Processo nº 8002451-50.2025.8.05.0039
ID: 326332923
Tribunal: TJBA
Órgão: 2ª V DE FAZENDA PUBLICA DE CAMAÇARI
Classe: Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública
Nº Processo: 8002451-50.2025.8.05.0039
Data de Disponibilização:
16/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ELISABETE MARIA DOS SANTOS SILVA
OAB/BA XXXXXX
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COMARCA DE CAMAÇARI 2ª Vara da Fazenda Pública de Camaçari. Cento Administrativo de Camaçari, 5ª andar do Fórum de Camaçari, Centro Administrativo - CEP 42800-000 Fone: (71) 3621-8714 …
COMARCA DE CAMAÇARI 2ª Vara da Fazenda Pública de Camaçari. Cento Administrativo de Camaçari, 5ª andar do Fórum de Camaçari, Centro Administrativo - CEP 42800-000 Fone: (71) 3621-8714 SENTENÇA PROCESSO Nº: 8002451-50.2025.8.05.0039 REQUERENTE: MARILENE DE JESUS SOARES REQUERIDO: MUNICIPIO DE CAMACARI, ESTADO DA BAHIA ASSUNTO/ CLASSE PROCESSUAL: [Urgência] Vistos, etc. Dispensado o relatório, na forma dos arts. 38 da Lei n.º 9.099/95 c/c o 27 da Lei n.º 12.153/2009. Decido. 2. Das preliminares: 2.1. Nada há o que prover em relação à preliminar de incompetência absoluta do juízo eis que, na decisão ID 488183425, foi determinado o processamento do feito pelo rito das Leis n.º 12.153/2009 e n.º 9.099/95, sem, entretanto, remessa dos autos para Juízo distinto, mantendo-se o feito nesta serventia, eis que, conforme Decreto Judiciário n. 152/2022 do TJBA, os Juizados Especiais da Fazenda Pública estão, nesta Comarca, organizados sob o modelo de Juizados Especiais Adjuntos. 2.2. Deixo de acolher, como tais, as preliminares de ilegitimidade passiva e de carência de ação por falta de interesse de agir tendo em vista que as questões nelas veiculadas se confundem com o mérito da demanda e, como tais, serão devidamente enfrentadas. 2.3. Em relação à preliminar de inépcia da exordial por impossibilidade de pedido genérico, a mesma não merece qualquer agasalho, pois a petição inicial expõe de forma clara os fatos e fundamentos de seu pedido, deduzindo, de maneira igualmente inteligível, qual a pretensão que postula em face dos mesmos. Ademais, qualquer alegação sobre o cabimento da pretensão deduzida se trata de matéria que se confunde com o mérito da demanda e, como tal, será devidamente enfrentado. 2.4. Por fim, deixo de reconhecer, na espécie, a alegada perda superveniente de objeto. É que, nos termos da orientação jurisprudencial dominante, a medida liminar concedida em mandado de segurança ou procedimento comum, ainda que ostente caráter satisfativo, reclama a confirmação de seus efeitos por sentença de mérito. Neste sentido, trago à colação o julgado do eg. Tribunal Regional Federal da Primeira Região, a seguir ementado: "PROCESSUAL CIVIL - MANDADO DE SEGURANÇA - RITO OBRIGATÓRIO COM PRÉVIA OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO (ART. 81 E ART. 82 DO CPC E ART. 10 DA LEI Nº 1.533/51) - LIMINAR DEFERIDA: CONFIRMAÇÃO DOS EFEITOS POR SENTENÇA - PERDA SUPERVENIENTE DE INTERESSE PROCESSUAL NÃO CONFIGURADA. 1. Trata-se de mandado de segurança, em que, por força de preceitos legais (art. 81, art. 82 e art. 84 do CPC e art. 10 da Lei nº 1.533/51) não revogados expressamente, é obrigatória a oitiva do Ministério Público, que não pode ser dispensada. 2. O cumprimento de liminar satisfativa não induz perda de objeto do MS, pois necessária a confirmação de seus efeitos. 3. Apelação provida em parte: afastada a extinção do processo sem resolução do mérito, determinando-se o retorno dos autos à origem para que, após regular processamento do feito, outra sentença se profira como de direito se entender. 4. Peças liberadas pelo relator, em 03/06/2008, para publicação do acórdão." (AMS2006.32.00.003517-9/AM, Sétima Turma, relator o Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral, "D.J.e." de 11.7.2008) 3. Em relação ao mérito da demanda, da análise dos elementos constantes dos autos, em cotejo com a legislação de regência e com a orientação dos Tribunais sobre a matéria, tenho que a medida de urgência antes deferida deve ser confirmada, a conduzir à parcial procedência do pedido formulado. De fato, das informações constantes nos autos (IIDD 487984020, 487984022 e 487984023), a parte autora possui sequela motora à direita decorrente de episódios prévios de AVCI e AVCH, necessitando de apoio unilateral para deambular. Por igual, existe suspeita clínica de novo AVC em dezembro/2024 devido a piora dos déficits prévios e disartria moderada. Em razão do respectivo quadro, necessita se submeter aos exames de ressonância magnética de crânio, angiorressonância de vasos cerebrais e cervical, holter 24 horas, MAPA 24 horas e ecocardiografia transtorácica. Por igual, conforme documento ID 494146577, o especialista no Sistema NatJus confirmou a adequação dos exames prescritos para a condição clínica da paciente, indicando a existência de evidências científicas, constantes na literatura médica. Ademais, a parte autora também necessita de fornecimento de transporte eis que se locomove mediante uso de muletas, bem como não dispõe de condições para arcar com os custos do transporte para realização de exames em Salvador. 3.1. Está na Constituição Federal (negritos ausentes dos originais): "Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana; (...)Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação." 3.2. A obrigação do(s) réu(s) em assegurar tratamento de saúde adequado ao autor - e, por conseqüência, a(s) sua(s) legitimidade(s) passiva(s) - está assentada, uma vez que, na forma da Lei n.º 8.080/90, União, Estados, municípios e Distrito Federal são solidariamente responsáveis por garantir acesso e tratamento de saúde aos cidadãos brasileiros e estrangeiros residentes. Neste sentido, trago à colação o entendimento do eg. Superior Tribunal de Justiça, como se verifica do julgado a seguir ementado: "ADMINISTRATIVO. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. RECURSO QUE NÃO LOGRA INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. 1. Sendo o Sistema Único de Saúde (SUS) composto pela União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade solidária dos aludidos entes federativos, de modo que qualquer um deles tem legitimidade para figurar no pólo passivo das demandas que objetivam assegurar o acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros. 2. Mantém-se na íntegra a decisão agravada quando não infirmados seus fundamentos. 3. Agravo regimental improvido." (Ag 886974 (AgRg)-SC, Segunda Turma, relator o Ministro João Otávio de Noronha, "D.J." de 29.10.2007) Da mesma forma, a supremacia do direito constitucional à saúde e, por consequência, da vida digna, bem como a existência de obrigação do Município e do Estado de prestar adequado atendimento médico a todos os que procurem seus serviços também foi reconhecida pelo Eg. Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, como se verifica, inter plures, do julgado a seguir ementado: "MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE FÓRMULA ALIMENTAR NEOCATE A PESSOA DE RECURSOS INSUFICIENTES. OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO. PRELIMINARES REJEITADAS. LEGITMIDADE PASSIVA DO SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE. VIA MANDAMENTAL ADEQUADA. LAUDO MÉDICO QUE DISPENSA DILAÇÃO PROBATÓRIA. CONCRETIZAÇÃO DA NORMA CONSTITUCIONAL INSCRITA NO ART. 196. INCABÍVEL ARGUMENTAÇÃO QUE OPONHA POLÍTICA PÚBLICA COMO ÓBICE DE ACESSO AO SISTEMA PÚBLICO DE SAÚDE. OBRIGATORIEDADE DO MUNICÍPIO DE PRESTAR ATENDIMENTO ÀQUELES QUE O PROCUREM EM SUAS UNIDADES DE SAÚDE. PROGRAMA PÚBLICO ESPECÍFICO QUE COMPROVA A EXISTÊNCIA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA E RECURSOS FINANCEIROS. NÃO INCIDÊNCIA DA RESERVA DO IMPOSSÍVEL. INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. NÃO VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE O ESTADO DA BAHIA E O MUNICÍPIO DO SALVADOR. PROVIMENTO TOTAL DA SEGURANÇA. 1. O MUNICÍPIO NÃO ESTÁ OBRIGADO A PRESTAR ATENDIMENTO À SAÚDE APENAS DAQUELES QUE POSSUAM COMPROVADA RESIDÊNCIA EM SEUS LIMITES TERRITORIAIS, MAS DAQUELES QUE BUSQUEM ATENDIMENTO NAS UNIDADES POR ELE ADMINISTRADAS. INTERPRETAÇÃO QUE RESTRINGE O ACESSO DOS CIDADÃOS NACIONAIS AO SISTEMA PÚBLICO DE SAÚDE NÃO SE COMPATIBILIZA COM A FORMA FEDERATIVA DE ORGANIZAÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO NEM RESPEITA A UNIVERSALIDADE DE ACESSO E A DESCENTRALIZAÇÃO, PRINCÍPIOS NORTEADORES DO SUS. TENDO HAVIDO OMISSÃO DE UNIDADE DE SAÚDE MUNICIPAL NA PRESTAÇÃO DO ALIMENTO NEOCATE, É PARTE LEGÍTIMA O SECRETÁRIO DE SAÚDE DO MUNICÍPIO PARA FIGURAR COMO AUTORIDADE COATORA DO MANDADO DE SEGURANÇA; 2. O LAUDO MÉDICO DE CONTEÚDO CLARO E CONCLUSIVO ACERCA DA SITUAÇÃO PATOLÓGICA E DAS MEDIDAS TERAPÊUTICAS NECESSÁRIAS AO RESTABELECIMENTO DA SAÚDE DA IMPETRANTE É PROVA DOCUMENTAL SUFICIENTE. NÃO HAVENDO NOS AUTOS QUAISQUER RAZÕES PARA DÚVIDA ACERCA DA IDONEIDADE E ISENÇÃO DA PROFISSIONAL QUE O FIRMOU, DISPENSA-SE DILAÇÃO PROBATÓRIA. A VIA MANDAMENTAL É ADEQUADA AO RECLAMO DO DIREITO; 3. O DIREITO DA IMPETRANTE AO ATENDIMENTO PÚBLICO DE SAÚDE, SENDO ESTA UMA PESSOA CUJOS RECURSOS FINANCEIROS NÃO LHE POSSIBILITEM ARCAR COM O TRATAMENTO, SURGE NO MOMENTO EM QUE SE LHE APRESENTA A ENFERMIDADE, E NÃO APÓS SUBMETER-SE A PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS. OS ARGUMENTOS DA POLÍTICA PÚBLICA E DA NECESSÁRIA SUBMISSÃO A COMPLEXOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS, COLOCADOS COMO OBSTACULO DE ACESSO DO CIDADÃO À SAÚDE, RETIRAM DA NORMA INSERTA NA SEGUNDA PARTE DO ART. 196 A CARACTERÍSTICA GARANTIDORA, O QUE NÃO SE MOSTRA COMPATIVEL COM A SISTEMÁTICA CONSTITUCIONAL; 4. A EXISTÊNCIA DO PROGRAMA PARA CRIANÇAS ; COM NECESSIDADES ALIMENTARES ESPECIAIS, JÁ IMPLEMENTADO E VIGENTE, DEMONSTRA QUE O MUNICÍPIO DO SALVADOR POSSUI NÃO APENAS RECURSOS FINANCEIROS COMO PREVISÃO ORGAMENTÁRIA ESPECÍFICA PARA O FIM BUSCADO NA AÇÃO. O RECONHECIMENTO PELO PODER JUDICIÁRIO DO DIREITO AO RECEBIMENTO DA FÓRMULA NEOCATE POR PESSOA CARENTE E NECESSITADA NÃO VIOLA A SEPARAÇÃO DOS PODERES. TAMBÉM NÃO SOCORRE A AUTORIDADE MUNICIPAL O PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL; 5. OS ENTES FEDERATIVOS SÃO SOLIDARIAMENTE RESPONSÁVEIS PELO FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS E CONGENERES, ALÉM DE OUTRAS MEDIDAS TERAPÊUTICAS, NECESSÁRIOS AO TRATAMENTO ADEQUADO DE PESSOA ENFERMA QUE NÃO POSSUA CONDIÇÕES FINANCEIRAS DE CUSTEÁ-LO. PROVIMENTO TOTAL." (Mandado de Segurança n.º 52.397-0/2008, Seção Cível de Direito Público, relatora a Desembargadora Daisy lago Ribeiro, "D.P.J." de 11.3.2009 - negritos ausentes dos originais). 3.3. Está assentada, também, na jurisprudência a obrigação do Poder Público em custear os exames em testilha. Neste sentido: "ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TOMOGRAFIA. RELATÓRIO MÉDICO QUE AFIRMA A URGÊNCIA NA REALIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO. MANUTENÇAO DA SENTENÇA. - Deve ser mantida a sentença que determinou a realização de tomografia computadorizada multi-slio de tórax, considerando o teor do relatório médico que afirma a urgência em sua execução, uma vez que no conflito de interesses - do Ente Público em extrapolar a suas verbas e o direito à vida da autora - entendo que deve prevalecer o direito à vida." (TJMG, Apelação Cível n. 10322120012214004, Primeira Câmara Cível, relator o Desembargador ALBERTO VILAS BOAS, "D.J.-e" de 10.9.2014); "EMENTA: REEXAME NECESSÁRIO - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO OBRIGAÇÃO FAZER -- DIREITO À SAÚDE - RESSONÂNCIA MAGNÉTICA - OBRIGAÇÃO DE FAZER - OMISSÃO ADMINISTRATIVA VERIFICADA - DEVER RECONHECIDO - MULTA ASTREINTE EM DESFAVOR DA FAZENDA PÚBLICA - POSSIBILIDADE. - Não há que se falar em perda do objeto já que o cumprimento da obrigação não se deu espontaneamente nem sobreveio legislação benéfica posterior. - Conforme art. 23, inciso II, da Constituição Federal de 1988, é de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios 'cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência'. - Pelo que se depreende do art. 127 da CR/88, é possível que o legitimado ativo não coincida com o titular do direito, o que é aceito, excepcionalmente, como no caso do Ministério Público atuando na defesa de interesse alheio que tem por objeto a saúde. - Comprovada a necessidade de determinado tratamento e verificada a omissão administrativa, é dever do ente público o seu fornecimento, importando a negativa em ofensa ao direito à saúde garantido constitucionalmente. - As cominações impostas pelo descumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, denominadas de astreintes, são dotadas de coercibilidade e tem por finalidade o cumprimento da obrigação imposta. Ainda que em desfavor da Fazenda Pública, esta é devida. Precedentes STJ. (TJMG, Apelação Cível n. 1.0145.13.053652-0/002, Terceira Câmara Cível, relator o Desembargador Jair Varão, "D.J.-e" de 08.5.2018) "DIREITO CONSTITUCIONAL - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - SAÚDE PÚBLICA - DISPONIBILIZAÇÃO DE EXAMES CARDÍACOS DE QUE NECESSITA A PARTE AUTORA - RECORRIDO QUE COMPROVOU SOFRER DE TAQUICARDIAS COM FREQUÊNCIA O QUE RESULTA EM AUMENTO DE SUA PRESSÃO ARTERIAL, AFETANDO SUAS ATIVIDADES DIÁRIAS - NECESSIDADE DA REALIZAÇÃO DE TESTE ERGOMÉTRICO, HOLTER 24 HORAS E MAPA 24 HORAS AFIM DE MONITORAR SUA PRESSÃO ARTERIAL, AVALIAR O RITMO E FREQUÊNCIA CARDÍACA ARTERIAL, PARA DETERMINAR A NECESSIDADE DE EVENTUAL TRATAMENTO CIRÚRGICO OU OUTRA FORMA DE ABORDAGEM CLÍNICA - DIREITO A SAÚDE - GARANTIA CONSTITUCIONAL E DEVER COMUM DA UNIÃO, DOS ESTADOS, DO DISTRITO FEDERAL E DOS MUNICÍPIOS - ENUNCIADO 65 DO TJRJ - ARTIGO 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - DEVER DE FORNECIMENTO PELO PODER PÚBLICO - NORMA DE EFICÁCIA PLENA COM APLICAÇÃO IMEDIATA - TAXA JUDICIÁRIA DEVIDA PELO MUNICÍPIO NA QUALIDADE DE RÉU SUCUMBENTE - SÚMULA 145 DO TJRJ E ENUNCIADO 42 DO FETJ TAXA JUDICIÁRIA - CONDENAÇÃO DO ESTADO AO SEU PAGAMENTO - IMPOSSIBILIDADE - OBRIGAÇÃO QUE SE AFASTA - INSTITUTO DA CONFUSÃO APLICÁVEL À ESPÉCIE - REJEIÇÃO DO RECURSO INTERPOSTO PELO MUNICÍPIO DE RIO DAS OSTRAS - RECURSO DO ERJ AO QUAL SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO APENAS PARA QUE SE AFASTE A CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DA TAXA JUDICIÁRIA." (TJRJ, Apelação Cível n. 0010115-46.2015.8.19.0068, Vigésima Segunda Câmara Cível, relator o Desembargador MARCELO LIMA BUHATEM, "D.J.-e" de 20.4.2020) "RECURSO INOMINADO. FAZENDA PÚBLICA. CUSTEIO DE EXAME. ECOCARDIOGRAFIA TRANSESOFAGICA . NECESSIDADE DA REALIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO DEMONSTRADA. DIREITO À SAÚDE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E OBJETIVA ENTRE OS ENTES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INAPLICABILIDADE DA CLÁUSULA DA RESERVA DO POSSÍVEL . ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E DA SEPARAÇÃO DE PODERES AFASTADA. DETERMINAÇÃO DE RESSARCIMENTO PELA UNIÃO E PELO ESTADO. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITOS ESTABELECIDOS PELO TEMA 106 STJ PREENCHIDOS . SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. ART. 46 DA LEI 9.099/95 .RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO." (TJPR, Recurso Inominado n. 0005128-92.2018.8 .16.0084, Quarta Turma Recursal, relatora a juíza BRUNA GREGGIO, "D.J.-e" de 16.08.2019) 3.4. Ademais, a jurisprudência nacional firmou entendimento do sentido de que a cláusula constitucional garantidora do direito à saúde engloba, também, o direito ao fornecimento de meio de transporte adequado quando a parte não dele dispuser ou quando for ele essencial para o sucesso do tratamento. Neste sentido: "Mandado de Segurança Fornecimento de ambulância para tratamento de enfermidade em outro município Portadora de Insuficiência Mitral e Má Formação Congênita dos Pés Obrigação do poder público de fornecer reconhecida - Inteligência dos arts. 196 e 198 da CF e legislação que rege o SUS Segurança concedida - Recursos desprovidos." (TJSP, Apelação/Reexame Necessário 0004991-24.2011.8.26.0296, 4ª Câmara de Direito Público, relator o Desembargador Ferreira Rodrigues, j. 24.06.2013) "Necessidade de transporte por ambulância para tratamento de doença renal crônica Laudo médico Obrigação do poder público de fornecer - Inteligência dos arts. 196 e 198 da CF e da legislação que rege o SUS - Sentença que procedência mantida - Recurso desprovido". (TJSP, Apelação 0000733-32.2011.8.26.0405, 4ª Câmara de Direito Público, relator o Desembargado Ferreira Rodrigues, "D.J" de 06.09.2012) "AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO COMINATÓRIA. FORNECIMENTO DE TRANSPORTE PARA PACIENTE COM DOENÇA RENAL CRÔNICA. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. IMPOSIÇÃO DE MULTA COMO MEIO COERCITIVO PARA ASSEGURAR O RESULTADO PRÁTICO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. DESNECESSIDADE DE NOVA DISCUSSÃO ACERCA DA EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA EM RAZÃO DO CARÁTER SOLIDÁRIO DA OBRIGAÇÃO. INCIDÊNCIA DA NORMA DO ARTIGO 196, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E DO ENUNCIADO DA SÚMULA Nº 65, DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REVISÃO DA MULTA ARBITRADA DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECURSO DESPROVIDO." (TJRJ, Apelação cível nº 0406407-37.2009.8.19.0001, Primeira Câmara Cível, relator o Desembargador FABIO DUTRA, j. 19.03.2013) "SUS. PACIENTE COM CÂNCER. NECESSIDADE DE TRANSPORTE DEVIDAMENTE COMPROVADA NO CASO DOS AUTOS. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. - O direito à saúde é um dos direitos fundamentais assegurado pela CF, não sendo permitido a Administração erguer barreiras burocráticas ensejando obstaculizar ou mesmo impedir o tratamento adequado ao cidadão carente. O princípio da legalidade, virtuoso instrumento de controle sobre os atos administrativos, não deve engessar a administração de modo a prejudicar o bem tutelado: o administrado". (TJMG, Agravo de Instrumento CV nº 1.0512.13.001692-0/001, 7ª Câmara Cível, relator o Desembargador Wander Marotta, j. 25.6.2013) "APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. DIREITO À SAÚDE. ESTADO E MUNICÍPIO. TRANSPORTE EM AMBULÂNCIA. BEXIGA NEUROGÊNICA E DOENÇA RENAL EM ESTÁGIO FINAL (CID N.31 E N.18-0). NECESSIDADE DE HEMODIÁLISE TRÊS VEZES POR SEMANA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. SOLIDARIEDADE DOS ENTES PÚBLICOS. PRELIMINAR ACOLHIDA. DECRETO DE EXTINÇÃO AFASTADO. LEGITIMIDADE DO ESTADO. PROVAS DA NECESSIDADE DO TRATAMENTO E DA INEXISTÊNCIA DE CONDIÇÕES FINANCEIRAS. - O direito à saúde e a solidariedade dos entes públicos na sua garantia é matéria já pacificada tanto neste Tribunal de Justiça quanto nas Cortes Superiores. Trata-se de interpretação sistemática da legislação infraconstitucional com os arts. 196 e 198 da Constituição Federal, não sendo oponível ao cidadão qualquer regulamentação que tolha seus direitos fundamentais à saúde e à dignidade. - A necessidade de transporte por ambulância para a realização de hemodiálise restou comprovada nos autos, conforme atestados e laudos médicos acostados, tendo em vista a condição precária da autora, pessoa idosa e portadora de doença em estágio terminal. PRELIMINAR ACOLHIDA. DECRETO DE EXTINÇÃO QUANTO AO ESTADO RÉU AFASTADO. APELAÇÃO PROVIDA". (TJRS, Apelação Cível nº 70054704705, Vigésima Segunda Câmara Cível, relatora a Desembargadora Marilene Bonzanini Bernardi, j. 02.07.2013) Indicando as condições de saúde da parte autora a necessidade de seu transporte para o local onde se realizará o exame a si prescrito, surge para si o direito de reivindicar tal atenção do Poder Público com o dever correlato da Administração prestá-lo em forma e modo que contribua para o seu tratamento e pronta recuperação. 3.5. Assentado, pois, o direito da parte autora de ser submetida aos exames médicos a si prescritos em unidade hospitalar adequada e equipada para o tratamento de sua condição, com o correlato direito de ser transportada(o), por meio adequado e que garanta a não piora de seu estado clínico, para o local, em outra cidade, onde serão realizados os exames médicos a si prescritos, bem como o dever do Poder Público de promovê-los e custeá-los. 3.6. Por oportuno, destaco que não são oponíveis à espécie alegações de inviabilidade do cumprimento de tais obrigações por força de limitações orçamentárias ou de incidência da chamada "reserva do possível". Isto, pois, tal como assentado pelas Cortes Superiores, a reserva do possível não é argumento oponível para legitimar o Estado de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, tudo em detrimento de valores fundamentais como a dignidade da pessoa humana. Neste sentido: "ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA 'RESERVA DO POSSÍVEL'. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO 'MÍNIMO EXISTENCIAL'. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO)." (ADPF n.º 45-DF, Plenário, relator o Ministro Celso de Mello, Informativo S.T.F. n.º 345/2004 - negritos ausentes dos originais) E, caso os réus venham a proporcionar o transporte em análise em localidade que atenda os requisitos da Portaria SAS n.º 055/99 do Ministério da Saúde (a saber: esgotados os meios de tratamento dentro do município, deslocamento maior que 50km de distância, atendimento pela rede pública hospitalar ou particular conveniada ao SUS, e prévia inscrição no Programa), deve o(a) autor(a) ter seu deslocamento para outro domicílio - e o de seu acompanhante - custeados pelo Sistema TFD (Tratamento Fora do Domicílio). Entretanto, há que se extremar situações díspares. A Portaria SAS/MS n.º 55/99 estabelece como requisitos para a obtenção do Transporte Fora de Domicílio (TFD), que o tratamento seja realizado em município distinto da residência do(a) autor(a), ficando vedado seu pagamento em deslocamentos menores do que 50Km (cinquenta quilômetros) de distância e em regiões metropolitanas. Entretanto, isto não significa afirmar que, uma vez constatada a necessidade e demais requisitos, exista proibição (ou sequer ausência de previsão legal autorizativa) do custeio, pelo ente público, do deslocamento para o respectivo tratamento. Significaria, tão somente, que não pode ele (tratamento com deslocamentos menores do que 50 km (cinquenta quilômetros) de distância e em regiões metropolitanas) ser custeado por intermédio dos recursos rubricados do Sistema de Informações Ambulatoriais - SIA/SUS, devendo ser bancado pelos recursos do orçamento geral da unidade federativa. 3.7. Em relação ao pedido de indenização por danos morais, da análise dos autos, tenho que pretende a parte autora ver caracterizada responsabilidade civil extracontratual dos réus (ente da Administração Pública) por ato omissivo (qual seja: demora no fornecimento de atendimento). 3.7.1. Sobre o regime de responsabilidade da Administração, trago à colação a lição de JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO (in Manual de Direito Administrativo, 22ª edição revista, ampliada e atualizada, LumenJuris Editora, Rio de Janeiro, 2009. págs. 531/533): "A marca característica da responsabilidade objetiva é a desnecessidade de o lesado pela conduta estatal provar a existência de culpa do agente ou do serviço. O fator culpa, então, fica desconsiderado como pressuposto da responsabilidade objetiva. Para configurar-se esse tipo de responsabilidade, bastam três pressupostos. O primeiro deles é a ocorrência do fato administrativo, assim considerado como qualquer forma de conduta, comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva, atribuída ao Poder Público. Ainda que o agente estatal atue fora de suas funções, mas a pretexto de exercê-las, o fato é tido como administrativo, no mínimo pela má escolha do agente (culpa in eligendo) ou pela má fiscalização de sua conduta (culpa in vigilando). O segundo pressuposto é o dano. Já vimos que não há falar em responsabilidade civil sem que a conduta haja provocado um dano. Não importa a natureza do dano: tanto é indenizável o dano patrimonial como o dano moral. Logicamente, se o dito lesado não prova que a conduta estatal lhe causou prejuízo, nenhuma reparação terá a postular. O último pressuposto é o nexo causal (ou relação de causalidade) entre o fato administrativo e o dano. Significa dizer que ao lesado cabe apenas demonstrar que o prejuízo sofrido se originou da conduta estatal, sem qualquer consideração sobre o dolo ou a culpa. Se o dano decorre de fato que, de modo algum, pode ser imputado à Administração, não se poderá imputar responsabilidade civil a esta; inexistindo o fato administrativo, não haverá, por conseqüência, o nexo causal. Essa é a razão por que não se pode responsabilizar o Estado por todos os danos sofridos pelos indivíduos, principalmente quando decorrem de fato de terceiro ou de ação da própria vítima". No caso em análise, sustenta a parte autora a existência de responsabilidade estatal por omissão. E, sobre o tema, obrigatória é a referência ao paradigmático voto do Exm.º Sr. Ministro Carlos Velloso, no julgamento do RE 204.037-RJ (Segunda Turma, voto proferido em sessão do dia 18.02.1997): "(...) O § 6º do art; 37 da CF dispõe: 'Art.37. (...) (...) § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o .responsável nos casos de dolo ou culpa.' Em princípio, pois, a responsabilidade objetiva do poder público, assentada na teoria do risco administrativo, ocorre por ato de seus agentes. Dir-se-á que o ato do agente público poderá ser omissivo. Neste caso, entretanto, exige-se a prova da culpa. É que a omissão é, em essência, culpa, numa de suas três vertentes: negligência, que, de regra, traduz desídia, imprudência, que é temeridade, e imperícia, que resulta de falta de habilidade (Álvaro Lazarini, 'Responsabilidade Civil do Estado por Atos Omissivos dos seus Agentes', em 'Rev. Jurídica', 162/125). Celso Antônio Bandeira de Mello, dissertando a respeito do tema, deixa expresso que 'o Estado só responde por omissões quando deveria atuar e não atuou - vale dizer: quando descumpre o dever legal de agir. Em uma palavra: quando se comporta ilicitamente ao abster-se.' E continua: 'A responsabilidade por omissão é responsabilidade por comportamento ilícito. E é responsabilidade subjetiva, porquanto supõe dolo ou culpa em suas modalidades de negligência, imperícia ou imprudência, embora possa tratar-se de uma culpa não individualizável na pessoa de tal ou qual funcionário, mas atribuída ao 'serviço estatal genericamente. É a culpa anônima ou faute de service dos franceses, entre nós traduzida por 'falta de serviço'. É que, em caso de ato omissivo do poder público, o dano não foi causado (pelo agente público. E o dispositivo constitucional instituidor da responsabilidade objetiva do poder público, art. 107 da CF anterior, art. 37, §6º, da CF vigente, refere se aos danos causados pelos agentes públicos, e não aos danos não causados por estes, 'como os provenientes de incêndio, de enchentes, de danos multitudinários, de assaltos ou agressões que alguém sofra em Vias e logradouros públicos, etc.' Nesses casos, certo é que o poder público, se tivesse agido, poderia ter evitado a ação causadora do dano. A sua não ação, vale dizer, a omissão estatal, todavia, se pode ser considerada condição da ocorrência do dano, causa, entretanto, não foi. A responsabilidade em tal caso, portanto, do Estado, será subjetiva. (Celso Antônio Bandeira de Mello, 'Responsabilidade Extracontratual do Estado por Comportamentos Administrativos', em 'Rev. dos Tribs.', 552/11, 13 e 14; 'Curso de Direito Administrativo', em 'Rev. dos Tribs.', 552/11,- 13 e 14; 'Curso de Direito Administrativo', Malheiros Ed. 5º ed., pp. 489 e segs.). Não é outro o magistério de Hely Lopes Meirelles: 'o que a Constituição distingue é o dano causado pelos agentes da Administração (servidores) dos danos ocasionados por atos de terceiros ou por fenômenos da natureza. Observe-se que o art. 37, §6º, só atribui responsabilidade objetiva a Administração pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causem a terceiros. Portanto o legislador constituinte só cobriu o risco administrativo da atuação ou inação dos servidores públicos; não responsabilizou objetivamente a Administração por atos predatórios de terceiros, nem por fenômenos naturais que causem danos aos particulares'. A responsabilidade civil por tais atos e fatos é subjetiva. (Hely Lopes Meirelles, 'Direito Administrativo Brasileiro', Malheiros Ed., 21ª ed., 1996, p. 566). Esta é, também, a posição de Lúcia Valle Figueiredo, que, apoiando-se nas lições de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello e Celso Antônio Bandeira de Mello, leciona que 'ainda que consagre o texto constitucional a responsabilidade objetiva, não há como se verificar a adequabilidade da imputação ao Estado na hipótese de omissão, a não ser pela teoria subjetiva'. E' justifica: é que, 'se o Estado omitiu-se, há de se perquirir se havia o dever de agir. Ou, então, se a ação estatal teria sido defeituosa a ponto de se caracterizar insuficiência da prestação de serviço.' (Lúcia Valle Figueiredo, 'Curso de Direito Administrativo', Malheiros Ed., 1994, p. 172). Desse entendimento não destoa a professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro ('Direito Administrativo', Ed. Atlas, 5ª ed., 1995, p.415). Posta a questão em tais termos, força é concluir, no caso, pelo não- conhecimento do recurso, dado que, conforme vimos, a versão fática do acórdão é que não houve culpa do servidor da empresa ao não impedir a ocorrência do fato, nem é possível presumir, no caso, a faute de service, ou a culpa anônima, vale dizer, a culpa que poderia ser atribuída ao serviço estatal de forma genérica. (...)" Nestes termos, doutrina e jurisprudência tem sólido entendimento no sentido do caráter subjetivo da responsabilidade civil estatal por ato omissivo. Senão, confira-se, ainda, (negritos ausentes dos originais): "EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: DETENTO FERIDO POR OUTRO DETENTO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º. I. - Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, esta numa de suas três vertentes -- a negligência, a imperícia ou a imprudência -- não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. II. - A falta do serviço -- faute du service dos franceses -- não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro. III. - Detento ferido por outro detento: responsabilidade civil do Estado: ocorrência da falta do serviço, com a culpa genérica do serviço público, por isso que o Estado deve zelar pela integridade física do preso. IV. - RE conhecido e provido." (S.T.F., RE 382.054-RJ, Segunda Turma, relator o Ministro Carlos Velloso, "D.J." de 01.10.2004). É dizer: em se tratando de responsabilidade civil por omissão, deve se afastar a regra de responsabilidade objetiva, procedendo-se, assim, a concreta verificação dos seguintes requisitos: a) omissão estatal; b) dano; c) nexo de causalidade entre a conduta omissiva e o dano; d) a existência de culpa em uma de suas dimensões (negligência, imprudência ou imperícia). 3.7.2. Nestes termos, tem a jurisprudência entendido que a recusa (ou demora) do Poder Público em viabilizar atendimento médico, conquanto verse sobre direito fundamental à saúde, não dá ensejo à constatação de danos morais aferíveis in re ipsa (havendo, se o caso, que se fazer efetiva prova dos seus requisitos autorizadores - não demonstrada nos autos, apesar de ter sido à parte postulante franqueada ampla oportunidade para a produção de provas). Sobre o tema (negritos ausentes dos originais): "Constitucional e Administrativo - Direito à saúde - Fornecimento de medicamento - Arts. 196 e 198 da CF - Dano moral - Omissão administrativa - Responsabilidade subjetiva - Dano não demonstrado. I - Nas hipóteses de omissão administrativa, como no caso dos autos, em não houve o fornecimento do aparelho necessário ao tratamento do autor, a responsabilidade civil do Poder Público é subjetiva, cabendo ao interessado demonstrar não só o dano e o nexo causal, mas também a culpa da Administração; II - O só fato do não fornecimento do medicamento pelo Poder Público ao autor não é suficiente para caracterizar o dano moral alegado; III - Recurso conhecido e provido." (TJSE, Apelação Cível 0040603-62.2011.8.25.0001, Segunda Câmara Cível, relator o Desembargador Gilson Felix dos Santos, "D.J.-e" de 30.6.2014); "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DIREITO À SAÚDE. PLEITO DE REALIZAÇÃO DE CIRURGIA ORTOPÉDICA. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE. DESCABIMENTO DA REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO. PEDIDO SUBSIDIÁRIO. AGENDAMENTO DE CONSULTA COM ORTOPEDISTA. OMISSÃO CONSTATADA. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE ASSEGURADO NO ART. 196 DA CF. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO." (TJPR, Apelação Cível 0066980-02.2019.8.16.0014, Quita Câmara Cível, relator o Desembargador Carlos Mansur Arida, "D.J.-e" de 27.11.2020). 4. Ante todo o exposto, satisfeitos os seus requisitos legais, forte nos arts. 1º, I; 5º, caput; 196, caput, da Constituição Federal, e disposições da Lei n.º 8.080/90, confirmando as decisões IIDD 496040828 e 497185171, julgo parcialmente procedente o pedido formulado, para confirmar o direito da parte autora de ter assegurado o fornecimento do tratamento necessário à recuperação da enfermidade que enfrenta, sabidamente sua submissão aos exames de ressonância magnética de crânio, angiorressonância de vasos cerebrais e cervical, holter 24 horas, MAPA 24 horas e ecocardiografia transtorácica (inclusive disponibilizando sua realização em ambiente hospitalar adequado, bem como o transporte para o local dos exames, caso se revele necessário), desde que mediante requisição médica idônea, firmada por profissional devidamente habilitado, em unidade hospitalar especializada, pública ou particular (nesta última hipótese, às suas completas expensas). Improcedente o pedido de condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Sem condenação ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios neste grau de jurisdição, a teor do art. 54, caput, da Lei n.º 9.099/95. Sem reexame necessário, a teor do art. 11 da Lei n.º 12.153/2009. P.R.I. Decorrido o prazo recursal sem a interposição de irresignação voluntária, nada sendo requerido, arquivem-se os presentes autos com baixa na Distribuição. Camaçari (BA), 14 de julho de 2025. (Documento assinado digitalmente) DANIEL LIMA FALCÃO Juiz de Direito
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