Processo nº 0000869-18.2012.8.11.0015
ID: 277217041
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0000869-18.2012.8.11.0015
Data de Disponibilização:
23/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FABIOLA BORGES DE MESQUITA
OAB/PR XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000869-18.2012.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Da…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000869-18.2012.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Efeitos] Relator: Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [OLIRIO MOSCHETTA - CPF: 156.533.589-91 (APELANTE), LEDOCIR ANHOLETO - CPF: 843.307.759-72 (ADVOGADO), BANCO TOYOTA DO BRASIL S/A - CNPJ: 02.977.348/0001-69 (APELADO), FABIOLA BORGES DE MESQUITA - CPF: 267.221.628-26 (ADVOGADO), MARILI DALUZ RIBEIRO TABORDA - CPF: 401.477.389-20 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Direito Civil. Ação Indenizatória. Financiamento De Veículo. Contrato Falso. Ação Consignatória. Ajuizamento De Busca E Apreensão Sem Justa Causa. Configuração De Dano Moral. Inexistência De Prova Do Dano Material. Parcial Provimento. I. Caso em exame 1. Consumidor ajuizou ação indenizatória em face da instituição bancária, postulando reparação por danos morais e materiais decorrentes da apreensão indevida de veículo, após disputa judicial sobre a quitação de contrato de financiamento com assinatura falsificada. II. Questão em discussão 2. A questão controvertida consiste em: (i) deliminar se a decisão proferida na ação consignatória, já transitada em julgado, abrange o pedido de indenização por danos morais, impedindo nova apreciação (coisa julgada material); (ii) se haveria bis in idem na renovação do pedido indenizatório; e (iii) se ficou comprovado o dano material alegado. III. Razões de decidir 3. A causa de pedir na ação consignatória é distinta desta, pois aquela versava sobre cobrança indevida e negativação, enquanto esta se refere ao ato processual abusivo consistente na propositura de ação de busca e apreensão em duplicidade, o que afasta a alegação de coisa julgada. 4. A apreensão judicial indevida do veículo, levada a efeito apesar da pendência de ação judicial que discutia a legitimidade do contrato, caracteriza falha na prestação do serviço bancário e enseja reparação moral por abalo à esfera extrapatrimonial do consumidor. 5. Os honorários contratuais pagos para defesa judicial, por si só, não configuram dano material indenizável, por se tratar de ônus ordinário do exercício do direito de defesa, conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso provido em parte para reformar a sentença, afastar a coisa julgada e julgar procedente o pedido de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), mantida a improcedência quanto aos danos materiais. Tese de julgamento: "A propositura de ação de busca e apreensão por instituição financeira, mesmo ciente da pendência de ação consignatória sobre o mesmo contrato, configura abuso de direito e enseja reparação por dano moral decorrente da apreensão indevida do bem." ____________________________ Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 337, §§ 1º e 4º; 485, V; CDC, art. 14.. Jurisprudência relevante citad: TJ, AgInt no AREsp 1.926.808/SP; TJ-MG, AC 10000211858543001; TJSP, Ap. Cív. 1007352-79.2023.8.26.0068. R E L A T Ó R I O RECURSO DE APELAÇÃO N.º 0000869-18.2012.8.11.0015 Trata-se de Recurso de Apelação interposto por Olírio Moschetta em virtude da sentença proferida pelo Juiz da 1ª Vara Cível da Comarca de Sinop, que julgou improcedentes os pedidos formulados na Ação Indenizatória ajuizada em face do Banco Toyota do Brasil S.A. O Juiz de 1º grau concluiu que, apesar de o Apelante ter alegado prejuízo na ordem de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), não comprovou o dispêndio desse montante, seja por meio de depósito, transferência, contrato, recibo ou outro documento idôneo, motivo pelo qual afastou a ocorrência dos danos materiais. No tocante ao dano moral, fundamentou que o Apelante ajuizou a Ação Consignatória n. 0001305-11.2011.8.11.0015, na qual foi reconhecida, por perícia grafotécnica, a falsidade da sua assinatura no contrato bancário que previa o pagamento de 48 (quarenta e oito) parcelas. Por isso, o contrato de financiamento foi declarado quitado; contudo, o dano moral foi afastado, motivo pelo qual declarou a incidência da coisa julgada sobre tal pedido indenizatório, uma vez que está embasado em fatos idênticos aos tratados neste processo. Ao final, compeliu o Apelante a arcar o ônus da sucumbência e arbitrou os honorários em 10% (dez por cento) do valor da causa. Inconformado, o Apelante assegurou que adquiriu um automóvel financiado pelo Banco Apelado em 24 (vinte e quatro) meses; no entanto, quitada a última parcela, foi surpreendido com a cobrança de mais 24 (vinte e quatro) prestações não contratadas. Afirmou que, embora tenha manejado a Ação Consignatória nº 0001305.11.2011.8.11.0015 para discutir o abuso da cobrança do dobro de parcelas contratadas, o Banco Apelado ajuizou a Ação de Busca e Apreensão nº 0000697.76.2012.8.11.0015, sem justa causa e em flagrante má-fé. Segundo ele, os danos alegados em virtude da ação de busca e apreensão não se confundem com os fatos articulados na Ação Consignatória. Requereu o reconhecimento do nexo causal entre o ajuizamento da ação de busca e apreensão e os danos materiais e morais. Alegou que os danos materiais consistem nos valores pagos aos seus advogados para representá-lo na demanda de Busca e Apreensão. Quanto aos danos morais, afirmou que não há falar em coisa julgada, pois os fatos são distintos. As contrarrazões foram anexadas no ID 222432260. É o relatório. V O T O R E L A T O R Eminentes Pares, Olírio Moschetta ajuizou Ação Indenizatória em face do Banco Toyota do Brasil S.A. e aduziu que, em 11/11/2008, adquiriu um veículo zero quilômetro no valor de R$ 115.000,00 (cento e quinze mil reais). Asseverou ter pago R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) de entrada e financiado a diferença em 24 (vinte quatro) vezes, com parcelas mensais de R$ 2.578,41 (dois mil quinhentos e setenta e oito reais e quarenta e um centavos). Aduziu que não assinou o contrato de financiamento na loja da concessionária; no entanto, recebeu boletos das 24 (vinte e quatro) parcelas, com vencimento da 1ª em 15/01/2009 e última em 15/12/2010. Sustentou que, ante a quitação do que fora contratado, solicitou a baixa do gravame em janeiro de 2011; contudo, foi informado de que ainda restavam 24 (vinte e quatro) parcelas, e que a de janeiro/2011 estava vencida. A justificativa do Banco foi a de que o carnê enviado para sua residência contém o número errado de parcelas, e que o correto seriam 48 (quarenta e oito) prestações. Alegou que, a despeito de registrada Reclamação no PROCON, recebeu cobrança no valor de R$ 3.060,47 (três mil e sessenta reais e quarenta e sete centavos), relativa à prestação vencida em 10/02/2011. Inconformado com a exigência bancária, ajuizou a Ação Consignatória n. 0001305.11.2011.8.11.0015. Arguiu que a soma do sinal (R$ 40.000,00) mais as 24 (vinte e quatro) parcelas pagas, resulta na amortização de R$ 101.881,84 (cento e um mil oitocentos e oitenta e um reais e oitenta e quatro centavos), de maneira que para solver o valor do automóvel – R$ 115.000,00 (cento e quinze mil reais) – o Banco faria jus à diferença de apenas R$ 13.118,16 (treze mil cento e dezoito reais e dezesseis centavos). Expôs que, na Ação Consignatória, o Juiz deferiu o pedido liminar, autorizou o depósito do valor incontroverso e, também, obstou a negativação do seu nome, sob pena de multa diária (decisão proferida em 24/02/2011). Aduziu que, mesmo ciente da ordem judicial, teve o seu nome inserido no cadastro de maus pagadores. E não foi só isso. O Banco foi além e, em 16/03/2011, ajuizou a Ação de Busca e Apreensão 0000697-76.2012.8.11.0015, cujo pedido liminar foi deferido. O veículo foi apreendido em 25/01/2012 e restituído no dia seguinte (26/01/2012), pois o Juiz singular reconheceu ter sido induzido a erro pelo Banco, que omitiu a existência da Ação Consignatória, na qual discutia a validade do contrato de financiamento em 48 (quarenta e oito) parcelas. O Apelante arguiu que o Banco apresentou o mesmo contrato nulo na demanda Consignatória e na de Busca e Apreensão, uma vez que não assinou qualquer documento no ato da compra. Afirmou, ainda, que tais ações foram reunidas para julgamento conjunto. Inconformado com o fato de que ter que contratar advogado para promover sua defesa na Ação de Busca e Apreensão, e ante a humilhação que passou perante a vizinhança com a apreensão do veículo que estava na garagem da sua residência, o Apelante ajuizou esta demanda em que requereu a reparação por danos materiais (gastos com honorários contratuais no valor de R$ 20.000,00) e morais (busca e apreensão do veículo). A inicial foi instruída com: (i) o contrato acoimado de falso, (ii) o recibo da compra no valor de R$ 115.000,00 (cento e quinze mil reais), (iii) o boleto de cobrança vencido em 10/02/2011 no valor de R$ 3.060,47 (três mil e sessenta reais e quarenta e sete centavos), (iv) a reclamação registrada no PROCON, (v) decisão liminar que autorizou o depósito do valor incontroverso na Ação n. 0001305.11.2011.8.11.0015, (vi) prova da consignação e, também, da negativação no SPC, (vii) decisão que compeliu o Apelado ao pagamento de multa pelo descumprimento da decisão na Ação Consignatória, que foi cassada no RAI 121.929/2011, (viii) defesa apresentada na Ação de Busca e Apreensão 0000697-76.2012.8.11.0015, (ix) Auto de Apreensão e Depósito lavrado em 25/01/2012 e Auto de Restituição cumprido em 26/01/2012. A instituição bancária não apresentou defesa nesta ação, embora citada. Em vista da revelia, o Juiz singular encerrou a instrução antecipadamente e prolatou sentença. Julgou procedente o pedido e arbitrou o montante da indenização por danos morais em R$ 10.000,00 (dez mil reais). Lado outro, julgou improcedente o pedido de indenização por danos materiais, por falta de provas. Inconformadas, ambas as partes apelaram. Os recursos foram julgados por esta Colenda Primeira Câmara, sob a relatoria da Desa. Nilza Maria Pôssas de Carvalho. À unanimidade, anulou-se a sentença prolatada neste feito, porque não foi observada a conexão com as outras 02 (duas) ações em trâmite (Consignatória n. 0001305-11.2011.8.11.0015 e Busca e Apreensão 0000697-76.2012.8.11.0015), já que têm causa na mesma controvérsia. Determinou que as três ações fossem julgadas conjuntamente. De conseguinte, o pedido recursal do consumidor para majorar o valor da indenização por danos morais foi julgado prejudicado. Transitada em julgado (16/06/2016) e retornada à origem, o Juiz de 1º grau determinou a reunião dos processos; no entanto, ordenou a suspensão do trâmite deste feito, que assim permaneceu até a digitalização e inclusão na plataforma do PJe, efetivada em agosto/2021. Ocorre que, em 09/09/2013, o Juiz de primeiro grau já havia proferido sentença conjunta na Ação Consignatória n. 0001305-11.2011.8.11.0015 e Busca e Apreensão 0000697-76.2012.8.11.0015. No relato dos fatos, o Julgador destacou que sobre o conflito (mesma lide) pendia esta demanda, que foi manejada por último, já que o Apelante visa compelir o Banco a reparar-lhe os danos materiais e morais provenientes do manejo da Ação de Busca e Apreensão. Salientou que o Apelante pediu que fosse declarada a quitação do financiamento com o depósito do valor incontroverso e a reparação por danos morais em virtude da negativação do seu nome. Acolheu a tese de que o contrato bancário é nulo. Declarou a quitação do financiamento, considerou sem lastro o ajuizamento da Busca e Apreensão, reconheceu a má-fé da instituição bancária e, em vista disso, impingiu-lhe o pagamento de multa processual de 1% (um por cento) do valor da causa. A despeito de considerar abusiva a cobrança promovida pelo Banco (boleto de cobrança e negativação indevida), uma vez que já havia acolhido o pedido indenizatório por danos morais nesta ação (que foi julgada antecipadamente ante a revelia do Banco), deixou de fixar nova condenação na Consignatória. Salienta-se que a sentença unitária proferida na Ação Consignatória e de Busca e Apreensão foi objeto de apelação, de relatoria da Desa. Nilza Maria Pôssas de Carvalho, na qual a preliminar de cerceamento de defesa suscitada pelo Banco foi acolhida, já que o pedido de perícia grafotécnica fora indeferido. Com o regresso dos autos, realizou-se a perícia pretendida, que concluiu não ser do Apelante a assinatura aposta no contrato bancário. Em seguida às manifestações das partes, prolatou-se nova sentença conjunta nas ações conexas: Consignatória n. 0001305-11.2011.8.11.0015 e Busca e Apreensão 0000697-76.2012.8.11.0015, sem se atentar para a reunião com este feito. Os pedidos da Consignatória foram julgados procedentes. O contrato de financiamento foi declarado quitado e o Banco compelido a indenizar o Apelante pelos danos morais na quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). De conseguinte, julgou improcedente o pedido de busca e apreensão do automóvel. As partes interpuseram Recurso de Apelação em virtude desse ato sentencial, que foi julgado na sessão de 13/09/2022. A ementa ficou assim assentada: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE CONSIGAÇÃO EM PAGAMENTO. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO. PERÍCIA GRAFOTÉCNICA. ASSINATURA FALSA. CONTRATO INVÁLIDO. VALOR CONSIGNADO. DÍVIDA QUITADA. DANO MORAL. AFASTADO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. Realizada perícia grafotécnica e constatada a falsidade da assinatura, não subsistem as cláusulas e condições nele estabelecidas. Não há que se falar em dano moral, se não aponta efetivamente uma conduta do apelante que supostamente lhe tenha causado o dano moral, faz alegações genéricas a respeito do dano moral e da possibilidade de reparação. (Sem destaques no original). Particularmente sobre o pedido indenizatório por danos morais, a ilustre Relatora ponderou que, a despeito da cobrança de valor diferente do incontroverso, o Apelante não havia quitado completamente o valor do veículo, tanto que promoveu a Ação de Consignação para depositar o valor pendente de R$ 13.118,16 (treze mil, cento e dezoito reais e dezesseis centavos). Para espancar quaisquer dúvidas sobre as razões de decidir da Relatora, que proferiu voto condutor e afastou a indenização por danos morais na Ação Consignatória, transcrevo o trecho abaixo: Em relação ao dano moral, o apelante pugna pelo afastamento da compensação que lhe foi imposta, pois a dívida existia, tanto o é que o apelado promoveu consignação do valor de R$ 13.118,16 (treze mil, cento e dezoito reais e dezesseis centavos), sendo portanto legítima a inscrição promovida junto aos cadastros competentes. Neste ponto, há que se ressaltar que o apelado ajuizou a ação de consignação em pagamento, exatamente para que pudesse garantir a quitação do veículo nos termos ajustados entre as partes, isto é, R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), 24 (vinte e quatro) parcelas de R$ 2.578,41(dois mil, quinhentos e setenta e oito reais e quarenta e um centavos), por isso, consignou o valor de R$ 13.118,16 (treze mil, cento e dezoito reais e dezesseis centavos), que faltava para quitar o contrato no montante de R$ 115.000,00 (cento e quinze mil reais). Verifica-se que inicialmente foi concedida a tutela antecipada para que o apelante se abstivesse de inscrever o nome do apelado no cadastro de inadimplentes. Da análise da petição inicial, tem-se que o apelado não aponta efetivamente uma conduta do apelante que supostamente lhe tenha causado o dano moral, faz alegações genéricas a respeito do dano moral e da possibilidade de reparação. Além disso, de fato, havia um valor em aberto, qual seja, R$ 13.118,16 (treze mil, cento e dezoito reais e dezesseis centavos), tanto que o apelado consignou tal quantia nos autos no curso do processo. Portanto, deve-se afastar a compensação imposta ao apelante. A Relatora, Des. Nilza Maria P. de Carvalho, considerou legítima a inscrição promovida pelo Banco nos cadastros de maus pagadores, e destacou que o consumidor não havia apontado a conduta da instituição bancária que teria causado o dano à sua esfera extrapatrimonial. Isto é, não houve análise do pedido indenizatório por danos morais em virtude do manejo abusivo da Ação de Busca e Apreensão. O acórdão transitou em julgado em 18/03/2024, pois no julgamento do Agravo em Recurso Especial, a Corte Superior não conheceu do Especial. Volvendo a este feito, o Juiz da causa retomou a marcha processual e, tendo em vista que a celeuma havia sido resolvida nas ações conexas, proferiu nova sentença, em que reconheceu a coisa julgada material quanto aos fatos que poderiam ensejar o pedido indenizatório por danos morais. Quanto aos danos materiais, considerou faltar provas do prejuízo material. Por isso, julgou improcedente a pretensão. Inconformado, o Apelante sustenta que houve erro de julgamento, uma vez que foram comprovados os danos morais e materiais sofridos em razão da busca e apreensão indevida de seu veículo, resultante da atuação de má-fé do Banco Apelado. Pois bem. O ponto nodal desta demanda é saber se o Apelante faz jus à indenização por danos materiais e morais em decorrência do ajuizamento da Ação de Busca e Apreensão nº 0000697-76.2012.8.11.0015, mesmo já tendo havido decisão anterior na Ação de Consignação n. 0001305.11.2011.8.11.0015. Em outros dizeres, é necessário verificar se: (i) se há repercussão da decisão anterior (Ação Consignatória) sobre o pedido atual de indenização, ou seja, se configura dupla indenização pelos mesmos fatos (bis in idem), (ii) se há existência de coisa julgada material sobre o pedido indenizatório por danos morais, (iii) se há suficiência de provas do alegado dano material. Em resumo, o Apelante insiste na separação dos fatos da ação consignatória e desta demanda indenizatória, a qual teria como causa exclusivamente a repercussão da busca e apreensão em sua esfera subjetiva. Aduziu que desejou quitar o valor que entendia pendente mediante a consignação da diferença; no entanto, teve o nome negativado por dívida não contratada e o veículo apreendido por 01 (um) dia, de forma indevida. Afirmou que houve má-fé no manejo da ação que apreendeu o veículo e, por fim, que provou os danos materiais com o pagamento de honorários contratuais para sua defesa na ação de busca e apreensão. Depois de analisar detidamente as 03 (três) ações, entendo que o recurso merece prosperar, em parte. Com efeito, conquanto determinada a reunião das 03 (três) ações que envolvem a controvérsia, visto que esta Câmara de Direito Privado considerou a identidade de causa de pedir e pedidos, esta ação foi julgada separadamente (a posteriori). A despeito disso, a decisão anterior (Ação Consignatória) não inviabiliza exame meritório do pedido de indenização por danos morais formulado neste processo, uma vez os fatos que ensejaram o manejo desta ação indenizatória são decorrentes da falta de justa causa para o ajuizamento da Ação de Busca e Apreensão quando o Banco já sabia da existência da Ação Consignatória, na qual discutia-se a validade do contrato bancário. Em outros termos, a causa subjacente desta ação não é a cobrança indevida por meio do boleto de cobrança ou da negativação, e sim do manejo da ação de busca e apreensão de maneira abusiva, que culminou no vexame de ter sido apreendido o carro, e que configura falha do serviço da instituição financeira. Nesse sentido, colaciono jurisprudências: Com efeito, a AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - BUSCA E APREENSÃO - AJUIZAMENTO INDEVIDO - DANOS MORAIS. A falha na prestação do serviço da instituição financeira consubstanciada no ajuizamento de ação de busca e apreensão indevida gera transtornos ao consumidor, não podendo ser caracterizado como mero aborrecimento e sendo, assim, cabível a indenização por danos morais. (TJ-MG - AC: 10000211858543001 MG, Relator.: Estevão Lucchesi, Data de Julgamento: 18/11/2021, Câmaras Cíveis / 14ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 18/11/2021). Ora, se o pronunciamento jurisdicional definitivo na Ação de Consignação em Pagamento, com trânsito em julgado (certificado em 18/03/2024), diz respeito a fatos distintos, não há falar em dupla indenização com o manejo desta. Logo, sem mais delongas, ao caso, não se aplica a coisa julgada material, à luz dos artigos 485, V, e 337, §§ 1º e 4º, todos do CPC. Sobre o pedido indenizatório por danos morais, entendo estar configurada a ofensa à esfera extrapatrimonial do Apelante, já que teve o veículo apreendido sem justa causa, tanto que o Juiz do processo determinou a devolução no dia seguinte, porque reconheceu ter sido induzido a erro pelo Banco Apelado. Nessa linha de raciocínio, como fornecedora, a instituição financeira deveria ter sido mais atenta e não demandar contra o cliente que já havia judicializado ação consignatória para discutir a legitimidade da cobrança de mais 24 (vinte e quatro) parcelas que afirmava não contratadas. A falta de segurança ao cliente enseja o dever de reparar os danos, tratando-se de responsabilidade objetiva. Neste contexto, assevera Cláudia Lima Marques que: A responsabilidade imposta pelo art. 14 do CDC é objetiva, independente de culpa e com base no defeito, dano e nexo causal entre o dano ao consumidor-vítima (art. 17) e o defeito do serviço prestado no mercado brasileiro. Com o CDC, a obrigação conjunta de qualidade-segurança, na terminologia de Antônio Herman Benjamin, isto é, de que não haja um defeito na prestação do serviço e conseqüentemente acidente de consumo danoso à segurança do consumidor-destinatário final do serviço, é verdadeiro dever imperativo de qualidade (art. 24-25 do CDC), que se expande pela alcançar todos os que estão na cadeia de fornecimento, ex vi art. 14 do CDC (...) (in Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 248-250). Em vista disso, entendo que o Apelante suportou vários transtornos decorrentes da falha na prestação dos serviços do Banco Apelado, já que teve ação judicial de busca e apreensão proposta contra si, sendo-lhe, por isso, devida indenização por danos morais, que fixo no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), suficiente para alcançar a dupla finalidade: compensatória e pedagógica. Nesse sentido, trago jurisprudência: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INDENIZATÓRIA - PERDA DE OBJETO - FALTA DE INTERESSE DE AGIR - AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE - COBRANÇA E AJUIZAMENTO DE BUSCA E APREENSÃO IRREGULARES - DANO MORAL - COMPROVAÇÃO - VALOR FIXADO - ADEQUAÇÃO - REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO - CABIMENTO. (...) A cobrança extrajudicial e o ajuizamento indevido de ação de busca e apreensão cujo débito não mais existia é ato ilícito indenizável. O arbitramento da indenização por danos morais deve observar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para alcançar a dupla finalidade compensatória e pedagógica da reparação, de acordo com as circunstâncias do caso e as condições socioeconômicas das partes. (...) (TJMG - Apelação Cível 1.0707.15.011986-5/001, Relator (a): Des.(a) Manoel dos Reis Morais, 20ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 07/04/2021, publicação da sumula em 08/04/2021). Relativamente aos danos materiais, de acordo com o Código Civil (art. 402) e jurisprudência do STJ, estes devem ser comprovados de forma clara e induvidosa, e não podem ser presumidos. Na espécie, o dano material está fundamentado na despesa com honorários advocatícios para defesa do Apelante na ação de busca e apreensão e, conforme adiantado, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que os custos com a contratação de advogado não configuram, por si só, dano material indenizável, pois inserem-se no âmbito do exercício regular do direito de defesa: "A contratação de advogados para defesa judicial de interesses da parte não enseja, por si só, dano material passível de indenização, porque inerente ao exercício regular dos direitos constitucionais de contraditório, ampla defesa e acesso à Justiça". (AgInt no AREsp n. 1.926.808/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 6/12/2021, DJe de 16/12/2021). Casos análogos nos Tribunais reiteram que a contratação de advogado para litígio judicial ordinário não gera direito à indenização por danos materiais. Nesse sentido, colaciono jurisprudência: APELAÇÃO. Ação que visa indenização por danos materiais decorrentes da contratação de advogado particular para o ajuizamento de ação contra a ré, na qual o autor sagrou-se vencedor. Sentença de improcedência. Apelo do demandante. Indenização pela contratação de advogado particular. É pacífico o entendimento dos tribunais superiores de que não há dano material indenizável em decorrência da contratação de advogado particular. Sentença mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível: 1007352-79.2023.8.26.0068, Relator.: Carmen Lucia da Silva, Data de Julgamento: 17/12/2023, 25ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/12/2023). RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E DANOS MORAIS. INAPLICABILIDADE DO CDC. PESSOA JURÍDICA. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO A HONRA OBJETIVA. DANOS MATERIAIS. A CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO POR SI SÓ NÃO ENSEJA DANOS MATERIAIS. PRECEDENTES DO STJ. SENTENÇA INTEGRALMENTE MANTIDA. ART 46 DA LEI 9.099/95. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. (TJ-AM - Recurso Inominado Cível: 0681902-66.2022.8.04.0001 Manaus, Relator.: Anagali Marcon Bertazzo, Data de Julgamento: 16/02/2024, 2ª Turma Recursal, Data de Publicação: 16/02/2024). No mais, tal qual entendeu o Juiz da causa, o Apelante não trouxe documentos suficientes para demonstrar outros prejuízos concretos, motivo pelo qual a sentença deve ser integralmente confirmada. Feitos esses esclarecimentos, dou parcial provimento ao recurso. Reformo a sentença, afasto a declaração de ofensa à coisa julgada. Julgo procedente o pedido indenizatório por danos morais em virtude o ajuizamento da Ação de Busca e Apreensão sem justa causa. Arbitro o montante em R$ 10.000,00 (dez mil reais), com juros de mora pela taxa da SELIC, deduzida do IPCA, a partir da citação, e correção monetária pelo IPCA a partir do arbitramento. Redistribuo o ônus da sucumbência em 50% (cinquenta por cento) para cada parte, e mantenho os honorários advocatícios. Deixo de aplicar honorários recursais porque o apelo foi provido em parte. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 20/05/2025
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