Processo nº 5036893-80.2024.8.09.0051
ID: 317202066
Tribunal: TJGO
Órgão: 3ª Câmara Cível
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5036893-80.2024.8.09.0051
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
PALOMA BURGO SANTOS
OAB/GO XXXXXX
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DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. LITISPENDÊNCIA MATERIAL ENTRE AÇÕES FUNDADAS NA MESMA RELAÇÃO JURÍDICA CONTRATUAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. SENTENÇA CASSADA.I. CASO EM EXAME 1. Ap…
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. LITISPENDÊNCIA MATERIAL ENTRE AÇÕES FUNDADAS NA MESMA RELAÇÃO JURÍDICA CONTRATUAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. SENTENÇA CASSADA.I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de cobrança de multa rescisória contratual, com base em alegado inadimplemento de obrigações pela franqueadora. O juízo de origem não reconheceu o descumprimento contratual, fundamentando-se em prova emprestada de demanda anterior envolvendo as mesmas partes. Os autores interpuseram recurso visando a reforma ou cassação da sentença, com reabertura da instrução, restabelecimento da liminar e condenação da ré.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é cabível o prosseguimento da ação diante da existência de litispendência material com processo anterior, fundado na mesma relação jurídica e conjunto fático; e (ii) saber se o pedido de cobrança de multa contratual, sob nova qualificação jurídica, configura ampliação indevida da demanda, violando o disposto no artigo 329 do Código de Processo Civil.III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A presente demanda reproduz integralmente os fatos e fundamentos da ação anterior, limitando-se a modificar o enquadramento jurídico da pretensão. 4. Verifica-se identidade substancial da relação jurídica contratual discutida, de modo que a nova ação pretende rediscutir sob nova roupagem tese já submetida ao Poder Judiciário. 5. Aplica-se a teoria da identidade da relação jurídica material, reconhecendo-se a litispendência material, ainda que sob pedidos formalmente distintos. 6. A proposição autônoma da nova ação, após estabilização da demanda anterior, afronta o artigo 329 do Código de Processo Civil e compromete os princípios da boa-fé, economia processual e segurança jurídica.IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Sentença cassada e processo extinto sem resolução do mérito por litispendência material. Apelação cível prejudicada.Tese de julgamento: "1. Caracteriza litispendência material a propositura de nova demanda fundada na mesma relação jurídica contratual, com repetição dos fatos essenciais e mera requalificação jurídica do pedido. 2. A ampliação da demanda após a estabilização do processo anterior, mediante ajuizamento autônomo, afronta o disposto no artigo 329 do Código de Processo Civil."Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 9º, 10, 337, VI, §§ 2º e 3º, 372, 485, V e § 3º, 98, § 3º; CF, art. 5º, XXXV e LIV.Jurisprudências relevantes citadas: STJ, REsp 963.681/SC, Relator Ministro José Delgado, Primeira Turma, j. 18.12.2007, DJ 25.02.2008; TJDF, Apelação Cível 0008410-59.2016.8.07.0020, Relator Desembargador Alfeu Machado, 6ª Turma Cível, j. 23.05.2018; TJMG, Apelação Cível 10000212528970001, Relator Desembargador Habib Felippe Jabour, 18ª Câmara Cível, j. 19.07.2022
Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado de Goiás 3ª Câmara Cível Gabinete do Desembargador Fernando Braga Viggiano APELAÇÃO CÍVEL N. 5036893-80.2024.8.09.0051COMARCA : GOIÂNIARELATOR : DESEMBARGADOR FERNANDO BRAGA VIGGIANOAPELANTES: LUAN LUCAS MOTA GOMES e WALLACE SOUZA SANTOS APELADA : BEHEST FRANCHISING E PARTICIPAÇÕES LTDA VOTO Conforme relatado, cuida-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por LUAN LUCAS MOTA GOMES e WALLACE SOUZA SANTOS contra sentença proferida pela Juíza de Direito da 25ª Vara Cível da comarca de Goiânia, Dra. Laura Ribeiro de Oliveira, nos autos da ação de cobrança de multa rescisória proposta em face de BEHEST FRANCHISING E PARTICIPAÇÕES LTDA.Na petição inicial, os apelantes narram que adquiriram unidades da franquia "Behest Burger", investindo valores significativos na implantação das lojas, mas que, diante de sucessivos descumprimentos contratuais atribuídos à franqueadora — como ausência de suporte, produtos de baixa qualidade, fornecimento irregular de insumos, superfaturamento de produtos e da obra da loja, ausência de suporte técnico, sonegação fiscal e práticas abusivas —, foram levados a rescindir os contratos de franquia. Diante disso, considerando que “a culpa pela resolução dos contratos de franquia na data de 23/11/2022 para Wallace e 02/01/2023 para Luan foi exclusivamente pela ré, relatados e provados documentalmente e testemunhalmente no bojo da ação n° 5041567-38.2023.8.09.0051 na 25ª Vara Cível da Comarca de Goiânia/GO”, pleiteiam a condenação dos réus ao pagamento das multas estipuladas nas cláusulas contratuais, nos valores de R$ 83.306,61 para Wallace e R$ 124.586,28 para Luan.A parte ré, embora regularmente citada, permaneceu inerte, razão pela qual foi decretada a revelia, sem que isso implicasse a automática procedência dos pedidos iniciais, com fundamento na relatividade da presunção de veracidade dos fatos alegados (artigo 344 do Código de Processo Civil).Na sentença recorrida (evento 90), o juízo a quo entendeu que a controvérsia comportava julgamento antecipado do mérito, com base nas provas coligidas, em especial por meio da prova emprestada dos autos n. 5041567-38.2023.8.09.0051, que envolvia as mesmas partes e causa de pedir, nos moldes do artigo 372 do Código de Processo Civil. Na análise conjunta dos elementos dos autos, a Magistrada não reconheceu a ocorrência de descumprimento contratual ou irregularidades relevantes aptas a justificar o encerramento precoce da atividade empresarial ou a indenização pretendida.Restou consignado que os autores não lograram demonstrar os vícios alegados, pois o conjunto probatório, inclusive a prova testemunhal, indicou que houve suporte técnico por parte da franqueadora, que as lojas se mantinham operacionais, e que os insumos tinham preço compatível com os custos logísticos. Salientou-se ainda que o contrato de franquia é um contrato de risco, e que o encerramento das lojas em novembro de 2022, apenas três meses após sua abertura, evidenciava arrependimento comercial, e não inadimplemento contratual.Ademais, pontuou-se que não houve qualquer comprovação de vício ou nulidade do negócio jurídico, tampouco demonstração de que os autores comunicaram previamente à franqueadora a venda das unidades, como exigido contratualmente. Nesses termos, ao fim, julgou improcedentes os pedidos iniciais, revogou a liminar anteriormente concedida e condenou os autores ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 20% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa por força da concessão da gratuidade de justiça.Inconformados, os autores LUAN LUCAS MOTA GOMES e WALLACE SOUZA SANTOS interpuseram apelação (evento 93), requerendo a cassação da sentença, com o consequente retorno dos autos para reabertura da instrução, ou sua reforma, para que sejam julgados procedentes os pedidos iniciais, com o restabelecimento da liminar, condenação dos réus ao pagamento das quantias pleiteadas e afastamento da verba honorária, por ausência de constituição de procurador pelo réu revel.A parte ré/apelada BEHEST FRANCHISING E PARTICIPAÇÕES LTDA. é revel e o prazo para contrarrazões teve início com a publicação de evento 100, mas transcorreu in albis.Feita a contextualização da demanda, antes de adentrar no mérito recursal, cumpre apreciar a preliminar suscitada de ofício, nos termos dos artigos 9º, 10 e 337, inciso VI, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil, relativa à possível litispendência material, em razão da existência de demanda anterior (processo n. 5041567-38.2023.8.09.0051), bem como eventual tentativa de ampliação indevida do pedido, em desconformidade com o previsto pelo artigo 329 do mesmo diploma legal.Cabe destacar que a verificação da litispendência, por constituir matéria de ordem pública, pode e deve ser analisada de ofício pelo juízo, nos termos do artigo 485, § 3º, do Código de Processo Civil, mesmo na ausência de manifestação da parte contrária ou de provocação expressa.No ponto, ressalte-se que, em resposta ao despacho que oportunizou manifestação sobre a questão em apreço (evento 103), os apelantes sustentaram que, embora as partes e o vínculo contratual sejam os mesmos, os objetos e fundamentos jurídicos das ações são distintos, pois, na ação anterior, postula-se reparação por práticas abusivas ocorridas durante a execução do contrato, enquanto nesta se pleiteia a multa rescisória com base em cláusula penal contratual, diante da alegada rescisão motivada por descumprimento contratual da franqueadora. Alegam, ainda, que a presente ação foi proposta de forma autônoma, em momento processual diverso, inexistindo qualquer aditamento indevido ou ampliação da demanda estabilizada.Pois bem.Ao se compulsar os autos e confrontar as alegações desta demanda com o conteúdo da ação anteriormente ajuizada por LUAN LUCAS e WALLACE — ação de indenização por danos materiais e morais, autos n. 5041567-38.2023.8.09.0051 — constata-se que a presente ação reproduz a mesma relação jurídica contratual, os mesmos fatos fundamentais e, por conseguinte, a mesma controvérsia jurídica de fundo já submetida à apreciação judicial.Com efeito, na demanda anterior, os autores também narraram a adesão ao sistema de franquia da marca “Behest Burger”, operado pela requerida, com promessas contratuais envolvendo suporte operacional, fornecimento de insumos a preços competitivos por meio de um centro de distribuição exclusivo e padronização da construção das lojas. Assim, alegaram, de modo minucioso, os mesmos fatos agora invocados: ausência de suporte técnico, fornecimento de produtos de baixa qualidade e sem documentação fiscal, descumprimento de promessas contratuais, desorganização logística, prejuízos operacionais e desequilíbrio na relação contratual. Com base nesse conjunto fático, requereram a condenação da franqueadora ao pagamento de indenização por danos materiais e morais.A presente demanda, embora tenha por pedido a multa contratual, não apresenta fatos novos, autônomos ou posteriores. Ao contrário, repete integralmente a narrativa dos vícios contratuais anteriormente descritos, apenas mudando a moldura jurídica da pretensão. Os autores agora buscam a cláusula penal com fundamento no mesmo inadimplemento que, na ação anterior, sustentava a tese de responsabilidade civil.Nessa intelecção de ideias, a análise dos dois processos evidencia que a causa de pedir remota e próxima é substancialmente idêntica: os fatos que motivaram a propositura da nova ação já foram amplamente discutidos e apresentados na ação anterior. A única diferença formal repousa no tipo de pedido (indenização vs. multa contratual), o que, no entanto, não descaracteriza a litispendência, quando se tem por critério também a identidade da relação jurídica material, como adotado pela jurisprudência e doutrina mais recente.Por certo, o pedido, embora formalmente distinto, não tem o condão de descaracterizar a identidade substancial da relação jurídica discutida. A doutrina e a jurisprudência pátrias, especialmente após o novo Código de Processo Civil, têm reconhecido que a litispendência não exige mais a exata repetição dos três elementos clássicos da ação (partes, pedido e causa de pedir), pois reconhecem que a teoria da tríplice identidade nem sempre é suficiente para identificar a duplicidade de ações. Em razão disso, passou-se a aplicar, em complemento, a teoria da identidade da relação jurídica material, de modo que é possível a configuração de litispendência material quando a nova demanda reproduzir a mesma relação jurídica material já resolvida em ação anterior.Conforme ensina José Miguel Garcia Medina, ao comentar o artigo 337 do Código de Processo Civil, diante da insuficiência da teoria da tríplice identidade para solucionar questões práticas, poderá ser aplicada a teoria da identidade da relação de direito material, permitindo-se, excepcionalmente, reconhecer a litispendência, ainda que não sejam exatamente os mesmos elementos da ação. Leia-se:"VI. Litispendência e coisa julgada. Teorias da tríplice identidade e da identidade da relação jurídica material. São elementos que identificam a ação: partes, causa de pedir e pedido (c. § 2.º do art. 337 do CPC/2015; sobre cada um desses elementos, cf. comentário ao art. 319 do CPC/2015). Tais elementos são relevantes para se perquirir se, confrontando duas ou mais ações, está-se diante de ações idênticas (total ou parcialmente) ou distintas. Havendo, por exemplo, identidade parcial (por exemplo, quanto a causa petendi e partes), há conexão. Havendo identidade total (isso é, reproduzindo-se ação anteriormente ajuizada, cf. § 1.º do art. 337 do CPC/2015), será caso de litispendência ("quando se repete ação que está em curso", cf. § 3.º do art. 337 do CPC/2015) ou coisa julgada ("quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado", cf. § 4.º do art. 337 do CPC/2015). O CPC/1973 revelou, nos §§ 1.º a 4.º de seu art. 301, ser fiel à teoria da tríplice identidade (cf. Egas Dirceu Moniz de Aragão, Conexão e"tríplice identidade", RePro 29/50), e o mesmo se pode dizer, no que respeita aos §§ 1.º a 4.º do art. 337 do CPC/2015.[...]Costuma-se referir também, na doutrina, a concepção mais ampla, outrora referida por Savigny (Traité de droit romain, vol. 6, p. 426), que, aludindo à exceção de coisa julgada, referia-se à máxima segundo a qual" exceptionem rei judicatae obstare quotiens eadem quaestio inter easdem personas revocatur "(" a exceção de coisa julgada obsta, sempre, a que entre as mesmas pessoas a mesma questão seja reexaminada ", na tradução de Egas Dirceu Moniz de Aragão apresentada em Observações sobre os limites subjetivos da coisa julgada, RT 625/7). De acordo com essa concepção, mesma questão e mesmas pessoas seriam os elementos que definiriam a ação e permitiriam identificá-la a outras. Sob esse prisma, importa que a relação de direito material seja a mesma. Trata-se da teoria da identidade da relação jurídica material. Na doutrina brasileira, cf., amplamente, José Rogério Cruz e Tucci (A causa petendi..., 2. ed., cit., n. 3.2, p. 78 ss.), que afirma ser possível valer-se da teoria da identidade da relação jurídica material quando a teoria da tríplice identidade for insuficiente (ob. cit., p. 213; no mesmo sentido, Ana Clara Viola Ladeira, Identificação da conexão..., RePro 238/65). Esse modo de pensar tem inspirado a jurisprudência." (José Miguel Garcia Medina, in Código de Processo Civil Comentado - Ed. 2021, São Paulo (SP), Editora Revista dos Tribunais)Araken de Assis, por sua vez, ao tratar dos efeitos da litispendência, destaca a relevância da análise da essência do conflito, e não apenas dos seus elementos formais: “[...] a litispendência deve sobrepujar a análise meramente literal dos elementos da ação, pois seu objetivo é evitar, de forma efetiva, que sejam movidos, concomitantemente, diversos processos que tenham o mesmo resultado prático.”(Processo Civil Brasileiro, RT, 2016, v. 2, p. 688).No mesmo sentido, Marinoni, Arenhart e Mitidiero alertam para a necessidade de se considerar a substância da controvérsia:“O critério básico para identificação da coisa julgada - e dos seus limites - é segundo o qual há coisa julgada quando se repete em juízo ação já julgada por sentença definitiva transitada em julgado (art. 337, § 4.º). Vale dizer: é o critério da tríplice identidade. Uma ação é idêntica à outra quando tiverem as mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido (art. 337, § 2.º). Trata-se de critério tradicional na dogmática processual civil. Conjuntamente com os arts. 502 e ss., serve como primeiro norte para identificação da área de confinamento da autoridade da coisa julgada.Assim, além do critério da tríplice identidade, é necessário empregar igualmente o critério da identidade da relação jurídica para aferição da coisa julgada no Código de 2015. Ou seja: há necessidade de enriquecer o exame da identidade das causas, empregando-se para tanto não só o critério da tríplice identidade, mas também o da identidade da relação jurídica. Trata-se de decorrência do caráter dinâmico oriundo do diálogo que rege a construção do mérito da causa que será ao final julgada pela sentença". (Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, in Curso de Processo Civil - Vol. 2 - Ed. 2021. São Paulo (SP) - Editora Revista dos Tribunais)É exatamente o que se verifica no caso concreto: os autores não trazem nenhum fato superveniente ou inadimplemento posterior, limitando-se a tentar rediscutir — sob outra tese jurídica — fatos já submetidos ao Poder Judiciário e que, frise-se, foram amplamente enfrentados e rejeitados na sentença proferida na ação anterior, cujo teor já está incluso nos autos e se encontra em fase recursal.Permitir que a mesma relação jurídica seja analisada novamente, apenas sob a roupagem de cláusula penal, comprometeria os princípios da unicidade da jurisdição, economia processual, boa-fé e segurança jurídica. Como bem observou o Superior Tribunal de Justiça, em precedente que destaco:RECURSO ESPECIAL. CARTÓRIO. ESCRIVÃO. TITULARIDADE. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO CUMULADA COM REINTEGRAÇÃO DO CARGO. MANDADO DE SEGURANÇA ANTERIORMENTE IMPETRADO COM O MESMO OBJETIVO. LITISPENDÊNCIA. CONFIGURAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO. [...] 6. Embora a postulante sustente que para ficar configurada a litispendência é necessário que haja identidade de parte, pedido e causa de pedir, o que não ocorre no presente caso,"[...] importa registrar que, a ratio essendi da litispendência é que a parte não promova duas demandas visando o mesmo resultado. Ressalte-se que esta é a regra, e por sua vez, comporta exceções, pelo que, por força desses princípios depreendidos das normas e da razão de ser das mesmas é possível afirmar-se que há litispendência quando duas ou mais ações conduzem ao mesmo resultado; por isso que: electa una via altera non datur". ( MS 8483/DF, Rel. Min. Luiz Fux). 7. In casu, o recorrente procura a anulação do Ato Administrativo n.145/96 da lavra do Presidente do Tribunal de Justiça a fim de que lhe seja restituído o cargo que anteriormente ocupava. Tentou isso por meio da ação mandamental. Não conseguiu. Tenta, novamente, em sede de ação anulatória de ato administrativo c/c reintegração de cargo. Configurada está a litispendência a justificar a extinção do processo. Pensar o contrário seria facultar às partes litigantes a propositura de um número sem fim de ações objetivando o mesmo fim sob os mais variados fundamentos. 8. Recurso especial parcialmente conhecido quanto aos artigos 535, II, e 301, V, § 3º, do Código de Processo Civil e NÃO PROVIDO". (STJ, REsp 963.681/SC, Relator Ministro JOSÉ DELGADO, Primeira Turma, julgado em 18/12/2007, DJ 25/02/2008)Na esteira deste entendimento, colaciono julgados dos Tribunais Pátrios:APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. EXTINÇÃO DA AÇÃO . RECONHECIMENTO DE LITISPENDÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE TRÍPLICE INDENTIDADE (PARTES, CAUSA DE PEDIR E PEDIDO). EFEITOS PROCESSUAIS E SUBSTANCIAIS DA LITISPENDÊNCIA. APLICABILIDADE DA TEORIA DA IDENTIDADE DA RELAÇÃO JURÍDICA MATERIAL . IDENTIFICAÇÃO DA RELAÇÃO JURÍDICA DISCUTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Para que haja a constatação de litispendência e seus efeitos, não é necessário que as demandas tenham a mesma nomenclatura, pertençam a uma mesma classificação de processos e, ainda, tenham identidade de partes. O que deve ser observado é se existe reprodução idêntica e exata de objeto já litigioso, consoante a teoria da identidade da relação jurídica material.Entender de modo diverso é permitir que sejam formados dois ou mais títulos executivos judiciais acerca do mesmo objeto (imóvel), o que poderia ensejar enorme insegurança jurídica ante a possibilidade de prolação de decisões conflitantes atribuindo a posse do mesmo imóvel a várias pessoas. 2 . Na lição de Araken de Assis, "a litispendência produz duas espécies de feitos: processuais e substanciais. Enquanto os efeitos processuais da litispendência se manifestam no plano do processo e se referem aos elementos da demanda, com um olhar para o seu interior, como por exemplo, a proibição de renovação da demanda, a perpetuação da competência, a prevenção da competência, a perpetuação do valor da causa e a proibição de inovar o estado de fato; Já os efeitos substanciais dizem respeito às relações materiais das partes, entre si ou com terceiros, e seus reflexos externos ao processo, a exemplificar: a litigiosidade da coisa, a indisponibilidade patrimonial relativa, a constituição em mora do réu, a interrupção da prescrição e da decadência e a averbação da demanda".(ASSIS, Araken de. Processo Civil Brasileiro . 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. v. 2, tomo 2, p . 688). 3. Na análise da litispendência, o julgador, em regra, deve adotar a teoria da tríplice identidade (partes, causa de pedir e pedido) prevista no art. 337, § 2º do CPC . Não obstante, quando insuficiente, ou seja, faltar alguns dos 03 elementos, abre-se espaço para a chamada teoria da identidade da relação jurídica material, segundo a qual o que importa é a identificação da relação jurídica discutida nas demandas, se é essencialmente a mesma, conquanto existam diferenças em relação a alguns elementos, ou seja, a litispendência deve sobrepujar a análise meramente literal dos elementos da ação, pois seu objetivo é evitar, de forma efetiva, que sejam movidos, concomitantemente, diversos processos que tenham o mesmo resultado prático. 4. Se existem vários processos (ações possessórias) já em andamento, contendo partes diversas, mas, onde a causa de pedir e o pedido são os mesmos/idênticos, ou seja, em todas as ações discute-se a "posse" sobre o mesmo imóvel, é de se reconhecer o fenômeno da litispendência entre os processos em tramitação, especialmente quando a questão sobre a posse já foi reconhecida no processo originário, sob pena de haver decisões conflitantes nas demais ações possessórias. 5 . Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida. (TJDF, Apelação Cível 0008410-59.2016.8.07.0020, Relator Desembargador ALFEU MACHADO, 6ª Turma Cível, Data de Julgamento: 23/05/2018, Data de Publicação: Publicado no DJE : 29/05/2018)APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER . MESMOS FATOS. APLICAÇÃO DA TEORIA DA IDENTIDADE DA RELAÇÃO JURÍDICA. LITISPENDÊNCIA. COISA JULGADA . OCORRÊNCIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. ART. 485, INC . V, DO CPC. RECURSO NÃO PROVIDO. - De acordo com a teoria da identidade da relação jurídica, a litispendência se configura quando a relação jurídica da nova demanda é essencialmente a mesma da anterior, ainda que não exista perfeita identidade entre elas nos seus três elementos (partes, pedidos e causa de pedir) - No caso concreto, embora com argumentos e pedidos diferentes, as ações ajuizadas pelo Apelante/Autor embasaram-se nos mesmos fatos (relação jurídica), restando configurada a litispendência. (TJMG, Apelação Cível 10000212528970001 MG, Relator Desembargador HABIB FELIPPE JABOUR, 18ª Câmara Cível, Data de Julgamento: 19/07/2022, Data de Publicação: 19/07/2022)Além disso, cumpre destacar que a presente ação foi ajuizada após a estabilização da demanda anterior (com citação válida em maio de 2023), violando também o disposto no artigo 329 do Código de Processo Civil, que veda a ampliação da demanda após o início do contraditório, salvo nas hipóteses legalmente previstas, entre as quais não se inclui a propositura autônoma de nova ação sobre o mesmo vínculo jurídico.Assim, a multiplicidade de ações fundadas no mesmo contexto contratual, com fragmentação artificial dos pedidos, além de violar os princípios da segurança jurídica e da economia processual, gera risco de decisões conflitantes, enfraquecendo a efetividade da prestação jurisdicional.Portanto, diante da identidade substancial da relação jurídica discutida nas duas ações, da repetição dos fundamentos fáticos e jurídicos e da tentativa de rediscutir obrigações contratuais sob nova roupagem, reconhece-se a litispendência material, como causa de extinção do feito, sem resolução do mérito.Ante o exposto, CASSO de ofício a sentença proferida pela Magistrada de origem e, com fundamento nos artigos 337, § 3º, e 485, inciso V, ambos do Código de Processo Civil, reconheço a litispendência material e JULGO EXTINTO o presente processo, sem resolução do mérito.Via de consequência, JULGO PREJUDICADA a apelação cível interposta.Sem honorários advocatícios.Custas pelos autores, com exigibilidade suspensa em face da gratuidade de justiça (artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil).É como voto.Goiânia, datado e assinado digitalmente.Fernando Braga ViggianoDesembargadorRelator6APELAÇÃO CÍVEL N. 5036893-80.2024.8.09.0051COMARCA : GOIÂNIARELATOR : DESEMBARGADOR FERNANDO BRAGA VIGGIANOAPELANTES: LUAN LUCAS MOTA GOMES e WALLACE SOUZA SANTOS APELADA : BEHEST FRANCHISING E PARTICIPAÇÕES LTDA. DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. LITISPENDÊNCIA MATERIAL ENTRE AÇÕES FUNDADAS NA MESMA RELAÇÃO JURÍDICA CONTRATUAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. SENTENÇA CASSADA.I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de cobrança de multa rescisória contratual, com base em alegado inadimplemento de obrigações pela franqueadora. O juízo de origem não reconheceu o descumprimento contratual, fundamentando-se em prova emprestada de demanda anterior envolvendo as mesmas partes. Os autores interpuseram recurso visando a reforma ou cassação da sentença, com reabertura da instrução, restabelecimento da liminar e condenação da ré.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é cabível o prosseguimento da ação diante da existência de litispendência material com processo anterior, fundado na mesma relação jurídica e conjunto fático; e (ii) saber se o pedido de cobrança de multa contratual, sob nova qualificação jurídica, configura ampliação indevida da demanda, violando o disposto no artigo 329 do Código de Processo Civil.III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A presente demanda reproduz integralmente os fatos e fundamentos da ação anterior, limitando-se a modificar o enquadramento jurídico da pretensão. 4. Verifica-se identidade substancial da relação jurídica contratual discutida, de modo que a nova ação pretende rediscutir sob nova roupagem tese já submetida ao Poder Judiciário. 5. Aplica-se a teoria da identidade da relação jurídica material, reconhecendo-se a litispendência material, ainda que sob pedidos formalmente distintos. 6. A proposição autônoma da nova ação, após estabilização da demanda anterior, afronta o artigo 329 do Código de Processo Civil e compromete os princípios da boa-fé, economia processual e segurança jurídica.IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Sentença cassada e processo extinto sem resolução do mérito por litispendência material. Apelação cível prejudicada.Tese de julgamento: "1. Caracteriza litispendência material a propositura de nova demanda fundada na mesma relação jurídica contratual, com repetição dos fatos essenciais e mera requalificação jurídica do pedido. 2. A ampliação da demanda após a estabilização do processo anterior, mediante ajuizamento autônomo, afronta o disposto no artigo 329 do Código de Processo Civil."Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 9º, 10, 337, VI, §§ 2º e 3º, 372, 485, V e § 3º, 98, § 3º; CF, art. 5º, XXXV e LIV.Jurisprudências relevantes citadas: STJ, REsp 963.681/SC, Relator Ministro José Delgado, Primeira Turma, j. 18.12.2007, DJ 25.02.2008; TJDF, Apelação Cível 0008410-59.2016.8.07.0020, Relator Desembargador Alfeu Machado, 6ª Turma Cível, j. 23.05.2018; TJMG, Apelação Cível 10000212528970001, Relator Desembargador Habib Felippe Jabour, 18ª Câmara Cível, j. 19.07.2022 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL N. 5036893-80.2024.8.09.0051. Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pela Quarta Turma Julgadora de sua Terceira Câmara Cível, por unanimidade de votos, em CASSAR A SENTENÇA DE OFÍCIO E JULGAR PREJUDICADO O MÉRITO RECURSAL, tudo nos termos do voto do Relator.Votaram, além do Relator Desembargador Fernando Braga Viggiano, o Desembargador Gilberto Marques Filho e o Desembargador Murilo Vieira de Faria.Presidiu a sessão de julgamento o Excelentíssimo Senhor Desembargador Murilo Vieira de Faria.Esteve presente à sessão o representante da Procuradoria-Geral de Justiça, conforme consignado no respectivo extrato da ata.Goiânia, datado e assinado digitalmente.Fernando Braga ViggianoDesembargadorRelator Av. Assis Chateaubriand, Nº 195, Setor Oeste, CEP:74130-011, Fone: (62) 3216-2254gab.fbviggiano@tjgo.jus.br
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