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Processo nº 1016485-07.2025.8.11.0000

ID: 322946461

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1016485-07.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

ANTONIO VALDECIR CALOTA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ODAIR ANTONIO FRANCISCO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1016485-07.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Cheque, Assistência Judiciária Gratuita, … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1016485-07.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Cheque, Assistência Judiciária Gratuita, Penhora / Depósito/ Avaliação, Efeito Suspensivo / Impugnação / Embargos à Execução] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [ODAIR ANTONIO FRANCISCO - CPF: 503.609.301-15 (ADVOGADO), ANTONIO VALDECIR CALOTA - CPF: 847.516.069-72 (AGRAVANTE), IVAN CARLOS DE OLIVEIRA - CPF: 265.868.191-72 (AGRAVADO), MELIM CONSTRUCOES E INCORPORACOES LTDA - CNPJ: 13.532.079/0001-43 (TERCEIRO INTERESSADO), ANNA CAROLINA VIEIRA DE OLIVEIRA - CPF: 025.353.671-57 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A AGRAVANTE(S): ANTONIO VALDECIR CALOTA AGRAVADO(S): IVAN CARLOS DE OLIVEIRA EMENTA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO POR ALTERAÇÃO SUPERVENIENTE DA SITUAÇÃO ECONÔMICA. PRESUNÇÃO LEGAL DE HIPOSSUFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA EM SENTIDO CONTRÁRIO. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Agravo de Instrumento interposto nos autos de cumprimento de sentença em face da decisão que revogou os benefícios da justiça gratuita anteriormente concedidos ao executado, sob fundamento de modificação da condição financeira em razão da existência de veículos automotores em seu nome e participação societária em empresa. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se estão presentes, no caso concreto, elementos suficientes a justificar a revogação do benefício da justiça gratuita, especialmente diante da titularidade formal de bens móveis (veículos) e participação societária, à luz da presunção legal de hipossuficiência e dos documentos apresentados. III. RAZÕES DE DECIDIR O art. 99, § 3º, do CPC estabelece presunção legal de veracidade quanto à alegação de insuficiência de recursos para fins de gratuidade da justiça, admitindo prova em contrário a ser produzida pela parte adversa ou verificada de ofício pelo juízo. A titularidade formal de veículos automotores em nome do agravante, por si só, não constitui elemento suficiente para afastar a presunção de hipossuficiência, sobretudo quando o conjunto probatório evidencia que tais bens foram financiados para terceiros e que o agravante não aufere benefícios econômicos diretos deles, como demonstrado por comprovantes de transferências bancárias e ausência de utilização dos veículos. A análise da suficiência econômica deve considerar a disponibilidade efetiva de renda e patrimônio, e não apenas a titularidade registral, especialmente quando inexistem indícios robustos de incremento patrimonial ou padrão de vida incompatível com a alegada hipossuficiência. Não tendo o agravado apresentado prova concreta de fruição econômica ou incremento financeiro relevante por parte do agravante, mantém-se a presunção de hipossuficiência, na medida que a existência de bens em nome da parte não afasta, isoladamente, o direito à gratuidade, exigindo cotejo entre renda efetiva, despesas e contexto probatório, sob pena de afronta ao acesso à justiça (art. 5º, LXXIV, CF). IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: A presunção de hipossuficiência decorrente da declaração para fins de gratuidade de justiça só pode ser afastada por prova robusta de suficiência econômica, não bastando a mera titularidade formal de bens. A análise da condição financeira deve privilegiar a efetiva disponibilidade de renda e patrimônio, à luz do princípio do amplo acesso à justiça. A revogação da justiça gratuita exige demonstração inequívoca de alteração superveniente da situação de insuficiência, não configurada no caso concreto. Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, LXXIV; CPC, arts. 98, 99, § 3º, e 1.015, V. Jurisprudência relevante citada: TJMT, 1007450-23.2025.8.11.0000 e 1008770-11.2025.8.11.0000 R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por Antônio Valdecir Calota contra decisão interlocutória proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível de Cuiabá-MT, nos autos de cumprimento de sentença proposto por Ivan Carlos de Oliveira, em que se discutem honorários sucumbenciais arbitrados em 10% do valor atualizado da causa (R$ 140.000,00), com execução no montante de R$ 16.732,67. A decisão recorrida (ID 192290732 PJE 1º Grau), de 07/05/2025, revogou os benefícios da justiça gratuita que haviam sido anteriormente deferidos ao executado, sob os seguintes fundamentos, ora transcritos: Trata-se de cumprimento de sentença requerido por Ivan Carlos de Oliveira em face de Antônio Valdecir Calota. O executado foi condenado ao pagamento de honorários de sucumbência arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa. O exequente requereu o cumprimento de sentença (ID. 176397914). O executado apresentou impugnação ao cumprimento de sentença, requerendo a inexigibilidade dos honorários advocatícios, uma vez que houve a concessão dos benefícios de justiça gratuita em seu favor (ID. 177541228). A parte exequente alega que o executado possui capacidade econômica financeira, haja vista que possui dois veículos considerados de luxo em seu nome, bem como o devedor figura como sócio administrador na empresa Pantanal Representações de Calçados Ltda, inscrita no CNPJ n. 13.540.534/0001-52 (ID. 177631693). Por outro lado, o executado aduz que possui renda de três salários mínimos, bem como que os veículos em seu nome foram adquiridos por meio de financiamento, mas que emprestou “seu nome” para retirar tais veículos aos senhores Paulo Roberto de Oliveira Junior (proprietário do Virtus) e Sr. Thiago Felix de Oliveira (proprietário do Creta) – ID. 177787118. É o relato. Decido. O executado requer a manutenção dos benefícios de Justiça Gratuita, afirmando que os veículos mencionados pela exequente não estão em sua posse, pois foram adquiridos por meio de financiamento para outras duas pessoas (Paulo e Thiago), de modo que mensalmente estas pessoas repassam o valor das parcelas do financiamento a ele, conforme comprovantes de transferências bancárias juntados nos autos. Razão merece o exequente, uma vez que o executado integra o quadro de sócios da empresa Pantanal Representações de Calçados LTDA, bem como possui bens em seu nome, sendo dois veículos automóveis de valores considerados. Nesse viés, os documentos apresentados pelo executado são insuficientes para a demonstração de vulnerabilidade financeira. Além disso, o executado não trouxe aos autos nenhum demonstrativo que comprove a celebração de acordos para o financiamento dos veículos para terceiros. Portanto, verifica-se que houve mudança na situação financeira do executado, motivo pelo qual REVOGO os benefícios de justiça gratuita ao executado Antônio Valdecir Calota. Ante o exposto, intime-se, o executado, através de seu procurador constituído nos autos, para pagar o débito em questão, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido das custas processuais, se houver, consignando que em não ocorrendo o pagamento voluntário no prazo aludido, incidirá multa de 10% (dez por cento) sobre o valor do débito, bem como honorários advocatícios arbitrados no mesmo patamar. Consigne que, transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário ou o cumprimento da obrigação de modo voluntário, inicia-se automaticamente o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, impugnação ao cumprimento de sentença (art. 525, CPC). Não oferecida impugnação no prazo a que alude o caput do art. 525 do NCPC, manifeste-se a parte credora, no prazo de 15 (quinze) dias, quanto ao seu interesse pelo prosseguimento do feito. Às providências. Cumpra-se. Em suas razões recursais (ID. 288394354) a parte Recorrente invoca os seguintes argumentos fático-jurídicos: Necessidade de manutenção da justiça gratuita. Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso para reformar a decisão agravada, restabelecendo os benefícios da justiça gratuita, reconhecendo a inexigibilidade dos honorários sucumbenciais ou, alternativamente, determinando a suspensão da cobrança enquanto perdurar a situação de insuficiência. Recurso do réu tempestivo (Aba Expedientes – Decisão (39960751) – PJE 1º Grau) e preparo dispensado ante a discussão sobre o deferimento da justiça gratuita (ID. 288572886). Intimada a apresentar as contrarrazões, o Recorrido deixou transcorrer o prazo (id. 295089856). Tutela recursal indeferida (ID. 288972354) Não houve manifestação da Procuradoria de Justiça em razão da matéria. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R AGRAVANTE(S): ANTONIO VALDECIR CALOTA AGRAVADO(S): IVAN CARLOS DE OLIVEIRA VOTO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Reitero que se trata de Recurso de Agravo de Instrumento interposto por Antônio Valdecir Calota contra decisão proferida nos autos de cumprimento de sentença, na qual o Juízo da 3ª Vara Cível de Cuiabá-MT revogou os benefícios da justiça gratuita anteriormente concedidos ao executado, sob o argumento de alteração superveniente da situação econômica e insuficiência de prova robusta acerca da manutenção da hipossuficiência. O agravante, em seu recurso, sustenta que permanece em idêntica condição de hipossuficiência desde a concessão do benefício, alegando que sua renda mensal, oriunda de pró-labore, não excede a três salários-mínimos. Aponta que os veículos registrados em seu nome foram financiados para uso de terceiros, cujos pagamentos das parcelas seriam realizados por esses supostos proprietários de fato, circunstância que, segundo alega, estaria corroborada pelos comprovantes de transferência bancária acostados aos autos. O recorrente defende que a ausência de documento formal não tem o condão de afastar a situação fática efetivamente comprovada, de modo que não haveria elementos capazes de infirmar a presunção legal de hipossuficiência, sustentando ainda que não dispõe de outros bens relevantes e que o agravado não teria apresentado prova robusta para justificar a revogação da gratuidade. Pontua, ainda, que a decisão recorrida implica a imediata exigibilidade dos honorários advocatícios sucumbenciais no valor de R$ 16.732,67, o que comprometeria seu sustento, sendo manifesta a possibilidade de dano de difícil ou impossível reparação. Por fim, requer, sucessivamente, a manutenção do benefício da justiça gratuita, o reconhecimento da inexigibilidade dos honorários advocatícios, ou, subsidiariamente, a suspensão da exigibilidade da cobrança pelo prazo legal, enquanto persistir sua condição de insuficiência de recursos. Passo à análise das teses meritórias. Necessidade de manutenção da justiça gratuita. A controvérsia central consiste em definir se estão presentes, no caso concreto, elementos suficientes a justificar a revogação do benefício da justiça gratuita, com fundamento na superação da hipossuficiência do executado, ora agravante, em razão da titularidade dos veículos HYUNDAI/CRETA 20A PRESTI Placa PRN6A42 Ano 2018/2018 Cor PRETA e VW/VIRTUS MF Placa QOO8G26 Ano 2018/2019 Cor BRANCA. De início, impõe-se registrar que, nos termos do art. 99, § 3º, do CPC, presume-se verdadeira a alegação de insuficiência de recursos para a concessão de gratuidade da justiça, podendo essa presunção ser elidida mediante prova em sentido contrário, cuja demonstração incumbe à parte adversa ou ao próprio juízo, de ofício, quando houver elementos nos autos que justifiquem o indeferimento ou a revogação do benefício. No caso em exame, verifica-se que o agravante apresentou declaração de rendimentos e holerites, indicando percepção mensal em valor próximo a três salários-mínimos, oriundos de pró-labore de empresa da qual é sócio-administrador, além de documentação que detalha as despesas da pessoa jurídica e o efetivo valor líquido repassado ao agravante (IDs. 177787120, 177787121, 177787123 e 177787124). Esses elementos, em regra, demonstram a modesta condição financeira do requerente e a ausência de disponibilidade patrimonial relevante. O ponto de inflexão, e que motivou a revogação do benefício na origem, reside no fato de constarem, em nome do agravante, dois veículos considerados de valor, circunstância que, segundo a decisão recorrida, revelaria incremento de capacidade econômica e, consequentemente, afastaria o estado de insuficiência. No entanto, a argumentação central do agravante reside na afirmação de que tais veículos, embora formalmente registrados em seu nome, teriam sido financiados para terceiros, os quais arcam com o pagamento das respectivas parcelas, circunstância esta que buscou comprovar por meio de comprovantes de transferência bancária e recibos. É importante destacar que, do ponto de vista jurídico, a titularidade formal do bem automotor — enquanto não transferida junto ao órgão de trânsito — permanece com o agravante, atraindo a presunção legal de propriedade, conforme entendimento consolidado no âmbito do Código de Trânsito Brasileiro (art. 123, §1º). Contudo, não se pode perder de vista a natureza do instituto da gratuidade da justiça, que tem por escopo a efetividade do acesso jurisdicional, sendo certo que a análise da suficiência econômica deve considerar a real disponibilidade de patrimônio e renda, e não apenas a formalidade registral, quando presentes indícios sérios e idôneos de que não há, na prática, incremento patrimonial capaz de afastar a hipossuficiência. No caso, conquanto ausente instrumento formal de cessão, comodato ou declaração expressa dos supostos proprietários de fato, os documentos colacionados — especialmente as transferências bancárias e os recibos de pagamento das parcelas por terceiros (ID. 177787126, 177787128, 177787133, 177787134, 177787135,177787136, 177789895, 177789896 e 177789898 – PJE 1º Grau) — indicam, ao menos em juízo inicial, a plausibilidade da tese de que o agravante não aufere, de fato, os benefícios decorrentes da titularidade dos veículos. Some-se a isso a ausência de demonstração, por parte do agravado, de elementos concretos que infirmem a narrativa do agravante quanto à efetiva fruição dos bens ou incremento em seu padrão econômico. Não se ignora que a prova cabal da condição de insuficiência muitas vezes se revela de difícil constituição, razão pela qual a interpretação deve privilegiar o princípio do amplo acesso à justiça e a presunção legal estabelecida pelo CPC. A mera existência de patrimônio formal, diante das peculiaridades do caso, não se mostra suficiente, por si só, para afastar a presunção de hipossuficiência, sobretudo diante da documentação apresentada e da inexistência de prova robusta da parte adversa em sentido contrário. No caso, a simples titularidade de veículos registrados em nome do agravante, por si só, não autoriza a presunção absoluta de incremento patrimonial ou de disponibilidade de liquidez suficiente a ensejar a revogação da justiça gratuita. O fato de constar, no registro junto ao órgão de trânsito, a propriedade formal de bens automotores não se confunde, necessariamente, com a fruição econômica efetiva ou com o acréscimo real na capacidade financeira, sobretudo quando os elementos dos autos indicam que tais bens foram financiados para uso de terceiros, e que o agravante não aufere renda ou proveito direto deles, circunstância reforçada pelos comprovantes de pagamento realizados por terceiros. A aferição da capacidade de arcar com custas e honorários deve considerar a efetiva disponibilidade de recursos financeiros, e não apenas a titularidade formal de bens, especialmente quando inexiste demonstração de que tais ativos compõem patrimônio líquido livre e desembaraçado. Em hipóteses como a dos autos, a ausência de utilização econômica do bem pelo agravante, aliada à falta de outros elementos que demonstrem incremento relevante no seu padrão de vida, inviabiliza o afastamento da presunção legal de hipossuficiência, não se prestando a mera titularidade registral como fundamento suficiente para revogação da gratuidade de justiça. Em idêntico sentido, julgado desta Câmara: Ementa: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUSTIÇA GRATUITA. PRESUNÇÃO LEGAL DE HIPOSSUFICIÊNCIA. COMPROVAÇÃO DA IMPOSSIBILIDADE DE ARCAR COM CUSTAS PROCESSUAIS. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de Instrumento interposto por Rosimeire Pereira dos Santos contra decisão da 9ª Vara Cível da Comarca da Capital que indeferiu pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita nos autos da Ação de Reparação por Danos Materiais e Morais. A agravante alega hipossuficiência financeira, comprovada por meio de declaração e documentos, e insurge-se contra o indeferimento baseado na existência de bens móveis e na suposta ausência de comprovação documental. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em definir se, diante da declaração de hipossuficiência e da documentação apresentada, é devida a concessão da justiça gratuita à parte agravante. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A declaração de hipossuficiência firmada por pessoa natural goza de presunção legal de veracidade, nos termos do art. 99, §3º, do CPC, cabendo à parte contrária ou ao juízo produzir prova em sentido contrário. 4. A existência de bens móveis em nome da parte requerente não é, por si só, suficiente para afastar a presunção de hipossuficiência, especialmente quando tais bens não possuem liquidez imediata ou alto valor de mercado, ou ainda se encontram inutilizados. 5. A análise da capacidade financeira da parte requer cotejo entre rendimentos mensais e despesas ordinárias, não se limitando à verificação de patrimônio ou à renda bruta. 6. A documentação acostada aos autos, notadamente os holerites, demonstra incompatibilidade entre a renda mensal da agravante e as custas processuais exigidas, superiores a R$ 16 mil, evidenciando sua impossibilidade de arcar com tais valores sem comprometer o sustento próprio. 7. A negativa da justiça gratuita, nessas condições, afronta o princípio da inafastabilidade da jurisdição. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. A declaração de hipossuficiência firmada por pessoa natural goza de presunção legal de veracidade, sendo admitida prova em contrário. 2. A existência de bens móveis não afasta, por si só, a presunção de hipossuficiência quando não evidenciada sua liquidez ou valor relevante. 3. A análise da capacidade econômica para fins de justiça gratuita exige a ponderação entre rendimentos e despesas ordinárias, não podendo basear-se exclusivamente em patrimônio ou renda bruta. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LXXIV; CPC, arts. 98 e 99, §3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp 257.029/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 05.02.2013, DJe 15.02.2013. (N.U 1007450-23.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/04/2025, Publicado no DJE 24/04/2025) DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. REVOGAÇÃO DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS NOVOS. PRESUNÇÃO RELATIVA DE HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO AFASTADA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Agravo de instrumento interposto contra decisão que revogou a gratuidade de justiça anteriormente concedida nos autos de embargos de terceiro. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se a revogação da justiça gratuita, com base nos mesmos documentos que justificaram sua concessão, é válida diante da ausência de elementos novos que indiquem a inexistência de hipossuficiência econômica. III. RAZÕES DE DECIDIR O agravo de instrumento é cabível contra decisão que revoga gratuidade de justiça, conforme art. 1.015, V, do CPC. A revogação do benefício foi realizada sem qualquer fato novo ou juntada de documentos adicionais, utilizando os mesmos elementos anteriormente analisados para sua concessão, o que viola o princípio da segurança jurídica. A presunção legal de veracidade da declaração de hipossuficiência feita por pessoa natural é relativa e, para fins de revogação do benefício anteriormente concedido, cabe à parte contrária demonstrar, de forma objetiva, a capacidade financeira do beneficiário, o que não ocorreu no caso. A mera existência de patrimônio sem liquidez não afasta, por si só, a hipossuficiência financeira, que deve ser analisada à luz da real capacidade de arcar com os custos do processo sem prejuízo próprio ou da família. A revogação infundada da gratuidade compromete o direito de acesso à justiça e contraria entendimento pacífico da jurisprudência. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: “1. A revogação da gratuidade de justiça somente é válida quando baseada em elementos novos capazes de afastar a presunção de hipossuficiência anteriormente reconhecida. 2. A parte que impugna a concessão da assistência judiciária gratuita tem o ônus de provar a suficiência financeira do beneficiário. 3. A existência de patrimônio, por si só, não afasta a hipossuficiência se não evidenciar disponibilidade imediata de recursos para custear o processo.” (N.U 1008770-11.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/05/2025, Publicado no DJE 30/05/2025) Diante de todo o exposto, entendo que, no caso concreto, não restou demonstrada, de modo inequívoco, a modificação da condição de insuficiência do agravante capaz de legitimar a revogação do benefício da justiça gratuita, razão pela qual a decisão agravada merece reforma, para restabelecer os efeitos da gratuidade, com suspensão da exigibilidade dos honorários advocatícios enquanto persistir a situação de insuficiência econômica, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC. Conclusão. Por essas razões, conheço do recurso de Agravo de Instrumento e DOU-LHE PROVIMENTO para reformar a decisão agravada e restabelecer ao agravante os benefícios da justiça gratuita, com a consequente suspensão da exigibilidade dos honorários advocatícios enquanto perdurar a condição de insuficiência de recursos, nos termos do artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025

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Processo nº 1008770-87.2025.4.01.3600

ID: 337321801

Tribunal: TRF1 Órgão: 8ª Vara Federal Cível da SJMT Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 1008770-87.2025.4.01.3600

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

TULIO PEREIRA DE SOUZA

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

Advogados:

SAULO ROBERTO ROVERI

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL SEÇÃO JUDICIÁRIA DE MATO GROSSO 8ª VARA FEDERAL CÍVEL DA SJMT PROCESSO: 1008770-87.2025.4.01.3600 G7 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: TULIO PEREIR… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL SEÇÃO JUDICIÁRIA DE MATO GROSSO 8ª VARA FEDERAL CÍVEL DA SJMT PROCESSO: 1008770-87.2025.4.01.3600 G7 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: TULIO PEREIRA DE SOUZA IMPETRADO: GERENTE-EXECUTIVO DO INSS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, .COORDENADOR REGIONAL DE PERÍCIA MÉDICA EM BRASÍLIA - DF TERCEIRO INTERESSADO: UNIÃO FEDERAL SENTENÇA 1. RELATÓRIO Trata-se de mandado de segurança impetrado por TULIO PEREIRA DE SOUZA em face de ato praticado pelo GERENTE-EXECUTIVO DO INSS e outros, objetivando, em síntese, a análise e conclusão do requerimento administrativo de Auxílio-Acidente, protocolado sob n. 903004708, em 26/09/2024. O juízo deferiu a liminar. O INSS manifestou interesse em ingressar no feito. A autoridade impetrada prestou as suas informações e comprovou o cumprimento da medida judicial. 2. FUNDAMENTAÇÃO Os fundamentos jurídicos da decisão que deferiu a liminar devem ser ratificados nesta sentença, conforme o teor abaixo: Nos termos do artigo 7º, inciso III, da Lei 12.016, de 2009, para a suspensão initio litis do ato reputado ilegal, faz-se necessária a demonstração da aparência do direito alegado e do risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Verifico a presença dos requisitos necessários à concessão da medida liminar. A Lei nº 9.784, de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, em seu art. 49, fixou o prazo de trinta dias para a Administração decidir os processos administrativos. A Emenda Constitucional nº 45 de 2004 garantiu, como direito fundamental, a razoável duração do processo judicial e administrativo, e dos meios necessários à celeridade de sua tramitação. Nesse sentido, dispõe o inciso LXXVIII do artigo 5º da CF: “todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. A propósito, transcrevo precedentes do TRF/1ª Região: PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA. GERENTE EXECUTIVO DO INSS. REQUERIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO NO ÂMBITO ADMINISTRATIVO. RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. DEMORA NA APRECIAÇÃO. PRAZO SUPERIOR A 3 (TRÊS) MESES. ILEGALIDADE CONFIGURADA. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS. 1. Em sede de mandado de segurança, nos termos do art. 6º, § 3º, da Lei nº 12.016/2009, considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática. 2. Quanto à matéria de legitimidade discutida nos autos, esta Corte Regional tem entendimento de que “na estrutura organizacional da autarquia-previdenciária é o Gerente Executivo do Instituto Nacional do Seguro Social na respectiva localidade onde se deu o ato impugnado, o responsável pelo deferimento ou indeferimento do benefício, e ainda, pela suspensão, bloqueio ou cancelamento do mesmo, sendo, portanto, a parte legítima passiva ad causam.” (AMS 0003401-29.2012.4.01.3813, Relator Desembargador Federal Wilson Alves de Souza, Primeira Turma, e-DJF1 07/08/2019). 3. A demora na resposta por parte da Administração não pode extrapolar limite aceitável, sob pena de ofender o postulado da razoável duração dos processos administrativos e judiciais, garantida constitucionalmente no art. 5º, LXXVIII da Constituição Federal e de contrariar os princípios da eficiência e da razoabilidade, previstos, respectivamente, no artigo 37, caput, da Constituição Federal e no art. 2º, caput, da Lei 9.784/99, aos quais a Administração Pública está jungida. 4. A ausência de justo motivo para o descumprimento de norma procedimental (art. 49 da Lei nº 9.784/99), torna reconhecida a omissão da Administração Pública, que contraria direito líquido e certo do interessado a quem a Constituição Federal assegura a razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII). 5. Consoante entendimento desta Corte Regional “a demora injustificada no trâmite e decisão dos procedimentos administrativos consubstancia lesão a direito subjetivo individual, passível de reparação pelo Poder Judiciário com a determinação de prazo razoável para fazê-lo, à luz do disposto no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Carta Constitucional e na Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999” (TRF1/REO Nº 0003971-33.2016.4.01.3600, Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, Primeira Turma, e-DJF1 29/03/2019). Nesse mesmo sentido: REOMS Nº 0001769-20.2011.4.01.4001, Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, Sexta Turma, e-DJF1 08/05/2020; AC Nº 1002934-98.2018.4.01.3400, Desembargador Federal Carlos Augusto Pires Brandão, Quinta Turma, PJe 24/04/2020. 6. É de 30 (trinta) dias, prorrogável motivadamente por igual período, o prazo de que dispõe a Administração para decidir após o encerramento da instrução de processo administrativo (art. 49 da Lei nº 9.784/99). 7. Nesse mesmo sentido, seguindo orientação na lei de regência, é o que dispõe o art. 691, § 4º, da Instrução Normativa INSS/PRES 77/2015, ao estabelecer que "concluída a instrução do processo administrativo, a Unidade de Atendimento do INSS tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada". 8. Ademais, o artigo 41-A, § 5º, da Lei 8.213/91, disciplina um prazo de 45 dias para o início do pagamento de benefício previdenciário, após a apresentação da documentação necessária à sua concessão, razão pela qual, a míngua de justificativa plausível, deve a Administração garantir o cumprimento da legislação de regência. 9. Na hipótese dos autos, verifica-se que já decorreram mais de 3 (três) meses entre a data do protocolo do recurso administrativo (21/08/2019 - fl. 23) e a data da impetração do presente mandado de segurança (19/12/2019 - fl. 1), e o pedido continuou sem resposta, caracterizando a mora do INSS. 10. A mora da Administração Pública ofende o postulado da razoável duração dos processos administrativos e judiciais garantida constitucionalmente, no art. 5º, LXXVIII da Constituição Federal. 11. No caso, apresentou as informações e não há nos autos notícia relativa a eventual exigência existente no processo, de modo que concluída a fase de instrução, o prazo de lei para a apreciação do requerimento administrativo é de ser observado, sob pena de violação ao princípio da razoável duração do processo. 12. Tendo em vista o caráter alimentar do benefício pleiteado, e, considerando ainda a violação do princípio da razoável duração do processo, é cabível a fixação de prazo pelo Poder Judiciário para a conclusão da análise do processo administrativo da parte impetrante, após a conclusão da instrução. 13. Apelação do INSS e remessa oficial desprovidas. (AC1015476-96.2019.4.01.3600, Relator Desembargador Federal CÉSAR JATAHY, TRF1 - Segunda Turma, data do julgamento: 10/02/2021, grifei) CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. AUXÍLIO-DOENÇA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. DEMORA INJUSTIFICADA DO INSS NA ANÁLISE DO RECURSO. SEGURANÇA CONCEDIDA PARA DETERMINAR A MANIFESTAÇÃO DA AUTARQUIA. 1. A sentença concedeu a segurança, para determinar ao impetrado que se manifeste, em 10 (dez) dias, no processo administrativo protocolado pelo impetrante, no qual se insurge contra o indeferimento de seu benefício de auxílio-doença. 2. Não há justificativa plausível para que a autarquia demore tanto tempo na apreciação de um recurso, mormente quando indefere a concessão de benefício previdenciário, pleiteado pelo segurado, o qual possui caráter alimentar. 3. Remessa oficial a que se nega provimento. (REOMS 0016910-89.2009.4.01.3600, DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 28/01/2014 PAG 387.) O cidadão tem o direito de peticionar aos Poderes Públicos e, quando o faz, a Administração Pública tem o dever de lhe dar uma resposta dentro de um prazo razoável, sob pena de afronta ao princípio da eficiência. Nos termos do art. 48, da Lei n.º 9784/99, que regula todo o processo administrativo no âmbito federal, verbis: “Art. 48. A Administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações, em matéria de sua competência.“ Outrossim, o MPF e a autarquia previdenciária firmaram acordo no bojo do Recurso Extraordinário com Repercussão Geral Reconhecida nº 1.171.152/SC (Tema de Repercussão Geral nº 1.066 do Supremo Tribunal Federal). O referido acordo foi devidamente homologado pelo Supremo Tribunal Federal, ostentando efeito vinculante sobre as ações coletivas já ajuizadas tratando do mesmo objeto pactuado no Recurso Extraordinário Com Repercussão Geral Reconhecida nº 1.171.152/SC, tendo o INSS se comprometido a concluir processos administrativos de reconhecimento inicial de direitos previdenciários e assistenciais, nos prazos máximos abaixo fixados, de acordo com a espécie e o grau de complexidade do benefício: Benefício assistencial à pessoa com deficiência - 90 dias; Benefício assistencial ao idoso - 90 dias; Aposentadorias, salvo por invalidez - 90 dias; Aposentadoria por invalidez comum e acidentária (aposentadoria por incapacidade permanente) - 45 dias; Salário maternidade - 30 dias; Pensão por morte - 60 dias; Auxílio reclusão - 60 dias; Auxílio-doença comum e por acidente do trabalho (auxílio temporário por incapacidade) - 45 dias; Auxílio acidente - 60 dias. O atraso do INSS, devidamente comprovado, implicou mácula aos princípios da razoável duração do processo e da eficiência administrativa, violando direito líquido e certo da parte impetrante, principalmente quando se trata de pedidos de benefícios previdenciários em que a demora injustificada pode atingir a subsistência do cidadão e, consequentemente a sua dignidade como ser humano, impondo-se rigor no respeito aos prazos de resposta pela Administração Pública. Não há como deixar de reconhecer que a mora administrativa obsta o exercício de um direito social. A Administração, ao submeter os segurados a meses de espera para ver a conclusão de seu requerimento de benefício, comete ilegalidade, ainda que a inércia não decorra de voluntária omissão dos agentes públicos ou de problemas estruturais da máquina estatal. Portanto, o direito líquido e certo pretendido pela parte impetrante merece guarida nesta via mandamental, nos termos da fundamentação supramencionada. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, CONCEDO A SEGURANÇA, na forma do art. 487, I, do CPC, e ratifico a liminar que determinou à autoridade impetrada o envio do requerimento protocolado sob n. 903004708 para agendamento da perícia médica. 3.1. sentença sujeita a reexame necessário (artigo 14, § 1º, da Lei nº 12.016/2009); havendo recurso voluntário, intime-se para as contrarrazões e encaminhem-se os autos para a respectiva instância; 3.2. condeno a impetrada ao reembolso das custas judiciais (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/1996; artigo 86, parágrafo único, do CPC). 3.3. sem condenação em honorários advocatícios (artigo 25 da Lei nº 12.016/2009 e Súmulas nº 105 do STJ e nº 512 do STF). 3.4. abra-se vista dos autos ao Ministério Público Federal; 3.5. acolho o ingresso do INSS; 3.6. após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos; 3.7. intimem-se. (assinado digitalmente) DIOGO NEGRISOLI OLIVEIRA Juiz Federal Substituto

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Processo nº 5015497-68.2025.8.13.0223

ID: 337147341

Tribunal: TJMG Órgão: Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Divinópolis Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5015497-68.2025.8.13.0223

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

FUNDACAO GERALDO CORREA

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

LEANDRO CARVALHO SANTOS RIBEIRO

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MANOEL JOSE BRANDAO TEIXEIRA JUNIOR

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Divinópolis / Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Divinópolis Rua Doutor Paulo de Mello Freitas, 100… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Divinópolis / Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Divinópolis Rua Doutor Paulo de Mello Freitas, 100, Fórum Dr. Manoel Castro dos Santos - Liberdade, Liberdade, Divinópolis - MG - CEP: 35502-635 PROCESSO Nº: 5015497-68.2025.8.13.0223 CLASSE: [CÍVEL] PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO: [Repasse de verbas do SUS] AUTOR: FUNDACAO GERALDO CORREA CPF: 20.146.064/0001-02 RÉU: ESTADO DE MINAS GERAIS CPF: 18.715.615/0001-60 e outros DECISÃO Vistos etc., Fundação Geraldo Corrêa, pessoa jurídica qualificada nos autos, ajuizou Ação Cominatória com Obrigação de Fazer, com pedido liminar, contra o Estado de Minas Gerais e o Município de Divinópolis, ambos pessoas jurídicas de direito público interno. Narra que é uma entidade privada sem fins econômicos, de natureza beneficente e assistencial, responsável pela gestão de um complexo hospitalar de referência no Município de Divinópolis/e em toda a macrorregião oeste do Estado de Minas Gerais. Afirma que mais de 80% de sua capacidade de atendimento é direcionada ao Sistema Único de Saúde (SUS), atendendo população superior a 1,2 milhão de habitantes de 54 municípios, o que a qualifica como um agente fundamental para a efetivação do direito à saúde na região. Sustenta possuir Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS) e manter Contrato Administrativo com o Município de Divinópolis, atuando de forma complementar e legalmente respaldada no âmbito do SUS. Argumenta que, em virtude da alta demanda e da limitação de receitas próprias, sua estrutura é majoritariamente dependente de financiamento público, sendo os repasses de recursos, especialmente por meio de contratos SUS e emendas parlamentares, indispensáveis para a manutenção de suas atividades essenciais. Ressalta que a interrupção desses repasses, ou a imposição de barreiras para sua liberação, possui o potencial de causar um impacto irreparável à saúde pública regional, comprometendo a continuidade da assistência. Diz que o cerne da controvérsia reside nas exigências impostas pelo Cadastro Geral de Convenentes – CAGEC, sistema instituído pelo Decreto Estadual nº 44.293/2006 e atualmente disciplinado pelo Decreto Estadual nº 48.745/2023 e pela Resolução Conjunta SEGOV/CGE nº 01/2024. Alega que tal sistema, bem como os procedimentos administrativos correlatos, condicionam a manutenção do cadastro ativo da entidade à apresentação de certidões de regularidade fiscal, especificamente, no seu caso, a certidão de regularidade perante o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. Informa que não consegue obter a referida certidão, pois a mesma se encontra vencida ou irregular, conforme demonstra por meio de imagens do sistema CAGEC que indicam a reprovação de sua solicitação de atualização cadastral. Aduz que a justificativa apresentada pelo sistema seria a de que o documento foi marcado como "Irregular", indicando a existência de um possível débito junto ao órgão emissor. Menciona que a situação fiscal adversa decorre de pendências junto à Caixa Econômica Federal, relativas a contribuições não recolhidas ao FGTS, consubstanciadas na Certidão de Dívida Ativa FGMG 2016 00349. Diz que a validade desses débitos está sendo discutida em ação judicial autônoma (processo nº 1008770-75.2021.4.01.3811), mas que tal controvérsia não é o objeto da presente demanda. Defende a desproporcionalidade e a inconstitucionalidade da exigência da Certidão Negativa de Débitos (CND) como condição para o recebimento de recursos públicos. Requer o benefício da gratuidade da justiça e a concessão de tutela provisória de urgência para determinar que os réus se abstenham de exigir a apresentação de certidões de regularidade fiscal e trabalhista (notadamente o Certificado de Regularidade do FGTS, a Certidão da RFB/PGFN e a ausência de registros no CADIN e CAGEC) como condição para que a autora possa formalizar, aditar ou renovar convênios e receber repasses de verbas públicas destinadas às suas atividades, inclusive as oriundas de emendas parlamentares. Com a inicial viera documentos. Intimada para comprovar a hipossuficiência financeira, a autora comprovou o recolhimento das custas. É o relatório. Anote-se o recolhimento das custas no sistema. O pleito antecipatório deve observar os requisitos legais previstos no artigo 300, do Código de Processo Civil, ou seja, a demonstração dos elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano. No caso em apreço, embora a autora apresente argumentos relevantes acerca da essencialidade dos serviços que presta e do potencial impacto social de uma eventual paralisação de suas atividades, uma análise mais detida dos autos, neste momento processual, não permite vislumbrar, com a segurança necessária, a presença do requisito da probabilidade do direito. O ponto controvertido central da presente demanda reside em saber se a exigência de regularidade fiscal, imposta por atos normativos estaduais como condição para o cadastramento e a celebração de parcerias com o Poder Público, pode ser afastada liminarmente em favor de uma entidade filantrópica prestadora de serviços essenciais de saúde, com base no princípio da supremacia do interesse público e na aplicação analógica do artigo 25, § 3º, da Lei de Responsabilidade Fiscal. O primeiro óbice à concessão da medida pleiteada reside na própria formulação da causa de pedir. A autora, apesar de indicar a existência de uma pendência relativa ao FGTS, consubstanciada na CDA FGMG 2016 00349, e de mencionar a existência de uma ação judicial correlata, abstém-se de detalhar de forma precisa e atualizada a sua situação fiscal. A petição inicial é genérica ao afirmar que "não consegue inserir a certidão de regularidade fiscal, tendo em vista que a mesma se encontra vencida". Não há nos autos elementos que permitam a este juízo compreender a real dimensão da irregularidade, os motivos pelos quais o certificado não pode ser renovado, se há ou não suspensão da exigibilidade do crédito tributário no âmbito do processo que tramita na Justiça Federal, ou mesmo se a autora buscou alternativas administrativas para a regularização do débito, como o parcelamento. A simples juntada de uma captura de tela do sistema CAGEC, que aponta a reprovação do documento por "irregularidade", é insuficiente para demonstrar, de plano, a ilegalidade ou a desproporcionalidade do ato administrativo questionado. A probabilidade do direito, para fins de tutela de urgência, não pode se assentar em alegações vagas sobre a situação fática que deu origem à negativa administrativa. Ademais, e de forma mais contundente, a pretensão autoral esbarra, em uma análise preliminar, na existência de um plexo normativo que expressamente condiciona a transferência de recursos públicos à comprovação de regularidade fiscal e perante o FGTS. O Cadastro Geral de Convenentes – CAGEC, conforme mencionado pela própria requerente, é regido pelo Decreto Estadual nº 48.745, de 29 de dezembro de 2023, e pela Resolução Conjunta SEGOV/CGE nº 01, de 3 de janeiro de 2024. Tais atos normativos, que gozam de presunção de legalidade e legitimidade, estabelecem um conjunto de regras e procedimentos que visam assegurar a idoneidade das entidades que contratam com o Poder Público e a correta aplicação dos recursos públicos. A exigência de regularidade fiscal não é uma mera formalidade, mas um instrumento de controle, governança e responsabilidade na gestão da coisa pública. A principal tese jurídica da autora, centrada na aplicação analógica do artigo 25, § 3º, da Lei Complementar nº 101/2000, não se revela, em sede de cognição sumária, suficiente para afastar a incidência de tais normas. O referido dispositivo legal estabelece uma exceção à aplicação de "sanções de suspensão de transferências voluntárias". A interpretação literal e sistemática do texto parece indicar que sua aplicação se destina a impedir a interrupção abrupta de repasses já pactuados e em curso, em razão de uma irregularidade fiscal superveniente do ente beneficiário, protegendo a continuidade de ações essenciais. A pretensão da autora, contudo, é mais ampla: busca-se um salvo-conduto para "formalizar, aditar ou renovar convênios", ou seja, busca-se a isenção de um requisito de habilitação, prévio à própria formalização do ajuste. A extensão do alcance da norma, por via de analogia, para abranger situações de celebração de novos pactos ou de renovação de instrumentos vencidos, em detrimento de regulamentação administrativa expressa, representa uma medida de grande impacto na ordem administrativa e financeira do Estado, que não se afigura prudente deferir sem o aprofundamento do contraditório e da instrução probatória. A própria legislação de licitações e contratos, citada pela autora (Lei nº 14.133/2021), embora postergue a verificação para a fase de habilitação, não elimina a exigência. Ao contrário, o artigo 68, inciso IV, do referido diploma legal, estabelece como requisito de habilitação fiscal, social e trabalhista "a regularidade relativa à Seguridade Social e ao FGTS, que demonstre cumprimento dos encargos sociais instituídos por lei". Tal previsão legal, ao invés de amparar a tese autoral, reforça a premissa de que a regularidade fiscal, trabalhista e perante a seguridade social é condição fundamental para a contratação com a Administração Pública. E nem deve ser diferente, na medida em que tais direitos trabalhistas e sociais são fundamentais, além do que sabidamente recursos do FGTS não são apenas reservas financeiras dos trabalhadores, o que já seria suficiente para que se exija a regularidade de contribuição, mas são utilizados pela Administração Pública para outras finalidades, tal como financiamento imobilário. Dessa forma, a pretensão liminar da autora implicaria, na prática, em determinar que a Administração Pública ignore deliberadamente seus próprios atos normativos e as leis gerais que regem a matéria, com base em uma interpretação extensiva e analógica de um dispositivo legal cuja aplicação ao caso concreto é, no mínimo, controversa, além de permitir que a autora continue a exercer sua atividade mesmo gerando prejuízo ao seu quadro de funcionários e a toda coletividade. Tal providência violaria a presunção de legitimidade dos atos administrativos e o princípio da legalidade, ao qual a Administração está estritamente vinculada. Por fim, quanto ao requisito risco, é inegável que a ausência de repasses públicos pode gerar graves dificuldades para a manutenção dos serviços prestados pela autora, com potencial prejuízo à saúde da população. Contudo, o perigo de dano, por si só, não é capaz de sustentar a concessão da tutela de urgência quando desacompanhado de uma robusta probabilidade do direito. Ademais, a situação de irregularidade fiscal da autora não parece ser um fato novo ou imprevisível, haja vista a menção a uma dívida ativa constituída em 2016 e a uma ação judicial ajuizada em 2021.Ou seja, aparentemente há mais de uma década a autora não regulariza o recolhimento do FGTS. Ainda, não há nenhuma prova concreta de que a autora teve algum repasse recusado por tal motivo e o montante em questão. A concessão de uma medida liminar nestas circunstâncias poderia criar um precedente perigoso, incentivando o descumprimento de obrigações legais por anos a fio por outras entidades sob o argumento da essencialidade de seus serviços, em detrimento do interesse público na arrecadação e na responsabilidade fiscal, o que pode significar repasses de recursos " a fundo perdido". Ante o exposto, indefiro o pedido liminar. Considerando que o direito em discussão é indisponível, deixo de designar audiência de conciliação. Citem-se os réus para apresentarem contestação, no prazo legal. Intime-se. Divinópolis, data da assinatura eletrônica. Fernando Lino dos Reis Juiz de Direito

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Processo nº 1006230-87.2025.8.11.0000

ID: 330361405

Tribunal: TJMT Órgão: Turma de Câmaras Criminais Reunidas Classe: REVISãO CRIMINAL Nº Processo: 1006230-87.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

MAYCON ANTONIO SANTOS DA SILVA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ROMULO BEZERRA PEGORARO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS Número Único: 1006230-87.2025.8.11.0000 Classe: REVISÃO CRIMINAL (12394) Assunto: [Roubo] Relator: Des(a). HELIO NISHIYAMA T… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS Número Único: 1006230-87.2025.8.11.0000 Classe: REVISÃO CRIMINAL (12394) Assunto: [Roubo] Relator: Des(a). HELIO NISHIYAMA Turma Julgadora: [DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). WESLEY SANCHEZ LACERDA, DES(A). CHRISTIANE DA COSTA MARQUES NEVES, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). JUANITA CRUZ DA SILVA CLAIT DUARTE, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [ROMULO BEZERRA PEGORARO - CPF: 733.828.091-68 (ADVOGADO), MAYCON ANTONIO SANTOS DA SILVA - CPF: 060.660.831-12 (REQUERENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REQUERIDO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), DIEGO ANTONIO APPARECIDO BRIZOLA GATTO - CPF: 065.754.451-52 (VÍTIMA), FRANCISCO DJAVAN MORAES DA SILVA - CPF: 778.141.772-00 (VÍTIMA), JOSE CARLOS DA PAIXAO SILVA JUNIOR - CPF: 027.680.022-24 (VÍTIMA), JUÍZO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE PRIMAVERA DO LESTE (REQUERIDO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO REVISONAL, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR E EM DISSONÂNCIA DO PARECER MINISTERIAL. EMENTA DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO E CORRUPÇÃO DE MENORES. NULIDADE POR OFENSA AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. INOCORRÊNCIA. SENTENÇA QUE SE ATEVE À DESCRIÇÃO CONTIDA NA DENÚNCIA. ABSOLVIÇÃO DO CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENORES. IMPOSSIBILIDADE. IDADE DO ADOLESCENTE COMPROVADA DOCUMENTALMENTE. DECOTE DA MAJORANTE DE RESTRIÇÃO À LIBERDADE DA VÍTIMA NO CRIME DE ROUBO. VIABILIDADE. LAPSO TEMPORAL JURIDICAMENTE RELEVANTE NÃO COMPROVADO. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. REVISÃO CRIMINAL PARCIALMENTE PROCEDENTE. I. CASO EM EXAME 1. Revisão criminal proposta contra acórdão que redimensionou a pena do requerente para 11 anos e 10 meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 25 dias-multa, pela prática dos crimes de roubo majorado (CP, art. 157, §2º, II e V, e §2º-A, I, c/c art. 70, por três vezes) e corrupção de menores (ECA, art. 244-B). 2. Fatos relevantes: (i) crime de roubo em que o requerente e um adolescente, após iniciarem a execução, tomaram posse de objetos das vítimas, invertendo a posse dos bens; (ii) vítimas que foram amarradas e mantidas presas no banheiro da residência por cerca de 20 minutos, enquanto os agentes continuavam a subtração dos bens; (iii) executores presos dentro da residência, em flagrante delito; (iv) boletim de ocorrência com registro da idade do adolescente envolvido na ação delitiva; (v) denúncia que, apesar de descrever a inversão de posse de parte dos objetos subtraídos, tratou a ação como tentada no parágrafo de resumo e na imputação final; (vi) sentença de 1º grau que reconheceu a consumação do delito de roubo e aplicou, dentre outras, a majorante da restrição da liberdade das vítimas; (vii) pena fixada inicialmente em 24 anos e 10 meses de reclusão, depois reduzida na apelação. 3. Requerimentos: (i) nulidade do processo por ofensa ao princípio da correlação entre a denúncia e a sentença condenatória e da falta de adoção do instituto da mutatio libelli (CPP, art. 384); (ii) absolvição do crime de corrupção de menores (ECA, art. 244-B; (iii) afastamento da causa de aumento de pena prevista no art. 157, §2º, V, do CP. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. As questões em discussão consistem em: (i) verificar se houve nulidade processual por ausência de aditamento da denúncia após mudança da capitulação jurídica do fato e por inobservância das disposições previstas no art. 384 do CPP; (ii) analisar se há comprovação suficiente da menoridade do adolescente envolvido na prática criminosa, para fins de caracterização do crime de corrupção de menores (ECA, art. 244-B); e (iii) examinar se o tempo de restrição da liberdade das vítimas justifica a incidência da causa de aumento prevista no art. 157, §2º, V, do CP. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. Muito embora tenha constado a forma tentada do crime de roubo no parágrafo introdutório e na imputação final da denúncia, a descrição fática converge para a modalidade consumada do delito. Por isso, a alteração da capitulação jurídica realizada pelo magistrado na sentença, de roubo tentado para consumado, tomando como norte descrição fática contida na própria denúncia, não é causa de nulidade da sentença, senão aplicação do instituto da emendatio libelli, previsto no art. 383 do CPP. 6. O boletim de ocorrência tem fé pública e constitui documento hábil para comprovar a menoridade do jovem que cometeu o crime patrimonial ao lado do requerente, conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça. 7. Uma vez demonstrado que o tempo de restrição da liberdade das vítimas não ultrapassou o necessário para a execução do crime, deve ser afastada a causa de aumento prevista no art. 157, §2º, V, do CP e, consequentemente, redimensionada a reprimenda. IV. DISPOSITIVO 8. Revisional parcialmente procedente. _______________________________ Dispositivos relevantes citados: Código Penal, arts. 59, 61, I, 65, III, “d”, 157, §2º, II e V, §2º-A, I, e 33, §2º, “a”; Código de Processo Penal, arts. 383 e 384; Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 244-B. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 582, HC n. 197.068/SP, HC n. 476.345/MG, AgRg no HC n. 641.592/MG, AgRg no AREsp n. 1.880.000/MG, AgRg no AREsp n. 2.078.061/MG, AgRg nos EDcl no AgRg no AREsp n. 1.526.361/SP. TJMT, ApCrim 0005822-60.2019.8.11.0021, ApCrim 1006207-69.2021.8.11.0037, ApCrim 1017243-09.2023.8.11.0015. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. HÉLIO NISHIYAMA Egrégia Turma: Trata-se de revisão criminal ajuizada por Maycon Antônio Santos da Silva, assistido por advogado constituído, com fundamento no art. 621, inc. I e III, do Código de Processo Penal, contra sentença condenatória proferida pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Primavera do Leste nos autos da ação penal n. 1008770-70.2020.8.11.0037. Na origem, o requerente foi condenado pela prática dos crimes de roubo majorado (CP, art. 157, §2º, II e V, e §2º-A, I, por três vezes, na forma do art. 70) e corrupção de menores (ECA, art. 244-B) à pena de 24 (vinte e quatro) anos e 10 (dez) meses de reclusão em regime fechado e ao pagamento de 375 (trezentos e setenta e cinco) dias-multa (id. 271807395). Em segunda instância, a Segunda Câmara Criminal deu provimento ao apelo defensivo, reduzindo a reprimenda para 11 (onze) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime fechado, e 25 (vinte e cinco) dias-multa (id. 271807397). A condenação transitou em julgado em 13/outubro/2021 (id. 271807398). Na presente ação autônoma de impugnação, o requerente busca ver declarada a nulidade do processo desde a fase instrutória, sob o argumento de que, ao aplicar a regra da emendatio libelli (CPP, art. 383) na sentença, em detrimento do instituto da mutatio libelli (CPP, art. 384), o Juízo de origem teria violado o princípio da correlação entre denúncia e sentença. De modo subsidiário, postula a absolvição quanto ao delito de corrupção de menores (ECA, art. 244-B), por entender que a idade do adolescente não estaria documentalmente provada nos autos, e o decote da causa de aumento referente à restrição da liberdade das vítimas no crime de roubo (CP, art. 157, § 2º, inc. V) (id. 271807391). A inicial vem instruída com documentos (id. 271807392 a 271807399). A tutela de urgência foi indeferida (id. 272438898). A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela improcedência da revisão criminal (id. 273715385). É a síntese do necessário. Devidamente relatados, os autos foram encaminhados à revisão. VOTO EXMO. SR. DES. HÉLIO NISHIYAMA (RELATOR) Egrégia Turma: Conforme consta nos autos, o Ministério Público de Mato Grosso ofereceu denúncia em desfavor do requerente Marcos Antônio Santos Silva, imputando-lhe a prática dos crimes de roubo majorado tentado (CP, art. 157, §º, II e V, §2º-A, I, c/c art. 14, II, na forma do art. 70) e corrupção de menores (ECA, art. 244-B), em razão dos seguintes fatos: “Consta dos inclusos autos de inquérito policial que, no dia 19 de dezembro de 2020, por volta das 02h00min, na Rua Maringá, n. 1011, bairro Jardim Riva, nesta cidade e Comarca de Primavera do Leste/MT, o denunciado Maycon Antônio Santos da Silva, após prévio ajuste e conluio de vontades com o adolescente Luan Ferreira de Oliveira, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, agindo com manifesto animus furandi, mediante a utilização de armas de fogo, sendo 01 (um) revólver calibre n. 32 municiada com 05 (cinco) projéteis de igual calibre e 01 (uma) pistola calibre n. 7.65mm, municiada com 01 (um) projétil de igual calibre, de acordo com Termo de Exibição e Apreensão (ID n.º 46612774), tentaram subtrair, mediante grave ameaça, a quantia de R$ 2.203,25 (dois mil, duzentos e três reais e vinte e cinco centavos) em espécie além de cartões de créditos, aparelhos celulares e diversos objetos que se encontravam no interior da casa, pertencentes às vítimas Francisco Djavan Moraes da Silva, Diego Antônio Aparecido Brizola Gatto e José Carlos da Paixão Silva Junior, através de restrição da liberdade, não alcançando o resultado final por circunstâncias alheias a sua vontade. Nas mesmas circunstâncias de tempo e local acima narrados, o denunciado Maycon Antônio Santos da Silva corrompeu o menor de 18 (dezoito) anos Luan Ferreira de Oliveira, com ele praticando as infrações penais acima mencionadas. 02. DA DESCRIÇÃO DOS FATOS: Segundo restou apurado, no local, data e hora dos fatos acima mencionados, o denunciado Maycon Antônio Santos da Silva, após prévio ajuste e conluio de vontades com o adolescente Luan Ferreira de Oliveira, resolveram ingressar na residência onde se encontravam as vítimas Francisco Djavan Moraes da Silva, Diego Antonio Aparecido Brizola Gatto e José Carlos da Paixão Silva Junior e cada qual fazendo uso das armas de fogo, 01 revólver calibre n. 32 municiada com 05 projéteis de igual calibre e 01 pistola calibre n. 7.65mm, municiada com 01 projétil de igual calibre, de acordo com Termo de Exibição e Apreensão (ID n.º 46612774), anunciaram o assalto. Apura-se também dos autos que, os denunciados após renderem as vítimas tomaram destas todo o dinheiro que cada um trazia, além de exigir a entrega dos aparelhos celulares e cartões de créditos com fornecimento de senhas, sob ameaça de morte caso entregassem a senha errada, o que de fato lhes foi dado corretamente. Registra-se no decorrer dos autos de inquérito policial que, os denunciados após tomarem os objetos acima mencionados, colocaram as vítimas trancadas no interior do banheiro da residência, restringindo a liberdade e mantendo-as em seu poder para que pudessem subtrair os objetos da residência, ocasião em que a Polícia Militar chegou no local após receber informações de um vizinho de que havia uma movimentação anormal no local. Verifica-se também nos autos que, os policiais militares ao ingressarem na casa, renderam o denunciado e o adolescente liberando as vítimas do banheiro, sendo que no interior do carro da vítima foi encontrado diversos objetos que o denunciado já teria colocado para levar. Por fim, restou evidenciado dos autos que, embora praticados no mesmo contexto fático, os denunciados e seu comparsa atingiram patrimônios de vítimas diversas, motivo pelo qual resta forçoso o reconhecimento da prática de delitos distintos em concurso formal. 03. DOS REQUERIMENTOS: DIANTE DO EXPOSTO, o MINISTÉRIO PÚBLICO, através do Promotor de Justiça subscritor, denuncia a Vossa Excelência as pessoas de MAYCON ANTONIO SANTOS DA SILVA, como incurso no artigo 157, § 2º, II e V, § 2º-A, I, c/c artigo 14, II e artigo 70, caput, todos do Código Penal (por três vezes) e artigo 244-B da Lei n.º 8.069/90” (id. 271807393). Encerrada a instrução criminal, o Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Primavera do Leste, após realizar emendatio libelli (CPP, art. 383), julgou procedente a pretensão punitiva estatal para condenar o requerente pela prática dos crimes de roubo majorado na modalidade consumada (CP, art. 157, §2º, II e V, e §2º-A, I) e corrupção de menores (ECA, art. 244-B), impondo-lhe a pena de 24 (vinte e quatro) anos e 10 (dez) meses de reclusão em regime inicial fechado e o pagamento de 375 (trezentos e setenta e cinco) dias-multa (id. 271807395). Inconformado, o requerente interpôs recurso de apelação buscando exclusivamente a fixação, quanto ao crime de roubo, da pena-base no mínimo legal, e a redução do valor unitário do dia-multa para o patamar mínimo previsto em lei. O apelo foi provido pela Segunda Câmara Criminal, que redimensionou a reprimenda para 11 (onze) anos e 10 (dez) meses de reclusão em regime inicial fechado e 25 (vinte e cinco) dias-multa (id. 271807397). O acórdão transitou em julgado em 13/outubro/2021 (id. 271807398). Ainda renitente com a sua condenação, o requerente propôs a presente revisão criminal, cujas pretensões não foram objeto da irresignação interposta na ação penal originária, a evidenciar o conhecimento integral das matérias. Assim, passo à análise dos pleitos defensivos. 1. PLEITO ANULATÓRIO 1.1. Correlação entre denúncia e sentença Em seu pleito inaugural, o requerente afirma que o processo que culminou em sua condenação é nulo, pois a sentença condenatória não guardaria correlação com a denúncia oferecida pelo Ministério Público, o que, em tese, violaria o sistema acusatório e os princípios do devido processo legal (CF, art. 5º, inc. LIV) e do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º, inc. LV). Pormenoriza que a inicial acusatória imputou a prática do crime de roubo tentado, mas o Juízo de primeiro grau, sem observar as determinações do art. 384 do Código de Processo Penal, condenou o requerente pelo crime de roubo em sua modalidade consumada. Assim, aduzindo a existência de descompasso entre a narrativa contida na denúncia e a sentença condenatória, busca ver declarada a nulidade do processo desde a audiência de instrução e julgamento, a fim de que seja realizada a mutatio libelli (CPP, art. 384) e oportunizadas, após o aditamento da peça inaugural, a manifestação da defesa e a renovação da instrução processual. A pretensão é improcedente. De acordo com o Código de Processo Penal, “o juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave” (CPP, art. 383). Ao consagrar a emendatio libelli, o mencionado dispositivo permite que o julgador promova a readequação típica dos fatos descritos na denúncia. Nessas hipóteses, como destaca a doutrina, “não ocorrerá qualquer alteração do fato descrito na peça inicial acusatória. Ela permanece intacta. O que mudará é a tipificação ou classificação jurídica do fato imputado” (ALVES, Leonardo Barreto Moreira. Manual de Processo Penal. 3ª. ed. Salvador, JusPODIVM, 2023, p. 1286). Nesses moldes, o julgador pode adequar o tipo penal que efetivamente se amolde aos fatos narrados na peça inicial, ainda que isso implique imposição de pena mais severa, sem a necessidade de aditar a denúncia ou “reabrir” a instrução probatória. Não é por outra razão que a Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, em caso semelhante ao tratado nestes autos, reconheceu que: “Se a denúncia consignou que o acusado subtraiu as ferramentas e uma bolsa, sendo posteriormente perseguido e capturado por testemunhas e preso pela polícia militar, não há nenhuma nulidade na condenação do agente pelo cometimento do furto em sua forma consumada, ainda que a Promotoria de Justiça tenha entendido ter havido apenas a tentativa” (N.U 0005822-60.2019.8.11.0021, Câmaras Isoladas Criminais, Orlando de Almeida Perri, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 07/12/2021, Publicado no DJE 12/12/2021). Portanto, a questão fundamental para admitir a realização da emendatio libelli e, consequentemente, a alteração da capitulação jurídica do fato atribuído ao agente, está na existência, ou não, de descrição do evento na inicial acusatória. Trazendo essa lição para o caso dos autos e atento aos termos da denúncia, observa-se que no parágrafo introdutório e na imputação final consta expressamente a forma tentada do crime de roubo, enquanto a descrição fática converge juridicamente para a modalidade consumada do delito. No parágrafo de resumo, aponta-se que o requerente e o adolescente “tentaram subtrair, mediante grave ameaça, a quantia de R$ 2.203,25 (dois mil, duzentos e três reais e vinte e cinco centavos) em espécie além de cartões de créditos, aparelhos celulares e diversos objetos que se encontravam no interior da casa”. Logo na sequência, porém, a inicial acusatória descreve que, após o exercício de grave ameaça com o emprego de arma de fogo, os agentes subtraíram diversos bens das vítimas [dinheiro, aparelhos celulares e cartões de créditos] e, em seguida, trancaram os ofendidos no interior do banheiro com a finalidade de subtrair mais bens do interior da residência, consoante abaixo destacado: “Apura-se também dos autos que, os denunciados após renderem as vítimas tomaram destas todo o dinheiro que cada um trazia, além de exigir a entrega dos aparelhos celulares e cartões de créditos com fornecimento de senhas, sob ameaça de morte caso entregassem a senha errada, o que de fato lhes foi dado corretamente. Registra-se no decorrer dos autos de inquérito policial que, os denunciados após tomarem os objetos acima mencionados, colocaram as vítimas trancadas no interior do banheiro da residência, restringindo a liberdade e mantendo-as em seu poder para que pudessem subtrair os objetos da residência, ocasião em que a Polícia Militar chegou no local após receber informações de um vizinho de que havia uma movimentação anormal no local” (id. 271807393). Como se nota, apesar da narrativa feita no parágrafo de resumo – que redundou na capitulação jurídica do delito na forma tentada –, a denúncia descreve, com bastante precisão que, logo no início da ação delitiva, o requerente e o menor em sua companhia lograram êxito em despojar as vítimas de parte de seus bens, circunstâncias suficientes o bastante para autorizar a nova atribuição jurídica conferida pelo magistrado na sentença, nos termos do art. 383 do Código de Processo Penal. Aliás, é perfeitamente possível que o órgão julgador tenha uma compreensão jurídica da situação fática distinta daquela trazida na denúncia, sobretudo quando confirmada na fase de instrução probatória, como ocorre na espécie. “20. Em análise dos autos, verifica-se, portanto, que é necessário o afastamento da modalidade ‘tentativa’. Explico. 21. Assim, fica evidente dos autos que o fato consumou no momento em que os acusados estavam em posse das res furtivas, sendo que renderam as vítimas, tomaram destas todo o dinheiro que cada uma trazia, além de exigir a entrega dos aparelhos celulares e cartões de créditos com fornecimento de senhas, sob ameaça de morte caso entregassem a senha errada, o que lhes foi passado corretamente. 22. Ainda, após se apossar todos os objetos supramencionados, trancaram as vítimas no interior do banheiro da residência, restringindo a liberdade e mantendo-as em seus poderes para que pudessem subtrair objetos da residência Reforçando o acerto da readequação típica realizada pelo órgão julgador com base em descrição expressamente contida denúncia, de roubo tentado para consumado, as próprias vítimas, quando ouvidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, esclareceram que foram despojadas dos seus bens – ainda que por breve lapso temporal. 23. Além disso, a jurisprudência é assente no sentido de que deve ser afastada a tentativa, quando resta devidamente comprovado que o fato se consumou, aplicando-se a teoria da amotio ou da apprehensio, de que, ‘a consumação do delito de roubo, segundo entendimento jurisprudencial dominante, dá-se no momento em que o agente torna-se possuidor da coisa alheia móvel subtraída, sendo prescindível que a res saia da esfera de vigilância da vítima ou que o agente exerça a posse tranquila daquela. Teoria da amotio ou da appehensio’. (...) 25. Ressalte-se que ao proceder à nova definição jurídica da imputação inicial (emendatio libelli), que não se atenta contra os princípios da ampla defesa e o nex procedat judez ex officio, corolários do sistema acusatório entre nós adotado. 26. Devo argumentar, finalmente, que a classificação do delito na peça acusatória não tem, necessariamente, que ser exata, pois que o perfeito enquadramento da espécie é tarefa do magistrado, a partir do princípio do ‘narra mihi factum, dabo tibi jus’ (...)” (id. 271807395). Reforçando o acerto da readequação típica realizada pelo órgão julgador – com base em descrição expressamente contida denúncia, repita-se –, as próprias vítimas, quando ouvidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, esclareceram que foram despojadas dos seus bens – ainda que por breve lapso temporal. Nesse sentido, o ofendido Diego Antônio Aparecido Brizola Gatto afirmou que, tão logo anunciado o delito, o requerente e o menor se apoderaram dos objetos que ele e os demais ofendidos traziam consigo (aparelhos celulares, carteiras etc.) e, na sequência, amarraram as mãos deles e os trancaram no banheiro. Do mesmo modo, o ofendido José Carlos da Paixão declarou que, anunciada a prática delitiva, foram subtraídos o seu celular, sua corrente e seu relógio. Desenhado esse quadro, não há impeditivo algum ao reconhecimento da modalidade consumada do crime de roubo, pois, de acordo com o Superior Tribunal de Justiça, o mencionado delito se consuma justamente com esta inversão mediante violência ou grave ameaça, “ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada” (Súmula 582/STJ). Logo, não há falar-se em nulidade do processo, porque a peça inaugural descreve a inversão da posse de parte dos bens subtraídos, o que permitiu à defesa do requerente contestar e enfrentar a questão e conferiu ao magistrado de primeira instância a possibilidade de, com base em entendimento consolidado e sumulado a respeito da matéria, reconhecer a forma consumada do crime contra o patrimônio. Adotando a mesma compreensão, confira-se da jurisprudência: “O equívoco na denúncia quanto à capitulação do crime imputado ao acusado - modalidade tentada, em vez de consumada - pode ser corrigido na sentença, por meio da emendatio libelli, prevista no art. 383 do Código de Processo Penal. O réu se defende dos fatos imputados na denúncia, e não da classificação a eles atribuída” (HC n. 158.545/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 19/11/2012, DJe de 27/11/2012). “Não há ilegalidade no procedimento adotado pelo magistrado de origem, que condenou os pacientes pelo crime de roubo consumado, já que, nos exatos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal, o Juízo pode atribuir definição jurídica diversa aos fatos contidos na inicial, desde que não os modifique, ainda que, por consequência, tenha que aplicar pena mais grave. [...] Não há ilegalidade na condenação dos pacientes pelo crime de roubo consumado, quando o Ministério Público oferece denúncia e sustenta nas alegações finais que o delito teria sido praticado na forma tentada. 5. O entendimento firmado pelas instâncias de origem está de acordo com o sufragado nesta Corte Superior de Justiça, pelo qual o crime de roubo, assim como o de furto, se consuma quando o agente obtém a posse, ainda que breve, do bem subtraído, não sendo necessário que esta se dê de forma mansa e pacífica” (HC n. 197.068/SP, relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 16/4/2013, DJe de 24/4/2013). Diante desse cenário, não há nulidade a ser reconhecida. 2. PLEITO ABSOLUTÓRIO 2.1. Crime de corrupção de menores (ECA, art. 244-B) O requerente busca ser absolvido da imputação do crime de corrupção de menores (ECA, art. 244-B), sob o fundamento de que nos autos não contêm prova documental da idade de L.F.D.O., menor igualmente envolvido na violenta subtração. Uma vez mais, não assiste razão ao requerente. De acordo com o art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, o crime de corrupção de menores se caracteriza pelo ato de “corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la”. Ao tratar da matéria, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que “a certidão de nascimento não é o único documento hábil à comprovação da menoridade do adolescente a fim de caracterizar a elementar do crime de corrupção de menor, porquanto há outros documentos dotados de fé pública igualmente válidos para fundamentar o livre convencimento do Magistrado” (HC n. 476.345/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 7/2/2019, DJe de 15/2/2019). No caso em tela, ao consultar os autos do processo na origem, constata-se que o boletim de ocorrência n. 2020.312342 indica que o adolescente L.F.D.O. nasceu em 26/01/2004 e, portanto, tinha 16 (dezesseis) anos de idade na data do crime (id. 46612781 – processo n. 1008770-70.2020.8.11.0037). Essa informação é suficiente o bastante para comprovar a idade do menor, pois, consoante destacado pela Corte da Cidadania, a idade do menor envolvido em conduta criminosa pode ser demonstrada por documento de registro civil, bem como outros também dotados de fé pública (AgRg no HC n. 641.592/MG, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 24/8/2021, DJe de 30/8/2021). Dentre esses documentos, inclui-se o boletim de ocorrência, uma vez que, como na espécie, além de confeccionado por autoridade dotada de fé pública, há indicação do nome completo do menor, da sua data de nascimento, idade, naturalidade, do nome da mãe e do endereço, elementos suficientes para comprovar a prática do crime previsto no art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente. No mesmo sentido, admitindo a comprovação da idade do menor por dados contidos em boletim de ocorrência, destaque-se: “A comprovação da menoridade, para fins de tipificação do delito previsto no art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, não exige obrigatoriamente a apresentação de documentos oficiais, podendo esta circunstância elementar ser comprovada por outros documento idôneos, tais como o boletim de ocorrência policial e auto de apreensão do adolescente’ (AgRg no AREsp 1.487.060/MG, Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 02/08/2019)” (AgRg no AREsp n. 1.880.000/MG, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 19/4/2022, DJe de 22/4/2022). Nesse quadro, é evidente que “o boletim de ocorrência é documento idôneo a comprovar a idade do menor envolvido” (AgRg no AREsp n. 2.078.061/MG, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 7/3/2023, DJe de 10/3/2023). Por decorrência lógica, não acolho o pleito absolutório. 3. DAS PENAS 3.1. Majorante da restrição de liberdade da vítima Finalmente, o requerente pleiteia o afastamento da causa de aumento relativa à restrição de liberdade das vítimas no crime de roubo (CP, art. 157, § 2º, V). Para subsidiar a pretensão, alega que as vítimas Francisco Djavan Moraes da Silva e José Carlos da Paixão relataram que a ação criminosa durou, até a chegada da Polícia Militar, entre 15 (quinze) e 20 (vinte) minutos, e que o ofendido Diego Antônio Aparecido Brizola Gatto afirmou que a conduta delitiva perdurou entre 05 (cinco) a 10 (dez) minutos. A matéria comporta análise, pois não foi objeto do apelo defensivo interposto anteriormente, que se limitou a solicitar a fixação, quanto ao crime de roubo, da pena-base no mínimo legal e a redução do valor unitário do dia-multa para o patamar mínimo previsto em lei. Dito isso, o pedido comporta acolhimento. Ao tratar da questão, a sentença destacou: “No que tange a restrição de liberdade, desnecessário maiores digressões ante a fundamentação acima, visto que restou caracterizado que os acusados mantiveram as vítimas em seu poder. Por conseguinte, encontra-se plenamente configurada a causa de aumento descrita no artigo 157, § 2º inciso V, do Código Penal, visto que, para consumar o crime e garantir o sucesso da fuga, os criminosos mantiveram os ofendidos, conforme afirmado em seus depoimentos, amarrados, restringindo, portanto, a liberdade de locomoção dos mesmos” (id. 271807395). A legislação penal prevê que a pena do crime de roubo é aumentada se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo a sua liberdade (CP, art. 157, §2º, V). Conforme explica a doutrina, o elemento normativo “mantém”, previsto no art. art. 157, §2º, inc. V, do Código Penal, indica que a restrição da liberdade deve ocorrer por tempo juridicamente relevante, ou seja, por período superior ao necessário à execução do delito (ALVES, Jamil Chaim. Manual de Direito Penal. 5ª. ed. Salvador: JusPODIVM, 2024, p. 1057). No mesmo sentido, confira-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “Nos moldes da orientação desta Casa, para o reconhecimento da causa de aumento de pena prevista no inciso V do § 2º do art. 157 do Código Penal, o tempo de restrição da liberdade das vítimas deve ser relevante, superior ao necessário para a conclusão da empreitada criminosa (AgRg no HC n. 23.301/MS, relator Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 28/11/2019)” (AgRg nos EDcl no AgRg no AREsp n. 1.526.361/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 22/3/2022, DJe de 25/3/2022). No caso em tela, as vítimas relataram que depois de abordadas e rendidas, foram amarradas e levadas ao banheiro, onde foram mantidas trancadas enquanto os agentes reviravam a casa em busca de objetos para subtrair, até que, pouco depois, a Polícia Militar chegou ao local e as liberou. Em seu depoimento, a vítima Francisco Djavan Moraes da Silva destacou que depois da intervenção dos policiais militares, constatou que os agentes haviam “carregado praticamente tudo” que tinha dentro de casa e colocado os objetos no interior de seu veículo, o que foi confirmado pelo ofendido José Carlos da Paixão. A partir desses elementos, verifica-se que, iniciada a conduta criminosa, o requerente e o menor subtraíram bens das vítimas, amarraram e as levaram para o banheiro e, em seguida, prosseguiram na execução do delito, apoderando-se de mais objetos e levando-os para o veículo do ofendido Francisco Djavan Moraes da Silva. Todavia, apesar do relato de que os fatos duraram entre 15 (quinze) e 20 (vinte) minutos (Francisco Djavan Moraes da Silva e José Carlos da Paixão) e 05 (cinco) a 10 (dez) minutos (Diego Antônio Aparecido Brizola Gatto), e que as vítimas foram amarradas, o simples desenrolar dos fatos no tempo e a imposição de obstáculo para evitar fuga ou reação dos ofendidos não é suficiente para atrair a majorante descrita no art. 157, §2º, V, do Código Penal. Como mencionado, é fundamental que a restrição da liberdade perdure por tempo juridicamente relevante, ou seja, superior ao necessário para execução do delito. Na hipótese, embora tenham subtraído bens das vítimas, tomando-lhes a posse, é certo que, durante todo o período em que ficaram no interior da residência, os agentes permaneceram transferindo os bens que encontravam para o veículo que seria utilizado para o transporte, a denotar que a constrição ambulatorial durou apenas o prazo necessário para a execução da empreitada criminosa. Delineado esse cenário, por não haver elementos que permitam concluir que a prática criminosa perdurou por tempo superior ao necessário para consumação do crime, impõe-se o afastamento da majorante prevista no art. 157, §2º, V, do Código Penal. Seguindo essa linha de raciocínio, confira-se: “A majorante da restrição da liberdade das vítimas deve ser afastada, pois a privação durou apenas o tempo necessário à consumação do delito, sem se prolongar de forma juridicamente relevante” (N.U 1006207-69.2021.8.11.0037, Câmaras Isoladas Criminais, Wesley Sanchez Lacerda, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 11/03/2025, Publicado no DJE 14/03/2025). Assim, por não vislumbrar na hipótese o transcurso de tempo juridicamente relevante, afasto a causa de aumento de pena prevista no art. 157, §2º, V, do Código Penal. 4. REDIMENSIONAMENTO DA PENA 4.1. Pena-base Em face do afastamento da causa de aumento de pena prevista no art. 157, §2º, V, do Código Penal, passo a redimensionar a pena do crime de roubo. Ao analisar o acórdão proferido pela Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, observa-se que o Juízo de primeiro grau fixou a pena-base acima do mínimo legal, após considerar o concurso de pessoas (CP, art. 157, §2º, II) e a restrição de liberdade das vítimas (CP, art. 157, §2º, V) como circunstâncias judiciais desfavoráveis, consoante abaixo destacado: “Destarte, utilizo as causas de aumento dos incisos II e V do § 2º do artigo 157 do Código Penal (concurso de pessoas e restrição da liberdade da vítima) como circunstâncias judiciais desfavoráveis (art. 59 do CP). Logo, considerando a existência de uma circunstância judicial negativa, relativa às circunstâncias do crime, e uma vez que o delito foi praticado com restrição de liberdade das vítimas, em concurso de pessoas, pois exigiram delas que entregassem os cartões de créditos com fornecimento de senhas, sob ameaça de morte caso fosse entregue a senha errada, e com a utilização ostensiva de armas sendo apontadas aos ofendidos, entendo como devido o aumento em 1/3, ficando a pena na primeira fase fixada em 5 anos e 4 meses de reclusão, e 13 dias-multa, no valor mínimo unitário” (id. 271807397). Assim, em face do decote da causa de aumento de restrição de liberdade das vítimas (CP, art. 157, §2º, V), remanesce apenas um elemento negativo nesta fase, razão pela redimensiono a pena basilar para 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa. 4.2. Pena provisória Conforme destacado pela Segunda Câmara Criminal, milita em desfavor do requerente a agravante da reincidência (CP, art. 61, I), assim como incide a atenuante da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”), circunstâncias que foram compensadas integralmente. Assim, ausentes outras circunstâncias modificadoras, preserva-se a pena intermediária em 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa. 4.3. Pena definitiva Na terceira fase da dosimetria, em razão da incidência da majorante do emprego de arma de fogo (CP, art. 157, §2º-A, I), a ensejar o incremento da reprimenda em 2/3 (dois terços), elevo a pena para 07 (sete) anos, 09 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 20 (vinte) dias-multa. Por força do reconhecimento da prática de três crimes de roubo em concurso formal (CP, art. 70), a pena deve ser elevada em 1/5 (um quinto) e estabelecida, definitivamente, em 09 (nove) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 24 (vinte e quatro) dias-multa. Diante da condenação conjunta pelo delito de corrupção de menores (ECA, art. 244-B), que resultou na imposição da pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão, e em observância ao critério do cúmulo material mais benéfico (CP, art. 69), somo as reprimendas, encontrando a resposta penal definitiva de 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 24 (vinte e quatro) dias-multa, que torno definitiva ante a inexistência de outros fatores a serem ponderados. Preservo as demais cominações, a exemplo do valor unitário do dia-multa (1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos), do regime fechado (CP, art. 33, §2º, “a”) e da vedação à substituição das penas constritivas de liberdade por restritivas de direitos. 5. DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a presente revisão criminal, apenas para afastar a majorante da restrição da liberdade da vítima (CP, art. 157, § 2º, V) e, por efeito, redimensionar a pena imposta ao requerente Maycon Antônio Santos da Silva, pela prática do crime de roubo majorado (CP, art. 157, §2º, II e §2º-A, I) para 09 (nove) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 24 dias-multa, resultando na resposta penal definitiva de 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de reclusão em regime fechado e 24 (vinte e quatro) dias-multa, em desconformidade com o parecer. Certificado o trânsito em julgado, comunique-se ao Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá, onde tramita o executivo de pena movido contra o requerente (n. 0009220-17.2018.8.11.0064). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/07/2025

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