Processo nº 5012389-14.2023.8.24.0023
ID: 337006692
Tribunal: TJSC
Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5012389-14.2023.8.24.0023
Data de Disponibilização:
29/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JÚLIO CESAR GOULART LANES
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5012389-14.2023.8.24.0023/SC
APELANTE
: GLOBAL DISTRIBUICAO DE BENS DE CONSUMO LTDA. (IMPETRANTE)
ADVOGADO(A)
: JÚLIO CESAR GOULART LANES (OAB SC024166)
DESPACHO/DECISÃO
Global Distribui…
Apelação Nº 5012389-14.2023.8.24.0023/SC
APELANTE
: GLOBAL DISTRIBUICAO DE BENS DE CONSUMO LTDA. (IMPETRANTE)
ADVOGADO(A)
: JÚLIO CESAR GOULART LANES (OAB SC024166)
DESPACHO/DECISÃO
Global Distribuição de Bens de Consumo Ltda. impetrou
Mandado de Segurança
contra ato dito coator praticado pelo Gerente de Fiscalização da Diretoria de Administração Tributária da Secretaria de Fazenda do Estado de Santa Catarina, objetivando, em síntese, o reconhecimento do direito líquido e certo de não recolher o ICMS-DIFAL enquanto não implementado portal para tanto, nos termos do art. 24-A da Lei Complementar n. 190/2022. Defendeu que o Portal DIFAL, nos moldes como existente à época de impetração do
writ
, era
"um mero site com um apanhado de informações desatualizadas e desconectadas, que em nada se assemelha a uma ferramenta de apuração centralizada"
. Requereu a concessão da segurança, a fim de que não seja obrigada a recolher o ICMS-DIFAL até que seja disponibilizada plataforma adequada e que seja editada lei, no âmbito do Estado de Santa Catarina, a respeito do referido tributo (
evento 1, INIC1
, EP1G).
Instado, o Estado de Santa Catarina prestou informações (
evento 29, PET1
, EP1G). Preliminarmente, suscitou a inadequação da via eleita, diante da impugnação de leio em tese e ausência de conduta imputável à autoridade coatora. No mérito, defendeu que
"a entrada em vigor da Lei Complementar nº 190/2022 autoriza a imediata produção de efeitos da Lei Estadual n. 16.853/2015".
Sustentou que a cobrança do ICMS-DIFAL deve observar tão somente a anterioridade nonagesimal. Requereu, portanto, a denegação da ordem.
O Ministério Público manifestou-se pela desnecessidade de intervenção (
evento 32, PROMOÇÃO1
, EP1G).
Sobreveio sentença, nos seguintes termos (
evento 143, SENT1
, EP1G):
"[...] Ante do exposto,
DENEGO A SEGURANÇA
pleiteada, julgando
improcedentes
os pedidos formulados na inicial, nos termos do art. 487, inc. I , do CPC.
Sem condenação em honorários advocatícios, consoante art. 25 da Lei n. 12.016/2009 e enunciados sumulares 512 do STF e 105 do STJ.
Custas, pela parte impetrante.
Eventuais valores em subconta, intime-se o Estado de Santa Catarina para informar dados bancários em 15 dias. Após o trânsito, expeça-se o alvará.
Sentença não sujeita a reexame necessário.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. [...]"
Opostos aclaratórios (
evento 152, EMBDECL1
, EP1G), foram rejeitados (
evento 173, SENT1
, EP1G).
Irresignada, a Impetrante interpôs recurso de
Apelação
(
evento 185, APELAÇÃO1
, EP1G). Preliminarmente, aventa a prolação de sentença
extra petita,
já que, além de inexistente apreciação da tese fundamental levantada na peça inaugural, houve decisão acerca de matéria alheia à causa de pedir e ao pedido por si formulado. No mérito, reitera que o Portal DIFAL não preenche os requisitos previstos no art. 24-A da Lei Complementar n. 90/2022, condição intrínseca à possibilidade de cobrança do ICMS-DIFAL. Defende que
"somente depois do primeiro dia útil terceiro mês a contar a criação do Portal do DIFAL – frisa-se: desde que cumpridos os requisitos previstos na LC 190/22, inclusive a existência de uma 'ferramenta que permita a apuração centralizada do imposto' e 'emissão das guias de recolhimento' – o DIFAL passa a ser devido"
. Requer o reconhecimento da nulidade da sentença e, no mérito, a sua reforma integral, a fim de que seja concedida a ordem.
Com contrarrazões (
evento 192, CONTRAZ1
, EP1G), os autos ascenderam a esta Corte.
Pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça lavrou o parecer o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Paulo Cezar Ramos de Oliveira, manifestando-se pela desnecessidade de intervenção (
evento 6, PARECER1
, EP2G).
É o relatório.
Decido.
1. Da admissibilidade
Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.
2. Do recurso
Trata-se de Apelação interposta por Global Distribuição de Bens de Consumo Ltda. em face da sentença que, nos autos do
Mandado de Segurança
impetrado contra ato dito coator praticado pelo Gerente de Fiscalização da Diretoria de Administração Tributária da Secretaria de Fazenda do Estado de Santa Catarina, denegou a ordem postulada.
Pois bem.
Não obstante suscite a Recorrente ter havido julgamento
"extra petita"
, na verdade, manifesto que aquele foi "
citra petita"
, posto que deixou de analisar, todas as teses/pedidos apresentados.
Explico.
Na origem, cuida-se de Mandado de Segurança em que se postula o reconhecimento do direito líquido e certo de não recolher o ICMS-DIFAL enquanto não houver a devida implementação do Portal DIFAL, nos termos do art. 24-A da Lei Complementar n. 90/2022.
Extrai-se de trecho da petição inicial (
evento 1, INIC1
, EP1G):
[...] Ou seja, não basta disponibilizar qualquer site para que sejam cumpridos os critérios e exigência do art. 24-A da LC 190/22. Caso contrário, estar-se-ia admitindo a retirada, indevidamente e por mero ato administrativo, da eficácia daquele dispositivo da Lei Complementar.
Trata-se aqui de uma norma de eficácia limitada, isto é, toda a nova disciplina do DIFAL dada pela LC 190/22 não produzirá efeitos, enquanto não existir uma
"ferramenta que permita a apuração centralizada do imposto" e "emissão das guias de recolhimento".
O cumprimento integral de todos os requisitos do Portal do DIFAL, previsto no art. 24-A da LC 190/22, inclusive a ferramenta de centralização da apuração e emissão de guias de DIFAL em um só ambiente é condição de validade da própria cobrança do DIFAL.
Por essas razões, a cobrança do DIFAL é indevida neste Estado, no período anterior à disponibilização pelos Estados de um Portal que atenda o art. 24-A da LC 190/22 em sua integralidade. [...]
Com base em tais fundamentos, a Apelante/Impetrante formulou os seus pedidos:
[...] (d) ao final, seja CONCEDIDA A SEGURANÇA para assegurar às IMPETRANTES o direito de, sem ficarem sujeita à imposição de qualquer sanção, penalidade, restrição ou limitação de direitos, não serem obrigadas as recolher o DIFAL ao ESTADO DE SANTA CATARINA, relativamente às operações interestaduais envolvendo as vendas ou as remessas de mercadorias aos consumidores finais não contribuintes de ICMS situados no ESTADO DE SANTA CATARINA (já ocorridas ou que venham a ocorrer) até que sejam atendidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:
1) a disponibilização de uma ferramenta de apuração centralizada e de emissão de guias de recolhimento do DIFAL, no Portal Nacional do DIFAL, instituído pelo Convênio CONFAZ 235/2021, de modo a permitir que as IMPETRANTES possam apurar, de maneira centralizada, os seus débitos de DIFAL, e emitir as respectivas guias de recolhimento do DIFAL em relação a todas as unidades federativas por meio dessa ferramenta centralizada, respeitado o prazo de cobrança de que trata o parágrafo quarto do art. 24-A da LC 87/1996, em sua redação dada pela LC 190/2022;
2) a vigência de uma nova lei neste Estado a respeito do DIFAL, em conformidade com a nova lei complementar sobre o mesmo tema, sem os vícios acima apontados, respeitando-se os princípios da anterioridade de exercício e da anterioridade nonagesimal; e [...] (g.n.)
A sentença, contudo, foi proferida nos seguintes termos (
evento 143, SENT1
, EP1G):
[...] A Emenda Constitucional n. 87/2015 alterou o art. 155, II, § 2º, VII e VIII, da Constituição da República, para permitir a cobrança do diferencial de alíquota de ICMS [DIFAL] nas operações de venda a consumidores finais não contribuintes do imposto:
VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015)
Após, adveio a Lei Estadual n. 16.853/2015, que implementou a cobrança do Difal no âmbito do Estado de Santa Catarina.
O augusto STF ao julgar o TEMA 1.093 entendeu que a cobrança DIFAL necessita de regulamentação por
Lei Complementar Federal,
sendo insuficiente a edição de lei estadual:
TEMA 1093 A cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais.
Posteriormente, foi editada a
Lei Complementar Federal
n. 190/2022, a qual entrou em vigor em 05.01.2022, com a previsão de observância da noventena [art. 3º],
possibilitando a efetiva cobrança do DIFAL a partir de 05.04.2022:
“Art. 24-A. Os Estados e o Distrito Federal divulgarão, em portal próprio, as informações necessárias ao cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, nas operações e prestações interestaduais, conforme o tipo.
§ 1º O portal de que trata o caput deste artigo deverá conter, inclusive:
I - a legislação aplicável à operação ou prestação específica, incluídas soluções de consulta e decisões em processo administrativo fiscal de caráter vinculante;
II - as alíquotas interestadual e interna aplicáveis à operação ou prestação;
III - as informações sobre benefícios fiscais ou financeiros e regimes especiais que possam alterar o valor a ser recolhido do imposto; e
IV - as obrigações acessórias a serem cumpridas em razão da operação ou prestação realizada.
§ 2º O portal referido no caput deste artigo conterá ferramenta que permita a apuração centralizada do imposto pelo contribuinte definido no inciso II do § 2º do art. 4º desta Lei Complementar, e a emissão das guias de recolhimento, para cada ente da Federação, da diferença entre a alíquota interna do Estado de destino e a alíquota interestadual da operação.
§ 3º Para o cumprimento da obrigação principal e da acessória disposta no § 2º deste artigo, os Estados e o Distrito Federal definirão em conjunto os critérios técnicos necessários para a integração e a unificação dos portais das respectivas secretarias de fazenda dos Estados e do Distrito Federal.
§ 4º Para a adaptação tecnológica do contribuinte, o inciso II do § 2º do art. 4º, a alínea “b” do inciso V do caput do art. 11 e o inciso XVI do caput do art. 12 desta Lei Complementar somente produzirão efeito no primeiro dia útil do terceiro mês subsequente ao da disponibilização do portal de que trata o caput deste artigo.
§ 5º A apuração e o recolhimento do imposto devido nas operações e prestações interestaduais de que trata a alínea “b” do inciso V do caput do art. 11 desta Lei Complementar observarão o definido em convênio celebrado nos termos da Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975, e, naquilo que não lhe for contrário, nas respectivas legislações tributárias estaduais.”
Art. 2º Fica revogada a alínea “c” do inciso II do caput do art. 11 da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir).
Art. 3º Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação, observado, quanto à produção de efeitos, o disposto na alínea “c” do inciso III do caput do art. 150 da Constituição Federal.
O Estado SC disponibilizou o Portal do DIFAL através do site
"https://dfeportal.svrs.rs.gov.br/Difal/"
Ato contínuo, foi ajuizada ADI n. 7.066, julgada improcedente pelo STF, confirmando a constitucionalidade do art. 3º da Lei Complementar Federal n. 190/2022, estipulou que a cobrança da DIFAL
está sujeita apenas ao princípio da noventena, sem necessidade de observar o princípio da anterioridade anual.
CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. ICMS. COBRANÇA DO DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA NAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS QUE DESTINEM BENS E SERVIÇOS A CONSUMIDOR FINAL NÃO CONTRIBUINTE DO IMPOSTO. EMENDA CONSTITUCIONAL 87/2015. LEI COMPLEMENTAR 190/2022. INEXISTÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA OU DA BASE DE CÁLCULO. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE. LIMITAÇÃO AO PODER DE TRIBUTAR CIRCUNSCRITA ÀS HIPÓTESES DE INSITUIÇÃO OU MAJORAÇÃO DE TRIBUTOS. PRECEDENTES DESTE SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ART. 3º DA LC 190/2022. REMISSÃO DIRETA AO PRECEITO INSCRITO NO ART. 150, III, “B”, CF. CONSTITUCIONALIDADE. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO
1. A EC 87/2015 e a LC 190/2022 estenderam a sistemática de aplicação do diferencial de alíquota do ICMS em operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final contribuinte para as operações destinadas a não contribuintes, atribuindo capacidade tributária ativa a outro ente político, sem modificar a hipótese de incidência ou a base de cálculo do tributo.
2. A ampliação da técnica fiscal não afetou a esfera jurídica do contribuinte, limitando-se a fracionar o produto da arrecadação antes devido integralmente ao Estado produtor (alíquota interna) em duas parcelas devidas a entes diversos. Portanto, não corresponde à instituição nem majoração de tributo e, por isso mesmo, não atrai a incidência das regras relativas à anterioridade (CF, art. 150, III, b e c).
3. O art. 3º da LC 190/2022 condicionou a produção dos efeitos do referido diploma legislativo à observância do disposto na alínea c do inciso III do caput do art. 150 da Constituição Federal (anterioridade nonagesimal), o que corresponde ao estabelecimento de vacatio legis de noventa dias.
4. A regra inscrita no art. 24-A, § 4º, da LC 87/1996, incluído pela LC 190/2022 não caracteriza comportamento excessivo do legislador, pois visa apenas a conceder prazo hábil para a adaptação operacional e tecnológica por parte do contribuinte.
5. Ações Diretas julgadas improcedentes
Desta forma, a Lei Complementar Federal n. 190/2022 tornou possível a cobrança do ICMS DIFAL a partir de 05.04.2022. Não bastasse isso, na ADI 7.066 o STF declarou a constitucionalidade da cobrança e
vacatio legis
de noventa dias/anterioridade nonagesimal.
Por fim, sublinho que os processos
ajuizados após
a data do julgamento do TEMA 1.093 do STF (em 24/2/2021) não estão abrangidos pela modulação dos efeitos fixados pelo Supremo. [...] (g.n.)
Não obstante tenha sido delimitado o marco inicial da cobrança do ICMS-DIFAL, não houve análise pelo Juízo de origem, a respeito da tese/pedido envolvendo a implementação do portal como condição para a cobrança do tributo, tendo em vista que a decisão objurgada limitou-se a consignar que
"O Estado SC disponibilizou o Portal do DIFAL através do site "https://dfeportal.svrs.rs.gov.br/Difal/",
sem abordar a temática.
Entretanto,
descabido o reconhecimento da nulidade integral da sentença, devendo apenas, ser suprida a omissão,
nos termos do disposto no artigo 1.013, § 3º, inciso III, do CPC/15.
Neste sentido, é de minha Relatoria:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ALÍQUOTA DE ICMS INCIDENTE SOBRE FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA AUTORA.
NULIDADE DA SENTENÇA, EM DECORRÊNCIA DO JULGAMENTO
EXTRA PETITA. PARCIAL ACOLHIMENTO. DECISÃO NA VERDADE, CITRA PETITA. AUSÊNCIA DE ANÁLISE DE TODAS AS TESES/PEDIDOS APRESENTADOS NA PEÇA PORTAL. MERO SUPRIMENTO DA OMISSÃO. EXEGESE DO ART. 1.013, § 3°, INCISO III, DO CPC/2015.
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO E NÃO INCIDÊNCIA DA MODULAÇÃO DOS EFEITOS DO TEMA 745/STF, EM DECORRÊNCIA DE ANTERIOR IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA. TESE INSUBSISTENTE. AUTORA QUE FORMULOU PEDIDO DE DESISTÊNCIA DO MANDAMUS, ANTES QUE FOSSE REALIZADA A NOTIFICAÇÃO DA AUTORIDADE COATORA. PRESCRIÇÃO QUE SÓ SE INTERROMPE, COM A CITAÇÃO VÁLIDA (NO CASO, NOTIFICAÇÃO). EXEGESE DO ARTIGO 240 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA QUE NÃO SURTIU OS EFEITOS INVOCADOS.
IMPOSSIBILIDADE DE ADOÇÃO DE ALÍQUOTA DE ICMS SUPERIOR, ÀQUELA QUE ONERA AS OPERAÇÕES EM GERAL. AFASTAMENTO. TESE JURÍDICA RECONHECIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, MAS COM MODULAÇÃO DOS EFEITOS. APLICAÇÃO SOMENTE A PARTIR DO EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2024, RESSALVADAS AS AÇÕES PROPOSTAS ATÉ 05.02.2021. DEFLAGRAÇÃO DA DEMANDA, APÓS O REFERIDO MARCO TEMPORAL. IMPROCEDÊNCIA QUE DEVE SER MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, TÃO SÓ PARA SUPRIR OMISSÃO DA SENTENÇA. (Apelação n. 5055799-59.2022.8.24.0023, Terceira Câmara de Direito Público. Data do julgamento: 13.12.2022) (g.n.)
Assim, passa-se à análise do mérito da questão.
Postula a Apelante/Impetrante, em síntese, que o Portal DIFAL não preenche os requisitos previstos no art. 24-A da Lei Complementar n. 90/2022, condição intrínseca à possibilidade de cobrança do ICMS-DIFAL. Ainda, sustenta a impossibilidade de conversão dos depósitos em renda, diante da inexistência de trânsito em julgado da sentença que a determinou.
Razão, adianta-se, não lhe assiste.
Primeiramente, extrai-se da redação original da Constituição Federal, no que concerne ao ICMS-DIFAL:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: [...]
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; [...]
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: [...]
VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:
a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto;
b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;
VIII - na hipótese da alínea "a" do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual; [...]
A partir da EC n. 87/2017, foi conferida nova redação ao dispositivo:
VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual; [...]
VIII - a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída:
a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto;
b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto;
O Supremo Tribunal Federal, ao se manifestar acerca da temática, assentou a necessidade de edição de lei complementar para o fim de efetiva instituição do tributo:
"A cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais"
(Tema 1.093).
Importa ressaltar que o recolhimento do diferencial de alíquotas pelos consumidores finais contribuintes já era disciplinado pela redação original do art. 155 da Constituição Federal, pela Lei Kandir (Lei Complementar n. 87/1996) e, em Santa Catarina, pela Lei Complementar n. 10.297/1996.
Com o advento da Lei Complementar n. 190/2022, restou regulamentada a
"cobrança do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto"
, bem como prevista a criação do Portal-DIFAL:
Art. 24-A. Os Estados e o Distrito Federal divulgarão, em portal próprio, as informações necessárias ao cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, nas operações e prestações interestaduais, conforme o tipo.
§ 1º O portal de que trata o caput deste artigo deverá conter, inclusive:
I - a legislação aplicável à operação ou prestação específica, incluídas soluções de consulta e decisões em processo administrativo fiscal de caráter vinculante;
II - as alíquotas interestadual e interna aplicáveis à operação ou prestação;
III - as informações sobre benefícios fiscais ou financeiros e regimes especiais que possam alterar o valor a ser recolhido do imposto; e
IV - as obrigações acessórias a serem cumpridas em razão da operação ou prestação realizada.
§ 2º O portal referido no caput deste artigo conterá ferramenta que permita a apuração centralizada do imposto pelo contribuinte definido no inciso II do § 2º do art. 4º desta Lei Complementar, e a emissão das guias de recolhimento, para cada ente da Federação, da diferença entre a alíquota interna do Estado de destino e a alíquota interestadual da operação.
§ 3º Para o cumprimento da obrigação principal e da acessória disposta no § 2º deste artigo, os Estados e o Distrito Federal definirão em conjunto os critérios técnicos necessários para a integração e a unificação dos portais das respectivas secretarias de fazenda dos Estados e do Distrito Federal.
§ 4º Para a adaptação tecnológica do contribuinte, o inciso II do § 2º do art. 4º, a alínea “b” do inciso V do caput do art. 11 e o inciso XVI do caput do art. 12 desta Lei Complementar somente produzirão efeito no primeiro dia útil do terceiro mês subsequente ao da disponibilização do portal de que trata o caput deste artigo.
§ 5º A apuração e o recolhimento do imposto devido nas operações e prestações interestaduais de que trata a alínea “b” do inciso V do caput do art. 11 desta Lei Complementar observarão o definido em convênio celebrado nos termos da Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975, e, naquilo que não lhe for contrário, nas respectivas legislações tributárias estaduais.
Observa-se que a norma mencionada determinou a criação do Portal do DIFAL, exigência devidamente observada pelo Estado de Santa Catarina. No entanto, em nenhum momento essa norma estabeleceu que a implantação do referido portal seria condição para a exigência do Diferencial de Alíquotas (DIFAL) nas operações destinadas a consumidor final não contribuinte do ICMS. Assim, embora a criação e o funcionamento do portal sejam relevantes, não constituem requisitos para a constituição do crédito tributário.
Além disso, ainda que a Apelante/Impetrante alegue falhas na funcionalidade da plataforma, não foi comprovado que tais deficiências comprometam a apuração ou o recolhimento do tributo. Dessa forma, eventuais falhas na implementação do Portal do DIFAL não são suficientes para impedir a atuação fiscal da Fazenda Estadual.
De todo modo, evidente que a implementação de novas tecnologias, quando ainda em estado incipiente de desenvolvimento, demandam aprimoramento técnico, mormente quando utilizadas pro elevado número de usuários e programada para o exercício de atividades complexas, sem que isso configure causa de inexigibilidade do tributo.
E, inclusive, "
ainda que fosse inexistente um Portal nacional da DIFAL com as informações para o contribuinte emitir os documentos fiscais necessários para o cumprimento de sua obrigação tributária, tal não impede a cobrança da DIFAL de ICMS a partir do início dos efeitos da Lei Complementar n. 190/2022
e da legislação estadual pertinente
" (TJSC, Apelação n. 5019197-35.2023.8.24.0023, Terceira Câmara de Direito Público, Rel. Des. Jaime Ramos. Data do julgamento: 25.03.2025).
Isso porque, reitera-se, a Lei Complementar n. 190/2022 jamais atribuiu à implementação do referido portal, condicionante para a exigibilidade do tributo. Evidentemente que seu efetivo funcionamento representa mecanismo facilitador do adimplemento das obrigações tributárias pelos contribuintes, mas jamais poderia constituir hipótese para o não pagamento.
A jurisprudência desta Corte não destoa:
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO. ART. 1.021, DO CPC.
MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO EM 23/03/2023, CONTRA ATO TIDO COMO ABUSIVO E ILEGAL IMPUTADO AO GERENTE DE FISCALIZAÇÃO DA DIRETORIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA SECRETARIA DA FAZENDA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. VALOR ATRIBUÍDO À CAUSA: R$ 50.000,00.
OBJETIVADO RECONHECIMENTO DA INEXIGIBILIDADE DO DIFAL-DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA DO ICMS, SOB ALEGADA INEXISTÊNCIA DE PORTAL ELETRÔNICO ADEQUADO.
VEREDICTO DENEGANDO A ORDEM POSTULADA.
JULGADO MONOCRÁTICO QUE NEGOU PROVIMENTO À APELAÇÃO INTERPOSTA PELA SOCIEDADE EMPRESÁRIA IMPETRANTE.
INCONFORMISMO DE AMARO FASHION LTDA.
APONTADA DESOBRIGAÇÃO DE RECOLHIMENTO DO DIFAL, ENQUANTO NÃO DISPONIBILIZADO PORTAL CONDIZENTE COM OS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 24-A DA LEI COMPLEMENTAR N. 190/2022.
ESPECULAÇÃO FRÍVOLA. ESCOPO MALSUCEDIDO.
PLATAFORMA CENTRALIZADA ACESSÓRIA PARA FACILITAR A APURAÇÃO DO TRIBUTO.
EXIGIBILIDADE DO IMPOSTO QUE NÃO ESTÁ CONDICIONADA À PLENA IMPLEMENTAÇÃO DA FERRAMENTA TECNOLÓGICA COMPLETIVA.
ADEMAIS, POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE OUTROS MEIOS PARA CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA.
PROLOGAIS.
"Não há falar em inexigibilidade do ICMS/DIFAL, no âmbito das operações interestaduais envolvendo as vendas ou as remessas de mercadorias aos consumidores finais não contribuintes de ICMS situados no Estado de Santa Catarina, porquanto o art. 24-A da Lei Complementar n. 190/2022 não condicionou a cobrança do tributo à plena implantação do Portal Nacional do DIFAL e, ademais, a ferramenta disponibilizada a partir do Convênio ICMS n. 235/2021, do CONFAZ, permite a apuração centralizada do imposto e a emissão das guias de recolhimento" (TJSC, Apelação Cível n. 5013996-62.2023.8.24.0023, rela. Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. em 03/04/2025).
APONTADA IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DOS DEPÓSITOS JUDICIAIS EM RENDA, ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA.
PONDERAÇÃO SENSATA. VINDICAÇÃO PLAUSÍVEL.
INCORPORAÇÃO DEFINITIVA DOS VALORES AO PATRIMÔNIO PÚBLICO, QUE EXIGE DECISÃO FINAL IRRECORRÍVEL CONFIRMANDO A EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO.
PRECEDENTES.
"A regra da conversão dos depósitos judiciais em renda da Fazenda Pública deve ser seguida quanto não mais houver controvérsia judicial sobre a exigibilidade dos créditos tributários correlatos, daí porque se exige o trânsito em julgado para essa providência (Min. Benedito Gonçalves)" (TJSC, Apelação Cível n. 5014134-29.2023.8.24.0023, rel. Des. Júlio César Knoll, Terceira Câmara de Direito Público, j. monocrático em 13/03/2025).
DECISÃO UNIPESSOAL EM PARTE READEQUADA.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação n. 5025950-08.2023.8.24.0023, Primeira Câmara de Direito Público, Rel. Des. Luiz Fernando Boller. Data do julgamento: 06.05.2025) (g.n.)
APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA TRIBUTÁRIO. ICMS-DIFAL. ORDEM DENEGADA. RECURSO DA CONTRIBUINTE.
DEFINIÇÃO DO SUJEITO ATIVO DO DIFAL. CRITÉRIO DE ENTRADA FÍSICA. CONSTITUCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE DESVIRTUAMENTO DO CRITÉRIO DO FATO GERADOR. ADI N. 7.158. PRECEDENTES.
PORTAL NACIONAL PREVISTO NO ART. 24-A DA LEI COMPLEMENTAR N. 190/2022. SUFICIÊNCIA PROVISÓRIA DOS PORTAIS ESTADUAIS INTEGRADOS. DISPONIBILIZAÇÃO DA PLATAFORMA PELOS ENTES FEDERATIVOS QUE PERMITE A CENTRALIZAÇÃO. EVENTUAL INADEQUAÇÃO TÉCNOLÓGICA QUE NÃO AFASTA A OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA SEGURANÇA JURÍDICA. PRECEDENTES.
ALEGADA NECESSIDADE DE RATIFICAÇÃO ATUAL DA LEI ESTADUAL N. 16.853/2015 DIANTE DA PROMULGAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR N. 190/2022. INSUBSISTÊNCIA. RACIOCÍNIO AFASTADO NO TEMA 1.094 DO STF. MERA MODULAÇÃO DE EFICÁCIA TEMPORAL.
DENEGAÇÃO DA ORDEM MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO (Apelação n. 5021577-31.2023.8.24.0023, Quinta Câmara de Direito Público, Rel. Des. Vilson Fontana. Data do julgamento: 29.04.2025) (g.n.)
E, de minha Relatoria:
APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPLEMENTAÇÃO DO PORTAL PARA APURAÇÃO DO DIFERENCIAL DE ALÍQUOTAS DE ICMS (DIFAL). SENTENÇA QUE DENEGOU A SEGURANÇA. INSURGÊNCIA DA IMPETRANTE.
PRELIMINAR.
NULIDADE DA SENTENÇA, EM DECORRÊNCIA DO JULGAMENTO EXTRA PETITA. PARCIAL ACOLHIMENTO. DECISÃO NA VERDADE, CITRA PETITA. AUSÊNCIA DE ANÁLISE DE TODAS AS TESES/PEDIDOS APRESENTADOS NA PEÇA PORTAL. MERO SUPRIMENTO DA OMISSÃO. EXEGESE DO ART. 1.013, § 3°, INCISO III, DO CPC/2015.
MÉRITO.
IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA DO ICMS-DIFAL ENQUANTO NÃO DEVIDAMENTE IMPLEMENTADO O PORTAL, CONSOANTE PREVISTO NO ART. 24-A DA LEI COMPLEMENTAR N. 90/2022. AFASTAMENTO. PORTAL QUE, EMBORA DISPONIBILIZADO PELO ESTADO, NÃO REPRESENTA CONDICIONANTE AO RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. INEXISTÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO ACERCA DA IMPOSSIBILIDADE DE ADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA. DISPONIBILIDADE DE MEIOS ALTERNATIVOS PARA TANTO. DENEGAÇÃO DA ORDEM MANTIDA
. SUSPENSÃO DA CONVERSÃO DOS DEPÓSITOS EM RENDA ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DE DECISÃO DE MÉRITO. TESE PROFÍCUA. IMPERIOSA REFORMA DA DECISÃO NO PONTO.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, TÃO SÓ PARA SUPRIR OMISSÃO DA SENTENÇA E SUSPENDER A CONVERSÃO DOS DEPÓSITOS EM RENDA, ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO DE MÉRITO. (Apelação n. 5023294-78.2023.8.24.0023, Terceira Câmara de Direito Público. Data do julgamento: 20.05.2025) (g.n.)
Destarte, a manutenção da denegação da ordem, é medida que se impõe.
3. Conclusão
Ante o exposto, conheço do recurso e dou-lhe parcial provimento, para reconhecer a existência de julgamento
citra petita
e, com base no artigo 1.013, § 3°, inciso III, do CPC/2015, manter a denegação da ordem.
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