Processo nº 1003152-85.2025.8.11.0000
ID: 339672793
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 1003152-85.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
31/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ALEXANDRE TORRES VEDANA
OAB/PR XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003152-85.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Liminar] R…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003152-85.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Liminar] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ALEXANDRE TORRES VEDANA - CPF: 388.122.901-91 (ADVOGADO), MARCO ANTONIO DOS SANTOS PERIN - CPF: 913.890.039-49 (AGRAVANTE), NILDA DA SILVA ALVES - CPF: 570.223.211-91 (AGRAVADO), NILSATER ENGENHARIA FLORESTAL LTDA - CNPJ: 09.604.548/0001-15 (AGRAVADO), ULISSES ANTONIO DE CARVALHO NETO - CPF: 012.033.501-80 (AGRAVADO), PATRICIA ALVES DE CARVALHO - CPF: 018.487.481-59 (AGRAVADO), MARCOS ANTONIO RUIZ - CPF: 621.691.901-63 (AGRAVADO), MARCOS ANTONY BARBOSA DE OLIVEIRA - CPF: 034.693.411-76 (AGRAVADO), LEONARDO PAULO AIMI - CPF: 446.672.640-04 (AGRAVADO), BOESING UNIAO AGROFAMILIAR LTDA. - CNPJ: 26.249.721/0001-23 (AGRAVADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0003-06 (AGRAVADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (AGRAVADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. AVERBAÇÃO PREMONITÓRIA. ESCRITURA DE DOAÇÃO. INDÍCIOS DE FALSIDADE DOCUMENTAL. FRAUDE EM CADEIA DOMINIAL. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA CONFIGURADOS. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão que deferiu parcialmente tutela provisória de urgência, determinando averbação premonitória nas matrículas dos imóveis rurais objeto da lide, impedindo atos de disposição até ulterior deliberação judicial. O agravante sustenta ser donatário legítimo dos imóveis por força de escritura pública lavrada em 2009, alegando que terceiros promoveram sequência de falsificações documentais e atos notariais fraudulentos para transferência indevida da titularidade dos bens. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se a tutela provisória concedida, limitada à averbação premonitória, encontra-se adequadamente fundamentada diante dos requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil, considerando a existência de escritura de doação anterior às alegadas transferências fraudulentas e a necessidade de proteção da cadeia dominial contra possíveis atos de má-fé de terceiros. III. Razões de decidir 3. A decisão agravada demonstrou prudência ao reconhecer a presença dos requisitos da tutela provisória, considerando que a escritura de doação de 2009 possui anterioridade temporal em relação às supostas alienações posteriores, configurando interesse jurídico prioritário do donatário na linha sucessória legítima, conforme artigos 1.228 e 1.245 do Código Civil. 4. O fumus boni iuris encontra-se evidenciado na existência de documento público idôneo e na demonstração de indícios robustos de falsidade material e ideológica em procurações e contratos que permitiram alienações subsequentes dos mesmos bens, circunstância corroborada por elementos probatórios nos autos e em ação paralela. 5. O periculum in mora resta configurado diante da possibilidade concreta de novas fraudes ou consolidação indevida de registros em favor de terceiros adquirentes de má-fé, com potencial prejuízo irreversível à cadeia dominial, justificando a medida cautelar de averbação premonitória. 6. A averbação premonitória, prevista nos artigos 799, inciso IX, e 828 do Código de Processo Civil, constitui mecanismo legítimo de preservação da utilidade da tutela jurisdicional, conferindo publicidade à existência da demanda e limitando efeitos quanto à boa-fé de terceiros, sendo compatível com a finalidade cautelar em demandas envolvendo alegações de fraude complexa. 7. A decisão observou adequadamente que a suspensão da eficácia de atos notariais dotados de fé pública exige contraditório e cognição plena, sendo a via adequada o julgamento definitivo, salvo hipóteses de falsidade manifesta que ainda carecem de prova técnica formal no presente estágio processual. IV. Dispositivo e tese 8. Agravo de Instrumento conhecido e desprovido. Tese de julgamento: "A averbação premonitória em matrícula imobiliária constitui medida cautelar adequada quando evidenciados indícios de fraude na cadeia dominial e a existência de título translativo anterior, sendo suficiente para sua concessão a demonstração do fumus boni iuris e do periculum in mora, independentemente da cognição exauriente sobre a falsidade de atos notariais posteriores." Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 300, 799, IX, e 828; CC, arts. 1.228 e 1.245. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, 4ª Câmara de Direito Privado, AI 10192242620208110000, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 11.11.2020; TJ-MT, 3ª Câmara de Direito Privado, AI 1009298-16.2023.8.11.0000, Rel. Des. Antonia Siqueira Gonçalves, j. 26.07.2023; TJ-GO, 7ª Câmara Cível, AI 5474140-59.2022.8.09.0064, Rel. Des. Fabiano Abel de Aragão Fernandes, j. 17.10.2022. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento interposto por Marco Antônio dos Santos Perin, contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Várzea Grande/MT, nos autos da Ação de Rito Comum nº 1044827-56.2024.8.11.0002, que, em sede de tutela provisória de urgência, deferiu parcialmente os pedidos formulados, determinando a expedição de ofício ao Cartório do 1º Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Colniza/MT para averbação da existência da ação (averbação premonitória) nas matrículas nº 417, 418, 419, 420, 421 e 422, impedindo, por ora, atos de disposição sobre tais imóveis até ulterior deliberação judicial. O agravante alega ser donatário legítimo das frações dos imóveis rurais registrados nas mencionadas matrículas, por força de escritura pública de doação lavrada em 17/09/2009, outorgada por seu avô, Giácomo Perin, conforme documento público registrado no 1º Tabelionato de Notas de Francisco Beltrão/PR. Sustenta que, por conta da ausência de georreferenciamento à época, a escritura não pôde ser levada imediatamente a registro. Alega, ainda, que terceiros, por meio de uma sequência de falsificações documentais e atos notariais fraudulentos, promoveram a lavratura de procurações e escrituras de compra e venda falsas, com posterior tentativa de transferência indevida da titularidade dos imóveis em benefício dos agravados, como se fossem legítimos procuradores do falecido, envolvendo pessoas físicas e jurídicas. Sustenta que os documentos públicos que instruem as falsas transferências são absolutamente nulos e que os pagamentos relativos às supostas aquisições foram realizados em contas vinculadas à empresa Nilsater Engenharia Florestal Ltda., da qual a ré Nilda da Silva Alves é sócia. Defende que a decisão da 4ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande, nos autos nº 1036722-32.2020.8.11.0002, não constitui óbice para o registro da escritura de doação em seu favor, pois não o tem como parte e versa sobre medidas protetivas em face de terceiros adquirentes. Nas razões do presente recurso, o agravo postula essencialmente, a reforma parcial da decisão agravada para: i) determinar expedição de ofício ao Serviço Notarial e Registral do Distrito de Bom Sucesso, pertencente à comarca de Várzea Grande/MT, determinando que anote a suspensão da eficácia das procurações lavradas em 18/07/2019 na Folha 72 do Livro 43 e em 24/09/2019 na Folha 168 do Livro 43; e também que se abstenha de expedir traslados/certidões atestando sua existência, salvo se solicitada pelo Poder Público; e, ainda que não mais reconheça firmas atribuídas a GIÁCOMO PERIN; ii) determinar expedição de ofício ao Tabelionato de Notas de Querência/MT, com ordem para que anote a suspensão da eficácia do substabelecimento lavrado em 02/07/2019 na Folha 073 do Livro 0062-P; da escritura de compra e venda lavrada em 04/09/2019 na Folha 153 do Livro 057-N; e da escritura de compra e venda lavrada em 14/05/2020 na Folha 040 do Livro 0061-N; e também que se abstenha de expedir traslados/certidões atestando sua existência, salvo se solicitada pelo Poder Público.” Sem pedido de tutela recursal de urgência. O Estado de Mato Grosso apresentou contrarrazões, sustentando que o juízo de primeiro grau atuou dentro dos parâmetros legais ao reconhecer a presença dos requisitos previstos no art. 300 do Código de Processo Civil e, com base nisso, concedeu a medida cautelar de averbação premonitória nas matrículas dos imóveis em litígio, com o objetivo de conferir publicidade à demanda e resguardar eventuais direitos de terceiros de boa-fé. Requereu, assim, o desprovimento do recurso de agravo de instrumento, para que seja integralmente mantida a decisão interlocutória agravada (Id. 275795381). Os demais agravados não foram intimados, tendo em vista que os Avisos de Recebimento (ARs) foram devolvidos sem cumprimento. A Procuradoria-Geral de Justiça por meio do parecer da d. Procuradora de Justiça, Elisamara Sigles Vodonós Portela, manifestou-se pelo desprovimento do recurso de agravo de instrumento, devendo ser mantida a decisão agravada por seus próprios fundamentos (Id. 289251859). Os autos foram conclusos ao Eminente Relator, Desembargador Deosdete Cruz Junior, que, por meio da decisão proferida sob o Id. 289875385, reconheceu a incompetência da Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo para julgar a presente demanda, determinando a redistribuição do recurso para uma das Câmaras Cíveis de Direito Privado deste Egrégio Tribunal. A decisão teve por fundamento o art. 21, inciso II, alínea “a”, do Regimento Interno, bem como a orientação jurisprudencial firmada sobre a matéria, conforme se extrai do seguinte trecho, que ora transcrevo: “[...] Analisando detidamente os autos, verifica-se que, embora o Estado de Mato Grosso figure no polo passivo da demanda originária, a natureza jurídica da lide é nitidamente de direito privado, por envolver relação patrimonial e sucessória entre particulares, especificamente acerca da validade de ato de liberalidade, da regularidade de procurações, de escrituras públicas de compra e venda, contratos particulares, registros imobiliários e da autenticidade de documentos públicos e privados. Nos termos do art. 21, inciso II, alínea “a”, do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça, compete às Câmaras Cíveis Isoladas Ordinárias de Direito Privado o julgamento dos recursos interpostos contra decisões de juízes de primeiro grau em matéria de Direito Privado. Eis o teor da norma: Art. 21 - Às Câmaras Cíveis Isoladas Ordinárias de Direito Privado compete: II - Julgar: a) os recursos das decisões dos Juízes de Primeiro Grau em matéria cível de Direito Privado; (Alterado E.R. n.º 008/2009 -TP). A inserção do Estado na lide não tem o condão de modificar a natureza essencialmente civil do objeto litigioso, especialmente porque a eventual responsabilidade a ser imputada ao ente público é reflexa e subsidiária, decorrente de atos notariais praticados por delegatários do serviço público, o que, por si só, não desnatura o caráter privado da demanda. Nesse contexto, observa-se que tramita, paralelamente, a ação anulatória de registros públicos e atos notariais, registrada sob o n. 1036722-32.2020.8.11.0002, perante a 4ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT, versando sobre os mesmos imóveis, fatos e personagens envolvidos no presente recurso, o que reforça a competência das Câmaras de Direito Privado para análise da matéria. A coexistência de demandas paralelas — uma submetida à jurisdição cível e outra à Câmara de Direito Público — gera risco concreto de decisões conflitantes, em afronta aos princípios da segurança jurídica, da economia processual e da efetividade da prestação jurisdicional. Com efeito, este Tribunal de Justiça tem entendido que a mera presença de ente público na relação processual não atrai, por si só, a competência das Câmaras de Direito Público, quando o objeto litigioso é eminentemente de Direito Privado: DIREITO PROCESSUAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL INTERPOSTA EM AÇÃO INDENIZATÓRIA POR ATRASO NA ENTREGA DE OBRA. CONTROVÉRSIA ENTRE JUÍZA CONVOCADA NA 2ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO E DESEMBARGADOR INTEGRANTE DA 1ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, AMBAS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MATO GROSSO. COMPETÊNCIA FIRMADA COM BASE NA NATUREZA DA RELAÇÃO JURÍDICA LITIGIOSA. CONFLITO PROCEDENTE PARA RECONHECER A COMPETÊNCIA DA CÂMARA CÍVEL DE DIREITO PRIVADO. I. Caso em exame 1. Conflito negativo de competência deflagrado por Desembargador integrante da Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo em face do declínio de competência proferido por Juíza convocada na Segunda Câmara de Direito Privado, porquanto ambos se consideram incompetentes para julgar a Apelação Cível n. 0003058-55.2019.8.11.0004 (art. 66, II, do CPC). II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em averiguar se a só presença de ente municipal no polo passivo de ação cível indenizatória tem o condão de atrair a competência da Câmara Cível Isolada Ordinária de Direito Público e Coletivo. III. Razão de decidir 3. A competência das Câmaras Cíveis de Direto Privado e das Câmaras Cíveis de Direito Público e Coletivo, é fixada em função da natureza da relação jurídica litigiosa, de sorte que a competência, como critério geral, deve ser estabelecida em razão do pedido e da causa de pedir, e não dos sujeitos processuais. 4. A apelação cível foi interposta no bojo de ação cível indenizatória que trata exclusivamente de atraso na entrega de imóvel, de modo que a relação jurídica subjacente ao recurso tem inegável natureza de Direito Privado, tanto que a ação fora processada e julgada pela 4ª Vara Cível da Comarca de Barra do Garças/MT, e não pela Vara de Fazenda Pública, sendo certo, outrossim, que não há interesse público direto envolvido na lide, nem se trata de contrato típico da Administração Pública, de modo que a presença do Município de Barra do Garças/MT no polo passivo da ação à conta de sua suposta contribuição para o atraso na conclusão da obra, em razão da dubiedade de mapas do loteamento disponíveis em seus bancos de dados; não é causa, por si só, para que o recurso seja examinado pela Câmara de Direito Público, haja vista a natureza privada do contrato pactuado. IV. Dispositivo e tese 5. Conflito negativo julgado procedente, a fim de declarar a Câmara Cível Isolada Ordinária de Direito Privado como competente para julgar a Apelação Cível n. 0003058-55.2019.8.11.0004. Tese de julgamento: “Se o Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Mato Grosso define pela matéria e não pela pessoa a competência recursal das Câmaras Cíveis Isoladas, o fundamento suficiente e determinante para determinar-se a competência, seja das Câmaras Cíveis de Direto Privado, seja das Câmaras Cíveis de Direito Público e Coletivo, efetivamente, é a natureza da relação jurídica em litígio.” (TJ/MT. N.U 1001287-27.2025.8.11.0000, ÓRGÃO ESPECIAL CÍVEL, GILBERTO GIRALDELLI, Órgão Especial, Julgado em 27/02/2025, Publicado no DJE 27/02/2025). Diante de todo o exposto, impõe-se o declínio da competência para uma das Câmaras de Direito Privado deste Egrégio Tribunal, para o adequado processamento e julgamento do presente recurso, observando-se, inclusive, eventual prevenção em razão da ação originária mencionada.” Os autos foram redistribuídos em cumprimento a decisão de ID 289875385. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Cuida-se de agravo de instrumento interposto por MARCO ANTONIO DOS SANTOS PERIN, contra decisão interlocutória proferida nos autos da Ação de Rito Comum n. 1044827-56.2024.8.11.0002, em trâmite perante a 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Várzea Grande/MT, que deferiu parcialmente os pedidos de tutela provisória. Nos autos de origem, Marco Antônio dos Santos Perin, ajuizou ação ordinária com pedido de tutela provisória contra diversos réus, incluindo pessoas físicas e jurídicas, além do Estado de Mato Grosso. Alega que, por escritura lavrada em 2009, seu avô Giácomo Perin lhe doou imóveis registrados em Colniza/MT. Contudo, por meio de um conjunto de falsificações, inclusive de documentos públicos, procurações, cédulas de identidade, certidões e até selos de autenticidade, a titularidade dos imóveis teria sido transferida indevidamente a terceiros, mediante suposta fraude coordenada por Nilda da Silva Alves e outros. Os pedidos liminares foram formulados com o objetivo de se determinar: (i) o registro imediato da doação; (ii) a averbação da indisponibilidade dos imóveis pertencentes aos réus; (iii) a suspensão da eficácia de atos notariais reputados fraudulentos; e (iv) a proteção possessória e patrimonial até o julgamento final da ação. O agravante anexou, como prova, escritura pública de doação lavrada em 2009, anterior a qualquer alienação posterior dos referidos imóveis. Apresentou indícios de falsidade material e ideológica em diversas procurações e contratos que permitiram a alienação subsequente dos mesmos bens. Demonstrou, ainda, que o registro da escritura de doação não foi efetivado à época em razão da ausência de georreferenciamento. Ademais, apontou que os réus agiram em conluio, circunstância evidenciada por movimentações bancárias e por elementos constantes nos autos da ação paralela (n. 1036722-32.2020.8.11.0002, em trâmite na 4ª Vara Cível de Várzea Grande), incluindo tentativa de acordo frustrada. A controvérsia devolvida a esta instância recursal restringe-se à extensão e eficácia da tutela concedida, à luz da situação fática peculiar e da moldura probatória já estabelecida nos autos originários. A decisão agravada considerou, em juízo sumário de cognição, que eventual registro da doação encontra-se obstado por medida cautelar concedida nos autos da Ação nº 1036722-32.2020.8.11.0002, em trâmite na 4ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT, onde foi determinada a indisponibilidade das matrículas em razão de alegada falsidade documental, consistente na outorga fraudulenta de procurações e escrituras de compra e venda. A liminar proferida naquela demanda, contudo, teve como escopo específico impedir o registro de títulos originados de tais instrumentos viciados, não abrangendo, por sua própria extensão subjetiva e objetiva, a escritura de doação anteriormente firmada em favor do agravante. Com efeito, é notório que a doação objeto da presente lide foi formalizada em data anterior às supostas alienações posteriores, estas, inclusive, já obstadas por decisão judicial. Cuida-se de negócio jurídico revestido de validade formal e anterioridade registral (ainda que não efetivada), o que confere ao donatário, herdeiro necessário de seu avô o interesse jurídico evidente e prioritário no reconhecimento de seu direito real, conforme delineado nos arts. 1.228 e 1.245 do Código Civil, in verbis: “Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.” “Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.” O cenário descrito evidencia, de forma robusta, a presença do fumus boni iuris, revelado na existência de documento público idôneo, a escritura de doação que encontra respaldo na linha sucessória legítima do agravante. Do mesmo modo, o periculum in mora também se encontra configurado, diante da possibilidade de novas fraudes ou da consolidação indevida de registros em favor de terceiros adquirentes de má-fé, com potencial prejuízo irreversível à cadeia dominial. Não bastasse isso, a própria decisão agravada deferiu a averbação premonitória nas matrículas referidas, reconhecendo implicitamente o risco de dilapidação do direito invocado pelo agravante, o que reforça a compatibilidade da medida com a finalidade cautelar da demanda. A averbação premonitória, prevista nos artigos 799, inciso IX, e 828 do Código de Processo Civil, constitui mecanismo voltado à preservação da utilidade da tutela jurisdicional, mediante publicidade da existência da demanda e limitação de efeitos erga omnes quanto à boa-fé de terceiros. Vejamos: “Art. 799. Incumbe ainda ao exequente: [...] IX - proceder à averbação em registro público do ato de propositura da execução e dos atos de constrição realizados, para conhecimento de terceiros.” “Art. 828. O exequente poderá obter certidão de que a execução foi admitida pelo juiz, com identificação das partes e do valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis, de veículos ou de outros bens sujeitos a penhora, arresto ou indisponibilidade.” Assim, a manutenção da medida mostra-se não apenas juridicamente possível, mas absolutamente necessária, sobretudo em demandas que envolvem alegações de fraude complexa e a presença de múltiplos réus. Nesse sentido é o julgado deste Eg. Tribunal de Justiça: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO MONITÓRIA – AVERBAÇÃO PREMONITÓRIA REALIZADA EM 2015 – IMÓVEL VENDIDO – ALEGAÇÃO DE PREJUÍZO DO TERCEIRO ADQUIRENTE – INVIABILIDADE DE PLEITEAR DIREITO ALHEIO EM NOME PRÓPRIO - FUNDAMENTO DA DECISÃO NÃO IMPUGNADO – ANOTAÇÃO COM OBJETIVO DE EVITAR FRAUDE À EXECUÇÃO E DAR CIÊNCIA A TERCEIROS – POSSIBILIDADE INCLUSIVE EM AÇÃO DE CONHECIMENTO – RECURSO NÃO PROVIDO. Se o agravado não impugna o fundamento da decisão que por si só a mantém, impõe-se o não o provimento do Recurso. A averbação premonitória é possível mesmo em fase de conhecimento para que se evite fraude à execução e dê ciência a terceiro sobre demanda que envolve o imóvel que pretende adquirir.” (10192242620208110000 TJ-MT, Quarta Câmara de Direito Privado, Relator: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Data de Julgamento: 11/11/2020, Data de Publicação: 11/11/2020). (grifo nosso). No que se refere à suspensão da eficácia dos atos notariais, o juízo de origem acertadamente observa que a fé pública exige o contraditório e a cognição plena, sendo a via adequada o julgamento definitivo, salvo nas hipóteses em que a falsidade se apresente de forma manifesta, o que, no presente caso, pode até ser plausível, mas ainda carece de prova técnica formal. Nesse sentido, julgado do Eg. Tribunal de Justiça de Goiás, verbis: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATOS JURÍDICOS C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. SUPOSTA SIMULAÇÃO. INDÍCIOS DE OCULTAÇÃO DE BENS. DECISÃO MANTIDA. 1. Trata-se o agravo de instrumento de recurso cuja análise pela instância revisora cinge-se à verificação do acerto ou desacerto da decisão agravada. Vale dizer, nos estreitos limites da espécie recursal, não é possível o exame de temas não abordados na decisão recorrida, ainda que versem sobre matéria de ordem pública, sob pena de suprimir-se a atuação jurisdicional do julgador de 1ª instância, corrompendo seu livre convencimento. 2. Nos termos do artigo 300, caput, do CPC, a concessão da tutela provisória de urgência condiciona-se a demonstração da probabilidade do direito alegado e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. 3. Havendo indícios de ocorrência de suposta simulação dos negócios jurídicos e de ocultação de bens das partes, é necessário que haja a devida instrução processual, por meio do contraditório e ampla dilação probatória. 4. Não sendo determinada a quebra do sigilo bancário, e apenas estabelecido que fosse realizada busca/pesquisa por meio do sistema SISBAJUD, nas contas bancárias em nome das partes requeridas, a fim de aferir os valores existentes nessas, não há se falar em violação à intimidade da parte agravante, porquanto essa diligência é perfeitamente razoável ao caso em tratativa, porque o conhecimento da existência do ajuizamento da demanda pode ensejar tentativa de transferência de valores a terceiros. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJ-GO 5474140-59 .2022.8.09.0064, Relator.: DESEMBARGADOR FABIANO ABEL DE ARAGÃO FERNANDES - (DESEMBARGADOR), 7ª Câmara Cível, Data de Publicação: 17/10/2022). (grifo nosso) E deste Sodalício: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EMBARGOS DE TERCEIRO – LIMINAR INDEFERIDA – FUNDAMENTOS DA DECISÃO QUE DETERMINA A CONSTRIÇÃO CAUTELAR NÃO IMPUGNADOS – CRÍVEL NULIDADE DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS QUE ANTECEDERAM E CULMINARAM NA AQUISIÇÃO DAS PROPRIEDADES CONSTRITAS – COMANDO DECISÓRIO QUE DEVE SER COMPREENDIDO COM O CONTEXTO DA FUNDAMENTAÇÃO, CONJUNTO DA POSTULAÇÃO E BOA-FÉ – CONTEXTO DE NULIDADE QUE NÃO É RETORQUIDO PELA SINGELA ALEGAÇÃO DE TITULARIDADE IMOBILIÁRIA – MEDIDA DE CUNHO CAUTELAR – AUSENTE PREJUÍZO – NECESSIDADE DE CONTRADITÓRIO JUDICIAL E DILAÇÃO PROBATÓRIA PARA MELHOR ELUCIDAR OS FATOS – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO E AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. Há na demanda anulatória que determina a constrição cautelar robustas evidências documentais de que os imóveis e direito contritos derivaram de aparente conluio de simulações de sucessivas alienações em detrimento da autora da demanda anulatória, por ocasião de divórcio extrajudicial aparentemente maculado de nulidade, culminando na titularidade da parte agravante/embargante. Conquanto na decisão conste que a constrição deve ser efetivada contra os bens e direitos em nome do casal, tal comando não pode ser estritamente considerado, eis que do analítico exame dos fundamentos da decisão, do conjunto da postulação e da boa-fé, consoante arts. 5º e 322, § 2º do CPC, constata-se, ao menos em seara sumária, que a magistrada refere-se aos “bens do casal” como sendo os que foram objeto dos negócios jurídicos suspeitos, os quais atualmente não mais estão sob titularidade deles, mas de terceiros, dentre os quais a parte agravante, indicada como suposta amante do requerido da demanda anulatória, ora titular da pessoa jurídica embargante recorrente. A escorreita razão determinante do não deferimento da liminar é a “existência de fortes elementos a ensejar a desconfiança de que a responsável pela empresa RELLUX CONSTRUTORA E CONSULTORIA EIRELI possa não ter agido de boa-fé e/ou possa ter aderido a simulação de negócios”, contexto que, por ora, prepondera sob a singela alegação de titularidade dos bens constritos. Medida constritiva combatida possui cunho cautelar que, a priori, face à robusta evidência de nulidade, deve preponderar, mormente porque não delineado nenhum prejuízo concreto e objetivo, além da própria ordem constritiva, apto a consubstanciar possível periculum in mora contra a parte agravante/embargante. Argumentos da parte embargante devem ser melhor examinados no decorrer da pertinente instrução processual judicial, quando lhe será propiciado contraditar e demonstrar de forma mais robusta a legitimidade de seu alegado direito. Recurso desprovido. Decisão mantida.” (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1009298-16.2023.8 .11.0000, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 26/07/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 31/07/2023). (grifo nosso) Diante disso, conclui-se que a decisão recorrida deve ser integralmente mantida, tanto por sua consonância com os princípios da prudência e da proporcionalidade aplicáveis à tutela provisória, quanto por estar alicerçada em elementos que evidenciam, em cognição sumária, a plausibilidade do direito afirmado e o risco de perecimento do bem jurídico tutelado. Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e NEGO-LHE provimento, para o fim de manter integralmente a decisão agravada, que deferiu parcialmente a tutela de urgência pleiteada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 29/07/2025
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