Uber Do Brasil Tecnologia Ltda. x Kleber Alex Ferreira Dos Santos Rodrigues
ID: 256736073
Tribunal: TRT20
Órgão: Primeira Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO - RITO SUMARíSSIMO
Nº Processo: 0000852-89.2024.5.20.0005
Data de Disponibilização:
15/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
SOLIMAR MACHADO CORREA
OAB/PA XXXXXX
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LILI DE LIMA CRUZ
OAB/DF XXXXXX
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RAFAEL ALFREDI DE MATOS
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 20ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA Relatora: VILMA LEITE MACHADO AMORIM 0000852-89.2024.5.20.0005 : UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 20ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA Relatora: VILMA LEITE MACHADO AMORIM 0000852-89.2024.5.20.0005 : UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. : KLEBER ALEX FERREIRA DOS SANTOS RODRIGUES PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 20ª REGIÃO PROCESSO nº 0000852-89.2024.5.20.0005 (RORSum) EMBARGANTE: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA EMBARGADO: KLEBER ALEX FERREIRA DOS SANTOS RODRIGUES RELATORA: DESEMBARGADORA VILMA LEITE MACHADO AMORIM EMENTA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - OMISSÃO NO ACÓRDÃO - PROVIMENTO. Constatada omissão no julgado, apenas, quanto ao tópico "VIOLAÇÃO À LIVRE INICIATIVA E AO LIVRE EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA", merecem provimento os Aclaratórios, no particular, a fim de que a prestação jurisdicional seja entregue em sua integralidade, sem emprestar efeito modificativo. RELATÓRIO UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. opõe Embargos de Declaração ao Acórdão constante do ID bf96c8b, proferido nos autos da Reclamação Trabalhista em que contende com KLEBER ALEX FERREIRA DOS SANTOS RODRIGUES. Objetiva que sejam sanados vícios existentes no julgado, nos termos dos arts. 897-A da CLT c/c 489, §1° e 1.022 do CPC. Processo em ordem e em mesa para julgamento. DO CONHECIMENTO Presentes os pressupostos necessários de admissibilidade, conhece-se dos Embargos Declaratórios. DO MÉRITO NECESSIDADE DE ESCLARECIMENTO DO QUADRO FÁTICO DO V. ACÓRDÃO - PONTOS INCONTROVERSOS FIXADOS PELAS PARTES NÃO APRECIADOS OU TRANSCRITOS - OMISSÃO - OBSCURIDADE / SUBORDINAÇÃO ALGORÍTMICA - OBSCURIDADE - PREQUESTIONAMENTO A Embargante defende a existência de omissão e obscuridade no Acórdão, ao argumento de que: O v. acórdão, d.m.v., deixa de consignar as razões pelas quais não se valeu da confissão real do Autor no sentido do trabalho autônomo por ele prestado, livre de qualquer controle pela Reclamada, a suscitar omissão e obscuridade: Isto porque restou demonstrada a total liberdade do reclamante acerca dos dias, horários e forma de trabalho, conforme depoimento pessoal do Reclamante colhido em audiência realizada em 23 de outubro de 2024, conforme ata de id 70937f7, confirmando que: 1- Não havia determinação de dias e horários para utilização da plataforma; 2- Poderia desligar o aplicativo a qualquer momento e não havia punição em virtude dessa conduta; 3- Não era necessário enviar relatório de viagens realizadas; 4- O Reclamante também era cadastrado em outras plataformas concorrentes para atuar como motorista; 5- Que não havia determinação de exclusividade; 6- Poderia escolher a área de atuação; 7- Podia cancelar e recusar viagens; 8- Podia compartilhar o veículo com outra pessoa; 9- Que as avaliações eram recíprocas entre motorista e passageiro; 10- Que escolhia a forma de recebimento do pagamento pelas viagens; O v. acórdão, neste ponto, deixa de enfrentar, data máxima vênia, a tese recursal abordada pela reclamada, deixando de se pronunciar, portanto, sobre o conjunto probatório dos autos, que indica a liberdade de atuação na plataforma Uber, o que justifica o aclaramento da r. decisão, até para que não se cogite ofensa ao art. 5º, II, da Constituição. Suscita, ainda, obscuridade "na adoção da tese de 'subordinação algorítmica', diante da ausência de indicação da base legal utilizada para fundamentar a conclusão do v. acórdão - a representar potencial violação ao art. 3º, da CLT e art. 5º, II, da Constituição." Ao exame. Eis o teor do Acórdão sobre o ponto em questão: O Apelante inconforma-se com o não reconhecimento do vínculo empregatício na sentença recorrida, argumentando, inicialmente que: [...] a Recorrente é empresa de tecnologia e disponibiliza sua plataforma para aqueles que atuam no transporte individual privado de passageiros, tal como o Recorrido, regulado pela Lei 12.587/2012, em seus artigos 3º e 4º: [...] Logo, as atividades realizadas pelos motoristas parceiros estão previstas na Lei Federal 12.587/2012, que instituiu a Política Nacional de Mobilidade Urbana, e no Código Civil, ao passo em que as atividades da Recorrente e da Plataforma são previstas e reguladas pela Lei Federal nº 12.965/14, conhecida como o Marco Civil da Internet, e também pela Constituição Federal. É a lei, portanto, que determina o ramo de negócio da recorrente. Ou seja, o motorista parceiro, na condição de cliente, aceita e anui aos termos do contrato de prestação de serviço firmado com a Uber, para, através do aplicativo disponibilizado, permitir que o motorista busque, receba e atenda solicitação de serviços de transporte feita pelos usuários do aplicativo. O motorista não realiza qualquer trabalho para o aplicativo, mas sim pelo aplicativo, premissa muito bem observada pelo Col. TST no julgamento do AIRR 10575-88.2019.5.03.0003, 4ª Turma, Rel. Min. Alexandre Luiz Ramos, pub. 10.09.2020, já transcrito neste apelo, suscitado para confirmar a violação legal, e não para fins de divergência jurisprudencial. [...] Portanto, à vista de tais esclarecimentos, o que deve ser entendido é que a Uber não contrata a prestação de serviços dos motoristas-parceiros, ao revés, são eles que, com o fito de maximizar os seus ganhos, contratam os serviços de intermediação desta empresa, restando expressamente impugnada a afirmação de que "(...) a ré reconheceu a prestação de serviços, mas em modalidade diversa da apontada na inicial, era seu o ônus probatório dos fatos modificativos/extintivos, conforme estabelece o artigo 818, II, da CLT.". [...] Ainda nessa linha de pensamento, mesmo que se entenda que a Uber é empresa de transporte, é certo que a mera inserção na atividade fim da empresa se tornou irrelevante para, isoladamente, irradiar qualquer consequência jurídica trabalhista, após o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324 e do Recurso Extraordinário (RE) 958252, pelo Eg. STF. Por fim, é certo que o vínculo de emprego somente poderia ter sido reconhecido com prova robusta da presença dos seus elementos constitutivos, a saber: subordinação, não eventualidade, onerosidade e pessoalidade. Em sequência, tratando sobre cada um dos requisitos do vínculo empregatício, aponta, quanto à subordinação, que: Primeiramente, a forma pela qual a relação jurídica entre a Uber e o Recorrido foi estabelecida já destoa completamente daquela firmada em uma relação de emprego. Enquanto na relação de emprego há processo seletivo, análise curricular e entrevistas, para se tornar motorista parceiro da Uber basta a realização de cadastro, ato unilateral e volitivo do próprio motorista parceiro, que ocorre prioritariamente por via digital ou com auxílio em algum ponto de apoio da empresa. Não há treinamentos, fiscalização da atividade e tampouco controle dos dias e horas em que o motorista utiliza a plataforma. Ainda, o Recorrido poderia utilizar outras plataformas, não lhe sendo exigido número mínimo de viagens. E a total ausência de subordinação, bem como dos demais requisitos também foi provado através do depoimento da testemunha Walter Tadeu Martins (ata de id. b9bcaa3): [...] Aliás, materializando a tese de que os motoristas figuram como empreendedores que veem na tecnologia Uber uma forma de aperfeiçoar o seu empreendimento, tem-se o fato de que estes não só suportam os ônus financeiros decorrentes de sua atividade, como também pagam pelo serviço de intermediação digital prestado pela Recorrente, tornando nítido, assim, a inexistência do elemento onerosidade: [...] A fim de que não pairassem dúvidas sobre o quanto alegado na defesa, bem como no intuito de se desvencilhar corretamente do ônus probatório que lhe competia, a Recorrente anexou também a ata de audiência em que consta o depoimento do Sr. Vitor de Lalor Rodrigues da Silva, que de forma categórica comprovou os fatos extintivos ou modificativos do direito autoral, senão vejamos (ata de id. e46ee1e): [...] Por isso, ao observar a prova dos autos, verifica-se de imediato que a subordinação não se fazia presente, ainda mais quando se verifica que o Recorrido poderia ficar com o aplicativo desligado quando quisesse. Ora, restou, portanto, incontroverso que o Recorrido poderia utilizar a plataforma quando quisesse, no momento que desejasse, sem estar sujeito a qualquer forma de poder diretivo da Recorrente. Todos os elementos fáticos trazidos na defesa se tornaram incontroversos, reitere-se. [...] Nesse sentido, afirmar que a fixação de preços (ainda que na forma de sugestão pela Uber) é ponto que demonstra a subordinação é, no mínimo, criativo. Sabe-se que a predefinição do valor é um imperativo do negócio que, sem ele, não permitiria a existência da plataforma, quer para o passageiro, quer para o motorista parceiro. Quem solicitaria um deslocamento pelo aplicativo sem saber quanto iria pagar? Quem aceitaria ser motorista parceiro e realizar uma viagem sem saber quanto irá receber? [...] De mais a mais, com relação a geolocalização, a Recorrente destaca que o mesmo raciocínio se aplica: sem essa ferramenta, a efetividade da plataforma seria nula. Como poderia ser feita a intermediação entre o passageiro e o motorista, senão com base na proximidade em que eles se encontram? Como seria possível calcular o valor da viagem, com base na distância percorrida e no tempo gasto? [...] E, ainda em relação à geolocalização, é certo que motorista e usuários são os únicos responsáveis por determinar não só a rota a ser seguida, mas também se querem fazer uso da plataforma. De maneira completamente livre, a qualquer tempo, o motorista pode simplesmente não se logar no aplicativo. É essa liberdade de escolher quando, onde e como estará logado que retira a possibilidade de enquadramento da relação como empregatícia. [...] Enfim, a existência de regras mínimas, além de muitas vezes serem exigências da própria lei, é um imperativo lógico para o funcionamento da plataforma. Sem elas, certamente o Recorrido sequer teria interesse em se cadastrar na Uber, pela inviabilidade do negócio. A seguir, no que toca à onerosidade inerente ao seu labor, defende: [...] a prova dos autos comprovou que a relação jurídica sequer era qualificada pelo elemento da onerosidade. A testemunha Walter Tadeu Martins Filho, comprovou que, sendo uma relação de parceria comercial, a Uber e o Recorrido faziam um rateio do pagamento realizado pelo cliente, da seguinte forma (ata de id. b9bcaa3): [...] E esse "rateio" decorria da necessidade de o Recorrido remunerar a Uber pela utilização da plataforma, e não o contrário, como consta expressamente cláusula 4.6 dos "Termos e Condições Gerais dos Serviços de Intermediação Digital": [...] Assim, quer pelo fato de o responsável pelo pagamento ser o cliente, quer pelo fato de existir, na verdade, um pagamento do Recorrido à Uber, na forma de porcentagem da viagem realizada por intermediação da plataforma, não há como se considerar que a relação foi pautada pela onerosidade - ainda que "lato sensu", como afirmou a sentença, sem informar qual seria essa nova conceituação de onerosidade. [...] Não é demais destacar que a precificação das ofertas pela Recorrente, não possui a capacidade de gerar qualquer resquício de subordinação ou onerosidade, a uma porque decorre do próprio contrato de parceria comercial, a duas porque busca atender aos próprios interesses dos envolvidos na intermediação digital. Quanto à pessoalidade, aponta que: [...] a norma cogente acerca da utilização de aplicativo para o exercício do transporte de passageiro exige da detentora da plataforma digital a identificação do motorista, e não em razão de a reclamada pretender exigir do motorista um perfil que se enquadre ao critério previamente definido. Por corolário, não se trata de pretender a reclamada a prestação de serviço intuito personae, mas a necessidade de cadastro prévio na plataforma decorre de obrigação legal, nos termos da Lei nº 12.587/2012, art. 4, inc. X: [...] Logo, as atividades realizadas pelos motoristas parceiros estão previstas na Lei Federal 12.587/2012, que instituiu a Política Nacional de Mobilidade Urbana, e no Código Civil, ao passo em que as atividades da Recorrente e da Plataforma são previstas e reguladas pela Lei Federal nº 12.965/14, conhecida como o Marco Civil da Internet, e também pela Constituição Federal. É a lei, portanto, que determina o ramo de negócio da recorrente. Tal determinação legal se dá por questões de segurança para todos os envolvidos na plataforma, já que somente pessoas devidamente habilitadas podem se cadastrar como motoristas. Não é, portanto, exigência da Uber, mas sim do poder público. Fica fácil concluir que por força de lei, o motorista deve ser necessariamente cadastrado na ré, não podendo ser alguém escolhido pelo dono do veículo ou por algum motorista já cadastrado na ré. Por certo, para efeitos trabalhistas, a pessoalidade se configura quando há infungibilidade no polo do prestador, quando o contrato é firmado intuitu personae. E, no caso concreto, restou provado que o Recorrido poderia cadastrar outras pessoas, vinculadas ao seu cadastro, para utilizar o mesmo carro, sendo que o pagamento é feito, inclusive, na conta do Recorrido, mesmo que a viagem tenha sido realizada por terceiro. A testemunha Vitor de Lalor Rodrigues da Silva, comprovou esse fato (ata de id. e46ee1e): [...] Assim, a prova oral demonstra que o Recorrido poderia ter pessoas vinculadas ao seu cadastro, sendo que ele receberia o valor das viagens, mesmo sendo ela realizada por terceiros! Por óbvio, o fato desse terceiro também estar cadastrado junto à Uber não desqualifica a fungibilidade, já que, no final das contas, o Recorrido receberia pela viagem realizada por terceiro, cabendo somente a eles, e entre eles (sem participação da Uber), o acerto de contas. O cadastro de terceiro não é uma anuência prévia, mas sim mero procedimento de segurança determinado por lei. [...] Por isso, a possibilidade de que outras pessoas, vinculadas a conta do Recorrido, utilizem a plataforma e gerem receitas para ele, afasta o requisito da pessoalidade. Já sobre a não eventualidade/habitualidade do labor exercido, afirma que: [...] é próprio o parceiro que define o melhor momento para "logar" na plataforma digital Uber, o que rompe com a expectativa de continuidade da atividade individual, traço característico da não eventualidade, particularidade esta que, por consequência, acaba inviabilizando, por completo, a previsibilidade intrínseca à continuidade da relação empregatícia. Fato é que a Uber não tem previsibilidade de quando os motoristas estarão "on-line", o que requer seja observado por estes Nobres Julgadores! E, a prova documental (id. 1f5a377) demonstra que o Recorrido permaneceu longo período sem realizar nenhuma viagem, sem qualquer ônus ou comunicação a Reclamada. Verifica-se aqui que não se trata de período no qual o Recorrido simplesmente recusou "demandas" - na verdade, ao não logar, ele não se colocava sequer disponível para receber ofertas de viagens. No caso concreto, a prova evidencia que o Recorrido, ao passar períodos sem logar na plataforma, sequer esteve disponível para receber as ofertas de viagens, o que ceifa completamente a natureza do contrato de trabalho intermitente. Por certo, em nenhuma relação de emprego o Recorrido poderia ter ficado longos períodos sem exercer as suas atividades e não receber nenhuma punição por isso, como aconteceu no caso do reclamante. No caso da Uber, e mais precisamente no caso dos autos, a hipótese é completamente distinta: nos períodos que ficou sem realizar o log on na plataforma Uber, não é possível conceber, ainda que na mente mais criativa, que ele tenha ficado "à disposição" da empresa. Como ele receberia as ofertas de viagens, se não entrou no aplicativo? Por certo, jamais houve qualquer continuidade na relação jurídica mantida, com grandes lapsos temporais nos quais o Recorrido sequer se apresentou como ativo na plataforma (conforme documento de id. 1f5a377), de modo que o requisito da habitualidade não estava presente na relação, mesmo que sob a indevida ótica de um contrato intermitente. Por fim, o Recorrente, a fim de adensar a sua tese, cita julgados que entende favoráveis a sua tese e pugna pela reforma da sentença para que seja afastado o reconhecimento do vínculo de emprego. Examina-se. Inexistindo controvérsia quanto às atividades realizadas pelo Reclamante enquanto motorista vinculado à Uber, tem-se como questão central trazida ao exame desta Relatoria a natureza jurídica da relação existente entre esses motoristas e as empresas que se utilizam de plataformas digitais para oferecer serviços de transporte de pessoas, a qual, passando ao largo das formas tradicionais de emprego, requer uma apreciação do arcabouço legislativo que trata da matéria, à luz de uma nova estrutura de organização empresarial e de prestação de serviços que se desenvolve através de softwares e seus algoritmos. É sabido que, para que fique caracterizado o vínculo empregatício, é necessária a coexistência de quatro elementos fático-jurídicos, insertos nos arts. 2º e 3º, da CLT: onerosidade, subordinação, não eventualidade e pessoalidade. Sobre o tema, assim manifestou-se o Juízo de 1º grau: VINCULO EMPREGATÍCIO O reclamante postula o reconhecimento do contrato de emprego entre as partes, com admissão em 12/09/2019, na função de motorista de aplicativo, com remuneração média mensal de R$ 3.000,00, tendo sido desligado em 28 /06/2024. Conta que a contratação foi realizada através de uma aplicação eletrônica na qual exigido apresentação de Carteira Nacional de Habilitação válida para a categoria do serviço e com EAR ("exerce atividade remunerada"), Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo - CRLV do automóvel usado como ferramenta de trabalho, Antecedentes criminais negativos, conta bancária válida e de sua titularidade, além da foto atualizada de perfil. Alega que recebia remuneração mensal média de 3.000,00, cujo gerenciamento era realizado pela própria reclamada, apurando os pagamentos (dinheiro e cartão de crédito) recebidos pelo motorista e pagamento semanalmente na terça-feira pelo trabalho realizado de domingo a sábado. Salienta que o trabalhador não pode atuar de outro modo senão pelos passos definidos pela reclamada, que lhe são comunicados através do aplicativo, não tendo liberdade para gerir a sua atividade da forma como desejar. Defende que a reclamada transfere aos motoristas o risco do negócio, uma vez que não assumiu a responsabilidade pela aquisição e manutenção do veículo, por exemplo. Diz que procurou saber o motivo do seu desligamento, mas seu atendimento foi automatizado, cuja resposta foi "direção perigosa". Explica o autor que foi injustamente acusado por ser vítima de acidente de trânsito, no qual um motorista ingressou na contramão e o surpreendeu com colisão frontal, conforme Boletim de Ocorrência. Destaca que a UBER funciona como uma transportadora que utiliza veículos de motoristas contratados para realizar o transporte de passageiros. É a empresa que controla o meio produtivo, pois pode simplesmente desligar um motorista do sistema, excluindo-o do mercado de trabalho. Alega que essa capacidade de controle demonstra claramente que adetém o poder sobre toda a atividade econômica realizada. Afirma que coexistiam todos os critérios necessários para a caracterização da relação de emprego, quais sejam: prestação de serviço por pessoa física, pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação. No que tange à pessoalidade informa que motorista não pode se fazer substituir na execução da atividade, sob pena de ser desligado. Quanto à continuidade diz que o trabalho dos motoristas para a empresa é essencial, ante a necessidade constante do serviço dentro da atividade econômica. No que concerne à onerosidade, sustenta que a reclamada define unilateralmente a política de pagamento dos motoristas, incluindo os preços das viagens, formas de pagamento e descontos. Os motoristas não têm controle sobre os valores cobrados nem conhecimento dos critérios de cálculo utilizados pela empresa. Além disso, a empresa retém parte significativa dos valores pagos pelos usuários e repassa segundo seus critérios aos motoristas, exercendo total controle sobre a remuneração, descontos e bonificações. Por fim, com relação à subordinação, destaca que a relação entre os motoristas e a plataforma revela-se controlada em várias frentes: 1) exigências para realizar um grande número de viagens, sujeitando-se a advertências, bloqueios ou até desligamento se recusarem corridas ou obtiverem avaliações baixas; 2) falta de controle sobre a distribuição de viagens, determinada pela plataforma; 3) monitoramento da conduta pelos usuários, que avaliam os motoristas; 4) aplicação de penalidades como advertências, suspensões e demissões; 5) rastreamento em tempo real dos motoristas via GPS; 6) falta de autonomia na definição dos preços cobrados dos clientes. Aduz que o serviço de motorista é executado sob demanda, controlado por algoritmos pela plataforma para manter padrões de qualidade e lucratividade, exercendo controle sobre diversas informações através de monitoramento eletrônico. Assevera que a subordinação jurídica do trabalhador é claramente demonstrada com as seguintes evidências incompatíveis com a suposta autonomia: A reclamada organizava as chamadas dos clientes e indicava qual o reclamante deveria atender; avaliava continuamente a performance do reclamante usando tecnologia e notas dos clientes, podendo dispensá-lo se não atingissem a média mínima; os serviços eram prestados diariamente, com controle minucioso e telemático da empresa sobre o trabalho e o cumprimento de suas diretrizes; a empresa também definia unilateralmente parâmetros como o preço das corridas. Pleiteia a nulidade da dispensa, uma vez que fora abruptamente desligado de forma automatizada, sem aviso prévio e acesso a informação do motivo do desligamento e, consequentemente, a reintegração e o pagamento de danos morais e materiais. Inicialmente, a ré defende a inexistência de qualquer norma jurídica que autorize o restabelecimento e a manutenção de um contrato civil bilateral, de modalidade continuada quando uma das partes não tem mais interesse na sua continuidade. Sustenta que a Uber é empresa de tecnologia e disponibiliza sua plataforma para aqueles que atuam no transporte individual privado de passageiros, tal como o Autor, regulado pelos artigos 3º e 4º da Lei nº 12.587/2012. Assevera que não contrata a prestação de serviços dos motoristas-parceiros, ao revés, são eles que, com o fito de maximizar os seus ganhos, contratam os serviços de intermediação desta empresa. Defende a inexistência de qualquer resquício de vínculo de emprego, em razão da completa ausência de todos os seus requisitos. Ao exame. Como a ré reconheceu a prestação de serviços, mas em modalidade diversa da apontada na inicial, era seu o ônus probatório dos fatos modificativos/extintivos, conforme estabelece o artigo 818, II, da CLT. Pois bem. O vínculo de emprego se configura quando presentes os requisitos contidos no art. 3º da CLT, quais sejam: pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação. A prestação de serviço de motorista mediante a utilização de plataformas como a da reclamada é matéria amplamente discutida, que gera debates jurídicos e perpassa, sobretudo, por uma análise da subordinação jurídica e suas evoluções conceituais, e se estas são aplicáveis ao serviço oferecido em plataformas e aplicativos digitais. Os demais requisitos da relação de emprego são de fácil constatação no caso do serviço de motorista de aplicativos. A atividade é lucrativa, pois gera dividendos para o aplicativo e para o motorista/trabalhador por ser meio de sustento ou renda extra. É frágil o argumento de que o motorista é quem paga ao aplicativo parte do valor cobrado na corrida. Em verdade o pagamento é feito conforme determinações da regra, de sorte que a reclamada retém para si taxa variável de no mínimo 25%. O critério da não-eventualidade também está presente, porquanto se verifica que a atividade prestada pelo motorista é feita de forma permanente no âmbito da reclamada, de sorte que sua inatividade acarreta seu desligamento da plataforma. No que tange à pessoalidade, há que se ressaltar que o cadastro de cada motorista é individual sendo a substituição por outro, vedada pelo aplicativo, inclusive, consta a proibição no termo de adesão (cláusula 2.1 dos Termos e Condições Gerais dos Serviços de Intermediação Digital). Resta-nos perquirir acerca da subordinação, o requisito mais polêmico para a configuração da relação de trabalho ora em apreço. Destaco de antemão que os fatos de a reclamada gerenciar os resultados de seus "parceiros"/motoristas, ter ciência da localização destes e aplicarlhes sanções disciplinares revelam que as três manifestações clássicas do poder de comando, denotativo da relação de emprego, estão presentes, sejam elas o poder de organização e regulamentação, o poder de controle e fiscalização, o poder disciplinar e sancionador. No meu sentir o fato de ficar a critério do motorista o início e término da jornada de trabalho, de não haver exigência quanto ao número mínimo de corridas diárias, de o motorista poder tirar folga, caso desejasse, sem necessidade de justificar sua ausência, não inviabiliza a configuração da subordinação que se exige para a caracterização do emprego. Se assim não fosse, os trabalhadores com jornada e/ou horários flexíveis estariam excluídos da proteção constitucional e legal reservada ao emprego. Também não poderiam ostentar a condição de empregados, entre outros, os trabalhadores que prestam serviço externo, regidos pelo art. 62, I da CLT, ou mesmo os empregados em regime de teletrabalho que prestam serviço por produção ou tarefa, estes literalmente regidos pelo art. 62, III da CLT. Registro, outrossim, que o argumento de a legislação previdenciária dispensar tratamento diferenciado à categoria dos trabalhadores autônomos não interfere na análise da natureza do vínculo à vista do caso concreto, pois do contrário estaríamos a derrogar, definitivamente, o princípio da primazia da realidade e, assim, a violar o art. 9º da CLT e o art. 167 do Código Civil. O fato é que os conceitos de subordinação jurídica tradicionais não se amoldam perfeitamente à nova realidade das relações de trabalho. Essa foi a lição de Fausto Siqueira Gaia em seu livro "Uberização do Trabalho" (Gaia, Fausto Siqueira. Uberização do Trabalho: aspectos da subordinação jurídica disruptiva. 2ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2020): "A programação de algoritmos, que dita e distribui os locais de atuação dos motoristas por meio de aplicativos, que informa à plataforma tecnológica em tempo real se e que com qual frequência o trabalhador vem recusando serviços, e que serve de canal para a avaliação e para punição do trabalhador, substituiu a atuação pessoal e presencial do empregador e seus prepostos no exercício dos poderes de gestão, de organização e disciplinar". Somando-se a isso há o fato de que as empresas constituídas para a prestação de serviços (que dependem da intermediação de mão de obra para realização de sua atividade) caminham a passos largos para a configuração de "empresa vazia" ou "empresa enxuta", valendo-se das plataformas digitais como ferramentas tecnológicas para realizar sua atividade, com a redução dos custos envolvidos na aquisição da força de trabalho. Por tudo que foi exposto, no caso em apreço, está sim presente o requisito da subordinação necessário para configurar a relação de emprego. Nesse contexto, reconheço o vínculo empregatício entre as partes, com admissão em 12/09/2019, na função de motorista de aplicativo, com salário mensal de R$ 3.000,00 e data de saída em 09/08/2024, diante da projeção do aviso prévio de 42 dias. O distrato laboral imotivado decorrente do exercício regular do poder diretivo e potestativo do empregador. Assim, indefiro o pleito de nulidade da dispensa e, consequentemente, a reintegração, diante da inexistência de hipótese legal para fundamentar este pleito. Isso posto, julgo improcedente o pleito de danos materiais. Deixo de apreciar obrigação de fazer para assinatura na CTPS e pagamento de verbas trabalhistas e rescisórias decorrentes, em razão da ausência de pedido. Sem razão o Recorrente. Isso porque, em primeiro lugar, o serviço prestado pelo Autor era marcado por evidente pessoalidade, na medida em que o ingresso como "motorista parceiro" dependia de prévio cadastro individual do trabalhador que fornecia à Uber dados pessoais. Ademais, no curso do contrato de trabalho, a atuação do Obreiro estava submetida a constante avaliação individualizada promovida pela Reclamada, através da observação das notas atribuídas ao motorista pelos usuários. Em segundo lugar, no que toca à onerosidade, esta se mostra na existência de contrapartida econômica em benefício do empregado, que vende à Uber sua força de trabalho, já que o Demandante era pago pelas corridas realizadas para a Apelante. Por outro lado, a não-eventualidade é patente, tendo em vista que houve, no caso em tela, labor habitual, inserto na dinâmica da atividade econômica da empresa, para a Acionada, não havendo, de outra banda, prova de que a conexão do Obreiro ao aplicativo se deu de maneira ocasional, pontual ou dispersa. Em verdade, o que se verifica a partir do histórico de corridas colacionado pelo Reclamante é a habitualidade inequívoca na prestação dos seus serviços à empresa (ID 1f5a377). Cabe lembrar, ademais, que reconhecida a prestação dos serviços, incumbe à Demandada demonstrar a eventualidade ou autonomia do labor, ônus do qual não se desimcumbiu a contento. No mais, sobre a subordinação, observa-se que o Reclamante estava subordinado à Uber, já que a esta cabia dirigir, regulamentar, fiscalizar e disciplinar seus empregados, apresentando a estes parâmetros de serviço objetivamente alinhados pela empresa e inserindo-os na estrutura da empresa, cuja dinâmica de organização e funcionamento é definida pelo contratante. Contudo, para além das dimensões clássica, objetiva e estrutural da subordinação, em casos como o sob exame, também se identifica a subordinação algorítima, uma vez que a Uber vale-se de um sistema sofisticado de contratação, gestão, supervisão, avaliação e fiscalização de mão de obra, à base de ferramentas tecnológicas, aptas a construir e manter um poder de controle empresarial detalhado sobre o a organização e de prestação dos serviços de transportes justificadores da existência e da lucratividade do trabalhador. Assim sendo, cumpre declinar que, a nível jurisprundencial, em se tratando de forma de relação de trabalho moderna, clara decorrência das mudanças cada vez mais velozes por que passam nossa sociedade neste "século dos algoritmos", os Tribunais de nosso país, assim como as Cortes espalhadas pelo globo, vêm se debruçando sobre tais questões, dando início à construção de entendimento quanto à matéria. Na esteira da compreensão desta Relatoria, colaciona-se recente decisão proferida pela 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho: RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017. UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. NATUREZA JURÍDICA DA RELAÇÃO MANTIDA ENTRE OS TRABALHADORES PRESTADORES DE SERVIÇOS E EMPRESAS QUE ORGANIZAM, OFERTAM E EFETIVAM A GESTÃO DE PLATAFORMAS DIGITAIS DE DISPONIBILIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE AO PÚBLICO, NO CASO, O TRANSPORTE DE PESSOAS E MERCADORIAS. NOVAS FORMAS DE ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA FORÇA DE TRABALHO HUMANA NO SISTEMA CAPITALISTA E NA LÓGICA DO MERCADO ECONÔMICO. ESSENCIALIDADE DO LABOR DA PESSOA HUMANA PARA A CONCRETIZAÇÃO DOS OBJETIVOS DA EMPRESA. PROJEÇÃO DAS REGRAS CIVILIZATÓRIAS DO DIREITO DO TRABALHO SOBRE O LABOR DAS PESSOAS NATURAIS. INCIDÊNCIA DAS NORMAS QUE REGULAM O TRABALHO SUBORDINADO DESDE QUE NÃO DEMONSTRADA A REAL AUTONOMIA NA OFERTA E UTILIZAÇÃO DA MÃO DE OBRA DO TRABALHADOR (ART. 818, II, DA CLT). CONFLUÊNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS HUMANISTAS E SOCIAIS QUE ORIENTAM A MATÉRIA (PREÂMBULO DA CF/88; ART. 1º, III E IV; ART. 3º, I, II, III E IV; ART. 5º, CAPUT; ART. 6º; ART. 7º, CAPUT E SEUS INCISOS E PARÁGRAFO ÚNICO; ARTS. 8º ATÉ 11; ART. 170, CAPUT E INCISOS III, VII E VIII; ART. 193, TODOS DA CONSTITUIÇÃO DE 1988). VÍNCULO DE EMPREGO. DADOS FÁTICOS CONSTANTES DO ACÓRDÃO REGIONAL REFERINDO-SE A RELAÇÃO SOCIOECONÔMICA ABRANGENTE DE PERÍODO DE QUASE DOIS MESES. PRESENÇA DOS ELEMENTOS INTEGRANTES DA RELAÇÃO EMPREGATÍCIA. INCIDÊNCIA, ENTRE OUTROS PRECEITOS, TAMBÉM DA REGRA DISPOSTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 6º DA CLT (INSERIDA PELA LEI n. 12.551/2011), A QUAL ESTABELECE QUE "OS MEIOS TELEMÁTICOS E INFORMATIZADOS DE COMANDO, CONTROLE E SUPERVISÃO SE EQUIPARAM, PARA FINS DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA, AOS MEIOS PESSOAIS E DIRETOS DE COMANDO, CONTROLE E SUPERVISÃO DO TRABALHO ALHEIO". PRESENÇA, POIS, DOS CINCO ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO, OU SEJA: PESSOA HUMANA PRESTANDO TRABALHO; COM PESSOALIDADE; COM ONEROSIDADE; COM NÃO EVENTUALIDADE; COM SUBORDINAÇÃO. ÔNUS DA PROVA DO TRABALHO AUTÔNOMO NÃO CUMPRIDO, PROCESSUALMENTE (ART 818, CLT), PELA EMPRESA DE PLATAFORMA DIGITAL QUE ARREGIMENTA, ORGANIZA, DIRIGE E FISCALIZA A PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS ESPECIALIZADOS DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE. Cinge-se a controvérsia do presente processo em definir se a relação jurídica havida entre o Reclamante e a Reclamada - Uber do Brasil Tecnologia Ltda. - configurou-se como vínculo de emprego (ou não). A solução da demanda exige o exame e a reflexão sobre as novas e complexas fórmulas de contratação da prestação laborativa, algo distintas do tradicional sistema de pactuação e controle empregatícios, e que ora se desenvolvem por meio da utilização de plataformas e aplicativos digitais, softwares e mecanismos informatizados semelhantes, todos cuidadosamente instituídos, preservados e geridos por sofisticadas (e, às vezes, gigantescas) empresas multinacionais e, até mesmo, nacionais. É importante perceber que tais sistemas e ferramentas computadorizados surgem no contexto do aprofundamento da revolução tecnológica despontada na segunda metade do século XX (ou, um pouco à frente, no início do século XXI), a partir da informática e da internet , propiciando a geração de um sistema empresarial de plataformas digitais, de amplo acesso ao público, as quais permitem um novo meio de arregimentação de mão de obra, diretamente por intermédio desses aplicativos digitais, que têm o condão de organizar, direcionar, fiscalizar e zelar pela hígida prestação de serviços realizada ao cliente final. A modificação tecnológica e organizacional ocorrida nas duas últimas décadas tem sido tão intensa que há, inclusive, autores e correntes de pensamento que falam na existência de uma quarta revolução tecnológica no sistema capitalista. Evidentemente que essa nova estrutura de organização empresarial e de prestação de serviços facilita a aproximação e a comunicação na sociedade e no âmbito da prestação de serviços ao público alvo, seja este formado por pessoas físicas ou por instituições. Porém a lógica de sua estruturação e funcionamento também tem sido apreendida por grandes corporações empresariais como oportunidade ímpar para reduzirem suas estruturas produtivas e, especialmente, o custo do trabalho utilizado e imprescindível para o bom funcionamento econômico da entidade empresarial. De nenhuma valia econômica teria este sistema organizacional e tecnológico, conforme se percebe, se não houvesse, é claro, a prestação laborativa por ele propiciada ao público alvo objetivado - neste caso, se não existissem motoristas e carros organizadamente postos à disposição das pessoas físicas e jurídicas. Realmente, os impactos dessa nova modalidade empresarial e de organização do trabalho têm sido diversos: de um lado, potenciam, fortemente, a um custo mais baixo do que o precedente, a oferta do trabalho de transporte de pessoas e coisas no âmbito da sociedade; de outro lado, propiciam a possibilidade de realização de trabalho por pessoas desempregadas, no contexto de um desemprego agudo criado pelas políticas públicas e por outros fatores inerentes à dinâmica da economia; mas, em terceiro lugar, pela desregulamentação amplamente praticada por este sistema, gerando uma inegável deterioração do trabalho humano, uma lancinante desigualdade no poder de negociação entre as partes, uma ausência de regras de higiene e saúde do trabalho, uma clara falta de proteção contra acidentes ou doenças profissionais, uma impressionante inexistência de quaisquer direitos individuais e sociais trabalhistas, a significativa ausência de proteções sindicais e, se não bastasse, a grave e recorrente exclusão previdenciária. O argumento empresarial, em tal quadro, segue no sentido de ser o novo sistema organizacional e tecnológico tão disruptivo perante a sistemática de contratação anterior que não se fazem presentes, em sua estrutura e dinâmica, os elementos da relação empregatícia. E, efetivamente, é o que cabe examinar, afinal, no presente processo. Passa-se, dessa maneira, ao exame da relação socioeconômica e jurídica entre as partes do presente processo, respeitados os aspectos fáticos lançados pelo próprio acórdão regional, como determina a Súmula 126 do TST. Nesse exame, sem negligenciar a complexidade das questões que envolvem a discussão dos autos, o eventual enquadramento como vínculo empregatício da relação jurídica entre o prestador de serviços e as plataformas digitais, pelo Poder Judiciário Trabalhista no Brasil, vai depender das situações fáticas efetivamente demonstradas, as quais, por sua própria complexidade, podem abarcar inúmeras e múltiplas hipóteses. A propósito, no Direito brasileiro existe sedimentada presunção de ser empregatício o vínculo jurídico formado - regido pela Constituição da Republica (art. 7º) e pela CLT, portanto - , desde que seja incontroversa a prestação de serviços por uma pessoa natural a alguém (Súmula 212, TST). Essa presunção jurídica relativa (não absoluta, esclareça-se) é clássica ao Direito do Trabalho, em geral, resultando de dois fatores historicamente incontestáveis: a circunstância de ser a relação de emprego a regra geral de conexão dos trabalhadores ao sistema socioeconômico capitalista; a circunstância de a relação de emprego, desde o surgimento do Direito do Trabalho, ter se tornado a fórmula mais favorável e protegida de inserção da pessoa humana trabalhadora na competitiva e excludente economia contemporânea. No Brasil, desponta a singularidade de esta antiga presunção jurídica ter sido incorporada, de certo modo, até mesmo pela Constituição da Republica de 1988, ao reconhecer, no vínculo empregatício, um dos principais e mais eficazes instrumentos de realização de notável bloco de seus princípios cardeais, tais como o da dignidade do ser humano, o da centralidade da pessoa humana na ordem jurídica e na vida socioeconômica, o da valorização do trabalho e do emprego, o da inviolabilidade física e psíquica da pessoa humana, o da igualdade em sentido substancial, o da justiça social, o do bem-estar individual e social, o da segurança e o da subordinação da propriedade à sua função socioambiental. Com sabedoria, a Constituição percebeu que não se criou, na História do Capitalismo, nessa direção inclusiva, fórmula tão eficaz, larga, abrangente e democrática quanto a estruturada na relação de emprego. Convergindo inúmeros preceitos constitucionais para o estímulo, proteção e elogio à relação de emprego (ilustrativamente: Preâmbulo da CF/88; art. 1º, III e IV; art. 3º, I, II, III e IV; art. 5º, caput ; art. 6º; art. 7º, caput e seus incisos e parágrafo único; arts. 8º até 11; art. 170, caput e incisos III, VII e VIII; art. 193, todos do Texto Máximo de 1988), emerge clara a presunção também constitucional em favor do vínculo empregatício no contexto de existência de incontroversa prestação de trabalho na vida social e econômica. De par com isso, a ordem jurídica não permite a contratação do trabalho por pessoa natural, com os intensos elementos da relação de emprego, sem a incidência do manto mínimo assecuratório da dignidade básica do ser humano nessa seara da vida individual e socioeconômica. Em consequência, possuem caráter manifestamente excetivo fórmulas alternativas de prestação de serviços a alguém, por pessoas naturais, como, ilustrativamente, contratos de estágio, vínculos autônomos ou eventuais, relações cooperativadas e as fórmulas intituladas de "pejotização" e, mais recentemente, o trabalho de transporte de pessoas e coisas via arregimentação e organização realizadas por empresas de plataformas digitais. Em qualquer desses casos, estando presentes os elementos da relação de emprego, esta prepondera e deve ser reconhecida, uma vez que a verificação desses pressupostos, muitas vezes, demonstra que a adoção de tais práticas se dá, essencialmente, como meio de precarizar as relações empregatícias (art. 9º, da CLT). Nesse aspecto, cumpre enfatizar que o fenômeno sócio-jurídico da relação empregatícia emerge quando reunidos os seus cinco elementos fático-jurídicos constitutivos: prestação de trabalho por pessoa física a outrem, com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e sob subordinação. Observe-se que, no âmbito processual, uma vez admitida a prestação de serviços pelo suposto empregador/tomador de serviços, a ele compete demonstrar que o labor se desenvolveu sob modalidade diversa da relação de emprego, considerando a presunção (relativa) do vínculo empregatício sedimentada há várias décadas no Direito do Trabalho, conforme exaustivamente exposto. A análise casual das hipóteses discutidas em Juízo, portanto, deve sempre se pautar no critério do ônus da prova - definido no art. 818 da CLT -, competindo ao obreiro demonstrar a prestação de serviços (inciso I do art. 818 da CLT); e à Reclamada, provar eventual autonomia na relação jurídica (inciso II do art. 818 da CLT). No caso dos autos , a prova coligida no processo e referenciada pelo acórdão recorrido demonstrou que a Reclamada administra um empreendimento relacionado ao transporte de pessoas - e não mera interligação entre usuários do serviço e os motoristas cadastrados no aplicativo - e que o Reclamante lhe prestou serviços como motorista do aplicativo digital. Assim, ficaram firmemente demonstrados os elementos integrantes da relação de emprego, conforme descrito imediatamente a seguir. Em primeiro lugar, é inegável (e fato incontroverso) de que o trabalho de dirigir o veículo e prestar o serviço de transporte, em conformidade com as regras estabelecidas pela empresa de plataforma digital, foi realizado, sim, por uma pessoa humana - no caso, o Reclamante. Em segundo lugar, a pessoalidade também está comprovada, pois o Obreiro precisou efetivar um cadastro individual na Reclamada, fornecendo dados pessoais e bancários, bem como, no decorrer da execução do trabalho, foi submetido a um sistema de avaliação individualizada, a partir de notas atribuídas pelos clientes e pelo qual a Reclamada controlava a qualidade dos serviços prestados. É também incontroverso de que todas as inúmeras e incessantes avaliações feitas pela clientela final referem-se à pessoa física do motorista uberizado, emergindo, assim, a presença óbvia do elemento fático e jurídico da pessoalidade. O caráter oneroso do trabalho executado é também incontroverso, pois a clientela faz o pagamento ao sistema virtual da empresa, em geral por meio de cartão de crédito (podendo haver também, mais raramente, pagamento em dinheiro) e, posteriormente, a empresa gestora do sistema informatizado credita parte do valor apurado na conta corrente do motorista. Ora, o trabalhador somente adere a esse sistema empresarial e de prestação laborativa porque ele lhe assegura retribuição financeira em decorrência de sua prestação de trabalho e em conformidade com um determinado percentual dos valores apurados no exercício desse trabalho. Sobre a não eventualidade , o labor do Reclamante estava inserido na dinâmica intrínseca da atividade econômica da Reclamada e inexistia qualquer traço de transitoriedade na prestação do serviço. Não era eventual, também, sob a perspectiva da teoria do evento, na medida em que não se tratava de labor desempenhado para certa obra ou serviço, decorrente de algum acontecimento fortuito ou casual. De todo modo, é também incontroverso de que se trata de labor inerente à rotina fundamental da empresa digital de transporte de pessoas humanas, sem o qual tal empresa sequer existiria. Por fim, a subordinação jurídica foi efetivamente demonstrada, destacando-se as seguintes premissas que se extraem do acórdão regional, incompatíveis com a suposta autonomia do trabalhador na execução do trabalho: 1) a Reclamada organizava unilateralmente as chamadas dos seus clientes/passageiros e indicava o motorista para prestar o serviço; 2) a empresa exigia a permanência do Reclamante conectado à plataforma digital para prestar os serviços, sob risco de descredenciamento da plataforma digital (perda do trabalho); 3) a empresa avaliava continuamente a performance dos motoristas, por meio de um controle telemático e pulverizado da qualidade dos serviços, a partir da tecnologia da plataforma digital e das notas atribuídas pelos clientes/passageiros ao trabalhador. Tal sistemática servia, inclusive, de parâmetro para o descredenciamento do motorista em face da plataforma digital - perda do trabalho -, caso o obreiro não alcançasse uma média mínima; 4) a prestação de serviços se desenvolvia diariamente, durante o período da relação de trabalho - ou, pelo menos, com significativa intensidade durante os dias das semanas -, com minucioso e telemático controle da Reclamada sobre o trabalho e relativamente à estrita observância de suas diretrizes organizacionais pelo trabalhador, tudo efetivado, aliás, com muita eficiência, por intermédio da plataforma digital (meio telemático) e mediante a ativa e intensa, embora difusa, participação dos seus clientes/passageiros. Saliente-se ser fato notório (art. 337, I, do CPC/15) que a Reclamada é quem estabelece unilateralmente os parâmetros mais essenciais da forma de prestação dos serviços e da dinâmica de funcionamento da atividade econômica, como, por exemplo, a definição do preço da corrida e do quilômetro rodado no âmbito de sua plataforma digital. Desse quadro, se percebe a configuração da subordinação jurídica nas diversas dimensões: a) clássica , em face da existência de incessantes ordens diretas da Reclamada promovidas por meios remotos e digitais (art. 6º, parágrafo primeiro, da CLT), demonstrando a existência da assimetria poder de direção/subordinação e, ainda, os aspectos diretivo, regulamentar, fiscalizatório e disciplinar do poder empregatício; b) objetiva, tendo em vista o trabalho executado estritamente alinhado aos objetivos empresariais; c) estrutural , mediante a inteira inserção do profissional contratado na organização da atividade econômica desempenhada pela Reclamada, em sua dinâmica de funcionamento e na cultura jurídica e organizacional nela preponderante; d) por fim, a subordinação algorítima, que consiste naquela efetivada por intermédio de aferições, acompanhamentos, comandos, diretrizes e avaliações concretizadas pelo computador empresarial, no denominado algoritmo digital típico de tais empresas da Tecnologia 4.0. Saliente-se, por oportuno, que a suposta liberdade do profissional para definir seus horários de trabalho e de folgas, para manter-se ligado, ou não, à plataforma digital, bem como o fato de o Reclamante ser detentor e mantenedor de uma ferramenta de trabalho - no caso, o automóvel utilizado para o transporte de pessoas - são circunstâncias que não têm o condão de definir o trabalho como autônomo e afastar a configuração do vínculo de emprego. Reitere-se: a prestação de serviços ocorria diariamente, com sujeição do Autor às ordens emanadas da Reclamada por meio remoto e telemático (art. 6º, parágrafo único, da CLT); havia risco de sanção disciplinar (exclusão da plataforma) em face da falta de assiduidade na conexão à plataforma e das notas atribuídas pelos clientes/passageiros da Reclamada; inexistia liberdade ou autonomia do Reclamante para definir os preços das corridas e dos seus serviços prestados, bem como escolher os seus passageiros (ou até mesmo criar uma carteira própria de clientes); não se verificou o mínimo de domínio do trabalhador sobre a organização da atividade empresarial, que era centralizada, metodicamente, no algoritmo da empresa digital; ficou incontroversa a incidência das manifestações fiscalizatórias, regulamentares e disciplinares do poder empregatício na relação de trabalho analisada. Enfim, o trabalho foi prestado pelo Reclamante à Reclamada, mediante remuneração, com subordinação, e de forma não eventual. Cabe reiterar que, embora, neste caso concreto, tenham sido comprovados os elementos da relação empregatícia, deve ser considerado que o ônus da prova da autonomia recai sobre a defesa, ou seja, o ente empresarial, já que inequívoca a prestação de trabalho (art. 818, II, da CLT), sendo forçoso reconhecer, também, que a Reclamada não se desvencilhou satisfatoriamente de seu encargo probatório. Dessa forma, deve ser reformado o acórdão regional para se declarar a existência do vínculo de emprego entre as Partes, nos termos da fundamentação. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR: 1003530220175010066, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 06/04/2022, 3ª Turma, Data de Publicação: 11/04/2022). Do acórdão, com o intuito de enriquecer este julgado, cumpre trazer à baila não apenas a ementa supra, mas a íntegra da análise promovida pelo Tribunal Superior do Trabalho do fenômeno em apreço, já que este trata de maneira brilhante do tema e serve de "farol" para essa árdua tarefa que o Direito do Trabalho tem pela frente: evitar que, na esteira de uma tecnologia que permeia cada canto do fazer humano, retornemos às trevas da exploração do homem pelo homem - ou, num contexto de capitalismo globalizado, do homem pelos grandes conglomerados de tecnologia . A solução da demanda exige o exame e a reflexão sobre as novas e complexas fórmulas de contratação da prestação laborativa, algo distintas do tradicional sistema de pactuação e controle empregatícios, e que ora se desenvolvem por meio da utilização de plataformas e aplicativos digitais, softwares e produtos semelhantes, todos cuidadosamente instituídos, preservados e geridos por sofisticadas (e, às vezes, gigantescas) empresas multinacionais e, até mesmo, nacionais. É importante perceber que tais ferramentas computadorizadas surgem no contexto do aprofundamento da revolução tecnológica surgida na segunda metade do século XX, a partir da informática e da internet, propiciando a geração de um sistema empresarial de plataformas digitais, de amplo acesso ao público, as quais permitem um novo meio de arregimentação de mão de obra, diretamente por intermédio desses aplicativos digitais, que têm o condão de organizar, direcionar, fiscalizar e zelar pela hígida prestação de serviços realizada ao cliente final. A modificação tecnológica e organizacional ocorrida nas duas últimas décadas tem sido tão intensa que há, inclusive, autores e correntes de pensamento que falam na existência de uma quarta revolução tecnológica (ou quarta revolução industrial). Evidentemente que essa nova estrutura de organização empresarial e de prestação de serviços facilita a aproximação e a comunicação na sociedade e no âmbito da prestação de serviços ao público alvo, seja este formado por pessoas físicas ou por instituições. Porém a lógica de seu funcionamento também tem sido apreendida por grandes corporações empresariais como oportunidade ímpar para reduzirem suas estruturas produtivas e o custo do trabalho utilizado e imprescindível para o seu bom funcionamento econômico. De nenhuma valia econômica teria este sistema organizacional, conforme se percebe, se não houvesse, é claro, a prestação laborativa por ele propiciada ao público alvo objetivado. Os impactos dessa nova modalidade empresarial e de organização do trabalho têm sido diversos: de um lado, potenciam, fortemente, a um custo mais baixo do que o precedente, a oferta do trabalho de transporte de pessoas e coisas no âmbito da sociedade; de outro lado, propiciam a possibilidade de trabalho a pessoas desempregadas, no contexto de um desemprego agudo criado pelas políticas públicas e outros fatores inerentes à dinâmica da economia; mas, em terceiro lugar, pela desregulamentação amplamente praticada por este sistema, geram uma inegável deterioração do trabalho humano, uma lancinante desigualdade no poder de negociação entre as partes, uma ausência de regras de higiene e saúde do trabalho, a falta de proteção contra acidentes ou doenças profissionais, a inexistência de quaisquer direitos individuais e sociais trabalhistas, a ausência de proteções sindicais e, se não bastasse, a recorrente exclusão previdenciária. O argumento empresarial, em tal quadro, segue no sentido de ser o novo sistema organizacional e tecnológico tão disruptivo perante a sistemática de contratação anterior que não se fazem presentes, em sua estrutura e dinâmica, os elementos da relação empregatícia. É o que cabe examinar, afinal, no presente processo. Nesse ponto, faz-se necessário compreender que essas novas fórmulas de gestão da força de trabalho também derivam de um longo processo de crise econômica e de transformações sociais ocorridas nos últimos 30 anos, com forte impacto nas políticas sociais das nações democráticas do planeta. Esse cenário, composto ainda pela alta renovação tecnológica e a intensa competição capitalista, construiu-se sem poupar suas repercussões negativas no mundo do trabalho, ou seja, agravou-se o problema da redução dos postos formais de trabalho em diversos segmentos econômicos e elevou-se o prestígio de discursos sobre a reestruturação das estratégias e modelos clássicos de gestão empresarial, bem como da desregulamentação trabalhista, tudo a favor de uma maior aproximação dos processos e mecanismos de gestão da força de trabalho às necessidades econômicas do sistema capitalista. É importante refletir, diante dessas complexas questões, sobre a função do Direito: cabe a ele manter-se, mesmo em face da revolução tecnológica e da inovação das formas de gestão da força do trabalho, como um instrumento de civilização, ou deve, ao invés - na linha exaustivamente instigada pelo pensamento neoconservador -, ser um passivo (ou, até mesmo, ativo) instrumento de exacerbação das desigualdades do sistema econômico propiciadas pela aplicação e manejo desregulados e darwinistas das tecnologias e suas múltiplas ferramentas? A verdade é que este momento histórico, de crises e transformações sociais, torna ainda mais clara a necessidade de um segmento jurídico com as características essenciais do Direito do Trabalho, o qual deve ser projetado sobre as relações sociais como instrumento de civilização e regulação do sistema econômico e social capitalista. Nesse contexto, enquadrarem os avanços tecnológicos nos interesses também das pessoas humanas - ao invés de, estritamente, no interesse do poder econômico - chama-se progresso civilizatório, constitucionalismo humanístico e social, em contraponto à desagregação e entropia estimuladas pelo unilateralismo das fórmulas de gestão concebidas sob a exclusiva perspectiva economicista e antissocial. É importante lembrar que o Direito do Trabalho é produto do capitalismo, atado à evolução histórica desse sistema, retificando-lhe distorções econômico-sociais e civilizando a importante relação de poder que sua dinâmica econômica cria no âmbito da sociedade civil. Ele fixou controles para esse sistema, conferiu-lhe certa medida de civilidade, inclusive buscando eliminar as formas mais perversas de utilização da força de trabalho pela economia. Seu nascimento, como ramo jurídico distinto e autônomo, deu-se a partir da conversão de diversos fatores, um dos quais a Revolução Industrial, que simboliza as profundas transformações sociais, econômicas e tecnológicas ocorridas a partir da metade do Século XVIII. Começava ali a se estruturar a relação empregatícia (o trabalho livre e subordinado) como categoria jurídica e hegemônica sobre a qual se formularam e se desenvolveram os princípios, regras e institutos jurídicos do Direito do Trabalho; bem como se estruturava o próprio sistema econômico-social, hoje dominante, após longo processo de construção civilizada da sociedade industrial urbana, por intermédio da inclusão de uma parcela cada vez maior de pessoas na economia contemporânea. Faz-se essa rápida digressão apenas para reiterar a justificativa histórica do Direito do Trabalho e compreender a permanente necessidade de sua projeção sobre todas as formas de prestação do labor humano oneroso como instrumento de avanço civilizatório, especialmente em momentos de relevantes modificações sociais e econômicas. A discussão destes autos, por demandar reflexão acerca de novas fórmulas de gestão da força de trabalho humano, deve ter como ponto de partida essa função civilizatória do Direito do Trabalho e o seu caráter expansionista. Nada obstante, é inexistente a produção regulatória do Poder Legislativo do País sobre as questões de natureza trabalhista no âmbito das relações entre prestadores de serviço e empresas que utilizam as plataformas digitais. O enfrentamento dessa problemática pelas Cortes Trabalhistas, por outro lado, ainda não é significativa, notadamente no âmbito do TST, inexistindo uma jurisprudência pátria consolidada sobre o tema. Cumpre destacar, todavia, que existem discussões doutrinárias no Brasil e em todo o mundo democrático sobre a natureza da relação dos motoristas e/ou entregadores de aplicativos com a respectiva plataforma ou aplicativo digital que utiliza sua força de trabalho, assim como as possíveis medidas jurídicas de regulamentação nesse âmbito. No plano do direito comparado, tem-se verificado a tendência de o Poder Judiciário, tanto nos EUA como na Europa, reconhecer a natureza trabalhista/empregatícia da relação jurídica entre prestadores de serviços e as empresas que exploram as plataformas digitais de transporte de pessoas e entregas, restringindo o livre império das forças de mercado na regência da administração do labor humano nessa específica área. [...] A Organização Internacional do Trabalho - OIT, por sua vez, já no ano de 2006, atenta às alterações sociais decorrentes dos novos modelos de produção de bens e serviços, expediu a Recomendação nº 198 (Sobre Relações de Trabalho), cujo preâmbulo já anunciava sua preocupação com as "dificuldades em determinar a existência de uma relação de trabalho quando os respectivos direitos e obrigações dos interessados não são claros, quando se tenta encobrir a relação de trabalho, ou quando existem inadequações ou limitações na legislação, na sua interpretação ou em seu aplicativo"8. Embora essa diretiva da OIT não tenha eficácia normativa equivalente a uma Convenção, ela surge como vetor de interpretação importante para direcionar a composição das controvérsias no âmbito da jurisdição nacional. Dela se extrai, por exemplo, a perspectiva recomendatória no sentido de que os Estados-Membros criem mecanismos que evitem a simulação das relações de trabalho no âmbito "de outras relações que possam incluir o recurso a outras formas de acordos contratuais que ocultem a verdadeira situação jurídica, entendendo-se que existe uma relação de trabalho disfarçada quando o empregador trata o trabalhador como se não o fosse, de forma a ocultar o seu verdadeiro estatuto jurídico, podendo surgir situações em que as disposições contratuais resultem na privação do trabalhador da proteção a que tem direito" (Art. 4, "b"). A par de tudo até aqui exposto, sem olvidar a complexidade das questões que envolvem a discussão dos autos, o eventual enquadramento como vínculo empregatício da relação jurídica entre prestador de serviços e as plataformas digitais, pelo Poder Judiciário Trabalhista no Brasil, vai depender das situações fáticas efetivamente demonstradas, as quais, por sua própria complexidade, podem envolver inúmeras e múltiplas hipóteses. Aliás, entre as empresas de plataformas digitais congêneres existem dois grandes grupos, com diferenças significativas entre eles. De um lado, as empresas que são realmente disruptivas, uma vez que conseguem aproximar o consumidor final do fornecedor final do produto, sem a intermediação do trabalho humano organizado, tal como ocorre, por exemplo, com empresas como a AirBnB - Air, Bed and Breakfast -, a qual consegue compartilhar para os consumidores de qualquer lugar do planeta ofertas de vagas em apartamentos, casas e outras residências situadas em locais distantes da cidade ou do país do consumidor interessado. E esse compartilhamento é feito sem a necessidade da organização de um sistema de trabalho à base de profissionais intermediários entre a plataforma digital e o consumidor interessado. Do mesmo modo, isso se verifica com a empresa Booking.com, plataforma pela qual qualquer indivíduo, em qualquer lugar do planeta, pode efetivar, em qualquer lugar da terra, reservas em Hotéis, pousadas, etc. Ou ainda empresas digitais como a Pet Anjo/Pet Hub, mediante as quais o dono de um pequeno animal de estimação (mascote ou pet) pode entrar em contato com outros proprietários de pets para alojar o seu animal, em residências, onerosamente, por curtos períodos. Nesses casos, existe, sim, um sistema empresarial disruptivo, o qual não passa pela utilização predatória do trabalho humano. Aqui se trata de empresas reais de compartilhamento. Por outro lado, o segundo grupo de empresas de plataformas digitais que se dizem partícipes da economia compartilhada (mas que nela não estão efetivamente integradas ou apenas parcialmente estão ali inseridas) ostentam estrutura, natureza e dinâmica sumamente distintas, uma vez que passam pela utilização intensiva do trabalho humano, sem respeitar regras civilizatórias trabalhistas, para conseguirem cumprir os seus objetivos empresariais. Trata-se, por ilustração, das empresas de transportes de pessoas e coisas, que necessitam, estruturalmente, do trabalho humano intensivo, mas que o querem utilizar sem cumprir as regras legais civilizatórias existentes em benefício dos seres humanos envolvidos nessa dinâmica de labor intensivo. É o caso dos autos, conforme claramente se percebe. Ora, aqui não se trata das lídimas empresas da economia de compartilhamento. Trata-se de sistemas empresariais digitais que, mediante sofisticado sistema de algoritmos, conseguem realizar uma intensiva utilização de mão de obra com o fito de alcançarem o objetivo empresarial de fornecerem transporte imediato a pessoas e coisas. E assim o fazem sem o cumprimento da ordem jurídica constitucional e legal trabalhista. Aliás, como bem apontou o Ministro Alberto Bresciani, em seu voto convergente com este relator colacionado aos autos, cabe se notar "que a precarização não é causada pela tecnologia, mas é a tecnologia que é utilizada como ferramenta de ideologia econômica, para criar 'novas' modalidades de trabalho, alijadas da proteção social mínima" De toda maneira, no Direito brasileiro existe sedimentada presunção de ser empregatício o vínculo jurídico formado - regido pela CLT, portanto -, desde que seja incontroversa a prestação de serviços por uma pessoa natural a alguém (Súmula 212, TST). Essa presunção jurídica relativa (não absoluta, esclareça-se) é clássica ao Direito do Trabalho, em geral, resultando de dois fatores historicamente incontestáveis: a circunstância de ser a relação de emprego a regra geral de conexão dos trabalhadores ao sistema socioeconômico capitalista; a circunstância de a relação de emprego, desde o surgimento do Direito do Trabalho, ter se tornado a fórmula mais favorável e protegida de inserção da pessoa humana trabalhadora na competitiva e excludente economia contemporânea. No Brasil, desponta a singularidade de essa antiga presunção jurídica ter sido incorporada, de certo modo, até mesmo pela Constituição da República de 1988, ao reconhecer, no vínculo empregatício, um dos principais e mais eficazes instrumentos de realização de notável bloco de seus princípios cardeais, tais como o da dignidade do ser humano, o da centralidade da pessoa humana na ordem jurídica e na vida socioeconômica, o da valorização do trabalho e do emprego, o da inviolabilidade física e psíquica da pessoa humana, o da igualdade em sentido substancial, o da justiça social, o do bem-estar individual e social, o da segurança e o da subordinação da propriedade à sua função socioambiental. Com sabedoria, a Constituição percebeu que não se criou, na História do Capitalismo, nessa direção inclusiva, fórmula tão eficaz, larga, abrangente e democrática quanto a estruturada na relação de emprego. Convergindo inúmeros preceitos constitucionais para o estímulo, proteção e elogio à relação de emprego (ilustrativamente: Preâmbulo; art. 1º, III e IV; art. 3º, I, II, III e IV; art. 5º, caput; art. 6º; art. 7º, caput e seus incisos e parágrafo único; arts. 8º até 11; art. 170, caput e incisos III, VII e VIII; art. 193, todos do Texto Máximo de 1988), emerge clara a presunção também constitucional em favor do vínculo empregatício no contexto de existência de incontroversa prestação de trabalho na vida social e econômica. De par com isso, a ordem jurídica não permite a contratação do trabalho por pessoa natural, com os intensos elementos da relação de emprego, sem a incidência do manto mínimo assecuratório da dignidade básica do ser humano nessa seara da vida individual e socioeconômica - sob pena de retrocesso civilizatório, na medida em que o trabalho não é uma mercadoria e sim o instrumento mais consistente para assegurar a dignidade do ser humano na sociedade contemporânea. Não absorve, pois, fórmulas regentes da relação de emprego que retirem tal vínculo do patamar civilizatório mínimo afirmado pela ordem jurídica contemporânea. O próprio art. 7º da Constituição, em seu caput e incisos, estabelece o envoltório protetivo trabalhista para toda relação de emprego configurada na sociedade. Em consequência, possuem caráter manifestamente excetivo fórmulas alternativas de prestação de serviços a alguém, por pessoas naturais, como, ilustrativamente, contratos de estágio, vínculos autônomos ou eventuais, relações cooperativadas e as fórmulas intituladas de "pejotização" e, mais recentemente, a chamada "uberização". Em qualquer desses casos, estando presentes os elementos da relação de emprego, esta prepondera e deve ser reconhecida, uma vez que a verificação desses pressupostos, muitas vezes, demonstra que a adoção de tais práticas se dá apenas como meio de precarizar as relações empregatícias (art. 9º da CLT: fraude), alargando os lucros do empreendimento. Nessa linha, a propósito, muito bem enfatizou o Ministro Alberto Bresciani, em seu voto convergente ao voto deste relator (já anexado aos autos): "De início, há de se partir do pressuposto de que os padrões internacionais de direitos humanos básicos não fazem distinção entre trabalhadores tradicionais (como empregados de fábricas) e não tradicionais (motoristas de aplicativo)." Desse modo, havendo a comprovação da presença dos elementos fático-jurídicos necessários à configuração do liame empregatício, antes mencionados, mantém-se a sentença de origem. Apelo improvido, no aspecto. Como se infere tanto do Acórdão, como das próprias razões apresentadas pela Embargante, em verdade, a sua real intenção não é outra senão a de rediscutir a justiça da decisão embargada, por não concordar com as deliberações adotadas por esta E. Corte, pretensão essa, contudo, inadmissível em sede de Declaratórios. No caso vertente, não se vislumbra omissão no julgado, que tomou por base os pontos incontroversos da demanda e apresentou pormenorizadamente as razões de fato e de direito que o fundamentaram. Conclui-se, assim, que a Embargante, consoante textualmente expresso em transcrição acima, pretende o reexame do conjunto probatório, hipótese, como se sabe, incabível em sede de Aclaratórios. Ademais, não cabe ao Poder Judiciário satisfazer indagações, tampouco se ver compelido a registrar na decisão todos os elementos de prova trazidos aos autos, intensificando, desnecessariamente, o ofício jurisdicional. Cumpre registrar, ainda, que a ausência de expressa análise de algum dispositivo legal apontado nas razões recursais ou de algum dos argumentos lançados, inclusive de valoração de prova, não configura omissão. Tem-se, portanto, que a decisão embargada, no particular, encontra-se devidamente fundamentada, nos moldes do art. 93, inciso IX, da Constituição da República. Assim, caso entenda a parte que houve erro de julgamento, o meio processual adequado para ver apreciado o seu inconformismo não é a via de Aclaramento. Inexistindo omissão, também não há que se falar em acolhimento dos Embargos para fins de prequestionamento, nos termos das Súmulas de nºs 297, do TST e 4, deste Regional. Embargos improvidos. VIOLAÇÃO À LIVRE INICIATIVA E AO LIVRE EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA - OMISSÃO / PREQUESTIONAMENTO A Embargante aponta, nesse tópico, que o "v. acórdão foi omisso sobre possível interferência no modelo de negócio da empresa, em violação os princípios dos valores sociais do trabalho, da valorização do trabalho, da livre iniciativa e do livre exercício de atividade econômica constantes no artigo 1º, IV e 170, caput, IV e parágrafo único da CF/88, questões devidamente suscitadas em contrarrazões (ID. 779d30d), mas ainda não apreciadas pela r. decisão embargada". Alega que a "omissão sobre as alegadas violações constitucionais ganha maior relevância pois a matéria sub judice foi reconhecida como constitucional pelo C. STF, que, em recentíssima decisão, declarou a existência de repercussão geral no recurso extraordinário RE 1.446.336, que gerou o Tema 1291 de repercussão geral do STF: Reconhecimento de vínculo empregatício entre motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa administradora de plataforma digital, que discute justamente a potencial violação ao art. 1º, IV e 170, IV da Constituição". Ao exame. Ainda que de maneira breve, verifica-se que a Embargante tratou sobre a questão em epígrafe em seu Apelo, afirmando, na peça de ID 53d3429, o que se segue: Não é demais lembrar que não compete ao Judiciário interferir na dinâmica da atividade empresarial, especialmente quando a Lei expressamente reconhece a atividade, como pretende o reclamante, ao se distanciar da realidade do modelo de negócio da recorrida. Sendo detentora de plataforma eletrônica, a Recorrida possui liberdade para definir as condições de utilização de sua tecnologia, estabelecendo, inclusive, o preço para a prestação dos serviços fornecidos ao cliente que, in casu, é o motorista, tal como o Recorrido. Via de consequência, há nítida pretensão do reclamante de interferência estatal no poder potestativo da Recorrida contida no art. 1º, IV e 170 da CR/88, e artigo 3º, VIII da Lei 12965/14 invadindo a esfera da gestão da propriedade privada. Data máxima vênia, a pretensão do recorrente excede ao poder do Estado interferir na estruturação jurídica da empresa, na sua finalidade social, salvo se for exercido para controle de legalidade dos atos abusivos, configurando indevida intromissão no poder diretivo da empresa a desconfiguração da relação comercial existente. Com relação ao tópico em apreço, incorreu, de fato, o julgado em omissão, razão pela qual, suprindo-a, complementa-se a fundamentação para dela fazer constar o que se segue: Sabe-se que a República Federativa do Brasil, consoante insculpido no art. 1º, IV, da CRFB/88, tem como fundamentos "os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa", estando, a nossa ordem econômica, nos termos do art. 170, "fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social". Dessa maneira, a busca pela equalização entre os interesses dos trabalhadores e dos empresários que atuam em nosso país é balizador de nosso Estado Democrático de Direito, devendo, por consequência, a relação entre as plataformas digitais e aqueles que lhes prestam serviços, gerando-lhes lucros, ser, igualmente visualizada através dessas lentes a fim de evitar que sua atuação se dê ao arrepio de todas as conquistas sociais asseguradas ao trabalhador pela nossa Carta Magna, em especial a dignidade da pessoa humana. É certo, portanto, que o execício da liberdade econômica não se sobrepõe, de modo algum, aos demais princípios existentes na Constituição, em especial aqueles que, através da proteção aos trabalhadores, visa garantir um patamar civilizatório mínimo necessário à salvaguarda da dignidade dos trabalhadores em nosso país. Ademais, não se pode olvidar que, à luz da primazia da realidade, uma vez que existam na relação estabelecida entre as partes os elementos que caracterizam o vínculo empregatício, esta deve ser reconhecida judicialmente, ainda que tal reconhecimento impacte na alteração da dinâmica gerencial idealizada para a empresa. No mesmo sentido, a jurisprudência a seguir: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA RÉ. RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO COM A PLATAFORMA DIGITAL. PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, CENTRALIDADE DA PESSOA HUMANA NA ORDEM ECONÔMICA E SOCIAL. VALOR SOCIAL DO TRABALHO E DA LIVRE INICIATIVA, FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE E DA MÁXIMA EFETIVIDADE DOS DIREITOS CONSTITUCIONAIS No que tange ao enfrentamento acerca da liberdade econômica e livre iniciativa, em complementação do julgado, destaca-se que, o debate acerca do tema reconhecimento do vínculo de emprego com a plataforma digital não pode se pautar em uma visão simplista das relações contratuais, negando a um dos contratantes, o trabalhador, o acesso a direitos mínimos conquistados a muito custo histórico e assegurados no âmbito constitucional com o status de cláusulas pétreas. É preciso que a relação contratual respeite as diretrizes constitucionais. Entender de modo diferente, como vem fazendo a plataforma digital, é entrar em rota de colisão com os mais basilares preceitos constitucionais assegurados ao trabalhador, com relevo para os princípios do valor social do trabalho e da livre iniciativa, função social da propriedade, máxima efetividade dos direitos constitucionais, da dignidade da pessoa humana e da centralidade da pessoa humana na ordem jurídica e social (arts. 1º, 3º, 5º, 6º, 7º e 170, CF/88). É o direito e as relações dele decorrentes que devem se adequar ao homem, garantindo a sua dignidade, e não o contrário. Não cabe ao homem se despir da sua dignidade, representada pelos seus direitos mínimos, para se adaptar às dinâmicas emergentes no mercado de trabalho, pura e simplesmente em nome da "livre iniciativa" e da "liberdade econômica". O Direito do Trabalho se rege também por princípios, dentre os quais o da primazia da realidade, segundo o qual o que define a relação jurídica é a realidade objetiva evidenciada pelos fatos, independente de terem as partes consciência ou vontade de integrar tal relação. Portanto, toda relação de trabalho subordinado, pessoal, habitual e onerosa, como é o caso dos autos, corresponderá a um vínculo de emprego, mesmo que as partes não tenham formalizado o contrato de trabalho ou tenham pactuado formalmente de outro modo, como por exemplo, na forma de prestação de serviços autônomos. Embargos a que se dá provimento, sem efeito modificativo. (TRT-1 - Recurso Ordinário - Rito Sumaríssimo: 0100513-94.2021.5.01.0063, Relator: MARIO SERGIO MEDEIROS PINHEIRO, Data de Julgamento: 25/11/2022, Primeira Turma, Data de Publicação: DEJT 2022-12-13) Embargos providos, para sanar a omissão apontada, no particular, sem conferir, contudo, efeito modificativo ao julgado. DA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - OMISSÃO/ OBSCURIDADE A seguir, a Embargante alega que "o v. acórdão suscita omissão e obscuridade, uma vez que não houve o reconhecimento de prestação de serviços, já que a Embargante a nega veementemente ao longo dos autos, bem como em sua peça recursal (ID 53d3429). Muito ao contrário, sempre esclareceu que é a empresa que prestava serviços ao embargado". Nesta esteira, "requer seja sanada a omissão e a obscuridade referente à negativa da prestação de serviços pela Uber, até para que não se cogite ofensa ao próprio art. 5º, II, da Constituição.". Sem razão. Isso porque a UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA., ao questionar as premissas fáticas nas quais se baseou este Tribunal para proferir sua decisão, não busca ver suprida omissão, mas sim obter uma reapreciação do caso, notadamente considerando que este juízo, diante de tudo quanto carreado aos autos, entendeu por distribuir o ônus da prova à Reclamada frente à sua narrativa da existência de relação entre as partes diversa da empregatícia. Como já dito acima, uma vez que a decisão embargada não se encontra carente em sua fundamentação, caso a parte entenda que houve erro de julgamento, o meio processual adequado para ver apreciado o seu inconformismo não é a oposição de Embargos de Declaração. Embargos a que se nega provimento. Isso posto, conhece-se dos Embargos de Declaração e, no mérito, dá-se-lhes parcial provimento para, sanando a omissão constatada no Acórdão, complementar a sua fundamentação, consoante excerto supra, o qual passa a integrar a decisão proferida, sem, contudo, conceder-lhe efeito modificativo. Acordam os Desembargadores da Primeira Turma do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região, por unanimidade, conhecer dos Embargos de Declaração e, no mérito, dar-lhes parcial provimento para, sanando a omissão constatada no Acórdão, complementar a sua fundamentação, consoante excerto supra, o qual passa a integrar a decisão proferida, sem, contudo, conceder-lhe efeito modificativo. Presidiu a SESSÃO VIRTUAL o Exmo. Desembargador Presidente JOSENILDO CARVALHO. Participaram, ainda, o(a) Exmo(a) Representante do Ministério Público do Trabalho da 20ª Região, o Exmo. Procurador RÔMULO BARRETO DE ALMEIDA, bem como os(as) Exmos.(as) Desembargadores(as) VILMA MACHADO AMORIM (RELATORA), RITA OLIVEIRA e THENISSON DÓRIA. VILMA LEITE MACHADO AMORIM Relatora ARACAJU/SE, 14 de abril de 2025. NELSON FREDERICO LEITE DE MELO SAMPAIO Diretor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- KLEBER ALEX FERREIRA DOS SANTOS RODRIGUES
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