por uso indevido de marca, cumulada com pedido de medida cautelar de busca e apreensão de bens móveis, indenização por danos materiais e morais, perdas e danos e reconhecimento de enriquecimento ilícito, ajuizada por Grazielle Cristina Mesquita, representada por Ernesto Manoel da Mata, em face de Paulo da Silva Sanches e MT Cereais e Rações EIRELI. Em análise ao contrato de compra e venda de estabelecimento comercial firmado entre Ernesto Manoel da Mata, Grazielle Cristina Mesquita e Paulo da Silva Sanches, de ID 29728816, no valor de R$ 637.500,00, observa-se que o negócio jurídico consistiu na alienação de bens móveis integrantes da unidade produtiva, tais como máquinas e equipamentos utilizados na fabricação de rações, bem como o direito ao uso da marca “Rações Casablanca”. Nos termos pactuados, a aquisição seria quitada por meio de pagamento parcelado, ficando estipulado que, em caso de inadimplemento, o contrato seria rescindido, com a consequente restituição dos bens e da marca à vendedora, conforme estipulação expressa na cláusula nona. Posteriormente, em razão do inadimplemento do comprador, foi firmado instrumento particular de rescisão contratual (ID 29728802), no qual as partes reconheceram a extinção do contrato de compra e venda por descumprimento das obrigações assumidas por Paulo da Silva Sanches. O distrato expressamente declarou rescindido o vínculo negocial firmado em 19 de novembro de 2008, determinando-se a restituição integral do estabelecimento comercial, incluindo o fundo de comércio, estoque, utensílios, móveis, equipamentos, máquinas, instalações, e o direito ao uso do nome fantasia “Rações Casablanca”, aos vendedores Grazielle Cristina Mesquita e Ernesto Manoel da Mata. No mesmo documento, consignou-se que nada mais restava a exigir entre as partes, exceto o cumprimento integral das cláusulas de devolução dos bens e direitos à parte vendedora, formalizando, assim, o encerramento da relação contratual com fundamento no inadimplemento contratual. Porém, o que se observa é que o requerido Paulo da Silva Sanches não restituiu os bens objeto do contrato rescindido e, ao revés, alienou indevidamente tais bens a terceiros, como se seus fossem, inclusive continuando a utilizar a marca “Rações Casablanca”, apesar de saber que seu direito de uso havia cessado com o distrato. A revelia do réu Paulo faz incidir os efeitos do art. 344 do Código de Processo Civil, presumindo-se verdadeiros os fatos narrados pela autora, especialmente a não devolução dos bens e o uso indevido da marca após a rescisão formal do contrato. Tal conduta configura manifesto abuso de direito, contrariando os princípios da boa-fé objetiva e da função social dos contratos, previstos nos artigos 421 e 422 do Código Civil. Ademais, o uso indevido da marca registrada por terceiro sem autorização legítima caracteriza violação ao direito de propriedade industrial e à identidade empresarial da autora, amparada pelos artigos 129 e 130 da Lei nº 9.279/96 (Lei da Propriedade Industrial). A ausência de devolução dos bens móveis alienados, bem como a apropriação indevida do direito ao uso da marca — após sua revogação por distrato firmado entre as partes —, configura, ainda, ato ilícito nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil, autorizando a responsabilização do réu pelos danos materiais decorrentes da indevida alienação e pelo enriquecimento ilícito obtido à custa da autora, violando o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa (art. 884, CC). Por conseguinte, o pedido de indenização, além de juridicamente cabível, revela-se necessário para recompor o patrimônio lesado da autora, diante da indevida apropriação de bens e direitos de sua titularidade, cuja restituição foi expressamente prevista e descumprida pelo requerido. Do dano material No que tange aos danos materiais, observa-se que o valor de R$ 637.500,00 representa o montante integral do contrato de compra e venda celebrado entre as partes, posteriormente rescindido por inadimplemento do requerido. Trata-se, portanto, de valor que deve ser restituído à autora, conforme previsto expressamente no instrumento de distrato (ID 29728802), não se tratando de pedido indenizatório propriamente dito, mas de devolução do que foi pago, em decorrência da inexecução contratual. A ausência de restituição dos bens e direitos transferidos, conforme pactuado, enseja enriquecimento sem causa, vedado pelo ordenamento jurídico (art. 884, do Código Civil). Do dano moral Quanto ao pedido de indenização por danos morais, apesar de ser juridicamente possível sua concessão a pessoas jurídicas, nos casos em que há comprovação de violação à honra objetiva, imagem institucional ou reputação no mercado (art. 52, do Código Civil), entendo que os elementos constantes dos autos não são suficientes para configurar lesão de tal natureza. A propósito: (...) DANO MATERIAL. PERDA EMERGENTE COMPROVADA. SIMPLES DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. MERO ABORRECIMENTO. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Os danos materiais podem ser subclassificados em danos emergentes (o que efetivamente se perdeu) ou lucros cessantes (o que razoavelmente se deixou de lucrar). Danos materiais na modalidade de perda emergente comprovados por meio de documento (comprovantes de pagamento de parcelas). 2. O simples descumprimento contratual, embora caracterize conduta ilícita, por si só, não configura dano moral, pois não tem o condão de macular a imagem do consumidor e de gerar sentimentos indesejados. 3. Recurso conhecido e parcialmente provido. 4. Sem custas e honorários advocatícios. (...) (TJ-MT - RECURSO INOMINADO: 1046467-05.2021.8.11 .0001, Relator.: HILDEBRANDO DA COSTA MARQUES, Data de Julgamento: 19/02/2024, Terceira Turma Recursal, Data de Publicação: 27/02/2024) A controvérsia decorre essencialmente do inadimplemento contratual e da não restituição dos bens objeto do ajuste, conduta que, embora reprovável, não se mostra, por si só, apta a atingir a esfera extrapatrimonial da autora de forma a justificar reparação por dano moral. Trata-se de situação que se insere no âmbito da responsabilidade contratual e patrimonial, não havendo nos autos elementos concretos que demonstrem prejuízo à imagem ou reputação da empresa perante terceiros. Dos lucros cessantes No que tange ao pedido de indenização por perdas e danos no valor de R$ 1.120.000,00, a pretensão não pode ser acolhida. Os lucros cessantes, diferentemente dos danos emergentes, não se presumem, devendo ser comprovados de forma objetiva e concreta, conforme preconiza o artigo 402 do Código Civil. Trata-se de indenização por aquilo que razoavelmente a parte deixou de auferir, sendo imprescindível a demonstração da efetiva frustração de receitas projetadas com base em elementos contábeis ou financeiros idôneos. No presente caso, a parte autora não colacionou aos autos documentos contábeis que evidenciem o desempenho financeiro da empresa, tampouco apresentou balanços patrimoniais, demonstrativos de resultados ou relatórios que indiquem sua regular operação e lucratividade antes ou depois da rescisão contratual. Não foi demonstrado, de forma concreta, que a empresa estava em funcionamento, com atividade produtiva ou expectativa real de faturamento a ser frustrada em decorrência da conduta do requerido. A ausência de tais elementos impede a apuração dos lucros cessantes de maneira segura, o que inviabiliza a condenação com base apenas em estimativas unilaterais ou em presunções genéricas de prejuízo. A indenização por lucros cessantes exige prova do nexo de causalidade entre a conduta ilícita e a frustração econômica da parte, o que não se verificou no caso concreto. Assim, ausente a prova mínima do prejuízo alegado, impõe-se o não acolhimento do pedido indenizatório sob esse fundamento. Do dispositivo Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados por Grazielle Cristina Mesquita, representada por Ernesto Manoel da Mata, em face de Paulo da Silva Sanches, para o fim de reconhecer o uso indevido da marca “Rações Casablanca” e a indevida apropriação dos bens vinculados ao contrato rescindido. Por conseguinte, condeno o requerido Paulo da Silva Sanches ao pagamento de R$ 637.500,00 (seiscentos e trinta e sete mil e quinhentos reais), a título de restituição por danos materiais, que deverá ser corrigido monetariamente pelo IPCA desde a data da resolução do contrato, acrescido de juros pela taxa Selic, a partir da citação. Ainda, determino que o requerido se abstenha de utilizar a marca “Rações Casablanca”, sob pena de multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia de descumprimento, limitada a 60 (sessenta) dias, valor que poderá ser revisto caso se mostre excessivo ou ineficaz, nos termos do art. 536, §1º, do CPC. Por conseguinte, resolvo o mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC. Condeno o requerido Paulo da Silva Sanches ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. LUIS OTÁVIO PEREIRA MARQUES Juiz de Direito

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