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Processo nº 1016090-40.2024.8.11.0003

ID: 337057275

Tribunal: TJMT Órgão: 3ª VARA CRIMINAL DE RONDONÓPOLIS Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1016090-40.2024.8.11.0003

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ELISTON RIBEIRO DA SILVA

Sentença

Advogados:

DANIEL VITOR TEIXEIRA DO CARMO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso Polo VII - Comarca de Rondonópolis – 3ª Vara Criminal R. Barão do Rio Branco, nº 2299, Jd. Guanabara, 78.710-100 Rondonópolis – MT, Telefone (66) 3410-6100 /… Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso Polo VII - Comarca de Rondonópolis – 3ª Vara Criminal R. Barão do Rio Branco, nº 2299, Jd. Guanabara, 78.710-100 Rondonópolis – MT, Telefone (66) 3410-6100 / 3410-6152. SENTENÇA Autos: 1016090-40.2024.8.11.0003 Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO Réu: ELISTON RIBEIRO DA SILVA Visto. 1. Relatório O Ministério Público do ESTADO DE MATO GROSSO ofereceu denúncia em face de ELISTON RIBEIRO DA SILVA, já qualificado, como incurso nas disposições art. 155, §4º, II, e art. 180, caput, ambos do Código Penal, em concurso material de crimes. Narra a denúncia em síntese: “1º FATO – FURTO QUALIFICADO Consta dos autos, que no dia 24 de junho de 2024, por volta das 06h10min, em residência particular, situada na Rua Quatorze, nº 787, Residencial Nova Era, nesta cidade e comarca de Rondonópolis, o denunciado ELISTON Ribeiro da Silva subtraiu, para si ou para outrem, mediante fraude, coisa alheia móvel, consistente em energia elétrica, em prejuízo1 da ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., pessoa jurídica de direito privado. 2º FATO – RECEPTAÇÃO Na mesma data, horário e local, o denunciado ELISTON Ribeiro da Silva ocultou e, em momento anterior, recebeu/adquiriu coisa que sabia ser produto de crime, consistente em 01 (um) conjunto de uniforme, avaliado em R$900,00 (novecentos reais), 01 (um) bastão “pega tudo”, avaliado em R$4.000,00 (quatro mil reais), 01 (um) kit de aterramento elétrico, avaliado em R$2.000,00 (dois mil reais) e 01 (um) kit de vara de manobra, avaliado em R$1.800,00 (mil e oitocentos), em prejuízo da ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., pessoa jurídica de direito privado. HISTÓRICO DOS FATOS Ressai dos autos, que no dia 24 de junho de 2024, no período matutino, investigadores de polícia deram cumprimento a mandado de busca e apreensão e prisão temporária, expedido pelo juízo da 3ª Vara Criminal de Rondonópolis (autos nº 1014469-08.2024.811.0003), no endereço situado à Rua Quatorze, nº 787, Residencial Nova Era, nesta, em razão de investigações pretéritas apontarem que o denunciado integrava uma associação criminosa responsável por realizar adulterações e ligações clandestinas em diversos domicílios deste município, gerando enorme prejuízo para a Concessionária de Energia Elétrica – ENERGISA. No local, os investigadores observaram que, embora o padrão de energia da residência estivesse sem relógio/medidor, diversos eletrônicos que guarneciam a casa estavam ligados. Diante disso, uma equipe da ENERGISA foi solicitada no local, para realização de inspeção, sendo identificado uma ligação clandestina fraudulenta, conforme se extrai do Auto de Inspeção (Id. 160941636) e do laudo pericial anexo. Outrossim, durante a busca na residência, os investigadores de polícia localizaram 01 (um) conjunto de uniforme, 01 (um) bastão “pega tudo”, 01 (um) kit de aterramento elétrico, 01 (um) kit de vara de manobra, em nome da ENERGISA. Esses objetos, mais tarde, foram reconhecidos pelo Supervisor de Medição de Combate a Perdas da concessionária, como tendo sido subtraídos da empresa, em data anterior (termo de reconhecimento de objeto – Id. 160941602). Ao ser interrogado, o denunciado fez uso do direito ao silêncio. Ante o exposto, DENUNCIO: ELISTON Ribeiro da Silva como incurso nas disposições do art. 155, §4º, II, e art. 180, caput, do Código Penal, em concurso material de crimes (...)”. (Denúncia do Id. 116752506). A denúncia foi devidamente recebida em 09 de julho de 2024 (Id. 161751819). Citado, o réu apresentou resposta à acusação no Id. 162811548. Decisão designando audiência de instrução e julgamento (Id. 143368310). Durante a instrução processual inquiriu-se as testemunhas Ueslei Martins de Oliveira, Lauro Evaner Correa e Emerson Reginaldo de Oliveira, bem como interrogou-se o réu Eliston Ribeiro da Silva. O Ministério Público apresentou memoriais finais (Id. 186317279 e 193141825). A Defesa Técnica apresentou memoriais finais no Id. 193379216, pugnando pelo reconhecimento formal da quebra da cadeia de custódia dos vestígios e bens apreendidos, com fundamento nos artigos 158-A a 158-F do Código de Processo Penal, diante da ausência de identificação técnica, lacração, registros periciais e documentação adequada no momento da apreensão, guarda e restituição dos objetos e a declaração de ilicitude das provas materiais obtidas, nos termos do artigo 157 do CPP. No mérito, postula absolvição do acusado em relação ao crime de receptação, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal e quanto ao crime de furto que seja reconhecida a atenuante da confissão. Despacho convertendo o julgamento em diligência para determinar a intimação da assistente de acusação para que apresente memoriai finais (Id. 197217122). Certidão do decurso do prazo para apresentar os memoriais finais (Id. 199491991). É a síntese do necessário. Fundamento e decido. 2. Fundamentação Trata-se de Ação Penal proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, em desfavor de ELISTON RIBEIRO DA SILVA, já qualificado, como incurso nas disposições art. 155, §4º, II, e art. 180, caput, ambos do Código Penal, em concurso material de crimes. O processo está formalmente em ordem, inexistindo nulidades ou vícios a sanar. As provas foram coligidas sob o crivo dos princípios norteadores do devido processo legal, mormente o contraditório e a ampla defesa, nos termos constitucionais e processuais. Presentes às condições necessárias ao exercício do direito de ação, bem como os pressupostos legalmente exigidos. Não existem matérias preliminares pendentes a serem apreciadas. Passo doravante à análise do mérito. 2.1. Do crime de Furto qualificado (art. 155, §4ª, II, CP) O delito imputado ao acusado tem a seguinte redação: “Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. Furto qualificado § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido: II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza”. O artigo 155 do Código Penal tipifica o crime de furto, descrevendo como elementar objetiva do tipo a conduta de "subtrair” (tirar, fazer desaparecer ou retirar), seguida, é lógico, de outros importantes elementos descritivos e normativos. Neste aspecto, a elementar subjetiva é o dolo, consubstanciado na intenção específica de assenhoramento definitivo da coisa. Exige-se, portanto, o ânimo fundamental de apropriar-se de algo que não lhe pertence (para si ou para outrem). O furto se distingue do roubo pela ausência de violência ou grave ameaça. O § 4º do artigo 155 prevê circunstâncias qualificadoras que agravam a pena. Sobre o momento consumativo do furto, há uma grande divergência doutrinária. Adotando-se a teoria do amotio, amplamente reconhecida pelas cortes superiores, especialmente pelo STJ, considera-se consumado o furto com a simples posse da coisa subtraída, ainda que por um breve período temporal e independentemente de posse mansa e pacífica ou desvigiada, sendo suficiente que o agente consiga retirar o bem da esfera de vigilância da vítima.[1] A legislação pátria dispõe no artigo 14 do Código Penal que o crime encontra-se consumado quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal, e tentado quando, iniciada a execução, não se consuma, por circunstâncias alheias à vontade do agente. O objeto jurídico protegido é o patrimônio do indivíduo, enquanto o objeto material é a coisa alheia móvel sujeita à subtração. O crime de furto é classificado como comum, material, de forma livre, comissivo (como regra), instantâneo, de dano, unissubjetivo e plurissubsistente.[2] As provas produzidas durante o curso procedimental, seja durante a fase investigatória, seja durante a fase judicial, permitem concluir pela responsabilidade do réu nesse evento criminoso noticiado na denúncia. Materialidade A materialidade do delito está devidamente comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante (Id. 160941591), Boletim de Ocorrência (Id. 160941593), Termo de Exibição e Apreensão (Id. 160941596), Laudo Pericial n. 511.2.23.9151.2024.188252-A01 (Id. 161746307), bem como pelos depoimentos colhidos em juízo. Autoria A autoria, de igual modo, encontra-se perfeitamente delineada nos autos na pessoa do acusado. O réu, em juízo, confessou a prática do delito de furto de energia, admitindo que realizou a ligação direta da rede elétrica em sua residência, sem a instalação do medidor, com o intuito de não pagar pelo consumo da energia utilizada. No que tange a confissão do acusado, é pacífico o entendimento de que a confissão judicial ou extrajudicial, quando corroboradas por outros meios de provas, são circunstâncias que autorizam o édito condenatório. Nessa linha de intelecção, as confissões judiciais ou extrajudiciais valem pela sinceridade com que são feitas ou verdade nelas contidas, desde que corroboradas por outros elementos de prova inclusive circunstâncias. (Precedentes: STF - RTJ 88/371). O laudo pericial atestou categoricamente a ocorrência de ligação clandestina no imóvel do acusado, verificando que não havia medidor de energia instalado no padrão, existindo apenas uma ligação direta dos cabos elétricos da rede para o imóvel. Constatou-se, ainda, que havia energia no local, sendo possível visualizar lâmpadas acesas, evidenciando o consumo efetivo sem a devida medição, caracterizando a subtração de energia elétrica (Id. 161746307). Corroborando o laudo pericial, tem-se o depoimento da testemunha Lauro Evaner Corrêa, policial civil que participou da diligência de busca e apreensão, confirmando que foi encontrada na residência do acusado uma ligação direta na rede elétrica, sem medidor, permitindo o uso de energia sem o devido registro de consumo. Ainda nesse sentido, o depoimento da testemunha Ueslei Martins de Oliveira, supervisor de medição da empresa Energisa, confirmou a irregularidade na ligação elétrica, ressaltando que o imóvel estava recebendo energia elétrica de forma clandestina, sem o devido registro ou medição. É cediço que o depoimento dos policiais constitui elemento de prova de extremada importância já que complementa as demais existentes e, como tal, compõe todo o arcabouço probatório existente em face do acusado. A propósito, revestem-se de fé pública e gozam de presunção de legalidade e legitimidade, quando corroboradas pelas demais provas coligidas. Nesse sentido, o Enunciado Orientativo nº. 8 do TJMT: “Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal”. Assim, comprovadas a materialidade e a autoria do delito de furto qualificado, impõe-se a condenação do acusado é medida que se impõe. Ressalte-se por fim, que o fato é típico, antijurídico e culpável, logo, estando comprovadas a materialidade e a autoria, outro caminho não resta a não ser julgar parcialmente procedente a presente ação penal. Circunstância(s) qualificadora(s) O conjunto probatório presente nos autos demonstrou a materialidade e a autoria delitivas do crime de furto qualificado pela fraude ( CP, art. 155, § 4º, II). Configura-se a qualificadora da fraude no furto de energia elétrica mediante ligação clandestina ou emprego de ardil que obstaculiza a mensuração do consumo de energia elétrica. Nesse sentido: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ART. 155, § 4º, II, do CP. FURTO DE ÁGUA PRATICADO MEDIANTE FRAUDE CONTRA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, configura o crime de furto qualificado pela fraude (art. 155, § 4º, II, do Código Penal) a conduta consistente no furto de água da concessionária de serviço público, praticado mediante ligação clandestina . 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp n. 1.830.267/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 17/9/2019, DJe de 23/9/2019.) APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTO DE ÁGUA MEDIANTE FRAUDE (ART. 155, § 3º E § 4.º, INC. II, DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. PRELIMINAR. NULIDADE DO PROCESSO. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. PRESCINDIBILIDADE PARA CONFIGURAR A MATERIALIDADE DO DELITO. CONFISSÃO DO RÉU CORROBORADA PELOS DEPOIMENTOS DOS FUNCIONÁRIOS DA EMPRESA CONCESSIONÁRIA FORNECEDORA DE ÁGUA DO MUNICÍPIO. MÉRITO. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. LIGAÇÃO DE ÁGUA CLANDESTINA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CRIME PRATICADO NA MODALIDADE QUALIFICADA. CIRCUNSTÂNCIA INCOMPATÍVEL COM O REFERIDO INSTITUTO. MAIOR GRAU DE REPROVABILIDADE NA CONDUTA DO ACUSADO. PLEITO AFASTADO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE USURPAÇÃO DE ÁGUAS. INVIABILIDADE. ÁGUA TRATADA E CANALIZADA POR EMPRESA CONCESSIONÁRIA. PROPRIEDADE DESTA. PRÁTICA DE FURTO MEDIANTE FRAUDE CONFIGURADA. FURTO PRIVILEGIADO. APLICAÇÃO UNICAMENTE DA PENA DE MULTA OU FIXAÇÃO NO PATAMAR MÁXIMO DA REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO QUE EVIDENCIAM MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. PENA SUBSTITUTIVA. PEDIDO DE SUBSTITUIÇÃO DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE POR PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. SANÇÃO CORPORAL QUE FOI SUBSTITUÍDA POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS, SENDO UMA DELAS A PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE DUAS REPRIMENDAS ALTERNATIVAS IDÊNTICAS. RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SC - APR: 00010291720178240141 Presidente Getúlio 0001029-17.2017.8.24.0141, Relator: Alexandre d'Ivanenko, Data de Julgamento: 21/05/2020, Quarta Câmara Criminal) A qualificadora da fraude mostra-se evidentemente configurada, considerando que o acusado utilizou-se de meio ardil para enganar a concessionária de energia, desviando o fluxo elétrico diretamente da rede, impedindo a medição do consumo e, consequentemente, o devido faturamento, conforme se extrai do Laudo Pericial acostado no Id. 161746307. Assim, o conjunto probatório dos autos é harmônico e seguro para afirmar que o réu praticou o delito de furto de água potável mediante fraude, capitulado no art. 155, § 4º, inciso II, do Código Penal. 2.3. Do crime de receptação (art. 180, caput, do Código Penal) Dispõe o art. 180, caput, do Código Penal: “Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa”. O crime de receptação está previso no artigo 180 do Código Penal e é configurado quando alguém adquire, recebe, transporta ou, ainda, oculta produto de crime, desde que tenha conhecimento disto, bem como influencia para que um terceiro adquirira, receba ou oculte estado de boa-fé. No que concerne ao delito de receptação, referente aos objetos encontrados na residência do acusado (conjunto de uniforme, bastão pega-tudo, kit de aterramento elétrico e kit de vara de manobra), entendo que a prova produzida não se mostra suficiente para embasar um decreto condenatório. Embora os itens tenham sido apreendidos na residência do acusado e a empresa Energisa tenha apresentado documentação visando comprovar a propriedade de parte dos bens, verifico que não restou demonstrado de forma inequívoca que o acusado tinha ciência da origem ilícita dos objetos, elemento subjetivo indispensável para a caracterização do delito de receptação. Conforme depoimentos das testemunhas Ueslei Martins de Oliveira e Emerson Reginaldo de Oliveira, os itens apreendidos, como o bastão pega-tudo e o kit de vara de manobra, são ferramentas comumente utilizadas por concessionárias de energia elétrica, mas não souberam informar se a venda é exclusiva para concessionária. O acusado, em seu interrogatório, afirmou que adquiriu as ferramentas para uso em seu trabalho como eletricista autônomo, não tendo conhecimento de que pudessem ser produtos de crime. Asseverou, ainda, que os materiais apreendidos podem ser adquiridos comumente no comércio. Ademais, não foram apresentados nos autos boletins de ocorrência ou outros registros que comprovassem efetivamente o extravio ou furto desses itens específicos encontrados na posse do acusado, havendo apenas a afirmação genérica de que tais objetos pertenceriam à empresa Energisa. Nesse contexto, embora os objetos tenham sido encontrados na posse do acusado e possam ser similares aos utilizados pela concessionária de energia, não se pode afirmar com a certeza necessária para uma condenação penal que o acusado tinha conhecimento da origem ilícita desses bens, sendo aplicável, portanto, o princípio in dubio pro reo quanto a este delito. Assim, o que se pode afirmar é que se a dúvida resplandece e ofusca a acusação, não havendo prova segura da autoria, impõe-se que a absolvição do denunciado. Nesse sentido: “APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO TENTADO. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. DECLARAÇÃO DA VÍTIMA CONSTANTE APENAS DA FASE INQUISITORIAL. PROVA JUDICIAL DEFICIENTE. CONDENAÇÃO TEMERÁRIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NO PROCESSO PENAL E PRESUNÇÃO DE RESPONSABILIDADE. DESCABIMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 156 DO CPP. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO ACUSATÓRIO E DA NÃO-CULPABILIDADE. MEROS INDICÍOS. APLICAÇÃO DO COMANDO DO ART. 155 DO CPP. ABSOLVIÇÃO PROFERIDA. RECURSO PROVIDO. A prolação de qualquer sentença condenatória demanda prova concreta e irrefutável da autoria. Em crimes contra o patrimônio, quase sempre perpetrados na clandestinidade, a palavra da vítima é de especial relevo. No entanto, esse crédito que se dá aos relatos dos ofendidos não é absoluto, devendo sempre vir alicerçado em outros elementos de convicção. Desse modo, não tendo sido possível a oitiva da vítima em juízo e ausentes elementos sob o crivo do contraditório quanto à imputada autoria, surgindo a dúvida, esta se resolve a favor do acusado. No modelo de processo penal democrático delineado pela Constituição da República de 1988, incumbe ao Ministério Público provar, de forma cabal, o alegado na denúncia, em obediência à interpretação ao comando estatuído no art. 156, primeira parte, do CPP, segundo o qual "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer". Conforme o art. 155 do CPP, "O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas". Não se colhendo da prova judicializada a certeza necessária quanto ao fato narrado na denúncia, outra solução não há senão a prolação de um Decreto absolutório com base no princípio do in dubio pro reo. Recurso provido”. (TJMG; APCR 1.0701.14.027579-6/001; Rel. Des. Nelson Missias de Morais; Julg. 01/03/2018; DJEMG 12/03/2018) Ademais, ninguém pode ser condenado com fundamento em indícios, conjecturas ou suspeitas, como se verifica no caso em analise, vez que a condenação exige prova plena, inconteste em que se arrime. Portanto, ante a carência de substrato probatório, em homenagem ao aforismo in dubio pro reo, imperiosa a absolvição do réu com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. 3. Dispositivo Diante o exposto, com arrimo nos fundamentos acima expostos, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal, consubstanciada na denúncia para CONDENAR o réu ELISTON RIBEIRO DA SILVA, qualificado nos autos, como incurso na prática do crime descrito no art. 155, §4º, II, do Código Penal, bem como ABSOLVÊ-LO da prática do delito descrito no art. 180, caput, do Código Penal, nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal. 4. Dosimetria Passo, por conseguinte, e destacadamente, à dosimetria da reprimenda penal do acusado, em obséquio ao princípio constitucional da individualização da pena (CF, art. 5º, inc. XLVI) e ao critério trifásico estabelecido no artigo 68 do Estatuto Repressivo. O Código Penal atribui para o crime de furto qualificado, a pena de reclusão de dois a oito anos, e multa 1ª Fase - Circunstâncias judiciais Verificando as condições do acusado e do crime, passo a dosimetria da pena atenta as circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do Código Penal. A culpabilidade do réu é normal à espécie, nada tendo a valorar; o não réu registra antecedentes; e nada existe de palpável nos autos sobre sua conduta social, além do que não existem elementos para aferir sua personalidade; o motivo do delito se constitui pelo desejo de obter lucro fácil, o que caracteriza a própria tipicidade da figura delitiva do crime; as circunstâncias são normais a espécie; consequências a meu ver não transcendem da normalidade; comportamento da vítima em nada contribuiu para a atividade criminosa. Assim, considerando que as circunstâncias judiciais são favoráveis, fixo a pena base do mínimo legal, ou seja, em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias multa. 2ª Fase - Circunstâncias legais Ausente agravantes a serem consideradas. Incide a atenuante da confissão (CP, art. 65, II, “d”). Todavia, deixo de considera-la, vista que a pena base foi fixada no mínimo legal, nos termos da Súmula 231 do STJ. 3ª Fase - Causas de diminuição e de aumento de pena Inexistem causas de aumento ou diminuição. Desse modo, torno a pena em definitivo do réu ELISTON RIBEIRO DA SILVA EM 2 (DOIS) ANOS DE RECLUSÃO E 10 (DEZ) DIAS MULTA. No que tange a pena de multa, considerando as mesmas circunstâncias judiciais e atento ao disposto nos artigos 49 e 60, ambos do CP, bem como, tendo em vista a situação econômica do acusado, atribuo o valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, para cada dia multa. Do regime de Pena Deverá o réu cumprir a pena inicialmente em regime aberto, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal. Benefícios Legais [Substituição de Pena, Suspensão Condicional da Penal] Considerando o disposto nos incisos I, II e III, do artigo 44 do Código Penal, entendo que os requisitos autorizadores da aplicação da medida socialmente adequada estão presentes, motivo pelo qual, após analisadas as condições econômicas do réu, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, a ser fixada pelo Juízo da Vara da Execução Penal. Valor Mínimo para Reparação dos Danos (CPP, art. 387, IV) Deixo de arbitrar o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, a teor do inciso IV do artigo 387 do Código de Processo Penal, considerada ausência de pedido explícito nesse sentido. Manutenção ou Imposição de Prisão Preventiva ou outra Medida Cautelar Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade, considerando a pena aplicada, o regime fixado ao cumprimento da pena, bem como, ausente os requisitos da prisão preventiva. Custas e Despesas Processuais e Honorários Advocatícios Condeno o réu ao pagamento das custas e despesas processuais, conforme dispõe o art. 804, do CPP, salientando que eventual pleito de Justiça gratuita poderá ser concedido na fase de execução e pelo juízo competente, porquanto este é o momento adequado para aferir a sua real situação financeira, uma vez que existe a possibilidade de alteração desta, após a data da condenação. 5. Disposições finais Cumpra a Secretaria Judicial às seguintes providências: a) Cientifiquem-se o Ministério Público e a Defesa Técnica do teor da presente sentença. b) Desnecessária a intimação (pessoal) do(a/s) réu(s), considerada a regra prevista no art. 369, § 2º, II, do Código de Normas Gerais da Corregedoria-Geral da Justiça – Foro Judicial [“Em caso de acusado solto, bastará a intimação de sua Defesa Técnica, sendo ela pública, constituída ou dativa”]. c) Intime-se a vítima [CPP, Art. 201, §2º]. Certifique-se quanto à existência de objetos apreendidos nos autos. Na hipótese, o réu deverá ser intimado para restitui-los, comprovando a propriedade, sob pena de perdimento. Após o trânsito em julgado desta sentença: a) INSIRA-SE no sistema conveniado ao Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Mato Grosso (SIEL), o teor desta condenação, nos termos do artigo 71, § 2º, do Código Eleitoral c/c artigo 15, inciso III, da Constituição Federal. b) OFICIEM-SE aos Institutos de Identificação Criminal Nacional e Estadual, bem como aos Cartórios Distribuidores desta Comarca e de residência e nascimento do réu, para as anotações pertinentes. c) EXPEÇA-SE Guia de Execução Penal Definitiva, encaminhando-se à Vara de Execuções Penais competente. Cumpridas todas essas providências, arquivem-se os autos, com as anotações e baixas de estilo, inclusive, com baixa na distribuição Rondonópolis/MT, datado e assinado digitalmente. CRISTHIANE TROMBINI PUIA BAGGIO Juíza de Direito [1] Tema Repetitivo 934/STJ: “Consuma-se o crime de furto com a posse de fato da res furtiva, ainda que por breve espaço de tempo e seguida de perseguição ao agente, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.” [2] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: volume único. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2023.

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Processo nº 1016090-40.2024.8.11.0003

ID: 337507064

Tribunal: TJMT Órgão: 3ª VARA CRIMINAL DE RONDONÓPOLIS Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1016090-40.2024.8.11.0003

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A.

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

LAZARO JOSE GOMES JUNIOR

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GRAZIELLI BRANDAO GOMES

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