Processo nº 1000516-79.2020.8.11.0079
ID: 329783217
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1000516-79.2020.8.11.0079
Data de Disponibilização:
21/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
PAULA MARTIN PIGNATARI
OAB/SP XXXXXX
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MARIA BEATRIZ BEVILACQUA VIANA GOMES
OAB/SP XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000516-79.2020.8.11.0079 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Esbulho / Turbação / Ameaça, Requerimento de Rei…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000516-79.2020.8.11.0079 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Esbulho / Turbação / Ameaça, Requerimento de Reintegração de Posse] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [ALCIDES GOMES MOREIRA - CPF: 053.538.011-99 (APELANTE), AGRO PECUARIA NOIRUMBA S A - CNPJ: 05.061.809/0001-47 (APELADO), PAULA MARTIN PIGNATARI - CPF: 350.773.618-78 (ADVOGADO), MARIA BEATRIZ BEVILACQUA VIANA GOMES - CPF: 086.053.398-02 (ADVOGADO), DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 02.528.193/0001-83 (APELANTE), ALCIDES GOMES MOREIRA - CPF: 053.538.011-99 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE: DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO APELADO: AGRO PECUÁRIA NOIRUMBA S/A EMENTA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO E DE NULIDADE DO PROCEDIMENTO. RESOLUÇÃO TJMT/OE/2/2019. VARA ESPECIALIZADA DE DIREITO AGRÁRIO DA COMARCA DE CUIABÁ. AUSÊNCIA DE CONFIGURAÇÃO DE CONFLITO FUNDIÁRIO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO QUE NÃO SE CONFUNDE COM CONFLITO POSSESSÓRIO COLETIVO. COMPETÊNCIA MATERIAL OBSERVADA. CITAÇÕES REGULARES E PROCEDIMENTO VÁLIDO. SENTENÇA MANTIDA. DESPROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de apelação cível interposto pela Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso contra sentença que julgou procedente o pedido de reintegração de posse em desfavor dos demandados, confirmando liminar anteriormente concedida e condenando parte dos réus ao pagamento de perdas e danos, custas processuais e honorários advocatícios. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2. Análise das alegações de nulidade da sentença por suposta incompetência absoluta do Juízo da Vara Única de Ribeirão Cascalheira-MT, sob o fundamento de tratar-se de conflito fundiário coletivo, e por suposta inobservância das normas processuais aplicáveis a litígios possessórios coletivos, especialmente os arts. 554 e 565 do CPC. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Inviabilidade de reconhecimento da competência da Vara Especializada em Direito Agrário da Comarca de Cuiabá-MT, diante da inexistência de litígio fundiário coletivo com repercussão social, grande número de pessoas economicamente hipossuficientes ou vínculo institucional com movimentos sociais ou associações. 4. A certidão do Oficial de Justiça revela ocupação pontual, desorganizada, sem pauta social, sem identificação de grande número de pessoas hipossuficientes e sem liderança identificável, o que afasta a natureza coletiva do conflito e mantém a competência no foro da situação da coisa, nos termos do art. 47, §2º, do Código de Processo Civil. 5. Inaplicabilidade das disposições especiais para conflitos fundiários dos arts. 554 e 565 do CPC, por ausência dos pressupostos de ocupação coletiva com vulnerabilidade social e articulação minimamente organizada. 6. Regularidade das citações pessoal e por edital, nos termos dos arts. 257 e 259 do CPC, com observância da participação da Defensoria Pública como curadora especial. 7. A interpretação sistemática entre os arts. 126 e 170, III, da Constituição Federal, evidencia que as funções sociais da propriedade e da posse permeiam a pauta dos conflitos fundiários, cuja natureza jurídica deve ser aferida com base nas circunstâncias concretas do caso, a confirmar a configuração ou não de conflito fundiário, ausentes na relação processual em exame. 8. A apelação não impugna o mérito da sentença, não questionando a posse legítima da autora, a prática do esbulho pelos réus identificados, nem os requisitos legais exigidos pelo art. 561 do CPC. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “A inexistência de grande número de pessoas, de relevância social, organização mínima e hipossuficiência econômica dos ocupantes descaracteriza o conflito fundiário coletivo, afastando a competência da Vara Especializada em Direito Agrário e legitimando a tramitação da ação no foro da situação do imóvel.” ________ Dispositivos relevantes citados: arts. 126 e 170, III, da Constituição Federal; arts. 47, §2º, 554, 562 e 565 do Código de Processo Civil; Resolução TJMT/OE/2/2019. Jurisprudência relevante citada: ED em AI 1002896-45.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/05/2025; AI 1009127-25.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 20/08/2024; AI 1013545-06.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/07/2024. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se deRecurso de Apelação Cível, interposto pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO em legitimação ex legis, com no fulcro o art. 554, §1º, do Código de Processo Civil, contra sentença (ID. 291642475) proferida pelo Juízo da Vara Única de Ribeirão Cascalheira-MT que, nos autos da Ação de Reintegração de Posse com Pedido Liminar movida por AGRO PECUÁRIA NOIRUMBA S/A em desfavor de ALCIDES GOMES MOREIRA, IVANEIS PEREIRA DE SOUZA e OUTROS, julgou procedentes os pedidos da inicial, nestes termos: [...] Trata-se de Ação de Reintegração de Posse com Pedido Liminar, ajuizada por AGRO PECUARIA NOIRUMBA S A, em face de IVANEIS PEREIRA DE SOUZA e outros, todos qualificados. Em resumo, a autora afirma ser possuidora da Fazenda Sevilha, que originou-se de uma área maior, registrada sob a matrícula nº 2.021 no Cartório de Registro de Imóveis de Ribeirão Cascalheira-MT. Dessa área, surgiram as seguintes matrículas: (i) a Matrícula nº 4.232, do CRI de Ribeirão Cascalheira-MT, com 10.192,8707 ha, conhecida como Fazenda Sevilha 'II', que é o objeto da presente demanda; e (ii) a Matrícula nº 4.644, do CRI de Ribeirão Cascalheira-MT, com 11.861,4689 ha, conhecida como Fazenda Sevilha 'I'. Relata que a autora exerce sobre a Fazenda Sevilha 'II' a posse mansa, pacífica e ininterrupta há décadas, desde a aquisição da propriedade. Nela, arrenda áreas para o Sr. Bruno Melcher, o Sr. Cristian Tony Toledo Palmieri e o Sr. Eduardo Augusto Palmieri, sempre preservando a área de reserva legal. Informa que aos 08/08/2020 um grupo de homens, que chegaram na área em uns 10 (dez) veículos, portanto foices e possivelmente armas de fogo, invadiram a área de vegetação nativa da Fazenda Sevilha II - podendo atingir ainda área de preservação permanente -, desmatando-a/picotando-a, atingindo inclusive parte da plantação. Requereu, liminarmente, a reintegração da posse. Ao final, pleiteou a procedência da ação, com a confirmação da tutela, além da condenação dos requeridos ao pagamento de indenização pelos danos e perdas causados. Juntou-se documentos. Recebida a inicial, foi determinada a elaboração de auto de constatação ao ID: 36467626 - Pág. 1. A diligência de constatação foi realizada pelo oficial de justiça, com a respectiva juntada ao ID: 36721123 - Pág. 1. Após a juntada diligêncial, a parte autora pugnou pelo deferimento da liminar (ID: 37062915 - Pág. 1). Foram abertas vistas ao Ministério Público, que emitiu parecer favorável à concessão do mandado liminar de reintegração de posse, com a fixação de prazo para desocupação voluntária e autorização para o uso de reforço policial, caso haja descumprimento, conforme ID: 37226434. Fora deferido o pedido liminar para determinar a imediata reintegração da autora na posse do imóvel objeto da matrícula nº 4.232, do CRI de Ribeirão Cascalheira, denominado 'Fazenda Sevilha II', com área total de 10.192,87 ha, especialmente na área de proteção ambiental (APP e reserva legal), conforme decisão ID: 37277333 - Pág. 4. Realizada a reintegração da autora na posse do imóvel Fazenda Sevilha II, não foi possível intimar os requeridos, pois não foram encontrados na propriedade, conforme diligência ID: 37546463. A parte autora requereu a citação por oficial de justiça dos requeridos Alcides Gomes Moreira e Ivaneis Pereira de Souza (ID: 39828807). O primeiro foi citado, conforme informado pelo Sr. Oficial de Justiça no ID: 36721091. Já o segundo, o Sr. Oficial de Justiça informou que não foi possível realizar a citação, conforme consta no ID: 36719858. Posteriormente, a Defensoria Pública apresentou exceção de incompetência absoluta em razão da matéria (ID: 42048205), sendo impugnada pelo autor (ID: 43183796) e indeferida na decisão (ID: 42912152), determinando-se, ainda, a citação dos ocupantes encontrados no local e a citação por edital dos demais. O autor opôs embargos à decisão (ID: 44873323), sendo acolhidos na decisão ID: 46914416, determinando-se a nova citação do requerido Ivaneis Pereira de Souza e indeferiu-se o pedido de citação por hora certa. O requerido Ivaneis Pereira de Souza foi citado, conforme diligência registrada no ID: 56884903, e o edital de citação foi publicado no ID: 51142527 e 63703364. Ambos os requeridos, Alcides Gomes Moreira e Ivaneis Pereira de Souza, foram devidamente citados, mas permaneceram inertes, deixando o prazo transcorrer in albis, conforme certificado nos autos (ID: 63739823). Além disso, o prazo referente ao edital de citação dos invasores em local incerto e não sabido também transcorreu sem qualquer manifestação, conforme certificado no ID: 66148247. A Defensoria Pública apresentou contestação por negativa geral, conforme registrado no ID: 66674035. A parte autora requereu a decretação de revelia dos requeridos citados e o julgamento antecipado da lide, conforme consta no ID: 67036295 - Pág. 4. Vieram os autos conclusos. [...] 2.2.Da revelia ejulgamento antecipado da lide. Analisando os autos, verifico que os requeridos Alcides Gomes Moreira e Ivaneis Pereira de Souza, devidamente citados (ID: 56884903 e 36721091), não apresentaram contestação nos autos, deixando o prazo transcorrerin albis, conforme certificado no ID: 63739823. Dessa forma, DECRETO-LHES à revelia, nos termos do artigo 344 do Código de Processo Civil. Assim sendo, aplico o julgamento antecipado da lide, nos termos dos arts. 355, incisos I e II, do CPC. Passo ao julgamento do mérito. 2.3. Do mérito. [...] Pois bem. No caso em tela, o autor demonstrou o cumprimento de todos os requisitos necessários para a procedência de seu pleito. Vejamos: I - Posse do Autor: Foi comprovada pelos documentos instruídos ao feito, a saber: matrícula do imóvel (ID: 36431745), estudo cadastral do INTERMAT (ID: 36431749), declarações de ITR (ID: 36431750, 36431752 e 36431755), CAR (ID: 36431768), APF (ID: 36431770), CCIR (ID: 36431772), contratos de arrendamento rural e comodato (ID: 36431773, 36431774 e 36431775), conta de energia (ID: 36431789), contratos de compra e venda de soja (ID: 36431790 e 36432343) e notas fiscais (ID: 36432351 a 36432355 e 39828827 a 39829799), que ratificam o exercício de sua posse. II - Esbulho praticado pelo requerido: Foi comprovado por meio dos seguintes documentos: boletim de ocorrência (ID: 36431780), fotografias (ID: 36431777), declarações de vizinhos (ID: 36431788 e 37062916) e mandado de constatação deste juízo (ID: 36721123). III - Data do esbulho: Descrita na inicial (ID: 36431139, pág. 3) e no boletim de ocorrência (ID: 36431780), datados de 08/08/2020. IV - Perda da posse: Ficou evidenciada pelos atos praticados pelos requeridos, que ingressaram de forma irregular na propriedade, violando a posse do autor e motivaram o ajuizamento da presente demanda. Por oportuno, destaco alguns trechos do auto de constatação (ID: 36721123): “(...) No decorrer do caminho (14 km) da estrada interna da fazenda foram fincadas várias estacas de madeira que aparentam separar os talhões dos invasores, além de pequenas aberturas na mata, seguida de algumas “picadas”. Alegaram os invasores que estavam vindo de Querência para continuar os trabalhos no acampamento, que não pertencem a nenhum grupo de sem-terra (MST, etc), que estão há uma semana no local abrindo “picadas” na mata e dividindo os talhões, sendo que cada talhão mede aproximadamente 250 metros de testada para a estrada vicinal e 2500 a 3000 metros mata a dentro, que está programado para reunir diversas pessoas entre 14/08 (amanhã) e 15/08 no referido local, que o movimento de invasão está sendo articulado pelos senhores Maguila, Saul e Cuiabano (não sabem de qual Cuiabano se trata), que existe outras pessoas que influenciam o movimento (não sabem precisar nomes) e que o mesmo é de forma desordenada, sendo que algumas picadas são abertas em locais distantes do acampamento principal e de forma aleatória (encontramos estacas distante 10 quilômetros do acampamento), que acreditam que tem gente com grande poder aquisitivo por trás de tal invasão, que os articuladores (acima mencionados) alegam que a fazenda Noirumba pertence ao P.A. Maria Tereza, que há pessoas de Ribeirão Cascalheira, Bom Jesus do Araguaia e Querência no local, que pela manhã de hoje havia um grupo de Ribeirão Cascalheira abrindo “picadas” ao fundo do acampamento, que as pessoas estão vindo através de mensagens entre conhecidos no Whatsapp (...)” (grifei) Portanto, pelos documentos juntados, pela constatação realizada pelo Oficial de Justiça e por tudo mais que consta nos autos, entendo que o autor comprovou todos os requisitos necessários para a procedência do pedido. Fica inconteste a posse do autor sobre o imóvel, a ocorrência do esbulho, a data do evento e a perda da posse, atendendo a todos os requisitos exigidos pela legislação. [...] 3. Dispositivo. Isto posto, e considerando tudo o que consta nos autos, CONFIRMO a liminar anteriormente deferida (ID: 37277333) e JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, extinguindo o processo com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: a) DETERMINAR a reintegração definitiva do autor na posse do imóvel objeto da matrícula 4.232 (ID: 36431745), do CRI de Ribeirão Cascalheira, denominado “Fazenda Sevilha II”, com área total de 10.192,87 ha. b) CONDENAR os requeridos ALCIDES GOMES MOREIRA, IVANEIS PEREIRA DE SOUZA e OUTROS a se absterem de praticar quaisquer atos de turbação ou esbulho na área objeto da lide, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), em caso de descumprimento. c) CONDENAR os requeridos ALCIDES GOMES MOREIRA e IVANEIS PEREIRA DE SOUZA ao pagamento de indenização pelas perdas e danos causados, a ser apurada em liquidação de sentença, podendo exigir dos demais envolvidos, em ação própria, o ressarcimento proporcional ao valor que desembolsaram para a quitação da obrigação. CONDENO os requeridos ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor dado à causa atualizado (CPC, art. 85, § 2º). [...] [grifos nossos e do original] Em suas razões recursais (ID. 291642476), a apelante sustenta as seguintes teses preliminares, postulando pela nulidade da sentença: Da incompetência absoluta do Juízo de Direito da Comarca de Ribeirão Cascalheira Da inobservância da tutela conferida pelo ordenamento jurídico aos litígios envolvendo ocupações coletivas Não foram suscitadas teses de mérito. A apelada, por sua vez, apresenta contrarrazões (ID. 291642477) nas quais rebate as alegações da apelante. O Ministério Público, por sua vez, emitiu Parecer (ID. 297115353) no qual rebate as alegações da apelante e opina pelo desprovimento do recurso. Recurso tempestivo, conforme aba de expedientes dos autos de origem (sentença-36416196), e preparo isento, nos termos da certidão de ID. 292818876, uma vez que a Defensoria Pública é dispensada do pagamento de preparo recursal. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO APELADA: AGRO PECUÁRIA NOIRUMBA S/A VOTO PRELIMINAR EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Inicialmente, verifico a presença dos requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal. Reitero que se trata de recurso de Apelação Cível, interposto pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO em legitimação ex legis, contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única de Ribeirão Cascalheira-MT que, nos autos da Ação de Reintegração de Posse com Pedido Liminar movida por AGRO PECUÁRIA NOIRUMBA S/A em desfavor de ALCIDES GOMES MOREIRA, IVANEIS PEREIRA DE SOUZA e OUTROS, julgou procedentes os pedidos da inicial para ratificar a liminar e determinar a reintegração definitiva da autora na posse do imóvel; que os requeridos se abstenham de praticar quaisquer atos de turbação ou esbulho na área objeto da lide, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 limitada a R$ 50.000,00, além de condenar parte dos réus ao pagamento de indenização por perdas e danos, a ser apurada em liquidação de sentença, e ao pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa. Em síntese, o Juízo a quo asseverou e concluiu que restaram comprovados todos os requisitos legais para a procedência da ação possessória, nos termos do art. 561 do CPC, tendo a parte autora demonstrado a posse legítima sobre o imóvel (Fazenda Sevilha II), o esbulho praticado pelos requeridos, a data do esbulho e a consequente perda da posse. Destacou-se, ainda, que a posse foi corroborada por vasta documentação e por mandado de constatação judicial, o qual confirmou a invasão irregular e a divisão do imóvel em talhões por terceiros. Diante da inércia dos requeridos regularmente citados, foi decretada a revelia e aplicado o julgamento antecipado da lide, resultando na ratificação da liminar concedida e no deferimento da reintegração definitiva da autora na posse do imóvel, além da condenação dos requeridos ao pagamento de indenização por perdas e danos, custas processuais e honorários advocatícios. A seguir, passo ao exame das teses preliminares suscitadas pela apelante. 1. Da incompetência absoluta do Juízo de Direito da Comarca de Ribeirão Cascalheira A apelante sustenta que, com fulcro no art. 126 da CF/88, cumulado com o Provimento nº 004/2008/CM; Resolução nº 007/2008/OE; Resolução nº 006/2014/TP e Resolução TJMT/OE/2/2019, a ação deveria ter sido processada e julgada pela Vara Especializada em Direito Agrário de Cuiabá, competente para conflitos fundiários coletivos no Estado de Mato Grosso, independentemente do local do litígio. Assevera que se trata de ocupação coletiva em área rural extensa (10.192,87 ha), com pluralidade de ocupantes identificados em diligência (não incluídos na lide e sem identificação precisa); ocupação organizada e com possível envolvimento de terceiros com "grande poder aquisitivo". Desse modo, postula pela declaração de nulidade de todos os atos decisórios proferidos pelo Juízo incompetente e remessa dos autos à Vara Agrária de Cuiabá, nos termos do art. 64, § 3º, do Código de Processo Civil. A apelada, por sua vez, argumenta que a matéria da incompetência foi arguida em exceção (ID. 42048205, autos de origem) e decidida no ID. 42912152, sem interposição de recurso, o que acarreta preclusão da matéria (arts. 505 e 507 do CPC). Ademais, aduz que não se trata de conflito fundiário coletivo, mas de invasão pontual e desorganizada, sem envolvimento de movimentos sociais organizados (ex.: MST). Assevera, ainda, que os invasores não reivindicaram posse, nem ingressaram com qualquer ação possessória. Destaca que o grupo era desorganizado, sem liderança clara ou vínculo institucional e que não há relevância social ou tensão coletiva envolvida. Outrossim, ressalta que, após o cumprimento da liminar em 2020, nenhum invasor retornou ao local. Desse modo, argumenta que prevalece, ao casto, a regra do art. 47, §2º, do CPC, no sentido de que a ação possessória deve ser proposta no foro da situação da coisa, sendo a competência absoluta da Vara de Ribeirão Cascalheira. O Ministério Público Estadual, por sua vez, asseverou que não há elementos suficientes para caracterizar conflito fundiário coletivo, pois o caso trata-se de: conflito entre particulares; invasão pontual e não organizada; ausência de grupo vulnerável organizado; e ausência de tensão social relevante. Nesse sentido, assevera que a jurisprudência deste egrégio Tribunal de Justiça tem entendido que a competência da Vara Agrária somente se aplica às lides que: envolvam coletivos organizados; tenham impacto social relevante; e envolvam reforma agrária. Desse modo, o Ministério Público Estadual ressalta que a competência da Vara Única de Ribeirão Cascalheira está corretamente firmada. Pois bem. A Resolução TJMT/OE/2/2019 estabelece que compete à Vara Especializada de Direito Agrário da Comarca de Cuiabá processar e julgar ações referentes a conflitos fundiários, em todo o Estado de Mato Grosso, independentemente da localização do litígio e do imóvel. A Resolução atende ao disposto na norma de eficácia limitada prevista no art. 126 da CF/88, nestes termos: Art. 126. Para dirimir conflitos fundiários, o Tribunal de Justiça proporá a criação de varas especializadas, com competência exclusiva para questões agrárias. Parágrafo único. Sempre que necessário à eficiente prestação jurisdicional, o juiz far-se-á presente no local do litígio. [grifo nosso] Os conflitos coletivos envolvendo posse, por sua vez, contam com previsões específicas nos arts. 554, § 1º e 565, caput, do Código de Processo Civil, in verbis: Art. 554. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados. § 1º No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas, serão feitas a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e a citação por edital dos demais, determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública. [...] Art. 565. No litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a turbação afirmado na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de concessão da medida liminar, deverá designar audiência de mediação, a realizar-se em até 30 (trinta) dias, que observará o disposto nos §§ 2º e 4º. [...] § 2º O Ministério Público será intimado para comparecer à audiência, e a Defensoria Pública será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça. [...] [grifo nosso] Ocorre que a natureza jurídica dos conflitos fundiários não se define exclusivamente pela presença de litisconsórcio passivo, ou seja, pela mera pluralidade de ocupantes no polo demandado. Trata-se de conceito que demanda análise substancial do caso concreto, especialmente quanto à existência de contexto social conflitivo, estrutura coletiva de ocupação e vulnerabilidade econômica do grupo envolvido. Assim, a distinção entre ações possessórias de cunho individual e aquelas de natureza coletiva não se resume à quantidade de sujeitos processuais envolvidos, mas reflete uma alteração qualitativa na essência do conflito. Nessa perspectiva, mais do que uma controvérsia circunscrita aos direitos de posse ou propriedade, as ações possessórias coletivas exigem o exame aprofundado de sua matriz social e das vulnerabilidades que as permeiam. Nos conflitos fundiários agrários, é comum que se manifeste o interesse jurídico de núcleos familiares em situação de vulnerabilidade econômica, organizados em grupos, movimentos sociais ou associações civis, cuja relação com a terra se estabelece como meio essencial de subsistência. Nessas circunstâncias, a posse e a propriedade passam a ser compreendidas sob a ótica de sua função social, sob a exegese do art. 170, III, da CF/88. Tal exegese está em consonância com o princípio da unidade da Constituição, que impõe a interpretação sistemática e coerente entre os diversos dispositivos constitucionais, no caso, o supracitado art. 126 em harmonia com o art. 170, III, do texto constitucional. Todavia, conforme asseverado pela apelada e pelo Ministério Público, constata-se que o caso em exame se trata de litisconsórcio passivo a envolver direitos individuais heterogêneos sem indícios de conflito fundiário. A própria certidão do Sr. Oficial de Justiça (ID. 36721123), lavrada durante o cumprimento do mandado de constatação, registra que os ocupantes encontrados no local não pertencem a movimentos sociais organizados, como o MST, tampouco apresentaram qualquer pauta coletiva relacionada à reforma agrária, revelando-se grupo desordenado, sem liderança identificável, que se dispersou espontaneamente antes mesmo do cumprimento da ordem liminar de reintegração. Ainda, os únicos invasores identificados, por serem proprietários de veículos (ID. 36431787, autos de origem) encontrados no local — Alcides Gomes Moreira e Ivaneis Pereira de Souza — foram citados pessoalmente (IDs 41963212 e 56884903), não apresentaram defesa técnica, e, no caso de Alcides, houve confissão expressa de que sua entrada na área se deu sob o falso boato de ausência de documentação fundiária, tendo deixado o local logo após solicitação do arrendatário da autora, conforme ficha de atendimento juntada aos autos pela própria Defensoria Pública (ID. Os demais ocupantes foram citados por edital (IDs. 60962882 e 63703364), e não houve contestação ou qualquer manifestação reivindicatória de posse, o que reforça a ausência de coletivo vulnerável articulado e desautoriza o reconhecimento de litígio fundiário coletivo. De igual modo, o Ministério Público Estadual, em seu parecer (ID. 297115353), manifestou-se no sentido de que não há nos autos qualquer indicativo de tensão social relevante ou de estrutura organizacional que caracterize conflito agrário coletivo, tratando-se de litígio entre particulares por ocupação pontual e desorganizada, sem respaldo institucional. Ademais, assevera-se que não há qualquer comprovação de grande número de pessoas em situação de hipossuficiência econômica, tal como exige a previsão do art. 554, § 1º, do Código de Processo Civil. Nessa linha, ressalta-se que a jurisprudência consolidada deste egrégio Tribunal de Justiça tem firmado entendimento de que a competência da Vara Especializada em Direito Agrário restringe-se aos conflitos fundiários que envolvam coletivos organizados, hipossuficientes, com relevante repercussão social e até mesmo vínculo com políticas públicas de reforma agrária, o que não se verifica nos presentes autos. Veja-se: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. IMÓVEL RURAL. INDEFERIMENTO DE REMESSA À VARA ESPECIALIZADA DE DIREITO AGRÁRIO DE CUIABÁ. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE CONFLITO FUNDIÁRIO COLETIVO COM REPERCUSSÃO SOCIAL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE ORIGEM MANTIDA. CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Agravo de instrumento interposto pela Associação dos Produtores Rurais Unidos de Santa Maria contra decisão que indeferiu pedido de remessa da Ação de Reintegração de Posse nº 0000433-27.2014.8.11.0100 à Vara Especializada de Direito Agrário de Cuiabá/MT ou, alternativamente, o apensamento à ação possessória nº 1000181-31.2019.8.11.0100, em trâmite na referida vara especializada. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se a ampliação subjetiva da lide e a alegação de interesse coletivo são suficientes para justificar o deslocamento da competência para a Vara Especializada de Direito Agrário da Capital, à luz da Resolução TJ-MT/OE/2/2019. III. RAZÕES DE DECIDIR A competência da Vara Especializada de Direito Agrário depende da configuração de litígio fundiário ou agrário coletivo com relevância social, nos termos da Resolução TJ-MT/OE/2/2019 e da jurisprudência consolidada deste Tribunal. A mera ampliação do polo passivo ou a alegação de que mais famílias passaram a ocupar a área não constitui, por si só, prova de conflito coletivo ou de repercussão social apta a atrair a competência da Vara Agrária. Não houve demonstração nos autos de qualquer alteração fática relevante que descaracterize a natureza originária da ação possessória individual ou que revele a existência de litígio de natureza coletiva voltado à reforma agrária. A ausência de elementos que comprovem tensão social, risco à ordem pública ou conflito fundiário coletivo justifica a manutenção da competência no juízo de origem. A remessa ou reunião de feitos à Vara Agrária depende de prova inequívoca da natureza coletiva do conflito, o que não se verifica no caso em exame. IV. DISPOSITIVO E TESE A competência da Vara Especializada de Direito Agrário exige a comprovação de litígio fundiário coletivo com relevância social, sendo insuficiente a mera pluralidade de partes ou o aumento do número de ocupantes da área litigiosa. A manutenção da competência do juízo de origem é medida que se impõe quando ausentes elementos fáticos e jurídicos que demonstrem a transfiguração da lide em conflito coletivo agrário. A remessa de ação possessória à Vara Agrária somente é cabível mediante prova inequívoca da alteração da natureza do conflito, sob pena de supressão de instância e indevida modificação de competência. (ED em AI 1002896-45.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/05/2025, Publicado no DJE 27/05/2025) [grifo nosso] AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO – DECISÃO DO JUÍZO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE SORRISO QUE DECLINOU DA COMPETÊNCIA PARA O JUÍZO DA VARA ESPECIALIZADA DE CONFLITOS AGRÁRIOS DA COMARCA DE CUIABÁ – AUSÊNCIA DE CONFLITO COLETIVO COM RELEVÂNCIA SOCIAL – RESOLUÇÃO TJ-MT/OE/2/2019 – CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Consoante a Resolução nº 007/2008/OE, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso estabeleceu em seus artigos 1º e 2º o funcionamento da Vara Especializada de Direito Agrário e determinou que compete a tal vara processar e julgar demandas que envolvam litígio coletivo pela posse de terras rurais. Para o declínio de competência das ações que versam sobre posse de imóveis rurais há, obrigatoriamente, a necessidade de se comprovar o conflito coletivo fundiário com relevância social, uma vez que a simples disputa de terras não atrai a competência para o Juízo especializado. No caso dos autos, a questão não se enquadra nos requisitos de demanda coletiva que possua relevância social, isto porque das provas apresentadas até o presente momento processual não se constatou alteração fática que retrata a existência de conflito fundiário coletivo propriamente dito, já que não há nenhum indicativo de tensão social ou algo do gênero com vistas à reforma agrária, de modo a ensejar a reconsideração de decisão já acobertada pela coisa julgada. Em consulta aos autos constatou-se a existência de outras ações referente o mesmo imóvel rural, sendo de extrema relevância apontar que nos autos da Ação de Reintegração de Posse nº 1045563-59.2021.8.11.0041 proposta perante a Vara Especializada de Direito Agrário, o Juízo proferiu decisão no sentido de reconhecer a competência da Vara Comum para o julgamento da ação. (AI 1009127-25.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 20/08/2024, Publicado no DJE 20/08/2024) [grifo nosso] RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – DECISÃO QUE MANTEVE A COMPETÊNCIA – MERO CONFLITO POSSESSÓRIO QUE NÃO RECLAMA A COMPETÊNCIA DA VARA ESPECIALIZADA DE DIREITO AGRÁRIO – INEXISTÊNCIA DE CONFLITO SOCIAL RELEVANTE – TESE DE ILEGITIMIDADE DE PARTE QUE SEQUER FOI SUSCITADA NA INSTÂNCIA DE ORIGEM – ANÁLISE QUE INCORRERIA EM INDEVIDA SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA – CUMPRIMENTO DA LIMINAR POSSESSÓRIA – EFETIVAÇÃO DO QUE JÁ HAVIA SIDO DECIDIDO NOS AUTOS EM FAVOR DA PARTE AUTORA – DECISÃO MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO I - Verifica-se que a competência da Vara Especializada de Direito Agrário, para tratar de conflitos possessórios dentro do Estado de Mato Grosso, se dará nos casos em que inequivocadamente versarem sobre conflitos fundiários e agrários que envolvam litígio coletivo, não bastando apenas a existência a formação de litisconsórcio por parte dos pretendentes da área em disputa. II – No que tange aos demais pontos suscitados pelos agravantes, em especial a ilegitimidade da parte autora, verifica-se que tal questão sequer foi provocada na instância de origem, tampouco abordada pelo Juízo singular, o que torna inviável sua análise diretamente nesta instância recursal, sob pena de indevida supressão de instância ou ofensa ao duplo grau de jurisdição. III - Quanto a ordem de cumprimento da reintegração de posse, verifica-se que o teor decisório, neste ponto, apenas deu marcha ao que já havia sido decidido anteriormente quanto ao direito possessório que assiste a parte autora, ora agravada. (AI 1013545-06.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/07/2024, Publicado no DJE 13/07/2024) [grifo nosso] Assim, não há fundamento jurídico nem fático para o deslocamento da competência à Vara Agrária de Cuiabá, devendo prevalecer a regra do art. 47, §2º, do Código de Processo Civil, qual seja: a ação possessória será proposta no foro da situação da coisa, de competência absoluta. Desse modo, a preliminar de incompetência do Juízo de origem deve ser rejeitada. É como voto. 2. Da inobservância da tutela conferida pelo ordenamento jurídico aos litígios envolvendo ocupações coletivas A apelante sustenta que o procedimento da ação desrespeitou garantias previstas para litígios possessórios coletivos nos arts. 554, §§1º a 3º e 565, ambos do Código de Processo Civil, o que compromete a validade dos atos processuais. Isso porque, segundo a recorrente, diligências (ID. 36721123 e ID. 37546463) identificaram pessoas não incluídas como rés, embora presentes no local. Ocupantes não foram citados pessoalmente, apesar de identificados. Houve falta de audiência de mediação e demais fases exigidas pelo art. 565 do CPC. A citação por edital foi feita de forma genérica e sem divulgação eficaz. E não há prova da autoria do esbulho por parte dos dois únicos réus condenados (Alcides e Ivaneis). Assim, postula pelo reconhecimento da nulidade absoluta de todos os atos do processo, com anulação da sentença por violação às regras do procedimento especial aplicável aos conflitos possessórios coletivos. A apelada, por sua vez, sustenta que o procedimento e as citações foram válidas. Ressalta que os únicos dois réus plenamente identificados (Alcides e Ivaneis) foram citados pessoalmente, conforme IDs 36721091 e 56884903. Outrossim, os demais réus, não identificados, foram citados por edital (IDs 60962882 e 63703364), conforme autoriza o art. 554, §1º, CPC, já que: não havia dados suficientes para citação pessoal; o Oficial de Justiça não obteve informações completas dos ocupantes (ID. 36721123); e no cumprimento da liminar (ID. 37546463), os ocupantes fugiram e não quiseram se identificar. O Ministério Público Estadual, por sua vez, também assevera que não há nulidade nas citações e procedimento pois: os réus identificados foram citados pessoalmente (Alcides e Ivaneis); os demais foram citados por edital, após tentativas infrutíferas de localização; a Defensoria Pública atuou como curadora especial. Pois bem. Conforme já asseverado, não há que se falar, ao caso em exame, em exigência de aplicação do procedimento especial que rege os conflitos fundiários, uma vez que não se caracteriza a existência de litígio possessório coletivo com relevância social, tampouco se verifica a presença de grupo hipossuficiente e vulnerável articulado, requisito necessário para incidência das disposições específicas previstas nos arts. 554 e 565 do CPC. Conforme consignado nas certidões de ID. 36721123 e ID. 37546463, autos de origem, os ocupantes da área agiram de forma desordenada, sem qualquer organização institucional, estrutura hierárquica ou liderança identificável, e, inclusive, evadiram-se do local no momento da execução da liminar, recusando-se a prestar informações ou a se identificarem formalmente. Outrossim, as citações realizadas nos autos observam a legalidade processual, nos termos dos arts. 257 e 259 do Código de Processo Civil. Isso porque, os réus plenamente identificados — Alcides Gomes Moreira e Ivaneis Pereira de Souza — foram devidamente citados pessoalmente, conforme IDs 36721091 e 56884903 dos autos de origem. Os demais ocupantes, não identificados, foram citados por edital (IDs 60962882 e 63703364), após tentativas infrutíferas de localização pessoal, como atestado pelo Oficial de Justiça nas diligências mencionadas. Portanto, não se verifica nulidade processual ou violação ao devido processo legal, sendo incabível a alegação de inobservância do procedimento especial para litígios possessórios coletivos no caso em apreço. Por fim, observa-se que a apelação não se volta contra o mérito da sentença, na medida em que não impugna a posse legítima exercida pela autora sobre o imóvel litigioso, tampouco refuta a prática de esbulho possessório atribuída aos réus identificados nos autos, nem controverte os requisitos previstos no art. 561 do Código de Processo Civil, os quais foram expressamente reconhecidos na sentença recorrida. Desse modo, a preliminar deve ser rejeitada. Diante do exposto, conheço do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se a sentença recorrida em todos os seus termos. Por fim, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, majoro a verba honorária sucumbencial, em desfavor dos requeridos, para 12% sobre o valor atualizado da causa. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025
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