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Janaina Miranda Almeida Santos x Latam Airlines Group S.A.

ID: 257066080

Tribunal: TJMT Órgão: 1º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1015658-90.2025.8.11.0001

Data de Disponibilização: 15/04/2025

Polo Ativo:

JANAINA MIRANDA ALMEIDA SANTOS

Polo Passivo:

LATAM AIRLINES GROUP S.A.

Sentença

Advogados:

FABIO RIVELLI

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ARACELLY COUTO MACEDO MATTOS

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ELISVALDO MENDES RAMOS

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Vistos etc. Processo na etapa de instrução e sentença. Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS proposta po… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Vistos etc. Processo na etapa de instrução e sentença. Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS proposta por JANAINA MIRANDA ALMEIDA SANTOS contra LATAM AIRLINES GROUP S.A, alegando, em síntese, que, inicialmente, adquiriu passagens aéreas junto à parte ré, saindo de Cuiabá/MT com destino a Florianópolis/SC, e que, posteriormente, o voo sofreu alteração. Nesse sentido, expõe que o voo estava, a princípio, previsto para chegar ao destino às 09h45min do dia 24/02/2025, entretanto, chegou somente às 16h10min do mesmo dia, ou seja, um atraso de aproximadamente 6 horas. Em razão disso, a parte autora pleiteia o recebimento de indenização por danos morais, em decorrência dos transtornos ocasionados. Realizada a audiência para tentativa de conciliação, esta restou frustrada (ID 190193102). A parte promovida apresentou contestação, na qual sustentou que o cancelamento do voo ocorreu devido à manutenção não programada da aeronave. Alegou, ainda, a inexistência de dever de indenizar, requerendo, por fim, a improcedência da pretensão inicial (ID. 190051219). Réplica apresentada ao ID 190134149. É o relatório. DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA Importante destacar, de início, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que o Código de Defesa do Consumidor prevalece sobre o Código Brasileiro de Aeronáutica nos casos de responsabilidade civil decorrente de má prestação dos serviços pela Companhia Aérea, e também o disposto nos artigos 734 a 742 do Código Civil. A corroborar: RECURSOS INOMINADOS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RELAÇÃO DE CONSUMO. TRANSPORTE AÉREO. VOO NACIONAL. APLICAÇÃO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DANOS MATERIAIS PARCIALMENTE COMPROVADOS. TEORIA DE REDUÇÃO DO MÓDULA DA PROVA. ADEQUAÇÃO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MAJORAÇÃO. ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL. RELAÇÃO JURÍDICA CONTRATUAL. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. (...) 6. O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor atribui ao fornecedor de serviços à responsabilidade objetiva quanto aos danos causados ao consumidor. 7. Não comporta acolhimento a tese de que as disciplinas ditadas pela Convenção de Varsóvia (Convenção de Montreal) e pelo Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n.º 7.565/86) devem ser aplicadas em detrimento do Código de Defesa do Consumidor. Isso porque, o tratado, ao ser internalizado, adquire em nosso ordenamento jurídico força de lei ordinária, e como tal, não subsiste à Lei n.º 8.078/90, como lei posterior específica destinada a tutelar os interesses do consumidor, expressa como garantia fundamental (art. 5.º, inc. XXXII, CF), inclusive a alegada Convenção. (...) (N.U 1011851-98.2021.8.11.0002, TURMA RECURSAL CÍVEL, LAMISSE RODER FEGURI ALVES CORREA, Turma Recursal Única, Julgado em 03/05/2022, Publicado no DJE 04/05/2022) Desse modo, sugiro a rejeição da aplicação do Código Brasileiro de Aeronáutica, prevalecendo o Código de Defesa do Consumidor. DO MÉRITO Inicialmente, destaco que a matéria é exclusivamente de direito, o que autoriza o julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, I, do Código de Processo Civil. A concessão dos benefícios da Justiça Gratuita ou sua impugnação não tem cabimento nesta fase processual, uma vez que o acesso ao primeiro grau em sede de Juizado Especial independe do recolhimento de custas, taxas ou despesas processuais, conforme dispõe o artigo 54 da Lei nº 9.099/95. A relação de consumo restou caracterizada, nos termos dos artigos 2º e 3º, ambos da Lei nº 8.078/90, sendo devida a inversão do ônus da prova. O atraso do voo é fato incontroverso, posto que demonstrado pela parte autora e confirmado pela parte requerida em contestação. Dessa forma, cabe-nos analisar se do atraso resultou dano moral a ser indenizado. No caso em apreço, se faz mister a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e das Resoluções da ANAC para proteger seu direito e lhe assegurar assistência integral. Neste ponto, imperioso ressaltar que a Resolução da ANAC nº 400/2016, que dispõe sobre os direitos aplicáveis aos passageiros que sofrerem atraso, cancelamentos interrupção ou preterições no momento do embarque, assegura não apenas a prestação de informações, mas também a plena e completa assistência ao passageiro. Confira-se: Art. 26. A assistência material ao passageiro deve ser oferecida nos seguintes casos: I - atraso do voo; II - cancelamento do voo; III - interrupção de serviço; ou IV - preterição de passageiro. Art. 27. A assistência material consiste em satisfazer as necessidades do passageiro e deverá ser oferecida gratuitamente pelo transportador, conforme o tempo de espera, ainda que os passageiros estejam a bordo da aeronave com portas abertas, nos seguintes termos: I - superior a 1 (uma) hora: facilidades de comunicação; II - superior a 2 (duas) horas: alimentação, de acordo com o horário, por meio do fornecimento de refeição ou de voucher individual; e III - superior a 4 (quatro) horas: serviço de hospedagem, em caso de pernoite, e traslado de ida e volta. § 3º O transportador poderá deixar de oferecer assistência material quando o passageiro optar pela reacomodação em voo próprio do transportador a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiro ou pelo reembolso integral da passagem aérea. Nos presentes autos, a parte autora pleiteia indenização em razão de atraso de voo, de aproximadamente 06 horas. Contudo, de acordo com a análise dos autos, verifica-se que houve a comprovação de assistência material, tais como, alimentação. (ID 190051219, pág. 8), a qual não foi impugnada. Destaco que, os documentos unilaterais, quando não especificamente impugnados, podem ser considerados válidos e autênticos, conforme dispõe o art. 411, inciso III, do CPC. Ressalta-se que a impugnação apta a comprometer a validade de tais documentos devem ser feita de maneira específica, trazendo elementos concretos que os fragilizem, inclusive contestando as informações neles contidas. Assim, não verifico omissão da demandada em relação à assistência material, ainda mais, quando não restou demonstrada nenhuma outra situação agravante. Uma vez cumpridas as exigências da Resolução 400 da ANAC, não vejo que seja o caso de falha na prestação dos serviços da parte requerida, logo, não há que se falar em indenização por danos morais. Nesse sentido, cito escólio de jurisprudência recente da E. Turma Recursal de Mato Grosso sobre o tema em comento: DIREITO DO CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO DE VOO. INTERDIÇÃO DE PISTA. FORTUITO EXTERNO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso inominado interposto contra sentença que julgou improcedente ação indenizatória por cancelamento de voo. A recorrente adquiriu passagem aérea para o trecho Cuiabá-Goiânia, com embarque previsto para 12/08/2024 às 16h30. Ao chegar ao aeroporto, foi informada do cancelamento do voo e de sua reacomodação para o dia seguinte, chegando ao destino com 24 horas de atraso. A companhia aérea alegou que o cancelamento decorreu da interdição temporária da pista do Aeroporto de Viracopos devido a um pouso de emergência de outra aeronave, caracterizando fortuito externo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em determinar se há responsabilidade da companhia aérea pelo cancelamento do voo e se há dano moral indenizável em razão do atraso no transporte. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O cancelamento do voo decorreu da interdição da pista do Aeroporto de Viracopos devido a um pouso de emergência de aeronave de outra empresa, o que caracteriza fortuito externo e afasta a responsabilidade da companhia aérea. 4. A recorrida prestou assistência material à recorrente, reacomodando-a em outro voo conforme previsto na Resolução nº 400 da ANAC, não havendo prova de gastos extras com alimentação ou hospedagem. 5. O dano moral não se configura, pois o atraso, embora inconveniente, constitui mero aborrecimento inerente à vida moderna, sem comprovação de vexame, constrangimento ou lesão à imagem da recorrente. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso não provido. Tese de julgamento: 1. A interdição de pista aeroportuária por evento alheio à companhia aérea caracteriza fortuito externo, afastando sua responsabilidade pelo cancelamento de voos. 2. O atraso no transporte aéreo, por si só, não configura dano moral indenizável, salvo prova de prejuízo extrapatrimonial excepcional. 3. O cumprimento das obrigações de assistência material pela companhia aérea, conforme a Resolução nº 400 da ANAC, afasta o dever de indenizar. (N.U 1057043-52.2024.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALDECI MORAES SIQUEIRA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 31/03/2025, Publicado no DJE 03/04/2025) DIREITO DO CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO DE VOO. ASSISTÊNCIA MATERIAL PRESTADA PELA COMPANHIA AÉREA. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso inominado interposto contra sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais em razão de cancelamento de voo. A reclamante alegou falha na prestação do serviço, atraso de aproximadamente 15 horas em sua localização e ocorrência de danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se houve falha na prestação do serviço pela companhia aérea; e (ii) estabelecer se a reclamante faz jus à indenização por danos morais em razão do cancelamento do voo. III. RAZÕES DE DECIDIR A relação jurídica entre as partes é regida pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), aplicando-se as suas disposições ao caso. A Resolução nº 400 da ANAC prevê que, em caso de cancelamento de voo, a companhia aérea deve prestar assistência material aos passageiros. Nos autos, restou demonstrado que a reclamada cumpriu essas obrigações, fornecendo alimentação, transporte e local para armazenamento de bagagem, bem como eximindo a autora da necessidade de hospedagem. A Lei nº 14.034/2020 estabelece que a indenização por dano extrapatrimonial depende da comprovação do prejuízo e de sua extensão, não sendo presumida a sua ocorrência. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui entendimento no sentido de que, em casos de atraso ou cancelamento de voo, o dano moral não é presumido (in re ipsa), sendo necessária a demonstração de atos que configuram lesão aos direitos da personalidade. No caso concreto, não há comprovação de constrangimento ou transtorno relevante que justifique indenização por dano moral, principalmente porque a companhia aérea prestou a assistência devida. Diante da ausência de comprovação de violação aos direitos da personalidade da reclamante, não há fundamento para a indenização pleiteada. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: O cancelamento de voo, por si só, não configura dano moral, sendo necessária a demonstração de lesão aos direitos da personalidade que extrapolem o mero dissabor. O cumprimento das obrigações de assistência material pela companhia aérea, nos termos da Resolução nº 400 da ANAC, exclui a configuração de falha na prestação do serviço. A indenização por dano moral no transporte aéreo depende da comprovação da violação aos direitos da personalidade do passageiro, nos termos do artigo 5º, inciso X, da CF/1988. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CPC, art. 373, eu; Lei nº 9.099/1995, arts. 46 e 55; Lei nº 14.034/2020, art. 251-A; Resolução nº 400/2016 da ANAC. Jurisprudência relevante: STJ, REsp 1.584.465-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma; STJ, AgInt no AREsp 2.150.150/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Rel. para julgamento Min. Raul Araújo, 4ª Turma, j. 21/05/2024; STJ, AgInt no AREsp 2.374.535/SP, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª Turma, j. 23/10/2023. (N.U 1010385-02.2024.8.11.0055, TURMA RECURSAL CÍVEL, GONCALO ANTUNES DE BARROS NETO, Primeira Turma Recursal, Julgado em 10/03/2025, Publicado no DJE 14/03/2025) Assim, ainda que se reconheça a responsabilidade objetiva do prestador de serviços, em razão da incidência do Código de Defesa do Consumidor, compete à parte promovente demonstrar a verossimilhança de suas alegações. Dessa forma, entendo que os transtornos suportados não ultrapassaram meros incômodos vivenciados pela parte autora. Ademais, situações de mero inadimplemento contratual não são, por si sós, aptas a ensejar reparação por danos morais (STJ - AgInt no REsp: 1974656 MG 2021/0362940-8, Data de Julgamento: 25/04/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/05/2022). Cumpre destacar que a indenização por danos morais deve se restringir a situações que efetivamente causem sofrimento, angústia ou aflição, em flagrante afronta aos direitos da personalidade. Logo, reconhecer o dano moral em face de dissabores cotidianos acabaria por banalizar o instituto. Em suma, não obstante as razões trazidas pela parte promovente, entendo que não restou demonstrado que tenha ela experimentado situação inesperada capaz de lhe causar constrangimento, humilhação, abalo emocional ou preocupação que extrapolasse os limites do tolerável. Nesse sentido, conforme reiterado entendimento jurisprudencial, o mero aborrecimento, o dissabor, a mágoa ou a irritação, desprovidos de consequências relevantes, não caracterizam dano moral indenizável. Portanto, a improcedência do pedido é medida impositiva. DISPOSITIVO Ante o exposto, proponho JULGAR IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Sem custas processuais e sem honorários advocatícios, nos termos dos artigos 54 e 55, ambos da Lei nº 9.099/95. Preclusas as vias recursais, arquive-se. Submeto o presente projeto de decisão à homologação da Magistrada Togada, para que surta os efeitos legais previstos no artigo 40 da Lei 9099/95. Karla Andrade Campos de Lara Pinto Juíza Leiga ______________________________________________________ Vistos. Para que produza os seus devidos efeitos jurídicos, nos termos do artigo 40, da Lei nº 9.099/95 c/c artigo 8º, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº 270/07, homologo o projeto de sentença juntado nos autos. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Cláudia Beatriz Schmidt Juíza de Direito

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Ailton Santos Da Silva x Banco Bradesco Financiamentos S.A.

ID: 308843875

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de São José dos Campos - 7ª Vara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1010385-34.2025.8.26.0577

Data de Disponibilização: 26/06/2025

Polo Ativo:

AILTON SANTOS DA SILVA

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

Intimação

Advogados:

SERGIO SCHULZE

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GIOVANNA VALENTIM COZZA

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Processo 1010385-34.2025.8.26.0577 - Procedimento Comum Cível - Contratos Bancários - Ailton Santos da Silva - Banco Bradesco Financiamentos S.A. - Vistos. Trata-se de ação na qual a parte autora s… Processo 1010385-34.2025.8.26.0577 - Procedimento Comum Cível - Contratos Bancários - Ailton Santos da Silva - Banco Bradesco Financiamentos S.A. - Vistos. Trata-se de ação na qual a parte autora sustentou em face da parte ré, em resumo, a incidência do Código de Defesa do Consumidor para revisão de contrato celebrado, além de cobrança ilegal, abusiva valores e de encargos indevidos. Assim, requereu a procedência da ação (fls. 01/29). A tutela antecipada foi indeferida (fls. 95/96). A parte ré foi citada e apresentou contestação a fls. 105/132. No mérito, rebateu os termos da parte autora, aduzindo a legalidade e legitimidade dos valores e encargos cobrados. Assim, requereu a improcedência. Houve oportunidade para réplica. É o relatório. D E C I D O. Prescinde o feito de dilação probatória comportando seu julgamento antecipado, por se tratar de matéria exclusivamente de direito, estando os fatos devidamente comprovados nos autos. No mérito, o substrato fático contratual representativo do negócio jurídico em análise foi juntado aos autos a fls. 73/80, cujas cláusulas se pretende rever, sendo evidente a relação jurídica continuada a legitimar eventual revisão dos encargos eventualmente cobrados, uma vez que não se pode validar obrigações ilegais ou nulas. Aliás, contratos celebrados entre instituição financeira e pessoa física sujeitam-se às normas da Lei n° 8.078/90, a teor da Súmula 297, do STJ, contudo, é certo também que a parte não foi compelida a contratar. Se assim o fez, independentemente do contrato ser de adesão, concordou, ao que consta, com os termos e condições de referido instrumento, que acarretaram a cobrança do valor principal com os encargos pactuados. O argumento da limitação constitucional da taxa de juros já não se justifica em face da alteração constitucional (EC n° 40/2003). Com efeito, o dispositivo então vigente não era auto-aplicável a teor da Súmula n° 648, do STF e Súmula Vinculante STF nº 07. E, no plano infraconstitucional permanece o entendimento da Súmula 596, do STF, que exclui as instituições financeiras da regra do artigo 1°, do Decreto n° 22.626/33, desde o advento da Lei n° 4.595/64. A Segunda Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.061.530/RS, submetido ao rito previsto no art. 543-C do CPC, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe 10.3.2009, consolidou o seguinte entendimento quanto aos juros remuneratórios: a) as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 combinado com o art. 406 do CC/02; d) é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada ante as peculiaridades do julgamento em concreto. Veja-se ainda a Súmula STJ 382. Nestes termos, juros são definidos conforme o custo do dinheiro tomado e o preço do dinheiro emprestado no mercado, sendo notório em tempos passados de instabilidade e no presente de relativa estabilidade econômica, a flutuação das taxas de juros é condicionada ao sabor das variáveis sazonais e ao humor da economia global (EDUARDO FORTUNA, Mercado Financeiro - Produtos e Serviços, RJ, Ed. Qualitymark, 11ª ed., p. 37-49, n. 4, 1998). Outrossim, os percentuais de juros são condicionados às diretrizes de política monetária, fiscal, cambial e de renda impostas pelo mercado e pelo governo federal visando à promoção do desenvolvimento econômico, garantindo o pleno emprego e sua estabilidade, o equilíbrio do volume financeiro e das transações econômicas com o exterior, a estabilidade de preços e controle da inflação, promovendo dessa forma a distribuição de riqueza e de rendas. Portanto, releva notar, com o respaldo na jurisprudência do STJ, que da análise adequada do caso concreto, não se verifica qualquer situação excepcional, abusividade ou desvantagem exagerada nas taxas de juros pactuadas e aplicadas, as quais sequer podem ser consideradas discrepantes da taxa média de mercado do período, conforme aquelas divulgadas pelo Banco Central. A alegação que identifica a excessividade dos juros porque em percentual superior a média do Banco Central não encontra comprovação efetiva na dimensão de sua análise fática financeira ou de lógica capitalista. Sendo uma média das taxas aplicadas, admissível que haja uma certa faixa de variação para mais ou para menos, o que possibilita a competição entre os bancos, que o consumidor pesquise e escolha a melhor taxa para o negócio, sem que isso configure abusividade. Não se pode pretender impor apenas um percentual fixo, caso contrário isto engessaria o mercado a ponto de exigir que todos os empréstimos tenham a mesma taxa. Anote-se que essa comparação também somente teria validade e deve ser feita corretamente em relação a taxa média para operações equivalentes e não operações distintas que naturalmente terão taxas médias diferentes, segundo apurado pelo Banco Central do Brasil. A jurisprudência do C. STJ tem considerado abusivas taxas superiores à média apenas quando em percentual muito exagerado e distorcido, como por exemplo, uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS), ao dobro (REsp 1.036.818) ou ao triplo (REsp 971.853/RS), tudo conforme expressa citação no REsp 1.061.530/RS, e levando em consideração o sopesamento dos critérios acima, ainda que em condições limítrofes, constata-se no caso concreto a não superação dessa faixa percentual máxima, portanto a conclusão é pela falta de prova efetiva de que a contratação é abusiva ou excessiva. E, tratando-se de contrato bilateral, é de rigor o cumprimento das condições estabelecidas, o que afasta a possibilidade de alteração das cláusulas inicialmente ajustadas, tendo em vista a ausência de motivo que tivesse o condão de autorizar este procedimento, posto que a qualificação da parte, indica que possuía plenas condições de tomar ciência do conteúdo do contrato, das condições de cumprimento e das conseqüências do eventual inadimplemento, o que torna juridicamente inviável a pretensão, em decorrência da absoluta previsibilidade das condições pactuadas. Nem mesmo a suposta divergência de taxa percentual diferente ou de índice diverso do contratado encontra mínimo fundamento. A indiciária alegação tem embasamento em erro de premissa matemática e equivoco de cálculo por não constar ter partido dos valores contratuais, mas sim de números outros genéricos e não bem identificados, tudo a evidenciar a parcialidade dessa conta que resta desacolhida. Em resumo, não é o caso de nulidade, abusividade, imprevisão, lesão enorme, desequilíbrio do contrato ou outras exceções taxativas e limitadas ou muito menos divergência de percentuais e índices, a justificar o acolhimento da pretensão inicial neste aspecto, estando a cobrança dos encargos e das taxas expressamente contratadas. No mesmo sentido, a alegação de capitalização indevida ficou sem um mínimo de indício qualquer, pois houve mera alegação genérica, sem que a parte devedora trouxesse qualquer elemento que pudesse macular os valores apontados pelo credor. Mais ainda, o Colendo Supremo Tribunal Federal, em julgamento definitivo em sede repercussão geral, considerou constitucional o artigo 5º da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), que permite a capitalização de juros em períodos inferiores a um ano às entidades vinculadas ao Sistema Financeiro Nacional (RE nº 592.377/RS, Rel. orig. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ o acórdão Min. Teori Zavascki, julgado em 04.02.2015 - Informativo de Jurisprudência nº 773 do E. STF). Ademais, a jurisprudência do C. STJ, especialmente após o REsp 973827, submetido ao rito previsto no art. 543-C do CPC, fixou entendimento no sentido de que é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.03.2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada. E, ainda que a capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara, sendo a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal disposição suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. Portanto, também, com o respaldo na jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no caso em exame, verifica-se que o negócio jurídico que vincula as partes é posterior a data da referida Medida Provisória, 31.03.2000, e, portanto, uma vez pactuada, possível a capitalização mensal dos juros. Sobre tarifas e encargos. Em um quadro geral, exemplificativamente, com relação às chamadas tarifas bancárias denominadas de: tarifa de abertura de crédito (TAC), tarifa de cadastro e emissão de carnê/boleto (TEC) ou mesmo o IOC/IOF, tarifa de aditamento de contrato, serviços de terceiro, contratação de seguro ou de proteção financeira, tarifa de registro, tarifa de avaliação e tarifa de gravame, entre outras, desde logo, de rigor estabelecer que a cobrança de tarifas pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil deve estar prevista em contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário. Além disso, não podem estar encartadas nas vedações previstas na legislação regente (em especial Resoluções 2.303/1996 e 3.518/2007 do CMN), tampouco podem configurar abusividade em relação à taxa média do mercado ou acarretar desequilíbrio contratual entre as partes ou configurar serviço não prestado. Para tarifa de cadastro esta relaciona-se a realização de pesquisas de dados hábeis a viabilizar a contratação bancária realizadas na praxe do mercado financeiro. No REsp Repetitivo nº 1.251.331/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/08/2013, DJe 24/10/2013, fixou entendimento no sentido de que permanece válida a Tarifa de Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. A eventual realização de pesquisas com custos diferentes por terceiros não configura abusividade ou direito a se igualar preço ou viável substituição por uma mediana mercadológica, se vigente as regras de livre mercado. Portanto, na hipótese presente, o contrato deve ser mantido nesse aspecto. Sobre tarifa de avaliação e tarifa de registro, aplicável o entendimento do C. STJ no REsp Repetitivo nº 1.578.553/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO. Como decidido: "(...) 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto. (...)" (REsp 1578553/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/11/2018, DJe 06/12/2018). Nos termos do precedente aplicável, a despesa de registro de contrato e a tarifa de avaliação, a princípio, não conflitam com a regulação bancária. Prestação de serviços efetiva de registro do contrato ocorre ao tempo da sua anotação e manutenção em sistema de gravames veiculares. Avaliação decorre de se vistoriar o estado geral e estimar o valor do bem dado em garantia. Logo, colocado em outras palavras, plenamente legítima a cobrança, com a ressalva imposta da análise e comprovação de abusividade por serviço não efetivamente prestado e ou onerosidade excessiva no caso concreto, o que, entretanto, verifica-se inocorrente de comprovação pela prova carreada aos autos e pela própria natureza da operação financeira e do sistema de garantias. E, como absolutamente inexistente qualquer prova no sentido da abusividade por não prestação do serviço ou onerosidade excessiva no comparativo do montante da operação, do valor total do contrato, logo não há razão para divergir do precedente e nada há para expurgar. Em resumo, não há razão para divergir do entendimento firmado pelo C. STJ e nada há para expurgar conforme se vê da leitura das cláusulas do instrumento contratual e provas carreadas aos autos. Ao reverso, as tarifas não constantes de cobrança genericamente impugnadas extrapolam os limites da lide e não tem como serem apreciadas. Assim, referido entendimento acima estende-se a todas as demais tarifas, que também são expressamente indicadas no contrato, portanto, sem direito à repetição, seja simples, seja em dobro. Neste panorama, convém realçar não ter havido demonstração da necessidade de eventual perícia técnica, mantendo-se a parte interessada em generalidades, mostrando-se fantasiosa, neste aspecto, a argumentação da petição inicial ao não observar as condições e encargos pactuados, de acordo com as diretrizes acima mencionadas, até porque o pedido inicial lastreia-se em matéria de direito, tal como a alegada ilegalidade de cláusulas contratuais. Por outro lado, mostra-se ilógico que a parte requerente tenha se tornado mais que adimplente ou credora da instituição financeira. Decorrência lógica, prejudicados os demais pedidos. Aliás, em relação ao pleito consignatório, o caso é também de improcedência porque a pretensão da requerente está fundada no pretenso direito a consignação de valores referentes a parcelas contratuais inadimplidas. Nesse sentido, a pretensão da parte não comporta acolhimento nos termos desta ação proposta, pois pretende consignação de parcelas já vencidas, sem cômputo de encargos contratuais moratórios ou prova de que tenha havido recusa de recebimento por parte do credor, circunstâncias que deveriam ter sido provadas. Note-se que o valor das parcelas é fixo, inexistindo surpresas ao consumidor, o que, em princípio resulta na vinculação do aderente às cláusulas restritivas de direito consubstanciadas nos encargos, a teor do quanto já decidido acima. Com efeito, não foi comprovada a mora do credor ou "mora accipiendi" pela recusa injustificada de recebimento do seu crédito decorrente do contrato. Veja-se que a parte não pode pretender consignar valores sem aplicar os encargos contratuais. Exigir ou impor à parte contrária receber valores a menor que o previsto em contrato não pode ser minimamente acolhido. Além disso, requisito para a consignação em pagamento é a inexistência de mora do devedor. Esses são os ensinamentos da insigne jurista Maria Helena Diniz: "Claro está que não poderá consignar com força de pagamento o devedor em mora". (Curso de Direito Civil Brasileiro, 2.º vol., Ed. Saraiva, pág. 246). Assim, como a ação só foi proposta após o vencimento das prestações que se pretende consignar e estas são todos anteriores e vencidas, bem como sem o depósito das sucessivas, não se olvidando da inexistência de comprovação da "mora accipiendi", configura-se a mora do devedor, tornando desde logo sem efeito de pagamento a presente ação. Diante do exposto e o mais que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial formulado. Ante a sucumbência, arcará a parte vencida com as custas e despesas processuais, além de honorários de advogado fixados em 10% do valor atualizado da causa, observado o benefício da Justiça Gratuita. Oportunamente, sem correta manifestação em prosseguimento, ao arquivo com as cautelas legais. P.R.I.. - ADV: SERGIO SCHULZE (OAB 298933/SP), GIOVANNA VALENTIM COZZA (OAB 412625/SP)

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Francisco Adriano De Olveira e outros x Instituto Dr Jose Frota e outros

ID: 343647739

Tribunal: TJCE Órgão: 4º Gabinete da 1ª Câmara de Direito Público Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0775546-78.2000.8.06.0001

Data de Disponibilização: 05/08/2025

Polo Ativo:

FRANCISCO ADRIANO DE OLVEIRA HELENA DE OLIVEIRA PROCURADORIA GERAL DE JUSTICA

Polo Passivo:

INSTITUTO DR JOSE FROTA INSTITUTO DR. JOSE FROTA - IJF MUNICIPIO DE FORTALEZA - PROCURADORIA GERAL DO MUNICIPIO - PGM

Intimação

Advogados:

ALEXANDRE AUGUSTO DE OLIVEIRA LOPES

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

Processo n. 0775546-78.2000.8.06.0001 - APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: FRANCISCO ADRIANO DE OLVEIRA APELADO: MUNICIPIO DE FORTALEZA - PROCURADORIA GERAL DO MUNICIPIO - PGM, INSTITUTO DR. JOSE FROTA - IJF, … Processo n. 0775546-78.2000.8.06.0001 - APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: FRANCISCO ADRIANO DE OLVEIRA APELADO: MUNICIPIO DE FORTALEZA - PROCURADORIA GERAL DO MUNICIPIO - PGM, INSTITUTO DR. JOSE FROTA - IJF, INSTITUTO DR JOSE FROTA REPRESENTANTE: PROCURADORIA DO MUNICÍPIO DE FORTALEZA, INSTITUTO DR. JOSÉ FROTA - IJF EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ERRO MÉDICO. PROVA PERICIAL NÃO REALIZADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. ADMISSIBILIDADE DO RECURSO. LAPSO TEMPORAL NÃO AFASTA O DIREITO À PROVA. NULIDADE DA SENTENÇA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. RECURSO PROVIDO. 1. Apelação Cível interposta por particular contra sentença que julgou improcedente pedido de indenização por danos decorrentes de suposto erro médico praticado por profissionais vinculados ao Instituto Dr. José Frota - IJF, hospital público mantido pelo Município de Fortaleza/CE. O juízo de origem entendeu pela inexistência de nexo causal entre o atendimento hospitalar e a perda da visão do autor, julgando a ação improcedente com fundamento na ausência de provas robustas do alegado erro médico. 2. Há três questões em discussão: (i) reconhecer a admissibilidade da apelação à luz dos princípios da efetividade da tutela jurisdicional e da instrumentalidade das formas; (ii) definir se houve cerceamento de defesa decorrente da ausência de realização de prova pericial, reiteradamente requerida; (iii) estabelecer se o decurso temporal entre os fatos e o momento atual pode ser invocado para justificar a não realização da perícia técnica. 3. A apelação preenche os pressupostos de admissibilidade, apresentando impugnação específica aos fundamentos da sentença e pedido claro de reforma, não havendo violação ao princípio da dialeticidade. A desconexão entre a parte argumentativa e os pedidos finais não compromete a compreensão do recurso, devendo prevalecer a interpretação sistemática da peça recursal. 4. A prova pericial médica é indispensável nos casos de responsabilidade civil por erro médico, especialmente quando há controvérsia sobre a origem do dano e complexidade técnica envolvida, sendo insuficiente a prova exclusivamente documental. 5. A ausência de realização da perícia, embora deferida e solicitada por ambas as partes e pelo Ministério Público, configura cerceamento de defesa e ofende os princípios do contraditório e da ampla defesa, previstos no art. 5º, LV, da CF/1988. 6. O juízo de origem incorre em error in procedendo ao presumir que o autor teria abdicado da produção da prova pericial, quando o que se extrai dos autos é justamente a reiterada insistência na sua realização. 7. O decurso temporal entre os fatos e a instrução processual não pode ser utilizado, aprioristicamente, pelo Judiciário como justificativa para a não produção da perícia. A avaliação sobre a viabilidade e utilidade da prova cabe ao perito, e não ao magistrado, sendo vedado ao juízo presumir sua ineficácia com base apenas na passagem do tempo. 8. O julgamento do mérito com base em prova incompleta afronta o art. 370 do CPC, que impõe ao juiz o dever de determinar as provas necessárias ao julgamento justo da causa. 9. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, LIV e LV; 37, § 6º; CPC, arts. 370 e 373. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, AC nº 1010385-23.2022.8.11.0006, Rel. Des. Maria Aparecida F. Fago, j. 23.07.2024; TJ-SP, AC nº 1003325-58.2019.8.26.0629, Rel. Des. Bandeira Lins, j. 06.05.2024; TJ-RS, AC nº 5000394-30.2019.8.21.0119, Rel. Des. Marcelo Cezar Muller, j. 25.03.2024; TJ-CE, AC nº 0182141-83.2016.8.06.0001, Rel. Des. Lira Ramos de Oliveira, j. 19.10.2022. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, ACORDAM os Desembargadores membros da 1ª Câmara de Direito Público do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer e dar provimento ao apelo, anulando a sentença, nos termos do voto da eminente Relatora, parte integrante deste. Fortaleza/CE, 14 de julho de 2025. Desa. Lisete de Sousa Gadelha Relatora e Presidente do órgão julgador RELATÓRIO Cuida-se de Apelação Cível interposta por Francisco Adriano de Oliveira, adversando Sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza/CE, que nos autos da Ação de Indenização sob o nº 0775546-78.2000.8.06.0001, ajuizada em desfavor do Município de Fortaleza e do Instituto Dr José Frota - IJF, julgou improcedente o pedido exordial, nestes termos: "Na hipótese em julgamento, o autor faz grave acusação aos médicos do hospital que o atenderam. Ocorre que não há nenhum indício de que os profissionais se portaram da forma odiosa sugerida na inicial. A acusação é por deveras grave e para que pudesse gerar algum efeito jurídico seria necessária o mínimo de provas a seu respeito. Não foi o que ocorreu nos autos. Ao contrário! O registro do acidente indica que, desde sempre, o promovente contava com lesões na parte frontal da face com comprometimento ocular, levando a concluir que o dano não foi fruto da ação dos profissionais de saúde e, sim, decorre do próprio acidente. Em suma, ausente qualquer demonstração de nexo de causalidade entre ação estatal e dano. Diante do exposto e tudo mais que dos autos consta, julgo IMPROCEDENTE o pedido autoral, com fundamento no art. 487, inciso I, do CPC/2015, em virtude da ausência de comprovação do suposto erro médico, bem como do nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo autor e a instituição médica. Sem condenação em custas processuais por isenção legal, uma vez que a parte autora é beneficiária da gratuidade judicial. Condeno a autora a pagar honorários advocatícios equivalente a 10% (dez por cento) do valor da causa (art. 85, §2º, CPC), contudo, com exigibilidade suspensa em virtude da justiça gratuita (art. 98, § 3º, CPC)". Nas razões do apelo (Id 14408743), sustenta a parte apelante, em síntese, que não há elementos probatórios aptos a demonstrar que a perda da visão ou do globo ocular tenha resultado diretamente do acidente, afirmando que a cegueira teria sido ocasionada pela remoção de suas córneas, realizada nas dependências do Instituto Dr. José Frota (IJF). Alega também, que jamais houve a nomeação de perito para a realização do exame necessário, bem como que o magistrado de origem não promoveu a produção das provas que entendia indispensáveis à comprovação dos alegados danos morais e materiais sofridos pelo recorrente. Ao final, requer o provimento do apelo e a reforma da decisão de origem. Em Contrarrazões o Município de Fortaleza (Id 14408750), aduz que a sentença recorrida deve ser integralmente mantida, porquanto enfrentou de forma precisa e fundamentada a controvérsia posta nos autos, não havendo nenhum reparo ou censura a ser imputado ao decisum. Por fim, requer a exclusão da condenação em honorários advocatícios e o não provimento do apelo. Os autos vieram à consideração deste Egrégio Tribunal de Justiça e foram distribuídos a minha relatoria por prevenção, Id 14641442. Contrarrazões do Instituto IJF (Id 14728408), em que requer o não provimento da apelação. Vista à douta PGJ, em que a Exma. Procuradora de Justiça, Dra. Águeda Maria Nogueira de Brito, opina em seu Parecer (Id 17420205), pelo não conhecimento da apelação, dada a ausência de dialeticidade, e pela anulação, de ofício, da sentença proferida, com o retorno dos autos ao juízo a quo, a fim de dar prosseguimento à instrução probatória, com a realização de prova pericial, de modo a elucidar as questões, com vistas a apurar o efetivo nexo de causalidade entre o dano existente e o agir dos demandados. Voltaram-me conclusos. É o relatório. VOTO Inicialmente, cumpre proceder à análise dos pressupostos de admissibilidade do recurso de apelação. No caso concreto, embora se verifique certa desconexão entre os pedidos formulados ao final da petição e a tese desenvolvida ao longo do arrazoado, constata-se que as razões recursais apresentam fundamentação juridicamente idônea e formalmente estruturada, por meio da qual o apelante impugna de maneira específica os fundamentos da sentença recorrida e postula, de forma clara e objetiva, a sua reforma, (Id 14408743 - p. 14). Dessarte, não se vislumbra violação ao princípio da dialeticidade, na medida em que, embora os pedidos finais estejam redigidos de forma dissociada da tese desenvolvida ao longo das razões recursais, é possível extrair, do inteiro teor da peça, impugnação clara e direta aos fundamentos da sentença recorrida, com postulação expressa de sua reforma. Nesse contexto, impõe-se a interpretação sistemática e finalística da peça recursal, em consonância com os princípios que regem o processo civil contemporâneo, notadamente os da efetividade da tutela jurisdicional, da instrumentalidade das formas e da primazia da decisão de mérito. Tais princípios orientam a atividade jurisdicional no sentido de se evitar o formalismo excessivo, privilegiando-se o exame substancial das alegações deduzidas em juízo, desde que presentes os elementos mínimos à compreensão da controvérsia e à adequada prestação jurisdicional. Dessa forma, uma vez constatado o regular preenchimento dos pressupostos de admissibilidade recursal, tanto de natureza extrínseca quanto intrínseca, e inexistindo óbices formais ou materiais ao seu conhecimento, forma-se juízo positivo de admissibilidade, razão pela qual conheço da Apelação Cível interposta. Passo ao exame de mérito. O cerne da questão cinge-se em averiguar a higidez da sentença promanada pelo douto Juízo a quo, que, ao proferir decisão, julgou improcedente o pedido autoral formulado na ação de indenização por suposto erro médico ajuizada em face do Município de Fortaleza e do Instituto Dr. José Frota - IJF, ao fundamento de inexistência de comprovação do alegado erro na conduta dos profissionais de saúde, bem como da ausência de nexo de causalidade entre o dano narrado (perda da visão) e a atuação estatal. Cumpre, ainda, proceder à análise da alegação formulada pelo apelante quanto à ausência de produção de prova pericial, por ele considerada imprescindível à adequada elucidação da controvérsia e à formação do convencimento judicial. Compulsando os autos, verifica-se que o juízo de origem consigna em sentença (Id 14408736) que a parte autora não demonstrou que a perda de sua visão ocorreu devido a um erro médico, razão pela qual inviabiliza a conclusão quanto eventual ingerência dos requeridos no atendimento realizado, razão pela qual, diante da ausência de provas, julgou improcedente o pleito autoral. Veja-se: "[...] Diante da análise do prontuário médico do autor (IDs. 66622680/segs.) a fim de se analisar se assiste ou não razão as alegações do autor, depreendo que o autor deu entrada no referido hospital devido a uma colisão entre sua motocicleta e um automóvel, diagnosticado com TCE (contusões hemorrágicas frontal e occipital, mais fratura dos ossos da face, lesões de córnea em ambos os olhos), o que ocasionou uma lesão perfurante atingindo a córnea e esclera (ID.66622688). Insta salientar que, de acordo com a regra básica do ônus probandi, a parte autora deve demonstrar o fato constitutivo de seu direito; e a promovida, por outro lado, fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito da autora, nos termos do art. 373, da legislação processual civil, a seguir: Art. 373. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor." Ocorre que, a parte autora não demonstrou que a perda de sua visão ocorreu devido a um erro médico (retirada das córneas sem autorização previa), visto que as evidências apresentadas nos autos levam a crer que a perda visual resultou de seu grave acidente. Desta feita, entendo que a autora não trouxe provas robustas capazes de demonstrar de forma clara e satisfatória que a perda de sua visão foi decorrente de erro médico, e não de seu grave acidente. [...]" Pois bem. Inicialmente, não se desconhece que a Constituição Federal, em seu artigo 37, § 6º, estabeleceu que a responsabilidade do ente público tem natureza objetiva, baseada na teoria do risco administrativo, exigindo, para o seu reconhecimento, os seguintes requisitos: a) ocorrência do dano; b) ação ou omissão administrativa; c) existência de nexo causal entre o dano e a ação administrativa e d) ausência de causa excludente de responsabilidade. "Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…) § 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa". (sem marcações no original) Sobre o tema, é sobremodo importante destacar o escólio de Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo[1]: Pela teoria do risco administrativo, a atuação estatal que causa dano ao particular faz nascer para a administração pública a obrigação de indenizar, independentemente da existência de falta do serviço ou de culpa de determinado agente público. Basta que exista o dano decorrente de atuação administrativa, sem que para ele tenha concorrido o particular. Em resumo, presentes o fato do serviço e o nexo direto de causalidade entre o fato e o dano ocorrido, nasce para o poder público a obrigação de indenizar. (sem marcações no original) Assim, extrai-se do entendimento doutrinário que pela teoria do risco administrativo o particular ofendido se exime de comprovar a culpa do Estado ou do agente público. A administração é que, na sua defesa poderá, se for o caso, visando a afastar ou a atenuar a sua responsabilidade, demonstrar a culpa total ou parcial do lesado no evento danoso, além da ocorrência de alguma das chamadas excludentes, caso em que o Estado se eximirá integral ou parcialmente do dever de indenizar. Ademais, importa ressaltar que se têm decidido que a responsabilidade por falta ou falha do serviço por culpa (ou dolo) caracterizará sempre responsabilidade por comportamento ilícito (arts. 186 e 927, ambos do CC/02) quando o Estado, devendo atuar segundo certos critérios ou padrões, não o faz, ou atua de modo insuficiente. Esclarecidas as diretrizes para a configuração do dever de indenizar, resta aferir se, no caso em análise, é devida a condenação do Instituto e do Município por danos morais, os quais o requerente alega ter suportado. Ao examinar cuidadosamente os autos, constata-se de forma inequívoca a existência do dano, tendo em vista que o apelante é portador de cegueira em ambos os olhos, o que o torna totalmente dependente de terceiros para o desempenho das atividades essenciais da vida cotidiana (Id 14408310 - p. 61). Reconhecida a ocorrência do dano, impõe-se averiguar se sua origem decorre de conduta comissiva ou omissiva imputável ao Poder Público ou a seus prepostos. Segundo a narrativa apresentada, a parte autora, ora apelante, sustenta que a perda da visão teria sido ocasionada pela retirada de suas córneas, supostamente realizada durante o período de internação no Instituto Dr. José Frota (20/10/2003 à 30/12/2003 - Id 14408307 - p. 58), sem o devido consentimento. Contudo, o Instituto Dr. José Frota, em suas manifestações nos autos (Id 14408489), afirmou que a perda da visão do autor estaria relacionada às lesões sofridas no acidente de trânsito que motivou sua internação, e não a qualquer intervenção médica voltada à retirada das córneas. Segundo a argumentação da instituição, os registros médicos evidenciariam que o comprometimento ocular do paciente seria anterior ao atendimento hospitalar, afastando a hipótese de atuação médica indevida, Id 14408528. Todavia, tal versão dos fatos exige a devida comprovação por meio de prova técnica adequada, principalmente diante da divergência existente quanto à causa efetiva da cegueira do autor. Nesse cenário, a ausência de perícia médica produzida por especialista imparcial compromete a elucidação dos elementos essenciais à formação do convencimento judicial. Sem essa prova pericial, resta inviabilizada uma análise segura e aprofundada da relação entre os danos alegados e a conduta dos profissionais do hospital, o que fragiliza a sustentação da tese apresentada pela defesa. A relevância da prova pericial revela-se ao longo da marcha processual, tendo em vista que sua realização foi reiteradamente suscitada pelas partes em diversas fases da instrução. Tal requerimento, inclusive, foi acolhido pelo juízo, mediante decisão que autorizou a produção da prova técnica, reconhecendo sua utilidade para o deslinde da controvérsia, sobretudo em razão da complexidade dos fatos narrados e da necessidade de esclarecimentos de natureza especializada. Diante disso, com o intuito de contextualizar sua importância e os motivos que culminaram em sua não realização, passo à síntese dos principais atos processuais relacionados à prova pericial. Id 14408296 - p. 47 - Petição inicial instruída com requerimento de produção de prova pericial. (ano 2004) Id 14408332 - p. 83 - O Juízo de origem fundamentou sua decisão destacando que a matéria envolve questões que demandam análise técnica e probatória, quiçá pericial, motivo pelo qual entendeu incabível o deferimento da antecipação de tutela. (ano 2004) Id 14408352 - p. 103 - No agravo de instrumento, cujo teor foi juntado aos autos, a parte retoma a questão relativa a prova pericial. (ano 2004) Id 14408382 - p. 133 - O Instituto Dr. José Frota, em contestação, requereu a produção ampla de provas, incluindo depoimento pessoal do autor, oitiva de testemunhas, prova pericial médica, juntada de documentos e inspeção médica. (ano 2004) Id 14408422 - p. 173 - Na réplica, a parte reforçou o pedido de realização da prova pericial. (ano 2004) Id 14408427 - p. 178 - O juízo determinou que as partes se manifestassem sobre a necessidade e adequação das provas a serem produzidas, para que fosse possível definir quais meios probatórios seriam essenciais para o julgamento do feito. (ano 2005) Id 14408429 - O Instituto Dr. José Frota manifestou-se nos autos requerendo a realização de prova pericial. (ano 2005) Id 14408430 - O Município manifestou-se nos autos requerendo a produção de prova testemunhal. (ano 2005) Id's 14408431/14408433 - O Juízo de origem determinou a expedição de ofício ao Conselho Regional de Medicina para indicação de dois peritos especialistas em Neurologia e Oftalmologia, sem vínculo com o Município de Fortaleza ou com o Instituto Dr. José Frota. (anos 2005/2006) Id 14408437 - Resposta do Conselho Regional de Medicina informando que não compete à autarquia a indicação direta de profissionais para atuar como peritos. (ano 2006) Id 14408442 - O juízo determinou o envio de ofício ao Secretário de Saúde do Município de Fortaleza, solicitando a indicação de dois médicos especialistas em Neurologia e Oftalmologia, sem vínculo com o Instituto Dr. José Frota, para atuarem como peritos no processo. (ano 2006) Id 14408446 - O Município indicou dois médicos oftalmologistas para atuarem como peritos no feito e informou que não possuía indicação para a especialidade de Neurologia. (ano 2006) Id 14408447 - O juízo determinou o envio de ofício ao Secretário de Saúde do Estado do Ceará, solicitando a indicação de três médicos especialistas em Neurologia para atuarem como peritos no presente processo. (ano 2007) Id 14408453 - O Estado do Ceará respondeu por meio de ofício informando que não dispõe de médicos peritos com especialidade em Neurologia para atuarem no presente feito. (ano 2007) Id 14408479 - O juiz determinou a intimação das partes, para informarem: "[...] b) a especificação das perícias a serem produzidas e outros meios de provas (com a necessária fundamentação da prova requerida, em nexo válido com os pontos indicados como controvertidos)." (ano 2009) Id 14408482 - p. 235 - A parte autora esclareceu que o custo da perícia deve ser arcado pelos demandados e destacou que tanto a prova pericial quanto a testemunhal são essenciais para a formação do convencimento do juízo. (ano 2010) Id 14408489 - O IJF sugeriu que as perícias médicas fossem realizadas nas especialidades de Oftalmologia, Neurologia e Traumatológicas. (ano 2010) Id 14408493 - O Ministério Público apresentou quesitos a serem respondidos pelos peritos nomeados, contribuindo para a delimitação técnica da prova pericial. (ano 2010) Id's 14408496 a 14408532 - realização de audiência e produção de prova testemunhal. (ano 2011) Id 14408725 - O Ministério Público se manifestou destacando que anteriormente: "o órgão ministerial havia se pronunciado pela necessidade da realização de perícia por profissional experto nomeado pelo juízo de forma imparcial, com a finalidade de responder e esclarecer as perguntas elencadas, para que assim seja feito o real diagnóstico da situação que resultou na perda da visão do promovente." (ano 2021) Id 14408728 - O Juízo proferiu despacho para que a parte autora se manifestasse se possuía o interesse na realização de prova pericial. (ano 2021) Id 14408732 - O autor manifestou-se requerendo a realização da prova pericial, exclusivamente para responder aos quesitos apresentados pelo Ministério Público em seu parecer. Por fim, o autor requereu que, uma vez respondidos os quesitos formulados pelo Ministério Público, a lide fosse sentenciada. (ano 2021) Id 14408733 - O juiz, diante da petição da parte autora, entendeu que o autor teria informado seu desinteresse na produção da prova pericial, com isso, determinou a abertura de vistas dos autos ao Promotor de Justiça responsável por esta Vara. (ano 2023) Id 14408735 - Em que o representante do Ministério Público se manifesta pela improcedência dos pedidos contidos na inicial, com base nos documentos então existentes nos autos. (ano 2023) Diante do exposto no resumo dos atos processuais relativos à prova pericial, resta evidente a importância dessa diligência para o esclarecimento dos fatos controvertidos. A ausência da perícia compromete a plena instrução do processo, prejudicando a correta avaliação das provas e, consequentemente, o julgamento justo da lide, a garantia da segurança jurídica e o direito das partes à ampla defesa e ao contraditório. Como salientou o representante do Ministério Público no segundo grau de jurisdição, a matéria não foi analisada por especialista apto a fornecer resposta técnica adequada: "Ou seja, a lesão ocular do paciente não foi examinada, tendo o perito apenas mencionado a informação constante de atestado apresentado pelo paciente, o qual não faz menção à retirada das córneas ou do globo ocular, mencionado evisceração, que consiste em técnica cirúrgica pela qual todo o conteúdo intraocular é removido, preservando a concha escleral restante, inserções musculares extraoculares e anexos orbitais circundantes. Portanto, conforme requerido pelas partes e pelo Parquet em primeiro grau de jurisdição, é essencial a realização de prova pericial, de modo a verificar o real diagnóstico da situação que resultou na perda da visão do promovente. Aqui é imperioso ressaltar que o Juiz monocrático entendeu erroneamente que o autor teria informado que não tem interesse na produção da prova pericial, pois o promovente pugnou, na verdade, pelo julgamento da causa após a realização de perícia, para responder aos quesitos levantados pelo Ministério Público no parecer de Id. 14408493/14408494." (Id 17420205 - p. 459) Assim, embora regularmente deferida, a perícia não foi efetivada, circunstância que escapa à esfera de responsabilidade das partes. Essa omissão estatal, ainda que involuntária, implicou evidente cerceamento de defesa, na medida em que inviabilizou a produção de prova técnica potencialmente decisiva para o julgamento da causa. Nos termos do art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, é assegurado às partes o direito ao contraditório e à ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, razão pela qual a ausência da perícia compromete a higidez do processo. Cumpre salientar que incumbe ao Magistrado conduzir e orientar a instrução do feito, podendo determinar, inclusive de ofício, a produção das provas indispensáveis à adequada solução da controvérsia. Tal prerrogativa encontra respaldo no artigo 370 do Código de Processo Civil, segundo o qual: "Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito." Nesse contexto, revela-se prematuro o julgamento da demanda sem a realização de prova pericial, sobretudo diante da inexistência, nos autos, de elementos probatórios suficientes para aferir, com segurança, a alegação de erro médico. Colaciono jurisprudências oriundas de casos diversos, porém, nos quais a prova pericial foi reconhecida como imprescindível à adequada solução da demanda indenizatória: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA AUTORA. TESE DE ERRO MÉDICO EM CIRURGIA DE ARTRODESE E DESCOMPRESSÃO. INSUBSISTÊNCIA. LAUDO MÉDICO, PRODUZIDO SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA, DEMONSTRANDO A ADOÇÃO DE PROCEDIMENTOS E TÉCNICAS ADEQUADAS AO QUADRO CLÍNICO DA DEMANDANTE. ACERVO PROBATÓRIO, COMPOSTO POR PROVA DOCUMENTAL, ORAL E PERICIAL, INDICANDO A INEXISTÊNCIA DE PROVA DA NEGLIGÊNCIA, IMPRUDÊNCIA OU IMPERÍCIA DO PROFISSIONAL MÉDICO QUE ATENDEU A AUTORA. CONSTATAÇÃO DE SEQUELAS DECORRENTES DE COMPLICAÇÃO CIRÚRGICA, DESCRITA PELA LITERATURA MÉDICA ESPECIALIZADA. TERMO DE CONSENTIMENTO ASSINADO PELA PACIENTE, DECLARANDO CIÊNCIA QUANTO A POSSÍVEIS RISCOS E INTERCORRÊNCIAS RELACIONADAS AO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. ADOÇÃO DE MEDIDAS E ESFORÇOS, PELO PROFISSIONAL MÉDICO REQUERIDO, PARA SOLUCIONAR OS PROBLEMAS VERIFICADOS, COM A REALIZAÇÃO DE DUAS NOVAS CIRURGIAS QUE RESULTARAM EM MELHORA PARCIAL APÓS OS TRATAMENTOS. ATO ILÍCITO NÃO CONFIGURADO. RESPONSABILIDADE CIVIL AFASTADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SC - Apelação: 0303826-10 .2017.8.24.0005, Relator.: Alex Heleno Santore, Data de Julgamento: 05/03/2024, Oitava Câmara de Direito Civil) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS - ERRO MÉDICO - PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA - PRODUÇÃO DE PROVA - INDEFERIMENTO - NECESSIDADE EVIDENCIADA - SENTENÇA ANULADA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Nos termos do artigo 355, do CPC, o julgamento antecipado da lide é cabível quando não houver a necessidade de produção de outras provas, o réu for revel e não houver requerimento de prova. 2 . Caracteriza cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide, desfavorável à parte que requereu a produção de prova. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10103852320228110006, Relator.: MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, Data de Julgamento: 23/07/2024, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 25/07/2024) EMENTA: APELAÇÃO - RESPONSABILIDADE DO ESTADO - ERRO MÉDICO - Suposta negligência ou omissão no atendimento de parturiente, cuja demora na realização do parto cesárea teria originado o óbito do recém-nascido, por irregularidade respiratória e aspiração de mecônio - Sentença de improcedência - Pretensão de reforma - Inadmissibilidade - Preliminares de cerceamento de defesa e nulidade da perícia técnica afastadas - Desnecessidade de prova oral bem como inadmissibilidade da exumação - Laudo elaborado por perito médico do IMESC, equidistante das partes e da confiança do juízo, com o atributo da isenção - Conclusão contrária aos interesses da parte que não dá ensejo à renovação da prova ou substituição da perita - Cerceamento de defesa não caracterizado - Ilegitimidade passiva da médica, conforme entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal (Tema 940 - STF) - Ademais, ausência, no caso concreto, de culpa dos demais requeridos - Laudo pericial que não atestou ocorrência de omissão, negligência ou imperícia no atendimento hospitalar, concluindo que o óbito não se deu em razão de má prática médica, pela demora na realização do parto cesárea - Ausência de prova de suposta conduta omissiva ou atendimento negligente prestado pelo serviço público - Sentença de improcedência mantida - Recurso não provido. (TJ-SP - Apelação Cível: 1003325-58.2019.8 .26.0629 Tietê, Relator.: Bandeira Lins, Data de Julgamento: 06/05/2024, 8ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 06/05/2024) EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. NECESSIDADE DE PROVA PERICIAL. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA, DE OFÍCIO . Imprescindível a realização de prova compatível, útil e necessária ao deslinde da controvérsia. No caso, necessária a realização da prova pericial de modo a tentar apurar eventual erro médico no atendimento dispensado à autora. Pedido de prova oral, pela autora, precluso. Precedentes .Sentença desconstituída, de ofício. Prejudicado, em parte, o apelo. (TJ-RS - Apelação: 50003943020198210119 OUTRA, Relator: Marcelo Cezar Muller, Data de Julgamento: 25/03/2024, Décima Câmara Cível, Data de Publicação: 28/03/2024) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ERRO MÉDICO. Afastamento da preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela FESP. Sentença citra petita, ante a omissão em relação ao pedido de indenização por danos morais formulado pelo coautor. Vício reconhecido de ofício, com imediata apreciação do pedido, nos termos do art. 1.013, § 3º, III, do CPC. Correção de erros materiais que constaram da sentença, não sanados mesmo com a oposição de embargos de declaração. Alegação de falha no atendimento médico prestado durante parto, acarretando anoxia neonatal e sequelas neurológicas irreversíveis, com déficit no desenvolvimento neuropsicomotor. Falha na conduta médica comprovada pelo laudo do IMESC. Inobservância aos protocolos de obstetrícia no tocante ao intervalo de controle dos batimentos cardíacos do feto. Embora não ateste de forma inequívoca o nexo causal entre a conduta médica e o sofrimento fetal, o laudo pericial é conclusivo ao apontar que a ausência de adequado monitoramento implicou a perda da chance de constatá-lo em momento anterior, o que certamente poderia ter evitado ou minorado as consequências advindas do evento. Danos morais e estéticos caracterizados. Redução do montante da indenização fixada na sentença. Reparação dos danos materiais restrita àqueles efetivamente comprovados nos autos. Cabimento da fixação de pensão mensal vitalícia em favor do infante, em razão da incapacidade laborativa, e de sua genitora, que resta impossibilitada de exercer atividade remunerada por se dedicar exclusivamente aos cuidados do filho. Revisão do termo inicial do pensionamento vitalício. Valor devido a partir da data em que o menor completará quatorze anos de idade, e, em relação à genitora, desde a data em que deixou seu emprego formal. Redistribuição dos ônus sucumbenciais, que passarão a ser integralmente suportados pelo réu . Recursos interpostos pelas partes e remessa necessária, considerada interposta, parcialmente providos. (TJ-SP - AC: 10259279820148260053 São Paulo, Relator.: Eduardo Prataviera, Data de Julgamento: 10/11/2023, 5ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 10/11/2023) EMENTA: PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SINISTRO DE TRÂNSITO. RECUSA DA SEGURADORA. PROVA PERICIAL UNILATERAL REALIZADA FORA DO JUÍZO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS AUTORAIS. PEDIDO DE PERÍCIA REALIZADO EM RÉPLICA, QUE SEQUER FOI APRECIADO. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. QUESTÃO PASSÍVEL DE ANÁLISE EX OFFICIO. SENTENÇA ANULADA COM RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. RECURSO DO AUTOR PREJUDICADO. Apresentada sua inicial (fls. 01/09), verifica-se que a parte autora realizou pedido genérico de produção de provas, no entanto, em sua réplica (fls . 269), a autora requereu explicitamente a realização de perícia como contraprova da avaliação técnica realizada unilateralmente pelo recorrido. Outrossim, apesar de o autor ter solicitado de forma clara a realização da prova pericial, o Juízo Singular quedou-se silente acerca de tal pedido, posteriormente apresentando despacho às fls. 274 apenas para intimar as partes para especificar as provas que pretendiam produzir em audiência. Ressalte-se que às fls . 279, em despacho saneador, foi deferida a prova testemunhal, porém, novamente, não se tratou do pedido de análise pericial realizado às fls. 269. Desse modo, vislumbra-se que ao sobrevir decisum meritório, sem que fosse apreciado o pedido de realização de prova pericial, resta configurado o cerceamento de defesa da parte autora, sobremaneira por se poder vislumbrar os prejuízos processuais sofridos pela recorrente ao ter todos seus pedidos julgados improcedentes, havendo violação da garantia constitucional do devido processo legal. Por conseguinte, outra conclusão não se pode chegar senão que o decisório proferido na ação em comento incorreu em vício de nulidade absoluta que, por ser matéria de ordem pública, é cognoscível de ofício, ainda que não tenha sido suscitado pelas partes Recurso de Apelação interposto pelo autor prejudicado. Decretação de nulidade da sentença ex officio, com o retorno dos autos ao Juízo de origem para realização de instrução e produção de prova técnica especializada (art. 464, § 2º e 3º do CPC). (TJ-CE - AC: 01899586720178060001 Fortaleza, Relator.: FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO, Data de Julgamento: 23/11/2022, 1ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 23/11/2022) EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS EM VIRTUDE DE ERRO MÉDICO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA POR FALTA DE PROVA. PROVA PERICIAL. NECESSIDADE. PROVA MEDIANTE REQUERIMENTO DAS PARTES OU DETERMINADO DE OFÍCIO PELO JUIZ. OBSERVÂNCIA AO ARTIGO 370 DO CPC. ERROR IN PROCEDENDO. CARGA PROBATÓRIA INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA. DETERMINADA A REABERTURA DA FASE DE INSTRUÇÃO PARA A REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL. PRECEDENTES. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Cinge-se a controvérsia em verificar eventual desacerto da decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza que nos autos de ação de reparação de danos materiais e morais em virtude de erro médico julgou totalmente improcedente o pleito autoral. 2. Aduz a parte autora que contratou a requerida para realizar um procedimento cirúrgico de flacidez nos braços e correção das marcas de expressão na face, versando sobre um procedimento estético e não reparatório, obrigação de resultado, defendendo, ainda, que houve cerceamento de defesa, uma vez que pugnada a perícia, a mesma fora dispensada pelo juízo, e fundamentada a improcedência da ação em sua não realização 3. Compulsando os autos, verifica-se que o juízo de origem consigna em sentença de fls. 262/269 que a prova técnica não foi produzida e utilizada no deslinde do presente feito, razão pela qual inviabiliza a conclusão quanto eventual ingerência do requerido no procedimento cirúrgico em apreço, razão pela qual, diante da ausência de provas, julgou improcedente o pleito autoral. 4. Para apuração da ocorrência ou não de erro médico, bem como da realização a contento do procedimento, é imprescindível a realização de prova pericial. Isto porque, a prova pericial servirá para esclarecer questões técnicas relativas ao procedimento médico e atual situação da Apelante, o que foge ao conhecimento jurídico do Magistrado. 5. É dever do julgador dirigir e instruir o processo, determinando, inclusive, a realização de prova quando necessária à solução da controvérsia. É o que dispõe o art. 370 do Código de Processo Civil: "Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito". Dessa forma, precipitado o julgamento do processo sem a produção de prova pericial, não havendo nos autos elementos de prova seguros para decidir a questão acerca da ocorrência de erro médico. 6. Não há como subsistir, portanto, o decreto de improcedência do pedido com base na falta de prova dos fatos constitutivos do direito da autora, motivo pelo qual a sentença deve ser anulada para que se produza a prova técnica. Nesse contexto, reconhecida a necessidade de realização de prova pericial, indispensável à solução da controvérsia, deve ser reconhecida a ocorrência de error in procedendo e cassada a respeitável sentença recorrida, determinando-se a reabertura da fase de instrução processual para a realização de prova pericial. 7. Recurso conhecido e provido. (TJ-CE - AC: 01821418320168060001 Fortaleza, Relator.: LIRA RAMOS DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 19/10/2022, 3ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 19/10/2022) No caso em tela, verifica-se que o juízo a quo incorreu em equívoco ao interpretar que o autor teria expressado desinteresse na realização da prova pericial, quando, na realidade, tal prova foi reiteradamente postulada nos autos. Essa conclusão contraria não apenas os elementos constantes do processo, como também viola o Enunciado 376 do Fórum Permanente de Processualistas Civis, que dispõe que "a vedação do comportamento contraditório aplica-se ao órgão jurisdicional". Trago entendimentos jurisprudenciais, que embora extraídos de casos concretos diversos, o objetivo é unicamente de evidenciar a impossibilidade de se admitir comportamento contraditório por parte do órgão jurisdicional, vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INDENIZATÓRIA - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - DEFEITO EM VEÍCULO - VERIFICAÇÃO DA CAUSA DO DEFEITO - DEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL - PRECLUSÃO PRO JUDICATO - JULGAMENTO DO FEITO SEM A REALIZAÇÃO DA PROVA TÉCNICA - CERCEAMENTO DE DEFESA - CONSTATAÇÃO - IMPRESCINDIBILIDADE DO ELEMENTO PROBATÓRIO PARA APURAÇÃO DO ATO ILÍCITO - SENTENÇA CASSADA. 1. De acordo com o artigo 505 do Código de Processo Civil, "nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide", sob pena de ofensa à preclusão "pro judicato" e à coisa julgada. 2. Configura-se cerceamento de defesa o deferimento do pedido de produção de prova pericial e a posterior prolação da sentença sem sua realização ou dispensa, mormente quando a parte sucumbente é privada de comprovar fatos indispensáveis à demonstração da veracidade de suas alegações. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001842-33.2018.8.13.0301, Relator.: Des.(a) Maria Lúcia Cabral Caruso, Data de Julgamento: 05/04/2024, 12ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 09/04/2024) EMENTA: I - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DISCUSSÃO SOBRE INDEVIDA SUSPENSÃO DE COMPETIDOR EM JOGO VIRTUAL POR DESCUMPRIMENTO DOS TERMOS DE USO. UTILIZAÇÃO DE HACK E APLICATIVOS NÃO PERMITIDOS. II - APELAÇÃO . GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. GOOGLE PLAY. AUSÊNCIA DE INGERÊNCIA SOBRE A CONDUTA DA CORRÉ . PRELIMINAR ACOLHIDA. III - APELAÇÃO. GARENA AGENCIAMENTO DE NEGÓCIOS LTDA. EMPRESA PUBLICADORA E DISTRIBUIDORA DE JOGOS VIRTUAIS . III.1. PRELMINARES. III .1.1. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DE JUSTIÇA DEFERIDA AO AUTOR. REJEIÇÃO III.1.2. NULIDADE DA SENTENÇA . MÁCULA VERIFICADA PELO INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL REQUERIDA PELA RÉ E SUA POSTERIOR CONDENAÇÃO A RESSARCIR AO AUTOR POR DANOS MATERIAIS E MORAIS POR AFIRMADA AUSÊNCIA DE PROVA AFIRMATIVA DE QUE O DEMANDANTE/USUÁRIO VIOLARA OS TERMOS DE USO DO JOGO AO EMPREGAR SOFTWARE SUSPEITO E NÃO AUTORIZADO (HACK). PROVIMENTO JUDICIAL DE MÉRITO DE FUNDAMENTAÇÃO COMPROMETIDA. JULGADO A QUE FALTA COERÊNCIA E RACIONALIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO . SENTENÇA CASSADA. IV - RECURSO DA RÉ GOOGLE PROVIDO. RECURSO DA RÉ GARENA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA CASSADA . 1. Evidenciado o uso, pelo autor, do serviço ofertado por lojas da Google Play tão somente para download do aplicativo de jogo online Free Fire, publicado e distribuído pela corré Garena Agenciamento de Negócios Ltda., manifesto não haver pertinência subjetiva a justificar a inclusão no polo passivo da Google Brasil Internet Ltda., que nenhuma participação teve na determinação de suspender permanentemente o demandante/usuário por afirmada utilização de softwares suspeitos ou não autorizados pelas regras que disciplinam o jogo . Preliminar de ilegitimidade passiva acolhida. Honorários arbitrados. 2. Justiça gratuita . Não tem cabimento afastar o benefício concedido pelo juízo de origem, ao autor/apelado, de gratuidade de justiça quando inexistentes nos autos elementos de convicção hábeis a infirmar sua alegada hipossuficiência econômica para custear as despesas processuais. Impugnação à gratuidade de justiça rejeitada. 3. Preliminar de nulidade da sentença . Postulada pela ré/apelante, em fase de especificação de provas, a produção de prova técnica e devidamente justificada sua necessidade para devida elucidação da controvérsia, não guarda coerência a decisão do juízo que indeferiu o requerimento assim formulado com a decisão de mérito posteriormente proferida que, por falta de demonstração da alegada violação, pelo autor, dos termos de uso do jogo, condenou a demandada a ressarcir o demandante por perdas e danos. Hipótese em que induvidosa a necessidade de prova técnica para aferir se ocorreu efetivo emprego, pelo usuário, de programa ou dispositivo externo não autorizado (hack) pelas regras que disciplinam o jogo. Sentença com fundamentação inequivocamente comprometida. Cerceamento de defesa devidamente configurado . Provimento de mérito cassado para reabertura da fase de instrução do feito e realização da perícia técnica. 4. Recurso da ré Google Brasil Internet Ltda. conhecido e provido . Recurso da ré Garena Agenciamento de Negócios Ltda. conhecido e parcialmente provido. Preliminar de nulidade da sentença acolhida. (TJ-DF 07255862820208070001 1745111, Relator.: DIVA LUCY DE FARIA PEREIRA, Data de Julgamento: 23/08/2023, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: 25/08/2023) Com efeito, embora não tenha havido indeferimento expresso da prova pericial, verifica-se que o juízo formou entendimento equivocado no sentido de que o autor teria abdicado de sua realização. Tal equívoco, no entanto, comprometeu a adequada instrução do feito, resultando em julgamento de improcedência com base na alegada insuficiência de provas. Destaco, que ainda que se reconheça o longo decurso temporal desde os fatos discutidos nos autos, não cabe ao Poder Judiciário presumir, de forma apriorística, a ineficácia ou inutilidade da prova pericial. Nos termos do artigo 370 do Código de Processo Civil, é dever do magistrado determinar as provas necessárias à formação do seu convencimento, sendo certo que a avaliação quanto à viabilidade técnica e à possibilidade de produção da prova compete ao perito, profissional habilitado para aferir os elementos técnicos disponíveis. A possível recusa na realização da perícia, sob o fundamento genérico de que o tempo decorrido comprometeria sua eficácia, além de desconsiderar a autonomia técnica do perito, compromete o direito das partes à ampla defesa e à efetiva prestação jurisdicional, violando, por conseguinte, os princípios insculpidos nos artigos 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal. Diante disso, impõe-se o reconhecimento da nulidade da sentença, com a consequente reabertura da fase instrutória, a fim de viabilizar a produção da prova pericial indispensável ao esclarecimento técnico dos fatos controvertidos. Dispositivo Ante todo o exposto, em consonância com o parecer ministerial, conheço e dou provimento ao recurso para anular a sentença vergastada por error in procedendo, determinando a reabertura de fase de instrução com realização de prova pericial. É como voto. [1]Alexandrino, Marcelo. Direito administrativo descomplicado. _ 23. ed. rev., atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015.

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