Danilo Miranda Rosa e outros x Impacto Servicos De Seguranca Ltda.
ID: 315149302
Tribunal: TST
Órgão: 5ª Turma
Classe: RECURSO DE REVISTA COM AGRAVO
Nº Processo: 0010146-67.2023.5.15.0094
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Passivo:
Advogados:
ANDERSON DE OLIVEIRA BARBOZA
OAB/SP XXXXXX
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FLAVIO HENRIQUE BERTON FEDERICI
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 5ª TURMA Relator: DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES RRAg AIRR 0010146-67.2023.5.15.0094 AGRAVANTE: DANILO MIRANDA ROSA AGRAVADO: IMPA…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 5ª TURMA Relator: DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES RRAg AIRR 0010146-67.2023.5.15.0094 AGRAVANTE: DANILO MIRANDA ROSA AGRAVADO: IMPACTO SERVICOS DE SEGURANCA LTDA. Poder Judiciário Justiça do Trabalho Tribunal Superior do Trabalho PROCESSO Nº TST-AIRR - 0010146-67.2023.5.15.0094 AGRAVANTE: DANILO MIRANDA ROSA ADVOGADO: Dr. ANDERSON DE OLIVEIRA BARBOZA AGRAVANTE: IMPACTO SERVICOS DE SEGURANCA LTDA. ADVOGADO: Dr. FLAVIO HENRIQUE BERTON FEDERICI AGRAVADO: DANILO MIRANDA ROSA ADVOGADO: Dr. ANDERSON DE OLIVEIRA BARBOZA AGRAVADO: IMPACTO SERVICOS DE SEGURANCA LTDA. ADVOGADO: Dr. FLAVIO HENRIQUE BERTON FEDERICI GMDAR/ALRD/ABM D E C I S Ã O Vistos etc. I – CONSIDERAÇÕES INICIAIS Os presentes recursos estão submetidos à disciplina da Lei 13.467/2017, especificamente em relação ao requisito da transcendência. De acordo com o art. 896-A da CLT, com a redação dada pela MP 2226/2001, “O Tribunal Superior do Trabalho, no recurso de revista, examinará previamente se a causa oferece transcendência com relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica.”. Apesar de o art. 2º da MP 2226/2001 ter conferido a esta Corte a competência para regulamentar, em seu regimento interno, o processamento da transcendência do recurso de revista (assegurada a apreciação da transcendência em sessão pública, com direito a sustentação oral e fundamentação da decisão), tal regulamentação não foi editada. Com o advento da Lei 13.467/2017, os parâmetros para o exame da transcendência foram objetivamente definidos (§ 1º do art. 896-A da CLT), devendo ser observados no âmbito desta Corte em relação aos recursos interpostos contra acórdãos publicados após a vigência da Lei 13.467/2017 (art. 246 do RITST). De acordo com § 1º do art. 896-A da CLT, são indicadores da transcendência, entre outros critérios que podem ser delineados por esta Corte, a partir do exame de cada caso concreto: I - econômica, o elevado valor da causa; II - política, o desrespeito da instância recorrida à jurisprudência sumulada do Tribunal Superior do Trabalho ou do Supremo Tribunal Federal; III - social, a postulação, por reclamante-recorrente, de direito social constitucionalmente assegurado; IV - jurídica, a existência de questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista. O exame do art. 896-A, § 1º, da CLT revela que o próprio legislador deixou aberta a possibilidade de detecção de outras hipóteses de transcendência, ao sugerir de modo meramente exemplificativo os parâmetros delineados no § 1º do art. 896-A da CLT. Não se pode, portanto, no exercício desse juízo inicial de delibação, afastar o papel precípuo do TST de guardião da unidade interpretativa do direito no âmbito da Justiça do Trabalho. Nesse sentido, deve se entender presente a transcendência política nas hipóteses em que as decisões regionais, de forma direta e objetiva, contrariam a jurisprudência pacífica e reiterada desta Corte, ainda que não inscrita em Súmula ou Orientação Jurisprudencial. Esse novo sistema busca realizar pelo menos três valores constitucionais relevantes: isonomia, celeridade e segurança jurídica no tratamento aos jurisdicionados. Por isso, também as decisões nesses incidentes, quando descumpridas, devem ensejar o reconhecimento da transcendência política para o exame do recurso de revista. Em síntese, o pressuposto da transcendência política estará configurado sempre que as decisões regionais desafiarem as teses jurídicas pacificadas pelo TST em reiteradas decisões (§ 7º do art. 896 c/c a Súmula 333 do TST), em Súmulas, em Orientações Jurisprudenciais ou em Incidentes de Resolução de Demandas Repetitivas e de Assunção de Competência. II – AGRAVO DE INSTRUMENTO DO RECLAMANTE Trata-se de agravo de instrumento interposto em face da decisão do Tribunal Regional do Trabalho, mediante a qual foi denegado seguimento ao recurso de revista. A parte procura demonstrar a satisfação dos pressupostos para o processamento do recurso obstado. Houve apresentação de contraminuta e contrarrazões. Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, na forma regimental. Assim resumida a espécie, profiro a seguinte decisão, com lastro no art. 932 do CPC. Observo que o recurso encontra-se tempestivo e regular. Registro, ainda, que se trata de agravo de instrumento com o objetivo de viabilizar o processamento de recurso de revista interposto em face de decisão publicada na vigência das Leis 13.015/2014 e 13.467/2017. O Tribunal Regional negou seguimento ao recurso de revista da parte, por entender não configuradas as hipóteses de cabimento previstas no artigo 896 da CLT. Eis os termos da decisão: (...) DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO (8826) / PARTES E PROCURADORES (8842) / SUCUMBÊNCIA (8874) / HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS (10655) / SUCUMBENCIAIS Quanto a essa questão, a matéria já não está "sub-judice". A inconstitucionalidade parcial do art. 791-A, § 4º, da CLT, no que presume a perda da condição de hipossuficiência econômica, apenas em razão da apuração de créditos obtidos em outra relação processual, foi declarada pelo E. STF (ADIn. 5766/DF), em sessão do dia 20/10/2021, tornando prejudicado, inclusive, o objeto da ArglncCiv 0008292-68.2019.5.15.0000, em trâmite no âmbito deste E. Tribunal. Com efeito, o Pretório Excelso reconheceu que o referido preceito padece de inconstitucionalidade, por violação ao art. 5º, incisos XXXV e LXXIV, da Constituição Federal. Registre-se, de outra parte, que a eficácia "erga omnes" das decisões do STF, quando proferidas em controle concentrado de constitucionalidade, ocorre a partir da publicação da ata de seu julgamento, o que se deu, neste caso, no mesmo dia 20/10/2021 (STF, ARE 1.031.810/DF, Recl 3.632/AM; Recl872/SP, Recl 3.473 /DF, ADI 711/AM). Ademais, na decisão proferida na Reclamação 53.350-DF (DJe 17 /05/2022), o Ministro Alexandre de Moraes esclareceu que "o que esta CORTE vedou foi o automático afastamento da condição de hipossuficiência da parte como consequência lógica da obtenção de valores em juízo, e não a possibilidade de haver condenação em honorários advocatícios (os quais podem ser arbitrados, ficando sob condição suspensiva de exigibilidade)". Nesse sentido, todas as Turmas do Eg. TST firmaram entendimento de que segue possível a condenação do hipossuficiente econômico ao pagamento de honorários sucumbenciais, desde que se suspenda a exigibilidade do crédito até a mudança da situação patrimonial do devedor, demonstrada oportunamente pelo credor, perante o juízo de origem, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou. Portanto, a interpretação conferida pela v. decisão recorrida está em consonância com iterativa, notória e atual jurisprudência do Eg. TST (RR- 1001724-11.2019.5.02.0055,1ª Turma, Relator: Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 11/11 /2022, RR-1000912-90.2020.5.02.0068, 2ª Turma, Relatora: Maria Helena Mallmann, DEJT 09/12/2022, RR-20303-24.2018.5.04.0016, 3ª Turma, Relator: Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 24/06/2022, RR-1000389-26.2019.5.02.0711, 4ª Turma, Relator: Alexandre Luiz Ramos, DEJT 03/06/2022, Ag-RR-1000413-72.2019.5.02.0511, 5ª Turma, Relator: Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 10/06/2022, RR-467-76.2019.5.12.0026, 6ª Turma, Relatora: Katia Magalhaes Arruda, DEJT 02/12/2022, Ag-RR-1003144- 12.2017.5.02.0511, 7ª Turma, Relator: Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 09/12/2022 e RR-10647-82.2019.5.15.0119, 8ª Turma, Relator: Aloysio Correa da Veiga, DEJT 27/05 /2022). Inviável, por decorrência, o apelo, ante o disposto no art. 896, § 7º, da CLT e na Súmula 333 do Eg. TST. CONCLUSÃO DENEGO seguimento ao recurso de revista. (...) O Reclamante sustenta, em síntese, que lhe foi concedido o benefício da justiça gratuita, porém foi condenado ao pagamento de honorários sucumbenciais em razão da procedência parcial no presente processo. Defende que “a manutenção da condenação do recorrente ao pagamento da verba honorária em favor dos recorridos, viola princípios e garantias previstos na Constituição Federal, em especial os princípios da inafastabilidade da jurisdição e a assistência judiciária integral aos hipossuficientes” (fl. 618). Aponta, dentre outros, violação do artigo 1º, III, IV, 3º, III, 5º, XXXV, LIV, LV e LXXIV, da Constituição Federal. Ao exame. Inicialmente, ressalto que a parte Agravante, nas razões do recurso de revista, atendeu devidamente às exigências processuais contidas no art. 896, § 1º-A, I, II e III, e § 8º, da CLT. Afinal, a parte transcreveu o trecho da decisão regional que consubstancia o prequestionamento da controvérsia (fl. 616), indicou ofensa à ordem jurídica e promoveu o devido cotejo analítico. No caso presente, o Tribunal Regional negou provimento ao recurso ordinário das partes e manteve sentença na qual constou condenação de ambas a honorários advocatícios de 10%, visto que verificada a sucumbência reciproca na demanda e nos exatos termos do art. 791-A da CLT. Consignou que a sentença já determinou a suspensão de exigibilidade da parcela devida pelo Reclamante por ser esse beneficiário da justiça gratuita e ressaltou que, “Conforme decisão proferida pelo E. STF nos autos da ADI 5766, observa-se que os limites da declaração de inconstitucionalidade do art. 791, §4° da CLT estão atrelados à presunção de que deixou de existir a condição de hipossuficiência que justificou a concessão dos benefícios da justiça gratuita, somente pelo fato de o trabalhador ter obtido créditos no mesmo ou em outro processo.” (fls. 573/574). Entendeu que “permanece hígida a possibilidade de condenação do beneficiário da justiça gratuita, devendo o crédito permanecer em condição suspensiva” (fl. 574), razão pela qual manteve condenação e os parâmetros estabelecidos na sentença. Pois bem. Conforme artigo 6º da Instrução Normativa 41/2018 elaborada por esta Corte Superior, as alterações promovidas pela Lei 13.467/2017, referentes aos honorários advocatícios sucumbenciais, só se aplicam às ações propostas após 11 de novembro de 2017, in verbis: Art. 6º Na Justiça do Trabalho, a condenação em honorários advocatícios sucumbenciais, prevista no art. 791-A, e parágrafos, da CLT, será aplicável apenas às ações propostas após 11 de novembro de 2017 (Lei nº 13.467/2017). Nas ações propostas anteriormente, subsistem as diretrizes do art. 14 da Lei nº 5.584/1970 e das Súmulas nos 219 e 329 do TST. A presente ação foi proposta em 01/02/2023, portanto, após a vigência da Lei 13.467/2017, e, desse modo, o regramento relativo à condenação de honorários advocatícios segue a diretriz da referida legislação. A esse respeito, dispõe o art. 791-A da CLT: Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. § 1º Os honorários são devidos também nas ações contra a Fazenda Pública e nas ações em que a parte estiver assistida ou substituída pelo sindicato de sua categoria. § 2º Ao fixar os honorários, o juízo observará: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. § 3º Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca, vedada a compensação entre os honorários. § 4º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. § 5º São devidos honorários de sucumbência na reconvenção. A norma em exame ao mesmo tempo em que buscou prestigiar uma conduta responsável por parte daquele que busca a tutela do Poder Judiciário, não descuidou do trabalhador hipossuficiente, ao prever a condição suspensiva de exigibilidade da verba honorária em caso de sucumbência. Sucede que o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a ADI 5766, concluiu que, não obstante seja possível a condenação do beneficiário da justiça gratuita ao pagamento de honorários advocatícios, não se pode presumir que a mera obtenção de créditos em juízo seja apta a alterar o status de hipossuficiente do trabalhador, razão pela qual é inviável a utilização dos valores relativos ao êxito na demanda para fins de pagamento dos honorários da parte adversa. Eis os termos da decisão: EMENTA: CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 13.467/2017. REFORMA TRABALHISTA. REGRAS SOBRE GRATUIDADE DE JUSTIÇA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DE ÔNUS SUCUMBENCIAIS EM HIPÓTESES ESPECÍFICAS. ALEGAÇÕES DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO, ACESSO À JUSTIÇA, SOLIDARIEDADE SOCIAL E DIREITO SOCIAL À ASSISTÊNCIA JURÍDICA GRATUITA. MARGEM DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CRITÉRIOS DE RACIONALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. 1. É inconstitucional a legislação que presume a perda da condição de hipossuficiência econômica para efeito de aplicação do benefício de gratuidade de justiça, apenas em razão da apuração de créditos em favor do trabalhador em outra relação processual, dispensado o empregador do ônus processual de comprovar eventual modificação na capacidade econômica do beneficiário. 2. A ausência injustificada à audiência de julgamento frustra o exercício da jurisdição e acarreta prejuízos materiais para o órgão judiciário e para a parte reclamada, o que não se coaduna com deveres mínimos de boa-fé, cooperação e lealdade processual, mostrando-se proporcional a restrição do benefício de gratuidade de justiça nessa hipótese. 3. Ação Direta julgada parcialmente procedente. Declarou-se, então, a inconstitucionalidade da parte final do art. 791-A, § 4º, da CLT, precisamente das expressões: "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa". Assim, vencido o beneficiário da justiça gratuita, poderá ser condenado ao pagamento de honorários advocatícios, os quais, todavia, permanecerão sob condição suspensiva de exigibilidade, somente podendo ser executados caso haja prova superveniente da perda da condição de hipossuficiência, vedada qualquer compensação com créditos trabalhistas obtidos na ação ou em outra demanda. No caso dos autos, o Tribunal Regional, considerando a sucumbência recíproca, manteve sentença que condenou ambas as partes ao pagamento dos honorários sucumbenciais, aplicando a condição suspensiva de exigibilidade prevista no art. 791, § 4º, da CLT quanto aos honorários devidos pelo Reclamante beneficiário da justiça gratuita. Assim, a Corte a quo proferiu decisão em consonância com a tese jurídica firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da na ADI 5766. Encontrando-se, pois, a decisão agravada em conformidade com a jurisprudência consolidada deste Tribunal Superior do Trabalho, não se configura a transcendência política. Do mesmo modo, não há falar em questão jurídica nova (transcendência jurídica); o valor da causa não assume expressão econômica suficiente a ensejar a intervenção desta Corte (transcendência econômica); nem tampouco se divisa ofensa a direito social constitucionalmente assegurado (transcendência social). Ante o exposto, e amparado no artigo 932 do CPC, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento. III – AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA Trata-se de agravo de instrumento interposto em face da decisão do Tribunal Regional do Trabalho, mediante a qual foi denegado seguimento ao recurso de revista. A parte procura demonstrar a satisfação dos pressupostos para o processamento do recurso obstado. Houve apresentação de contraminuta e contrarrazões. Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, na forma regimental. Assim resumida a espécie, profiro a seguinte decisão, com lastro no art. 932 do CPC. Observo que o recurso encontra-se tempestivo e regular. Registro, ainda, que se trata de agravo de instrumento com o objetivo de viabilizar o processamento de recurso de revista interposto em face de decisão publicada na vigência das Leis 13.015/2014 e 13.467/2017. O Tribunal Regional negou seguimento ao recurso de revista da parte, por entender não configuradas as hipóteses de cabimento previstas no artigo 896 da CLT. Eis os termos da decisão: (...) DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / DURAÇÃO DO TRABALHO (13764) / COMPENSAÇÃO DE JORNADA (13767) / REGIME 12X36 DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / DURAÇÃO DO TRABALHO (13764) / HORAS EXTRAS APLICABILIDADE DO ART. 59-B, PARÁGRAFO ÚNICO, DA CLT O v. acórdão, com base nas provas dos autos, consignou que, conquanto tenha sido estabelecido por norma coletiva, houve prestação habitual de horas extraordinárias a invalidar o regime 12x36. Ressaltou ademais que a referida escala de trabalho não pode se confundir com o sistema de compensação de jornada, afastando a aplicação da Súmula nº 85, item IV e do art. 59-B, parágrafo único, da CLT. O Eg. TST firmou entendimento de que a prestação habitual de horas extras descaracteriza o regime especial de jornada de trabalho 12x36 (12 horas de trabalho por 36 horas de descanso), ainda que autorizado por meio de norma coletiva, devendo ser remuneradas, como extras, as horas laboradas após a 8ª hora diária e 44ª hora semanal, acrescidas do adicional de 50%, inclusive no período posterior ao início de vigência da Lei nº 13.467/2017. Inaplicáveis a Súmula 85, IV, e o art. 59-B, parágrafo único, da CLT (incluído pel Lei nº 13.467/2017), ao caso, por não se tratar o referido regime de um sistema de compensação de jornada propriamente dito, mas sim de um regime especial de trabalho de caráter excepcional. Portanto, a interpretação conferida pelo v. acórdão recorrido está em consonância com iterativa, notória e atual jurisprudência do Eg. TST (RRAg-372-64.2020.5.06.0192, 3ª Turma, Relator: Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 17/02/202, Ag- AIRR-708-21.2019.5.06.0413, 4ª Turma, Relator: Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 07/05/2021, RR-1000761-18.2018.5.02.0708, 6ª Turma, Relatora: Cilene Ferreira Amaro Santos, DEJT 20/09/2019, RR-1144-59.2015.5.02.0080, 7ª Turma, Relator: Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 12/05/2023 e RRAg-10195-12.2020.5.03.0171, 8ª Turma, Relatora: Delaide Alves Miranda Arantes, DEJT 24/10/2022). Inviável, por consequência, o apelo, ante o disposto no art. 896, § 7º, da CLT e na Súmula 333 do Eg. TST. CONCLUSÃO DENEGO seguimento ao recurso de revista. (...) A parte requer a exclusão da condenação ao pagamento de horas extras sob o argumento de que o regime de escala 12x36 está previsto em norma coletiva. Defende que “a extrapolação da jornada em poucos minutos diários não pode ser se considerada como realização de horas extras habituais, até porque são apenas minutos, a ponto de tornar nula a jornada de 12x36” (fl. 634). Sustenta, ainda, que a realização de horas extras habituais não invalida a norma coletiva que previu a jornada em turnos ininterruptos de revezamento, devendo ser prestigiada a autonomia negocial coletiva. Argumenta que “a jornada de trabalho do Reclamante sempre guardou consonância com as normas previstas em Convenção Coletiva de Trabalho, não havendo que se falar em descaracterização da escala 12x36” (fl. 626) e defende a aplicação do decidido pelo STF no julgamento do Tema 1.046 da sua Tabela de Repercussão Geral. Aduz que “a prestação de horas extras não invalida o sistema adotado, até porque não há previsão na norma coletiva nesse sentido, sendo devidas, como extras, apenas as horas que ultrapassarem a jornada negociada coletivamente.” (fl. 682). Aponta, dentre outros, violação dos artigos 7º, XIII e XXVI, da CF, 59-A, 59-B, parágrafo único, 611, §1º, da CLT, bem como contrariedade às Súmulas 85, IV, e 444 do TST e divergência jurisprudencial. Transcreve arestos para cotejo de teses. Ao exame. Inicialmente, ressalto que a parte Agravante, nas razões do recurso de revista, atendeu devidamente às exigências processuais contidas no art. 896, § 1º-A, I, II e III, e § 8º da CLT. Afinal, a parte transcreveu o trecho da decisão regional que consubstancia o prequestionamento da controvérsia (fls. 624/625); indicou ofensa à ordem jurídica, bem como contrariedade a verbete sumular; e promoveu o devido cotejo analítico. No caso presente, o Tribunal Regional manteve sentença na qual foi afastada norma coletiva por entender que a existência de horas extras habituais invalida o regime de trabalho de 12x36 pactuado. Entendeu que “a descaracterização da escala 12x36 é inevitável, pois há um conjunto de descumprimentos das normas trabalhistas, o que inviabiliza a consecução dos objetivos da jornada especial, diante do comprometimento da relação entre a quantidade de horas trabalhadas e aquelas necessárias para a recomposição da saúde física e psíquica do trabalhador, considerando a prestação de horas extras diárias, somadas à supressão do intervalo intrajornada e à realização de folgas trabalhadas além do limite permitido pela norma coletiva.” (fl. 567). Consignou que “não há inobservância à tese vinculante fixada pelo E. STF no julgamento do Tema 1046, pois a reclamada não pode defender o cumprimento da norma coletiva pelo trabalhador se, de outro lado, a própria empresa descumpriu a sua parte.” (fl. 567). Ainda, ressaltou que, “em caso de ausência de cumprimento das formalidades legais ou de prestação de horas extras habituais, a Súmula 85 do C. TST e o atual art. 59-B não se aplicam para fundamentar a impossibilidade de descaracterização da escala 12x36, uma vez que tal sistema não se trata, propriamente, de um regime de compensação.” (fl. 567). Concluiu, assim, que “Com a descaracterização da escala 12x36, devem ser restabelecidos os limites de 8 horas diárias e 44 semanais, pelo que não tem razão a reclamada ao pleitear a observância das variações dos limites semanais, tampouco que sejam deferidas apenas as diferenças pelo labor além da 12ª hora.” (fl. 569). Pois bem. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada em 02/06/2022, apreciou o Tema 1.046 do ementário de repercussão geral e deu provimento ao recurso extraordinário (ARE 1121633) para fixar a seguinte tese: "São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis". Portanto, segundo o entendimento consagrado pelo STF no referido julgamento, alçada a autonomia negocial coletiva ao patamar constitucional (art. 7º, XXVI, da CF), as cláusulas dos acordos e convenções coletivas de trabalho, em que previsto o afastamento ou limitação de direitos, devem ser integralmente cumpridas e respeitadas, salvo quando, segundo a teoria da adequação setorial negociada, afrontem direitos revestidos com a nota da indisponibilidade absoluta. No caso dos autos, não se discute direito absolutamente indisponível do trabalhador. A jornada para os turnos ininterruptos de revezamento pode ser transacionada pelos atores coletivos pactuantes, na linha da mais recente jurisprudência do STF. Ainda, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual realizada de 5.4.2024 a 12.4.2024, por unanimidade, no julgamento do RE 1.476.596/MG, concluiu que a prestação habitual de horas extras não é suficiente para afastar a aplicação do instrumento coletivo tampouco configura descumprimento da norma coletiva pela Reclamada. Ao que se verifica, a decisão do Tribunal Regional parece desafiar a remansosa jurisprudência desta Corte, restando divisada, portanto, a transcendência política do debate proposto. Nesse contexto, em que se vislumbra possível afronta ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, deve ser provido o agravo de instrumento, autorizando-se o processamento do recurso de revista, para melhor análise. Assim, DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento, para prosseguir no exame do recurso de revista no tema. IV – RECURSO DE REVISTA Satisfeitos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passo ao exame dos pressupostos intrínsecos do recurso de revista. O Tribunal Regional assim decidiu acerca da matéria: (...) HORAS EXTRAS. ESCALA 12X36. MINUTOS RESIDUAIS. FOLGAS TRABALHADAS. INTERVALO INTRAJORNADA A reclamada pede que seja reconhecida a validade da escala 12x36, conforme autorizada em norma coletiva, alegando que os cartões de ponto são válidos e que todas as horas trabalhadas foram devidamente anotadas e pagas. Afirma que o reclamante não trabalhava mais do que 4 folgas; que não houve prova capaz de demonstrar a existência de minutos não anotados e que a prova oral demonstra que sempre houve correta anotação da jornada, inclusive das folgas trabalhadas; que o depoimento da testemunha do reclamante deve ser avaliado com cautela, pois também possui ação contra a empresa, além de se mostrar contraditório, pois o depoente não trabalhou diretamente com o autor. Argumenta que eventuais minutos residuais ou supressão do intervalo intrajornada não descaracterizam a escala 12x36. Subsidiariamente, a reclamada pede que eventuais diferenças de horas extras sejam apuradas para o labor além da 12ª hora; que seja reconhecido que a escala desempenhada é de 36 horas em uma semana e 48 em outra; que seja aplicado o divisor 220. E com relação ao intervalo intrajornada, a ré insiste que o autor sempre desfrutou de uma hora completa, advertindo que a testemunha obreira não acompanhava a pausa, enquanto a testemunha da empresa teria afirmado que já presenciou o autor durante o intervalo. O reclamante, por sua vez, pleiteia a majoração da condenação com relação aos domingos e feriados, alegando que com a descaracterização da escala 12x36, não se aplica o art. 59-A da CLT. Com parcial razão a reclamada em seus pedidos subsidiários e com parcial razão o reclamante quanto aos feriados. Vejamos. Quanto à descaracterização da escala 12x36, não há reparos a serem feitos na sentença, pois o reclamante comprovou que os controles de frequência juntados pela reclamada não refletem a realidade do contrato. O preposto da reclamada afirmou que após os registros, o relatório era impresso para assinatura do empregado; a testemunha do reclamante também afirmou que os cartões de ponto eram assinados pelo reclamante com horários prontos; a testemunha da reclamada declarou, no mesmo sentido, que era emitido um relatório para conferência e assinatura. Entretanto, os controles juntados pela empresa não possuem assinatura do reclamante (fls. 215/245). Embora a ausência de assinatura, por si, não seja causa para invalidade dos documentos, a própria reclamada admitiu que os controles ocorria dessa forma, evidenciando que os relatórios juntados não são os mesmos conferidos pelo trabalhador. E não é só. A testemunha da reclamada afirmou que todos os postos de trabalho possuem livro de ocorrência, logo, a prova sobre as folgas trabalhadas era simples para a empresa, bastando a juntada dos referidos livros, em ordem sequencial, para identificar a quantidade de dias trabalhados pelo reclamante nos meses do contrato. Outrossim, a testemunha do reclamante foi segura ao afirmar que os registros de ponto eram apresentados incorretamente; que nem todas folgas trabalhadas eram anotadas; que o reclamante chegava com antecedência na base para, então, ser conduzido ao posto, sendo que somente lá é que ocorria a anotação da jornada, ocorrendo situação similar na saída. O depoimento da testemunha obreira merece credibilidade, pois o próprio depoente afirmou que ele ou outros supervisores, conduziam o autor da base para o posto e que já ligou para o reclamante trabalhar em folgas. A reclamada não produziu prova capaz de demonstrar eventual comprometimento de isenção da testemunha do reclamante, o que se configura pelo simples fato de também litigar contra a empresa, conforme Súmula 357 do C. TST. Com relação ao intervalo intrajornada, diante da imprestabilidade dos controles, cabia à reclamada comprovar o respeito à pausa, ônus do qual não se desvencilhou, pois embora sua testemunha tenha afirmado que já presenciou o autor durante o intervalo, relatou que nunca almoçou com o trabalhador, logo, é evidente que não possui conhecimento sobre a duração da pausa. Assim, correta a sentença que fixou a jornada de trabalho do reclamante em conformidade com o conjunto probatório, nos termos do trecho da decisão que adiante transcrevo e adoto como parte das razões de decidir: No tocante à jornada propriamente dita, embora a testemunha do reclamante não tenha trabalhado diretamente com o autor, eis que inspetor de segurança, reputo que reforçou informações importantes como os postos de trabalho (Base e Moinhos), atestando o labor do autor na Base por aproximadamente 01 ano, situação que é correspondente à lotação dos cartões na medida que eles revelam o labor rotativo até 01/04/2021, com a fixação de posto a partir de 02/04/2021 e alteração do horário diurno para o noturno a partir de 04/03/2022 até a rescisão. Outra declaração que destaco é em relação aos horários praticados pelo autor, bem próximos daqueles mencionados na exordial, em que pese a testemunha não tenha feito esclarecimentos sobre a necessidade de troca de uniforme e adoção de providências do posto. De todo modo, menciona que o horário estendido das 05h30 às 18h30 era por conta do deslocamento entre a base e o posto de trabalho quando o autor não tinha posto fixo, situação era levado e buscado pelos funcionários da empresa. Atestou, ainda, a testemunha do autor a ausência de rendição e o gozo de 15 minutos de intervalo intrajornada, com folgas laboradas na proporção de 06 a 07 por mês, sendo algumas registradas e outras não, decisão que era da empresa, uma vez que os espelhos vinham prontos para assinatura. Embora não tenha laborado com o autor no dia a dia, diz ter ciência do labor em folgas porque já presenciou o autor laborar nesses dias e também fez o contato para que ele trabalhasse nas folgas (15m30s em diante). Neste contexto fático, afasto os cartões para fins de comprovação de jornada (cadência, entrada, saída e intervalo intrajornada), arbitrando a jornada nos seguintes moldes, considerando os depoimentos das partes, a prova testemunhal, os documentos juntados e princípio da razoabilidade: Base, desde a admissão até 01/04/2021: escala 12x36, das 05h30 às 18h30, com 15 minutos de intervalo e 06 folgas trabalhadas por mês; Moinhos, de 02/04/2021 até 03/03/2022: escala 12x36, das 05h40 às 18h10, com 15 minutos de intervalo e 06 folgas trabalhadas por mês; Moinhos, de 04/03/2022 até a rescisão: escala 12x36, das 17h40 às 06h10, com 15 minutos de intervalo e 06 folgas trabalhadas por mês. Nesse contexto, a descaracterização da escala 12x36 é inevitável, pois há um conjunto de descumprimentos das normas trabalhistas, o que inviabiliza a consecução dos objetivos da jornada especial, diante do comprometimento da relação entre a quantidade de horas trabalhadas e aquelas necessárias para a recomposição da saúde física e psíquica do trabalhador, considerando a prestação de horas extras diárias, somadas à supressão do intervalo intrajornada e à realização de folgas trabalhadas além do limite permitido pela norma coletiva. Por isso não há inobservância à tese vinculante fixada pelo E. STF no julgamento do Tema 1046, pois a reclamada não pode defender o cumprimento da norma coletiva pelo trabalhador se, de outro lado, a própria empresa descumpriu a sua parte. Ora, admitir a possibilidade de manutenção da jornada de 12 horas diárias sem o pagamento de horas extras pelo labor além da 8ª hora, afronta o art. 7, XIII da CF/88 e o próprio art. 59 da CLT, que autoriza o acréscimo de horas extras à jornada, em número não excedente a duas. Cumpre ressaltar que em caso de ausência de cumprimento das formalidades legais ou de prestação de horas extras habituais, a Súmula 85 do C. TST e o atual art. 59-B não se aplicam para fundamentar a impossibilidade de descaracterização da escala 12x36, uma vez que tal sistema não se trata, propriamente, de um regime de compensação. Nesse sentido segue a jurisprudência do C. TST: I - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. LEIS NºS 13.015/2014 E 13.467/2017 . REGIME DE JORNADA DE TRABALHO 12 X 36. PRESTAÇÃO DE HORAS EXTRAS HABITUAIS. DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME. PERÍODO DE VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. 1. A jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que a extrapolação do limite diário ou semanal descaracteriza o regime especial de jornada de trabalho 12 x 36, ainda que autorizado por meio de norma coletiva, vez que em desacordo com o disposto no art. 7º, XIII, da Constituição da República. 2. Descaracterizado o acordo de compensação por vício material, em que tanto a jornada diária quanto a semanal eram extrapoladas nas semanas em que a reclamante laborava por 4 dias, é inaplicável a segunda parte do item IV da Súmula 85 desta Corte, a qual prevê a limitação do pagamento ao adicional legal, porquanto a adoção irregular da escala de trabalho não se confunde com mero sistema de compensação de jornada. 3. O entendimento jurisprudencial de que o regime em escala 12x36 não corresponde à simples compensação de jornada semanal também importa para afastar a incidência do parágrafo único do art. 59-B da CLT. Precedentes. 4. As premissas fáticas consignadas no acórdão regional indicam ser incontroverso que o reclamante, embora sujeito à jornada excepcional de 12x36, prestava labor extraordinário em caráter habitual, razão pela qual resta descaracterizado o regime de 12x36, devendo ser remuneradas, como extras, as horas laboradas após a 8ª hora diária e 44ª hora semanal, inclusive no período posterior ao início de vigência da Lei nº 13.467/2017, eis que é inaplicável a previsão do art. 59-B, parágrafo único, da CLT ao caso. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (RRAg - 372-64.2020.5.06.0192 - Orgão Judicante: 3ª Turma - Relator: Alberto Bastos Balazeiro - Julgamento: 15/02/2023 - Publicação: 17/02/2023) AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - REGIME DE ESCALA DE 12X36 - DESCARACTERIZAÇÃO - HORAS EXTRAORDINÁRIAS HABITUAIS. De acordo com a jurisprudência desta Corte, a prestação de horas extraordinárias habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada, mesmo quando celebrado mediante adoção do regime de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso. Precedentes da SBDI-1 . Incidem o art. 896, § 7º, da CLT e a Súmula nº 333 do TST. Agravo interno desprovido. (Ag-AIRR - 11545-36.2017.5.15.0129 - Orgão Judicante: 2ª Turma - Relatora: Margareth Rodrigues Costa - Julgamento: 08/02/2023 - Publicação: 10/02/2023) 2 - REGIME 12X36. HORAS EXTRAS HABITUAIS. INVALIDADE. 2.1. A discussão destes autos não diz respeito à matéria com repercussão geral tratada no Tema 1046-"Validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado constitucionalmente", uma vez que o Tribunal de origem não declarou a invalidade da norma coletiva, tendo destacado, na verdade, o descumprimento da norma pela reclamada, pela exigência de trabalho extraordinário habitual. 2.2. No caso, a prestação habitual de horas extras descaracterizou completamente o regime de 12X36, sendo devidas, como extras, as horas excedentes da 8ª diária e da 44ª semanal. Agravo não provido. (Ag-AIRR - 315-57.2019.5.09.0011 - Orgão Judicante: 8ª Turma - Relatora: Delaide Alves Miranda Arantes - Julgamento: 09/11/2022 - Publicação: 16/11/2022) No sistema de trabalho do reclamante a folga aos domingos ocorria de forma intercalada durante o mês, logo, não há que se falar em pagamento em dobro desses dias, conforme art. 7°, XV da CF/88. Mas tem razão o reclamante quanto ao pagamento em dobro dos feriados trabalhados, na forma da Súmula 444 do C. TST, pois com a descaracterização da escala 12x36, não se aplica o art. 59-A, parágrafo único da CLT. Portanto, provejo em parte o recurso do reclamante para deferir o pagamento dos feriados trabalhados como horas extras, acrescidas do adicional de 100%, mais os reflexos deferidos em sentença. Considerando que o reclamante não informou os feriados trabalhados, deverão ser considerados as datas nacionais, indicadas na Lei 662/1949, apurando em liquidação se coincidentes com a escala, considerando o primeiro dia de trabalho em diante e observando eventuais afastamentos. Com a descaracterização da escala 12x36, devem ser restabelecidos os limites de 8 horas diárias e 44 semanais, pelo que não tem razão a reclamada ao pleitear a observância das variações dos limites semanais, tampouco que sejam deferidas apenas as diferenças pelo labor além da 12ª hora. Entretanto, pelos mesmos fundamentos, a reclamada tem razão ao requerer a aplicação do divisor 220, o que também está em conformidade com a mais recente jurisprudência da Corte Superior: II - RECURSO DE REVISTA. RECLAMADA. LEI Nº 13.467/2017. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. REGIME 12X36. HORAS EXTRAS. DIVISOR. 1 - Discute-se a aplicação do divisor para cálculo de horas extras aos empregados que trabalham em jornada de 12x36 horas. 2 - O entendimento desta Corte é no sentido de que somente é considerada hora extra a que exceda o limite das 44 semanais, o que atrai a aplicação do divisor 220 para o cálculo das horas extras do empregado que trabalha no regime de 12x36. Julgados. 3 - Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento". (RR - 10773-90.2020.5.03.0165 - Orgão Judicante: 6ª Turma - Relatora: Katia Magalhaes Arruda - Julgamento: 16/02/2022 - Publicação: 18/02/2022). B) RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E LEI 13.467/2017 .HORAS EXTRAS. JORNADA DE TRABALHO 12x36. DIVISOR APLICÁVEL. A decisão do TRT considera inaplicável o divisor 220 referido por documentos coletivos negociados pertinentes à categoria/empresa, insistindo na aplicação do divisor 210. Contudo, a jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que, em se tratando de trabalho submetido ao regime de 12x36, o divisor adotado deve ser 220. Julgados. Recurso de revista conhecido e provido". (RR - 10446-70.2020.5.03.0093 - Orgão Judicante: 3ª Turma - Relator: Mauricio Godinho Delgado - Julgamento: 27/10/2021 - Publicação: 05/11/2021). II - RECURSO DE REVISTA. LEI N.º 13.015/2014. HORAS EXTRAS. ESCALA 12x36. DIVISOR APLICÁVEL. Hipótese em que o Tribunal Regional manteve a condenação quanto à aplicação do divisor 210 para jornada de 12x36 horas. Contudo, a jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que, em se tratando de trabalho submetido ao regime de 12x36, o divisor adotado deve ser o 220. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido". (ARR - 11364-89.2016.5.03.0004 - Orgão Judicante: 2ª Turma - Relatora: Maria Helena Mallmann - Julgamento: 15/09/2021 - Publicação: 17/09/2021). Reformo em parte. (...) A parte requer a exclusão da condenação ao pagamento de horas extras sob o argumento de que o regime de escala 12x36 está previsto em norma coletiva. Defende que “a extrapolação da jornada em poucos minutos diários não pode ser se considerada como realização de horas extras habituais, até porque são apenas minutos, a ponto de tornar nula a jornada de 12x36” (fl. 634). Sustenta, ainda, que a realização de horas extras habituais não invalida a norma coletiva que previu a jornada em turnos ininterruptos de revezamento, devendo ser prestigiada a autonomia negocial coletiva. Argumenta que “a jornada de trabalho do Reclamante sempre guardou consonância com as normas previstas em Convenção Coletiva de Trabalho, não havendo que se falar em descaracterização da escala 12x36” (fl. 626) e defende a aplicação do decidido pelo STF no julgamento do Tema 1.046 da sua Tabela de Repercussão Geral. Aduz que “a prestação de horas extras não invalida o sistema adotado, até porque não há previsão na norma coletiva nesse sentido, sendo devidas, como extras, apenas as horas que ultrapassarem a jornada negociada coletivamente.” (fl. 682). Aponta, dentre outros, violação dos artigos 7º, XIII e XXVI, da CF, 59-A, 59-B, parágrafo único, 611, §1º, da CLT, bem como contrariedade às Súmulas 85, IV, e 444 do TST e divergência jurisprudencial. Transcreve arestos para cotejo de teses. Ao exame. No caso presente, o Tribunal Regional manteve sentença na qual foi afastada norma coletiva por entender que a existência de horas extras habituais invalida o regime de trabalho de 12x36 pactuado. Entendeu que “a descaracterização da escala 12x36 é inevitável, pois há um conjunto de descumprimentos das normas trabalhistas, o que inviabiliza a consecução dos objetivos da jornada especial, diante do comprometimento da relação entre a quantidade de horas trabalhadas e aquelas necessárias para a recomposição da saúde física e psíquica do trabalhador, considerando a prestação de horas extras diárias, somadas à supressão do intervalo intrajornada e à realização de folgas trabalhadas além do limite permitido pela norma coletiva.” (fl. 567). Consignou que “não há inobservância à tese vinculante fixada pelo E. STF no julgamento do Tema 1046, pois a reclamada não pode defender o cumprimento da norma coletiva pelo trabalhador se, de outro lado, a própria empresa descumpriu a sua parte.” (fl. 567). Ainda, ressaltou que, “em caso de ausência de cumprimento das formalidades legais ou de prestação de horas extras habituais, a Súmula 85 do C. TST e o atual art. 59-B não se aplicam para fundamentar a impossibilidade de descaracterização da escala 12x36, uma vez que tal sistema não se trata, propriamente, de um regime de compensação.” (fl. 567). Concluiu, assim, que “Com a descaracterização da escala 12x36, devem ser restabelecidos os limites de 8 horas diárias e 44 semanais, pelo que não tem razão a reclamada ao pleitear a observância das variações dos limites semanais, tampouco que sejam deferidas apenas as diferenças pelo labor além da 12ª hora.” (fl. 569). Pois bem. Registro que os Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho são reconhecidos em nível constitucional (artigo 7º, XXVI), cumprindo-lhes fixar as cláusulas e condições de trabalho a serem observadas nos contratos de trabalho celebrados pelos sujeitos vinculados ao âmbito de representação dos entes pactuantes. Como regra, buscam ampliar os níveis de proteção social já assegurados pela ordem normativa heterônoma estatal (CLT, artigos 9º e 444), sem prejuízo de que, em situações excepcionais e devidamente justificadas, possam também promover a redução, temporal e transitória, em relação aos temas salário e jornada, dos padrões legais de proteção social (CF, artigo 7º, VI, XIII e XIV). Desvendar quais são os limites da negociação coletiva é tarefa extremamente difícil, sobretudo quando a Lei Maior consagra o princípio da autonomia privada coletiva e ao mesmo tempo estatui garantias pontuais ao trabalhador. Ao longo da história, doutrina e jurisprudência tentaram fixar o real alcance do poder de conformação coletiva autônoma de interesses no âmbito das relações de trabalho, compondo conflitos e fixando novas regras de observância obrigatória nos contratos de trabalho celebrados no âmbito das categorias representadas. A Magistrada e Professora Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva, em estudo expressivo, analisou as tendências do TST na primeira metade da década de 2000 (pós-década de 1990), observando que: "Apesar da recente revalidação do entendimento, validando a negociação coletiva no que se refere ao turno ininterrupto de revezamento, que indica que o espaço da negociação coletiva permanece sendo valorizado, observa-se que não há mais uma postura acrílica em relação aos conteúdos pactuados, havendo uma tendência a abandonar o minimalismo que caracterizou os primeiros julgados". (...) Quando o TST passa a excepcionar as regras que afetam a saúde e a segurança do trabalhador daquelas possíveis de serem transacionadas, afirmando-as como critérios decisivos para a invalidação das regras coletivamente pactuadas, há uma sinalização de um deslocamento do debate. Diminui-se a importância do debate pactuado/legislado para o eixo no interior das próprias regras legais, no sentido da discussão de sua disponibilidade relativa/indisponibilidade, em que se questionam os contornos do que seja ordem pública social, bem como sobre o respeito às regras legais aplicáveis aos processos negociais". (SILVA, Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da. Relações coletivas de trabalho. São Paulo: LTr, 2008. p. 478-479. O exercício da autonomia negocial coletiva reconhecida aos sindicatos (CF, art. 7º, XXVI e 8º, VI), no entanto, não é absoluto e não pode alcançar normas que contrariem as liberdades individuais ou coletivas ou os direitos individuais indisponíveis dos trabalhadores (LC 75/93, art. 83, IV), entre as quais se destacam as regras de proteção à saúde e segurança do trabalho (CF, arts. 7º, XXII, 21, XXIV c/c o art. 155 e ss da CLT) - que integram o núcleo essencial do postulado fundamental da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). Discorrendo sobre o alcance da autonomia negocial coletiva, a doutrina anuncia que: "Pelo princípio da adequação setorial negociada as normas autônomas juscoletivas construídas para incidirem sobre certa comunidade econômico-profissional podem prevalecer sobre o padrão geral heterônomo justrabalhista desde que respeitados certos critérios autorizativos: a) quando as normas autônomas juscoletivas implementam um padrão setorial de direitos superior ao padrão geral oriundo da legislação heterônomas aplicável; b) quando as normas autônomas juscoletivas transacionam setorialmente parcelas justrabalhistas de indisponibilidade relativa (e não de indisponibilidade absoluta). (...) São amplas, portanto, as possibilidades de validade e eficácia jurídicas das normas autônomas coletiva em face das normas heterônomas imperativas, à luz do princípio da adequação setorial negociada. Entretanto está claro que essas possibilidades não são plenas e irrefreáveis. Há limites objetivos à adequação setorial negociada; limites jurídicos objetivos à criatividade jurídica da negociação trabalhista. Desse modo, não prevalece se concretizada mediante ato estrito de renúncia (e não transação). É que ao processo negocial coletivo falece poderes de renúncia sobre direitos de terceiros (isto é, despojamento unilateral sem contrapartida do agente adverso). Cabe-lhe, essencialmente, promover transação (ou seja, despojamento bilateral ou multilateral, com reciprocidade entre os agentes envolvidos), hábil a gerar normas jurídicas." (DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, São Paulo: LTr, 2006, p. 1320-1321). Em outro momento, o Professor Delgado, ilustre ministro desta Corte, esclarece que: "No caso brasileiro, esse patamar civilizatório mínimo está dado essencialmente, por três grupos convergentes de normas trabalhlstas heterônomas: as normas constitucionais em geral (respeitadas, é Constituição: art. 7º, VI, XIII e XIV, por exemplo); as normas de tratados e convenções internacionais vigorantes no plano interno brasileiro (referidas pelo art. 5º, § 2º, da CF/88, já expressando um patamar civilizatório no próprio mundo ocidental em que se integra o Brasil); as normas legais infraconstitucionais que asseguram patamares de cidadania ao indivíduo que labora (preceitos relativos à saúde e segurança no trabalho, normas concernentes a bases salariais mínimas, normas de identificação profissional, dispositivos antidiscriminatórios etc. (Direito coletivo do trabalho, p. 177). Após expor o conteúdo do art. 4º da Convenção 98 da OIT (1949), Arion Romita ressalvava o caráter limitado da autonomia negocial coletiva: A autonomia sindical, no entanto, não pode ser invocada para acobertar abusos ou o mau uso da liberdade. Incumbe ao Estado, que tutela os interesses gerais de toda a sociedade, que coordena e harmoniza esses mesmos interesses, o dever de controlar a atividade sindical. O Estado democrático não pode deixar de proteger-se e proteger a sociedade: se admitisse a violação da lei (inclusive a penal) em nome do respeito à liberdade sindical, negaria a verdadeira liberdade a todos os cidadãos. Por isso, deve intervir onde e quando a ação sindical redunde em prejuízos dos interesses gerais que lhe incumbe tutelar institucionalmente. A intervenção estatal, porém, deve esgotar-se na tarefa de manter a ordem pública e estabelecer equilíbrio entre as necessidades e os direitos dos indivíduos." (ROMITA, Arion Sayao. Os limites da autonomia negocial coletiva segundo a jurisprudência. Revista LTr, setembro de 2016, p. 1038). E mais adiante prosseguia: Erra quem supõe que a negociação coletiva de condições de trabalho se reduza a um assunto entre particulares a respeito do qual o Estado mantem uma atitude neutra. Não: o Estado intervém porque o interesse público está diretamente afetado. A negociação coletiva não é livre, tal como se os interlocutores sociais pudessem leva-la a cabo conforme entendessem ou segundo suas conveniências. Embora inexista no Brasil legislação reguladora da negociação coletiva, a lei regula amplamente os institutos da convenção coletiva de trabalho e do acordo coletivo de trabalho. Em face da negociação coletiva, o Estado se reserva uma ampla gama de poderes que amparam uma também ampla intervenção, de sorte que, embora não se trate de uma negociação tripartite, pode ser considerada uma negociação vigiada, limitada, controlada. Esta intervenção se processa já a partir das restrições constitucionais e, principalmente, pela atuação do Ministério Público do Trabalho e da Justiça do Trabalho. (ob. cit., p. 1040). Assim, desde que atendida a exigência democrática da deliberação legítima da categoria e não se tratando de transação de direitos gravados de elevada significação social e, por isso, indisponíveis, tanto no plano coletivo quanto individual, deve ser reconhecida a validade da norma coletiva. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada em 02/06/2022, apreciou o Tema 1.046 do ementário de repercussão geral e deu provimento ao recurso extraordinário (ARE 1121633) para fixar a seguinte tese: "São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis". Portanto, segundo o entendimento consagrado pelo STF no referido julgamento, alçada a autonomia negocial coletiva ao patamar constitucional (art. 7º, XXVI, da CF), as cláusulas dos acordos e convenções coletivas de trabalho, em que previsto o afastamento ou limitação de direitos, devem ser integralmente cumpridas e respeitadas, salvo quando, segundo a teoria da adequação setorial negociada, afrontem direitos revestidos com a nota da indisponibilidade absoluta. No caso dos autos, não se discute direito absolutamente indisponível do trabalhador. A jornada para os turnos ininterruptos de revezamento (conforme reconhecida alhures, no caso) pode ser transacionada pelos atores coletivos pactuantes, na linha da mais recente jurisprudência do STF. Dessa forma, a instituição do regime de turno ininterrupto de revezamento em escala de 12x36, quando previsto em norma coletiva, é plenamente válida e deve ser respeitada, sob pena de maltrato ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal. Nesse sentido, é certo que esta Corte Superior sedimentou o entendimento de que a prestação habitual de horas extras além do módulo semanal estabelecido na norma coletiva evidenciava que a própria Reclamada descumpria o disposto no instrumento coletivo, razão pela qual o caso dos autos não guardaria relação com o Tema 1.046 do ementário de Repercussão Geral do STF - validade de acordo ou convenção coletiva de trabalho que disponha sobre a limitação ou redução de direitos trabalhistas. Ocorre que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual realizada de 5.4.2024 a 12.4.2024, por unanimidade, no julgamento do RE 1.476.596/MG, concluiu que a prestação habitual de horas extras não é suficiente para afastar a aplicação do instrumento coletivo tampouco configura descumprimento da norma coletiva pela Reclamada. Transcrevo: 5. O eventual descumprimento de cláusula de norma coletiva não é, de todo modo, fundamento para a sua invalidade. Observe-se que o autor ajuizou reclamação trabalhista com pedido de condenação no pagamento de horas extras. Isso sob o argumento de ilicitude de jornadas de turnos ininterruptos de revezamento estabelecidas em acordo coletivo de trabalho. Nesse sentido, a sentença trabalhista do Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Betim concluiu que o acordo coletivo seria inválido: Assim, INVALIDO as cláusulas normativas que permitem escalas de trabalho superiores a 6 horas e DEFIRO o pedido de pagamento de horas extras a partir da 6ª diária e diferenças de horas extras e adicionais noturnos já quitados durante o pacto laboral, conforme se apurar em liquidação. Assim, INVALIDO as cláusulas normativas que permitem escalas de trabalho superiores a 6 horas e DEFIRO o pedido de pagamento de horas extras a partir da 6ª diária e diferenças de horas extras e adicionais noturnos já quitados durante o pacto laboral, conforme se apurar em liquidação. 6. É fora de dúvida, assim, que, desde a sentença até o acórdão recorrido, o que se fez foi afirmar a nulidade de turnos ininterruptos de revezamento estabelecidas em acordo coletivo de trabalho. Não se tratou de exame de inadimplemento de cláusula, mas de anulação da negociação coletiva por suposta prevalência do legislado sobre o acordado. Ocorre que há previsão expressa na Constituição sobre a possibilidade de disposição, por convenção ou acordo coletivo, de questões relacionadas à jornada de trabalho (CRFB, art. 7º, XIV). Por sinal, em relação especificamente à negociação coletiva sobre turnos ininterruptos de revezamento, o voto do Ministro Relator Gilmar Mendes no ARE 1.121.633, registrou o seguinte: Assim, ainda que de forma não exaustiva, entendo que a jurisprudência do próprio TST e do STF considera possível dispor, em acordo ou convenção coletiva, ainda que de forma contrária a lei sobre aspectos relacionados a: (i) remuneração (redutibilidade de salários, prêmios, gratificações, adicionais, férias) e (ii) jornada (compensações de jornadas de trabalho, turnos ininterruptos de revezamento, horas in itinere e jornadas superiores ao limite de 10 horas diárias, excepcionalmente nos padrões de escala doze por trinta e seis ou semana espanhola). (Grifos acrescentados) (Grifos acrescentados) 7. Assim sendo, a questão controvertida examinada pelo Assim sendo, a questão controvertida examinada pelo acórdão recorrido não é distinta daquela examinada pelo Supremo Tribunal Federal no regime da repercussão geral (Tema 1.046/STF). (...) (grifos nossos) Nesse cenário, em razão da constatação da prestação de horas extras pela Corte de origem para além da 8ª diária, restam devidas como extras as horas prestadas além do módulo mensal instituído pelos instrumentos normativos, no tocante aos períodos em que há instrumento normativo aplicável às partes juntados aos autos. Neste sentido, cito os seguintes julgados: "AGRAVO. RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.467/2017. TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. NORMA COLETIVA EM QUE PREVISTA JORNADA DE OITO HORAS DIÁRIAS. PRESTAÇÃO DE HORAS EXTRAS HABITUAIS. VALIDADE. TEMA 1046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. MATÉRIA JULGADA. ARE 1.121.633. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA. 1. Mediante decisão monocrática, o recurso de revista interposto pelo Reclamante não foi conhecido quanto ao tema "horas extras". 2. Na hipótese, o Tribunal Regional entendeu que "as negociações coletivas, ao tempo em que estabeleceram a adoção de jornadas em turnos ininterruptos de revezamento de 8 horas, atribuiu aos trabalhadores vantagens outras, como citado acima, não se verificando, destarte, a extrapolação dos limites da razoabilidade" . Consignou, ainda que "o fato de o reclamante prestar horas extras excedentes dos limites de oito horas diárias e quarenta e quatro semanais não autoriza a declaração de nulidade da cláusula" destacando que "caberia, eventualmente, apenas o pagamento, como labor extraordinário, das horas que excederem a jornada convencionada, salientando-se, conforme bem observado pelo juízo a quo, que não houve a formulação de pedido nesse sentido na inicial" . 3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada em 02/06/2022, apreciou o Tema 1.046 do ementário de repercussão geral e deu provimento ao recurso extraordinário (ARE 1.121.633) para fixar a seguinte tese: " São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis ". Portanto, segundo o entendimento consagrado pelo STF, as cláusulas dos acordos e convenções coletivas de trabalho, nas quais previsto o afastamento ou limitação de direitos, devem ser integralmente cumpridas e respeitadas, salvo quando, segundo a teoria da adequação setorial negociada, afrontem direitos gravados com a nota da indisponibilidade absoluta. Embora não tenha definido o STF, no enunciado da Tese 1046, quais seriam os direitos absolutamente indisponíveis, é fato que eventuais restrições legais ao exercício da autonomia da vontade, no plano das relações privadas, encontram substrato no interesse público de proteção do núcleo essencial da dignidade humana (CF, art. 1º, III), de que são exemplos a vinculação empregatícia formal (CTPS), a inscrição junto à Previdência Social, o pagamento de salário mínimo, a proteção à maternidade, o respeito às normas de proteção à saúde e segurança do trabalho, entre outras disposições minimamente essenciais. Nesse exato sentido, a Lei 13.467/2017 definiu, com clareza, conferindo a necessária segurança jurídica a esses negócios coletivos, quais seriam os direitos transacionáveis (art. 611-A da CLT) e quais estariam blindados ao procedimento negocial coletivo (art. 611-B da CLT). Ao editar a Tese 1.046, a Suprema Corte examinou recurso extraordinário interposto em instante anterior ao advento da nova legislação, fixando, objetivamente, o veto à transação de " direitos absolutamente indisponíveis ", entre os quais não se inserem, obviamente, direitos de índole essencialmente patrimonial, inclusive suscetíveis de submissão ao procedimento arbitral (Lei 9.307/96), como na hipótese, em que se questiona a jornada para os turnos ininterruptos de revezamento. 4. É certo que esta Corte Superior sedimentou o entendimento de que a prestação habitual de horas extras além do módulo semanal estabelecido na norma coletiva evidenciava que a própria Reclamada descumpria o disposto no instrumento coletivo, razão pela qual o caso dos autos não guardaria relação com o Tema 1.046 do ementário de Repercussão Geral do STF - validade de acordo ou convenção coletiva de trabalho que disponha sobre a limitação ou redução de direitos trabalhistas. Ocorre que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual realizada de 5.4.2024 a 12.4.2024, no julgamento do RE 1.476.596/MG, decidiu, por unanimidade, que a prestação habitual de horas extras não é suficiente para afastar a aplicação do instrumento coletivo, tampouco configura descumprimento da norma coletiva. 5. A instituição do regime de turno ininterrupto de revezamento com jornada diária de 08 horas, quando previsto em norma coletiva, é plenamente válida e deve ser respeitada, sob pena de maltrato ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, impondo-se o reconhecimento da validade da cláusula coletiva, por não se tratar de matéria albergada pela vedação imposta na tese firmada pela Suprema Corte. Dessa forma, a decisão do Tribunal Regional está em consonância com a da tese de repercussão geral firmada pelo STF no julgamento do ARE 1.121.633 (Tema 1046 do Ementário de Repercussão Geral do STF). Nesse contexto, não afastados os fundamentos da decisão agravada, nenhum reparo enseja a decisão. Agravo não provido" (Ag-RR-1397-72.2016.5.05.0195, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 09/04/2025). "I - AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 - PROVIMENTO. HORAS EXTRAS. TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. NORMA COLETIVA. HORAS EXTRAS HABITUAIS. DESCUMPRIMENTO DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Afasta-se o óbice do art. 896, §7º, da CLT, indicado na decisão monocrática, e remete-se o agravo de instrumento para análise do Colegiado. Agravo conhecido e provido. II - AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. HORAS EXTRAS. TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. NORMA COLETIVA. HORAS EXTRAS HABITUAIS. DESCUMPRIMENTO DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Vislumbrada potencial violação do art. 7º, XXVI, da Constituição Federal, processa-se o recurso de revista, quanto ao tema. Agravo de instrumento conhecido e provido. IV - RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. HORAS EXTRAS. TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. NORMA COLETIVA. HORAS EXTRAS HABITUAIS. DESCUMPRIMENTO DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1.121.633-GO, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.046) fixou a seguinte tese: "São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis" (DJe de 28.4.2023) . 2. Na hipótese, as premissas fixadas no acórdão regional revelam a existência de norma coletiva que fixou jornada de 12 horas, em escala de 4x4, caracterizando o sistema de turnos ininterruptos de revezamento. 3. Por não se tratar de direito indisponível, prevalece a autonomia da vontade coletiva, nos termos do art. 7º, XXVI, da CF, conforme decidido pelo STF. 4. Para além, o fundamento autônomo relativo ao descumprimento do pactuado pela prestação habitual de trabalho em sobrejornada não invalida a norma. Assim, devida a condenação ao pagamento como extraordinárias apenas das horas que ultrapassarem o avençado. Nesse sentido, recente julgado do Tribunal Pleno da Suprema Corte (RE 1476596, Relator Ministro: Luís Roberto Barroso, DJe 17-04-2024). Recurso de revista conhecido e provido" (RR-301-12.2015.5.09.0594, 5ª Turma, Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 23/08/2024). "RECURSO DE REVISTA. TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO. ELASTECIMENTO. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. LABOR HABITUAL EM SOBREJORNADA. VALIDADE DA NORMA COLETIVA. TEMA 1.046. 1. Discute-se a validade e aplicabilidade de norma coletiva que prevê jornada de oito horas em turnos ininterruptos quando constatada a prestação de horas extras habituais. 2. Não há dúvida quanto à possibilidade de que, por meio de norma coletiva, possa se majorar para oito horas a jornada em turnos ininterruptos de revezamento (art. 7º, XIV, da Constituição Federal – parte final e Súmula nº 423 do TST). 3. No mesmo sentido, a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 1046 da Repercussão Geral apregoa que "são constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis". 4. De outro lado, a jurisprudência deste Tribunal Superior do Trabalho firmou-se no sentido de que o labor extraordinário habitual consubstanciaria descumprimento da negociação coletiva e consequente ineficácia do pactuado. 5. Não obstante, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.476.596 – MG, encaminhado ao Supremo Tribunal Federal como representativo da controvérsia (CPC/2015, art. 1.036, § 1º), o Plenário, por unanimidade, entendeu que a prática habitual de horas extras não consubstancia distinção relevante à incidência do Tema 1046 e, portanto, não invalida ou torna inaplicável a negociação coletiva que autoriza o trabalho em turnos de revezamento com jornada de oito horas. 6. Nesse contexto, é preciso superar a jurisprudência até então prevalecente e, alinhando-se ao decidido pelo Supremo Tribunal Federal, reconhecer que a consequência da extrapolação habitual da jornada fixada por norma coletiva é o pagamento de tais horas como extras e não a desconsideração da jornada negociada coletivamente. Recurso de revista não conhecido" (RR-20153-96.2018.5.04.0451, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 10/05/2024). "I) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA – RITO SUMARÍSSSIMO – VALIDADE DAS NORMAS COLETIVAS QUE ELASTECEM A JORNADA EM TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO – TEMA 1.046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF – POSSÍVEL VIOLAÇÃO DO ART. 7º, XXVI, DA CF – PROVIMENTO. Diante da possível violação do art. 7º, XXVI, da CF, à luz do precedente vinculante do STF fixado no ARE 1121633 (Tema 1046 da Tabela de Repercussão Geral), dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista.Agravo de instrumento provido.II) RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA – RITO SUMARÍSSIMO – NORMAS COLETIVAS QUE ESLASTECEM A JORNADA EM TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO – VALIDADE DA NORMA COLETIVA – TEMA 1.046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF – TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA – VIOLAÇÃO DO ART. 7º, XXVI, DA CF – PROVIMENTO.1. O STF, ao deslindar o Tema 1.046 de sua tabela de repercussão geral, fixou a seguinte tese, de caráter vinculante: "São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis". Nesse sentido, consagrou a tese da prevalência do negociado sobre o legislado e da flexibilização das normas legais trabalhistas. 2. Ademais, ao não exigir a especificação das vantagens compensatórias e adjetivar de ''absolutamente'' indisponíveis os direitos infensos à negociação coletiva, também sacramentou a teoria do conglobamento e a ampla autonomia negocial coletiva, sob tutela sindical, na esfera laboral, uma vez que, se os incisos VI, XIII e XIV do art. 7º da CF admitem a redução de salário e jornada mediante negociação coletiva, que são as duas matérias básicas do contrato de trabalho, todos os demais direitos que tenham a mesma natureza salarial ou temporal são passíveis de flexibilização.3. Na esteira da Carta Magna, a reforma trabalhista de 2017 (Lei 13.467) veio a parametrizar a negociação coletiva, elencando quais os direitos que seriam (CLT, art. 611-A) ou não (CLT, art. 611-B) negociáveis coletivamente.4. No caso dos autos, o objeto das cláusulas das normas coletivas refere-se ao elastecimento da jornada de trabalho no turno ininterrupto de revezamento, o que atende aos parâmetros do precedente vinculante do STF, além dos constitucionais e legais suprarreferidos, pois se está legitimamente flexibilizando norma legal atinente a jornada de trabalho.5. Registre-se que o entendimento vinculante da Suprema Corte não excepcionou a aplicação da norma coletiva na hipótese de extrapolação habitual da jornada acordada, de modo que tal circunstância, por si só, não resultaria na invalidação ou na não aplicação do instrumento negociado. 6. Veja-se que o inciso XIV do art. 7º da CF é claro ao dispor sobre a possibilidade do elastecimento da jornada mediante norma coletiva ("jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva"), sem a proibição quanto à prestação de horas extras habituais em tais casos. 7. Nesses termos, reconhecida a transcendência política da causa, por contrariedade ao entendimento vinculante do STF no Tema 1.046 de Repercussão Geral, e a violação do art. 7º, XXVI, da CF, impõe-se o provimento do recurso de revista para, reformando o acórdão regional, reconhecer a validade das cláusulas concernentes ao elastecimento da jornada em turnos ininterruptos de revezamento, excluindo da condenação o pagamento de horas extras acima da 6ª diária e 36ª semanal, decorrentes da referida invalidação, bem como os reflexos e consectários legais daí decorrentes. Recurso de revista provido" (RR-0000353-51.2021.5.05.0192, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 19/04/2024). "AGRAVO DO RECLAMANTE TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. JORNADA DE 8 HORAS DIÁRIAS. AUTORIZAÇÃO EM NORMA COLETIVA. PRESTAÇÃO DE HORAS EXTRAORDINÁRIAS. TEMA 1046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NÃO PROVIMENTO. Cinge-se a controvérsia em saber se a norma coletiva que autoriza o trabalho em turnos ininterruptos de revezamento em jornadas superiores a 8 horas diárias deve ser considerada válida, à luz da decisão proferida no julgamento do Tema 1046 da Tabela de Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal. Decerto que, no tocante à amplitude das negociações coletivas de trabalho, esta Justiça Especializada, em respeito ao artigo 7.º, XXVI, da Constituição Federal, tem o dever constitucional de incentivar e garantir o cumprimento das decisões tomadas a partir da autocomposição coletiva, desde que formalizadas nos limites constitucionais. A negociação coletiva consiste em valioso instrumento democrático inserido em nosso ordenamento jurídico, por meio do qual os atores sociais são autorizados a regulamentar as relações de trabalho, atendendo às particularidades e especificidades de cada caso. Desse modo, as normas autônomas oriundas de negociação coletiva devem prevalecer, em princípio, sobre o padrão heterônomo justrabalhista, já que a transação realizada em autocomposição privada é resultado de uma ampla discussão havida em um ambiente paritário, com presunção de comutatividade. Esse, inclusive, foi o entendimento firmado pelo excelso Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo 1.121.633, em regime de repercussão geral (Tema 1046). Importa mencionar que o artigo 7º, XIV, da Constituição Federal traz expressa previsão acerca da possibilidade de negociação coletiva tendente a alterar a jornada de trabalho realizada em turnos ininterruptos de revezamento, devendo assim ser considerado como válido o acordo coletivo de trabalho, fruto da autonomia entre as partes. Também cabe observar que não se desconhece o entendimento desta colenda Corte Superior consagrado na Súmula nº 423, segundo a qual "Estabelecida jornada superior a seis horas e limitada a oito horas por meio de regular negociação coletiva, os empregados submetidos a turnos ininterruptos de revezamento não tem direito ao pagamento da 7ª e 8ª horas como extras". O posicionamento cristalizado no referido verbete jurisprudencial, entretanto, não pode ser utilizado como fundamento para invalidar a escala de 6x4 em regime de turno ininterrupto, a meu juízo, ainda que verificado o labor extraordinário habitual. Isso porque, examinando os precedentes que lhe deram origem, verifica-se que a discussão referia-se à possibilidade de a jornada de trabalho em turno ininterrupto de revezamento ser ampliada para oito horas, via negociação coletiva, hipótese em que a sétima e a oitava horas não poderiam ser remuneradas como extraordinárias. Não se estabeleceu, portanto, o limite máximo que a jornada de trabalho em regime de turno ininterrupto de revezamento poderia atingir. Com isso, não vislumbro no precedente citado nem no referido verbete que a prestação de horas extraordinárias habituais além da oitava, levaria a invalidade total do regime e o pagamento das horas trabalhadas além da 6ª diária. No caso, foi estabelecida, por norma coletiva, a escala de 6 dias de trabalho por 4 dias de folga, com jornada em 4 dias das 6h às 14h30 e em 2 dias das 23h00 às 06h00 . A escala, apesar da habitualidade da jornada extraordinária, proporciona um regime com evidentes benefícios aos empregados. A possibilidade de o trabalhador usufruir 4 dias seguidos de descanso é inegavelmente positiva, mas está diretamente ligada ao regime de escala negociado. Nesse contexto, não seria adequado declarar a invalidade do regime e a posterior condenação a partir da 6ª hora com manutenção das folgas amplamente diferenciadas. Portanto, na presente hipótese, tem-se que o egrégio Colegiado Regional, ao concluir como indevido ao reclamante o pagamento das horas extras trabalhadas além da sexta diária, em vista das disposições contidas nas normas coletivas, decidiu em consonância com o entendimento constante na tese vinculante firmada no julgamento do Tema 1046. Agravo a que se nega provimento" (Ag-AIRR-1000150-72.2019.5.02.0080, 8ª Turma, Relator Desembargador Convocado Carlos Eduardo Gomes Pugliesi, DEJT 13/05/2024). "I - AGRAVO TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. 8 HORAS DIÁRIAS. AUTORIZAÇÃO EM NORMA COLETIVA. PRESTAÇÃO HABITUAL DE HORAS EXTRAORDINÁRIAS. REDUÇÃO DO INTERVALO INTRAJORNADA. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. VALIDADE. TEMA 1046. PROVIMENTO. Constatado equívoco no exame do agravo de instrumento, o provimento do agravo para melhor exame do apelo é medida que se impõe. Agravo de instrumento a que se dá provimento. II - AGRAVO DE INSTRUMENTO TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. 8 HORAS DIÁRIAS. AUTORIZAÇÃO EM NORMA COLETIVA. PRESTAÇÃO HABITUAL DE HORAS EXTRAORDINÁRIAS. REDUÇÃO DO INTERVALO INTRAJORNADA. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. VALIDADE. TEMA 1046. PROVIMENTO. Ante possível contrariedade à tese vinculante firmada pelo STF no julgamento do Tema 1046, o provimento do agravo de instrumento para melhor exame do recurso de revista é medida que se impõe. Agravo de instrumento a que se dá provimento. III - RECURSO DE REVISTA TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. 8 HORAS DIÁRIAS. AUTORIZAÇÃO EM NORMA COLETIVA. PRESTAÇÃO HABITUAL DE HORAS EXTRAORDINÁRIAS. REDUÇÃO DO INTERVALO INTRAJORNADA. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. VALIDADE. TEMA 1046. PROVIMENTO. O egrégio Tribunal Regional, com fundamento nas Súmulas nºs 423 e 437, negou provimento ao recurso ordinário da reclamada para manter a condenação ao pagamento de horas extraordinárias excedentes à sexta diária e de 1h diária, a título de intervalo intrajornada, considerando inválida cláusula coletiva que previu o elastecimento da jornada em turno ininterrupto de revezamento bem como a redução do intervalo intrajornada. Decerto que, no tocante à amplitude das negociações coletivas de trabalho, esta Justiça Especializada, em respeito ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, tem o dever constitucional de incentivar e garantir o cumprimento das decisões tomadas a partir da autocomposição coletiva, desde que formalizadas nos limites constitucionais. A negociação coletiva consiste em valioso instrumento democrático inserido em nosso ordenamento jurídico, por meio do qual os atores sociais são autorizados a regulamentar as relações de trabalho, atendendo às particularidades e especificidades de cada caso. Em razão de reconhecer a relevância da negociação coletiva, a OIT, no artigo 4º da Convenção nº 98, promulgada por meio do Decreto n° 33.296/1953, estabeleceu a necessidade de serem tomadas medidas apropriadas para fomentá-la, incentivando a sua utilização para regular os termos e as condições de emprego. De igual modo, a Convenção nº 154 da OIT, promulgada pelo Decreto nº 1.256/1994, versa sobre o incentivo à negociação coletiva, cujo artigo 2º estabelece que essa tem como finalidade fixar as condições de trabalho e emprego, regular as relações entre empregadores e trabalhadores ou " regular as relações entre os empregadores ou suas organizações e uma ou várias organizações de trabalhadores ou alcançar todos estes objetivos de uma só ve z". Essa regulação, bem como a fixação das condições de emprego, se dá a partir do diálogo entre os entes coletivos, os quais atuam em igualdade de condições e com paridade de armas, legitimando o objeto do ajuste, na medida em que afasta a hipossuficiência ínsita ao trabalhador nos acordos individuais de trabalho. Desse modo, as normas autônomas oriundas de negociação coletiva devem prevalecer, em princípio, sobre o padrão heterônomo justrabalhista, já que a transação realizada em autocomposição privada é resultado de uma ampla discussão havida em um ambiente paritário, com presunção de comutatividade. Esse, inclusive, foi o entendimento firmado pelo excelso Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo 1.121.633, em regime de repercussão geral (Tema 1046). Destaca-se que as matérias discutidas nestes autos (Jornada em Turnos Ininterruptos de Revezamento e intervalo intrajornada) não podem ser entendidas como absolutamente indisponíveis. Logo, podem ser objeto de negociação coletiva nos ditames do Tema 1046. Importante realçar que as decisões proferidas pelo excelso Supremo Tribunal Federal em regime de repercussão geral, por força de sua natureza vinculante, mostram-se de observância obrigatória por parte dos demais órgãos do Poder Judiciário, que devem proceder à estrita aplicação de suas teses nos casos submetidos à sua apreciação, até mesmo para a preservação do princípio da segurança jurídica. No que diz respeito ao intervalo intrajornada , cabe observar que não se desconhece o entendimento desta colenda Corte Superior consagrado no item II da Súmula nº 437, segundo o qual " É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva ." Referido verbete sumular, todavia, possui natureza meramente persuasiva e, por essa razão, destinam-se " a influir na convicção do julgador, convidando-o ou induzindo-o a perfilhar o entendimento assentado, seja pelo fato de aí se conter o extrato do entendimento prevalecente, seja pela virtual inutilidade de resistência, já que o Tribunal ad quem tenderá, naturalmente, a prestigiar sua própria súmula, no contraste com recurso ou decisão em que se adote tese diversa " (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência jurisprudencial e súmula vinculante. 2ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 375). Cumpre destacar, nesse viés, que os paradigmas jurisprudenciais, como as súmulas e as orientações jurisprudenciais, por se revestirem de caráter persuasivo, não podem se sobrepor aos precedentes vinculantes provenientes do excelso Supremo Tribunal Federal, revelando-se imperiosa a revisão, por parte desse colendo Tribunal Superior, do entendimento preconizado na supracitada Súmula, à luz da tese fixada no Tema 1046. Com relação ao turno ininterrupto de revezamento , a Súmula nº 423, consigna que " Estabelecida jornada superior a seis horas e limitada a oito horas por meio de regular negociação coletiva, os empregados submetidos a turnos ininterruptos de revezamento não tem direito ao pagamento da 7ª e 8ª horas como extras ". O posicionamento cristalizado no referido verbete jurisprudencial, entretanto, não se aplica ao presente feito, a meu juízo. Isso porque, examinando os precedentes que lhe deram origem, verifica-se que a discussão referia-se à possibilidade de a jornada de trabalho em turno ininterrupto de revezamento ser ampliada para oito horas, via negociação coletiva, hipótese em que a sétima e a oitava horas não poderiam ser remuneradas como extraordinárias. Não se estabeleceu, portanto, os limites que a jornada de trabalho em regime de turno ininterrupto de revezamento poderia atingir, ou seja, não foi reconhecida a impossibilidade de norma coletiva prever jornada superior a oito horas. Desse modo, uma vez que nos precedentes que deram origem à súmula as discussões não se identificam com a questão ora em exame, a meu juízo, esse verbete jurisprudencial não pode ser invocado como fundamento para declarar a invalidade da norma. Na presente hipótese , considerando que o egrégio Colegiado Regional, ao determinar o pagamento de horas extraordinárias excedentes à sexta diária e de 1h integral por intervalo intrajornada concedido parcialmente, deixando de aplicar as disposições previstas nas normas coletivas pactuadas durante a vigência do contrato do reclamante, contrariou a tese vinculante firmada no julgamento do Tema 1046. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-Ag-AIRR-11175-61.2015.5.15.0021, 8ª Turma, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 06/05/2024). "RECURSO DE REVISTA - REGÊNCIA PELA LEI Nº 13.467/2017 - JORNADA DE TRABALHO. TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO. FIXAÇÃO DE 8 HORAS DIÁRIAS. MEDIANTE NEGOCIAÇÃO COLETIVA. PRESTAÇÃO HABITUAL DE HORAS EXTRAS. VALIDADE DA NEGOCIAÇÃO. ACÓRDÃO REGIONAL EM CONTRARIEDADE À JURISPRUDÊNCIA ITERATIVA E NOTÓRIA DO STF. TEMA 1046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Ao julgar o Recurso Extraordinário com Agravo 1.121.633, em regime de repercussão geral (Tema 1.046), o Supremo Tribunal Federal fixou a seguinte tese jurídica: "São constitucionais os acordos e as convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuem limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis ". O inciso XXVI do art. 7º da Constituição reconhece as convenções e os acordos coletivos de trabalho. As convenções coletivas são os pactos firmados entre dois ou mais sindicatos - estando de um lado o sindicato patronal e do outro o sindicato profissional (dos trabalhadores) - a respeito de condições de trabalho para a categoria (art. 611 da CLT). Os acordos coletivos são os pactos celebrados entre uma ou mais de uma empresa e o sindicato da categoria profissional a respeito de condições de trabalho (§ 1º do art. 611 da CLT). Assim, as convenções e os acordos coletivos são fontes do Direito do Trabalho, pois neles são estipulados direitos e obrigações para as partes convenentes, complementando as normas legais e contratuais de trabalho. No presente caso , discute-se a descaracterização da norma coletiva, em que se fixou turno ininterrupto de revezamento de 8 horas de duração, nos casos de realização de horas extras habituais. A norma coletiva majorou a duração dos turnos ininterruptos de revezamento, de seis para oito horas, e não proibiu a prestação de trabalho em sobrejornada. Dessa forma, havendo previsão normativa de regime especial de horário, deve ser aplicado entendimento do precedente vinculante do STF (Tema 1046), ainda que seja comum a realização de labor extraordinário. O direito material pretendido pela parte reclamante não está albergado no rol de direitos indisponíveis do trabalhador, e, portanto, não tem viés constitucional direto, razão pela qual o seu alcance é passível de flexibilização via ajuste coletivo. Julgado desta Oitava Turma. Desse modo, deve prevalecer a cláusula coletiva negociada. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-551-67.2019.5.08.0130, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 29/04/2024). Desse modo, o entendimento da Corte Regional, no sentido de não reconhecer a aplicação das normas coletivas em razão de horas extras habituais, mostra-se dissonante da tese de repercussão geral firmada pelo STF no julgamento do ARE 1.121.63 (Tema 1046 do Ementário de Repercussão Geral do STF). Diante do exposto, demonstrada a violação do artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, resta caracterizada a transcendência política do debate proposto, o que viabiliza o conhecimento do recurso de revista. Assim, CONHEÇO do recurso de revista por violação do artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, e, no mérito, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO para, reconhecida a validade das normas coletivas juntadas aos autos e aplicáveis às partes em que estabelecido o regime de 12x36, em observância à tese de repercussão geral firmada pelo STF no julgamento do ARE 1.121.633 (Tema 1046 do Ementário de Repercussão Geral do STF), determinar que na apuração de eventuais horas extras devidas ao Reclamante, no período de vigência dos referidos instrumentos, seja considerada extraordinária a jornada que exceder ao módulo diário e semanal negociado. Em caso de eventuais períodos não acobertados por normas coletivas, a apuração de horas extras deverá observar os limites previstos no art. 7º, XIV, da CF, conforme se apurar em liquidação de sentença. V - CONCLUSÃO Ante o exposto, com fundamento no artigo 932 do CPC: I – NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento do Reclamante; II – DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento da Reclamada para prosseguir no exame do recurso de revista; e III - CONHEÇO do recurso de revista, por violação do artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, e, no mérito, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO para, reconhecida a validade das normas coletivas juntadas aos autos e aplicáveis às partes em que estabelecido o regime de 12x36, em observância à tese de repercussão geral firmada pelo STF no julgamento do ARE 1.121.633 (Tema 1046 do Ementário de Repercussão Geral do STF), determinar que na apuração de eventuais horas extras devidas ao Reclamante, no período de vigência dos referidos instrumentos, seja considerada extraordinária a jornada que exceder ao módulo diário e semanal negociado. Em caso de eventuais períodos não acobertados por normas coletivas, a apuração de horas extras deverá observar os limites previstos no art. 7º, XIV, da CF, conforme se apurar em liquidação de sentença.. Custas inalteradas. Publique-se. Brasília, 27 de junho de 2025. DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES Ministro Relator
Intimado(s) / Citado(s)
- IMPACTO SERVICOS DE SEGURANCA LTDA.
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