Processo nº 5646802-13.2024.8.09.0079
ID: 331438624
Tribunal: TJGO
Órgão: Itaberaí - 1ª Vara Cível
Classe: EMBARGOS à EXECUçãO
Nº Processo: 5646802-13.2024.8.09.0079
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JOSE ARNALDO JANSSEN NOGUEIRA
OAB/GO XXXXXX
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Poder Judiciário do Estado de GoiásComarca de Itaberaí1ª Vara Cível Autos 5646802-13.2024.8.09.0079 Polo Ativo Maria Augusta Pitaluga Vieira De Bessa Polo Passivo Banco Do Bra…
Poder Judiciário do Estado de GoiásComarca de Itaberaí1ª Vara Cível Autos 5646802-13.2024.8.09.0079 Polo Ativo Maria Augusta Pitaluga Vieira De Bessa Polo Passivo Banco Do Brasil Sa SENTENÇA(Nos termos dos arts. 136 a 139 do Código de Normas da CGJ-GO, este serve como mandado de citação, intimação, ofício e alvará judicial) Trata-se de EMBARGOS À EXECUÇÃO opostos por MARIA AUGUSTA PITALUGA VIEIRA DE BESSA, em desfavor de BANCO DO BRASIL S.A, partes devidamente qualificadas nos autos.Alega a parte embargante, em sintese, ser produtora rural endividada e ter emitido uma Cédula de Crédito Bancário para custeio de lavoura de milho, tornando-se inadimplente devido à queda abrupta do valor de mercado dos produtos.Informa que o banco embargado ajuizou ação de execução cobrando R$ 608.686,80, valor que contesta por considerar abusivas as práticas do banco em sua planilha de cálculo.Assim, opôs os presentes embargos, requerendo a concessão de assistência judiciária, a aplicação do Decreto-Lei nº 167/67, por se tratar de crédito rural, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, com inversão do ônus da prova, alongamento da dívida rural em razão da frustração da safra e a declaração de nulidade das cláusulas abusivas, especificando a capitalização de juros sem previsão contratual, a cobrança de juros remuneratórios superiores ao limite legal, a cobrança de juros de mora acima do permitido, cobrança indevida de IOF e tarifas, vendas casadas e cobrança indevida de comissão de permanência.Em despacho de evento 4 foi determinada a intimação da parte embargante para comprovar hipossuficiência econômica.Em petição juntada em evento 6, a embargante requereu a juntada de documentos comprobatórios de hipossuficiência financeira e argumentou que sua inadimplência se deve a uma quebra de safra, além de que está respondendo a quatro ações de execução simultaneamente, com vultosas custas processuais.Em despacho de evento 8, foi determinada a intimação da embargante para apresentar certidão atualizada do imóvel denominado “Fazenda França”, matricula nº 18.283, o que foi cumprido em evento 10.Decisão de evento 12 concedeu assistência judiciária parcial à embargante, mediante desconto de 30% do valor das custas.Após o recolhimento da primeira parcela das custas, em decisão de evento 21, os embargos foram recebidos, com atribuição de efeito suspensivo, determinando averbação na matrícula do imóvel.Intimado, o banco embargado apresentou impugnação em evento 26, arguindo, em suma, a impossibilidade de suspensão da execução, a inexistência de hipossuficiência da embargante para a concessão da gratuidade da justiça, a liquidez, certeza e exigibilidade do título executivo, a inaplicabilidade da revisão contratual com base na teoria da imprevisibilidade, a legalidade das taxas de juros praticadas e encargos, e a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.Em réplica (evento 29), a embargante contestou os argumentos do banco, enfatizando a inadequação da via eleita pelo banco, a demonstração do cumprimento dos requisitos para o efeito suspensivo, a inexistência de inovação processual, a inaplicabilidade da teoria da imprevisão, o caráter abusivo das práticas financeiras e a plena aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.Em novo despacho (evento 30), foi determinada a intimação da embargante para comprovar a averbação da decisão de evento 21 na matrícula do imóvel.Em petição de evento 32, a embargante solicitou dilação de prazo para comprovação da averbação da decisão na matrícula do imóvel, juntando recibo de exame de cálculo, o que foi deferido em evento 34.Intimados para especificarem provas, o banco requereu o julgamento antecipado do feito, ao passo que a embargante apresentou justificativas sobre a ausência de averbação e requereu dilação de prazo para comprovar a averbação da suspensão e a produção de prova pericia contábil.Vieram os autos conclusos.É o relatório. Fundamento e DECIDO.De plano, verifico que foi concedido efeito suspensivo aos presentes embargos, condicionado expressamente à averbação da penhora voluntária na matrícula do imóvel oferecido em garantia, a saber, a Fazenda França, matrícula n. 18.283 do CRI de Itaberaí/GO.Todavia, decorridos mais de cinco meses da concessão do efeito suspensivo, a embargante não comprovou a efetiva averbação da constrição judicial, limitando-se a apresentar sucessivas justificativas amparadas em alegados entraves burocráticos e desencontros com o cartório, sem jamais comprovar a efetiva prática do ato exigido.Não bastasse a omissão reiterada, os próprios e-mails apresentados pela embargante no evento 40 evidenciam que o cartório tentou proceder ao registro da penhora, tendo encontrado resistência da própria embargante, que sustentou, de forma equivocada, que não se trataria de averbação de penhora, mas apenas do registro de uma decisão judicial, sob o pretexto de inexistência de termo ou auto formal de penhora.Esse entendimento, todavia, não encontra respaldo legal.Nos termos do art. 919, §1º, do CPC, o efeito suspensivo dos embargos à execução somente pode ser deferido quando, dentre outros requisitos, houver penhora, depósito ou caução suficientes para garantir a execução.Tratando-se de imóvel ofertado em garantia, como na hipótese dos autos, a averbação da constrição na matrícula constitui condição essencial e expressamente fixada pela decisão judicial para a formalização da penhora voluntária, sem a qual não se aperfeiçoa a garantia exigida em lei.A decisão judicial proferida nos autos, regularmente assinada e acompanhada de código de validação eletrônica, foi expedida exatamente para permitir o registro da penhora voluntária junto ao cartório de registro de imóveis, o que, contudo, não foi cumprido.Se, porventura, a embargante nutrisse dúvidas quanto ao alcance ou à forma de cumprimento da ordem judicial, caberia a ela submeter a questão ao juízo para esclarecimentos, e não simplesmente adotar interpretação própria e resistir ao cumprimento da determinação.Sua conduta, ao contrário, evidencia tentativa consciente de esvaziar o comando judicial, violando o dever de boa-fé e lealdade processual, o que inviabiliza a manutenção do efeito suspensivo concedido.Diante do exposto, REJEITO as justificativas apresentadas pela embargante no evento 40, REVOGO o efeito suspensivo anteriormente concedido com fundamento no art. 919, §1º, do CPC.Outrossim, INDEFIRO o pedido de produção de prova pericial contábil formulado pela embargante, com fundamento no artigo 370 do CPC, que confere ao magistrado a faculdade de indeferir as provas que considerar irrelevantes, impertinentes ou protelatórias.A embargante requereu a produção de prova pericial contábil com o objetivo de apurar a existência de encargos abusivos ao contrato celebrado entre as partes.Contudo, é cediço que os encargos abusivos podem ser verificados a partir da análise do próprio instrumento contratual e dos documentos que compõem a evolução do débito. Assim, não vislumbro a necessidade de dilação probatória para tal fim.Dito isso, observo que o processo comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inciso I, do CPC.O feito tramitou de forma regular, com observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, estando as partes devidamente representadas, não se verificando vícios, nulidades ou quaisquer irregularidades aptas a comprometer a validade dos atos processuais.Reconhecida, pois, a higidez do feito, com a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação, passo ao exame das preliminares suscitadas pela parte embargada, antes de ingressar na análise do mérito propriamente dito.Da impugnação à assistência judiciária gratuitaA embargada impugnou a suposta concessão do benefício da gratuidade da justiça à parte embargante, sob o fundamento de inexistência de comprovação de hipossuficiência econômica.Ocorre que, conforme se depreende dos autos, este juízo deferiu o benefício da assistência judiciária gratuita, tão somente para a conceder desconto sobre o valor das custas iniciais, medida adotada exclusivamente para viabilizar o recolhimento e o andamento regular do feito, sem a outorga formal do benefício previsto no art. 98 do CPC.Portanto, AFASTO a impugnação por ausência de objeto.Da impugnação à atribuição de efeito suspensivoA embargada, ainda, insurgiu-se contra a concessão do efeito suspensivo aos presentes embargos, aduzindo a ausência dos pressupostos legais.Todavia, sem razão.O efeito suspensivo foi concedido por decisão fundamentada, à luz da análise inicial dos requisitos previstos no art. 919, §1º, do CPC, especialmente a plausibilidade das alegações e o risco de prejuízo irreparável.Contudo, considerando que a embargante descumpriu a condição imposta, consistente na averbação da penhora na matrícula do imóvel oferecido em garantia, o efeito suspensivo anteriormente concedido restou revogado por este juízo, conforme decisão alhures.Assim, REJEITO a impugnação quanto à atribuição do efeito suspensivo, revogado neste ato.Na ausência de outras preliminares ou prejudiciais de mérito a serem enfrentadas, passo à análise do mérito.Cinge-se a controvérsia em apurar a legalidade da ação de execução proposta pela instituição financeira, fundada em cédula de crédito bancário, firmada para custeio agrícola, e vencida antecipadamente ante o inadimplemento parcial das parcelas pactuadas, e do pedido de revisão contratual, com alegações de abusividade do instrumento contratual, excesso de cobrança decorrente de capitalização de juros, comissão de permanência, venda casada e possibilidade de alongamento da dívida.É incontroverso nos autos a existência da obrigação contratual oriunda da Cédula de Crédito Bancário n. 214.614.171, firmada em 12/02/2023, no valor de R$ 380.969,28, com vencimento em 10/12/2023.Igualmente incontroverso o inadimplemento dos valores pactuados, o que motivou o vencimento antecipado da dívida, nos termos previstos contratualmente.Sobreleva analisar, portanto, os pedidos revisionais.Nesse ponto, destaco que embora a cédula de crédito bancário configure título executivo extrajudicial certo, líquido e exigível, é possível sua revisão em sede embargos à execução, desde que haja a indicação clara e precisa das abusividades constantes no título ou no contrato, como ocorre nos presentes autos.É cediço que a Cédula de Crédito Bancário é regida pela Lei n. 10.931/2004, ao passo que a Cédula de Crédito Rural é regulamentada através do Decreto-Lei n. 167/1967 e Lei n. 9.138/1995.No caso em tela, observo que a dívida é originária de crédito concedido com fundos do próprio banco exequente/embargado, não se enquadrando nas hipóteses previstas no artigo 5º da Lei n. 9.138/1995, haja vista que se trata de Cédula de Crédito Bancário, ou seja, não é uma Cédula de Crédito Rural.Lado outro, no tocante a obrigatoriedade de aplicação da legislação de crédito rural na hipótese dos autos, verifico que o contrato entabulado entre as partes trata-se Cédula de Crédito Bancário firmada com recursos próprios do Banco do Brasil.Sobre essa questão, não é demais frisar que, nos termos do artigo 9º do Decreto-Lei n. 167/1967, a Cédula de Crédito Rural subdivide-se sob as seguintes denominações, quais sejam: Cédula Rural Pignoratícia, Cédula Rural Hipotecária, Cédula Rural Pignoratícia e Hipotecária e Nota de Crédito Rural.Dito isso e considerando que a Cédula de Crédito Bancário, a qual se pretende a aplicação da legislação transcrita em linhas pretéritas, não espelha o modelo especial dos títulos de créditos rurais, entendo ser incabível a incidência do referido Decreto-Lei.Ademais, examinando a referida Cédula, consta expressamente que a legislação aplicável é a Lei n. 10.931/2004 e que o crédito foi concedido com recursos não controlados do Crédito Rural.Outrossim, ainda que eventualmente o crédito concedido pela instituição financeira tenha natureza rural, isto por si só não implica que ao título que o instrumentaliza, no caso, Cédula de Crédito Bancário, tenha que ser aplicada a legislação que trata especificamente do Crédito Rural.Desse modo, é inaplicável no caso concreto dos ditames do Decreto-Lei n. 167/1967, da Lei n. 9.138/1995, bem como o entendimento da Súmula 298 STJ, haja vista a natureza bancária da Cédula de Crédito firmada pela embargante.Em casos semelhante, este tem sido o entendimento jurisprudencial:“EMBARGOS À EXECUÇÃO Cédula de Crédito Bancário Embargantes que pretendem a aplicação de regramento próprio da Cédula de Crédito Rural, nos termos do Decreto-Lei 167/67 Inadmissibilidade Hipótese em que os embargantes contrataram crédito rural formalizado em Cédula de Crédito Bancário Aplicação da Lei 10.931/04 Pretensão de que, após o ajuizamento da execução, incidam apenas encargos legais - Descabimento - Os encargos contratuais incidem até o efetivo pagamento do débito Litigância de má-fé afastada Hipótese em que não se verificou a vontade inequívoca dos embargantes de praticar os atos previstos no art. 80, do CPC Ausência de descumprimento manifesto do postulado da boa-fé objetiva ou do dever de lealdade Oposição de embargos de declaração em face da sentença que não ensejou prejuízo significativo ao andamento do processo, tampouco configurou exercício abusivo do direito RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO” (TJSP, Apelação Cível n. 1008024-48.2019.8.26.0482, 11ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Renato Rangel Desinano, J. 26/07/2021)".Inaplicável, ainda, as disposições do Código de Defesa do Consumidor.O Superior Tribunal de Justiça já consolidou o entendimento,no sentido que, no financiamento de custerio agrícola, a fim de desenvolver sua atividade produtiva, o produtor rural não pode ser considerado destinatário final, razão pela qual, nesses casos, não incide o Código de Defesa do Consumidor.Nesse sentido:“(…) CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. (…) CDC. INAPLICABILIDADE. SÚMULA N. 83/STJ. DECISÃO MANTIDA. (…) 4. Segundo a orientação jurisprudencial do STJ, não incide o CDC, por ausência da figura do consumidor (art. 2º do CDC), nos casos de financiamento bancário ou de aplicação financeira com o propósito de ampliar capital de giro e atividade profissional. (…)” (STJ, AgInt no AREsp n. 555.083/SP, Rel. Ministro ANTÔNIO CARLOS FERREIRA, 4ª Turma, DJe 01/07/2019)".Logo, deixo de aplicar o Código de Defesa do Consumidor e indefiro o pedido de inversão ônus probatório ao caso em comento.No que tange ao direito de alongamento de dívidas oriundas de crédito rural, previsto na Súmula 298 do STJ e invocado pela embargante, é certo que tal prerrogativa não se aplica à Cédula de Crédito Bancário, porquanto este instrumento é regido por legislação específica distinta daquela que regulamenta as cédulas rurais, não estando, portanto, abrangido pelas disposições que autorizam o referido alongamento.Dessa forma, por ser inaplicável à Cédula de Crédito Bancário o regramento previsto no Decreto-Lei n.º 167/1967, inexiste fundamento legal ou contratual que ampare o alongamento da dívida.Outrossim, observo que a embargante sustenta a existência de irregularidades nos cálculos apresentados pelo banco exequente/embargado, alegando a cobrança indevida de capitalização mensal dos juros remuneratórios, bem como de juros de mora durante o período de inadimplência, sob o argumento de que tais encargos não estariam expressamente pactuados no instrumento contratual.Sobre o tema, enuncia a súmula 539, do Superior Tribunal de Justiça, ser "permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/03/2000 (MP nº 1.963-17/2000, reeditada como MP nº 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada”.No cado dos autos, analisando o teor da Cédula de Crédito Bancário n. 214.614.171, verifica-se que consta, de forma clara e específica, cláusula autorizativa da capitalização mensal dos juros remuneratórios (página 4 do contrato - item denominado "enacargos financeiros").No entanto, observo que embora conste o percentual da taxa de juros remuneratórios anual (21,9%), o instrumento contratual não faz nenhuma menção expressa da taxa mensal aplicada.Desta forma, reputo abusiva capitalização mensal dos juros remuneratórios no presente caso.Quanto ao pedido de limitação dos juros remuneratórios à taxa de 12% (doze por cento) ao ano e dos juros moratórios de 1% (um por cento) ano ano, insta destacar que tais previsões encontram respaldo exclusivamente nas hipóteses previstas na legislação específica do crédito rural, notadamente no Decreto-Lei n.º 167/1967, que disciplina as cédulas rurais,o que não é o caso dos autos.Ademais, inexistindo qualquer vedação legal ou contratual quanto à taxa pactuada entre as partes, e ausente demonstração de abusividade concreta, não há fundamento jurídico para impor a limitação pretendida.Em relação a incidência do Imposto Sobre Operações Financeiras – IOF, entendo que esta deve ser mantida, por se tratar de obrigação compulsória prevista em lei, não havendo, neste ponto, abusividade em sua previsão e cobrança.A respeito:“(…) 7. A incidência do Imposto Sobre Operações Financeiras - IOF deve ser mantida, por se tratar de obrigação compulsória prevista em lei, não havendo, neste ponto, abusividade em sua previsão e cobrança. (…)” (TJGO, Apelação Cível n. 0096701-71.2017.8.09.0011, Rel. GERSON SANTANA CINTRA, 3ª Câmara Cível, julgado em 24/07/2019, DJe de 24/07/2019)".Lado outro, verifica-se constar na cláusula ‘’TARIFA DE ESTUDO DE OPERAÇÕES RURAIS’’ a previsão da cobrança de Tarifa de Estudo de Operações, no valor de R$ 1.904,84, correspondendo a 0,5% do montante do crédito concedido ao embargante, razão pela qual, ela deve ser mantida, mormente pelo fato de ter sido previamente pactuada.Acerca do “Seguro Automático Penhor Rural”, a contratação é fato incontroverso.Importante salientar que a contratação do seguro se reverte em benefício direto do contratante com a proteção da cobertura segurada, e indireto com a viabilização de menores taxas contratuais, vantagem típica dos empréstimos concedidos mediante garantia. Assim, se considerados apenas os fatores da contratação expressa e da reversão do benefício em favor da embargante, não haveria que se falar em abusividade na contratação ou venda casada. Ocorre que o produto oferecido em si não é questionável, mas o mesmo não pode se falar da forma a que se apresenta a oferta ao cliente bancário.Denota-se da operação de crédito que houve indicação específica de determinada seguradora, o que aniquila a possibilidade de escolha do cliente quanto à contratação do seguro com a empresa que lhe aprouver. O que se observa, não raras vezes, é a necessária vinculação à seguradora pertencente, inclusive, ao mesmo grupo econômico da instituição financeira, prática esta abusiva e definida como venda casada, a qual deve ser rechaçada pelo judiciário, como decidiu o Superior Tribunal de Justiça em recurso especial repetitivo representativo da controvérsia REsp nº 1.639.320/SP, que firmou aseguinte tese:“Recurso Especial Repetitivo. Tema 972/STJ. Direito Despesa de pré-gravame. Validade nos contratos celebrados bancário. até 25/02 /2011. Seguro de proteção financeira. Venda casada. Restrição à escolha da seguradora. Analogia com o entendimento da súmula 473/STJ. Descaracterização da mora. Não ocorrência. Encargos acessórios. 1. Delimitação da controvérsia: Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo. 2. Teses fixadas para os fins do art. 1.040 do CPC/2015: 2.1 - Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da despesa com o registro do pré-gravame, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula pactuada no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva. 2.2 - Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada. 2.3 - A abusividade de encargos acessórios do contrato não descaracteriza a mora. 3. Caso concreto. 3.1. Aplicação da tese 2.3 ao caso concreto, mantendo-se a procedência da ação de reintegração de posse do bem arrendado. 4. Recurso Especial desprovido.”No caso concreto, ao aderir à proposta de seguro automático de penhor rural, a embargante foi direcionada à Cia. de Seguros Aliança do Brasil.Não ficou demonstrado nos autos a liberdade de escolha de outra seguradora pela embargada, ora contratante.Assim, forçoso concluir que a embargante foi suprimida em seu direito de escolha quanto à seleção da seguradora contratante. Configurada, portanto, a venda casada, nos exatos termos em que decidiu o Superior Tribunal de Justiça em precedente vinculante, em caso semelhante, forçoso reconhecer a abusividade da cobrança do seguro automático de penhor rural e, por conseguinte, reconhecer o excesso de execução no valor de R$ 3.348,95.A cobrança do "Seguro Agrícola", também reputo abusiva, pois não foi comprovada sua contratação, configurando-se ilegalidade.Não há no contrato nenhuma cláusula dispoto exatamente sobre o suposto "seguro agrícola", incluído nos cálculos do saldo devedor.Portanto, indevida a cobrança no valor de R$ 44.370,49.Com relação à comissão de permanência, ela é permitida durante o período de inadimplemento contratual, à taxa média dos juros de mercado, limitada ao percentual fixado no contrato, desde que não cumulada com correção monetária, com juros remuneratórios e moratórios, nem com multa contratual, como se infere das seguintes Súmulas: "Súmula 30 - A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis". "Súmula 294 - Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada a taxa do contrato.""Súmula 296 - Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, a taxa média de mercado estipulado pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.""Súmula 472 - A cobrança de comissão de permanência – cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato – exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual".Assim, a importância cobrada a título de comissão de permanência não poderá ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato, ou seja: a) juros remuneratórios à taxa média de mercado, não podendo ultrapassar o percentual contratado para o período de normalidade da operação; b) juros moratórios até o limite de 12% ao ano; e c) multa contratual limitada a 2% do valor da prestação, nos termos do artigo 52, § 1º, do CDC.In casu, se extrai da cláusula denonimada "inadimplemento" que:"(...) INADIMPLEMENTO - em caso de descumprimento de qualquer obrigação legal ou convencional, ou no caso de vencimento antecipado da operação, a partir do inadimplemento e sobre o valor inadimplido, serão exigidos, nos termos da Resolução 4.882, de 23.12.2020, do Conselho Monetário Nacional:a) Juros remuneratórios contratados para o período de adimplência da operação, previstos neste instrumento de crédito;b) Juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, ou fração, incidentes sobre o valor inadimplido;c) Multa de 2% (dois por cento), calculada e exigida nos pagamentos parciais, sobre os valores amortizados, e na liquidação final, sobre o saldo devedor da dívida".Nesse contexto, tendo em vista a cobrança dos juros remuneratórios durante o período da inadimplência, depreende-se que, malgrado instituída sob a denominação de juros remuneratórios, trata-se de comissão de permanência camuflada, evidenciando a existência deste instituto no contrato em análise. Por vezes, dispondo o contrato sobre a incidência cumulada com juros moratórios de 1% e multa moratória de 2%, a cobrança da comissão de permanência, ainda que perniciosamente denominada de juros remuneratórios pelo inadimplemento, apresenta-se manifestamente abusiva, devendo ser extirpada.Isso porque, não há como cumular juros remuneratórios, já levados em conta no cálculo da parcela, com os juros de mora, multa e, novamente, os juros remuneratórios após a mora.Sobre o tema, inclusive, este é o entendimento do TJGO: "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL C/C DANOS MATERIAIS E MORAIS. CDC. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL NÃO CONSIGNADO. JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS. ADEQUAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO. COBRANÇA DE JUROS REMUNERATÓRIOS NO PERÍODO DE INADIMPLÊNCIA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA CAMUFLADA. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. I - A matéria ora discutida prende-se à revisão de contrato firmado com instituição financeira, cuja aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor faz-se patente. II - Afigura-se viável a limitação dos juros remuneratórios, diante da efetiva demonstração da excessividade do lucro da intermediação financeira ou de ostensivo desequilíbrio contratual, tomando-se como parâmetro a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil à época da celebração do contrato. III - O contrato em questão trata-se de crédito pessoal não consignado, devendo ser adotada a taxa média de mercado praticada nos contratos da mesma espécie. IV - A cobrança da comissão de permanência, ainda que perniciosamente denominada de juros remuneratórios pelo inadimplemento, apresenta-se manifestamente abusiva quando cumulada com outros encargos de mora, devendo incidir somente juros moratórios de 1% ao mês e multa moratória de 2%. (…) (TJ-GO – Apelação Cível (CPC): 5335777.48.2017.8.09.0006, Relator: NORIVAL SANTOMÉ, Data de Julgamento: 30/04/2019, 6ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 30/04/2019)".Desta feita, deverão ser cobrados no caso de inadimplemento somente juros moratórios de 1% ao mês e multa moratória de 2%, afastando-se a cobrança dos juros remuneratórios, já que, como demonstrado, trata-se de verdadeira comissão de permanência camuflada.Por fim, constatada abusividade na capitalização mensal dos juros remuneratórios, a qual incidiu no período de normalidade contratual, verifica-se a descaracterização da mora da parte embargante. Conforme entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça, o reconhecimento de abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora.A mora, no sistema jurídico brasileiro, pressupõe um fato imputável ao devedor. Contudo, se o credor exige valores indevidos ou acima do permitido legalmente, como no caso da capitalização abusiva, a purgação da mora é frustrada, afastando-se a responsabilidade do devedor por tal encargo.Dessa forma, deverá a instituição financeira embargada promover o recálculo do débito, excluindo da cobrança a capitalização mensal de juros, os valores referentes ao seguro automático penhor rural, o seguro agrícola e comissão de permancência (juros remuneratórios) calculados sobre o período de inadimplência, assim como as atualizações incidentes destes quando da confecção do cálculo que instrui a execução em apenso.Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, I do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os embargos à execução para:I) DECLARAR a abusividade da capitalização mensal de juros remuneratórios vinculados ao contrato objeto dos autos, por ausência de menção expressa da taxa mensal aplicada;II) DECLARAR a abusividade dos valores correspondentes ao "seguro automático penhora rural" e "seguro agrícola", por manifesta venda casada e ausência de comprovação de contratação, respectivamente.III) DECLARAR a abusividade da comissão de permanência (juros remuneratórios) incidentes sobre o período de inadimplência, por se tratar de comissão de permanência camuflada e indevidamente cumulada com outros encargos de mora;IV) DECLARAR A DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA da parte embargante, em razão das abusividades reconhecidas nos encargos exigidos no período de normalidade contratual (capitalização mensal de juros remuneratórios).DETERMINAR que a instituição bancária promova o recálculo do débito exequendo, MANTENDO a incidência do Imposto Sobre Operações Financeiras – IOF e da Tarifa de Estudo de Operações Rurais, e EXCLUINDO especificamente:I) capitalização mensal de juros;II) os valores correspondentes ao "seguro automático penhor rural" e "seguro agrícola";III) a comissão de permanência (juros remuneratórios) incidentes sobre o período de inadimplência;IV) as atualizações monetárias, juros e encargos incidentes especificamente sobre os valores acima destacados, quando da elaboração do cálculo que instrui a execução em apenso;Fica mantida a validade das demais cláusulas contratuais e dos encargos regularmente pactuados, prosseguindo-se a execução pelo saldo que remanescer após o recálculo.Em razão da sucumbência recíproca, CONDENO ambas as partes, na proporção de 50% (cinquenta por cento) cada, ao pagamento de custas processuais e honorários sucumbenciais, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil.TRANSLADE-SE cópia desta sentença para o processo principal.Havendo interposição de embargos de declaração, certifique sua tempestividade, intimando-se a parte Recorrida para manifestar em 05 dias, na forma do artigo 1023 do CPC. Ressalto, desde já, que a interposição de recurso protelatório para rediscussão dos termos da sentença ou eventual valor da condenação, implicará na condenação da multa e sanções previstas no CPC.Na hipótese de interposição de Recurso de Apelação, tendo em vista a nova sistemática estabelecida pelo CPC – que extinguiu o juízo de admissibilidade a ser exercido pelo Juízo "a quo" (art. 1.010 do CPC) –, sem nova conclusão, intime-se a parte contrária para que ofereça resposta no prazo de 15 (quinze) dias. Após, remetam-se os autos à Superior Instância para apreciação do recurso interposto.Transitada em julgado, arquivem-se os autos com as baixas e anotações de estilo.Sentença publicada e registrada eletronicamente.Intimem-se. Cumpra-se.Itaberaí, data da assinatura digital. Thaís Lopes Lanza MonteiroJuíza de Direito
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