Processo nº 8020983-92.2025.8.05.0000
ID: 322661324
Tribunal: TJBA
Órgão: Des. José Soares Ferreira Aras Neto
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 8020983-92.2025.8.05.0000
Data de Disponibilização:
11/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MAURICIO AMORIM DOURADO
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Processo nº: 8020983-92.2025.8.05.0000 Órgão Julgador: Primeira Câma…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Processo nº: 8020983-92.2025.8.05.0000 Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível AGRAVANTE: SALVADOR SHOPPING S/A e outros Advogado(s): FRANCISCO DE FARO FRANCO NETO, MARIA AMELIA DE SALLES GARCEZ AGRAVADO: ANNE PRESENTES COMERCIAL LTDA Advogado(s): Advogado(s) do reclamado: MAURICIO AMORIM DOURADO Relator(a): Des. José Soares Ferreira Aras Neto REPUBLICAÇÃO* Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO n. 8020983-92.2025.8.05.0000 Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível AGRAVANTE: SALVADOR SHOPPING S/A e outros Advogado(s): FRANCISCO DE FARO FRANCO NETO (OAB:BA41709-A), MARIA AMELIA DE SALLES GARCEZ (OAB:BA5174-A) AGRAVADO: ANNE PRESENTES COMERCIAL LTDA Advogado(s): DECISÃO Vistos, etc. Cuida-se de recurso de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por SALVADOR SHOPPING S/A E CONDOMINIO DO SALVADOR SHOPPING em face da decisão prolatada pelo Juízo da 3ª Vara Cível e Comercial da Comarca de Salvador/BA que, nos autos da ação de prestação de contas nº. 8133939-53.2022.8.05.0001, ajuizada por ANNE PRESENTES COMERCIAL LTDA, julgou procedente o pedido de prestação de contas, nos seguintes termos: "Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido da primeira fase da ação de exigir contas, nos termos do art. 550, §5º, do CPC, para CONDENAR os réus SALVADOR SHOPPING S/A e CONDOMÍNIO DO SALVADOR SHOPPING a prestarem as contas exigidas pela autora, na forma mercantil/contábil, referentes ao período da relação locatícia mantida entre as partes, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhes ser lícito impugnar as que a autora apresentar, devendo especificar receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, observando, assim, os termos do art. 551 do CPC. Os réus deverão apresentar, especificamente, os documentos solicitados no item 5 da petição inicial, a saber: Atas das Assembleias nas quais foram aprovadas as previsões orçamentárias; Demonstrativo da cobrança e pagamento das despesas comuns do Condomínio por cada lojista/locatário, com o critério utilizado no cálculo correspondente ao CRD (Coeficiente de Rateio de Despesas), consideradas as deduções e descontos, bem como a ABL (Área Bruta Locável) do Shopping; Demonstrativo de pagamento dos encargos condominiais devidos pelas lojas desocupadas, com a comprovação de quem efetivamente arcou com tais pagamentos; Demonstrativo de pagamento dos encargos condominiais dos espaços ocupados por ilhas, quiosques e carrinhos; Demonstrativo por cargos, salários e atribuições dos funcionários contratados pelos Réus, que laboraram e laboram no Empreendimento, cuja folha de pagamento foi custeada pelo Condomínio e, consequentemente, pelos locatários; Demonstrativos e o critério utilizado referente à destinação das verbas concernentes a energia elétrica; Demonstrativos e o critério utilizado referente à destinação das verbas concernentes ao ar condicionado que abrange as áreas de uso comum (mall); Demonstrativos e o critério utilizado referente à cobrança e a destinação da verba concernente ao ar condicionado instalado no salão de uso comercial da Autora; Demonstrativo e comprovação do pagamento de todos os locatários, assim como o critério utilizado, referente às verbas concernentes ao fornecimento de energia elétrica; Demonstrativo da fração do valor do IPTU atribuído a cada loja e aquele relativo às áreas comuns e de circulação do Empreendimento; Demonstrativo do critério no que diz respeito à cobrança ou percentual correspondente da taxa de administração; Demonstrativo dos pagamentos das custas processuais relacionadas às Ações de Despejo/Execuções/Monitórias, propostas pelos Réus; Demonstrativo de todas as despesas de conservação, limpeza e segurança do estacionamento, a partir da implementação da cobrança por seu uso, bem como a comprovação de quem efetivamente pagou tais custos de manutenção e funcionamento; Demonstrativo dos valores pagos ao Município de Salvador em razão do TAC firmado, com a apresentação da origem do dinheiro e os respectivos recibos. Condeno os réus ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC. Apresentadas as contas no prazo fixado, intime-se a parte autora para que se manifeste em 15 (quinze) dias, nos termos do art. 550, §6º, do CPC. Havendo impugnação, intime-se a parte ré para manifestação em igual prazo. Não sendo apresentadas as contas no prazo determinado, intime-se a parte autora para apresentá-las, de acordo com o art. 550, §7º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se." (ID 83311703, fls. 15/21) Em suas razões, o agravante aduz que "ao declarar que a possibilidade de valer-se o locatário da faculdade a que alude o art. 22, IX, da lei de locações seria providência ínsita à ação de exigir contas, restou silente quanto ao entendimento jurisprudencial, na via oposta, segundo a qual a via adequada para alcançar o objetivo aparentemente perseguido pela autora não seria essa ação de exigir contas.". Pontua que "conforme reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça não há interesse de agir pelo demandante quando há prévia estipulação quanto à forma pela qual serão prestadas as contas". Salienta que "a decisão agravada merece reforma à luz da flagrante ilegitimidade passiva da Agravante Salvador Shopping S/A, na medida em que a sua posição jurídica é de simples proprietária de unidades autônomas do empreendimento denominado Salvador Shopping, unidades essas que se encontram locadas a terceiros e fazem parte de um universo condominial denominado Condomínio do Salvador Shopping.". Assevera que "não estando a proprietária das unidades - Salvador Shopping S/A - vinculada diretamente às atividades comerciais desenvolvidas pelos locatários no âmbito do Shopping, e nem sendo ela beneficiária das verbas que são repassadas pelos locatários ao Condomínio ou ao Fundo de Promoções Coletivas, referida proprietária simplesmente não faz parte da relação jurídica subjacente (não cobra e não recebe nenhum valor em nome próprio, a título de rateio de despesas condominiais ou promocionais)." Informa que "todos os lojistas do empreendimento, individualmente considerados, como determina o sigilo comercial, recebem regiamente a nota de débito referente à loja locada, onde restam discriminadas todas as parcelas cobradas em virtude da locação (aluguéis, demais encargos e contribuições para o Fundo de Promoções), assim como o relatório (Relatório de Despesas Incorridas) no qual são discriminados todos os gastos do Condomínio em si, dentre despesas com "pessoal", materiais, serviços, tributos e contribuições, seguros, bens e despesas financeiras, para que, de posse de tais informações possa, cada lojista, aferir se os valores que lhe estão sendo cobrados estão em conformidade com o rateio contratualmente estipulado". Complementa que "a autora carece do interesse de agir, tanto na modalidade interesse-necessidade, quanto na modalidade interesse-adequação, o que enseja, indubitavelmente, a reforma da decisão agravada, procedendo-se à extinção da presente ação, sem resolução do mérito, nos termos do inciso VI, do artigo 485, do Código de Processo Civil." Suscita a inépcia da inicial, haja vista que a agravada limita-se "a requerer a apresentação de rol de documentos - muitos dos quais nada têm a ver com a locação e administração dos espaços comerciais - não especificando o período que devam referir-se tais elementos, tampouco traz motivos plausíveis para tê-los, o que torna indiscutível a sua total ausência de certeza e determinação, a ensejar a imediata extinção da demanda em tela, sem resolução do mérito." No mérito, repete que "a Agravada sempre teve ciência da faculdade de obter administrativamente do Condomínio esclarecimentos ou apresentação de documentos - prerrogativa essa legalmente assegurada ao locatário consoante previsto no artigo 22, IX, c/c artigo 54, ambos da lei nº 8.245/91 - preferindo a Recorrida, ao revés, intentar diretamente a demanda judicial vertente para tanto, desprezando as evidências de ser ela flagrantemente desnecessária e inadequada à satisfação de sua real pretensão, que é fazer tabula rasa das regras contratuais por ela livremente pactuadas." Requer, assim, a atribuição de efeito suspensivo ao recurso. Pugna, ao fim, pelo provimento do recurso. É o relatório. Decido. Conheço do recurso, presentes que se encontram os pressupostos de admissibilidade. O cerne da inconformidade reside na suposta incongruência da decisão prolatada pelo Juízo da 3ª Vara Cível e Comercial da Comarca de Salvador/BA que, nos autos da ação de prestação de contas nº. 8133939-53.2022.8.05.0001, julgou procedente o pedido de prestação de contas A concessão de efeito suspensivo, em sede de Agravo de Instrumento, encontra previsão expressa no artigo 1.019, I, do Código de Processo Civil, que assim estabelece: Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias: I - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; (…) No mesmo sentido, o parágrafo único do art. 995 do CPC/2015 estabelece que "a eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso". Deste modo, nos termos dos arts. 995, parágrafo único, e 1.019, inciso I, do Código de Processo Civil, a atribuição de efeito suspensivo ou a antecipação da pretensão recursal exigem a demonstração da probabilidade do direito invocado e do perigo de dano grave de difícil ou impossível reparação. A tutela de urgência, prevista no art. 300 do CPC, pressupõe a presença de "elementos que evidenciem a probabilidade do direito e perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo" No caso em apreço, em juízo de cognição sumária e não exauriente, próprio do momento processual, entendo que não restaram demonstrados pelo Recorrente o cumprimento dos requisitos legais indispensáveis ao deferimento da medida pleiteada, senão vejamos. Na origem, trata-se de ação de exigir contas aduzindo a autora, em síntese, que figurou como locatária de unidade comercial situada no empreendimento administrado pelos agravantes. A pretensão da autora consiste na obtenção da prestação de contas relativas aos valores pagos, ao longo da vigência do contrato de locação, a título de despesas condominiais, Fundo de Promoção e Propaganda (FPP), Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), consumo de energia elétrica e sistema de ar condicionado. Alega a requerente que sempre arcou com tais encargos de maneira pontual, contudo, jamais lhe foram apresentados de forma clara e objetiva os critérios de rateio ou os demonstrativos detalhados de tais cobranças. Tal ausência de transparência, segundo sustenta, enseja fundada dúvida quanto à legitimidade e à proporcionalidade dos valores exigidos, levantando a possibilidade de ter assumido ônus que, por força contratual ou legal, não lhe competiam. No tocante às despesas vinculadas à operação do estacionamento, cuja exploração comercial teve início no ano de 2015, a autora afirma que os custos relacionados à sua manutenção e funcionamento não são suportados diretamente pelo operador do serviço, sendo, ao que tudo indica, repassados de forma indevida aos lojistas. Ressalta, ainda, que jamais foi prestada qualquer forma de contas sobre esses encargos específicos, o que reforça a necessidade de uma apuração precisa e transparente acerca da destinação e composição das quantias exigidas. É cediço que a ação de exigir contas apresenta natureza bifásica, estruturando-se em dois momentos processuais distintos e sucessivos. Na fase inicial, o juízo se limita à averiguação da existência do dever jurídico de prestar contas, decorrente de relação jurídica pré-existente entre as partes, que envolva administração de bens, valores ou interesses alheios. Reconhecido tal dever, impõe-se ao réu a obrigação de apresentar as contas respectivas, abrindo-se, então, a segunda fase. Na etapa subsequente, a atividade jurisdicional volta-se à análise minuciosa das contas prestadas, a fim de aferir sua regularidade, exatidão e consistência, culminando na apuração de eventual saldo, seja ele credor ou devedor, em favor de qualquer das partes envolvidas. Assim, no caso em apreço, a sentença de primeiro grau restringiu-se exclusivamente à fase inaugural da demanda, nos exatos termos do § 5º do art. 550 do Código de Processo Civil, concentrando a análise judicial na existência, ou não, de obrigação legal imposta aos réus de prestar contas à autora. Tal verificação demanda o exame da relação jurídica entre as partes e a identificação de indícios que demonstrem o exercício, pelos réus, de poderes de administração, gerência ou guarda de interesses alheios, elementos indispensáveis à caracterização do dever de prestar contas. Quanto à preliminar de carência de interesse de agir, ainda que haja estipulação contratual prévia sobre a forma pela qual serão demonstradas as receitas e despesas, tal previsão, por si só, não afasta o interesse processual da parte locatária em buscar judicialmente a efetiva e clara apresentação dessas contas, especialmente quando a forma prevista não vem sendo devidamente observada ou se mostra insuficiente para garantir a transparência e o acesso à integralidade das informações. Com efeito, o interesse de agir decorre da necessidade da tutela jurisdicional para obtenção de um resultado útil ao direito material, conforme disposto no artigo 17 do Código de Processo Civil, ao dispor que "para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade". Impende trazer à baila a explanação sobre o tema, por parte de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, in verbis: (...) Existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático. Movendo a ação errada ou utilizando-se do procedimento incorreto, o provimento jurisdicional não lhe será útil, razão pela qual a inadequação procedimental acarreta a inexistência de interesse processual. (NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. 3a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 532). Tal interesse se perfaz pela demonstração de utilidade e necessidade da jurisdição, o que se verifica de forma evidente no caso da autora, locatária de loja pertencente aos agravantes que, apesar de pré-estabelecerem as diretrizes para prestação de contas, não apresentaram tais informações de forma clara, detalhada e verificável. Sob essa perspectiva, impõe-se o reconhecimento da presença do binômio utilidade e necessidade, elementos indispensáveis à configuração do interesse processual, o que ratifica a legitimidade do exercício do direito de ação por parte da autora. No tocante à alegada exigência de requerimento administrativo prévio, não subsiste fundamento jurídico que imponha tal condicionante para o ajuizamento da presente demanda. A inexistência de previsão legal expressa nesse sentido afasta qualquer exigência de esgotamento da via administrativa como requisito de admissibilidade da ação judicial. Corrobora esse entendimento o disposto no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição da República, que consagra o princípio da inafastabilidade da jurisdição, nos seguintes termos: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Tal preceito confere ao jurisdicionado o direito inalienável de acesso à justiça sempre que houver, ainda que em tese, violação ou ameaça de violação a direito subjetivo, vedando qualquer obstáculo normativo que submeta o exercício desse direito à prévia manifestação de órgãos administrativos. Nesse sentido: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. 1ª FASE. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. RECURSO CABÍVEL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO. APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. LOJA EM SHOPPING CENTER. INTERESSE DE AGIR. DECADÊNCIA. PRESCRIÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA. AFASTADAS. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE PRESTAR CONTAS. RELAÇÃO LOCATÍCIA. INOVAÇÃO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRETENSÃO RESISTIDA. PRINCÍPIOS DA SUCUMBÊNCIA E DA CAUSALIDADE. I - Inicialmente esclareço que o recurso cabível da decisão que julga procedente a 1ª fase da ação de prestação de contas é o de agravo de instrumento, devendo ser aplicado o princípio da fungibilidade recursal, desde que observado o prazo para a interposição do agravo. Precedente do STJ II ? Noutro ponto, tem-se que o interesse de agir consubstancia-se na necessidade e na utilidade do processo, no que se refere à obtenção, pela indispensável intervenção judicial, da satisfação do alegado direito. Devem restar comprovados tanto o interesse processual, quanto a eleição da via adequada . No caso em testilha, existe o interesse da parte apelada. Isto porque, tendo sido a autora, ora apelada, locatária junto ao condomínio requerido, resta demonstrado o interesse processual quanto ao requerimento judicial de prestação de contas das despesas relativas ao período da locação. III ? Da mesma forma, a via processual mostra-se adequada já que o ajuizamento desta ação era medida judicial cabível para a autora alcançar a finalidade de apurar os valores recebidos a título de fundo de promoção e condomínio do Buriti Shopping, bem como as despesas e investimentos pagos no referido empreendimento no mesmo período. IV ? No que pertine a alegação de decadência, o art . 54, § 2º, da lei 8.245/61 não estabelece prazo decadencial de 60 dias para que se formule pedido de prestação de contas no seio de contrato de locação em shopping center, mas, sim, estatui a periodicidade mínima para essa prestação. V - Melhor sorte não socorre a recorrente quanto a alegação de prescrição. Isto porque, ação de prestação de contas tem por base obrigação de natureza pessoal, a ela se aplicando a prescrição decenária prevista no artigo 205 do Código Civil . VI ? O dever de prestar contas ocorre sempre que a administração de bens, valores ou interesses de determinado sujeito seja confiado a outrem. No contexto, inquestionável o dever da parte ré/recorrente de prestar contas à demandante, eis que, estando a autora/apelada sujeita ao pagamento das despesas do condomínio e do fundo de promoção, tem o direito de exigir prestação de contas. VII - Nos termos do art. 550 do Código de Processo Civil: "Aquele que afirmar ser titular do direito de exigir contas requererá a citação do réu para que as preste ou ofereça contestação no prazo de 15 (quinze) dias? . Logo, não tendo o legislador imposto como requisito para exigência de prestação de contas que o locatário esteja em dia com o pagamento de aluguéis, não pode a parte que tem o dever de prestá-las, eximir-se de sua obrigação, alegando para tanto a exceção do contrato não cumprido, de forma a criar novos requisitos. VIII - Sem amparo, ainda, a tese de ilegitimidade para prestar as contas dos valores relativos ao fundo de promoção já que este, conforme consta do e-mail encaminhado pela recorrente, é pago juntamente com o aluguel e condomínio diretamente ao requerido no mesmo boleto bancário. Portanto, sendo a relação contratual realizada exclusivamente com o apelante, este é a única figura legítima para o polo passivo da presente demanda. IX ? Em razão dos princípios da sucumbência e da causalidade, existindo resistência da parte em fornecer a documentação pleiteada, revela-se legítimo condená-la ao pagamento da verba honorária . X ? Em relação a tese da inexistência do dever de prestar contas, por tratar-se de relação locatícia, esta não foi objeto de discussão na instância inaugural em nenhum momento, se fazendo impossível a sua análise neste momento processual, sob pena de se incorrer na vedada supressão de instância. APELAÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA PARTE, DESPROVIDA. (TJ-GO 5387874-83.2018 .8.09.0137, Relator.: REINALDO ALVES FERREIRA - (DESEMBARGADOR), 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 09/12/2020) Ademais, a prestação de contas, sobretudo em contratos complexos como os de locação em shopping centers - que envolvem cobranças de taxas condominiais, fundo de promoção, despesas rateadas e outros encargos - implica dever de transparência e de boa-fé objetiva, conforme estabelecido no art. 422 do Código Civil, o qual impõe a ambas as partes o dever de agir com observância aos princípios de probidade e boa-fé. A ausência de clareza ou o descumprimento da forma estipulada de prestação de contas violam tais princípios fundamentais, o que justifica o ajuizamento da ação para compelir o locador à observância dos deveres contratuais e legais. Vale ressaltar, ainda, o disposto no artigo 550 do Código de Processo Civil, que autoriza a ação de exigir contas tanto em favor de quem tem o direito de prestá-las quanto de quem deseja exigi-las, sendo suficiente a demonstração de relação jurídica que legitime tal exigência. Portanto, sendo a locatária titular do direito de exigir transparência nas cobranças que lhe são impostas, possui legitimidade e interesse de agir para postular a prestação de contas judicialmente, mesmo que haja previsão contratual, se esta não vem sendo cumprida de forma eficaz. Conclui-se, assim, que a alegação genérica de existência de cláusula contratual que estipule a forma da prestação de contas não basta para afastar o interesse de agir da locatária, sobretudo diante da inobservância prática de tais disposições ou da existência de dúvidas razoáveis sobre os valores cobrados. O Poder Judiciário, nesses casos, deve intervir para garantir a higidez da relação contratual e a proteção do contratante hipossuficiente, assegurando o exercício do direito à informação e ao controle das obrigações pecuniárias decorrentes do contrato. Noutro giro, cumpre destacar, de forma inequívoca, a legitimidade ativa da autora para a propositura da presente demanda, haja vista que, na qualidade de locatária de unidade comercial no empreendimento dos réus, assumia, contratualmente, a obrigação de contribuir com os encargos condominiais e demais despesas acessórias, tais como Fundo de Promoção e Propaganda, energia elétrica, ar-condicionado e tributos incidentes. Assim, é incontroverso que a autora exerceu a condição de locatária de unidade comercial, especificamente a loja nº 1045, localizada no empreendimento denominado Salvador Shopping. Tal relação contratual encontra-se devidamente comprovada por meio do contrato de locação anexo aos autos, constando, ainda, que as atividades comerciais da autora foram encerradas em 02 de agosto de 2021, marco final da relação locatícia que deu ensejo à presente demanda. Diante desse vínculo jurídico-obrigacional, é-lhe assegurado o direito subjetivo de fiscalizar a destinação e a administração dos valores por ela repassados, legitimando, assim, o pleito de prestação de contas. Nos termos do § 2º do art. 54 da Lei nº 8.245/91 (Lei de Locações), é assegurado ao locatário de espaço em shopping center o direito de exigir a devida comprovação das despesas repassadas, conforme se extrai da literalidade do dispositivo legal: "As despesas cobradas do locatário devem ser previstas em orçamento, salvo casos de urgência ou força maior, devidamente demonstradas, podendo o locatário, a cada sessenta dias, por si ou entidade de classe, exigir a comprovação das mesmas." Conclui-se, portanto, que a norma impõe um dever de transparência ao empreendedor e/ou administrador do shopping, estabelecendo expressamente a obrigação de demonstrar a origem, destinação e fundamento das despesas cobradas, seja a título de encargos condominiais, seja a título de despesas acessórias, como fundo de promoção, energia elétrica, ar-condicionado e tributos. Trata-se, pois, de um dever de prestação de contas imposto por lei, cuja finalidade é assegurar o equilíbrio contratual e a boa-fé nas relações comerciais estabelecidas no âmbito de centros comerciais. No que tange à legitimidade passiva, cuja preliminar fora suscitada pelas agravantes, revela-se plenamente aplicável ao caso a teoria da aparência, amplamente reconhecida na jurisprudência pátria, especialmente nas hipóteses em que há confusão ou sobreposição de funções entre as pessoas jurídicas envolvidas. Isto porque, no caso concreto, SALVADOR SHOPPING S/A e o CONDOMÍNIO DO SALVADOR SHOPPING atuam de forma integrada, compondo um grupo econômico com divisão nebulosa de responsabilidades, o que dificulta a individualização das condutas administrativas atribuídas a cada uma das rés. Ressalte-se, ainda, que o próprio contrato de locação comercial foi celebrado com a empresa SALVADOR SHOPPING S/A, a qual não pode se furtar à responsabilidade pela gestão dos valores cobrados durante a relação locatícia, tampouco eximir-se do dever de prestar contas sobre recursos cuja administração é exercida, ao menos em parte, em conjunto com o condomínio. A tentativa de fragmentar tal responsabilidade carece de amparo jurídico, sobretudo diante da relação de confiança estabelecida com a autora, fundada na boa-fé objetiva e nos deveres anexos ao contrato. Os agravantes, alegam, também, a desnecessidade de prestação de novas contas, haja vista que as despesas comuns do empreendimento são regularmente informadas aos lojistas por meio de balancetes contábeis disponibilizados trimestralmente. Contudo, tal alegação carece de comprovação nos autos, não havendo qualquer prova efetiva de que tais documentos tenham sido, de fato, entregues à autora durante a vigência do contrato de locação, tampouco se demonstrou que os referidos balancetes observavam o formato técnico exigido pela legislação processual e contábil vigente. Consoante dispõe o art. 551 do Código de Processo Civil, é dever do réu apresentar as contas "na forma adequada, especificando-se as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, se houver". Assim, a obrigação de prestar contas não se satisfaz com a simples entrega de relatórios genéricos ou de caráter meramente informativo, pressupondo um conjunto documental estruturado segundo os princípios da contabilidade, com detalhamento minucioso das receitas auferidas, das despesas realizadas e dos critérios de sua destinação, devidamente acompanhados dos respectivos comprovantes. Nesse contexto, a disponibilização eventual de meros balancetes vagos, desacompanhados de documentação comprobatória e sem qualquer individualização das parcelas atribuídas à autora, não supre o dever legal de prestação de contas. A prestação deve atender ao formato mercantil-contábil, sendo imprescindível a transparência, a rastreabilidade dos lançamentos e a justificativa técnica dos encargos. Ademais, o dever de prestar contas abrange, por força do próprio objeto contratual, a demonstração clara dos critérios de rateio das despesas entre os lojistas, elucidando os cálculos dos valores atribuídos a cada unidade comercial, especialmente diante das alegações trazidas pela autora, no sentido de que teria suportado despesas que extrapolam sua cota-parte contratual ou legal. Considerando que não há qualquer elemento nos autos que comprove o cumprimento regular de tal obrigação por parte dos réus, observando-se, ao revés, total ausência de documentação idônea que demonstre a entrega formal das contas à agravada, em conformidade com os parâmetros legais, evidente o descumprimento do dever de transparência e fiscalização que rege a relação entre administradores de shopping centers e lojistas. Outrossim, na hipótese de ser verídica a afirmação dos agravantes quanto ao rigor na prestação das contas referentes às despesas comuns do empreendimento por meio de balancetes contábeis disponibilizados trimestralmente, há de se concluir que o atendimento da ordem proferida pelo Douto Juízo de primeiro grau não será de grande complexidade, sobretudo considerando a suposta organização e boa-fé dos locadores. Nesse diapasão, não merece reparo a decisão exarada pelo Douto Juízo de primeiro grau. Por derradeiro, importante esclarecer que a presente decisão, ato de caráter transitório, poderá ser revista a qualquer tempo, após regular instrução do feito, e desde que venham aos autos elementos de convicção que autorizem novo decisum. Pelo exposto, NEGO EFEITO SUSPENSIVO ao agravo de instrumento. Na presente situação, importante a requisição de informações ao Digno Juízo prolator da decisão guerreada, sobre a ocorrência de fatos novos relacionados com o presente recurso e que tenha repercussão no seu deslinde (art. 1.018, §1º, do CPC/2015). Comunique-se ao Juízo de Primeiro Grau o conteúdo desta decisão, encaminhando-lhe cópia do seu inteiro teor (art. 1019, I, do CPC/2015). Intime-se o agravado para responder no prazo de quinze (15) dias, conforme norma contida no art. 1.019, II, do CPC/2015. Com o escopo de garantir a efetividade e celeridade processual, atribuo força de mandado/ofício ao presente pronunciamento judicial, incluindo a possibilidade da Secretaria realizar as notificações e intimações por meio eletrônico, notadamente na hipótese dos processos submetidos ao Juízo 100% digital, conforme os termos do ato conjunto n.07/2022. Publiquem-se. Intimem-se. Salvador/BA, 8 de julho de 2025. DESEMBARGADOR JOSÉ ARAS Relator
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