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Processo nº 1013019-05.2025.8.11.0000

ID: 306711540

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1013019-05.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 25/06/2025

Polo Ativo:

UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013019-05.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013019-05.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer / Não Fazer, Planos de saúde] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (AGRAVANTE), M. C. M. D. S. - CPF: 097.529.061-41 (AGRAVADO), VALDIR DE JESUS DOS SANTOS - CPF: 602.300.459-87 (AGRAVADO), VALDIR DE JESUS DOS SANTOS - CPF: 602.300.459-87 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), PLURAL GESTAO EM PLANOS DE SAUDE LTDA - CNPJ: 97.553.801/0001-16 (TERCEIRO INTERESSADO), JONATAS PEIXOTO LOPES - CPF: 004.280.311-02 (ADVOGADO), MYKAELLA ATTYLA SANT ANA PRADO - CPF: 053.339.081-84 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. CANCELAMENTO UNILATERAL. TUTELA DE URGÊNCIA. RESTABELECIMENTO. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. INADIMPLÊNCIA CONTESTADA. PROTEÇÃO À SAÚDE. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que concedeu tutela de urgência para determinar o restabelecimento do plano de saúde da beneficiária menor de idade, cujo contrato foi cancelado unilateralmente pela operadora sob alegação de inadimplemento por período superior a 60 dias. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar: (i) se estão presentes os requisitos autorizadores da tutela de urgência previstos no art. 300 do CPC para o restabelecimento do plano de saúde; e (ii) se o cancelamento unilateral do plano de saúde observou os requisitos estabelecidos no art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 9.656/98, notadamente quanto à comprovada notificação prévia do consumidor. III. Razões de decidir 3. A probabilidade do direito resta evidenciada pela existência de declaração de quitação anual de débitos referente ao ano de 2024, que contrapõe a alegação de inadimplência, bem como pela ausência de comprovação de que a agravante tenha cumprido o requisito legal de notificar a consumidora até o quinquagésimo dia de inadimplência. 4. O e-mail que a agravante alega ter enviado em 11/12/2024, informando sobre risco de cancelamento por pendências de julho/24 e novembro/24, para cancelamento previsto para 14/12/2024, não atende ao prazo legal estabelecido no art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 9.656/98, que exige notificação prévia, pessoal e inequívoca. 5. O perigo de dano é inconteste, pois a privação da cobertura do plano de saúde coloca em risco o bem jurídico de maior relevância do ordenamento jurídico: a vida. A proteção à saúde é direito fundamental assegurado pela Constituição Federal e, no caso de menores de idade, goza de proteção especial, conforme disposto no art. 227 da Carta Magna. 6. Não há perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, uma vez que, caso a agravante obtenha êxito na demanda principal, poderá proceder à rescisão contratual pelos meios legais e buscar o ressarcimento de eventuais custos. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: "1. O cancelamento unilateral do contrato de plano de saúde por inadimplência exige notificação prévia, pessoal e inequívoca do segurado até o quinquagésimo dia de inadimplência, conforme art. 13, parágrafo único, II, da Lei nº 9.656/98. 2. A declaração de quitação anual de débitos, somada à ausência de comprovação da notificação legal, são elementos suficientes para caracterizar a probabilidade do direito em tutela de urgência para restabelecimento do plano de saúde." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 227; CPC, art. 300; Lei nº 9.656/98, art. 13, parágrafo único, II. Jurisprudência relevante citada: Súmula 608/STJ; TJ-GO - AI: 5320581-53.2024.8.09.0051; TJ-SP - AC: 1007358-86.2022.8.26.0047. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo interposto por UNIMED CUIABÁ – COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, contra decisão que concedeu antecipação da tutela determinando o restabelecimento do plano de saúde de M. C. M. S., representada por VALDIR DE JESUS DOS SANTOS, nos autos da ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela e indenização por danos morais e materiais (autos nº 1011498-19.2025.8.11.0002). A recorrente alega que a decisão agravada viola o art. 300 do CPC, pois não estão presentes os requisitos para a concessão da tutela antecipada, tendo sido concedida de forma equivocada. Sustenta que não há elementos que evidenciem a probabilidade do direito da Agravada, bem como não há perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Argumenta que agiu em conformidade com a legislação aplicável ao rescindir o contrato da agravada por inadimplência, após notificação prévia, não havendo qualquer irregularidade em sua conduta. Afirma que o agravado estava ciente da inadimplência e não regularizou o débito no prazo legal de 60 dias. Aduz que o contrato de plano de saúde prevê expressamente a possibilidade de rescisão em caso de inadimplência e que a concessão da tutela antecipada viola o princípio da boa-fé contratual, além de poder causar dano de difícil reparação à Agravante. Ao final, requer o provimento do agravo para reformar a decisão agravada, indeferindo a tutela antecipada, bem como a concessão de efeito suspensivo ao recurso. Preparo efetuado (id. 282704899). Por decisão monocrática de id. 282742860, restou indeferido pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso. A agravada apresentou contraminuta (id. 288368381), alegando que sempre adimpliu regularmente suas obrigações contratuais, conforme demonstram as declarações de pagamento e quitação anexas aos autos principais. Argumenta que o cancelamento ocorreu sem qualquer notificação prévia válida, em manifesta afronta ao disposto no art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 9.656/98. Sustenta a presença dos requisitos para a concessão da tutela de urgência e requer o desprovimento do recurso. A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso (id. 291147367), entendendo estarem presentes os requisitos do art. 300 do CPC para a concessão da tutela de urgência. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Como já relatado, versam os autos acerca do agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo interposto por UNIMED CUIABÁ – COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, contra decisão que concedeu antecipação da tutela determinando o restabelecimento do plano de saúde de M. C. M. S., representada por VALDIR DE JESUS DOS SANTOS, nos autos da ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela e indenização por danos morais e materiais (autos nº 1011498-19.2025.8.11.0002). Como é cediço, o agravo de instrumento é o recurso cabível contra as decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias, conforme preconiza o art. 1.015, inciso I, do Código de Processo Civil. O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço. A questão debatida neste recurso circunscreve-se à análise do acerto ou desacerto da decisão que concedeu a tutela de urgência para determinar o restabelecimento do plano de saúde da agravada, notadamente quanto à presença dos requisitos autorizadores previstos no art. 300 do CPC. De acordo com o referido dispositivo legal, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. O § 3º do mesmo artigo estabelece que a tutela de urgência não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. Inicialmente, cumpre destacar que a questão central deste recurso envolve a aplicação do art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 9.656/98, que disciplina os planos e seguros privados de assistência à saúde. O mencionado dispositivo assim dispõe: Art. 13. Os contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação. Parágrafo único. Os produtos de que trata o caput, contratados individualmente, terão vigência mínima de um ano, sendo vedadas: (...) II - a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência; A norma em questão estabelece que a suspensão ou rescisão unilateral do contrato de plano de saúde somente é permitida em caso de fraude ou não pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência. No caso em apreço, a agravante alega que a agravada ficou inadimplente com as faturas dos meses de julho e novembro de 2024, por período superior a 60 dias, o que justificaria o cancelamento do plano de saúde. Sustenta ainda que enviou diversas notificações, sendo a última em 11/12/2024, com previsão de exclusão em 14/12/2024, data em que ocorreu o cancelamento do plano. Contudo, analisando os documentos juntados aos autos, verifico que a agravada apresentou declarações de pagamento e quitação anual de débitos referente ao ano de 2024 (id. 188766347 dos autos de origem), o que, em princípio, contrapõe-se à alegação de inadimplência sustentada pela agravante. Vejamos: DECLARAÇÃO DE QUITAÇÃO ANUAL DE DÉBITOS Prezado(a) Beneficiário(a): VALDIR DE JESUS DOS SANTOS - 0560011872011381 Contrato: 02063 Em atenção à Lei Federal nº 12.007/09, a PLURAL GESTAO EM PLANOS DE SAUDE LTDA declara que todas as suas faturas, relativas às mensalidades com vencimento no período de janeiro até dezembro de 2024 encontram-se quitadas no nosso sistema. Esta declaração substitui as quitações dos faturamentos mensais de débitos para efeito de comprovação de pagamento, inclusive em relação aos anos anteriores. Ademais, quanto à notificação prévia exigida pela legislação, não ficou demonstrado que a agravante tenha cumprido o requisito legal de notificar a consumidora até o quinquagésimo dia de inadimplência. O e-mail que a agravante alega ter enviado em 11/12/2024, informando sobre risco de cancelamento por pendências de julho/24 e novembro/24, para um cancelamento que ocorreria em 14/12/2024, não atende ao prazo legal estabelecido no dispositivo supracitado. Como ressalvado anteriormente, tratando-se de extinção de contrato de assistência médica por plano coletivo, a notificação quanto ao cancelamento do plano de saúde é conduta obrigatória, nos termos do artigo 13 Parágrafo único, inciso II da Lei 9.656/98. À propósito: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. CANCELAMENTO DO PLANO DE SAÚDE. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL PRÉVIA DO SEGURADO. RENEGOCIAÇÃO. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 300 DO CPC. DECISÃO MANTIDA. 1. O cancelamento unilateral do contrato de plano de saúde exige notificação prévia, pessoal e inequívoca do segurado, conforme art. 13, parágrafo único, II, da Lei 9.656/1998, e jurisprudência desta Corte. 2. Constatado que as correspondências não foram entregues pessoalmente à contrante, bem como relatada a posterior negociação e quitação das parcelas vencidas, exsurge a probabilidade do direito vindicado. 3. O perigo da demora é evidenciado na medida em que a manutenção do cancelamento do plano de saúde significaria evidente prejuízo à parte agravada, porquanto necessita das coberturas contratadas para ter acesso a tratamentos de saúde. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-GO - Agravo de Instrumento: 5320581-53.2024.8 .09.0051 GOIÂNIA, Relator.: Des(a). DESEMBARGADOR WILSON SAFATLE FAIAD, 10ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ) APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CANCELAMENTO DO PLANO DE SAÚDE POR INADIMPLEMENTO. Procedência do pleito inaugural para condenar a ré a restabelecer o plano de saúde do autor. Insurgência da operadora do plano de saúde. Desnecessidade. Falta de pagamento da mensalidade que, por si só, não autoriza a rescisão contratual. Necessidade de notificação prévia do beneficiário acerca do débito e da possibilidade de cancelamento em caso de inadimplemento. Inteligência do art. 13, parágrafo único, II, da Lei nº 9656/98 e da Súmula nº 94 deste E. TJSP. Notificação ao autor por e-mail que não atende ao disposto na legislação vigente. Ausência de prova de inequívoco conhecimento da mensagem eletrônica enviada pela ré. Recorrente, ademais, que aceitou o pagamento das mensalidades em atraso após o cancelamento do plano. Reativação bem determinada. Recurso desprovido. (TJ-SP - Apelação Cível: 1007358-86.2022.8.26 .0047 Assis, Data de Julgamento: 06/02/2024, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 06/02/2024) (destaquei) No tocante à probabilidade do direito, tenho que a agravada demonstrou, em cognição sumária, a existência de elementos que evidenciam a verossimilhança de suas alegações. Os documentos juntados aos autos, notadamente as declarações de pagamento e quitação anual, somados à ausência de comprovação, pela agravante, do cumprimento do requisito legal de notificação prévia nos termos exigidos pela Lei nº 9.656/98, são suficientes para demonstrar, nesta fase processual, a probabilidade do direito invocado. Quanto ao perigo de dano, é inconteste que a privação da cobertura do plano de saúde coloca em risco o bem jurídico de maior relevância do ordenamento jurídico: a vida. A proteção à saúde é direito fundamental assegurado pela Constituição Federal e, no caso de menores de idade, goza de proteção especial, conforme disposto no art. 227 da Carta Magna. Destarte, a manutenção da decisão que determinou o restabelecimento do plano de saúde da agravada até o julgamento do mérito pelo Juiz de Direito, se mostra imprescindível para resguardar seu direito à saúde, garantia constitucional de indisputável relevância. No que concerne à alegação da agravante de que a manutenção da decisão agravada lhe causará lesão grave e de difícil reparação, entendo que tal argumento não prospera. Isso porque a operadora poderá ser integralmente ressarcida caso, ao final da demanda, seja julgada improcedente a pretensão inicial. Por outro lado, não se vislumbra o perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (art. 300, § 3º, do CPC), uma vez que, caso a agravante obtenha êxito na demanda principal, poderá proceder à rescisão contratual pelos meios legais e buscar o ressarcimento de eventuais custos. Ademais, cumpre ressaltar que, nos contratos de plano de saúde, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, devendo suas cláusulas ser interpretadas da maneira mais favorável ao consumidor, conforme entendimento consolidado na Súmula 608 do Superior Tribunal de Justiça. Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento, mantendo integralmente a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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Processo nº 1013019-05.2025.8.11.0000

ID: 306711550

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1013019-05.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 25/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

M. C. M. D. S.

Acórdão

Advogados:

JONATAS PEIXOTO LOPES

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MYKAELLA ATTYLA SANT ANA PRADO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013019-05.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013019-05.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer / Não Fazer, Planos de saúde] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (AGRAVANTE), M. C. M. D. S. - CPF: 097.529.061-41 (AGRAVADO), VALDIR DE JESUS DOS SANTOS - CPF: 602.300.459-87 (AGRAVADO), VALDIR DE JESUS DOS SANTOS - CPF: 602.300.459-87 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), PLURAL GESTAO EM PLANOS DE SAUDE LTDA - CNPJ: 97.553.801/0001-16 (TERCEIRO INTERESSADO), JONATAS PEIXOTO LOPES - CPF: 004.280.311-02 (ADVOGADO), MYKAELLA ATTYLA SANT ANA PRADO - CPF: 053.339.081-84 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. CANCELAMENTO UNILATERAL. TUTELA DE URGÊNCIA. RESTABELECIMENTO. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. INADIMPLÊNCIA CONTESTADA. PROTEÇÃO À SAÚDE. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que concedeu tutela de urgência para determinar o restabelecimento do plano de saúde da beneficiária menor de idade, cujo contrato foi cancelado unilateralmente pela operadora sob alegação de inadimplemento por período superior a 60 dias. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar: (i) se estão presentes os requisitos autorizadores da tutela de urgência previstos no art. 300 do CPC para o restabelecimento do plano de saúde; e (ii) se o cancelamento unilateral do plano de saúde observou os requisitos estabelecidos no art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 9.656/98, notadamente quanto à comprovada notificação prévia do consumidor. III. Razões de decidir 3. A probabilidade do direito resta evidenciada pela existência de declaração de quitação anual de débitos referente ao ano de 2024, que contrapõe a alegação de inadimplência, bem como pela ausência de comprovação de que a agravante tenha cumprido o requisito legal de notificar a consumidora até o quinquagésimo dia de inadimplência. 4. O e-mail que a agravante alega ter enviado em 11/12/2024, informando sobre risco de cancelamento por pendências de julho/24 e novembro/24, para cancelamento previsto para 14/12/2024, não atende ao prazo legal estabelecido no art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 9.656/98, que exige notificação prévia, pessoal e inequívoca. 5. O perigo de dano é inconteste, pois a privação da cobertura do plano de saúde coloca em risco o bem jurídico de maior relevância do ordenamento jurídico: a vida. A proteção à saúde é direito fundamental assegurado pela Constituição Federal e, no caso de menores de idade, goza de proteção especial, conforme disposto no art. 227 da Carta Magna. 6. Não há perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, uma vez que, caso a agravante obtenha êxito na demanda principal, poderá proceder à rescisão contratual pelos meios legais e buscar o ressarcimento de eventuais custos. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: "1. O cancelamento unilateral do contrato de plano de saúde por inadimplência exige notificação prévia, pessoal e inequívoca do segurado até o quinquagésimo dia de inadimplência, conforme art. 13, parágrafo único, II, da Lei nº 9.656/98. 2. A declaração de quitação anual de débitos, somada à ausência de comprovação da notificação legal, são elementos suficientes para caracterizar a probabilidade do direito em tutela de urgência para restabelecimento do plano de saúde." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 227; CPC, art. 300; Lei nº 9.656/98, art. 13, parágrafo único, II. Jurisprudência relevante citada: Súmula 608/STJ; TJ-GO - AI: 5320581-53.2024.8.09.0051; TJ-SP - AC: 1007358-86.2022.8.26.0047. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo interposto por UNIMED CUIABÁ – COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, contra decisão que concedeu antecipação da tutela determinando o restabelecimento do plano de saúde de M. C. M. S., representada por VALDIR DE JESUS DOS SANTOS, nos autos da ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela e indenização por danos morais e materiais (autos nº 1011498-19.2025.8.11.0002). A recorrente alega que a decisão agravada viola o art. 300 do CPC, pois não estão presentes os requisitos para a concessão da tutela antecipada, tendo sido concedida de forma equivocada. Sustenta que não há elementos que evidenciem a probabilidade do direito da Agravada, bem como não há perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Argumenta que agiu em conformidade com a legislação aplicável ao rescindir o contrato da agravada por inadimplência, após notificação prévia, não havendo qualquer irregularidade em sua conduta. Afirma que o agravado estava ciente da inadimplência e não regularizou o débito no prazo legal de 60 dias. Aduz que o contrato de plano de saúde prevê expressamente a possibilidade de rescisão em caso de inadimplência e que a concessão da tutela antecipada viola o princípio da boa-fé contratual, além de poder causar dano de difícil reparação à Agravante. Ao final, requer o provimento do agravo para reformar a decisão agravada, indeferindo a tutela antecipada, bem como a concessão de efeito suspensivo ao recurso. Preparo efetuado (id. 282704899). Por decisão monocrática de id. 282742860, restou indeferido pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso. A agravada apresentou contraminuta (id. 288368381), alegando que sempre adimpliu regularmente suas obrigações contratuais, conforme demonstram as declarações de pagamento e quitação anexas aos autos principais. Argumenta que o cancelamento ocorreu sem qualquer notificação prévia válida, em manifesta afronta ao disposto no art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 9.656/98. Sustenta a presença dos requisitos para a concessão da tutela de urgência e requer o desprovimento do recurso. A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso (id. 291147367), entendendo estarem presentes os requisitos do art. 300 do CPC para a concessão da tutela de urgência. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Como já relatado, versam os autos acerca do agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo interposto por UNIMED CUIABÁ – COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, contra decisão que concedeu antecipação da tutela determinando o restabelecimento do plano de saúde de M. C. M. S., representada por VALDIR DE JESUS DOS SANTOS, nos autos da ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela e indenização por danos morais e materiais (autos nº 1011498-19.2025.8.11.0002). Como é cediço, o agravo de instrumento é o recurso cabível contra as decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias, conforme preconiza o art. 1.015, inciso I, do Código de Processo Civil. O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço. A questão debatida neste recurso circunscreve-se à análise do acerto ou desacerto da decisão que concedeu a tutela de urgência para determinar o restabelecimento do plano de saúde da agravada, notadamente quanto à presença dos requisitos autorizadores previstos no art. 300 do CPC. De acordo com o referido dispositivo legal, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. O § 3º do mesmo artigo estabelece que a tutela de urgência não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. Inicialmente, cumpre destacar que a questão central deste recurso envolve a aplicação do art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 9.656/98, que disciplina os planos e seguros privados de assistência à saúde. O mencionado dispositivo assim dispõe: Art. 13. Os contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação. Parágrafo único. Os produtos de que trata o caput, contratados individualmente, terão vigência mínima de um ano, sendo vedadas: (...) II - a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência; A norma em questão estabelece que a suspensão ou rescisão unilateral do contrato de plano de saúde somente é permitida em caso de fraude ou não pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência. No caso em apreço, a agravante alega que a agravada ficou inadimplente com as faturas dos meses de julho e novembro de 2024, por período superior a 60 dias, o que justificaria o cancelamento do plano de saúde. Sustenta ainda que enviou diversas notificações, sendo a última em 11/12/2024, com previsão de exclusão em 14/12/2024, data em que ocorreu o cancelamento do plano. Contudo, analisando os documentos juntados aos autos, verifico que a agravada apresentou declarações de pagamento e quitação anual de débitos referente ao ano de 2024 (id. 188766347 dos autos de origem), o que, em princípio, contrapõe-se à alegação de inadimplência sustentada pela agravante. Vejamos: DECLARAÇÃO DE QUITAÇÃO ANUAL DE DÉBITOS Prezado(a) Beneficiário(a): VALDIR DE JESUS DOS SANTOS - 0560011872011381 Contrato: 02063 Em atenção à Lei Federal nº 12.007/09, a PLURAL GESTAO EM PLANOS DE SAUDE LTDA declara que todas as suas faturas, relativas às mensalidades com vencimento no período de janeiro até dezembro de 2024 encontram-se quitadas no nosso sistema. Esta declaração substitui as quitações dos faturamentos mensais de débitos para efeito de comprovação de pagamento, inclusive em relação aos anos anteriores. Ademais, quanto à notificação prévia exigida pela legislação, não ficou demonstrado que a agravante tenha cumprido o requisito legal de notificar a consumidora até o quinquagésimo dia de inadimplência. O e-mail que a agravante alega ter enviado em 11/12/2024, informando sobre risco de cancelamento por pendências de julho/24 e novembro/24, para um cancelamento que ocorreria em 14/12/2024, não atende ao prazo legal estabelecido no dispositivo supracitado. Como ressalvado anteriormente, tratando-se de extinção de contrato de assistência médica por plano coletivo, a notificação quanto ao cancelamento do plano de saúde é conduta obrigatória, nos termos do artigo 13 Parágrafo único, inciso II da Lei 9.656/98. À propósito: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. CANCELAMENTO DO PLANO DE SAÚDE. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL PRÉVIA DO SEGURADO. RENEGOCIAÇÃO. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 300 DO CPC. DECISÃO MANTIDA. 1. O cancelamento unilateral do contrato de plano de saúde exige notificação prévia, pessoal e inequívoca do segurado, conforme art. 13, parágrafo único, II, da Lei 9.656/1998, e jurisprudência desta Corte. 2. Constatado que as correspondências não foram entregues pessoalmente à contrante, bem como relatada a posterior negociação e quitação das parcelas vencidas, exsurge a probabilidade do direito vindicado. 3. O perigo da demora é evidenciado na medida em que a manutenção do cancelamento do plano de saúde significaria evidente prejuízo à parte agravada, porquanto necessita das coberturas contratadas para ter acesso a tratamentos de saúde. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-GO - Agravo de Instrumento: 5320581-53.2024.8 .09.0051 GOIÂNIA, Relator.: Des(a). DESEMBARGADOR WILSON SAFATLE FAIAD, 10ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ) APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CANCELAMENTO DO PLANO DE SAÚDE POR INADIMPLEMENTO. Procedência do pleito inaugural para condenar a ré a restabelecer o plano de saúde do autor. Insurgência da operadora do plano de saúde. Desnecessidade. Falta de pagamento da mensalidade que, por si só, não autoriza a rescisão contratual. Necessidade de notificação prévia do beneficiário acerca do débito e da possibilidade de cancelamento em caso de inadimplemento. Inteligência do art. 13, parágrafo único, II, da Lei nº 9656/98 e da Súmula nº 94 deste E. TJSP. Notificação ao autor por e-mail que não atende ao disposto na legislação vigente. Ausência de prova de inequívoco conhecimento da mensagem eletrônica enviada pela ré. Recorrente, ademais, que aceitou o pagamento das mensalidades em atraso após o cancelamento do plano. Reativação bem determinada. Recurso desprovido. (TJ-SP - Apelação Cível: 1007358-86.2022.8.26 .0047 Assis, Data de Julgamento: 06/02/2024, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 06/02/2024) (destaquei) No tocante à probabilidade do direito, tenho que a agravada demonstrou, em cognição sumária, a existência de elementos que evidenciam a verossimilhança de suas alegações. Os documentos juntados aos autos, notadamente as declarações de pagamento e quitação anual, somados à ausência de comprovação, pela agravante, do cumprimento do requisito legal de notificação prévia nos termos exigidos pela Lei nº 9.656/98, são suficientes para demonstrar, nesta fase processual, a probabilidade do direito invocado. Quanto ao perigo de dano, é inconteste que a privação da cobertura do plano de saúde coloca em risco o bem jurídico de maior relevância do ordenamento jurídico: a vida. A proteção à saúde é direito fundamental assegurado pela Constituição Federal e, no caso de menores de idade, goza de proteção especial, conforme disposto no art. 227 da Carta Magna. Destarte, a manutenção da decisão que determinou o restabelecimento do plano de saúde da agravada até o julgamento do mérito pelo Juiz de Direito, se mostra imprescindível para resguardar seu direito à saúde, garantia constitucional de indisputável relevância. No que concerne à alegação da agravante de que a manutenção da decisão agravada lhe causará lesão grave e de difícil reparação, entendo que tal argumento não prospera. Isso porque a operadora poderá ser integralmente ressarcida caso, ao final da demanda, seja julgada improcedente a pretensão inicial. Por outro lado, não se vislumbra o perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (art. 300, § 3º, do CPC), uma vez que, caso a agravante obtenha êxito na demanda principal, poderá proceder à rescisão contratual pelos meios legais e buscar o ressarcimento de eventuais custos. Ademais, cumpre ressaltar que, nos contratos de plano de saúde, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, devendo suas cláusulas ser interpretadas da maneira mais favorável ao consumidor, conforme entendimento consolidado na Súmula 608 do Superior Tribunal de Justiça. Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento, mantendo integralmente a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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Milton Hilario Borges Da Silva x Filomena Aparecida Dos Santos Borges Da Silva

ID: 278114196

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Taubaté - 3ª Vara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1013019-87.2024.8.26.0625

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

MILTON HILARIO BORGES DA SILVA

Polo Passivo:

FILOMENA APARECIDA DOS SANTOS BORGES DA SILVA

Intimação

Advogados:

WASHINGTON SPINDOLA DE MIRANDA

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EVELINE PIMENTA DA FONSECA

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AGNIS LUIZA DE ANDRADE RODRIGUES

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ADV: Washington Spindola de Miranda (OAB 273740/SP), Eveline Pimenta da Fonseca (OAB 296423/SP), Agnis Luiza de Andrade Rodrigues (OAB 471585/SP) Processo 1013019-87.2024.8.26.0625 - Procedimento Com… ADV: Washington Spindola de Miranda (OAB 273740/SP), Eveline Pimenta da Fonseca (OAB 296423/SP), Agnis Luiza de Andrade Rodrigues (OAB 471585/SP) Processo 1013019-87.2024.8.26.0625 - Procedimento Comum Cível - Reqte: Milton Hilario Borges da Silva - Reqda: Filomena Aparecida dos Santos Borges da Silva - Juiz(a) de Direito: Dr(a). Rodrigo Valério Sbruzzi Vistos. Trata-se de ação indenizatória ajuizada por MILTON HILÁRIO BORGES DA SILVA contra FILOMENA APARECIDA DOS SANTOS BORGES DA SILVA e JOSÉ AFONSO DOS SANTOS. Narra o autor que, em 16.07.2024, foi reintegrado na posse do imóvel da Rua Monsenhor Miguel Martins n° 445, Vila Marly nesta cidade, após procedência da ação n. 1014348-08.2022.8.26.0625, da 2ª Vara Cível local. Afirma que, além das péssimas condições do bem quando de sua retomada, o réu JOSÉ AFONSO foi visto cortando a fiação elétrica durante a reintegração, razão pela qual registrou a ocorrência junto à autoridade policial. Diz ainda que tomou conhecimento de que a ré estava inadimplente com o IPTU desde 2019, acumulando uma dívida de R$3.896,28. Acrescenta que também teve que arcar com o custo de um caminhão para mudança e montador de móveis (R$610,00 - fls.17) e com obras de limpeza e restauração elétrica do imóvel (R$12.954,78 - fls.19/21). Por tudo isso pede a condenação dos réus ao ressarcimento de R$17.460,98 a título de danos materiais e a lhe indenizarem por danos morais em R$5.000,00 pela angústia causada pela lesão patrimonial. A inicial veio acompanhada por instrumento de procuração, documentos pessoais, boletim de ocorrência, cópias extraídas de outros processos, comprovantes de pagamento, contas de consumo e extratos, sendo dado à causa o valor de R$22.460,98. A ação foi admitida e os reús, citados por carta com AR, apresentaram contestação com reconvenção às fls.101/109, sem arguir preliminares. No mérito, alegaram, em síntese: (i) que é falsa a afirmação de que o filho da corré furtou os fios da rede elétrica; (ii) que toda a ação de reintegração foi acompanhada pelas advogadas e por policiais militares; (iii) que não houve nenhuma intercorrência na diligência e não foi praticado nenhum ilícito pelos requeridos; (iv) que realizaram benfeitorias no imóvel; (v) que a demora na devolução do imóvel ocorreu pelo direito dos requeridos em exercer sua defesa. Em reconvenção, pleitearam a indenização pelas benfeitorias realizadas. A defesa veio acompanhada por instrumentos de procuração, documentos pessoais e fotografias. O processamento da reconvenção foi indeferido às fls.121/122, sobrevindo réplica às fls.125/131. Com esse RELATÓRIO, FUNDAMENTO e DECIDO. O feito já comporta julgamento sem necessidade de outras medidas em atividade probatória complementar (art. 355 do CPC). De início, MANTENHO o indeferimento da gratuidade aos réus (fls.147), pois o que juntaram agora (fls.155/161) não representa atendimento correto e completo ao que foi determinado antes para comprovação da alegada hipossuficiência econômico-financeira. Não há prejudiciais/preliminares suscitadas. No mérito, a hipótese é de PROCEDÊNCIA EM PARTE. Os pedidos são de natureza indenizatória e estão fundados na alegada necessidade que o autor teve de realizar obras de recuperação/reparação de danos no imóvel e de tomar determinado serviço, além da falta de pagamento de IPTU em certo período pela ré, quando o ocupava. Pois bem. A reintegração do autor na posse do imóvel decorreu da sentença prolatada nos autos do proc. 1014348-08.2022.8.26.0625, tendo como principal fundamento da procedência o fato de o comodato que havia concedido a seu irmão, ex-companheiro da ré FILOMENA APARECIDA DOS SANTOS BEGOTI, ter sido extinto com a separação do casal; e, não havendo interesse na renovação do comodato em favor da ré, deduziu o autor a pretensão que foi então acolhida. Reconheceu-se na sentença a existência do comodato verbal ao irmão do autor desde julho/2013, tendo sido a ré notificada extrajudicialmente em 15.07.2022, quando então passou a ser caracterizado o esbulho com sua permanência no imóvel. Aqui, a contestação traz a admissão inequívoca desse empréstimo gratuito comodato envolvendo o imóvel em questão (fls.104). A decisão foi mantida em grau de apelação, com julgamento em 05.03.2024. Ou seja: a ocupação pela ré é derivada e estava atrelada de uma posse concedida ao seu companheiro, irmão do autor, já havia 9 (nove) anos. São elementos que se colhem daqueles autos e que são há muito de conhecimento de ambas as partes litigantes. Nos presentes autos, a ocupação incontroversa é pela ré e seu filho, o corréu JOSÉ AFONSO. Desde logo, no que tange à pretensão da ré de ser indenizada ou exercer direito de retenção pelas benfeitorias que teria implementado no imóvel, o caso não comporta acolhimento. Na origem, tem-se uma posse exercida em função de um incontroverso comodato entre o autor comodantes e seu irmão, então companheiro da ré FILOMENA. Ou seja: trata-se de uma ocupação gratuita ao longo do tempo. Com base nisso, a regra legal é: "O comodatário não poderá jamais recobrar do comodante as despesas feitas com o uso e gozo da coisa emprestada" (art. 584 do Código Civil), inclusive porque "O comodatário é obrigado a conservar, como se sua própria fora, a coisa emprestada, não podendo usá-la senão de acordo com o contrato ou a natureza dela, sob pena de responder por perdas e danos" (art. 582). Daí o que decidido em caso assemelhado: "Com a devida vênia, é incabível a indenização por benfeitoria em contrato de comodato, por expressa vedação legal. (...) Viola a boa-fé objetiva a pretensão de ver indenizadas benfeitorias, considerando que o réu viveu no imóvel gratuitamente por anos. Não há falar, portanto, em indenização por benfeitorias ou direito de retenção" (Apelação n. 1001350-97.2024.8.26.0120 (TJSP); Rel: Sandra Galhardo Esteves; 12ª Câmara de Direito Privado; j: 25/03/2025). Objetivamente: "O comodatário não tem direito à retenção ou indenização por benfeitorias quando estas não foram autorizadas pelo comodante, nos termos do art. 584 do Código Civil" (Apelação n. 1003523-91.2022.8.26.0564 (TJSP); Rel: Maria Fernanda de Toledo Rodovalho; 23ª Câmara de Direito Privado; j: 19/02/2025). Na mesma linha: Apelação n. 1002132-13.2021.8.26.0152 (TJSP); Rel: Nuncio Theophilo Neto; 22ª Câmara de Direito Privado; j: 18/11/2024; EMENTA: "DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL REINTEGRAÇÃO DE POSSE IMÓVEL URBANO. Pretensão ajuizada pelo autor contra os réus. Contrato de comodato informal havido entre as partes em litígio. Contrato havido nos idos de 2007, denunciado em 2021, com resistência dos réus pautada pela posse derivada de cessão orientada por dívidas trabalhistas não honradas pelo autor. Pedido dos réus de indenização por benfeitorias. Sentença de procedência da pretensão possessória. Inconformismo dos réus. Posse precária recebida pelos réus. Interpelação com fixação de prazo para desocupação. Inércia. Esbulho consumado. Comodato suficientemente provado. Esbulho configurado desde o termo final do prazo concedido para desocupação, conforme interpelação. Dívida de natureza trabalhista desencadeadora de uma pseudo-dação em pagamento não provada. Benfeitorias. Indenização/direito de retenção negado, visto que, no comodato, descabe a cobrança de despesas feitas com uso e gozo da coisa (art. 584 do Código Civil). Recurso desprovido". Para além disso, as benfeitorias não foram sequer enumeradas e valoradas. E, por conta disso, a compreensão é de que "Não há fundamento para a retenção de valores por benfeitorias, uma vez que as mesmas não foram especificadas ou comprovadas nos autos" (Apelação n. 1005855-21.2021.8.26.0223 (TJSP); Rel: Mario Chiuvite Junior; 3ª Câmara de Direito Privado; j: 20/03/2025). Assim: "Não se reconhece à parte ré, no presente feito, direito à retenção ou indenização por benfeitorias e acessões introduzidas no imóvel, visto que sequer especificadas na contestação, conforme orientação predominante na jurisprudência que se adota Não foram especificadas na contestação, no que consistiriam as benfeitorias ali alegadas genericamente como realizadas pela parte ré (...)" (Apelação n. 0004300-64.2016.8.26.0577 (TJSP); Rel: Rebello Pinho; 20ª Câmara de Direito Privado; j: 29/11/2021). Com isso assentado, passa-se à apreciação das postulações do autor. Para a cobrança de valores necessários para reparos de supostos danos causados pela ré no imóvel, a contestação traz como tese de defesa a alegação de que as obras realizadas posteriormente foram pela mera conveniência do autor, sem estarem associadas a danificações na edificação. Ou seja: o requerente teria então realizado obras e serviços para trazer ao imóvel novas condições melhores de conversação e aparência. Pelos registros fotográficos inseridos na lauda de fls.106 da contestação, o que se nota é a substituição do telhado (telhas) e do portão de metal e uma aparente abertura para um portão menor de passagem à lateral. Aliada a isso, tem-se a especial circunstância de se tratar de um imóvel com modestas características que foi usado por considerável tempo pelo irmão do autor; em determinado período, juntamente com a ré, com quem mantinha relacionamento. As fotografias de fls.133/145 evidenciam a simplicidade da construção, indicando a existência de trincas, manchas, infiltração, descolamento de revestimentos e reboco e outros fatos que não podem ser atrelados a danos causados pelos ocupantes, seja omissiva ou deliberadamente. As condições ali verificadas são pelo mero uso normal do bem. Fato é que os autos carecem, absolutamente, de provas minimamente concretas e seguras de que o imóvel foi danificado e em que extensão isso teria ocorrido, assim também se tudo pode mesmo ser atribuído aos réus. Em suma: inexistem elementos mínimos sequer indiciários de como o imóvel estava antes da ocupação pela ré e como ficou depois da reintegração do autor na posse. Os recibos e demais documentos juntados pelo autor às fls.19/21 têm como pertinências alguns serviços de pintura, de limpeza, de parte elétrica. São gastos que, no caso, por suas circunstâncias, devem ser associados a ações de melhoramento do prédio, e não de reparação de danos/deteriorações causados no imóvel pela ré. A conclusão é de que são obras de melhorias de condições, não estruturais e que não podem ser vinculadas automaticamente a esses supostos (mas não comprovados) danos. Há de bem se frisar que danos, especificamente, não se confundem com deteriorações decorrentes do uso normal do imóvel e do desgaste natural, inclusive pela ação do tempo (Apelação n. 1004799-39.2014.8.26.0597 (TJSP); Rel: Gilson Delgado Miranda; 35ª Câmara de Direito Privado; j: 07/04/2025; Apelação n. 1122251-96.2020.8.26.0100 (TJSP); Rel: Marcondes D'Angelo; 25ª Câmara de Direito Privado; j: 25/05/2023). Na própria inicial, a situação é tratada como "diversas obras para a limpeza e restauração elétrica da residência" (fls.4), o que se caracteriza como ações de preservação e recuperação de pontos isolados e associados às condições que, em certa medida, já não eram favoráveis no imóvel desde sempre por seu padrão construtivo. Nada há documentado em relação às condições do prédio e/ou do terreno ao tempo em que o autor disponibilizou o imóvel gratuitamente ao seu irmão, em julho/2013. É certo que "O comodatário é obrigado a conservar, como se sua própria fora, a coisa emprestada, não podendo usá-la senão de acordo com o contrato ou a natureza dela, sob pena de responder por perdas e danos" (art. 582 do Código Civil). Mas o tempo de ocupação sem que nada tivesse sido documentado impossibilita a identificação consistente do que se teria como danos advindos de ações da própria ré. O padrão modesto da construção não é verificado por fatores atuais, senão desde a posse transmitida pelo requerente a seu irmão. Acerca do pedido para o recebimento de R$610,00 que o autor teria gasto com um veículo de transporte/mudança e um montador de móveis para a retirada de bens pertencentes à ré e deixados no imóvel, o comprovante de fls.17 é de uma transferência/depósito em favor de PIMENTA DA FONSECA SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA. É pouco ou nada razoável admitir que esse pagamento teria sido feito para um determinado transporte e/ou prestação de serviços a marceneiro/montador. A sociedade é das advogadas que patrocinam a causa ao autor (fls.11) e não há nenhum outro documento com algum dado que permita a vinculação a esses tipos de serviços que teriam sido supostamente contratados. Diferentemente, relativamente ao pedido para pagamento do imposto predial (IPTU) desde 2019 até a data da reintegração do autor na posse, não houve contrariedade específica pelos réus. A ré FILOMENA, então como ocupante com seu filho após o término da relação com o irmão do autor, tinha a obrigação de suportar o tributo: "A princípio sem dúvida alguma a obrigação caberia à comodatária, já que não haveria fundamento para a comodante restar onerada por despesa de tal natureza, enquanto cede o bem gratuitamente àquela. Ocorre, contudo, que não há qualquer vedação legal à cessão absolutamente independente de encargo, arcando a própria comodante com tal obrigação" (Apelação n. 1001634-42.2022.8.26.0002 (TJSP); Rel: Sérgio da Costa Leite; 37ª Câmara de Direito Privado; j: 06/05/2025). Como não houve acerto em contrário entre as partes, a obrigação cabia mesmo aos réus como comodatários, pois "Despesas decorrentes do uso e gozo da coisa emprestada, que não podem ser cobrados do comodante Art. 584, do CC" (Apelação n. 1007108-85.2023.8.26.0704 (TJSP); Rel: José Wagner de Oliveira Melatto Peixoto; 37ª Câmara de Direito Privado; j: 28/01/2025). Os valores dos débitos a esse título (IPTU) ficaram incontroversos nos autos, constantes dos documentos de fls.24/28 que comprovam os pagamentos pelo autor, assim pela falta de qualquer impugnação pelos réus. Todo período mencionado nesses documentos foi de ocupação pela ré. Por sua vez, a alegada supressão de cabos/fios elétricos pelo corréu JOSÉ AFONSO na ocasião do cumprimento do mandado de reintegração de posse também carece de prova mínima, mesmo que inicial para eventual complementação por prova oral. O registro inserido na lauda de fls.3 da inicial evidencia o rompimento de alguns cabos aparentemente instalados em meio ou próximos a uma estrutura de alvenaria/concreto. Mas a principal afirmação do autor que demonstra a inutilidade de qualquer prova complementar está às fls.4: "Desse modo conclui-se que o Sr. José Afonso é o único responsável pelo corte dos fios de energia". Trata-se, claramente, de uma ilação, de uma elucubração resultante do fato de JOSÉ AFONSO ter adentrado a laje do imóvel, sendo isso visualizado pela advogada do autor e pelo Policial que acompanhava a diligência. Entretanto, o próprio furto dos cabos, pela falta de evento preciso e determinado, é algo que parte então apenas de uma presunção. O boletim de ocorrência (fls.13/14) foi lavrado sem a indicação de autoria, muito embora o requerente tenha consignado na ocorrência que o corréu teria subtraído a fiação. E, porque elaborado com origem em versão unilateral dos fatos, goza de uma presunção relativa que só pode se tornar absoluta se não contrariada com especificidade e com elementos consistentes (TJSP Apelação n. 1004042-16.2022.8.26.0322; Rel: Ferreira da Cruz; 28ª Câmara de Direito Privado; j: 27/03/2024; TJSP Apelação n. 1017123-43.2018.8.26.0008; Rel: Carmen Lucia da Silva; 33ª Câmara de Direito Privado; j: 26/03/2024; TJSP Apelação n. 1004808-58.2022.8.26.0358; Rel: Paulo Alonso; 30ª Câmara de Direito Privado; j: 19/03/2024). Neste caso, os réus contrariam incisivamente a alegação de que JOSÉ AFONSO teria cometido o furto. Para além disso, o fato está agora sob investigação no âmbito criminal. Nestes autos de ação civil, a afirmação do autor carece de provas consistentes, pois as declarações complementares do boletim (fls.15) também estão marcadas pela unilateralidade. Nuclearmente, o ponto determinante é: a inexistência de prova do alegado furto, especificamente. Em outro dizer: mesmo que se ateste por depoimentos de testemunhas que o corréu adentrou a laje do imóvel em certa ocasião, a subtração dos fios/cabos não tem algum elemento probatório consistente de base; não há solidez na afirmação do requerente nesse tocante. Por fim, quanto à pretensão indenizatória do autor fundada em alegados danos morais, não há mínima possibilidade de acolhimento, inexistentes indicativos sequer de uma mera sinalização de que, pelos fatores da situação fática ao longo do tempo, o autor teria de alguma forma experimentado danos extrapatrimoniais. A partir do que se considera efetivamente comprovado nos autos, a única pretensão acolhível é ao pagamento para reembolso das importâncias pagas pelo autor como IPTU do imóvel. Isso já conduziria, inevitavelmente, à improcedência do pedido indenizatório (danos extrapatrimoniais). Não bastasse, inexistem circunstâncias concretadas que pudessem caracterizar alguma ofensa à dignidade, a algum direito da personalidade do autor. Tratou-se de um comodato feito por ele a seu irmão de um imóvel que, por um determinado período, foi ocupado pelos réus (mãe e filho). E, ainda que os danos tivessem sido comprovados e pudessem ser imputados a eles (réus), a situação se restringiria a meros transtornos, meros aborrecimentos, simples chateação pela necessidade de reparos, sem maiores consequências que atingissem a esfera psíquica de forma grave. Os fatos não resultaram em desdobramentos sensíveis ao requerente. Destaco: "Para caracterizar obrigação de indenizar, não é decisiva a questão da ilicitude da conduta ou de o serviço prestado ser ou não de qualidade, mas sim a constatação efetiva do dano a bem jurídico tutelado, não sendo suficiente tão somente a prática de um fato contra legem ou contra jus, ou que contrarie o padrão jurídico das condutas (RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade Civil. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 68). Isso porque o "direito à compensação de dano moral, conforme a expressa disposição do art. 12 do CC, exsurge de condutas que ofendam direitos da personalidade (como os que se extraem, em numerus apertus, dos arts. 11 a 21 do CC), bens tutelados que não têm, per se, conteúdo patrimonial, mas extrema relevância conferida pelo ordenamento jurídico, quais sejam: higidez física e psicológica, vida, liberdade (física e de pensamento), privacidade, honra, imagem, nome, direitos morais do autor de obra intelectual. Nessa linha de intelecção, como pondera a abalizada doutrina especializada, dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são tão intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo (REsp 1406245/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 24/11/2020, DJe 10/02/2021)" (AgInt no REsp 1884984/SP AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2020/0178069-8; rel: E. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO; 4ª Turma; j: 29/11/2021). Objetivamente: "Normas de regência do instituto da reparação extrapatrimonial que não contemplam sensibilidade exacerbada ou susceptibilidade acentuada perante as adversidades do cotidiano" (Apelação n. 1007297-26.2023.8.26.0005 (TJSP); Rel: César Peixoto; 9ª Câmara de Direito Privado; j: 06/09/2024). Destaco: Apelação n. 1105937-70.2023.8.26.0100 (TJSP); Rel: Adilson de Araujo; 31ª Câmara de Direito Privado; j: 04/09/2024; EMENTA: "APELAÇÃO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DISSABOR, ABORRECIMENTO, MÁGOA, IRRITAÇÃO OU SENSIBILIDADE EXACERBADA. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. Só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral. Os eventos analisados nos presentes autos podem ter gerado aborrecimento, mas não evidenciaram dor psicológica capaz de configurar dano moral". Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES EM PARTE os pedidos deduzidos nesta ação, o que faço para CONDENAR os réus, FILOMENA APARECIDA DOS SANTOS BORGES DA SILVA e JOSÉ AFONSO DOS SANTOS, ambos qualificados, a, solidariamente, pagarem ao autor, MILTON HILÁRIO BORGES DA SILVA, também qualificado, a quantia de R$3.896,28 (três mil, oitocentos e noventa e seis reais e vinte e oito centavos), com correção monetária (IPCA) desde os desembolsos (fls.24/28) e juros legais moratórios (Selic), na forma do parágrafo único do art. 389 e do §1º do art. 406 do Código Civil, com redação pela Lei n. 14905/2024, desde a citação (art. 240 do CPC; art. 405 do CC). ARCARÁ: a parte ré com 33,33% de e a parte autora com 66,66% de todas as custas/despesas processuais; a parte ré com honorários que arbitro ao advogado (ou grupo de advogados) da parte autora em R$1.500,00 (um mil e quinhentos reais), por apreciação equitativa, com correção monetária a contar de agora e juros de mora de 1% ao mês a partir do trânsito em julgado (arts. 85, §§8º e 16, CPC); a parte autora com honorários que arbitro ao advogado (ou grupo de advogados) da parte ré em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado (Súmula n. 14 do C.STJ; art. 85, §2º e §4º, inc. III, CPC) da somatória das duas pretensões improcedentes (R$12.954,70 e R$610,00). Ficam as partes e interessados advertidos de que, para interposição de recurso e estando obrigados ao recolhimento de custas/preparo, deverão apresentar planilha de apuração do valor recolhido para que, posteriormente, seja praticado pela Serventia o disposto no inc. VI do art. 102 das NSCGJ (Provimento CG n. 01/2020) e no item "1" do Comunicado CG n. 136/2020. Publique-se. Intimem-se. Dispensado o registro (Prov. CG n. 27/2016).

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Processo nº 1013019-91.2016.8.11.0041

ID: 300016032

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: AGRAVO REGIMENTAL CíVEL Nº Processo: 1013019-91.2016.8.11.0041

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

EDIVALDO LIMA DE MELO

Acórdão

Advogados:

EDIVALDO LIMA DE MELO

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ALDEYR LIMA DE MELO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1013019-91.2016.8.11.0041 Classe: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) Assunto: [IUEE/Imposto Único sobre E… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1013019-91.2016.8.11.0041 Classe: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) Assunto: [IUEE/Imposto Único sobre Energia Elétrica] Relator: Des(a). MARCIO VIDAL Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] Parte(s): [ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (TERCEIRO INTERESSADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (AGRAVANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), EDIVALDO LIMA DE MELO - CPF: 011.012.371-98 (AGRAVADO), EDIVALDO LIMA DE MELO - CPF: 011.012.371-98 (ADVOGADO), ALDEYR LIMA DE MELO - CPF: 709.937.771-04 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0005-78 (AGRAVANTE), ENERGISA S/A - CNPJ: 00.864.214/0001-06 (AGRAVANTE), DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA - CPF: 568.962.041-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DES. MÁRCIO VIDAL. Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO EM REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. BASE DE CÁLCULO. INCLUSÃO DE TUST/TUSD. MODULAÇÃO DOS EFEITOS – TEMA 986/STJ. PRESERVAÇÃO DE DECISÃO LIMINAR CONCEDIDA ANTES DE 27/03/2017. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo Interno interposto contra decisão monocrática que, em sede de Reexame Necessário, ratificou sentença concessiva de segurança para afastar a incidência do ICMS sobre as tarifas TUST/TUSD nas faturas de energia elétrica da unidade consumidora n. 6/2510202-1, nos termos da modulação de efeitos fixada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 986. II. Questão em discussão 2. A controvérsia reside em determinar se a liminar concedida em 24/08/2016 permaneceu vigente até 29/05/2024, data da publicação do acórdão paradigma do Tema 986/STJ, para fins de aplicação da modulação de efeitos fixada pelo STJ. III. Razões de decidir 3. A tese firmada no Tema 986/STJ admite a exclusão das tarifas TUST/TUSD da base de cálculo do ICMS até 29/05/2024, desde que o contribuinte tenha obtido decisão liminar ou tutela provisória até 27/03/2017 e esta tenha permanecido vigente até a publicação do acórdão. 4. A existência de incidente genérico de suspensão de liminares instaurado anteriormente não se mostrou suficiente para demonstrar a cessação da eficácia da liminar no caso concreto, ausente qualquer ato judicial específico de cassação, revogação ou substituição da decisão originária. 5. A sentença reconheceu expressamente a manutenção da eficácia da liminar ao longo do período, situação corroborada pela decisão monocrática agravada, o que justifica a aplicação da modulação em favor do contribuinte. 6. A ausência de novos elementos probatórios no Agravo Interno impede a retratação da decisão agravada. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de Agravo Interno desprovido. Tese de julgamento: “1. A modulação de efeitos fixada no Tema 986 do STJ aplica-se às hipóteses em que a liminar foi concedida até 27/03/2017 e permaneceu eficaz até a publicação do acórdão paradigma em 29/05/2024, independentemente da existência de suspensão genérica sem efeito específico reconhecido no caso concreto.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 150, I; LC nº 87/1996, art. 13, § 1º, II, 'a'; CPC/2015, art. 927, § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.692.023/MT, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 13/03/2024, DJe 29/05/2024 (Tema 986). R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR) Egrégia Câmara, Trata-se de Recurso de Agravo Interno, interposto pelo Estado de Mato Grosso, contra a decisão monocrática proferida pelo Relator à época, que ratificou, em sede de Reexame Necessário, a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, que, nos autos do Mandado de Segurança, impetrado por Edivaldo Lima de Melo contra ato, indigitado coator, atribuído ao Secretário Adjunto da Receita Pública da Secretária de Fazenda - SEFAZ/MT e outro, concedeu em parte a ordem, para determinar que a autoridade coatora se abstenha de incluir a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) e/ou TUST na base de cálculo do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) cobrado nas faturas de energia elétrica da Unidade Consumidora n. 6/2510202-1, desde o deferimento da liminar até a data de publicação do acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo n. 986, em 29.5.2024, em conformidade com os parâmetros fixados no referido julgado. O Agravante sustenta que, no caso concreto, a modulação não é aplicável, pois a liminar concedida à parte autora para afastar a incidência do tributo foi suspensa anteriormente, por decisão proferida no Incidente de Suspensão de Liminares nº 53.157/2015, instaurado no âmbito do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, antes de 29/05/2024. Aduz que, de acordo com o precedente firmado no REsp 1.692.023/MT, a modulação de efeitos estabelecida pelo STJ só alcança os contribuintes que tenham obtido liminar até 27/03/ 2017 e a mantido vigente até 29/05/ 2024, data da publicação do acórdão paradigma. No entanto, como a liminar concedida nos presentes autos foi suspensa antes dessa data, o requisito da vigência contínua não se encontra preenchido, afastando, por conseguinte, a possibilidade de aplicação dos efeitos moduladores. Acrescenta que a liminar concedida no mandamus perdeu seus efeitos antes da consolidação da tese repetitiva, afastando qualquer direito da parte autora à preservação dos efeitos da decisão liminar para fins de restituição ou não incidência do imposto. Por isso, requer a retratação da decisão monocrática que aplicou a modulação de efeitos do Tema 986/STJ ao caso concreto. Alternativamente, pleiteia o encaminhamento do presente recurso ao órgão colegiado competente, com seu posterior provimento, para que seja reconhecida a inaplicabilidade da modulação e, por conseguinte, julgados totalmente improcedentes os pedidos formulados pela parte autora, inclusive sem preservação dos efeitos da liminar anteriormente concedida (id. 282378869). O Agravado deixou transcorrer in albis o prazo para contrarrazoar o recurso (id. 288154896). É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR) Egrégia Câmara Da análise dos autos, verifica-se que o Agravante, Estado de Mato Grosso, busca a reanálise da decisão que ratificou, em sede de reexame, a sentença proferida no Mandado de Segurança que discute a legalidade da inclusão das tarifas de uso dos sistemas de transmissão e distribuição de energia elétrica – TUST/TUSD – na base de cálculo do ICMS incidente sobre as faturas de energia elétrica da unidade consumidora n. 6/2510202-1, nos seguintes termos: “[...]Visto. Trata-se de Remessa Necessária de sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá/MT, que nos autos do “Mandado de Segurança”, impetrado por EDIVALDO LIMA DE MELO, em face de ato atribuído ao SECRETÁRIO ADJUNTO DA RECEITA PÚBLICA DA SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA – SEFAZ/MT e outro, concedeu a segurança pleiteada, confirmando a medida liminar anteriormente deferida, para declarar a ilegalidade da cobrança do ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias) incidente sobre a TUSD (Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição) da Unidade Consumidora – UC nº 6/2510202-1, e, via de consequência, julgou extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015. Sem recurso voluntário das partes, vieram os autos para reexame necessário. A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer colacionado no id. 272319377, manifestou-se pela ausência de interesse. É o relatório. DECIDO. Preambularmente é importante destacar que a submissão do presente caso à Turma Julgadora deste Eg. TJMT não é necessária quando a decisão está em consonância ou em manifesto confronto com a jurisprudência uníssona do Superior Tribunal de Justiça, situação que autoriza o julgamento monocrático do recurso, conforme artigo 932, incisos IV e V, do Código de Processo Civil. Essas decisões visam desafogar os Órgãos Colegiados, dando efetividade aos princípios da celeridade e da economia processual, respeitando as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Sobre o tema, comenta Daniel Amorim Assumpção Neves que este dispositivo (artigo 932) deve ser interpretado ampliativamente, de forma a ser aplicável sempre que existir precedente sobre a matéria de tribunal superior, ainda que não exista Súmula sobre o tema e que a matéria não tenha sido objeto de julgamento de causas repetitivas ou do incidente de assunção de competência (NOVO Código de Processo Civil, p. 1513, 2016 a ed., Jus PODIVM). Como visto do relatório, cuida-se de Remessa Necessária de sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá/MT, que nos autos do “Mandado de Segurança”, impetrado por EDIVALDO LIMA DE MELO, em face de ato atribuído ao SECRETÁRIO ADJUNTO DA RECEITA PÚBLICA DA SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA – SEFAZ/MT e outro, concedeu a segurança pleiteada, confirmando a medida liminar anteriormente deferida, para declarar a ilegalidade da cobrança do ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias) incidente sobre a TUSD (Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição) da Unidade Consumidora – UC nº 6/2510202-1, e, via de consequência, julgou extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015. Verifica-se que o juízo a quo não aplicou o entendimento firmado pelo STJ, no julgamento dos recursos repetitivos REsp n. 1692023/MT, REsp n. 16999851/TO e REsp n. 1163020/RS (Tema 986), no sentido de que, a Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e/ou Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) compõem a base de cálculo do ICMS, como custos operacionais formadores do preço final do kWh consumido. Vejamos: Tema Repetitivo 986 - Tese Jurídica Firmada: "A Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e/ou a Tarifa de Uso de Distribuição (TUSD), quando lançada na fatura de energia elétrica, como encargo a ser suportado diretamente pelo consumidor final (seja ele livre ou cativo), integra, para os fins do art. 13, § 1º, II, 'a', da LC 87/1996, a base de cálculo do ICMS". Eis a ementa do referido julgado: “PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ICMS SOBRE ENERGIA ELÉTRICA. ENCARGOS SETORIAIS RELACIONADOS COM TRANSPORTE (TUST) E DISTRIBUIÇÃO (TUSD) DE ENERGIA ELÉTRICA. VALOR DA OPERAÇÃO. DIFERENCIAÇÃO ENTRE A IDENTIFICAÇÃO DO FATO GERADOR DA EXAÇÃO E DA SUA BASE DE CÁLCULO. IMPORTÂNCIA DA DEMANDA E DELIMITAÇÃO DO SEU OBJETO 1. A questão controvertida nos feitos afetados ao julgamento no rito dos Recursos Repetitivos tem por escopo definir se os encargos setoriais correlacionados com operações de transmissão e distribuição de energia elétrica - especificamente a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) e a Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) -, lançados nas faturas de consumo de energia elétrica, e suportados pelo consumidor final, compõem a base de cálculo do ICMS. [...] TESE REPETITIVA 37. Adota-se, por todo o exposto, a tese repetitiva: "A Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e/ou a Tarifa de Uso de Distribuição (TUSD), quando lançadas na fatura de energia elétrica, como encargo a ser suportado diretamente pelo consumidor final (seja ele livre ou cativo), integra, para os fins do art. 13, § 1º, II, 'a', da LC 87/1996, a base de cálculo do ICMS.". MODULAÇÃO DOS EFEITOS. SUPERAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA QUE PERDUROU POR RAZOÁVEL PRAZO DE TEMPO. APLICABILIDADE NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS 38. Considerando que até o julgamento do REsp 1.163.020/RS - que promoveu mudança na jurisprudência da Primeira Turma - a orientação das Turmas que compõem a Seção de Direito Público do STJ era, s.m.j., toda favorável ao contribuinte do ICMS nas operações de energia elétrica, proponho, com base no art. 927, § 3º, do CPC, a modulação dos efeitos, a incidir exclusivamente em favor dos consumidores que, até 27.3.2017 - data de publicação do acórdão proferido julgamento do REsp 1.163.020/RS -, tenham sido beneficiados por decisões que tenham deferido a antecipação de tutela, desde que elas (as decisões provisórias) se encontrem ainda vigentes, para, independente de depósito judicial, autorizar o recolhimento do ICMS sem a inclusão da TUST/TUSD na base de cálculo. Note-se que mesmo estes contribuintes submetem-se ao pagamento do ICMS, observando na base de cálculo a inclusão da TUST e TUSD, a partir da publicação do presente acórdão - aplicável, quanto aos contribuintes com decisões favoráveis transitadas em julgado, o disposto adiante, ao final. 39. A modulação aqui proposta, portanto, não beneficia contribuintes nas seguintes condições: a) sem ajuizamento de demanda judicial; b) com ajuizamento de demanda judicial, mas na qual inexista Tutela de Urgência ou de Evidência (ou cuja tutela outrora concedida não mais se encontre vigente, por ter sido cassada ou reformada); c) com ajuizamento de demanda judicial, na qual a Tutela de Urgência ou Evidência tenha sido condicionada à realização de depósito judicial; e d) com ajuizamento de demanda judicial, na qual a Tutela de Urgência ou Evidência tenha sido concedida após 27.3.2017. 40. Em relação às demandas transitadas em julgado com decisão favorável ao contribuinte, eventual modificação está sujeita à análise individual (caso a caso), mediante utilização, quando possível, da via processual adequada. SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO. [...]”. (REsp n. 1.692.023/MT, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 13/3/2024, DJe de 29/5/2024.) (g.n.) Importante delinear que, após a definição do tema repetitivo, o colegiado decidiu modular os efeitos da decisão e o presente caso se enquadra na regra de modulação. Estabeleceu a Corte Superior, como marco o julgamento, pela Primeira Turma do STJ, do REsp 1.163.020, tendo em vista que, até esse momento, a orientação das turmas de direito público do STJ era favorável aos contribuintes. Nesse sentido, a Primeira Seção fixou que, até o dia 27 de março de 2017 – data de publicação do acórdão do julgamento na Primeira Turma –, estão mantidos os efeitos de decisões liminares que tenham beneficiado os consumidores de energia, para que, independentemente de depósito judicial, eles recolham o ICMS sem a inclusão da TUSD e da TUST na base de cálculo. Mesmo nesses casos, esses contribuintes deverão passar a incluir as tarifas na base de cálculo do ICMS a partir da data da publicação do acórdão do Tema Repetitivo 986. In casu, a ação mandamental foi impetrada em 26 de Fevereiro de 2016, a liminar foi concedida na data de 24 de Agosto de 2016 e a sentença proferida na data de 17 de Setembro de 2024. Portanto, o caso concreto se aproveita o entendimento anterior e mais benéfico ao contribuinte, enquadrando na exceção da modulação dos efeitos decidida pelo STJ, de forma que a sentença concessiva da segurança, que confirmou a liminar concedida em 15 de Fevereiro de 2017, deverá ser mantida. Diante deste quadro, à força do entendimento firmado pelo col. STJ no julgamento do Tema nº 986 e a sua modulação de efeitos, sob a técnica de casos seriais de observância imperativa, na forma do inc. III do art. 927 do CPC impõe-se a ratificação da sentença em ordem a manter a procedência do pedido inaugural. Com essas considerações, RATIFICO a sentença. [...]” (id. 272491875) Apesar dos argumentos apresentados no Agravo, observa-se que o Agravante não trouxe novos elementos probatórios capazes de justificar a modificação da decisão. No caso em apreço, consta que a ação constitucional, impetrada por Edivaldo Lima de Melo contra ato atribuído ao Secretário Adjunto da Receita Pública da Secretária de Fazenda - SEFAZ/MT e outro, discute a legalidade da inclusão das tarifas de uso dos sistemas de transmissão e distribuição de energia elétrica – TUST/TUSD – na base de cálculo do ICMS incidente sobre as faturas de energia elétrica da unidade consumidora n. 6/2510202-1. A liminar foi concedida em 24/08/2016 para afastar tal cobrança (ids. 270882907 e 270882910). O mandado de segurança ficou sobrestado, a partir de 21/08/2018, por força do julgamento do Tema 986 do Superior Tribunal de Justiça (id. 270882925). Em 17/09/2024, o Juízo da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública de Cuiabá/MT, à luz do julgamento do referido Tema, concedeu parcialmente a segurança pleiteada, para determinar a exclusão da TUST e da TUSD da base de cálculo do ICMS, limitada ao período compreendido entre a concessão da medida liminar (24/08/2016) e a publicação do acórdão do Tema Repetitivo 986/STJ (29/05/2024), em conformidade com a modulação de efeitos fixada pela Corte Superior. Confira-se: “[...]Vistos, etc. Trata-se de mandado de impetrado por EDIVALDO LIMA DE MELO contra suposto ato ilegal e abusivo praticado pelo SECRETARIO ADJUNTO DA RECEITA PÚBLICA DA SEFAZ/MT E OUTROS, objetivando a concessão da segurança para que seja declarada a ilegalidade da cobrança do ICMS sobre a TUSD/TUST nas faturas de energia elétrica da Unidade Consumidora n. 6/2510202-1. A impetrante, em síntese, reputa ilegal a cobrança de ICMS sobre a TUSD/TUST em suas faturas de energia elétrica. Com a inicial vieram documentos. Decisão proferida no Id. 1852346, concedendo o pedido liminar. [...] Nessa perspectiva, considerando que, no presente caso, foi concedida liminar em 24.08.2016, ou seja, em momento anterior à data de publicação do acórdão proferido pela Corte Superior, em 27.03.2017, devem ser observados os parâmetros fixados no julgamento do supracitado tema repetitivo. Ante o exposto, CONCEDO PARCIALMENTE a segurança pleiteada para determinar que a autoridade coatora se abstenha de incluir a TUSD e/ou TUST na base de cálculo do ICMS cobrado nas faturas de energia elétrica da Unidade Consumidora n. 6/2510202-1, desde o deferimento da liminar até a data de publicação do acórdão proferido pelo STJ no Tema Repetitivo 986, em 29.5.2024, em conformidade com os parâmetros fixados no referido julgado. Encaminhe-se cópia desta sentença à autoridade impetrada para os devidos fins. Com fundamento no art. 14, §1º, da Lei n. 12.016/2009, determino que após o decurso do prazo do recurso voluntário, sejam os autos encaminhados à Superior Instância, em vista do reexame necessário de sentença. Sem custas, como previsto no art. 10, XXII da Constituição Estadual. [...]” (id. 270882933) Em sede de remessa necessária, o Relator à época ratificou, monocraticamente, a sentença, ao reconhecer que a parte impetrante foi beneficiada por liminar vigente dentro do prazo estabelecido pelo STJ, preenchendo, portanto, os requisitos para a aplicação da modulação de efeitos fixada no Tema 986 — decisão que ora se impugna. Vê-se que a controvérsia dos autos reside na possibilidade de aplicação da modulação de efeitos fixada no julgamento do Tema Repetitivo 986/STJ ao mandado de segurança impetrado por contribuinte beneficiado por liminar concedida em 24/08/2016, a qual teria sido posteriormente suspensa por decisão proferida no Incidente de Suspensão de Liminares n. 53.157/2015, instaurado neste Tribunal de Justiça. O entendimento fixado pelo STJ determinou que “a Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e/ou Tarifa de Uso de Distribuição (TUSD), quando lançada na fatura de energia elétrica como encargo a ser suportado diretamente pelo consumidor final, seja livre ou cativo, integra, para fins do artigo 13, parágrafo 1º, inciso II, alínea a da LC 87/1996, a base de cálculo do ICMS” (Primeira Seção, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 13/03/2024, Tema nº 986). No entanto, a Corte Superior modulou os efeitos da decisão, estabelecendo que somente os consumidores que, até 27/03/2017, tenham sido beneficiados por decisões liminares ou antecipações de tutela ainda vigentes, poderão continuar recolhendo o ICMS sem a inclusão da TUST e da TUSD na base de cálculo, independentemente da realização de depósito judicial. Confira-se: “[...] 38. Considerando que até o julgamento do REsp 1.163.020/RS - que promoveu mudança na jurisprudência da Primeira Turma - a orientação das Turmas que compõem a Seção de Direito Público do STJ era, s.m.j., toda favorável ao contribuinte do ICMS nas operações de energia elétrica, proponho, com bas se no art. 927, § 3º, do CPC, a modulação dos efeitos, a incidir exclusivamente em favor dos consumidores que, até 27.3.2017 - data de publicação do acórdão proferido julgamento do REsp 1.163.020/RS -, tenham sido beneficiados por decisões que tenham deferido a antecipação de tutela, desde que elas (as decisões provisórias) se encontrem ainda vigentes, para, independente de depósito judicial, autorizar o recolhimento do ICMS sem a inclusão da TUST/TUSD na base de cálculo. Note-se que mesmo estes contribuintes submetem-se ao pagamento do ICMS, observando na base de cálculo a inclusão da TUST e TUSD, a partir da publicação do presente acórdão - aplicável, quanto aos contribuintes com decisões favoráveis transitadas em julgado, o disposto adiante, ao final. 39. A modulação aqui proposta, portanto, não beneficia contribuintes nas seguintes condições: a) sem ajuizamento de demanda judicial; b) com ajuizamento de demanda judicial, mas na qual inexista Tutela de Urgência ou de Evidência (ou cuja tutela outrora concedida não mais se encontre vigente, por ter sido cassada ou reformada); c) com ajuizamento de demanda judicial, na qual a Tutela de Urgência ou Evidência tenha sido condicionada à realização de depósito judicial; e d) com ajuizamento de demanda judicial, na qual a Tutela de Urgência ou Evidência tenha sido concedida após 27.3.2017. 40. Em relação às demandas transitadas em julgado com decisão favorável ao contribuinte, eventual modificação está sujeita à análise individual (caso a caso), mediante utilização, quando possível, da via processual adequada. [...]” (STJ, REsp n. 1.692.023/MT, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 13/3/2024, DJe de 29/5/2024) É justamente nesse ponto que se concentra a divergência trazida pelo Agravante, porque alega que a liminar concedida em 24/08/2016 não se encontrava vigente em 29/05/2024, pois teria sido suspensa por decisão da Presidência do TJMT no Incidente de Suspensão de Liminares n. 53.157/2015, aplicável indistintamente a todas as decisões precárias que versassem sobre a exclusão de TUST/TUSD da base de cálculo do ICMS. Não obstante a existência da referida decisão de suspensão genérica, não há nos autos prova inequívoca de que a liminar, no caso concreto, tenha efetivamente deixado de produzir efeitos jurídicos de forma plena e continuada ao longo do tempo. A simples invocação do incidente genérico não é suficiente para afastar a presunção de vigência da medida liminar, não havendo elemento que demonstre o cumprimento efetivo da ordem de suspensão pelo juízo de origem, tampouco sua revogação específica, cassação ou substituição por decisão de mérito anterior à modulação. Pelo contrário, conforme consignado na sentença de primeiro grau e reafirmado na decisão monocrática deste relator, a medida liminar foi regularmente concedida em 24/08/2016 e confirmada na sentença proferida em 17/09/2024, sem qualquer indicação de sua perda de eficácia entre esses marcos. Aliás, na decisão da remessa necessária, o Relator à época expressamente reconheceu que o caso se enquadra na hipótese de preservação dos efeitos da liminar até 29/05/2024, o que autoriza a aplicação da modulação, nos exatos termos delineados pelo STJ. Importante lembrar que, no julgamento do Tema 986, o STJ buscou compatibilizar segurança jurídica com isonomia, vedando apenas o benefício de decisões precárias não mais vigentes – o que não se comprovou no caso dos autos. Assim, inexistindo elementos novos capazes de infirmar os fundamentos da decisão agravada, não há razões jurídicas que justifiquem sua retratação. Forte nessas razões, NEGO PROVIMENTO ao Agravo de Interno interposto pelo Estado de Mato Grosso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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Processo nº 1013019-78.2022.8.11.0042

ID: 282098681

Tribunal: TJMT Órgão: Vice-Presidência Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1013019-78.2022.8.11.0042

Data de Disponibilização: 28/05/2025

Polo Ativo:

BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA JOAO CARLOS MULLER SANDERLEI FERREIRA DA COSTA

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

DARLAN DE OLIVEIRA BERNARDINO

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LEANDRO PERES DIAS NUNES

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

JULIA FERNANDA SANTOS DE CARVALHO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO GABINETE DA VICE-PRESIDÊNCIA RECURSOS ESPECIAIS Nº 1013019-78.2022.8.11.0042 RECORRENTES: BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES E JOÃO CARLOS MULLER RECORRIDAS: MINIST… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO GABINETE DA VICE-PRESIDÊNCIA RECURSOS ESPECIAIS Nº 1013019-78.2022.8.11.0042 RECORRENTES: BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES E JOÃO CARLOS MULLER RECORRIDAS: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO Vistos. 1. Do Recurso Especial interposto por Bruno Michel Medrado Rodrigues no id. 282371869 Trata-se de Recurso Especial interposto por BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas “a” e “c”, da Constituição Federal, contra acórdão de id. 280663363. A parte recorrente alega violação ao artigo 5º, incisos III, LIII e LVI, da Constituição Federal, bem como aos artigos 69, inciso I, 70, 158-A e 158-C, todos do Código de Processo Penal. Por fim, suscita ofensa ao artigo 35 da Lei n. 11.343/06. Foram apresentadas contrarrazões no id 287187889. É o relatório. Decido. Violação da Constituição Federal - Via inadequada Conforme se depreende da dicção dos artigos 102, III, e 105, III, ambos da Constituição Federal, não é possível a arguição de ofensa a dispositivo constitucional em sede de recurso especial, sob pena de usurpação de competência do Supremo Tribunal Federal, pois ao Superior Tribunal de Justiça compete apenas pacificar a interpretação dada a dispositivo de tratado ou de lei federal. Confira-se: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CPC/1973 NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO A FUNDAMENTO CONTIDO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 283/STF.EXAME DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. ARGUMENTAÇÃO DISSOCIADA. SÚMULA 284/STF. OFENSA A NORMA INFRALEGAL. NÃO ENQUADRAMENTO NO CONCEITO DE LEI FEDERAL. PROVAS DOS AUTOS QUE NÃO EVIDENCIAM A NECESSIDADE DE CONTRATAÇÃO DE PROFISSIONAIS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. (...) 4. Nos termos do art. 105, inciso III, da Constituição da República, o recurso especial é destinado tão somente à uniformização da interpretação do direito federal, não sendo a via adequada para a análise de eventual ofensa a dispositivos constitucionais, cuja competência pertence ao STF. 5. Razões recursais dissociadas da fundamentação adotada pelo acórdão recorrido. Incidência da Súmula 284 do STF. (...) 9.Agravo interno não provido”. (AgInt no REsp n. 2.003.755/RJ, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 22/11/2022, DJe de 24/11/2022). Em análise ao caso concreto, verifica-se que a parte recorrente alegou violação ao artigo 5º, incisos III, LIII e LVI, da Constituição Federal, cujo exame é vedado nesta via, conforme visto acima, o que obsta a sua admissão neste ponto. Do permissivo previsto no art. 105, III, ‘a’, da CF/1988. Nos termos do art. 105, inciso III, alínea ‘a’, da Constituição Federal, o Recurso Especial é cabível para impugnar decisões que contrariem tratado ou lei federal ou que lhes neguem vigência. A demonstração da violação exige que o recorrente exponha os fatos, identifique o dispositivo do tratado ou da lei federal supostamente violado e apresente, de forma objetiva e precisa, a fundamentação de como o acórdão recorrido teria incorrido na ofensa. Nesse sentido: TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 489 DO CPC. INOCORRÊNCIA. ALEGAÇÃO GENÉRICA DE OFENSA A DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA N. 284/STF. OFENSA À SÚMULA. CONCEITO DE TRATADO OU LEI FEDERAL. NÃO ENQUADRAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 518/STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DOS ARTS. 926, 927 E 928 DO CPC E 165 E 170 DO CTN. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA N. 282/STF. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO CONTRA LEI EM TESE. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 266/STF. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. [...] III – A jurisprudência desta Corte considera que, quando a arguição de ofensa ao dispositivo de lei federal é genérica, sem demonstração efetiva da contrariedade, aplica-se, por analogia, o entendimento da Súmula n. 284, do Supremo Tribunal Federal. IV – O conceito de tratado ou lei federal, previsto no art. 105, inciso III, a, da Constituição da República, deve ser considerado em seu sentido estrito, não compreendendo súmulas de Tribunais, bem como atos administrativos normativos. Incidência da Súmula n. 518 do Superior Tribunal de Justiça. [...] X – Agravo Interno improvido. (AgInt no REsp 2042016/MS – Min. Regina Helena Costa – Primeira Turma – j. 13.3.2023 – DJe 26-3-2023 – sem destaque no original). A despeito dos esforços argumentativos, quanto à alegação de ofensa aos artigos 69, inciso I, 70, 158-A e 158-C, todos do Código de Processo Penal, entendo que não merece prosperar. Isso porque a defesa, não ampara o seu inconformismo na violação de forma precisa e concreta, bem como, não aponta a contrariedade alegada, ou como ela teria ocorrido, o que consequentemente, impossibilita a exata compreensão da matéria apresentada. Assim, considerando que o presente Recurso Especial deixou de fixar, com a clareza necessária, quais são as controvérsias de direito veiculadas às supostas afrontas à legislação infraconstitucional, a possibilitar a sua estreita devolutividade ao Tribunal Superior, tem-se por deficiente a fundamentação recursal, razão pela qual se impõe sua inadmissão. Do permissivo previsto no art. 105, III, ‘c’, da CF/1988. Nos termos do art. 105, III, alínea ‘c’, da Constituição Federal, o Recurso Especial é cabível para impugnar decisões que atribuam à lei federal interpretação divergente daquela conferida por outro tribunal. A verificação da divergência pressupõe a demonstração da ocorrência de similitude fática, da incidência da mesma norma federal e da existência de interpretação jurídica conflitante. Essa demonstração exige a realização do cotejo analítico, consistente na exposição pormenorizada e efetiva das situações de fato, de direito e da divergência interpretativa entre o acórdão recorrido e o acórdão paradigma. Nesse sentido: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. COTEJO ANALÍTICO NÃO EFETUADO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL OBJETO DE INTERPRETAÇÃO DIVERGENTE. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284/STF. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. De acordo com o disposto no art. 1.029, § 1º, do CPC/2015, c/c art. 255, § 1º, do RISTJ, a demonstração da divergência exige não apenas a transcrição da ementa ou voto do acórdão paradigma, mas que o recorrente realize o devido cotejo analítico entre o aresto recorrido e o divergente, com a explicitação da identidade das situações fáticas e a interpretação diversa emprestada ao mesmo dispositivo de legislação infraconstitucional, o que não ocorreu. 2. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a alegação de dissídio jurisprudencial deve estar pautada na citação de dispositivo da legislação federal a que se tenha conferido interpretação diversa pelo aresto impugnado, sob pena de configurar-se deficiência na fundamentação. 3. Agravo interno improvido. (AgInt no Agravo em Recurso Especial n. 2.221.170- MS – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – Terceira Turma – j. 13-2-2023 – DJe 16-2-2023 – sem destaque no original)”. No caso dos autos, embora tenha fundamentado seu apelo excepcional com base no permissivo da alínea “c” do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, observa-se que, no ponto, o Recorrente deixou de efetuar o exame comparativo da divergência jurisprudencial. A circunstância, invariavelmente, impede a admissão do recurso quanto a este ponto. Da ausência de matéria exclusivamente de direito. Nos termos do art. 105, inciso III, da Constituição Federal, o Recurso Especial é cabível para impugnar decisões que contrariem tratado ou lei federal, ou que divirjam de interpretação de lei federal adotada por outro tribunal. Conforme leciona a doutrina, o Recurso Especial tem como escopo exclusivo a apreciação de questões de direito federal infraconstitucional – as denominadas federal questions [DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, v. V. São Paulo: Malheiros/JusPodivm, 2022, p. 271]. No caso dos autos, verifica-se que o deslinde da controvérsia depende do reexame do conjunto fático-probatório dos autos, circunstância que atrai a incidência da Súmula 7/STJ, segundo a qual: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. Nesse sentido, o seguinte julgado: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. TAXA DE RETENÇÃO. 25% DOS VALORES PAGOS. PECULIARIDADES DO CASO. REDUÇÃO MOTIVADA PARA 10% DOS VALORES PAGOS. VERIFICAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS E REEXAME DE ELEMENTOS FÁTICO-PROBATÓRIOS DOS AUTOS. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. INCIDÊNCIA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Na hipótese de rescisão de contrato de compra e venda de imóvel por desistência do comprador, deve prevalecer o percentual de 25% de retenção dos valores por ele pagos, salvo eventuais peculiaridades do caso a ensejar sua redução motivada, reconhecidas pela instância de origem. 2. Reconhecimento pelo Tribunal a quo da razoabilidade e proporcionalidade na aplicação do percentual de 10% de retenção, considerando os valores efetivamente pagos pelo promitente comprador e o estabelecido no contrato firmado entre as partes. 3. Aplicam-se as Súmulas n. 5 e 7 do STJ quando a adoção de conclusão diversa daquela a que chegou a instância de origem implicar, necessariamente, a interpretação de cláusulas contratuais e o reexame dos elementos fático-probatórios dos autos, medidas inviáveis na instância especial 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AgInt no AREsp n. 2.500.439/GO, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 20/3/2025, DJEN de 28/3/2025.)” A parte recorrente requer, em síntese, conhecimento e provimento do Recurso Especial, a fim de que seja reformado o acórdão ora hostilizado, ante ao possível bis in idem, mormente em vista o suposto envolvimento em associação e organização criminosa. Com arrimo nessa assertiva, pleiteia absolvição com esteio na ilicitude das provas, à medida que foram obtidas por juízo incompetente. Por fim, suscita a tese de quebra da cadeia de custódia, sob a justificativa de que não houve a participação de perito oficial. Quanto ao ponto, restou assentado no acórdão combatido: “(...) De início, pontue-se que, em juízo, os apelantes BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES, JOÃO CARLOS MULLER, DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA e LUCAS ROGANTE CAVALCANTE confessaram integrar o grupo infrator “Comando Vermelho”, compondo a cadeia hierárquica da organização e atuando em prol do grupo, seja mediante a efetuação de cobranças das taxas devidas à facção por outros membros e de depósitos bancários do dinheiro recebido e realização de filmagens das ruas nas “quebradas” (como admitiu BRUNO), seja através da venda droga (como admitiu JOÃO CARLOS) e de pagamento de mensalidade (como admitiu DOUGLAS) ou de aplicação de “disciplina” em face dos faccionados desobedientes (como admitiu LUCAS). (...) Em um vídeo salvo na galeria de mídias do aparelho celular de BRUNO, de 04/07/2022, é possível ver que o realizador da filmagem e um terceiro indivíduo têm em sua posse ao menos duas cartelas da droga sintética LSD (ácido lisérgico) e o exato momento em que o terceiro picota uma das cartelas para individualizar o entorpecente em porções, sendo de se pontuar que, embora BRUNO alegue em juízo que comprou o psicotrópico para experimentar, é inegável que o preparava para a venda em prol da “Comando Vermelho”, mesmo porque, cada uma das cartelas retratadas na gravação contém dezenas de selos, popularmente chamados de “doces”, o que é incompatível com o mero uso (vídeo armazenado no ID 227284163). No celular de BRUNO, foi localizada também uma lista de controle da distribuição de drogas ilícitas a outros faccionados, datada de 05/07/2022, o que revela não só a posição de “gerência” ocupada por BRUNO na difusão ilícita de entorpecentes pelo “CV-MT”, mas também o seu vínculo com os demais, pois, no rascunho (intitulado por BRUNO de “galo novo 100g”, referindo-se à nova remessa de drogas), ele classifica os revendedores pelo número de pedidos e pelo status de adimplência, respectivamente, pelo número aposto antes do “vulgo” de cada traficante e pelos emojis de “saco de dinheiro” (para quem já pagou) e de “X”, para quem ainda faltava quitar. (...) Outrossim, foi verificada no celular de BRUNO uma conversa na qual ele é abordado pela pessoa que se identifica como Walisson Gomes, vulgo “WG2”, o qual se oferece para ser o novo fornecedor de drogas sintéticas provenientes do Rio de Janeiro/RJ para comercialização em Água Boa/MT, em face do que BRUNO demonstra interesse, mas diz que não pode tomar monocraticamente a decisão de fechar o negócio e pede que o interlocutor lhe envie planilhas com os preços específicos de cada produto, a fim de que ele apresente para seus superiores hierárquicos, dizendo “igual eu falei pro senho faz a planilha certim chega ne mim que ai eu vou passar pra eles e eu sei te dá um posicionamento ce entendeu zika”. (Relatório de Inteligência no ID 227283269 - Pág. 4/7 e áudios originais armazenados do ID 227284165 ao ID 227284168). (...) No celular de BRUNO, foram encontradas ainda inúmeras fotos em que ele ostenta diversas armas de fogo, inclusive armas longas e de grosso calibre, que, segundo relataram as testemunhas em juízo, foram posteriormente apreendidas no depósito conhecido como “paiol do ‘Comando Vermelho’”, o que evidencia que o elo de BRUNO junto ao organismo infrator extrapolava a mera atividade de traficância realizada pelo grupo, já que possuía acesso também ao arsenal da facção (fotos no ID 227283269 - Pág. 13/14, ID 227284159, ID 227284160, ID 227284161 e ID 227284162). Durante a busca exploratória judicialmente deferida no celular de BRUNO, os agentes estatais desvelaram que ele participava de um grupo virtual no aplicativo WhatsApp intitulado “FECHAMENTO”, administrado pelos “gerentes”/”disciplinas” locais do “CV-MT” e que funcionava como um canal através do qual as referidas lideranças efetuavam cobranças aos demais faccionados, controlando quem já pagou o valor referente às drogas adquiridas da facção e intimidando os devedores com ameaças para que sanassem as pendências. Em uma mensagem enviada no referido grupo “FECHAMENTO” por BRUNO, este cumprimenta os demais integrantes e se auto intitula como “RJ”, logo após o que o vulgo “Kawai” (possivelmente o corréu processado em autos desmembrados André Paulo Dias) envia uma extensa lista arrolando os “vulgos” dos faccionados que estão adimplentes (sinalizados com o emoji de “confere/check”) e aqueles que não realizaram o pagamento (marcados com um emoji de interrogação), e, ao final da lista, fixa a data limite para quitação em 20/06/2022, nos seguintes termos: “Todos sabemos do nosso compromisso com a organização CV-RL então não deixe a desejar. Data 20/06/2022”. (ID 227283269 - Pág. 1) – Destaquei. Em outra mensagem enviada no grupo virtual em questão, denominada “INFORMATIVO”, fica claro o envolvimento de todos os participantes com a organização criminosa “Comando Vermelho”, seja em maior ou em menor capacidade, pois, ao final da mensagem, o remetente deixa claro que “Não estamos aqui para omprimir nem ser mais que ninguém mais todos somos sientes do nosso COMPROMISSO quando entramos na organização (cv-rl)” (Sic – ID 227283269 - Pág. 1) – Grifei. (...) Por fim, com relação a BRUNO, o declarante pontuou que ele se exibia, em fotografias armazenadas no celular, portando diversas armas de fogo, inclusive armas longas e de grosso calibre, ressaltando ainda que, durante buscas realizadas em um endereço conhecido como o “paiol do ‘Comando Vermelho’”, foram localizados e apreendidos os armamentos ostentados por BRUNO nas referidas fotos, que corrobora seu envolvimento no submundo da criminalidade. (...) Acerca do tema, tanto o crime tipificado no art. 35 da Lei n.º 11.343/06 e quanto o crime do art. 2.º da Lei n.º 12.850/13 visam tutelar a paz pública e, não obstante tal identidade de bens jurídicos primários, friso que não é juridicamente impossível a condenação de uma mesma pessoa como incursa nos dois tipos penais, pois, em determinados casos, diante da pluralidade de vínculos associativos, em diferentes contextos fáticos, o mesmo indivíduo pode incorrer concomitantemente tanto no delito de associação para o tráfico de drogas quanto no crime de organização criminosa, voltada à prática de outras infrações penais graves ou de caráter transnacional. Para tanto, é necessário que as provas permitam distinguir, no plano fático e jurídico, os crimes de associação para o tráfico e de organização criminosa, isto é, a dupla condenação exige a demonstração a contento dos liames subjetivos autônomos e simultâneos do mesmo indivíduo, com vistas a realizar a traficância juntamente com outrem de maneira permanente e estável (art. 35, Lei n.º 11.343/06) e, paralelamente, também com vistas a praticar outras infrações graves (incluindo-se aí o próprio narcotráfico) em conluio organizado com terceiros (art. 2.º, Lei n.º 12.850/13). Nesse sentido orienta a jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça, de acordo com a qual a associação para o tráfico e a organização criminosa constituem tipos penais autônomos e, havendo desígnios independentes e contextos fáticos e subjetivos distintos nas condutas, a condenação simultânea se mostra escorreita, consoante se infere a partir dos seguintes precedentes (...) [Grifos originais]. Contudo, para rever a conclusão adotada no acórdão recorrido pertinente as provas angariadas aos autos, bem como ao pleito de reconhecimento da confissão espontânea, imprescindível o reexame do quadro fático-probatório dos autos. Nesse sentido: “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. DECLARAÇÃO DE ILICITUDE DE PROVAS. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO PELA CORTE ESTADUAL COM BASE EM OUTROS ELEMENTOS VÁLIDOS. AUSÊNCIA DE REFORMATIO IN PEJUS. DEVOLUTIVIDADE AMPLA DO RECURSO DE APELAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Diante do amplo efeito devolutivo do recurso de apelação, não há qualquer óbice que impeça o conhecimento de toda a matéria versada, com a reapreciação dos fatos e de todas as provas produzidas nos autos. 2. Hipótese, ademais, em que o Tribunal a quo utilizou de fundamentos e provas que constam expressamente da sentença condenatória, não havendo a inovação apontada pela defesa. 3. O reconhecimento da ilicitude de parte das provas, por si só, não impede a manutenção da condenação, quando se vê que as instâncias ordinárias utilizaram outros elementos que comprovam, de forma suficiente, a materialidade e a autoria do crime, sem qualquer relação com a prova declarada ilícita. 4. Tendo o Tribunal a quo, após a detida análise dos autos, apontado a existência de provas lícitas, autônomos e suficientes, para sustentar a condenação da agravante pela prática dos crimes do art. 2º, caput, da Lei n. 12.850/2013 e art. 35 da Lei n. 11.343/2006, a modificação da conclusão, como requer a defesa, para o acolhimento da pretensão absolutória, demandaria o aprofundado revolvimento do conteúdo fático-probatório, o que é vedado na via estreita do recurso especial pela incidência da Súmula n. 7 do STJ. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp n. 2.187.844/SC, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 2/4/2025, DJEN de 7/4/2025.)” [Grifei] Não se trata, portanto, de matéria exclusivamente de direito, razão pela qual o Recurso Especial revela-se inadmissível. 2. Do Recurso Especial interposto por João Carlos Muller, interposto no id. 284499852 Trata-se de Recurso Especial interposto por JOÃO CARLOS MULLER, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas “a” e “c”, da Constituição Federal, contra acórdão de id. 280663363. A parte recorrente alega violação aos artigos 69, inciso I, 70, 157 e 158-A, todos do Código de Processo Penal. Em arremate, suscita ofensa ao artigo 35 da Lei n. 11.343/06 e ao artigo 2º da Lei Federal n. 12.850/2013. Foram apresentadas contrarrazões no id 287173883. É o relatório. Decido. Do permissivo previsto no art. 105, III, ‘a’, da CF/1988. Nos termos do art. 105, inciso III, alínea ‘a’, da Constituição Federal, o Recurso Especial é cabível para impugnar decisões que contrariem tratado ou lei federal ou que lhes neguem vigência. A demonstração da violação exige que o recorrente exponha os fatos, identifique o dispositivo do tratado ou da lei federal supostamente violado e apresente, de forma objetiva e precisa, a fundamentação de como o acórdão recorrido teria incorrido na ofensa. Nesse sentido: TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 489 DO CPC. INOCORRÊNCIA. ALEGAÇÃO GENÉRICA DE OFENSA A DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA N. 284/STF. OFENSA À SÚMULA. CONCEITO DE TRATADO OU LEI FEDERAL. NÃO ENQUADRAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 518/STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DOS ARTS. 926, 927 E 928 DO CPC E 165 E 170 DO CTN. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA N. 282/STF. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO CONTRA LEI EM TESE. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 266/STF. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. [...] III – A jurisprudência desta Corte considera que, quando a arguição de ofensa ao dispositivo de lei federal é genérica, sem demonstração efetiva da contrariedade, aplica-se, por analogia, o entendimento da Súmula n. 284, do Supremo Tribunal Federal. IV – O conceito de tratado ou lei federal, previsto no art. 105, inciso III, a, da Constituição da República, deve ser considerado em seu sentido estrito, não compreendendo súmulas de Tribunais, bem como atos administrativos normativos. Incidência da Súmula n. 518 do Superior Tribunal de Justiça. [...] X – Agravo Interno improvido. (AgInt no REsp 2042016/MS – Min. Regina Helena Costa – Primeira Turma – j. 13.3.2023 – DJe 26-3-2023 – sem destaque no original). A despeito dos esforços argumentativos, quanto à alegação de ofensa aos artigos 69, inciso I, 70, 157 e 158-A, todos do Código de Processo Penal, entendo que não merece prosperar. Isso porque a defesa, não ampara o seu inconformismo na violação de forma precisa e concreta, bem como, não aponta a contrariedade alegada, ou como ela teria ocorrido, o que consequentemente, impossibilita a exata compreensão da matéria apresentada. Assim, considerando que o presente Recurso Especial deixou de fixar, com a clareza necessária, quais são as controvérsias de direito veiculadas às supostas afrontas à legislação infraconstitucional, a possibilitar a sua estreita devolutividade ao Tribunal Superior, tem-se por deficiente a fundamentação recursal, razão pela qual se impõe sua inadmissão. Do permissivo previsto no art. 105, III, ‘c’, da CF/1988. Nos termos do art. 105, III, alínea ‘c’, da Constituição Federal, o Recurso Especial é cabível para impugnar decisões que atribuam à lei federal interpretação divergente daquela conferida por outro tribunal. A verificação da divergência pressupõe a demonstração da ocorrência de similitude fática, da incidência da mesma norma federal e da existência de interpretação jurídica conflitante. Essa demonstração exige a realização do cotejo analítico, consistente na exposição pormenorizada e efetiva das situações de fato, de direito e da divergência interpretativa entre o acórdão recorrido e o acórdão paradigma. Nesse sentido: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. COTEJO ANALÍTICO NÃO EFETUADO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL OBJETO DE INTERPRETAÇÃO DIVERGENTE. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284/STF. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. De acordo com o disposto no art. 1.029, § 1º, do CPC/2015, c/c art. 255, § 1º, do RISTJ, a demonstração da divergência exige não apenas a transcrição da ementa ou voto do acórdão paradigma, mas que o recorrente realize o devido cotejo analítico entre o aresto recorrido e o divergente, com a explicitação da identidade das situações fáticas e a interpretação diversa emprestada ao mesmo dispositivo de legislação infraconstitucional, o que não ocorreu. 2. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a alegação de dissídio jurisprudencial deve estar pautada na citação de dispositivo da legislação federal a que se tenha conferido interpretação diversa pelo aresto impugnado, sob pena de configurar-se deficiência na fundamentação. 3. Agravo interno improvido. (AgInt no Agravo em Recurso Especial n. 2.221.170- MS – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – Terceira Turma – j. 13-2-2023 – DJe 16-2-2023 – sem destaque no original)”. No caso dos autos, embora tenha fundamentado seu apelo excepcional com base no permissivo da alínea “c” do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, observa-se que, no ponto, o Recorrente deixou de efetuar o exame comparativo da divergência jurisprudencial. A circunstância, invariavelmente, impede a admissão do recurso quanto a este ponto. Da ausência de matéria exclusivamente de direito. Nos termos do art. 105, inciso III, da Constituição Federal, o Recurso Especial é cabível para impugnar decisões que contrariem tratado ou lei federal, ou que divirjam de interpretação de lei federal adotada por outro tribunal. Conforme leciona a doutrina, o Recurso Especial tem como escopo exclusivo a apreciação de questões de direito federal infraconstitucional – as denominadas federal questions [DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, v. V. São Paulo: Malheiros/JusPodivm, 2022, p. 271]. No caso dos autos, verifica-se que o deslinde da controvérsia depende do reexame do conjunto fático-probatório dos autos, circunstância que atrai a incidência da Súmula 7/STJ, segundo a qual: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. Nesse sentido, o seguinte julgado: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. TAXA DE RETENÇÃO. 25% DOS VALORES PAGOS. PECULIARIDADES DO CASO. REDUÇÃO MOTIVADA PARA 10% DOS VALORES PAGOS. VERIFICAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS E REEXAME DE ELEMENTOS FÁTICO-PROBATÓRIOS DOS AUTOS. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. INCIDÊNCIA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Na hipótese de rescisão de contrato de compra e venda de imóvel por desistência do comprador, deve prevalecer o percentual de 25% de retenção dos valores por ele pagos, salvo eventuais peculiaridades do caso a ensejar sua redução motivada, reconhecidas pela instância de origem. 2. Reconhecimento pelo Tribunal a quo da razoabilidade e proporcionalidade na aplicação do percentual de 10% de retenção, considerando os valores efetivamente pagos pelo promitente comprador e o estabelecido no contrato firmado entre as partes. 3. Aplicam-se as Súmulas n. 5 e 7 do STJ quando a adoção de conclusão diversa daquela a que chegou a instância de origem implicar, necessariamente, a interpretação de cláusulas contratuais e o reexame dos elementos fático-probatórios dos autos, medidas inviáveis na instância especial 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AgInt no AREsp n. 2.500.439/GO, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 20/3/2025, DJEN de 28/3/2025.)” A parte recorrente pugna pela reforma da decisão, a fim de reconhecer a contrariedade dos artigos 69, inciso I, 70, 157 e 158-A, todos do Código de Processo Penal, bem como ao artigo 35 da Lei n. 11.343/06, e ao final, artigo 2º da Lei Federal n. 12.850/2013. Quanto ao ponto, restou assentado no acórdão combatido: “No caso dos apelantes PEDRO, ARISNALDO, DOUGLAS, EDMILSON e JOÃO CARLOS, não obstante as suas incumbências e tarefas no âmbito da facção fossem precipuamente ligadas à difusão ilícita de entorpecentes, é evidente que o dolo destes não se limitou à traficância e à associação para a traficância, já que o repasse das taxas mensais devidas à organização e exultação ao “Comando Vermelho” demonstram efetiva vontade independente de integrar a facção, em capacidade que extrapolava os crimes autônomos perpetrados pelo organismo. O dolo dos agentes restou demonstrado também a partir da verdadeira promoção e enaltecimento ao organismo infrator, que recorrentes frequentemente externavam em conversas privadas e nos grupos virtuais dos quais participavam, sempre referindo-se à facção como “família” e aos demais faccionados como “irmãos” ou “manos”, amiúde incentivando uns aos outros a cumprirem suas responsabilidades junto ao grupo delinquente e alertando-se entre si sobre eventual patrulhamento policial que pudesse embaraçar o regular funcionamento das atividades facciosas. Diante deste cenário probatório, é explícita a existência de contextos fáticos distintos, de vínculos subjetivos imiscíveis e de desígnios autônomos nas condutas dos apelantes, não havendo dúvida, in casu, de que pertenciam à organização criminosa “Comando Vermelho” e atuavam em prol da facção de maneira extrínseca e que claramente desbordava da associação por eles formada para o tráfico de drogas. Diante deste cenário probatório, devem ser mantidas as condenações simultâneas dos recorrentes LUCAS, ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI, EDIMILSON, DOUGLAS, BRUNO e JOÃO CARLOS pelos crimes do art. 2.º da Lei n.º 12.850/2013 e art. 35 da Lei n.º 11.343/2006, em consonância com a linha de precedentes desta e. Corte de Justiça estadual: “Não há bis in idem pela condenação do apelante tanto por organização criminosa quanto por associação para o tráfico de drogas, diante da pluralidade de vínculos associativos, em diferentes contextos fáticos e com condutas distintas”. (TJ-MT - N.U 1011443-50.2022.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 20/08/2024, Publicado no DJE 26/08/2024)” [Grifos originais]. Contudo, para rever a conclusão adotada no acórdão recorrido pertinente à análise de provas, imprescindível o reexame do quadro fático-probatório dos autos. Nesse sentido: “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. DECLARAÇÃO DE ILICITUDE DE PROVAS. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO PELA CORTE ESTADUAL COM BASE EM OUTROS ELEMENTOS VÁLIDOS. AUSÊNCIA DE REFORMATIO IN PEJUS. DEVOLUTIVIDADE AMPLA DO RECURSO DE APELAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Diante do amplo efeito devolutivo do recurso de apelação, não há qualquer óbice que impeça o conhecimento de toda a matéria versada, com a reapreciação dos fatos e de todas as provas produzidas nos autos. 2. Hipótese, ademais, em que o Tribunal a quo utilizou de fundamentos e provas que constam expressamente da sentença condenatória, não havendo a inovação apontada pela defesa. 3. O reconhecimento da ilicitude de parte das provas, por si só, não impede a manutenção da condenação, quando se vê que as instâncias ordinárias utilizaram outros elementos que comprovam, de forma suficiente, a materialidade e a autoria do crime, sem qualquer relação com a prova declarada ilícita. 4. Tendo o Tribunal a quo, após a detida análise dos autos, apontado a existência de provas lícitas, autônomos e suficientes, para sustentar a condenação da agravante pela prática dos crimes do art. 2º, caput, da Lei n. 12.850/2013 e art. 35 da Lei n. 11.343/2006, a modificação da conclusão, como requer a defesa, para o acolhimento da pretensão absolutória, demandaria o aprofundado revolvimento do conteúdo fático-probatório, o que é vedado na via estreita do recurso especial pela incidência da Súmula n. 7 do STJ. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp n. 2.187.844/SC, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 2/4/2025, DJEN de 7/4/2025.)” [Grifei] Não se trata, portanto, de matéria exclusivamente de direito, razão pela qual o Recurso Especial revela-se inadmissível. Dispositivo. Ante o exposto, com fundamento no art. 1.030, inc. V, do Código de Processo Civil, inadmito os Recursos Especiais. Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Desa. Nilza Maria Pôssas de Carvalho Vice-Presidente

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Processo nº 1013019-78.2022.8.11.0042

ID: 256784551

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1013019-78.2022.8.11.0042

Data de Disponibilização: 15/04/2025

Polo Ativo:

BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA JOAO CARLOS MULLER SANDERLEI FERREIRA DA COSTA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

DARLAN DE OLIVEIRA BERNARDINO

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LEANDRO PERES DIAS NUNES

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JULIA FERNANDA SANTOS DE CARVALHO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1013019-78.2022.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1013019-78.2022.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins, Promoção, constituição, financiamento ou integração de Organização Criminosa] Relator: Des(a). GILBERTO GIRALDELLI Turma Julgadora: [DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). JONES GATTASS DIAS] Parte(s): [BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES - CPF: 053.337.401-43 (APELANTE), DARLAN DE OLIVEIRA BERNARDINO - CPF: 052.103.781-60 (ADVOGADO), EDIMILSON SILVA DE JESUS - CPF: 049.845.471-11 (APELANTE), SANDERLEI FERREIRA DA COSTA - CPF: 052.599.951-55 (APELANTE), CRISTIANE DOS SANTOS MENINO - CPF: 253.876.738-51 (ADVOGADO), PEDRO HENRIQUE CABRAL SILVA - CPF: 072.425.621-04 (APELANTE), ARISNALDO DA SILVA GOMES - CPF: 047.085.241-02 (APELANTE), DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA - CPF: 044.547.531-56 (APELANTE), LEANDRO PERES DIAS NUNES - CPF: 053.612.181-89 (ADVOGADO), LUCAS ROGANTE CAVALCANTE - CPF: 052.655.181-00 (APELANTE), JOAO CARLOS MULLER - CPF: 057.381.431-75 (APELANTE), JULIA FERNANDA SANTOS DE CARVALHO - CPF: 035.845.061-66 (ADVOGADO), SELSO LOPES DE CARVALHO - CPF: 358.723.060-91 (ADVOGADO), DANILO OLIVEIRA DA SILVA - CPF: 052.269.751-80 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MARIA JULIANA BARBOSA DE OLIVEIRA MATOS - CPF: 857.531.571-49 (TERCEIRO INTERESSADO), MARIA PAULA OLIVEIRA DE SOUZA - CPF: 064.660.512-77 (TERCEIRO INTERESSADO), EVANDRO ROSA DOS SANTOS - CPF: 828.220.341-68 (TERCEIRO INTERESSADO), SAÚDE PÚBLICA (VÍTIMA), CLAUDENICE FERREIRA MEDRADO RODRIGUES - CPF: 979.043.331-04 (ASSISTENTE), LIA IRENE MONTEIRO - CPF: 770.885.571-34 (ASSISTENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), ODIL CAMPOS DA SILVA - CPF: 038.096.521-64 (TERCEIRO INTERESSADO), LUIZ CARLOS PEREIRA DIAS - CPF: 055.923.341-84 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, REJEITOU AS PRELIMINARES ARGUIDAS, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO DO RÉU JOÃO CARLOS MÜLLER, COM EXTENSÃO DE OFÍCIO DOS RESPECTIVOS EFEITOS, E DESPROVEU OS RECURSOS DOS DEMAIS RÉUS. E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. TRÁFICO DE DROGAS ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. COMPETÊNCIA DA 7.ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ. VALIDADE DOS DADOS EXTRAÍDOS DOS CELULARES APREENDIDOS. ILICITUDE DECORRENTE DA QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA NÃO CONSTATADA. PRELIMINARES REJEITADAS. MÉRITO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM NA CONDENAÇÃO SIMULTÂNEA PELOS CRIMES DO ART. 2.º DA LEI N.º 12.850/2013 E ART. 35 DA LEI N.º 11.343/2006. CONTEXTOS FÁTICOS E SUBJETIVOS DISTINTOS. PRESENÇA DE DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. CONDENAÇÕES MANTIDAS. PENAS-BASE RETIFICADAS. RECURSOS DE OITO APELANTES DESPROVIDOS. RECURSO DE UM APELANTE PARCIALMENTE PROVIDO, COM EXTENSÃO DE PROVIDÊNCIA EX OFFICIO. I. Caso em exame 1. Recurso de apelação criminal interposto por 9 réus contra sentença proferida pela 7.ª Vara Criminal de Cuiabá/MT, que os condenou por delitos de organização criminosa, tráfico de drogas e associação para o tráfico. II. Questão em discussão 2. As questões em discussão consistem em: (i) verificar se o Juízo Especializado da Capital possuía competência para julgar o feito, a despeito de os crimes terem ocorrido no interior do Estado; (ii) examinar se os dados extraídos dos celulares apreendidos constituem prova ilícita, em decorrência da alegada quebra da cadeia de custódia; (iii) aferir se as provas são suficientes para manter as condenações; (iv) avaliar se houve bis in idem nas condenações simultâneas pelos delitos de organização criminosa e associação para o tráfico; (v) analisar a idoneidade dos fundamentos aventados para exasperar as penas-base. III. Razões de decidir 3. Por força do Provimento n.º 004/2008/CM e da Resolução n.º 11/2017/TP, expedidos por este Tribunal de Justiça dentro da sua prerrogativa de auto-organização, compete ao Juízo da 7.ª Vara Criminal Especializada da Comarca de Cuiabá/MT processar e julgar infrações penais envolvendo organizações criminosas, com jurisdição em todo o território estadual, de modo que inexiste ilegalidade ou inconstitucionalidade na tramitação de persecução penal deflagrada inicialmente no interior do Estado e, depois, remetida para o Juízo Especializado, que prevalece sobre os demais. 4. A alegação de quebra de cadeia de custódia não traz consigo qualquer elemento concreto que permita vislumbrar eventual interferência externa no iter probatório que comprometa a idoneidade dos dados extraídos dos aparelhos celulares. Deste modo, a arguição de nulidade, por si só, não se mostra suficiente para ensejar o reconhecimento de mácula, máxime considerando que, in casu, a fidedignidade do conteúdo digital restou confirmada pelos proprietários dos aparelhos celulares que confessaram a prática delitiva. 5. Os depoimentos prestados em juízo pelos policiais, corroborados que estão pelas confissões parciais de alguns dos apelantes e pelos dados extraídos dos celulares apreendidos, atestam que os réus se agremiaram de forma estruturalmente ordenada e com divisão funcional de tarefas ao “Comando Vermelho”, visando objetivo comum de obter vantagem mediante a prática de infrações penais graves, assim como se associaram entre si para o tráfico de drogas e concorreram para difundir entorpecentes ilícitos na cidade de Água Boa/MT, impondo-se assim ratificar as condenações pelos crimes do art. 2.º da Lei n.º 12.850/2013 e art. 33 e 35, ambos da Lei n.º 11.343/2006. 6. Não há bis in idem na condenação simultânea dos apelantes pelos crimes de organização criminosa e de associação para o tráfico de drogas, diante da pluralidade de vínculos associativos, em diferentes conjunturas, já que, na hipótese, as provas permitem discernir nitidamente a autonomia dos desígnios e os contextos fáticos imiscíveis que envolviam as condutas dos recorrentes. 7. Uma vez evidenciado que os fundamentos aventados na sentença para avaliar negativamente as consequências do crime de tráfico e a conduta social dos réus confundem-se demasiadamente com as próprias elementares dos delitos pelos quais já estão sendo condenados, é de rigor neutralizar tais circunstâncias judiciais, para evitar o bis in idem. IV. Dispositivo e tese 7. Recursos de oito apelantes desprovidos e recurso de um apelante parcialmente provido, com extensão de providência ex officio (art. 580, CPP). Teses de julgamento: “1. Compete ao Juízo da 7.ª Vara Criminal Especializada da Comarca de Cuiabá/MT processar e julgar infrações penais envolvendo organizações criminosas, com jurisdição em todo o território estadual. 2. Inexistindo elemento concreto a indicar que houve interferência externa capaz de comprometer as provas digitais legalmente extraídas dos celulares apreendidos, não há o que se falar em nulidade por ilicitude probatória de tais elementos, em decorrência da quebra da cadeia de custódia. 3.Os depoimentos dos policiais, somadas às confissões parciais e à vasta gama de dados extraídos dos celulares apreendidos, formam arcabouço probatório suficiente para manutenção da sentença condenatória. 4. Não há bis in idem na condenação simultânea do acusado pelos delitos de organização criminosa e de associação para o tráfico de drogas, diante da pluralidade de vínculos associativos, em diferentes contextos fáticos, com desígnios autônomos. 5. Devem ser neutralizadas circunstâncias judiciais avaliadas negativamente mediante fundamentação inidônea” Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5.º, LIII; CPP, arts. 69, 70 e 83, art. 158-A e ss.; Lei n.º 12.850/2013, art. 2.º; Lei n.º 11.343/2006, arts. 33 e 35. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no RHC n. 195.895/RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. em 2/9/2024; AgRg no HC n. 752.444/SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. em 4/10/2022, AgRg nos EDcl no HC n. 788.543/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. em 9/10/2023; TJMT, N.U 1011443-50.2022.8.11.0042, Primeira Câmara Criminal, j. em 20/08/2024. R E L A T Ó R I O APELANTE(S): LUCAS ROGANTE CAVALCANTE APELANTE(S): DANILO OLIVEIRA DA SILVA APELANTE(S): ARISNALDO DA SILVA GOMES APELANTE(S): PEDRO HENRIQUE CABRAL SILVA APELANTE(S): SANDERLEI FERREIRA DA COSTA APELANTE(S): EDIMILSON SILVA DE JESUS APELANTE(S): JOÃO CARLOS MULLER APELANTE(S): DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA APELANTE(S): BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES APELADO(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de apelação criminal interposto pelos apelantes identificados em epígrafe contra a r. sentença proferida pelo d. Juízo da Sétima Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT na ação penal n.º 1013019-78.2022.8.11.0042 (“Operação Arcabouço”), que os condenou nos seguintes termos: 1. LUCAS ROGANTE CAVALCANTE, vulgo “Manda Chuva” ou “Predileto”: foi sancionado com pena de 07 (sete) anos, 02 (dois) meses e 27 (vinte e sete) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, mais pagamento de 832 (oitocentos e trinta e dois) dias-multa, unitariamente arbitrados na mínima fração legal, pela prática dos delitos de organização criminosa e associação para o tráfico de drogas, em concurso material (art. 2.º, caput, da Lei n.º 12.850/2013 e art. 35 da Lei n.º 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal); 2. DANILO OLIVEIRA DA SILVA, vulgo “Guerreiro”: foi sancionado com pena de 04 (quatro) anos e 03 (três) meses de reclusão, no regime inicial semiaberto, mais pagamento de 98 (noventa e oito) dias-multa, unitariamente arbitrados na mínima fração legal, pela prática do delito de organização criminosa (art. 2.º, caput, da Lei n.º 12.850/2013); 3. ARISNALDO DA SILVA GOMES, vulgo “Naldo”: foi sancionado com pena de 14 (quatorze) anos, 11 (onze) meses e 12 (doze) dias de reclusão, no regime inicial fechado, mais pagamento de 1.548 (um mil, quinhentos e quarenta e oito) dias-multa, unitariamente arbitrados na mínima fração legal, pela prática dos delitos de organização criminosa, tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas, em concurso material (art. 2.º, caput, da Lei n.º 12.850/2013, art. 33 e art. 35, ambos da Lei n.º 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal); 4. PEDRO HENRIQUE CABRAL SILVA: foi sancionado com pena de 14 (quatorze) anos, 11 (onze) meses e 12 (doze) dias de reclusão, no regime inicial fechado, mais pagamento de 1.548 (um mil, quinhentos e quarenta e oito) dias-multa, unitariamente arbitrados na mínima fração legal, pela prática dos delitos de organização criminosa, tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas, em concurso material (art. 2.º, caput, da Lei n.º 12.850/2013, art. 33 e art. 35, ambos da Lei n.º 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal); 5. SANDERLEI FERREIRA DA COSTA: foi sancionado com pena de 14 (quatorze) anos, 11 (onze) meses e 12 (doze) dias de reclusão, no regime inicial fechado, mais pagamento de 1.548 (um mil, quinhentos e quarenta e oito) dias-multa, unitariamente arbitrados na mínima fração legal, pela prática dos delitos de organização criminosa, tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas, em concurso material (art. 2.º, caput, da Lei n.º 12.850/2013, art. 33 e art. 35, ambos da Lei n.º 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal); 6. EDIMILSON SILVA DE JESUS, vulgo “Papo Reto” ou “Jericó”: foi sancionado com pena de 18 (dezoito) anos, 07 (sete) meses e 12 (doze) dias de reclusão, no regime inicial fechado, mais pagamento de 1.856 (um mil, oitocentos e cinquenta e seis) dias-multa, unitariamente arbitrados na mínima fração legal, pela prática dos delitos de organização criminosa, tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas, em concurso material (art. 2.º, caput, da Lei n.º 12.850/2013, art. 33 e art. 35, ambos da Lei n.º 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal); 7. JOÃO CARLOS MULLER, vulgo “Pepa”: foi sancionado com pena de 14 (quatorze) anos, 02 (dois) meses e 27 (vinte e sete) dias de reclusão, no regime inicial fechado, mais pagamento de 1.532 (um mil, quinhentos e trinta e dois) dias-multa, unitariamente arbitrados na mínima fração legal, pela prática dos delitos de organização criminosa, tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas, em concurso material (art. 2.º, caput, da Lei n.º 12.850/2013, art. 33 e art. 35, ambos da Lei n.º 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal); 8. DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA, vulgo “Mensageiro”: foi sancionado com pena de 17 (dezessete) anos, 09 (nove) meses e 12 (doze) dias de reclusão, no regime inicial fechado, mais pagamento de 1.798 (um mil, setecentos e noventa e oito) dias-multa, unitariamente arbitrados na mínima fração legal, pela prática dos delitos de organização criminosa, tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas, em concurso material (art. 2.º, caput, da Lei n.º 12.850/2013, art. 33 e art. 35, ambos da Lei n.º 11.343/2006, na forma do art. 69 do Código Penal); 9. BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES, vulgo “RJ”: foi sancionado com pena de 18 (dezoito) anos, 07 (sete) meses e 12 (doze) dias de reclusão, no regime inicial fechado, e 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de detenção, mais pagamento de 1.924 (um mil, novecentos e vinte e quatro) dias-multa, unitariamente arbitrados na mínima fração legal, pela prática dos delitos de organização criminosa agravada, tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas e posse irregular de arma de fogo de uso permitido, em concurso material (art. 2.º, §3.º, da Lei n.º 12.850/2013, art. 33 e art. 35, ambos da Lei n.º 11.343/2006 e art. 12 da Lei n.º 10.826/2003, na forma do art. 69 do Código Penal). Nas razões recursais conjuntamente apresentadas no ID 227285734, por intermédio da Defensoria Pública Estadual, LUCAS, DANILO, ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI e EDIMILSON suscitam, preliminarmente, arguições de inconstitucionalidade e de ilegalidade parciais da norma administrativa constante da Resolução n.º 11/2017 do Tribunal Pleno do TJMT, no específico ponto em que atribui à Sétima Vara Criminal da Capital a competência para processar e julgar crimes praticados por organização criminosa “com jurisdição em todo o Estado”, por ofensa ao art. 5.º, LIII, e art. 22, I, ambos da CF e ao art. 69, I, a art. 83, todos do CPP, tudo com o subsequente pedido de remessa dos autos ao juízo competente, situado na Comarca de Água Boa/MT, onde os delitos teriam se consumado. Alternativamente, caso afastada a preliminar anterior, postulam o reconhecimento da nulidade de todos os atos processuais realizados pela autoridade judiciária de Água Boa/MT, por se tratar de juízo sabidamente incompetente, afastando-se a teoria do juízo aparente. Outrossim, ainda em sede preliminar, os referidos apelantes arguem nulidade, por ilicitude probatória, dos dados extraídos dos celulares apreendidos e demais elementos deles derivados, alegando a ocorrência de quebra da cadeia de custódia. No mérito, os apelantes formulam pedido de absolvição dos delitos de organização criminosa e de associação para o tráfico de drogas, com fulcro no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, ao que SANDERLEI, PEDRO, ARISNALDO e EDIMIILSON acrescentam ainda os pedidos cumulativos de absolvição do delito de narcotráfico, por falta de provas, ou de desclassificação da conduta para posse de drogas para consumo pessoal. Subsidiariamente, todos almejam a absolvição do crime organizado, com arrimo na tese de bis in idem entre esta infração penal e o delito de associação para o tráfico de drogas, que deveria prevalecer, ex vi do princípio da especialidade. Já nas razões recursais disponíveis no ID 227285782, mediante o patrocínio de advogado constituído, DOUGLAS busca a absolvição dos crimes de tráfico de drogas e de associação para o narcotráfico, com esteio no princípio in dubio pro reo, pois as provas produzidas em juízo não seriam suficientes para respaldar a prolação do édito condenatório. Por sua vez, nas razões recursais vistas no ID 227285790, também por intermédio de advogado particular, BRUNO vindica a absolvição do delito de associação para o tráfico de drogas, sob pena de se incorrer em bis in idem com a organização criminosa, ao que agrega o pleito cumulativo de reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, no que tange ao crime de tráfico. Enfim, através de patrono constituído, nas razões recursais acostadas no ID 227285794, JOÃO CARLOS levanta questão preliminar consistente na nulidade dos dados extraídos do seu aparelho celular, por quebra da cadeia de custódia, pois a coleta das provas digitais não teria seguido o devido procedimento voltado a assegurar a integridade do seu conteúdo; tudo a ensejar, como consequência do desentranhamento de tais provas, a absolvição do réu, por insuficiência probatória. No mérito, o aludido recorrente roga a absolvição dos crimes de associação para o tráfico de drogas e de organização criminosa, por falta de provas quanto ao seu vínculo associativo permanente e estável, e, subsidiariamente, pede que seja mantida apenas condenação pela segunda infração, afastando-se o concurso material entre elas, para não incorrer em dupla punição pelo mesmo fato (bis in idem); postulando ainda a fixação das penas no patamar mínimo legal, tendo em vista seus predicados pessoais favoráveis, como a primariedade e exercício de trabalho lícito. Em contrarrazões registradas no ID 227285802, o Ministério Público rechaça as pretensões defensivas e requer seja negado provimento aos apelos. Instada a se manifestar, a i. Procuradoria-Geral de Justiça, por meio do parecer encartado no ID 253454686, opina pela rejeição das preliminares e, no mérito, recomenda o desprovimento dos recursos. É o relatório. À douta Revisão. V O T O R E L A T O R V O T O (PRELIMINAR DE NULIDADE ARGUIDA PELA DEFESA – ALEGADA A INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO SENTENCIANTE) EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR) Egrégia Câmara: Os recursos em apreço são tempestivos, foram interpostos por quem tinha interesse e legitimidade para fazê-lo, e os meios de impugnação empregados afiguram-se necessários e adequados para se atingirem as finalidades colimadas, motivos pelos quais, estando presentes os seus requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, CONHEÇO dos apelos manejados pelos réus. Todavia, antes de adentrar no mérito das insurgências, tem-se que os apelantes LUCAS, DANILO, ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI e EDIMILSON suscitam, preliminarmente, arguições de inconstitucionalidade e de ilegalidade parciais da Resolução n.º 11/2017 do Tribunal Pleno do TJMT, por ofensa, respectivamente, ao art. 5.º, LIII, e art. 22, I, ambos da CF e ao art. 69, I, e art. 70, ambos do CPP, no específico ponto em que aquela norma administrativa confere à Sétima Vara Criminal de Cuiabá/MT a competência para processar e julgar crimes praticados por organização criminosa “com jurisdição em todo o Estado”, argumentando que apenas a União poderia legislar em matéria processual, ao passo que a lei federal (CPP) determina que competência seja firmada pelo local da infração, de modo que o Juízo Especializado desta Capital, que sentenciou o feito, seria incompetente para tanto. Com arrimo nestes argumentos, os apelantes requerem o reconhecimento da nulidade, com a subsequente remessa dos autos à Vara Criminal da Comarca de Água Boa/MT, cidade onde as infrações penais teriam se consumado, para que o juízo daquela unidade judiciária julgue o processo, inclusive por se tratar do juízo prevento, nos termos do art. 83 do CPP. Alternativamente, caso rechaçada a preliminar arguida, os recorrentes postulam o reconhecimento da nulidade de todos os atos processuais praticados pela autoridade judiciária de Água Boa/MT, notadamente do conteúdo resultante da extração dos dados dos celulares apreendidos, por ela autorizada, alegando que o juízo em questão era sabidamente incompetente à época em que deferiu a cautelar, o que afastaria a teoria do juízo aparente. Em que pesem os judiciosos argumentos da d. defesa, a preliminar não comporta acolhimento. Com efeito, extrai-se dos autos que o Juízo da Vara Criminal da Comarca de Água Boa/MT foi o responsável por inicialmente exercer jurisdição cautelar no feito, tendo, por exemplo, convertido a prisão em flagrante de alguns dos suspeitos em prisão preventiva e decretado a quebra do sigilo dos dados armazenados nos aparelhos celulares apreendidos, tudo no bojo do Incidente n.º 1001745-83.2022.8.11.0021, em 08/07/2022 (ID 227284658 - Pág. 146/149). No entanto, posteriormente, tendo em vista se tratar de processo-crime voltado a apurar, dentre outros, a suposta prática do delito de organização criminosa, após requerimento do Ministério Público com atribuições na comarca interiorana (ID 227284658 - Pág. 180), o referido juízo declinou da competência para processar e julgar o feito, em 15/08/2022, e determinou a remessa dos autos ao Juízo da 7.ª Vara Criminal de Cuiabá (ID 227284658 - Pág. 181/183). Desta feita, com o término do procedimento de inquérito, o órgão do Parquet com atribuições perante a Sétima Vara Criminal de Cuiabá (GAECO) ofertou denúncia em desfavor dos apelantes, em 29/09/2022 (ID 227284275), a qual foi recebida em 03/10/2022 pelo aludido Juízo Especializado desta Capital (ID 227284284), o qual determinou a citação dos réus, processou o feito e, ao cabo da instrução, sentenciou a lide. Nesse cenário, ao contrário do que sugere a i. defesa, inexiste qualquer ilegalidade na providência adotada na instância de origem, pois este Sodalício estadual já se manifestou, em reiteradas oportunidades, tanto por meio de suas Câmaras Criminais Isoladas quanto por meio da Turma de Câmaras Criminais Reunidas, que é competente a Sétima Vara Criminal da Capital para processar e julgar a ação penal em que se apura suposta prática do crime de organização criminosa, ainda que cometido no interior do Estado. Nesse sentido: “É competente a 7ª Vara Criminal de Cuiabá para processar e julgar a ação penal em que se apura suposta prática do crime de organização criminosa cometido na Comarca de Cáceres, por força do que dispõe a Resolução n. 11/2017, do Tribunal Pleno. Precedentes desta Corte e do STJ”. (N.U 1006902-03.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 07/06/2022, Publicado no DJE 15/06/2022) – Negritei. “Por força do Provimento n.º 004/2008/CM e da Resolução n.º 11/2017/TP, expedidos por este Tribunal de Justiça dentro da sua prerrogativa de auto-organização, compete ao Juízo da 7.ª Vara Criminal Especializada da Comarca de Cuiabá/MT processar e julgar infrações envolvendo organizações criminosas, com jurisdição em todo o território estadual.” (N.U 1012395-92.2021.8.11.0000, CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS, GILBERTO GIRALDELLI, Turma de Câmaras Criminais Reunidas, Julgado em 07/10/2021, Publicado no DJE 20/10/2021) – Destaquei. Ademais, embora a competência territorial em razão da matéria seja relativa e admita a prorrogação do juízo, tampouco há ilegalidade na tramitação de persecução penal deflagrada inicialmente no interior do Estado e, depois, remetida para o Juízo da 7.ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT, já que este é especializado quanto à matéria, e prevalece sobre os demais juízos, conforme já decidiu anteriormente esta c. Terceira Câmara Criminal: “HABEAS CORPUS – DELITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – COMPETÊNCIA DE JUÍZO DO INTERIOR DO ESTADO DECLINADA PARA A 7ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ – ALEGAÇÃO DE QUE A COMPETÊNCIA DA 7ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ NÃO ABRANGE AS COMARCAS DO INTERIOR – IMPROCEDÊNCIA – COMPETÊNCIA ESTADUAL ESTABELECIDA PELA RESOLUÇÃO N. 11/2017, DO TRIBUNAL PLENO – MATÉRIA DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA QUE NÃO ESTÁ RESTRITA AO CAMPO DE INCIDÊNCIA EXCLUSIVA DA LEI – PRECEDENTES – ORDEM DENEGADA EM CONSONÂNCIA COM O PARECER DA PGJ. (...). - Nesse contexto, não há ilegalidade na tramitação de ação penal deflagrada inicialmente no interior e, depois, remetida para o Juízo da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá-MT, já que este é especializado quanto à matéria, e prevalece sobre os demais juízos, conforme regulamentação administrativa do tribunal”. (N.U 1018752-88.2021.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RONDON BASSIL DOWER FILHO, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 17/11/2021, Publicado no DJE 19/11/2022) – Destaquei. Em relação às arguições de inconstitucionalidade e de ilegalidade da norma administrativa, por violação aos dispositivos constitucionais que reservam à União a prerrogativa de legislar sobre matéria processual e por ofensa aos dispositivos legais que firmam a competência pelo lugar da infração, entendo que estas tampouco devam prosperar. Deveras, o Superior Tribunal de Justiça já reconheceu a legitimidade do TJMT para adotar medidas desse jaez, firmando, inclusive, a competência da 7.ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT para apurar, conhecer e julgar crimes de organização criminosa ocorridos no interior do Estado, consoante se extrai dos seguintes precedentes: “I - A jurisprudência desta eg. Corte, alinhando-se ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, é a de autorização para que Tribunais locais procedam à especialização de Varas para o processamento de feitos restritos por matéria. Assim, apesar de terem sido cometidos os delitos na Comarca de Rondonópolis, o julgamento perante a Vara Especializada contra o Crime Organizado, os Crimes contra a Ordem Tributária e Econômica e os Crimes contra a Administração Pública se mostra acertado porquanto prevalece o Juízo especializado em razão da matéria. Precedentes. (...)”.(AgRg no REsp n. 1.611.615/MT, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 10/4/2018, DJe de 16/4/2018) – Grifei. “1. O Supremo Tribunal Federal, ao interpretrar o artigo 96, inciso I, alíneas ‘a’ e ‘d’, e inciso II, alínea ‘d’, da Constituição Federal, firmou o entendimento de que o Poder Judiciário pode dispor sobre a especialização de varas, pois se trata de matéria que se insere no âmbito da organização Judiciária dos Tribunais. Precedentes. 2. Não há qualquer ilegalidade na tramitação, quer do procedimento investigatório, quer da ação penal deflagrados contra os pacientes, perante a Vara Especializada contra o Crime Organizado, Crimes contra a Ordem Econômica e Crimes contra a Administração Pública da comarca de Cuiabá, pois embora os ilícitos a eles assestados tenham supostamente ocorrido em Paranatinga/MT e Campo Novo/MT, o referido Juízo, por ser especializado quanto à matéria, prevalece sobre os demais”. (HC n. 237.956/MT, relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 5/6/2014, DJe de 12/6/2014) – Grifei. “2. No caso concreto, são apurados delitos de corrupção ativa, fraudes à licitação, lavagem de dinheiro e de suposta organização criminosa, que dispõe de vara especializada criada pela Resolução n. 11/2017 no âmbito do Poder Judiciário do Estado do Mato Grosso, o que, de acordo com o entendimento desta Corte Superior de Justiça é autorizado pelo art. 96, inc. I, ‘a’, da Constituição Federal e, pelo art. 74 do Código de Processo Penal - CPP, pois trata-se de matéria que se insere no âmbito da organização judiciária dos Tribunais. 3. (...)”. (AgRg no RHC n. 154.203/MT, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 20/3/2023, DJe de 24/3/2023) – Destaquei. Também assim já se manifestou o Supremo Tribunal Federal: “(...) II. Não há violação aos princípios constitucionais da legalidade, do juiz natural e do devido processo legal, visto que a leitura interpretativa do art. 96, I, a , da Constituição Federal admite que haja alteração da competência dos órgãos do Poder Judiciário por deliberação dos Tribunais. Precedentes. III. A especialização de varas consiste em alteração de competência territorial em razão da matéria, e não alteração de competência material, regida pelo art. 22 da Constituição Federal. IV. Ordem denegada”. (STF - HC: 113018 RS, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 29/10/2013, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-225 DIVULG 13-11-2013 PUBLIC 14-11-2013) – Grifei. “Atribuição, à Vara especializada, de competência territorial que abrange todo o território do Estado-membro. Suscitação de ofensa ao princípio da territorialidade. Improcedência. Matéria inserida na discricionariedade do legislador estadual para tratar de organização judiciária. (...). 1. Os delitos cometidos por organizações criminosas podem submeter-se ao juízo especializado criado por lei estadual, porquanto o tema é de organização judiciária, prevista em lei editada no âmbito da competência dos Estados-membros (art. 125 da CRFB). Precedentes. (...). 10. O princípio do juiz natural não resta violado na hipótese em que Lei estadual atribui a Vara especializada competência territorial abrangente de todo o território da unidade federada, com fundamento no art. 125 da Constituição, porquanto o tema gravita em torno da organização judiciária, inexistindo afronta aos princípios da territorialidade e do Juiz natural”. (STF - ADI: 4414 AL, Relator: LUIZ FUX, Data de Julgamento: 31/05/2012, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 17/06/2013) – Destaquei. Ademais, conquanto a i. defesa entenda que os apelantes foram prejudicados pela tramitação do processo na Sétima Vara Criminal da Capital, urge destacar que a especialização das Varas possui como móvel precípuo garantir a otimização e a eficiência na instrução e condução dos feitos que apurem delitos de determinada natureza, materializando os princípios da celeridade e economia processuais, assim como a viabilização de um mais especializado e técnico provimento jurisdicional às partes integrantes da lide e interessadas na celeuma, seja por facilitar o acesso ao Judiciário, seja por ofertar maiores oportunidades de defesa. Deste modo, a meu ver, a instrução e o sentenciamento do feito pelo d. Juízo Especializado contra o Crime Organizado de Cuiabá, em detrimento do d. Juízo da Vara Criminal da Comarca de Água Boa/MT, não acarretou qualquer prejuízo aos recorrentes. Em outra vertente, a i. defesa sustenta que, caso rechaçada a presente preliminar e reconhecida a competência do juízo sentenciante, isto é, da Sétima Vara Criminal Especializada de Cuiabá, seria de rigor reconhecer a nulidade, por ilicitude probatória, dos dados extraídos dos celulares apreendidos, pois tal medida foi deferida pelo Juízo Criminal de Água Boa/MT, que seria sabidamente incompetente. Sem razão. Não obstante a extração dos dados dos celulares apreendidos tenha sido decretada pelo Juízo Criminal de Água Boa, o qual posteriormente declarou-se incompetente, o declínio da competência de um juízo para o outro não implica necessariamente na nulidade dos atos processuais já aperfeiçoados, os quais, ainda que porventura praticados por juízo incompetente, podem ser ratificados pelo julgador dotado de competência para tanto, assim como ocorreu na hipótese (ID 227284347 - Pág. 78). É o que preceitua o art. 108, § 1.º, do Código de Processo Penal, segundo o qual, se “(...) for aceita a declinatória, o feito será remetido ao juízo competente, onde, ratificados os atos anteriores, o processo prosseguirá”. – Negritei. A propósito, impõe-se alinhavar também que, mesmo nos casos de incompetência absoluta do juízo que decretou as medidas cautelares iniciais, não há nulidade ipso facto do conteúdo probatório delas decorrentes, a teor do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que “constatada a incompetência absoluta, os autos devem ser remetidos ao juízo competente, que pode ratificar ou não os atos já praticados”. (HC 308.589/RJ, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 01/09/2016) – Grifei. Por fim, a despeito de indicativos ab initio de que o presente caso possivelmente envolveria organização criminosa, não há como negar que apenas com a evolução das investigações, é que foram desvelados indícios mais contundentes e plausíveis de pertencimento dos suspeitos à facção “Comando Vermelho”, de modo que, a despeito do entendimento diverso da d. defesa, é plenamente aplicável ao caso a teoria do juízo aparente. É o que se infere, aliás, do relatório de inteligência policial contendo a análise do primeiro aparelho telefônico examinado, in verbis: “(...). Durante a análise dos dados do referido aparelho se pôde comprovar não só o envolvimento do suspeito com o tráfico de drogas, mas que, além disso, este faz parte de uma engrenagem criminosa com cargos e funções bem definidas cuja posição de liderança é atualmente exercida por três lideranças com nomes ainda não identificados. A presente investigação revela a estrutura da organização criminosa Comando Vermelho, atualmente em operação na cidade de Água Boa/MT. (...)”. (Trechos do Relatório de Investigação n.º 2022.13.61049 no ID 227283268 - Pág. 1). Portanto, é evidente a legalidade da convalidação pelo juízo competente dos atos praticados pelo magistrado anterior e, por conseguinte, a licitude das provas decorrentes de tais atos processuais. Nesse sentido: “2. É cediço que o princípio do juiz natural deve ser examinado com cautela na fase investigativa, sobremaneira no curso de investigações complexas em que não se mostram integralmente definidos, de plano, as imputações, os agentes envolvidos e a competência. Deste modo, é possível a ratificação de medidas cautelares autorizadas por Juízo que, em momento posterior, fora declarado incompetente. Vale frisar que, mesmo nos casos de incompetência absoluta, se admite a ratificação dos atos decisórios”. (AgRg no AREsp n. 2.295.067/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 8/8/2023, DJe de 14/8/2023) – Destaquei. Com tais considerações, REJEITO a preliminar arguida. É como voto. V O T O (PRELIMINAR DE NULIDADE ARGUIDA PELA DEFESA – ALEGADA A ILICITUDE PROBATÓRIA DOS DADOS EXTRAÍDOS DOS CELULARES, POR QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA) EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR) Egrégia Câmara: Ainda em sede preliminar, os apelantes LUCAS, DANILO, ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI, EDIMILSON e JOÃO CARLOS suscitam a nulidade, por ilicitude probatória, dos dados extraídos dos telefones celulares apreendidos, sob o argumento de que a coleta de seu conteúdo se deu manualmente pelos investigadores e não por meio de software de “espelhamento” de aparelhos eletrônicos, de modo que não foi seguido o procedimento voltado a assegurar a integridade e idoneidade probatória, em inobservância ao art. 158-A e ss. do CPP e violação à cadeia de custódia, tudo a ensejar, na intelecção defensiva, a inadmissibilidade e desentranhamento dos autos das referidas provas digitais e demais elementos delas derivados, ex vi do art. 157, §1.º, CPP. Com relação à chamada cadeia de custódia, importa esclarecer que o instituto foi formalmente introduzido no Código de Processo Penal brasileiro por meio da Lei n.º 13.964/2019 e consiste em um mecanismo garantidor da autenticidade das provas coletadas, funcionando como o procedimento de documentação formal destinado a manter e a detalhar a história cronológica de uma evidência, de modo a impedir possíveis interferências externas capazes de colocar em dúvida o resultado da atividade probatória e a assegurar o rastreamento do vestígio desde o local do crime até o Tribunal. Significa dizer que o desiderato precípuo do mecanismo reside em resguardar a história cronológica da prova (iter probatório) e em permitir o seu rastreamento retroativo até o momento de sua coleta. Sobre o tema, o e. Superior Tribunal de Justiça orienta que a matéria relacionada à quebra da cadeia de custódia não consubstancia uma nulidade processual em si, mas sim questão afeta à confiabilidade e eficácia da prova, a ser analisada casuisticamente, sem que se possa falar na ilicitude de que trata o art. 157 do CPP ou em necessidade de desentranhamento dos autos: “1. No caso, não é cabível o pretendido desentranhamento das provas colhidas no aparelho celular apreendido, por não se tratar de prova ilícita. Deveras, segundo a jurisprudência desse Superior Tribunal de Justiça, eventuais ‘irregularidades constantes da cadeia de custódia devem ser sopesadas pelo magistrado com todos os elementos produzidos na instrução, a fim de aferir se a prova é confiável’. (AgRg no HC n. 657.562/RS, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 30/9/2024, DJe de 2/10/2024) – Destaquei. “8. Prevalece nesta Corte a compreensão de que matéria relacionada à quebra da cadeia de custódia ‘[n]ão se trata [...] de nulidade processual, senão de uma questão relacionada à eficácia da prova, a ser vista em cada caso’ (...)”. (AgRg no HC n. 828.321/TO, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 25/9/2023, DJe de 28/9/2023) – Negritei. Não é outra a lição doutrinária de Renato Brasileiro de Lima, remetendo-se ao escólio de Douglas Fischer, in verbis: “É nesse sentido a lição de Douglas Fischer. Para o autor, eventual falha na observância de uma das etapas listadas nos incisos do art. 158-B do CPP não importará ‘automaticamente na inutilidade/invalidade do vestígio como elemento probatório para utilização no bojo de procedimento investigatório ou ação penal. Com efeito, a finalidade desse detalhamento procedimental é para conferir maior fidedignidade ao contexto geral da prova, mas não se apresenta como essencial à própria validade em si do elemento probatório, que será valorado ulteriormente pelo julgador. (...). Exemplificando, não é a ausência de eventual lacre retirado anteriormente dentro do novo recipiente que implicará a invalidade do vestígio coletado. Insiste-se: a recomendação legal é para dar maior garantia do procedimento. Mas sua falha, por si só, não atingirá a licitude e integridade do vestígio coletado e eventualmente já analisado’”. (LIMA, Renato Brasileiro de. – Pacote anticrime: comentários à lei nº 13.964/19 – artigo por artigo. – Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 257) – Destaquei. Ademais, para que se reconheça a ineficácia ou o menor valor de uma prova em razão da quebra da cadeia de custódia, não basta a simples alegação, desacompanhada de provas aptas a respaldá-la, de que houve a ruptura dos procedimentos a serem observados na manutenção e documentação da cronologia do vestígio (iter probatório). Mais que isso, deve ser demonstrado também que a suposta quebra realmente interferiu na higidez probatória ou no resultado de eventual perícia, corrompendo, adulterando ou contaminando o material periciado ou produzido e, por conseguinte, prejudicando alguma das partes ao modificar o conteúdo da prova colhida. Nesse sentido: “1. Para demonstrar a quebra da cadeia de custódia é imprescindível que seja demonstrado o risco concreto de que os vestígios coletados tenham sido adulterados. O Tribunal de origem expressamente afirmou não ter vislumbrado nenhuma evidência concreta de mácula às provas dos autos, inexistindo qualquer sustentação probatória na alegação da Defesa”. (AgRg no HC n. 825.126/SP, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do Tjsp), Sexta Turma, julgado em 9/9/2024, DJe de 11/9/2024) – Destaquei. Na presente hipótese, ao arguir a suposta quebra da cadeia de custódia dos dados extraídos dos celulares apreendidos, a i. defesa se limita a bradar que “foram os próprios policiais, sem formação na área da tecnologia, que extraíram de forma manual as informações do celular” e que, “mesmo existindo um sistema (‘Celebrate’) para isso, não foi utilizado”, de modo que “não houve observância do regramento dos arts. 158-A a 158-F do CPP, pois não é feito através de perito criminal”, razão pela qual não seria possível “acreditar que nenhum dado foi perdido ou alterado enquanto os celulares estiveram sob a custódia do Estado” (ID 227285734 - Pág. 24 e 26). Por outro lado, a i. defesa não indigita quais elementos concretos nos autos indicariam que os diálogos foram de fato adulterados ou corrompidos, sequer discrimina quais interações ou conversas possivelmente teriam sido alteradas e com base em quê, apresentando apenas alegação genérica de que os dados digitais em geral poderiam ter sido manipulados para incriminar os réus e que deveriam ter sido periciados. Por outro lado, como dito, a mera alegação de quebra da cadeia de custódia dos dados extraídos do celular, desprovidas de qualquer elemento hábil a atestar eventual interferência externa ou adulteração do substrato probatório, por si só, não basta para ensejar o reconhecimento de nulidade, máxime quando a coleta do conteúdo digital foi previamente deferida pela autoridade judiciária e os autos não trazem qualquer outro elemento que permita vislumbrar mácula que comprometa a idoneidade dos dados. É dizer, os apelantes não se desincumbiram do ônus de demonstrar que efetivamente houve interferência externa no iter probatório, menos ainda que a suposta interferência ocasionou adulteração no conteúdo da prova. Em situações semelhantes, o e. Superior Tribunal de Justiça não vislumbrou nulidade a ser sanada, conforme se infere dos seguintes precedentes: “3. A alegação de quebra de cadeia de custódia, apresentada de maneira conjunta com a tese de cerceamento de defesa, não traz elementos que permitam vislumbrar qualquer ocorrência que comprometa a idoneidade das provas, de maneira que os argumentos não se mostram suficientes para se concluir pela presença de qualquer mácula nas provas obtidas mediante o procedimento autorizado de interceptação telefônica”. (AgRg no RHC n. 195.895/RJ, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 2/9/2024, DJe de 4/9/2024) – Grifei. “V - No caso concreto, o procedimento de extração de dados não configurou nenhuma flagrante ilegalidade, nem mesmo sob o prisma procedimental da cadeia de custódia. Conforme expressamente consignado na sentença, a efetiva extração dos dados telemáticos somente se deu após a expedição da ordem judicial, apesar de os aparelhos terem sido apreendidos durante a prisão em flagrante e terem tido um relatório com fotografias de telas de celular desbloqueado confeccionado pela polícia. (...). VI - Nesse contexto, como já decidido por esta Corte Superior nos julgamentos precedentes (RHC n. 99.735/SC e RHC n. 143.169/RJ), não se pode confundir uma fotografia de tela de celular mostrando trechos de conversas de aplicativo de Whatsapp (este alterável apenas com o registro de ‘mensagem apagada’) com um print de tela de computador do programa/site Whatsapp Web, manipulável com a posse de senha (embora sempre passível de rastreamento sob uma perícia técnica). VII – (...). Assim, não se pode cogitar de qualquer circunstância concreta capaz de sugerir a adulteração da prova, nem mesmo de que tenha havido uma efetiva interferência indevida em seu caminho”. (AgRg no HC n. 829.138/RN, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 6/2/2024, DJe de 14/2/2024) – Negritei. “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXTORSÃO. NULIDADE DA PROVA. PRINTS DE MENSAGENS PELO WHATSAPP. QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA. NÃO VERIFICAÇÃO. AUSÊNCIA DE ADULTERAÇÃO DA PROVA OU DE ALTERAÇÃO DA ORDEM CRONOLÓGICA DAS CONVERSAS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. (...). 2. No presente caso, não foi verificada a ocorrência de quebra da cadeia de custódia, pois em nenhum momento foi demonstrado qualquer indício de adulteração da prova, ou de alteração da ordem cronológica da conversa de WhatsApp obtida através dos prints da tela do aparelho celular da vítima. 3. In casu, o magistrado singular afastou a ocorrência de quaisquer elementos que comprovassem a alteração dos prints, entendendo que mantiveram ‘uma sequência lógica temporal’, com continuidade da conversa, uma vez que ‘uma mensagem que aparece na parte de baixo de uma tela, aparece também na parte superior da tela seguinte, indicando que, portanto, não são trechos desconexos’. 4. O acusado, embora tenha alegado possuir contraprova, quando instado a apresentá-la, furtou-se de entregar o seu aparelho celular ou de exibir os prints que alegava terem sido adulterados, o que só reforça a legitimidade da prova. 5. ‘Não se verifica a alegada 'quebra da cadeia de custódia', pois nenhum elemento veio aos autos a demonstrar que houve adulteração da prova, alteração na ordem cronológica dos diálogos ou mesmo interferência de quem quer que seja, a ponto de invalidar a prova’. (...). 6. As capturas de tela não foram os únicos elementos probatórios a respaldar a condenação, que foi calcada também em outros elementos de prova, como o próprio interrogatório do acusado, comprovantes de depósito, além das palavras da vítima. 7. (...)”. (AgRg no HC n. 752.444/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 4/10/2022, DJe de 10/10/2022) – Destaquei. Além disso, os relatórios de inteligência policial contendo a análise dos dados extraídos dos celulares foram confeccionados por investigadores da Polícia Civil, no exercício de seu múnus público, tratando-se assim de documentação presumidamente autêntica e dotada de fé pública, que não pode ser desconstituída pela simples alegação não comprovada de quebra da cadeia de custódia. A propósito: “1. Nos termos da orientação desta Corte Superior, é despicienda a realização de perícia a fim de comprovar a fidedignidade das gravações, que são presumidamente autênticas, possuindo fé pública os agentes policiais envolvidos na operação. Tal entendimento independe da forma de transmissão das interceptações, se oriundos de gravações de áudio ou captação de mensagens de texto. Precedentes”. (AgRg no RHC n. 129.003/MT, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 13/10/2020, DJe de 20/10/2020) – Destaquei. “3. No caso, diante da coleta imediata do conteúdo probatório durante a busca e apreensão, autorizada por decisão judicial, não é possível afirmar que houve quebra da cadeia de custódia. Além disso, não se pode presumir eventual má-fé dos agentes públicos no manuseio das provas. Portanto, não houve a ilegalidade apontada”. (AgRg no AREsp n. 2.511.249/MG, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 15/10/2024, DJe de 17/10/2024) – Grifei. Mesmo porque, a legislação processual de regência não exige obrigatoriamente que a extração dos dados seja feita por peito oficial, conforme a jurisprudência do e. STJ: “3. Diferentemente do ocorrido no precedente citado pelos agravantes (RHC n. 143169-RJ), não há nenhum elemento demonstrativo de que que houve adulteração da prova ou de que houve alguma interferência na sua produção a ponto de invalidá-la. 4. Não existe obrigatoriedade de a extração de dados ser realizada por perito oficial. De fato, "[o] art. 158-C, [...], estabelece o perito oficial como sujeito preferencial a realizar a coleta dos vestígios’(...)”. (AgRg no HC n. 914.418/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 2/9/2024, DJe de 6/9/2024) – Grifei. Por oportuno, consigne-se que o julgamento do AgRg no RHC n. 195.895/RJ (5.ª Turma), do AgRg no AREsp n. 2.511.249/MG (6.ª Turma) e AgRg no HC n. 914.418 (5.ª Turma), são posteriores ao precedente invocado pela i. defesa do apelante JOÃO CARLOS em suas razões recursais (AgRg no HC n. 828.054/RN, j. em 23/4/2024, Informativo 811), a demonstrar que não procede o argumento de nulidade/ilicitude automáticas e que a análise da questão realmente deve sempre ser feita casuisticamente. In casu, ao ser ouvida em juízo, a testemunha Matheus Soares Augusto declarou que foi o delegado da Polícia Civil responsável por conduzir as apurações e explicitou que a extração e o exame dos dados dos celulares apreendidos se deram de forma idônea por parte dos investigadores, inclusive sob a supervisão direta do depoente (“eu mesmo, pessoalmente, auxiliei os investigadores na confecção desse relatório”), e que o dispositivo eletrônico do recorrente BRUNO foi mantido no “modo avião” durante a exploração, de forma que o trabalho investigativo se limitou a aferir o conteúdo do aparelho e interpretá-los, reduzindo a termo no relatório as respectivas conclusões. No mesmo sentido, a investigadora responsável pela análise do celular do recorrente SANDERLEI, Dheynny de Melo Carvalho, asseverou que, no exercício de seu múnus, limitou-se a transcrever nos relatórios as mensagens de texto e de áudio existentes no aparelho. Tais declarações judiciais coadunam com a realidade dos autos, pois, como já dito, inexiste qualquer demonstrativo no processo e nas próprias mídias coletadas (mensagens, vídeos e fotos angariados nos aparelhos telefônicos) que sequer sugira que as provas digitais tenham sido adulteradas, manipuladas de qualquer modo ou retiradas de contexto. Pelo contrário, o encadeamento dos diálogos é lógico e coeso. É também o que se infere dos Relatórios de Investigação n.º 2022.13.61049 e n.º 2022.13.62876, contendo a análise dos aparelhos celulares de BRUNO e JOÃO CARLOS, respectivamente, nos quais se lê que “todos os dados presentes, por exemplo, aplicativos, galeria de áudio, imagens e vídeos seguem em formato original, sem alteração ou atualização de datas, horários e ou qualquer acesso à internet a partir da data de sua apreensão”. (ID 227283268 - Pág. 3) e que “o celular durante todo o levantamento e investigação permaneceu em modo avião, sem acesso à internet, e foram mantidas e intactas as datas, horários e duração das conversas/diálogos e demais conteúdos presentes no aparelho”. (ID 227284246 - Pág. 3). Ademais, o réu parcialmente confesso BRUNO, proprietário de um dos quatro celulares apreendidos e analisados, quando interrogado em juízo, admitiu a autoria por vídeo achado em seu celular, assumindo que mandou tal vídeo no grupo virtual, e que trocava mensagens com outros denunciados, inclusive recebendo ordens de terceiros, a mando dos quais realizava cobranças via WhatsApp de pessoas que conhecia apenas pelos “vulgos”, tudo assumidamente em prol e por determinação do “Comando Vermelho”, o que confere verossimilhança ao conteúdo digital e tonifica a conclusão pela idoneidade das mídias. Em juízo, BRUNO confirmou também a fidedignidade das fotos extraídas de seu celular, embora negue a finalidade mercantil das drogas e a propriedade das armas ali retratadas, assim como ratificou a veracidade das listas de anotações com controle de pagamentos relacionados ao tráfico, achada em grupo do WhatsApp – não obstante refute ciência a respeito do que tais listas se tratavam –, assim como confirmou a autenticidade dos áudios que lhe foram enviados por um terceiro, se oferecendo para ser o novo fornecedor de drogas em Água Boa/MT. No mesmo sentido, ao confessar perante autoridade judiciária que faz parte do “Comando Vermelho” há dois anos e que vendeu drogas no interesse da facção, o proprietário do segundo aparelho celular explorado, JOÃO CARLOS, também deu a entender pela veracidade do conteúdo digital colhido no seu dispositivo eletrônico, ao declarar que “(...) nunca fui líder, mas eu faço parte da organização (...), eu tive que vender uma pequena quantidade, de três gramas, que é a foto que está no meu celular”; além de admitir que realmente pediu ao “CV-MT”, por mensagem de texto, para ser “desbrecado”. Se tudo isso não bastasse, a autoridade policial juntou aos autos filmagens de grande parte dos áudios originais enquanto eram reproduzidos, a corroborar a fidedignidade das transcrições reduzidas a termo nos relatórios de inteligência, conforme se vê nos arquivos de mídia denominados “Áudio 1.mp4” a “Áudio 12.mp4”, coligidos do ID 227284165 ao ID 227284176. Assim sendo, a despeito da irresignação defensiva, não me resta qualquer dúvida quanto à autenticidade das mídias, mensagens e demais dados angariados nos celulares apreendidos, máxime considerando a consonância do conteúdo digital com o restante das provas arrecadadas ao feito. Mesmo que assim não fosse, destaque-se que a atual jurisprudência das Cortes Superiores preconiza que, mesmo as nulidades denominadas absolutas, terão seu reconhecimento condicionado à demonstração de efetivo prejuízo acarretado à parte, sem o qual prevalecerá o princípio da instrumentalidade das formas (pas de nullité sans grief): “5. O reconhecimento de nulidades no curso do processo penal, sejam relativas ou absolutas, reclama uma efetiva demonstração do prejuízo à parte, sem a qual prevalecerá o princípio da instrumentalidade das formas positivado pelo art. 563 do CPP (pas de nullité sans grief)”. (AgRg no AREsp n. 2.521.340/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 26/11/2024, DJe de 3/12/2024) – Grifei. Na hipótese, as condenações não se embasam unicamente nas provas tidas por viciadas, especando-se também sobre outros elementos probatórios, a exemplo dos depoimentos prestados em juízo pelas testemunhas Wandervaney Soares da Silva, Dheynny de Melo Carvalho e Matheus Soares Augusto, consoante se exporá na análise do mérito, o que significa que não há, in casu, o prejuízo de que trata o art. 563 do CPP. Nesse sentido, mutatis mutandis: “3. Além disso, mesmo que assim não fosse, a condenação do acusado não se baseou única e exclusivamente nos dados extraídos do celular em questão, mas em uma série de outros elementos, devidamente acostados aos autos, não podendo falar em ilicitude por derivação das demais provas (‘Teoria da árvore envenenada’) e, muito menos, em nulidade absoluta do processo”. (AgRg no REsp 1853702/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, DJe 30/06/2020) – Destaquei. Por fim, especificamente com relação ao apelante JOÃO CARLOS MULLER, tem-se que este sequer arguiu tal questão preliminar em sua defesa prévia (ID 227284451) e tampouco em suas alegações finais (ID 227285681), vindo a suscitar a suposta nulidade apenas neste grau recursal, de modo que a matéria se encontra inclusive preclusa, no que lhe refere, conforme o entendimento jurisprudencial pátrio: “6. Na hipótese, a nulidade aqui trazida pela defesa não fora arguida na defesa prévia, na audiência de instrução realizada posteriormente e nem tampouco nas alegações finais, sendo suscitada apenas quando do recurso de apelação, o que evidencia a preclusão da alegação”. (HC n. 833.084/GO, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 10/12/2024, DJEN de 16/12/2024) – Destaquei. Com tais considerações, REJEITO a preliminar arguida. É como voto. V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR) Egrégia Câmara: Extrai-se da denúncia que, em data indeterminada, mas sabidamente até o mês de setembro de 2022, na Comarca de Água Boa/MT, os apelantes BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES, vulgo “RJ”, LUCAS ROGANTE CAVALCANTE, vulgo “Manda Chuva” ou “Predileto”, JOÃO CARLOS MULLER, vulgo “Pepa”, SANDERLEI FERREIRA DA COSTA, DANILO OLIVEIRA DA SILA, vulgo “Guerreiro”, PEDRO HENRIQUE CABRAL SILVA, ARISNALDO DA SILVA GOMES, vulgo “Naldo”, DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA, vulgo “Mensageiro”, e EDIMILSON SILVA DE JESUS, vulgo “Papo Reto” ou “Jericó”, juntamente com os codenunciados Odil Campos da Silva, Luiz Carlos Pereira Dias, Rodrigo Rosa de Oliveira, Carlos Alexandre Paulo Dias, vulgo “Ezequiel” ou “Carlinhos”, e André Paulo Dias, vulgo “Kawai”, promoveram, constituíram, integraram e ajudaram a financiar, pessoalmente, a organização criminosa “Comando Vermelho”, atuante em Água Boa/MT (FATO 01). Ressai da exordial acusatória que, entre os meses de julho e setembro de 2022, no município de Água Boa/MT, os recorrentes acima discriminados, juntamente com os referidos codenunciados, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, tinham em depósito, venderam, transportaram, trouxeram consigo e entregaram ao consumo de terceiros drogas ilícitas, especificamente cocaína e maconha (FATO 02), e, nas mesmas condições de tempo e lugar do primeiro fato (organização criminosa), os mencionados agentes se associaram para praticar, reiteradamente, o crime de tráfico de entorpecentes, em Água Boa/MT, visando o fortalecimento da facção criminosa “Comando Vermelho” (FATO 03). Por fim, a prefacial narra, na residência localizada na Rua C1, s/n, sem muros, no bairro Operário, em Água Boa/MT, o apelante BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES, vulgo “RJ”, tinha em depósito e ocultou armas de fogo de uso permitido, bem como munições de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, consistentes em 01 (uma) pistola calibre 7.65mm, marca Taurus; 01 (um) revólver calibre .38, marca Taurus; 01 (uma) arma de fogo tipo garrucha calibre.22; 01 (um) carregador de pistola .40; 02 (duas) munições intactas calibre .38 e 05 (cinco) munições intactas calibre .32, em prol da facção criminosa (FATO 04). Segundo a proposição ministerial, após a prisão em flagrante dos apelantes BRUNO e EDIMILSON, foram realizadas diligências de busca e apreensão, que culminaram no recolhimento dos aparelhos celulares de BRUNO e dos recorrentes SANDERLEI e JOÃO CARLOS, cujos dados foram extraídos após autorização judicial e revelaram ampla atuação de um núcleo do “Comando Vermelho” instalado na cidade de Água Boa/MT, em que figuravam como líderes os denunciados BRUNO, LUCAS, Carlos e André. Ainda de acordo com o Parquet, Carlos ocupava o topo da cadeia hierárquica e BRUNO exercia o papel de “gerente”, efetuando o controle do tráfico de drogas e realizando a mercancia ilícita propriamente dita, pois controlava uma das “bocas de fumo”, sendo que LUCAS também praticava a comercialização direta de drogas a usuários e distribuía entorpecentes para outros traficantes, além de atuar como “Disciplina” no grupo infrator. Já os apelantes JOÃO CARLOS, SANDERLEI, DANILO, PEDRO, ARISNALDO, DOUGLAS e EDIMILSON, acusa o órgão ministerial, eram subordinados aos aludidos líderes e encarregavam-se da revenda dos narcóticos aos consumidores finais, na qualidade de traficantes faccionados. Outrossim, a preambular individualiza as condutas de cada recorrente no âmbito da organização criminosa e na traficância e elenca os dados extraídos de celulares apreendidos e demais elementos de informação angariados no curso das apurações, para demonstrar o vínculo de cada um deles com o “Comando Vermelho”, narrando ainda que o comércio malsão era perpetrado no interesse e com o aval do “CV-MT” e que, para que pudessem manter seus pontos de difusão de drogas (“bocas de fumo” ou “biqueiras”) e continuar integrando a facção, os agentes repassavam periodicamente taxas aos membros hierarquicamente superiores, denominadas de “camisas”, tudo a demonstrar o processo logístico de distribuição de tarefas e ordenamento estrutural entre os agremiados, com o objetivo de ver o produto ilícito chegar aos usuários. Nessa conjuntura, a peça incoativa descreve que todos os increpados integravam a facção “Comando Vermelho”, com envolvimento na disseminação de drogas ilícitas em Água Boa/MT, principal atividade fomentada pela organização, desiderato para o qual se associaram de maneira permanente e estável. Diante destes fatos, os apelantes foram denunciados, ao que se sucedeu o devido processo legal, culminando na parcial procedência da pretensão punitiva estatal e na condenação de TODOS OS RECORRENTES como incursos nas penas do crime de organização criminosa (art. 2.º, Lei n.º 12.850/2013), com incidência da agravante do papel de comando (§3.º) em relação a BRUNO. Ademais, à exceção de DANILO, os demais recorrentes foram condenados também pela prática do delito de associação para o tráfico de drogas (art. 35, Lei n.º 11.343/2006), sendo que ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI, EDIMILSON, JOÃO CARLOS, DOUGLAS e BRUNO foram incursionados também nas iras do crime de narcotráfico (art. 33, Lei n.º 11.343/2006), do qual LUCAS e DANILO restaram absolvidos, contexto em que todos eles agora exsurgem inconformados perante esta instância revisora, nos termos já relatados. Por fim, vale destacar que, no mesmo pronunciamento judicial, os corréus Odil Campos da Silva e Luiz Carlos Pereira Dias restaram absolvidos dos delitos que lhes eram imputados, ao passo que, ainda na fase embrionária do processo, os denunciados Rodrigo Rosa de Oliveira, vulgo “Pitbull”, Carlos Alexandre Paulo Dias, vulgo “Ezequiel” ou “Carlinhos”, e André Paulo Dias, vulgo “Kawai”, não foram localizados para citação pessoal, de modo que, após a produção antecipada de provas em relação a eles, ao término da instrução, o feito foi desmembrado, nos moldes do art. 80 do CPP, suspendendo-se a tramitação processual e o curso do prazo prescricional, no que lhes refere (ID 227285659). Feitas essas breves digressões, passo à análise do mérito. 1. Do pedido comum de absolvição do crime de organização criminosa: Como se sabe, a teor do que preceitua o art. 1.º, §1.º, da Lei n.º 12.850/2013, considera-se organização criminosa a associação pré-estabelecida de 04 (quatro) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão ainda que informal de tarefas, tudo com o objetivo comum de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 04 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional. Tem-se, pois, que, para a subsunção do fato à norma, é necessário que o conjunto de 04 (quatro) ou mais indivíduos se agremie de maneira ordenada e organizada, como sugere a própria etimologia do tipo, ou seja, por meio de alguma forma de hierarquia e escalonamento entre superiores e subordinados, todos com objetivos comuns no âmbito da delinquência, equiparando-se a estrutura organizacional do grupo infrator a verdadeiros métodos de dinâmica empresarial, em meio à qual chefes e chefiados, cada qual com atribuições divididas e tarefas compartimentalizadas, mesmo que informalmente, realizam empreendimentos criminosos voltados a auferir vantagens de qualquer natureza. Nesse contexto, para além de definir o conceito de organização criminosa, a já mencionada Lei n.º 12.850/2013 tipifica, no seu art. 2.º, o delito consistente em “promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa”. Trata-se de tipo penal classificado pela doutrina como formal, o que significa dizer que a sua ocorrência material prescinde do resultado naturalístico e a conduta ilícita se consuma independentemente da consecução ou concretização dos delitos visados pelo grupo; e de perigo abstrato, cuja potencialidade lesiva é legalmente presumida com a mera reunião durável e organizada de pessoas voltada ao desiderato iníquo; conceituando-se ainda como crime comum e de forma livre, ou seja, que pode se cometido por qualquer pessoa e por qualquer meio eleito pelo agente, respectivamente; e também permanente, isto é, a sua consumação se prolonga no tempo na medida em que perdura o ajuntamento de seus membros. Outrossim, o delito de organização criminosa não admite a forma culposa e tem como elemento subjetivo o dolo, de modo que é indispensável a comprovação do liame volitivo do agente e da sua vontade livre e consciente de congregar-se, ou seja, do animus voltado ao agrupamento organizado permanente e estável, promovendo-o, financiando-o, constituindo-o ou simplesmente o integrando. É se se apontar que o tipo exige ainda o elemento subjetivo específico implícito no próprio conceito de organização criminosa e consubstanciado na obtenção de vantagem ilícita de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais graves, de modo que não basta que o sujeito ativo da infração se alie aos demais com a finalidade de cometer crimes per se, mas também que atue com a finalidade especial de obter alguma vantagem. Em outras palavras, o crime do art. 2.º da Lei n.º 12.850/2013 é de natureza formal e se consuma mediante a simples associação organizada e estável da coligação, com o escopo de praticar futuras infrações penais, ou seja, as infrações pretendidas são indefinidas, em oposição ao propósito inerente à mera coautoria, que se destina a um ou vários crimes certos, de maneira que a organização criminosa não necessita praticar essas infrações penais ou alcançar a vantagem almejada, bastando que o objetivo seja esse. Partindo dessas premissas, no caso concreto, a materialidade das infrações penais está comprovada por meio dos Boletins de Ocorrência (ID 227283261, ID 227284227 - Pág. 1/2, ID 227284233 - Pág. 1/2, ID 227284330 e ID 227285661 - Pág. 8/10) dos Autos de Apreensão (ID 227283263, ID 227284228, ID 227284230, ID 227284234, ID 227284256, ID 227284261 - Pág. 3/7, ID 227284331, ID 227284347 - Pág. 15 e ID 227285661 - Pág. 15 e 19); do Relatório de Investigação n.º 2022.61049, contendo a análise dos dados extraídos do celular do réu BRUNO, vulgo “RJ” (ID 227283268); do Relatório Policial n.º 2022.13.44913, em que foram esmiuçadas as circunstâncias que cingiram as prisões em flagrante (ID 227284658 - Pág. 30/49); do Laudo Pericial de Pesquisa em Resquício de Droga (ID 227284183); dos comprovantes de depósito em conta judicial dos significativos valores apreendidos quando das prisões (ID 227284184 e ID 227284185); e do Relatório de Investigação n.º 2022.13.62142 (ID 227284244). A materialidade delitiva pode ser inferida ainda do Relatório de Investigação n.º 2022.13.62876, contendo a análise dos dados extraídos do celular do réu JOÃO CARLOS, vulgo “Pepa” (ID 227284246 ao ID 227284248); do Relatório Técnico 011/2022/NIDRAB/PJC/MT (ID 227284249); do Relatório Final Complementar (ID 227284250); dos Relatórios de Busca e Apreensão (ID 227284255 e ss.); do Relatório n.º 2022.13.63380, contendo a análise dos dados extraídos do celular do réu SANDERLEI (ID 227284265); do Relatório n.º 2022.13.70446, contendo a análise dos dados extraídos do celular do réu PEDRO (ID 227284326); do Relatório Técnico 015/2022/NIDRAB/PJC/MT (ID 227284267); do Laudo de Exame Pericial em Substâncias Entorpecentes (ID 227284347 - Pág. 26/29); do Laudo de Constatação de Droga (ID 227284658 - Pág. 62/64); do Laudo de Exame de Constatação de Droga (ID 227285661 - Pág. 23/27); além da prova oral colhida na fase extrajudicial e em juízo. Ainda no que concerne à ocorrência material do delito, pontue-se que não há dúvida in casu quanto à presença das elementares elencadas pelo art. 1.º, §1.º, da Lei n.º 12.850/2013, seja o número mínimo de integrantes, seja a gravidade dos crimes aspirados pelo grupo, pois é de conhecimento geral a existência, no Estado de Mato Grosso, da organização criminosa autointitulada “Comando Vermelho”, cujo número de membros supera sobremaneira a quantidade de 04 (quatro) indivíduos e cujos planos se voltam à prática de uma miríade de delitos diversos, como tráfico de drogas, associação para o tráfico, lesão corporal etc., exatamente como se viu na espécie. Dito de outra forma, é induvidosa e até mesmo notória a materialidade do crime de organização criminosa praticado pelos faccionados do “Comando Vermelho”, cuja estrutura hierárquica, divisão de tarefas, com poder de mando distribuído por lideranças, estatuto e disciplina rígida não só confirmam o seu caráter estrutural autônomo, mas também lhe conferem capacidade de domínio sobre um contingente imensurável de indivíduos fora e dentro do sistema prisional. Tanto é que as Cortes Superiores há muito vêm caracterizando tal facção como “notória”, conforme se infere do precedente a seguir: “2. Caso em que o acusado encontra-se submetido à notória facção do crime organizado denominada ‘Comando Vermelho’, comercializando maconha e cocaína, além de atuar e coordenar diversas empreitadas criminosas que aterrorizam a população local”. (RHC n. 56.943/RJ, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 25/8/2015, DJe de 1/9/2015) – Grifei. Além disso, a realidade atual tampouco deixa espaço para dúvida quanto ao elemento subjetivo específico dos integrantes do aludido organismo infrator, isto é, sua especial vontade de obter vantagem de qualquer natureza, notadamente o domínio e o monopólio da própria facção sobre a criminalidade nas regiões em que atua, tudo mediante a prática de delitos graves e violentos. Não por outra razão, aliás, os faccionados amiúde externam que a perseverança do “Comando Vermelho” em si, com hegemonia sobre a delinquência em seus territórios, traduz vantagem para os próprios membros individualmente, que se consideram parte de um todo e que crescem junto à medida que a facção se expande, tudo com a especial finalidade e dolo específico de que a “Família” (CV-MT) persista e avance, já que tal resultado inegavelmente beneficia e confere vantagem a seus membros, seja ela locupletamento patrimonial, ascensão nos quadros da facção, prestígio e renome no âmbito da delinquência etc. Em relação à autoria, por sua vez, nota-se a presença de provas suficientes e aptas a implicar todos os apelantes no delito e a demonstrar que integravam o “Comando Vermelho” e compunham a célula da organização criminosa na cidade de Água Boa/MT, à época dos fatos. De início, pontue-se que, em juízo, os apelantes BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES, JOÃO CARLOS MULLER, DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA e LUCAS ROGANTE CAVALCANTE confessaram integrar o grupo infrator “Comando Vermelho”, compondo a cadeia hierárquica da organização e atuando em prol do grupo, seja mediante a efetuação de cobranças das taxas devidas à facção por outros membros e de depósitos bancários do dinheiro recebido e realização de filmagens das ruas nas “quebradas” (como admitiu BRUNO), seja através da venda droga (como admitiu JOÃO CARLOS) e de pagamento de mensalidade (como admitiu DOUGLAS) ou de aplicação de “disciplina” em face dos faccionados desobedientes (como admitiu LUCAS). Ademais, as admissões judiciais dos recorrentes acima mencionados são corroboradas pelas provas digitais extraídas dos celulares apreendidos, as quais implicam como faccionados também os recorrentes DANILO OLIVEIRA DA SILVA, ARISNALDO DA SILVA GOMES, PEDRO HENRIQUE CABRAL SILVA, SANDERLEI FERREIRA DA COSTA e EDIMILSON SILVA DE JESUS. Com efeito, em 07/07/2022, por ocasião das prisões em flagrante dos réus BRUNO e EDIMILSON, na qual, frise-se, foram surpreendidos com uma porção de droga ilícita e considerável quantia em espécie, cuja origem lícita a dupla não soube explicar (R$ 1.642 com EDIMILSON e R$ 400,00 com BRUNO), o aparelho celular de BRUNO foi apreendido e, após autorização judicial (Incidente PJE n.º 1001745-83.2022.8.11.0021), teve o seu conteúdo analisado pelos agentes de segurança pública. As mensagens de áudio e texto trocadas em janelas privadas e em grupos de WhatsApp, assim como as fotografias e vídeos armazenados na galeria de mídias do aparelho, são deveras comprometedores e assaz para enredar tanto BRUNO quanto outros apelantes no crime de integrar organização criminosa. Em um vídeo salvo na galeria de mídias do aparelho celular de BRUNO, de 04/07/2022, é possível ver que o realizador da filmagem e um terceiro indivíduo têm em sua posse ao menos duas cartelas da droga sintética LSD (ácido lisérgico) e o exato momento em que o terceiro picota uma das cartelas para individualizar o entorpecente em porções, sendo de se pontuar que, embora BRUNO alegue em juízo que comprou o psicotrópico para experimentar, é inegável que o preparava para a venda em prol da “Comando Vermelho”, mesmo porque, cada uma das cartelas retratadas na gravação contém dezenas de selos, popularmente chamados de “doces”, o que é incompatível com o mero uso (vídeo armazenado no ID 227284163). No celular de BRUNO, foi localizada também uma lista de controle da distribuição de drogas ilícitas a outros faccionados, datada de 05/07/2022, o que revela não só a posição de “gerência” ocupada por BRUNO na difusão ilícita de entorpecentes pelo “CV-MT”, mas também o seu vínculo com os demais, pois, no rascunho (intitulado por BRUNO de “galo novo 100g”, referindo-se à nova remessa de drogas), ele classifica os revendedores pelo número de pedidos e pelo status de adimplência, respectivamente, pelo número aposto antes do “vulgo” de cada traficante e pelos emojis de “saco de dinheiro” (para quem já pagou) e de “X”, para quem ainda faltava quitar. Por oportuno, destaque-se que, na lista de traficantes faccionados que adquiriram a nova remessa de drogas para varejo, constam os vulgos “Baianinho”, “Ciclop”, “Pit Bull”, “Aukapone”, “Fabiano” e “Kanabis”, além do ora apelante ARISNALDO DA SILVA GOMES, vulgo “Naudo”, tudo conforme fotos e análise reduzidas a termo no Relatório de Investigação n.º 2022.13.61049 (ID 227283268 - Pág. 8/9). Outrossim, foi verificada no celular de BRUNO uma conversa na qual ele é abordado pela pessoa que se identifica como Walisson Gomes, vulgo “WG2”, o qual se oferece para ser o novo fornecedor de drogas sintéticas provenientes do Rio de Janeiro/RJ para comercialização em Água Boa/MT, em face do que BRUNO demonstra interesse, mas diz que não pode tomar monocraticamente a decisão de fechar o negócio e pede que o interlocutor lhe envie planilhas com os preços específicos de cada produto, a fim de que ele apresente para seus superiores hierárquicos, dizendo “igual eu falei pro senho faz a planilha certim chega ne mim que ai eu vou passar pra eles e eu sei te dá um posicionamento ce entendeu zika”. (Relatório de Inteligência no ID 227283269 - Pág. 4/7 e áudios originais armazenados do ID 227284165 ao ID 227284168). No celular de BRUNO, foram encontradas ainda inúmeras fotos em que ele ostenta diversas armas de fogo, inclusive armas longas e de grosso calibre, que, segundo relataram as testemunhas em juízo, foram posteriormente apreendidas no depósito conhecido como “paiol do ‘Comando Vermelho’”, o que evidencia que o elo de BRUNO junto ao organismo infrator extrapolava a mera atividade de traficância realizada pelo grupo, já que possuía acesso também ao arsenal da facção (fotos no ID 227283269 - Pág. 13/14, ID 227284159, ID 227284160, ID 227284161 e ID 227284162). Durante a busca exploratória judicialmente deferida no celular de BRUNO, os agentes estatais desvelaram que ele participava de um grupo virtual no aplicativo WhatsApp intitulado “FECHAMENTO”, administrado pelos “gerentes”/”disciplinas” locais do “CV-MT” e que funcionava como um canal através do qual as referidas lideranças efetuavam cobranças aos demais faccionados, controlando quem já pagou o valor referente às drogas adquiridas da facção e intimidando os devedores com ameaças para que sanassem as pendências. Em uma mensagem enviada no referido grupo “FECHAMENTO” por BRUNO, este cumprimenta os demais integrantes e se auto intitula como “RJ”, logo após o que o vulgo “Kawai” (possivelmente o corréu processado em autos desmembrados André Paulo Dias) envia uma extensa lista arrolando os “vulgos” dos faccionados que estão adimplentes (sinalizados com o emoji de “confere/check”) e aqueles que não realizaram o pagamento (marcados com um emoji de interrogação), e, ao final da lista, fixa a data limite para quitação em 20/06/2022, nos seguintes termos: “Todos sabemos do nosso compromisso com a organização CV-RL então não deixe a desejar. Data 20/06/2022”. (ID 227283269 - Pág. 1) – Destaquei. Em outra mensagem enviada no grupo virtual em questão, denominada “INFORMATIVO”, fica claro o envolvimento de todos os participantes com a organização criminosa “Comando Vermelho”, seja em maior ou em menor capacidade, pois, ao final da mensagem, o remetente deixa claro que “Não estamos aqui para omprimir nem ser mais que ninguém mais todos somos sientes do nosso COMPROMISSO quando entramos na organização (cv-rl)” (Sic – ID 227283269 - Pág. 1) – Grifei. As mensagens são encerradas com emojis de “bandeira vermelha” (remissivas ao símbolo da facção) e com as siglas “cv_rl_agb”, ou seja, “Comando Vermelho Rogério Lemgruber de Água Boa/MT”. Nas mensagens, consta também um texto com o “QUADRO DISCIPLINAR CV_AB”, ou seja, em que figuram as “chefias” do “Comando Vermelho” no município de Água Boa, o qual é composto pelos “irmãos” “Gean”, “Contador”, “Isaac”, “Cebola”, “Kawai”, bem como os ora apelantes BRUNO e LUCAS ROGANTE, faccionados sob os vulgos “RJ” e “Manda Chuva”, respectivamente (ID 227283269 - Pág. 1). Cumpre frisar que os demais membros do grupo virtual não podem ser tidos como usuários de drogas adquirentes para consumo próprio, mas sim verdadeiros traficantes faccionados, que compravam e revendiam drogas ilícitas, no interesse do grêmio delinquente, pois, como é cediço, meros usuários com compram drogas com pagamento a prazo e tampouco possuem ciência de “nosso compromisso com a organização CV-RL”. A propósito, além das já aludidas 07 (sete) lideranças locais existentes no “quadro disciplinar”, dentre as quais os ora apelantes BRUNO e LUCAS, participam também do grupo virtual em questão, na condição de faccionados traficantes e pagadores de mensalidades à organização criminosa, outros 59 (cinquenta e nove) indivíduos, incluindo os ora recorrentes DOUGLAS (vulgo “Fantasma” ou “Mensageiro”), JOÃO CARLOS (vulgo “Pepa”), DANILO (vulgo “Guerreiro”) e EDIMILSON (vulgo “Papo Reto” ou “Jericó”). Em uma interação privada entre BRUNO e o terceiro identificado como “Sinpt”, depreende-se que o apelante EDIMILSON atuava na organização criminosa como uma espécie de “braço direito” de BRUNO, auxiliando-o não só na mercancia ilícita, mas também no recebimento de valores devidos à facção, pois, na conversa, BRUNO cobra com veemência o inadimplente (“Sinpt”), dizendo inclusive que estava “à mercê dos final”, referindo-se aos “finais da linha” (órgão de cúpula do “CV-MT”), e sugere que o valor devido poderia ter sido repassado ao recorrente EDIMILSON, vulgo “Papo Reto” ou “Jericó”, o que já resolveria a questão. A propósito, BRUNO diz que “eu não sei se o senho já passo esse dinheiro pro PAPO RETO entendeu mano? Porque até ne mim não chego ainda, se tá ligado?”, em face do que o interlocutor responde que já havia entregado parte da quantia ao réu EDIMILSON, vulgo “Papo Reto” ou “Jericó”, alegando que “passei pro JERICO ontem. Um pouco”. (Relatório de Inteligência no ID 227283269 - Pág. 9 e áudio original armazenado no ID 227284169). Na sequência, “Sinpt” envia mensagem de áudio a BRUNO, para se justificar, e deixa claro que os valores repassados a EDIMILSON têm relação com o narcotráfico realizado pelo grupo, ao esclarecer que “eu to pagando pra ele por quilo, ta ligado? Era só 550 só que eu devo pra ele, num tem? Ai ontem eu di 180 real pra ele, ta ligado? Nessa semana vou dá tudo e nóis já fecha os 550”. (Relatório de Inteligência no ID 227283269 - Pág. 10 e áudio original armazenado no ID 227284170) – Negritei. Em outro diálogo, travado entre BRUNO e EDIMILSON em 06/07/2022, fica clara a função de auxílio exercida pelo segundo, com o objetivo comum de comercializar entorpecentes em prol da facção, pois, BRUNO realiza uma venda de cocaína ao usuário identificado como “Leandro Gonçalves”, o qual barganha 15g (quinze gramas) da droga pelo preço de R$ 100,00 (“tavo querendo um brabo spanca crânio. (...) tem que ser pelo menos umas dez gramas, se não tu me rebenta, uns quinze gramas, não dá não?”). Em virtude do peso específico negociado com o usuário, BRUNO determina, por mensagens de áudio, que EDIMILSON ajeite a balança de precisão, a qual aquele estava indo buscar (“aquela ‘BL’, eu vou precisar dela (...) se tá com ela aí?), ao que EDIMILSON responde “to demais, to demais, ela tá facinho, po, só ocê encostar aqui que eu já levo ela pro cê”), sendo que, minutos depois, BRUNO encontra o consumidor “Leandro Gonçalves” e recebe dele o comprovante de transferência bancária no importe de R$ 100,00, a atestar que a comercialização ilícita se concretizou (Relatório de Inteligência no ID 227283269 - Pág. 24/25 e áudios originais armazenados do ID 227284171 ao ID 227284176). No mesmo sentido, o telefone celular do apelante JOÃO CARLOS MULLER, vulgo “Pepa”, também teve seus dados extraídos e analisados pelos investigadores e o resultado da diligência revelou que, além de ele participar do grupo virtual “FECHAMENTO” e ajudar a financiar a organização criminosa mediante repasses de taxas periódicas, como visto alhures, JOÃO CARLOS amiúde oferecia drogas à venda para usuários, como em 02/09/2022 e em 05/09/2022, quando diz aos contatos “Mariaaq”, “Uallanbillaw” e “Cleyt” que está “ntv” do “cera” e do “emoji de raio”, ou seja, oferecendo cocaína (Relatório de Investigação no ID 227284246 - Pág. 4). Aliás, em um diálogo com o contato “agrovendas”, JOÃO CARLOS manda foto segurando duas porções de cocaína e propagandeia “pega por 300 4g. levo ai agr”. (Relatório de Investigação no ID 227284246 - Pág. 5). Em outro diálogo, com o contato “Igor Tomae”, JOÃO CARLOS oferece drogas ilícitas (“braw”, significando maconha) a dez reais por grama e fecha o negócio (ID 227284246 - Pág. 5). O vínculo de JOÃO CARLOS com a organização criminosa ressai ainda mais evidente a partir dos diálogos travados por ele no final de agosto e início de setembro de 2022, quando indaga os contatos “Contador” e para o corréu Carlos Alexandre Dias, vulgo “Ezequiel” (autos desmembrados), a respeito de quando será “desbrecado”, ou seja, pede uma previsão de quando poderá voltar a comercializar drogas, sugerindo que estaria proibido de traficar pelo “Comando Vermelho”, como método de punição. A propósito, JOÃO CARLOS pontua para “Ezequiel” que precisa ser “desbrecado”, porque está “doido pra ganha um dinheiro (...) vê aí o que o senhor pode tá fazendo”, e indaga quem seria o atual fornecedor de cocaína (“o raio”), pois possuía usuários interessados mas não sabia quem estava encarregado da distribuição (“deixa eu fala com o senhor quem tw tendo o raio, tô com altos corre aki, to meio por fora de quem tem”), tudo conforme Relatório de Investigação no ID 227284247 - Pág. 1). Diante da indagação de JOÃO CARLOS, “Ezequiel” compartilha com ele o contato telefônico do apelante LUCAS ROGANTE, vulgo “Predileto” ou “Manda Chuva”, em face do que JOÃO CARLOS agradece e diz que “vo chega nos mano aki”, antes de enviar imagem com apologia ao “Comando Vermelho”, especificamente a figura de um palhaço com a legenda “Tudo 2 Passa Nada” (ID 227284247 - Pág. 1/2). Em outra interação, desta vez com o corréu André Paulo Dias, vulgo “Kawai” (autos desmembrados), JOÃO CARLOS envia um comprovante de transferência no valor de R$ 120,00 e se desculpa pelos atrasos nas mensalidades (chamadas por eles de “camisas”), e pergunta quando será “desbrecado”, ou seja, quando poderá voltar a traficar, pois já havia pagado metade das “camisas” que devia à facção (ID 227284247 - Pág. 3/4). Por oportuno, destaque-se que o terminal telefônico utilizado pelo corréu André Paulo Dias, vulgo “Kawai” (autos desmembrados), está cadastrado formalmente em nome do ora apelante ARISNALDO DA SILVA GOMES, vulgo “Naldo”, o que revela a concretude do elo entre os coligados (ID 227284247 - Pág. 4). No celular de JOÃO CARLOS, identificou-se ainda que ele pertencia a pluralidade de grupos de WhatsApp da organização criminosa, como o “Monster Burguer” e o “Mercado Vale Sul”, sendo que em tais ambientes virtuais, os participantes se alertavam entre si sobre o patrulhamento realizado pela polícia, sobre a passagem das viaturas e sobre a deflagração de operações policiais. Aliás, em um dos grupos (“Monster Burguer”), depreende-se que, na data da deflagração da “Operação Arcabouço”, que deu origem à presente ação penal, os faccionados comentam que o apelante DANILO, vulgo “Guerreiro” ou “Raivoso”, foi cercado pelos agentes de segurança pública, mas conseguiu fugir, assim como se referem a ele como “mano”, a evidenciar a espessura de seu vínculo com o organismo infrator (ID 227284247 - Pág. 5). Frise-se ainda que o Boletim de Ocorrência n.º (ID 227284227 - Pág. 1/2), corroborado que está pela prova testemunhal colhida em juízo, atesta que, na data em questão, do cumprimento dos mandados de prisão, DANILO realmente chegou a ser avistado pelos agentes estatais, porém, correu e pulou muros quando percebeu a viatura, conseguindo foragir. Outrossim, na mesma data em que DANILO empreendeu fuga, os policiais que diligenciavam na operação presenciaram uma “reunião de cúpula” em frente à casa do recorrente SANDERLEI, onde também se encontravam o apelante PEDRO e outros 04 (quatro) suspeitos, sendo que, neste momento, SANDERLEI bradou para os investigadores ““Vocês não vão achar o DANILO, essa hora ele ta longe”, externando assim mais uma prova de vínculo organizado e duradouro entre os agremiados, tudo conforme o Relatório Técnico 011/2022 e respectivos anexos fotográficos (ID 227284249). Da mesma forma, por ocasião do cumprimento dos mandados de busca e apreensão domiciliar em seus respectivos endereços, os apelantes DOUGLAS e ARISNALDO tiveram drogas ilícitas apreendidas consigo, o que tonifica a conclusão quanto às funções que exerciam nos quadros da organização criminosa, isto é, de traficantes faccionados (ID 227284250 - Pág. 6/7). Além disso, o celular do apelante SANDERLEI também foi apreendido e submetido à busca exploratória e não deixa dúvida quanto ao seu pertencimento e de outros recorrentes à organização criminosa “Comando Vermelho”. A propósito, em conversa com o contato “Gordinho”, SANDERLEI comercializa entorpecentes por elevado valor econômico, pois o interlocutor exige “Já vem com a mercadoria / Mas já trás a / Encomenda” e SANDERLEI por sua vez responde “Ai é bom que você não precisa vir aqui mais hoje / Aí vou levar essa fica 3.500” (ID 227284265 - Pág. 6) – Negritei. Em outro diálogo, o usuário “Carlos Eduardo” procura drogas e pede o contato telefônico do apelante DANILO, ao que SANDERLEI replica que ele mudou de número, após o que o interlocutor pede “arruma um braw pra mim (...) Amanha você me arruma 100 para abastecer?” (ID 227284265 - Pág. 8); e, em outra interação, SANDERLEI anuncia ao consumidor “marciooliveiracarvalho13” que está na ativa para a venda de cocaína, simbolizada por imagens (ID 227284265 - Pág. 9). O pertencimento de SANDERLEI ao “Comando Vermelho” fica mais evidente ainda a partir da mensagem de áudio por ele remetida ao corréu André Paulo Dias, vulgo “Boi” ou “Kawai” (autos desmembrados), em que o recorrente confidencia que estava preocupado de não conseguir a mensalidade devida à facção, chamada por ele de “família” (“Mano eu só tô resolvendo uns b.o aqui ver se eu levanto um dinheiro mano, tem que pagar os ir... Os... A família entendeu? Tá um paradão do carai. – ID 227284265 - Pág. 11). Já em troca com o contato “Metranha Dr” (6698117-9009), SANDERLEI conversa abertamente sobre valores de entorpecentes e, em determinado momento, manda áudio dizendo que determinará que o apelante PEDRO leve a droga para o destinatário (“Vou pedir pro Pedro levar ai dois minutos”), demonstrando assim a atuação conjunta e organizada destes increpados (ID 227284265 - Pág. 13/14). Em outra conversa, “Metranha Dr” dá a entender que também é fornecedor de drogas e que não abaixaria o preço da cocaína, porque havia pouca oferta, ao que SANDERLEI responde que também manteria o preço, pois precisava realizar os repasses para o corréu Carlos Alexandre Dias, vulgo “Ezequiel”, um dos supostos líderes municipais do “Comando Vermelho”: “‘Áudio 05 (Metranha Dr): - O cara lá queria cem real só, cê faz cem real? Num tem como né vei só de cento e cinquenta pra cima esse povo é doido eu falei óh é poucos que tem entendeu? E os poucos que tá teno é cento e cinquenta real uma grama e meia. Em seguida Sanderlei diz “150 tem que pagar o Ezequiel pô’”. (Relatório de Investigação no ID 227284265 - Pág. 15). Em nova mensagem de áudio, SANDERLEI diz que deixou cocaína para o contato “Metranha Dr”, no local por eles combinado (“Deixei duas de cento e cinquenta dentro da caixinha de correio, dentro dum potinho de pó royal”), conforme ID 227284265 - Pág. 15. Outrossim, SANDERLEI interage frequentemente com o apelante ARISNALDO, vulgo “Naldo”, evidenciando o liame entre os agentes na difusão de narcóticos, com posterior repasse dos lucros à organização criminosa. Nas mensagens, foi possível contemplar a mercancia de entorpecentes, onde ARISNALDO questiona SANDERLEI “Vc só tem picado o (figura de raio)”, referindo-se ao entorpecente cocaína, e SANDERLEI, por sua vez, responde enviando os valores “Tem / Sim “ 150 300 500”, e o diálogo continua com os áudios 07, 08, 09 e 10, onde ARISNALDO diz ter um dinheiro para entregar para SANDERLEI e este por sua vez afirma que vai passar esse valor para “Carlinhos”, ou seja, Carlos Alexandre Paulo Dias já mencionado anteriormente, suposto líder municipal do “CV-MT”; no áudio 10 é possível concluir que ARISNALDO também está comprando o entorpecente para revender, dizendo “mais tarde os cara vai querer mais”. (Relatório de Investigação no ID 227284265 - Pág. 18/19). Ao dialogar com o corréu Carlos Alexandre Dias, vulgo “Ezequiel” (autos desmembrados), SANDERLEI revela que repassa valores oriundos da venda de drogas para o suposto líder da facção em Água Boa/MT, ajudando a financiar o organismo infrator, ao dizer: “mano esqueci do seu não tô só esperando melhorar aqui o corre mercadoria tá na mão pode ficar de boa primeiro aqui é o seu”. (ID 227284265 - Pág. 20). Foram extraídas do celular de SANDERLEI, também, conversas entre ele e o apelante DOUGLAS, em que fica clara a função deste último no âmbito do “Comando Vermelho”, isto é, a guarda e o preparo da droga, para posterior distribuição aos traficantes faccionados, pois DOUGLAS diz para SANDERLEI que se enrolou e que talvez não conseguisse resolver naquela data, “mas vô tá fazendo um esforcinho pra tá soltando o senhor ai demoro?” (ID 227284265 - Pág. 21). Na sequência, DOUGLAS se explica, dizendo que não conseguiu “cortar” naquele dia, certamente referindo-se ao preparo do entorpecente (conforme esclareceram as testemunhas compromissadas em juízo), após o que SANDERLEI diz que então irá aguardar, dirigindo-se a DOUGLAS através de termos que denotam a inserção de ambos na estrutura hierárquica do “CV-MT”, ao dizer “Amanhã na hora que o senhor ativar chega junto vou estar aguardando. Valeu meu mano Só agradece”. (227284265 - Pág. 22) – Destaquei. Passada a data descrita acima, SANDERLEI interpela DOUGLAS novamente e este diz que foi entregar o produto, mas não havia ninguém no local, motivo pelo qual avisa que deixou a mercadoria na caixa de correio e SANDERLEI lhe envia o comprovante de pagamento eletrônico instantâneo (PIX), no considerável importe de R$ 1.500,00, enviados da conta bancária de ARISNALDO (ID 227284265 - Pág. 22). A dinâmica acima narrada me incute a certeza quanto à atuação conjunta e organizada do grupo, bem como quanto ao vínculo subjetivo que interligava os integrantes, cada qual com funções bem definidas no âmbito da estrutura ordenada da facção, inclusive tendo em vistas os protocolos bem definidos de entrega e pagamento da droga e a confiança mútua que envolvia a relação dos coligados. Ademais, pontue-se que é manifestamente inverossímil a tese defensiva sustentada por DOUGLAS e SANDERLEI, de que a tratativa de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) se referia à compra e venda de um celular: seja porque celulares não precisam ser “cortados” para serem vendidos; seja porque o mesmo modus operandi (deixar droga ao comparsa na caixinha de correio) foi usado por SANDERLEI em outra ocasião, com o contato “Metranha Dr” (“Deixei duas de cento e cinquenta dentro da caixinha de correio, dentro dum potinho de pó royal”). Prosseguindo, o diálogo travado entre SANDERLEI e o contato “Clovisney” em 05/09/2022 coloca pá de cal no seu envolvimento com a organização criminosa “Comando Vermelho”, pois o interlocutor se queixa a respeito de um indivíduo que estaria fazendo baderna em seu bar e indaga com quem poderia falar para corrigir o baderneiro, ao que SANDERLEI responde que acionará o “irmão Disciplina” da região, para que seja aplicado castigo “salve” no terceiro (“quebra ele no caibro”), o que demonstra que realmente integrava a facção, inclusive em capacidades que extrapolavam a traficância: “Áudio 13 (Sanderlei) - Ein mano na hora que ele chegar ai pega a visão aqui óh na hora que ele chegar ai cê já dá um bina eu aqui que eu já vou pegar uns irmão aqui e já subir ai, mas eu vou chegar no disciplina ai e passar a visão certinha, nós gruda ele ai mesmo rasta ele pro pro escuro ai quebra ele no caibro ai memo pra ele nunca mais botar os pé ai”. (ID 227284265 - Pág. 23/24) – Grifei. No celular do recorrente PEDRO, também foram localizadas mensagens que o implicam como traficante agremiado aos demais, notadamente a SANDERLEI e ARISNALDO, no interesse do “Comando Vermelho”, inclusive com conversas de PEDRO sobre o “quadro disciplinar” do grupo e sobre as penalidades impostas pela facção, como o “trabalho social”, in verbis: “(...) No diálogo do dia 03/09/2022 entre Pedro e o numeral (66) 9 8117-5217 este envia “Toyota (...) Em zika quadro disciplina / Falar pro senhor / Amanhã / 16:00 na hora / Pagar o trabalho social mano (...) Cemitério / 16:00” e Pedro retorna “Mano amanhã vou no rancho mais chego a tempo / Só tem o cemitério Mano / Esse luga e foda pra mim” e tem como resposta “Só lá mano / Único lugar”. No dia 04/09/2022 Pedro envia um vídeo em que é possível visualizar os túmulos ao fundo e diz “E ai mano caçando ocê aqui vei”. (ID 227284326 - Pág. 16/17) – Destaquei. A espessar o elo entre os recorrentes, em 27/08/2022, PEDRO solicita a DANILO o contato do corréu Carlos Alexandre Dias, vulgo “Ezequiel” (autos desmembrados), o qual é repassado por DANILO, e, em seguida, PEDRO envia mensagens de áudio ao suposto líder da facção em Água Boa/MT e este responde a PEDRO dirigindo-se a ele como “mano”, demonstrando o pertencimento de PEDRO ao grupo (ID 227284326 - Pág. 18/19). Por fim, o Relatório Técnico n.º 015/2022/NIDRAB/PJC/MT mostra que os apelantes SANDERLEI e PEDRO foram flagrados por câmeras de monitoramento, enquanto realizavam possível mercancia ilícita em prol da facção, em 29/08/2022 (ID 227284267). Como é cediço, as provas de natureza cautelar e não repetível, como diálogos interceptados e dados telefônicos provenientes de SMS ou aplicativo WhatsApp, captados e extraídos mediante autorização judicial e posteriormente reduzidos a termo em relatórios de inteligência da polícia, conforme se deu na espécie, submetem-se ao contraditório deferido e se inserem na ressalva do art. 155, caput, in fine, do CPP, bastando, pois, para formação do convencimento do órgão julgador, sem que se possa falar em ofensa ao aludido dispositivo legal. A propósito: “2. Não há se falar, pois, em violação do art. 155 do CPP, uma vez que questiona-se a utilização de provas irrepetíveis, sujeitas ao contraditório diferido, como interceptação de dados telefônicos provenientes de SMS e WhatsApp, busca e apreensão na residência de corréu e interceptações telefônicas constadas em relatórios de inteligência da polícia, sendo todas válidas para a condenação do agravante por ambos os crimes”. (AgRg no AgRg no HC n. 885.042/MG, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 2/9/2024, DJe de 6/9/2024) – Grifei. “7. No que se refere às interceptações telefônicas e às demais provas irrepetíveis, é possível a condenação com base apenas nessas provas, observada a ressalva contida na parte final do art. 155 do CPP. Precedentes”. (AgRg no REsp n. 2.120.994/SC, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 16/10/2024, DJe de 23/10/2024) – Destaquei. Não obstante a alegação defensiva no sentido de que o conteúdo cautelar cotejado acima não seria confiável, após uma análise concatenada com as demais provas coligidas ao feito, concluo que o pleno valor probatório daqueles elementos restou confirmado sob o crivo do contraditório judicial, inclusive pelas confissões parciais de alguns dos acusados. A propósito, ao serem ouvidas em juízo, as testemunhas Matheus Soares Augusto e Dheynny Melo Carvalho explicitaram que a extração e o exame dos dados dos celulares apreendidos se deram de forma idônea por parte dos investigadores e que os dispositivos eletrônicos foram mantidos no “modo avião”, de forma que a busca exploratória se limitou a aferir o conteúdo dos aparelhos e interpretá-los, reduzindo-se a termo no relatório as respectivas conclusões. Tais declarações judiciais coadunam com a realidade do processo, pois, conforme já exposto neste aresto na segunda preliminar arguida pela defesa, inexiste qualquer demonstrativo nos autos e nas próprias mídias coletadas (mensagens, vídeos e fotos angariados nos aparelhos telefônicos) que sequer sugira que as provas digitais tenham sido adulteradas, manipuladas de qualquer modo ou retiradas de contexto. Ademais, o réu parcialmente confesso BRUNO, proprietário de um dos quatro celulares apreendidos e analisados, quando interrogado em juízo, admitiu a autoria por vídeo achado em seu celular, assumindo que mandou tal vídeo no grupo virtual; e que trocava mensagens com outros denunciados, inclusive recebendo ordens de terceiros, a mando dos quais realizava cobranças via WhatsApp de pessoas que conhecia apenas pelos “vulgos”, tudo assumidamente em prol e por determinação do “Comando Vermelho”. Além disso, BRUNO confirmou a fidedignidade das fotos extraídas de seu celular, ratificou a veracidade da lista de anotações com controle de pagamentos relacionados ao tráfico, achada em grupo do WhatsApp, e a autenticidade dos áudios que lhe foram enviados por um terceiro, se oferecendo para ser o novo fornecedor de drogas em Água Boa/MT, o que confere verossimilhança ao conteúdo digital e tonifica a conclusão pela idoneidade das mídias. No mesmo sentido, ao confessar perante autoridade judiciária que faz parte do “Comando Vermelho” há dois anos e que vendeu drogas no interesse da facção, o proprietário do segundo aparelho celular analisado, JOÃO CARLOS, também deu a entender pela veracidade do conteúdo digital colhido do dispositivo eletrônico, ao declarar que “(...) nunca fui líder, mas eu faço parte da organização (...), eu tive que vender uma pequena quantidade, de três gramas, que é a foto que está no meu celular”; além de admitir que realmente pediu ao “CV-MT”, por mensagem de texto, para ser “desbrecado”, conforme ilustram as capturas de tela (“PrintScreen”). Se tudo isso não bastasse, a autoridade policial juntou aos autos filmagens de grande parte dos áudios originais enquanto eram reproduzidos, a corroborar a fidedignidade das transcrições reduzidas a termo nos relatórios de inteligência, conforme se vê nos arquivos de mídia denominados “Áudio 1.mp4” a “Áudio 12.mp4”, coligidos do ID 227284165 ao ID 227284176. Assim, a despeito dos judiciosos argumentos lançados pela defesa, não me resta qualquer dúvida quanto à autenticidade das mídias, mensagens e demais dados angariados nos celulares apreendidos, mormente tendo em vista a consonância do conteúdo digital com a prova oral colhida em juízo, conforme se passa a expor. Com efeito, o delegado de Polícia Matheus Soares Augusto esclareceu que, atualmente, o a difusão ilícita de entorpecentes no Estado de Mato Grosso está intrinsecamente ligada à organização criminosa “Comando Vermelho”, cujo aval é imprescindível para a realização do narcotráfico, de modo que traficantes dissidentes ou que se recusem a se envolver com a facção são eliminados. Sobre os fatos sub judice, o delegado contextualizou que a investigação teve início a partir das prisões em flagrante dos recorrentes BRUNO e EDIMILSON, pela prática de tráfico de drogas, e que, por meio da análise dos dados contidos no celular do primeiro, verificou-se que ele integrava o grupo de WhatsApp intitulado “Fechamento”, juntamente com outros membros do “CV-MT”, e que atuava em posição de destaque nos quadros do grêmio infrator, pois realizava a cobrança das “camisas” (mensalidades devida por todos os integrantes) dos demais faccionados. Além disso, a testemunha destacou que, embora fosse um “gerente” local em Água Boa/MT, BRUNO possuía seus próprios superiores e possuía contato direto com essas “lideranças finais” do “Comando Vermelho” em Mato Grosso, o que se verificou quando, certa feita, BRUNO foi abordado por um indivíduo, que se ofereceu para ser o fornecedor de drogas para o tráfico na região, em face do que BRUNO respondeu que, a despeito de sua função de “gerência”, não poderia tomar sozinho a decisão de “fechar o negócio” e que precisaria consultar os líderes finais. A testemunha Matheus ressaltou também que BRUNO perpetrava efetiva traficância em prol da organização criminosa, pois, embora tenha sido surpreendido com pouca droga por ocasião de prisão em flagrante, a perícia demonstrou que o porta-malas de seu carro continha resquícios de entorpecente, o que, na visão do depoente, corroboraria sua condição de traficante, pois, de acordo com a experiência do delegado, meros usuários não transportam droga para uso em tal compartimento do automóvel. Por fim, com relação a BRUNO, o declarante pontuou que ele se exibia, em fotografias armazenadas no celular, portando diversas armas de fogo, inclusive armas longas e de grosso calibre, ressaltando ainda que, durante buscas realizadas em um endereço conhecido como o “paiol do ‘Comando Vermelho’”, foram localizados e apreendidos os armamentos ostentados por BRUNO nas referidas fotos, que corrobora seu envolvimento no submundo da criminalidade. No que concerne ao recorrente LUCAS, o delegado destacou que este exercia a função de “Disciplina” da facção à época – o que coaduna com a confissão judicial do próprio acusado –, ao passo que JOÃO CARLOS vendia drogas no interesse da organização e que inclusive passou certo período “brecado”, isto é, proibido de efetuar o comércio malsão, como método de punição infligida pelos membros hierarquicamente superiores, razão pela qual ele reiteradamente pedia a LUCAS e ao corréu Carlos para ser “desbrecado”. Quanto ao apelante SANDERLEI, a testemunha Matheus pontuou que se trata de pessoa conhecida no meio policial, justamente por seu envolvimento com a mercancia ilícita, e delineou o vínculo associativo permanente e estável nutrido por ele junto aos demais faccionados, ao narrar que, não obstante respondesse às lideranças locais, ele exercia uma função de controle sobre os recorrentes PEDRO e ARISNALDO, ou seja, coordenava o narcotráfico realizado por estes últimos, inclusive mandando PEDRO levar drogas para entrega a usuários. Neste ponto, cumpre frisar que, além dos dados extraídos dos aparelhos celulares de BRUNO e SANDERLEI e do testemunho compromissado do delegado Matheus, SANDERLEI e PEDRO são implicados no ilícito também através das imagens captadas por câmeras de monitoramento, as quais flagraram a dupla enquanto realizava a comercialização de entorpecentes, o que tonifica ainda mais a conclusão de que realmente eram encarregados de tal tarefa, no âmbito do grêmio delinquente. No que refere ao apelante DANILO, a testemunha Matheus asseverou que, além de vinculado ao “gerente” BRUNO, aquele também atuava ligado ao réu SANDERLEI, acrescentando que, quando DANILO conseguiu empreender fuga, na data da deflagração da operação policial, seus colegas de facção comentaram a façanha em grupos de WhatsApp e se referiram a ele como “irmão”, o que denota a concretude do ânimo associativo com que DANILO exercia sua vontade livre e consciente de integrar a organização. Em relação ao segundo subalterno que entregava drogas a mando de SANDERLEI, qual seja, o recorrente ARISNALDO, o delegado testemunhante verbalizou que, de acordo com o que as investigações elucidaram, além de incorrer na distribuição direta de drogas a usuários em favor da facção, ele também realizava o repasse das mensalidades (“camisa”) aos membros hierarquicamente superiores, o que denota o seu vínculo com a coligação criminosa. No que tange ao apelante DOUGLAS, Matheus esclareceu que este integrava e ajudava a financiar o “Comando Vermelho” mediante o pagamento de “camisas” e, ainda, exercia uma função mais específica no âmbito do organismo infrator, consistente em guardar e preparar os entorpecentes para posterior revenda, “picando, cortando” a droga em pedaços menores para embalagem. Matheus asseverou que o recorrente EDMILSON, além de comercializar drogas diretamente com usuários e recolher dinheiro oriundo do tráfico de outros faccionados, era um dos membros mais antigos da facção na cidade, já tendo ocupado o cargo de “Disciplina” antes de ser preso e, após a soltura, passou a atuar na função de “braço direito” do réu BRUNO, com quem foi detido em flagrante, no momento em que a dupla realizaria depósito de dinheiro para a facção. Por fim, o delegado repisou que todos os apelantes estavam interligados entre si, sob a liderança local do recorrente BRUNO, no pertencimento comum à organização criminosa “Comando Vermelho”, e que os entorpecentes comercializados pelos acusados pertenciam à aludida facção, inclusive as drogas apreendidas por ocasião das prisões em flagrante de alguns dos suspeitos, como do próprio BRUNO e do apelante DOUGLAS, ainda que eventualmente de pequena monta. No mesmo diapasão, a investigadora da Polícia Civil Wandervaney Soares da Silva declarou em audiência instrutória que o apelante BRUNO já era conhecido no meio policial e que, à época dos fatos, atuava sob a alcunha de “RJ”, incumbindo-se de monitorar os bairros, a fim de averiguar se estava tudo tranquilo nos territórios da facção, o que os integrantes chamam de “responsáveis pela quebrada”. Neste ponto, destaque-se que as funções realizadas por BRUNO em prol da organização criminosa, tal qual revelou a testemunha Wandervaney, vão ao encontro não só da confissão judicial do acusado, mas também do vídeo recebido pela polícia juntamente com a notitia criminis, anteriormente à deflagração da operação, o qual foi filmado pelo próprio BRUNO enquanto ele transita em seu veículo pela via pública (ID 227284658 - Pág. 30 e ID 227284177 - Pág. 2/3). No vídeo em questão (“VID-20220603-WA0144.mp4”), BRUNO ostenta uma porção de maconha, faz referência ao “Comando Vermelho”, aludindo à facção como sua “família”, e narra enquanto filma: “Aqui é a parada meus irmão, quebradinha ai do, do Vila Nova, tudo dois. To dando um giro aqui de manhã pra vê como é que tá a quebrada, tudo linda, aqui é a parada meus irmãos, sempre na ativa, sempre no monitoramento vamo pra cima minha família, aqui é a parada”. (Sic – Mídia armazenada no ID 227284243) – Negritei. A propósito, a identificação de BRUNO como o protagonista do vídeo foi possível através da tatuagem que possui no pulso e pelo fato de a mesma gravação ter sido posteriormente achada em seu celular, sendo de se frisar que o próprio apelante assumiu a autoria pelo vídeo perante a magistrada a quo. Outrossim, a testemunha Wandervaney aduziu que os investigadores receberam notícia de que BRUNO estava residindo no bairro Guarujá, onde, em companhia do recorrente EDIMILSON, estaria distribuindo drogas ilícitas, a título oneroso, motivo pelo qual a equipe da depoente efetuou monitoramento no local noticiado e realizou a abordagem, sendo que, no porta-malas do veículo do primeiro, foram constatados resquícios de narcóticos; complementando que, nas buscas em uma residência vinculada a BRUNO, foi encontrado ainda um papel, com a lista de controle dos traficantes no município. Em harmonia com o que havia relatado o delegado Matheus, Wandervaney descreveu que, além de associado aos demais para o narcotráfico em si, o apelante LUCAS também compunha o “quadro disciplinar” do “Comando Vermelho”, sob o vulgo “Manda Chuva”, havendo informações de que, na condição de “Disciplina”, infligia sequestros e “salves” na cidade; ao passo que o recorrente JOÃO CARLOS, vulgo “Pepa”, não só traficava, mas demonstrava ser faccionado por meio dos repasses pecuniários que realizava em favor da organização (“ele também faz o pagamento da ‘camisa’, (...), traficante, traficante e integrante”). A testemunha narra que EDIMILSON auxiliava BRUNO na traficância e que o acusado SANDERLEI usava seu bar como ponto de revenda de entorpecentes e possuía íntimo vínculo com o réu DANILO e com os apelantes PEDRO e ARISNALDO, na medida em que estes dois últimos revendiam e entregavam drogas a mando de SANDERLEI, o qual, por sua vez, adquiria os psicotrópicos do recorrente DOUGLAS e pagava para este último, o qual, de acordo com a declarante, atendia por mais de um vulgo, dentre os quais “Fantasma” ou “Fantasminha”. Ademais, a policial civil pontuou que era forte e patente o ajuntamento de SANDERLEI, ARISNALDO e PEDRO entre si e com a organização “Comando Vermelho” e esclareceu que DOUGLAS se encarregava de preparar e “picar” os entorpecentes que seriam distribuídos, além de pagar a “camisa” (taxas periódicas devidas pelos faccionados), ao que acrescentou a informação de que DANILO também era faccionado antigo. Deveras, a narrativa judicial da investigadora Wandervaney, notadamente no que tange às incumbências de DOUGLAS na divisão de tarefas (preparo da droga que seria comercializada pelo organismo infrator), coaduna com as próprias circunstâncias do cumprimento de sua prisão em flagrante, pois, de acordo com a testemunha, no momento da detenção, DOUGLAS foi surpreendido com quantidade de drogas ilícitas e dinheiro. A testemunha relatou que SANDERLEI também se incumbia de viabilizar a “disciplina” na urbe de origem, pois, certa feita, foi interpelado por um comerciante local, o qual pedia fossem tomadas providências em relação a um indivíduo que fazia baderna em seu bar, em face do que SANDERLEI responde que acionaria os “Disciplina” para “quebrar” tal baderneiro. Por derradeiro, a investigadora destacou que o núcleo do “Comando Vermelho” composto pelos apelantes já vinha atuando há tempos em Água Boa/MT e que os líderes desta célula prestavam contas a faccionados superiores situados em outras cidades, não só quanto aos valores provenientes da comercialização de drogas, mas também em relação às penalidades “salve”, aplicadas como castigo quando algum membro desacatava o estatuto do grupo infrator. Em semelhante toada, sob o crivo do contraditório judicial, a policial civil Dheynny de Melo Carvalho corroborou os depoimentos das testemunhas anteriores, inclusive no que tange à função de “Disciplina” exercida por LUCAS nos quadros da organização criminosa e ao período em que JOÃO CARLOS foi “brecado” de vender entorpecentes pelos membros hierarquicamente superiores, em virtude da inadimplência no repasse das taxas mensais (“camisas”), ressaltando que este se comprometeu com superior hierárquico a quitar as mensalidades atrasadas, a fim de voltar a traficar. Dheynny confirmou também que SANDERLEI usava PEDRO para realizar sua entrega de drogas a usuários e que aquele se comprometia a pagar as taxas devidas à facção assim que os entorpecentes fossem vendidos, além de enviar comprovante de compra de drogas para DOUGLAS, no significativo importe de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), por intermédio de ARISNALDO, que usou sua própria conta corrente para a transação referente à mercadoria picada/cortada e distribuída por DOUGLAS aos demais traficantes, em prol do grupo. Oportunamente, destaque-se que o fato de as testemunhas consistirem nos policiais civis que diligenciaram na ocorrência e oficiaram na investigação não afasta a credibilidade ou a idoneidade dos seus depoimentos, tampouco elide o valor probatório dos seus relatos judiciais, máxime quando inexiste qualquer indicativo nos autos de que, aos agentes de segurança pública, interessaria implicar gratuitamente os réus na empreitada criminosa, exatamente como ocorre na presente hipótese. Sobre o tema, a Turma de Câmaras Criminais Reunidas do TJMT editou, em sede de uniformização de jurisprudência, o Enunciado Orientativo n.º 08, cuja redação dispõe que “Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal”. (Incidente de Uniformização de Jurisprudência n.º 101532/2015, DJE n.º 9.998, de 11/04/2017). Não discrepa a jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça: “II - O depoimento dos policiais prestado em Juízo constitui meio de prova idôneo a resultar na condenação do réu, notadamente quando ausente qualquer dúvida sobre a imparcialidade dos agentes, cabendo à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova, o que não ocorreu no presente caso”. (HC 404.507/PE, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 10/04/2018, DJe 18/04/2018). Especificamente com relação ao ânimo associativo permanente e estável mantido pelos acusados, concluo o comportamento e as condutas comissivas exercitadas pelos recorrentes, assim como o próprio modus operandi da organização criminosa, tais quais extraídos das provas digitais colhidas em sede cautelar e da prova oral angariada em juízo, deixam patente a presença do dolo dos agentes em se associarem, de maneira organizada, permanente e estável, para a prática de crimes graves. Dito de outra forma, a análise concatenada de todos esses depoimentos e dados dos celulares não deixa margem para dúvida de que os apelantes estavam coligados entre si e que o desiderato do ajuntamento não se limitava à mera prática de crimes certos e definidos, mas a uma verdadeira série indeterminada de infrações penais graves, com especial destaque para o monopólio do tráfico de drogas na cidade de Água Boa/MT. Deste modo, é evidente a organização estruturalmente ordenada e a divisão de tarefas para a empreitada ilícita, pois o fato de os réus, cada qual com seu encargo pré-estabelecido, prontamente agirem com vistas a satisfazer os interesses do “Comando Vermelho”, não só traficando, mas também mediante repasses pecuniários periódicos, não me deixa qualquer dúvida quanto ao ânimo de todos eles e a suas respectivas intenções de se ajuntarem à agremiação delinquente organizada, de maneira perene e habitual. Em suma, as provas dos autos denotam a habitualidade, estabilidade e permanência com que os recorrentes implementavam a sua vontade livre e consciente de integrar a agremiação ilícita, ainda que informalmente, mantendo contatos revestidos de conexão estruturalmente ordenada em cadeias de hierarquia e com divisão funcional de tarefas com outros integrantes (animus associativo), assim como a intenção de auferir vantagem através da prática indeterminada de infrações penais graves, como tráfico de drogas, associação para o narcotráfico, lesão corporal etc. (liame volitivo específico). Com tais considerações, mantêm-se as condenações dos apelantes LUCAS, DANILO, ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI, EDIMILSON, JOÃO CARLOS, DOUGLAS e BRUNO pelo crime do art. 2.º da Lei n.º 12.850/2013, inclusive com a incidência da agravante do papel de comando em relação ao último (§3.º). 2. Do pedido de absolvição do crime de associação para o tráfico de drogas: O crime de associação para o narcotráfico configura-se mediante a associação, de duas ou mais pessoas, voltada para o fim (liame subjetivo) de praticar, reiteradamente ou não, algum ou vários dos crimes previstos no artigo 33, caput e §1º, e artigo 34 da Lei n.º 11.343/06, sendo prescindível, contudo, a efetiva ocorrência material de qualquer das infrações visadas pelos associados. Demais disso, para a subsunção do fato à norma, consentem a jurisprudência e a doutrina pátrias que se exige ainda a estabilidade e a permanência da associação, estreitamente vinculadas à finalidade delituosa específica, de forma que a caracterização deste crime não se contenta com o simples dolo de agir conjuntamente, em concurso, para a prática de um ou mais crimes, sendo indispensável o dolo específico de associar-se de forma permanente e estável. Dito de outra forma, a incursão do agente nas penas de associação para o tráfico de drogas não prescinde da presença da intenção de permanência na societas sceleris, que não deve ser confundida com as hipóteses de mera coautoria. Nessa linha de raciocínio, leciona Guilherme Nucci que “exige-se elemento subjetivo do tipo específico, consistente no ânimo de associação, de caráter duradouro e estável. Do contrário, seria um mero concurso de agentes para a prática do crime de tráfico” (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. – 8. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 362). Na mesma toada firmou-se a jurisprudência deste e. TJMT: “5. Para a configuração do crime de associação para o tráfico de drogas, impõe-se a comprovação inequívoca da estabilidade e perenidade do ânimo associativo, sendo prescindível, contudo, a efetiva prática da traficância”. (Incidente de Uniformização de Jurisprudência n.º 101532/2015, DJE n.º 9998, de 11/04/2017) – Grifei. In casu, ao contrário do que foi sustentado pela defesa, o acervo probatório revela com segurança a presença do ânimo associativo permanente e estável entre os apelantes, que se organizavam habitualmente para a prática e o desenvolvimento do tráfico de drogas, conforme se extrai das provas digitais angariadas em sede cautelar e da prova oral colhida durante a instrução criminal, cujo conteúdo já foi exaustivamente cotejado no tópico anterior deste aresto, razão pela qual me abstenho de repeti-las, para evitar tautologia. Mesmo porque, é cediço que “3. As decisões judiciais devem ser analisadas como um todo e não por capítulos.” (HC n. 296.381/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, julgado em 26/8/2014, DJe de 4/9/2014). Com efeito, as mensagens de áudio e texto trocadas entre os recorrentes, minuciosamente examinadas alhures, denotam que, além de integrarem a organização criminosa “Comando Vermelho” em capacidades extrínsecas à traficância em si, os agentes mantinham ainda uma sólida e perene congregação de vontades e comunhão de esforços entre si para a realização desta atividade ilícita (narcotráfico), tudo com divisão de tarefas bem delineada. A propósito, verificou-se que o recorrente BRUNO, com o auxílio de EDIMILSON, não só praticava o comércio malsão, mas também coordenava a distribuição do produto e a mercancia realizada pelos demais, o que se constatou, por exemplo, quando BRUNO foi abordado por um terceiro indivíduo (Wallison Gomes, vulgo “WG2”), oferecendo-se para ser o novo fornecedor de drogas sintéticas oriundas do Rio de Janeiro/RJ em Água Boa/MT, ao que BRUNO respondeu que tentaria viabilizar o fechamento da parceria (Relatório de Inteligência no ID 227283269 - Pág. 4/7 e áudios originais armazenados do ID 227284165 ao ID 227284168). Embora não haja notícia nos autos se o negócio ilícito mencionado acima chegou a se concretizar, foi encontrado no celular de BRUNO um vídeo em que são cortados em porções individuais os selos (“doces”) de ao menos duas cartelas de ácido lisérgico (LSD), sendo de se pontuar que, em juízo, BRUNO confirmou a natureza sintética da droga – embora tenha negado a respectiva finalidade mercantil. Ademais, no celular de BRUNO foi localizada uma lista com o controle das drogas que ele distribuía aos seus coligados, intitulada “Galo Novo 100g”, em referência à nova remessa de entorpecentes que seria difundida, sendo de se pontuar que, no rol de varejistas, é possível visualizar anotado o vulgo “Naudo”, isto é, o apelante ARISNALDO DA SILVA GOMES, ao lado do algarismo “5” e do número “100” pago e outros “100” pendente. Sobre o documento de controle da traficância realizada pelo grupo, como bem pontuaram os investigadores que analisaram os dados do aparelho celular, “Nota-se que os compradores repetem a compra por diversas vezes, evidenciando ainda que não se tratam de usuários, mas sim revendedores, donos de bocas de fumo”. (ID 227283268 - Pág. 9) – Destaquei. Em relação ao ânimo associativo do recorrente EDIMILSON, o auxílio habitual e estável prestado por ele ao comparsa BRUNO pôde ser inferido por meio do diálogo travado entre a dupla na ocasião em que BRUNO vende cocaína (“um brabo spanca crânio”) para o usuário “Leandro Gonçalves Ab”. Naquela oportunidade, BRUNO precisa da balança de precisão (“BL”) para pesar a droga, sendo que o objeto fica guardado com EDIMILSON, razão pela qual aquele solicita que este prepare o instrumento de pesagem, que ele passaria para buscar, em face do que EDIMILSON responde com prontidão que a balança está “facinho” e, assim que BRUNO encostar, leva para ele, a fim de realizar a venda, após o que os apelantes ainda interagem sobre troca de entorpecentes, in verbis: “(áudio 14segundos) - BRUNO diz para EDMILSON: ‘Hein zika deixa eu fala pro cé ééé aquela BL eu vou precisa dela, eu to descendo aqui no Vila agora ai da o balão lá em baixo e eu vou passa, cê ta com ela ai?’ (áudio 5segundos) - EDMILSON responde: ‘Hein, to de mais uai, to demais, ela ta facim aqui pó. só o ce encosta aqui que eu já levo ela pro cé.’ (áudio 9segundos) - BRUNO diz para EDMILSON: ‘O, demoro viado, demoro, fala pro cé, eu vou passa ai, passa ai agora, só to dando o Balão aqui no Vila.’ (áudio 10segundos) - BRUNO diz para EDMILSON: ‘Ou pega 25 pra mim, 25 pra mim, e vamo lá em casa dá um pião lá, lá se já pega o rex já, solda um cara ali’”. (Relatório de Inteligência no ID 227283269 - Pág. 24/25 e áudios originais armazenados do ID 227284171 ao ID 227284176) – Destaquei. Pontue-se que, logo depois disso, BRUNO efetivamente realiza a venda da droga ao usuário e recebe o comprovante de transferência (ID 227283269 - Pág. 12), de modo que não há dúvida quanto à concorrência dos agentes para o narcotráfico, de maneira permanente e estável, mesmo porque, o próprio conteúdo da interação transcrita acima denota normalidade corriqueira e a habitualidade com que a colaboração recíproca era levada a efeito. Concomitantemente à traficância direta perpetrada pelos agentes, assim como BRUNO exercia função específica de coordenador e EDIMILSON de auxiliar, tem-se ainda que DOUGLAS também se encarregava de incumbência cumulativa, qual seja, de guardar e preparar as substâncias ilícitas que seriam revendidas por seus comparsas. Tal conclusão encontra respaldo nos diálogos travados entre DOUGLAS e SANDERLEI entre 30/08/2022 e 31/08/2022, dos quais é possível depreender que, embora de maneira velada, o segundo pede fornecimento de drogas ilícitas ao primeiro e este diz que não teve tempo de “cortar hoje”, ou seja, de preparar o produto, mas que se esforçaria para “estar soltando” para SANDERLEI o quanto antes, em face do que este responde que aguardará até o dia seguinte. Passada a primeira data, SANDERLEI novamente interpela DOUGLAS e este diz que levou a mercadoria até o interlocutor, porém, como não havia ninguém no local, deixou dentro da caixinha de correio, após o que SANDERLEI manda o comprovante de pagamento eletrônico instantâneo (PIX), no vultoso valor de 1.500,00 (mil e quinhentos reais), transferidos da conta bancária de ARISNALDO para a de DOUGLAS. Deveras, além de evidenciar as incumbências compartimentalizadas de DOUGLAS (preparo e redistribuição) e SANDERLEI (venda a varejo) no âmbito da associação traficante, tal interação demonstra também o dolo dos agentes e seu ânimo associativo permanente e estável, pois revela que a dinâmica do grupo era dotada de protocolos bem definidos e habituais, pois DOUGLAS diz que não teve tempo de cortar “hoje”, sugerindo que tal prática era iterativa. Ademais, o elemento subjetivo é traduzido pela confiança mútua entre os associados, a qual permitiu que DOUGLAS deixasse substâncias entorpecentes avaliadas a R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) na caixa de correio, para que SANDERLEI posteriormente as “resgatasse”, ao passo que SANDERLEI e ARISNALDO transferem a DOUGLAS o vultoso montante minutos após receberem a informação, muito possivelmente sem sequer conferir se a mercadoria estava ou não no compartimento informado. Oportunamente, destaque-se a manifesta carência de verossimilhança na tese defensiva de que a tratativa ora cotejada consistia em mera compra e venda de aparelho celular. A uma, porque celulares não precisam ser “cortados” para que o vendedor possa “estar soltando” o produto. A duas, porque o modus operandi aqui usado por SANDERLEI e DOUGLAS não era estranho ao grupo traficante, já que, em conversa com outro traficante (“Metranha Dr”), SANDERLEI diz que lhe deixou drogas justamente na caixa de correios: “Deixei duas de cento e cinquenta dentro da caixinha de correio, dentro dum potinho de pó royal”. (ID 227284265 - Pág. 15) – Negritei. Tanto é assim que, no momento de sua prisão em flagrante, DOUGLAS foi surpreendido com pluralidade de porções de drogas ilícitas (sendo uma pequena e duas grandes), além de R$ 293,00, conforme auto circunstanciado de busca e apreensão e termo de exibição e apreensão (ID 227285661 - Pág. 15 e 19), o que corrobora sua agremiação aos demais, com o objetivo comum e reiterado de traficar entorpecentes. No mesmo sentido, é patente a certeza quanto ao ânimo associativo permanente e estável do qual estavam imbuídos JOÃO CARLOS, LUCAS, SANDERLEI, ARISNALDO e PEDRO, todos com o objetivo comum de perpetrar em conjunto o tráfico de drogas. Com efeito, embora JOÃO CARLOS alegue em juízo que vendeu drogas uma única vez, as provas indicam que o réu amiúde comercializava entorpecentes com seus comparsas, o que se evidencia tanto pelas diversas conversas com usuários, em datas distintas, em que ele sinaliza que “está na ativa” (ID 227284246 - Pág. 5), quanto pelas suas tentativas reiteradas de ser “desbrecado” para “ganhar um dinheiro”, ou seja, de suspender a sua proibição de comercializar entorpecentes, conforme esclareceram os policiais civis ouvidos em juízo (ID 227284246 - Pág. 6/7). Este cenário revela a habitualidade com que JOÃO CARLOS difundia psicotrópicos e o seu elo associativo estável e permanente com os demais comparsas, tanto é que, certa feita, chega a indagar ao corréu Carlos Alexandre Dias, vulgo “Ezequiel” (autos desmembrados), quem seria o atual fornecedor de cocaína (“O raio”) do grupo, porque ele estaria “com altos corre aki”, ou seja, elevada procura por parte de consumidores, circunstâncias que certamente condizem com a assiduidade na traficância e com solidez da coligação com os mesmos comparsas. Outrossim, quando indagado por JOÃO CARLOS qual dos associados possuiria entorpecentes a fornecer para revenda, o vulgo “Ezequiel” repassa para JOÃO CARLOS justamente o contato telefônico do recorrente LUCAS, o que também basta para demonstrar a associação deste aos demais, com o especial desiderato de traficar reiteradamente. Da mesma forma, a análise dos dados extraídos dos aparelhos celulares de SANDERLEI e PEDRO deixa evidente a insólita frequência com que os dois e ARISNALDO comercializavam drogas ilícitas por WhatsApp, assim como evidencia o liame subjetivo que vinculava o trio, pois, conforme os elementos amplamente escrutinados no tópico anterior deste aresto, SANDERLEI usava PEDRO para realizar a entrega dos entorpecentes que comercializavam, tendo ambos sido filmados por câmeras de monitoramento justamente enquanto praticavam a mercancia ilícita, conforme Relatório Técnico no ID 227284267. Quanto a ARISNALDO, o liame subjetivo que revestia sua conduta ressaiu comprovado não só através de transferência de elevado valor pecuniário para que SANDERLEI adquirisse psicotrópicos do fornecedor DOUGLAS, mas também do conteúdo dos diálogos por ele travados com os demais recorrentes, citando-se, por exemplo, a inusitada naturalidade com que ele discute com SANDERLEI sobre os métodos de vender cocaína (simbolizada na conversa pelo emoji de um “raio”). Na conversa, ARISNALDO indaga SANDERLEI se ele “só tem picado?” e este responde que sim, listando os preços de 150, 300 e 500, após o que o primeiro responde casualmente “Ah tá. Achei que c ia soltar na G”, referindo-se à venda por grama (ID 227284265 - Pág. 19). Em semelhante senda, além das inúmeras tratativas sobre drogas averiguadas no celular de PEDRO, nota-se ainda a densidade de seu vínculo associativo com SANDERLEI e ARISNALDO, pois PEDRO depende do aval de SANDERLEI para entregar a droga, ao passo que, quando está impossibilitado de fazê-lo, passa o contato de ARISNALDO aos usuários, in verbis: “Ainda no dia 01/09/2022 Pedro diz para Cleverson falar com Sanderlei e que ele irá até Cleverson, depreende-se que Pedro busca o entorpecente com Sanderlei para entregar para Cleverson. Nas imagens Cleverson diz “Sssim não vai junto no bico dos patos / ia até te levar sábado / Só fica me tira do meu / Tá ligado q sempre te dou agrado” e Pedro retorna “Fala com ele ai que eu levo / Mais é só com ele / Liga / Ele tá no quarto”, infere-se de tal diálogo que Cleverson é cliente frequente de Pedro e Sanderlei tendo em vista que insiste para que Pedro vá levar pois sempre lhe dá um “agrado” e que teria que falar primeiro com Sanderlei para depois Pedro levar (...). Na conversa datada de 03/09/2022 entre o investigado Pedro e o contato “Tiago Quintana” (66) 9 8451-4449, este tenta comprar entorpecente com Pedro e como não consegue solicita o telefone de outro investigado trata-se de Arisnaldo da Silva Gomes CPF 047.085.241-02 vulgo “Naldo” como é possível observar na imagem em que “Tiago Quintana” envia a mensagem ‘Já q não vai falar comigo / Manda o número do naldo (...) Quero 100 conto” e Pedro retorna “Mano tô em casa nao / Tô aqui no cristalino (...) Vou ti mandar um número ai’”. (ID 227284326 - Pág. 5 e 12/13) – Destaquei. Por derradeiro, consigne-se que a vasta gama de provas digitais arrecadadas dos celulares apreendidos, além de lícita e suficiente para amparar o édito condenatório (art. 155, caput, in fine, CPP), conforme já exposto anteriormente, encontra ainda amplo respaldo na prova oral colhida em juízo, pois as testemunhas Matheus Soares Augusto, Wandervaney Soares da Silva e Dheynny de Melo Carvalho foram unívocas ao esclarecer que, além de integrarem a organização criminosa “Comando Vermelho”, os apelantes também se associaram entrei si de maneira sólida e perene, com a finalidade específica de comercializar entorpecentes na cidade de Água Boa/MT. Em suma, o arcabouço probatório é pródigo ao atestar que, ao traficarem juntos, guardando, transportando, preparando, entregando, vendendo e expondo à venda drogas ilícitas, o dolo dos acusados extrapolou o mero concurso de agentes e adquiriu conotações de permanência e de estabilidade que caracterizam a societas criminis. Nesses termos, à luz do princípio do livre convencimento motivado, estou convencido de que as provas coligidas ao feito, em ambas as fases processuais, são suficientes para demonstrar a materialidade do crime de associação para o narcotráfico, com todas as elementares objetivas e subjetivas inerentes ao tipo penal do art. 35, Lei n.º 11.343/2006, assim como para atestar a respectiva autoria que recai sobre os apelantes LUCAS, ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI, EDIMILSON, JOÃO CARLOS, DOUGLAS e BRUNO. Conservam-se, pois, as condenações pelo delito de associação para o tráfico. 3. Do propalado bis in idem entre os crimes de organização criminosa e associação para o tráfico de drogas: Alternativamente, os apelantes LUCAS, ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI e EDIMILSON pretendem a absolvição do delito de organização criminosa, ao passo que BRUNO e JOÃO CARLOS buscam a absolvição do crime de associação para o narcotráfico, todos com fulcro na tese de bis in idem, sustentando que a manutenção da condenação por ambos os delitos configuraria dupla punição pelo menos fato. Sem razão os recorrentes. Acerca do tema, tanto o crime tipificado no art. 35 da Lei n.º 11.343/06 e quanto o crime do art. 2.º da Lei n.º 12.850/13 visam tutelar a paz pública e, não obstante tal identidade de bens jurídicos primários, friso que não é juridicamente impossível a condenação de uma mesma pessoa como incursa nos dois tipos penais, pois, em determinados casos, diante da pluralidade de vínculos associativos, em diferentes contextos fáticos, o mesmo indivíduo pode incorrer concomitantemente tanto no delito de associação para o tráfico de drogas quanto no crime de organização criminosa, voltada à prática de outras infrações penais graves ou de caráter transnacional. Para tanto, é necessário que as provas permitam distinguir, no plano fático e jurídico, os crimes de associação para o tráfico e de organização criminosa, isto é, a dupla condenação exige a demonstração a contento dos liames subjetivos autônomos e simultâneos do mesmo indivíduo, com vistas a realizar a traficância juntamente com outrem de maneira permanente e estável (art. 35, Lei n.º 11.343/06) e, paralelamente, também com vistas a praticar outras infrações graves (incluindo-se aí o próprio narcotráfico) em conluio organizado com terceiros (art. 2.º, Lei n.º 12.850/13). Nesse sentido orienta a jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça, de acordo com a qual a associação para o tráfico e a organização criminosa constituem tipos penais autônomos e, havendo desígnios independentes e contextos fáticos e subjetivos distintos nas condutas, a condenação simultânea se mostra escorreita, consoante se infere a partir dos seguintes precedentes: “3. O entendimento da Corte local encontra-se em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que ‘é firme ao asseverar que não configura bis in idem a imputação concomitante da prática dos crimes de associação para o tráfico de drogas e organização criminosa, por se tratar de tipos penais autônomos’. (...) Ademais, não há se falar em duas imputações pelo mesmo fato, porquanto devidamente indicado que havia ‘desígnios autônomos, da integração de organização criminosa (Primeiro Comando da Capital - PCC) e da associação para o tráfico’”. (AgRg nos EDcl no HC n. 788.543/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 9/10/2023, DJe de 11/10/2023) – Destaquei. “3. O fato de o agente, em contextos diversos, integrar uma organização criminosa, que, conforme previsão legislativa, consiste em quatro ou mais pessoas se associarem para o fim de cometer crimes cuja pena máxima ultrapasse quatro anos, não absorve a conduta específica, prevista na Lei n. 11.343/2006, do indivíduo que está associado, de maneira permanente e estável, com diversos agentes com o objetivo de incidir nas condutas criminosas previstas na Lei de Drogas”. (AgRg no HC n. 820.954/SC, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 26/6/2023, DJe de 29/6/2023) – Negritei. Com base nisso, esta Terceira Câmara Criminal tem se orientado no sentido de que, se o arcabouço probatório sugere que o desígnio do agente, ao se agremiar de maneira permanente e estável a outrem, voltava-se exclusivamente à prática do crime de tráfico de drogas em uma mesma conjuntura, não permitindo discernir os contextos fáticos diferentes, a existência de elementos subjetivos autônomos, de vínculos associativos distintos ou vontades independentes do mesmo indivíduo visando várias outras infrações penais (inclusive, eventualmente, o próprio narcotráfico), somente então se estará diante de bis in idem, o que não é o caso dos autos. Isto porque, na espécie, é nítido que, além de se associarem entre si para a prática reiterada do narcotráfico, de maneira permanente e estável, os apelantes também se agremiaram ao “Comando Vermelho” e integravam a facção em uma inegável capacidade extrínseca àquela traficância, sendo evidente não só os desígnios autônomos em ambas as condutas, mas também a diversidade de vínculos subjetivos, já que, na organização criminosa, optaram por se inserir em cadeia hierárquica na qual se submetiam a outros indivíduos que sequer foram denunciados nesta ação penal, tudo a tornar imiscíveis as conjunturas fáticas. Tanto é que a investigadora Wandervaney Soares da Silva, na qualidade de testemunha compromissada, esclareceu em juízo que o núcleo do “Comando Vermelho” composto pelos apelantes já vinha atuando há tempos em Água Boa/MT e que esta célula prestavam contas a faccionados superiores situados em outras cidades, não só quanto aos valores provenientes da comercialização de drogas, mas também em relação às penalidades “salve”, aplicadas como castigo quando algum membro desacatava o estatuto do grupo infrator. A propósito, ficou evidenciado que, sob a liderança do apelante BRUNO, auxiliado por seu braço direito EDIMILSON, os demais recorrentes concorriam não só para o tráfico de drogas, mas também ajudavam a financiar a organização criminosa “Comando Vermelho”, mediante a cobrança e repasses periódicos de valores pecuniários para fortalecer a facção, sendo que a inadimplência das mensalidades (“camisas”) resultavam em penalidades aos faccionados, como ocorreu com o apelante JOÃO CARLOS, que foi alvo de castigo pelos membros hierarquicamente superiores e se sujeitou à sanção imposta (“brecado”). Ademais, as fotografias extraídas do aparelho celular de BRUNO revelam que ele costumava ostentar diversas armas de fogo, inclusive armas longas e de grosso calibre, as quais, segundo as testemunhas ouvidas, foram posteriormente apreendidas no depósito conhecido como “paiol do ‘Comando Vermelho’”, a demonstrar que ele tinha pleno acesso ao arsenal da facção. Do mesmo modo, as provas revelam que SANDERLEI e LUCAS ainda exerciam a “Disciplina” no interesse da facção, aplicando ou viabilizando a aplicação de castigos em face dos membros insubordinados, devedores ou qualquer cidadão que desacatasse as normas do “CV-MT” em seu território, conforme confissão judicial de LUCAS e mensagens de áudio trocadas entre SANDERLEI e o comerciante “Clovisney” (ID 227284265 - Pág. 23/24). No caso dos apelantes PEDRO, ARISNALDO, DOUGLAS, EDMILSON e JOÃO CARLOS, não obstante as suas incumbências e tarefas no âmbito da facção fossem precipuamente ligadas à difusão ilícita de entorpecentes, é evidente que o dolo destes não se limitou à traficância e à associação para a traficância, já que o repasse das taxas mensais devidas à organização e exultação ao “Comando Vermelho” demonstram efetiva vontade independente de integrar a facção, em capacidade que extrapolava os crimes autônomos perpetrados pelo organismo. O dolo dos agentes restou demonstrado também a partir da verdadeira promoção e enaltecimento ao organismo infrator, que recorrentes frequentemente externavam em conversas privadas e nos grupos virtuais dos quais participavam, sempre referindo-se à facção como “família” e aos demais faccionados como “irmãos” ou “manos”, amiúde incentivando uns aos outros a cumprirem suas responsabilidades junto ao grupo delinquente e alertando-se entre si sobre eventual patrulhamento policial que pudesse embaraçar o regular funcionamento das atividades facciosas. Diante deste cenário probatório, é explícita a existência de contextos fáticos distintos, de vínculos subjetivos imiscíveis e de desígnios autônomos nas condutas dos apelantes, não havendo dúvida, in casu, de que pertenciam à organização criminosa “Comando Vermelho” e atuavam em prol da facção de maneira extrínseca e que claramente desbordava da associação por eles formada para o tráfico de drogas. Diante deste cenário probatório, devem ser mantidas as condenações simultâneas dos recorrentes LUCAS, ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI, EDIMILSON, DOUGLAS, BRUNO e JOÃO CARLOS pelos crimes do art. 2.º da Lei n.º 12.850/2013 e art. 35 da Lei n.º 11.343/2006, em consonância com a linha de precedentes desta e. Corte de Justiça estadual: “Não há bis in idem pela condenação do apelante tanto por organização criminosa quanto por associação para o tráfico de drogas, diante da pluralidade de vínculos associativos, em diferentes contextos fáticos e com condutas distintas”. (TJ-MT - N.U 1011443-50.2022.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 20/08/2024, Publicado no DJE 26/08/2024) – Grifei. 4. Do pedido de absolvição do crime de tráfico de drogas – Pleito subsidiário de desclassificação da conduta para posse de drogas para consumo pessoal: Os apelantes ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI, EDIMILSON, DOUGLAS e JOÃO CARLOS pugnam pela absolvição do crime do art. 33 da Lei n.º 11.343/2006, por insuficiência de provas para a condenação, notadamente tendo em vista a falta de materialidade delitiva ante a não apreensão do entorpecente; ao que os quatro primeiros acrescentam ainda pleito alternativo de desclassificação da conduta para o delito do art. 28 da mesma Lei. A insurgência deve ser desprovida. De início, pontue-se que a materialidade do delito de tráfico de drogas é inconteste e pode ser inferida dos Autos de Apreensão (ID 227284347 - Pág. 15 e ID 227285661 - Pág. 15 e 19); do Relatório Policial n.º 2022.13.44913 (ID 227284658 - Pág. 30/49); do Laudo Pericial de Pesquisa em Resquício de Droga em Veículo Automotor (ID 227284183); do Laudo de Exame Pericial em Substâncias Entorpecentes (ID 227284347 - Pág. 26/29); do Laudo de Exame de Constatação de Droga (ID 227285661 - Pág. 23/27); do Laudo de Constatação de Droga (ID 227284658 - Pág. 62/64); além da prova oral colhida na fase extrajudicial e em juízo. Esclareça-se que, no momento de suas prisões, os apelantes BRUNO, EDIMILSON, DOUGLAS e ARISNALDO foram flagrados em poder de drogas ilícitas, as quais foram apreendidas e submetidas à perícia, apresentando resultado positivo para maconha e cocaína, conforme os laudos de constatação discriminados alhures, de modo que não procede o argumento da i. defesa de DOUGLAS, no sentido de que sua condenação se embasaria unicamente na confissão. Além disso, embora nem todos os recorrentes tenham sido surpreendidos na posse direta de substâncias entorpecentes, é cediço que, em situações excepcionais, é possível a comprovação da ocorrência material do delito de tráfico por outros meios que não a apreensão em si dos narcóticos, conforme iterativa jurisprudência das Cortes Superiores. E, conquanto a i. defesa dos acusados ARISNALDO, PEDRO, SANDERLEI e EDIMILSON traga à baila precedente julgado em 12/04/2016 (RHC 65.205/RN, Rel. Min. Jorge Mussi), para invocar a ocorrência de superação do entendimento anterior pelo Superior Tribunal de Justiça (overruling), é certo que paradigmas mais recentes apontam que o posicionamento do Tribunal da Cidadania segue firme no sentido de que é desnecessária a apreensão de drogas para caracterização do crime de tráfico, contanto que outros elementos de prova evidenciem a materialidade do ilícito: “1. A consolidada jurisprudência desta Corte Superior de Justiça já se posicionou quanto à desnecessidade de apreensão de drogas para caracterização do crime de tráfico, desde que outros elementos de prova evidenciem a materialidade do ilícito. No caso, as interceptações telefônicas foram decisivas no sentido de desnudar a articulação para a prática dos crimes imputados. Precedentes”. (AgRg no HC n. 788.240/BA, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 13/8/2024, DJe de 16/8/2024) – Destaquei. “4. A ausência de apreensão de drogas na posse direta do agente não afasta, de forma automática, a materialidade do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, especialmente quando existirem outros elementos de prova aptos a atestar a prática delitiva”. (AgRg no HC n. 746.119/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 27/9/2022, DJe de 30/9/2022) – Negritei. É também o entendimento deste Sodalício estadual: “2) Na esteira da jurisprudência dos Tribunais Pátrios, é possível que, excepcionalmente, a materialidade do delito de tráfico de entorpecentes seja comprovada por outros meios [testemunhal] que não a apreensão do entorpecente com subsequente confecção de laudo pericial, como ocorre na hipótese. (...)”. (N.U. 0002716-87.2009.811.0006, Relator: GILBERTO GIRALDELLI, Data de Julgamento: 24/06/2020, Terceira Câmara Criminal, Data de Publicação: 26/06/2020) – Negritei. In casu, a autoria dos recorrentes pelo delito de tráfico de drogas restou amplamente evidenciada, inclusive daqueles que não foram surpreendidos com entorpecentes. Com efeito, ao ser ouvido em juízo, o delegado da Polícia Civil Matheus Soares Augusto declarou que todos os apelantes estavam interligados entre si, sob a liderança local do recorrente BRUNO, no pertencimento comum à organização criminosa “Comando Vermelho”, e que os entorpecentes comercializados pelos acusados pertenciam à aludida facção como um todo, inclusive as drogas apreendidas por ocasião das prisões em flagrante de alguns dos suspeitos, como do próprio BRUNO e do apelante DOUGLAS. As declarações judiciais do agente de segurança pública são corroboradas pelas provas digitais coletadas dos celulares apreendidos, as quais são abundantes ao atestar que todos os recorrentes comercializavam drogas ilícitas para o “Comando Vermelho” à época dos fatos. Com efeito, no celular de JOÃO CARLOS, é possível ver que ele oferece entorpecentes para diversos usuários, em datas distintas, como para os contatos “Mariaaaaaq”, “Uallanbillaw” e “Cleyt”, além de enviar foto de cocaína para o consumidor “agrovendas” e propagandear “pega por 300 4g. levo ai agr” e de fechar uma venda de “braw” com o contato “Igor Tomae” (ID 227284246 - Pág. 4/5). Ademais, em juízo, o próprio JOÃO CARLOS confessou que alienou onerosamente narcóticos ao consumo de terceiros, enquanto as demais provas mostram que ele buscava ser “desbrecado”, para voltar a ganhar dinheiro traficando. No mesmo sentido, BRUNO praticava o comércio malsão com a ajuda de EDIMILSON, o qual guardava a balança de precisão usada nas vendas e, em 06/07/2022, disponibilizou o instrumento de pesagem para que BRUNO conseguisse realizar a venda de dez ou quinze gramas de cocaína para o usuário “Leandro Gonçalves”, pelo valor de R$ 100,00 (ID 227283269 - Pág. 24/25). Outrossim, no diálogo travado entre a pessoa de “Sinpt” e BRUNO, aquela explica para este que vinha pegando drogas com EDIMILSON mediante pagamento a prazo, ao elucidar que ““eu to pagando pra ele por quilo, ta ligado? Era só 550 só que eu devo pra ele, num tem? Ai ontem eu di 180 real pra ele, ta ligado? Nessa semana vou dá tudo e nóis já fecha os 550”. (ID 227283269 - Pág. 10). Igualmente, o veículo de BRUNO, apreendido por ocasião das prisões em flagrante deste e de EDMILSON, foi periciado e constatou-se que continha vestígios de maconha no porta-malas (ID 227284183), o que corrobora a traficância, pois a testemunha Matheus Soares Augusto esclareceu que, de acordo com a experiência policial, meros usuários não levam droga para consumo próprio em tal compartimento veicular. Se não bastasse, as prisões de BRUNO e EDIMILSON resultaram ainda na apreensão de balança de precisão e de rolo de plástico filme, sem contar que o primeiro portava R$ 400,00 em espécie e o segundo R$ 1.642,00 em moeda nacional, de procedência não explicada, o que corrobora o desiderato mercantil da droga apreendida (ID 227284658 - Pág. 44/46). Da mesma forma, a partir dos dados do aparelho celular de SANDERLEI, foi possível constatar diversas tratativas sobre a venda de drogas, como ocorreu com os contatos “Gordinho”, “marciooliveiracarvalho13” e “Metranha Dr”, sendo aferível ainda que ele se utilizava do auxílio dos apelantes PEDRO e ARISNALDO para traficar (ID 227284265 - Pág. 6/14). Isto porque, na interação com “Metranha Dr”, SANDERLEI diz que determinará que PEDRO entregue os entorpecentes ao comprador, ao passo que, no diálogo com o recorrente DOUGLAS, SANDERLEI usa ARISNALDO para transferir o significativo valor referente ao pagamento do produto ilícito comprado de DOUGLAS, na importância de R$ 1.500,00 (ID 227284265 - Pág. 21/22). Esta última interação demonstra ainda que, além de ter sido flagrado na posse de substância entorpecente (cerca de 50g de maconha) e quantia pecuniária não ínfima (R$ 293,00), DOUGLAS realmente guardava as drogas com finalidade comercial, pois, ao dialogar com SANDERLEI, DOUGLAS diz que não poderia lhe vender o entorpecente naquela data, porque não teve tempo de prepará-lo (“cortar”), e que lhe entregaria no dia seguinte. Na data seguinte, DOUGLAS deixa as drogas na caixinha de correio de SANDERLEI, informa-o e recebe dele o comprovante de pagamento eletrônico instantâneo (PIX) no considerável valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), evidenciando-se assim a expressiva quantidade de narcóticos negociada. Por oportuno, repise-se que, conforme já exposto no tópico n.º 02 deste aresto, carece sobremodo de verossimilhança a tese defensiva de que a tratativa ora cotejada consistia em mera compra e venda de aparelho celular. A uma, porque celulares não precisam ser “cortados” para que o vendedor possa “estar soltando” o produto. A duas, porque o modus operandi aqui usado por SANDERLEI e DOUGLAS não era estranho ao grupo traficante, já que, em conversa com outro traficante (“Metranha Dr”), SANDERLEI diz que lhe deixou drogas justamente na caixa de correios: “Deixei duas de cento e cinquenta dentro da caixinha de correio, dentro dum potinho de pó royal”. (ID 227284265 - Pág. 15) – Negritei. Em idêntica vertente, além de ser efetivamente flagrado com substâncias ilícitas (cocaína e maconha) em sua residência, ARISNALDO as possuía com finalidade mercantil, conforme se depreende das conversas achadas no celular de SANDERLEI, na medida em que ambos conversam sobre os preços a serem tabelados nas mercadorias “picadas” (“Tem / Sim “150 300 500”) e ARISNALDO revela que compraria para revender, ao dizer “É pq eu queria 5g. Mais ninguém tem. Mais tarde os cara vai querer mais”. (ID 227284265 - Pág. 18/19). Em idêntico sentido, no celular de PEDRO, foi encontrada uma miríade de tratativas em que ele comercializa drogas ilícitas com terceiros, sendo que, em um dos diálogos, quando um usuário não obtém sucesso em adquirir o produto espúrio de PEDRO, logo pede o contato de ARISNALDO, o qual é repassado por PEDRO, in verbis: “Adiante no dia 01/09/2022 Cleverson envia para Pedro uma mensagem de texto “Kd a droga / ???” Pedro responde com áudios e Cleverson escreve “Trás a caideira aí”. Ainda no dia 01/09/2022 Pedro diz para Cleverson falar com Sanderlei e que ele irá até Cleverson, depreende-se que Pedro busca o entorpecente com Sanderlei para entregar para Cleverson. (...). Na data de 26/08/2022 tem-se a conversa entre o investigado Pedro e o contato “Henrique Martin” (16) 9 9770-4661, o qual envia “E o raio daquele dia da festa Bom? / Vc tem do bom aqui?” e o Pedro o responde via áudios, salienta-se que onde menciona o termo “raio” quer significar cocaína. Adiante no dia 27/08/2022 Pedro envia para “Henrique Martin” uma foto aparentando ser substância entorpecente cocaína em um invólucro de plástico e o texto “E / Nosso povo não para”. No dia 31/08/2022 Pedro envia uma mensagem e apaga, e outra de visualização única, em seguida “Henrique Martin” questiona “Da Bahia? / Boa? / ???” infere-se que Pedro havia lhe enviado algo relacionado à entorpecente tendo em vista o contexto apresentado ao longo do diálogo. (...). No diálogo datado de 03/09/2022 entre Pedro e o contato “Calixto” (66) 9 8443-0188, este envia “Arruma as grama / E traz aki / Q o dinheiro tá na mão” e Pedro retorna com um áudio e o texto “Ver com ele ai / Eu tô e ape” possivelmente referindo-se a Sanderlei para tratar da aquisição de substância entorpecente. (...). Na conversa datada de 03/09/2022 entre o investigado Pedro e o contato “Tiago Quintana” (66) 9 8451-4449, este tenta comprar entorpecente com Pedro e como não consegue solicita o telefone de outro investigado trata-se de Arisnaldo da Silva Gomes CPF 047.085.241-02 vulgo “Naldo” como é possível observar na imagem em que “Tiago Quintana” envia a mensagem “Já q não vai falar comigo / Manda o número do naldo (...) Quero 100 conto” e Pedro retorna “Mano tô em casa nao / Tô aqui no cristalino (...) Vou ti mandar um numero ai. (...)”. (ID 227284326 - Pág. 5/13). Por derradeiro, destaque-se a existência de imagens registradas por câmeras de monitoramento, em que SANDERLEI e PEDRO foram captados justamente enquanto estariam traficando (ID 227284267). Portanto, está evidenciada a prática do tráfico de drogas pelos apelantes, inclusive nos moldes previstos pelo art. 28, §2.º, da Lei n.º 11.343/2006, não havendo o que se falar em absolvição por falta de provas, tampouco em desclassificação da conduta para posse de drogas para consumo pessoal, pois, uma vez constatada a efetiva comercialização por parte dos agentes e a destinação mercantil das substâncias, como se viu in casu, eventual condição de usuário, ainda que procedente, não elidiria a responsabilização penal pelo crime do art. 33 da Lei n.º 11.343/2006. Sobre o tema, ao uniformizar sua jurisprudência, a Turma de Câmaras Criminais Reunidas do TJMT editou o Enunciado Orientativo n.º 03, cuja redação preconiza, in verbis: “A condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006”. (Incidente de Uniformização de Jurisprudência n.º 101532/2015. DJE n.º 9998, de 11/04/2017, publicado em 12/04/2017) – Negritei. Ante o exposto, mantêm-se as condenações pelo delito de tráfico de drogas. 5. Dos pedidos de readequação das penas: Ao final, os apelantes BRUNO e JOÃO CARLOS almejam a readequação da pena, pois o primeiro vindica o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, no que tange ao crime de narcotráfico, ao passo que o segundo pretende a redução das penas-base dos três crimes, mediante a neutralização da sua conduta social e fulcro nos seus predicados pessoais favoráveis. Com relação ao pedido recursal de BRUNO, verbalize-se desde logo que não deve prosperar, pois, ao contrário do que se deu com o delito de organização criminosa, em que sua pena foi atenuada na segunda fase da dosimetria por força da confissão, o réu não confessou o delito de tráfico de drogas. Pelo contrário, BRUNO negou que praticasse o comércio malsão, de modo que não faz jus à atenuante do art. 65, III, d, do CP, no que se refere ao delito do art. 33 da Lei n.º 11.343/2006. Por outro lado, o pedido de redução das penas-base formulado por JOÃO CARLOS merece melhor sorte, embora não exatamente por força dos argumentos deduzidos pela i. defesa. Com efeito, ao valorar negativamente a CONDUTA SOCIAL do apelante, na dosimetria de todos os delitos (organização criminosa, tráfico e associação para o tráfico), o d. juízo a quo fundamentou que o réu se dedica à traficância, sem notícia de emprego lícito. Por outro lado, o precedente invocado pela d. magistrada para respaldar suas razões de decidir (HC 807513/ES, informativo 770 do STJ) refere-se a caso em que a conduta social negativada era de agente condenado por homicídio, o que certamente torna distinto (distinguishing) o presente caso concreto, em que o acusado já está sendo condenado justamente pelo delito de tráfico de drogas, de modo que se impõe neutralizar a aludida vetorial, sob pena de incorrer em bis in idem. Da mesma forma, ao depreciar as CONSEQUÊNCIAS do crime de tráfico, a julgadora da instância singela aventou que o réu promovia o comércio malsão no interesse de facção criminosa, para a qual era repassada parte dos proventos do narcotráfico. No entanto, neste caso concreto, o réu já está sendo condenado justamente por integrar a organização criminosa, nesta qualidade de traficante faccionado, de modo que tal modular deve ser igualmente neutralizada, sob pena de bis in idem. Assim sendo, neutralizo a CONDUTA SOCIAL, na primeira fase da dosimetria da pena de todos os delitos, e as CONSEQUÊNCIAS, na primeira fase da dosimetria da pena do crime de tráfico e, com arrimo no art. 580 do CPP, estendo tal providência aos demais apelantes que não recorreram neste ponto, mas se encontram em idêntica situação fático-processual. 6. Da materialização das novas reprimendas: 6.1 BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES (ORGANIZAÇAO CRIMINOSA): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, remanesce o desvalor da CULPABILIDADE, cujo peso mantenho em 1/8 (um oitavo) do termo médio, conforme operado na sentença, porquanto razoável e proporcional às peculiaridades do caso concreto, de modo que a pena-base fica estabelecida em 03 (três) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa. Na segunda fase, mantenho a compensação integral entre a confissão e a reincidência e conservo em 1/6 (um sexto) a expressividade da agravante do art. 2.º, §3.º, da Lei n.º 12.850/13, formando a pena de 04 (quatro) anos, 02 (dois) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão e pagamento de 14 (quatorze) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de majorantes ou minorantes na terceira fase. 6.2 BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES (TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL e às CONSEQUÊNCIAS, fixo a pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa. Na segunda fase, conservo em 1/6 (um sexto) a expressividade da agravante da reincidência, formando a pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de majorantes ou minorantes na terceira fase. 6.3 BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES (ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, fixo a pena-base em 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa. Na segunda fase, conservo em 1/6 (um sexto) a expressividade da agravante da reincidência, formando a pena de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 816 (oitocentos e dezesseis) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de majorantes ou minorantes na terceira fase. 6.4 BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES (CONCURSO MATERIAL): À luz do concurso material de delitos, cumulo as reprimendas e fixo a pena final e definitiva do apelante em 13 (treze) anos, 06 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão, mais pagamento de 1.481 (mil, quatrocentos e oitenta e um) dias-multa, além de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de detenção (pena do crime de posse irregular de arma de fogo) 6.5 EDIMILSON SILVA DE JESUS (ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, remanesce o desvalor da CULPABILIDADE, cujo peso mantenho em 1/8 (um oitavo) do termo médio, conforme operado na sentença, porquanto razoável e proporcional às peculiaridades do caso concreto, de modo que a pena-base fica estabelecida em 03 (três) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa. Na segunda fase, conservo em 1/6 (um sexto) a expressividade da agravante da reincidência, formando a pena de 04 (quatro) anos, 02 (dois) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão e pagamento de 14 (quatorze) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de majorantes ou minorantes na terceira fase. 6.6 EDIMILSON SILVA DE JESUS (TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL e às CONSEQUÊNCIAS, fixo a pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa. Na segunda fase, conservo em 1/6 (um sexto) a expressividade da agravante da reincidência, formando a pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de majorantes ou minorantes na terceira fase. 6.7 EDIMILSON SILVA DE JESUS (ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, fixo a pena-base em 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa. Na segunda fase, conservo em 1/6 (um sexto) a expressividade da agravante da reincidência, formando a pena de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 816 (oitocentos e dezesseis) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de majorantes ou minorantes na terceira fase. 6.8 EDIMILSON SILVA DE JESUS (CONCURSO MATERIAL): À luz do concurso material de delitos, cumulo as reprimendas e fixo a pena final e definitiva do apelante em 13 (treze) anos, 06 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão, mais pagamento de 1.413 (mil, quatrocentos e treze) dias-multa. 6.9 SANDERLEI FERREIRA DA COSTA (ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, remanesce o desvalor da CULPABILIDADE, cujo peso mantenho em 1/8 (um oitavo) do termo médio, conforme operado na sentença, porquanto razoável e proporcional às peculiaridades do caso concreto, de modo que a pena-base fica estabelecida em 03 (três) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.10 SANDERLEI FERREIRA DA COSTA (TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL e às CONSEQUÊNCIAS, fixo a pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.11 SANDERLEI FERREIRA DA COSTA (ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, fixo a pena-base em 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.12 SANDERLEI FERREIRA DA COSTA (CONCURSO MATERIAL): À luz do concurso material de delitos, cumulo as reprimendas e fixo a pena final e definitiva do apelante em 11 (onze) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, mais pagamento 1.212 (mil, duzentos e doze) dias-multa. 6.13 PEDRO HENRIQUE CABRAL (ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, remanesce o desvalor da CULPABILIDADE, cujo peso mantenho em 1/8 (um oitavo) do termo médio, conforme operado na sentença, porquanto razoável e proporcional às peculiaridades do caso concreto, de modo que a pena-base fica estabelecida em 03 (três) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.14 PEDRO HENRIQUE CABRAL (TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL e às CONSEQUÊNCIAS, fixo a pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.15 PEDRO HENRIQUE CABRAL (ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, fixo a pena-base em 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.16 PEDRO HENRIQUE CABRAL (CONCURSO MATERIAL): À luz do concurso material de delitos, cumulo as reprimendas e fixo a pena final e definitiva do apelante em 11 (onze) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, mais pagamento 1.212 (mil, duzentos e doze) dias-multa. 6.17 ARISNALDO DA SILVA GOMES (ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, remanesce o desvalor da CULPABILIDADE, cujo peso mantenho em 1/8 (um oitavo) do termo médio, conforme operado na sentença, porquanto razoável e proporcional às peculiaridades do caso concreto, de modo que a pena-base fica estabelecida em 03 (três) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.18 ARISNALDO DA SILVA GOMES (TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL e às CONSEQUÊNCIAS, fixo a pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.19 ARISNALDO DA SILVA GOMES (ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, fixo a pena-base em 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.20 ARISNALDO DA SILVA GOMES (CONCURSO MATERIAL): À luz do concurso material de delitos, cumulo as reprimendas e fixo a pena final e definitiva do apelante em 11 (onze) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, mais pagamento 1.212 (mil, duzentos e doze) dias-multa. 6.21 JOÃO CARLOS MULLER (ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, remanesce o desvalor da CULPABILIDADE, cujo peso mantenho em 1/8 (um oitavo) do termo médio, conforme operado na sentença, porquanto razoável e proporcional às peculiaridades do caso concreto, de modo que a pena-base fica estabelecida em 03 (três) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa. Na segunda fase, mantenho em 1/6 (um sexto) a expressividade conferida na sentença à atenuante da confissão, formando a pena de 03 (três) anos e 07 (sete) dias de reclusão e pagamento de 11 (onze) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de majorantes ou minorantes, na terceira fase. 6.22 JOÃO CARLOS MULLER (TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL e às CONSEQUÊNCIAS, fixo a pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à luz da Súmula n.º 213 do STJ na segunda fase e à míngua de majorantes ou minorantes, na terceira fase. 6.23 JOÃO CARLOS MULLER (ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, fixo a pena-base em 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de agravantes ou atenuantes e de majorantes ou minorantes, na segunda e na terceira fases, respectivamente. 6.24 JOÃO CARLOS MULLER (CONCURSO MATERIAL): À luz do concurso material de delitos, cumulo as reprimendas e fixo a pena final e definitiva do apelante em 11 (onze) anos e 07 (sete) dias de reclusão, mais pagamento 1.211 (mil, duzentos e onze) dias-multa. 6.25 DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA (ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, remanesce o desvalor da CULPABILIDADE, cujo peso mantenho em 1/8 (um oitavo) do termo médio, conforme operado na sentença, porquanto razoável e proporcional às peculiaridades do caso concreto, de modo que a pena-base fica estabelecida em 03 (três) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa. Na segunda fase, conservo a compensação integral entre a confissão espontânea e a reincidência e fixo a pena definitiva do apelante para este delito em 03 (três) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa, à míngua de majorantes ou minorantes, na terceira fase. 6.26 DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA (TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL e às CONSEQUÊNCIAS, fixo a pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa. Na segunda fase, conservo em 1/6 (um sexto) a expressividade da agravante da reincidência, formando a pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de majorantes ou minorantes na terceira fase. 6.27 DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA (ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO): Na primeira fase, uma vez afastada a valoração desfavorável atribuída à CONDUTA SOCIAL, fixo a pena-base em 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa. Na segunda fase, conservo em 1/6 (um sexto) a expressividade da agravante da reincidência, formando a pena de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 816 (oitocentos e dezesseis) dias-multa, a qual torno definitiva para este delito, à míngua de majorantes ou minorantes na terceira fase. 6.28 DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA (CONCURSO MATERIAL): À luz do concurso material de delitos, cumulo as reprimendas e fixo a pena final e definitiva do apelante em 12 (doze) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, mais pagamento de 1.411 (mil quatrocentos e onze) dias-multa. 6.29 LUCAS ROGANTE CAVALCANTE: As penas-base de LUCAS foram exasperadas mediante a depreciação da CULPABILIDADE (organização criminosa) e MAUS ANTECEDENTES (organização criminosa e associação para o tráfico), ou seja, não se estende a ele a providência deferida ao apelante JOÃO CARLOS MULLER, sendo inaplicável ao seu caso o art. 580 do CPP, de modo que sua pena fica inalterada. 6.30 DANILO OLIVEIRA DA SILVA: A pena-base de DANILO foi exasperada mediante a depreciação da CULPABILIDADE e MAUS ANTECEDENTES (organização criminosa), ou seja, não se estende a ele a providência deferida ao apelante JOÃO CARLOS MULLER, sendo inaplicável ao seu caso o art. 580 do CPP, de modo que sua pena fica inalterada. CONCLUSÃO: Ante todo o exposto, conheço dos recursos de apelação criminal interpostos por LUCAS ROGANTE CAVALCANTE, DANILO OLIVEIRA DA SILVA, ARISNALDO DA SILVA GOMES, PEDRO HENRIQUE CABRAL SILVA, SANDERLEI FERREIRA DA COSTA, EDIMILSON SILVA DE JESUS, JOÃO CARLOS MULLER, DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA e BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES, a fim de REJEITAR AS PRELIMINARES de nulidade arguidas pela defesa. No mérito, NEGO PROVIMENTO aos apelos de LUCAS ROGANTE CAVALCANTE, DANILO OLIVEIRA DA SILVA, ARISNALDO DA SILVA GOMES, PEDRO HENRIQUE CABRAL SILVA, SANDERLEI FERREIRA DA COSTA, EDIMILSON SILVA DE JESUS, DOUGLAS LUCIANO SANTOS FONSECA e BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao apelo de JOÃO CARLOS MULLER, apenas para readequar as penas-base, estendendo tal providência aos apelantes que se encontram na mesma situação fático-processual, com fulcro no art. 580 do CPP, de modo que as reprimendas finais e definitivas ficam reajustadas para os seguintes patamares: 1. BRUNO MICHEL MEDRADO RODRIGUES: 13 (treze) anos, 06 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão, mais pagamento de 1.481 (mil, quatrocentos e oitenta e um) dias-multa, além de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de detenção; 2. EDIMILSON SILVA DE JESUS: 13 (treze) anos, 06 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão, mais pagamento de 1.413 (mil, quatrocentos e treze) dias-multa; 3. SANDERLEI FERREIRA DA COSTA: 11 (onze) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, mais pagamento 1.212 (mil, duzentos e doze) dias-multa; 4. PEDRO HENRIQUE CABRAL SILVA: 11 (onze) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, mais pagamento 1.212 (mil, duzentos e doze) dias-multa; 5. ARISNALDO DA SILVA GOMES: 11 (onze) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, mais pagamento 1.212 (mil, duzentos e doze) dias-multa; 6. JOÃO CARLOS MULLER: 11 (onze) anos e 07 (sete) dias de reclusão, mais pagamento 1.211 (mil, duzentos e onze) dias-multa; 7. DOUGLAS LUCANOS SANTOS FONSECA: 12 (doze) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, mais pagamento de 1.411 (mil quatrocentos e onze) dias-multa. Mantém-se inalterada, nos demais termos, a r. sentença proferida pelo d. Juízo da Sétima Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT na ação penal n.º 1013019-78.2022.8.11.0042 (“Operação Arcabouço”). Considerando que já foram expedidas Guias de Execução Provisórias (ID 227285742, ID 227285744, ID 227285746, ID 227285748, ID 227285750, ID 227285752), oficie-se com urgência os d. Juízos da Execução, para que retifiquem com presteza os cálculos de pena a cumprir. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/04/2025

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