Everson Pereira Dos Santos x George Ottavio Brasilino Olegario e outros
ID: 321494711
Tribunal: TJRO
Órgão: Ariquemes - 3ª Vara Cível
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 7007695-22.2022.8.22.0002
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VINICIUS MEDEIROS MARQUES
OAB/PB XXXXXX
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GEORGE OTTAVIO BRASILINO OLEGARIO
OAB/PB XXXXXX
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CORINA FERNANDES PEREIRA
OAB/RO XXXXXX
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JOSIMARA FERREIRA DA SILVA PONCE
OAB/RO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Ariquemes - 3ª Vara Cível BALCÃO virtual (CPE/cartório): https://meet.google.com/iaf-porq-nmf - Telefone: (69)3309-8110 - E-mail…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Ariquemes - 3ª Vara Cível BALCÃO virtual (CPE/cartório): https://meet.google.com/iaf-porq-nmf - Telefone: (69)3309-8110 - E-mail: cpeariquemes@tjro.jus.br - SALA Virtual (Gabinete): https://meet.google.com/ojr-oeeq-psq - Localização: Fórum Juiz Edelçon Inocêncio, na Av. Juscelino Kubitschek, n. 2365, Bairro Setor Institucional, CEP 76872-853, Ariquemes/RO. Processo n.: 7007695-22.2022.8.22.0002 Classe: Procedimento Comum Cível Valor da Causa:R$ 345.835,00 Última distribuição:12/05/2023 AUTOR: EVERSON PEREIRA DOS SANTOS Advogado do(a) AUTOR: CORINA FERNANDES PEREIRA, OAB nº RO2074, JOSIMARA FERREIRA DA SILVA PONCE, OAB nº RO7532 REU: ENERGISA RONDONIA - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A Advogado do(a) RÉU: GEORGE OTTAVIO BRASILINO OLEGARIO, OAB nº PB15013, VINICIUS MEDEIROS MARQUES, OAB nº PB23072, ENERGISA RONDÔNIA SENTENÇA Vistos, etc. EVERSON PEREIRA DOS SANTOS ajuizou ação indenizatória por danos morais e materiais em face de ENERGISA RONDÔNIA - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., partes devidamente qualificadas nos autos. Sustentou o autor, em síntese, ser proprietário de imóvel rural situado na Linha B-110, Lote 71, Zona Rural do município de Cujubim/RO. Narrou que, no dia 23/08/2021, um incêndio atingiu sua propriedade, causado pela queda de um fio de alta tensão sobre a área rural, em razão do tombamento de uma árvore sobre a rede elétrica, o que provocou um curto-circuito. Segundo relatado, as chamas se alastraram rapidamente, atingindo aproximadamente 21 (vinte e um) alqueires de pastagem, além de cercas, gerando significativo dano material. Informou, ainda, que, em virtude da destruição do pasto, foi compelido a arrendar área de terceiros para manter seus animais, o que agravou os prejuízos patrimoniais suportados. Relatou que diversas testemunhas presenciaram os fatos e auxiliaram no controle do fogo, podendo confirmar que a origem do incêndio decorreu da falta de manutenção da rede elétrica, especialmente quanto à poda das árvores situadas na faixa de servidão da empresa requerida. Asseverou que, anteriormente ao sinistro, tanto ele quanto moradores vizinhos efetuaram diversas solicitações à requerida para que fosse realizada a poda das árvores próximas à rede elétrica, sem que qualquer providência tenha sido adotada pela concessionária. Destacou que os protocolos de atendimento registrados em 30/08/2021 (nº 2021967441) e 31/08/2021 (nº 2021799002) evidenciam a inércia da requerida, mesmo após o ocorrido. Alegou, ainda, que as fotografias acostadas aos autos demonstram a presença de fio caído no local do incêndio, comprovando que o rompimento da rede deveria ter acionado o desligamento automático do sistema (o chamado “desarme da canela”), o que, se tivesse ocorrido, teria evitado o incêndio e os danos dele resultantes. Ao final, requereu a condenação da ré ao pagamento de: a) R$ 298.085,00 (duzentos e noventa e oito mil e oitenta e cinco reais), a título de danos materiais, pela queima das pastagens e cercas; b) R$ 30.000,00 (trinta mil reais), a título de danos materiais decorrentes do arrendamento de pastagem; c) R$ 3.750,00 (três mil, setecentos e cinquenta reais), relativos ao pagamento de diárias de trabalhadores para combate ao fogo; d) R$ 3.000,00 (três mil reais), pela elaboração de laudo de avaliação do imóvel rural; e) R$ 1.000,00 (mil reais), relativos ao pagamento do perito que elaborou o Parecer Técnico de Incêndio Florestal; e f) R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de indenização por danos morais. A petição inicial foi devidamente instruída com documentos. Recebida a inicial (ID 77893824), foi deferido o recolhimento das custas iniciais para o final da lide. Devidamente citada, a ré apresentou contestação (ID 80075193), oportunidade em que não suscitou preliminares. No mérito, alegou que o incêndio descrito na inicial não decorreu de qualquer conduta comissiva ou omissiva de sua parte, mas sim de um evento natural, especificamente a queda de uma árvore sobre a rede elétrica em razão de fortes ventos, circunstância esta reconhecida pelo próprio autor na petição inicial e evidenciada no laudo por ele apresentado (ID 77351569). Acrescentou que o autor teria omitido fato relevante ao deslinde da causa, qual seja, a natureza fortuita do evento que originou o sinistro, sendo certo que o próprio documento acostado aos autos pelo requerente confirma que a queda da árvore se deu em razão de condições climáticas adversas, e não por falha na prestação do serviço ou ausência de manutenção por parte da empresa ré. Sustentou, ademais, que, nos termos da Norma Técnica NBR 15688/2012, especialmente em seus itens 5.5 e 5.6, não lhe compete a poda de árvores situadas em propriedades privadas, sendo tal atribuição do proprietário do imóvel. Alegou, inclusive, que o autor não respeitou a faixa de servidão administrativa, permitindo o plantio ou a permanência de vegetação em proximidade indevida da rede elétrica, sem adotar as providências necessárias para evitar o contato da vegetação com os cabos condutores. Asseverou que não houve qualquer solicitação anterior ao evento danoso para que a empresa realizasse intervenções na rede elétrica da localidade e que, além disso, inexiste nos autos prova apta a demonstrar omissão por parte da concessionária. Quanto aos danos alegados, impugnou o laudo de avaliação apresentado pelo autor, por considerá-lo inidôneo e desprovido de elementos comprobatórios mínimos, como orçamentos, notas fiscais ou parâmetros de valoração compatíveis com os valores de mercado. Nessa perspectiva, argumentou que não há como aferir, de forma precisa, a existência e extensão dos prejuízos invocados. Ao final, requereu a total improcedência dos pedidos formulados na inicial, deixando de juntar documentos. Na Réplica apresentada sob o ID 80990722, o requerente aduziu, em oposição às alegações trazidas pela parte requerida, que os documentos e registros fotográficos acostados aos autos são plenamente suficientes para demonstrar que o incêndio teve origem no cabo que se encontrava caído sobre a pastagem. Sustentou que, conforme demonstrado pelas imagens colacionadas pelo perito, a fatalidade decorreu da queda de um galho de árvore — situado fora dos limites da propriedade do autor — sobre o fio condutor, que permaneceu suspenso, ocasionando curto-circuito na rede e, por conseguinte, a emissão de faíscas que deram início ao fogo. Asseverou que houve manifesta omissão por parte da concessionária, que deixou de observar suas obrigações quanto à devida e regular manutenção da rede elétrica, tratando-se, no presente caso, de linha de alta tensão, cuja conservação incumbe exclusivamente à empresa requerida. Alegou, ainda, que, em sua contestação, a ré buscou transferir, de forma absolutamente desarrazoada e desproporcional, a responsabilidade pelo sinistro ao requerente e que, ao contrário do que afirma a parte adversa, sempre cumpriu com suas obrigações legais e contratuais, inclusive arcando com elevados custos na expectativa de receber da requerida um serviço prestado com segurança, eficácia e regularidade — o que, contudo, não se concretizou diante da conduta negligente e insatisfatória da concessionária. Destacou, por fim, que, nos termos do art. 140, § 1º, e do art. 77, ambos da Resolução nº 414/2010 da ANEEL, incumbe à concessionária a realização de inspeções periódicas nos equipamentos de medição, sendo que a prestação dos serviços deve ocorrer de forma a assegurar sua adequada fruição, isenta de vícios, transtornos ou falhas, e com garantia de total segurança ao consumidor. Diante disso, reiterou integralmente os pedidos formulados na petição inicial. Na fase de especificação de provas, devidamente intimadas, ambas as partes postularam pela produção de prova testemunhal. Na sequência, foram regularmente intimadas a se manifestarem quanto à concordância e aceitação da remessa dos autos ao núcleo especializado na matéria objeto da petição inicial, especificamente ao 2º Núcleo de Justiça 4.0, conforme consignado no ID 82948257. O autor, por meio da manifestação constante no ID 83174878, demonstrou interesse na transferência da tramitação do feito à referida unidade especializada. Por sua vez, ao ser intimada, a requerida apresentou os dados necessários para o recebimento das comunicações eletrônicas, além de declarar que não se opunha à tramitação do processo perante o Núcleo de Justiça 4.0 – Energia (ID 83993559). Sobreveio, então, decisão saneadora às fls. 42/113 (ID 89078630), na qual foi designado o engenheiro Moisés Vieira Fernandes para atuar como perito do Juízo, sendo igualmente fixados os pontos controvertidos da demanda, a saber: a autoria e a extensão dos danos alegados. Posteriormente, a parte autora retratou-se de sua manifestação anterior, declarando não possuir mais interesse na tramitação do feito perante o referido Núcleo de Justiça 4.0, conforme registrado na petição de ID 90411420. Diante disso, foi declarada a incompetência do referido Núcleo para atuar na presente lide (ID 90473600). O feito, então, retornou à tramitação perante o Juízo da 3ª Vara Cível desta Comarca, ocasião em que foram estabelecidos novos pontos controvertidos, consistentes em: a) a presença dos requisitos da responsabilidade civil; b) o dever de indenizar por parte da ré; e c) a existência de danos materiais e morais indenizáveis e o eventual montante devido (ID 90770699). Nos documentos de IDs 91539921 e 91867045, respectivamente, o autor apresentou seu rol de testemunhas, enquanto a parte ré pugnou pelo depoimento pessoal do autor e pela produção de prova pericial. Por fim, conforme consignado no despacho de ID 93481188, foi mantida a necessidade de realização da prova pericial, sendo igualmente ratificada a nomeação do perito anteriormente designado. O comprovante de pagamento dos honorários periciais foi juntado sob o ID 96891520. As partes apresentaram seus quesitos nos IDs 97471967 e 97855096. A parte autora acostou aos autos comprovantes de protocolos de atendimento, bem como novas imagens fotográficas da propriedade objeto da presente demanda (IDs 99109168 e 99109165). Subsequentemente, por meio da petição de ID 100015290, juntou novos documentos e notas fiscais com o intuito de comprovar os fatos articulados na petição inicial, além de demonstrar despesas adicionais, circunstância que ensejou a atualização dos valores referentes aos danos materiais suportados. Diante disso, requereu a intimação da parte ré para que se manifestasse sobre as novas provas. O laudo pericial foi juntado sob ID 104028619, no qual o perito concluiu que o incêndio atingiu uma área de 39,2118 hectares, comprometendo tanto pastagens quanto benfeitorias não reprodutivas (cercas, cochos etc.). Afirmou que o agente ígneo (fonte de calor) foi provocado por fagulhas resultantes de curto-circuito gerado pelo rompimento de cabo energizado ao tocar o solo, com faíscas alimentadas por vegetação seca. Constatou-se a presença de árvores a aproximadamente 5,5 a 6 metros da rede elétrica, o que representa risco de tombamento sobre a rede e consequente geração de faíscas. O valor estimado para a indenização foi de R$ 377.021,27 (trezentos e setenta e sete mil, vinte e um reais e vinte e sete centavos). Quanto à responsabilidade pelo sinistro, o perito não afirmou categoricamente se o incêndio poderia ter sido evitado com a manutenção da área de servidão, mas apontou indícios compatíveis com falha na manutenção preventiva, dada a proximidade da vegetação com a rede elétrica. A parte requerida manifestou-se sobre o parecer pericial e requereu que o perito esclarecesse as respostas apresentadas aos quesitos 15, 17 e 20 (ID 105425191). Por meio da decisão de ID 107714304, o expert foi intimado para esclarecer aparente contradição nas respostas aos quesitos 13 e 14. O pedido de esclarecimentos constante do ID 105425191 foi indeferido. Em seguida, sobreveio a resposta aos quesitos questionados (ID 107937166). Intimada, a parte autora manifestou ciência quanto ao teor do laudo pericial (ID 108593685). Em audiência de instrução, procedeu-se à oitiva das pessoas indicadas nos rôis anteriormente colacionados (ID 116791496). As partes apresentaram alegações finais por memoriais (IDs 117274070 e 119329691), oportunidade em que sustentaram, com base no conjunto probatório angariado, as teses que defenderam ao longo da demanda. A parte autora requereu a condenação da ré ao pagamento dos danos morais e materiais suportados, argumentando que os documentos acostados, os laudos técnicos e as provas orais produzidas comprovam atos ilícitos e omissivos praticados exclusivamente pela requerida. Por outro lado, a concessionária de energia elétrica pugnou pela improcedência dos pedidos, argumentando que o expert nomeado pelo Juízo chegou a conclusões dissociadas dos documentos que regem a lide, baseando-se em subsídios alheios. Alegou, ainda, que não havia aceiros preventivos de incêndio na propriedade, por se tratar de área destinada à atividade pecuária. Vieram-me os autos conclusos para julgamento. É, em essência, o relatório. FUNDAMENTO e DECIDO. Encerrada a instrução processual, passo, doravante, ao julgamento do feito. Da regularidade da demanda A petição inicial preenche adequadamente os requisitos dos artigos 319 e 320 do Código de Processo Civil, sendo os documentos que a instruem suficientes para amparar os fatos narrados e os pedidos formulados. As condições da ação devem ser aferidas in status assertionis, e, no presente caso, restaram devidamente demonstradas. As partes são legítimas e estão regularmente representadas. Outrossim, o interesse de agir encontra-se caracterizado, sendo a tutela jurisdicional necessária e adequada à via eleita. Da “impugnação ao laudo”: De início, verifica-se que a ré apresentou duas manifestações em relação ao laudo pericial constante do ID 104028619 (elaborado por engenheiro agrônomo): a) Em 08/05/2024 (ID 105425191), questionou as respostas do perito aos quesitos 15 e 17, notadamente quanto à dispensa de Plano de Controle, Prevenção e Combate a Incêndios para propriedades classificadas como de produção familiar — o que, segundo a ré, não seria o caso do autor, que seria pecuarista. Ainda, requereu resposta ao quesito 20, para que o perito apresentasse carta imagem da área nos períodos de 3 e 6 meses após o sinistro, com o objetivo de comprovar eventual aplicação de insumos corretivos no solo. Juntou, ademais, documentos voltados a demonstrar que o laudo teria sido baseado unicamente na narrativa inicial do autor. b) Em 17/07/2024 (ID 108604751), questionou em que se baseou o perito para estimar a utilização de insumos e os gastos com a suposta recomposição da pastagem, alegando a inexistência de documentação que corroborasse os dados indicados. Impugnou os valores estimados (ID 109439488). O pedido de esclarecimentos foi indeferido no ID 107714304, com a observação de que a atividade probatória relativa às alegações formuladas pelas partes incumbe a elas próprias, e não ao perito judicial (tais como a comprovação de gastos ou de que o autor teria acionado a concessionária para poda, entre outros). Isso não significa, contudo, que tais comprovações estejam supridas nos autos, sendo necessária a devida análise meritória dos pontos levantados. Ademais, eventuais discussões quanto à classificação da atividade econômica do autor (se produção familiar ou pecuária comercial) extrapolam as atribuições do perito designado neste feito. Ressalte-se que, conforme o art. 479 do CPC, a conclusão pericial não vincula o Juízo, que deverá apreciar o conjunto probatório como um todo para formar seu convencimento. Assim, o laudo pericial representa um dos elementos de prova a serem analisados, não tendo caráter vinculativo. Destaca-se, ainda, que, sendo o perito judicial profissional de confiança do Juízo e equidistante das partes, o laudo por ele apresentado cumpre sua função de complementar as provas, instruir o feito e auxiliar na formação do convencimento do julgador. Dessa forma, não há razão para acolher as impugnações apresentadas pela parte requerida. Estando presentes os pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido do processo e inexistindo questões preliminares pendentes de apreciação, passo ao exame do mérito. Do mérito: Cuida-se de ação indenizatória por danos materiais e morais, proposta contra a concessionária ré, decorrente do rompimento do cabo de rede elétrica de alta tensão (na data de 23/07/2021) que, energizado, provocou incêndio na pastagem e destruição de parte da cerca de arame da propriedade rural pertencente ao autor (21 alqueires de pastagem e cercas). Pois bem. A questão posta nos autos deve ser analisada à luz das disposições previstas na CRFB/88, no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor. De proêmio, cabe afirmar a incidência do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela, por força do disposto no artigo 17 do referido diploma legal, uma vez que a pretensão sub examine retrata a ocorrência de fato amoldável como típico acidente de consumo. Impende ressaltar, ainda, que a matéria em questão alude à responsabilidade da concessionária prestadora de serviço público de energia elétrica, que, por força do artigo 37, §6º da Constituição Federal, é objetiva, tal qual a do Estado, pois se usufrui dos benefícios de exploração da atividade pública deverá também suportar os seus riscos. Trata-se da teoria do risco administrativo que se fundamenta, sobretudo, na socialização do prejuízo de determinada pessoa que deve ser repartido por todos os cidadãos que compõe o Estado. Verifica-se também a submissão do fato à responsabilidade civil objetiva, prevista no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, que adotou a teoria do risco do empreendimento, tendo em vista que a atividade normalmente desenvolvida pelo fornecedor de serviço implica riscos para o direito de outrem. Veja-se: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. [...] Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.” [grifou-se] Em conformidade, o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 14, igualmente consagra a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços por danos causados ao consumidor por falha na prestação de seus serviços, estabelecendo que “[...] os órgãos públicos por si ou suas empresas concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigadas a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos” (CDC, art. 22), in verbis: “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.” Inegável, portanto, em se tratando de concessionária de serviço público exploradora de atividade de fornecimento de energia elétrica, a presença da teoria do risco, seja pelo fato de a atividade exercida ser potencialmente perigosa, seja em razão do lucro proporcionado pela atividade empresarial. Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência pátria: “Responsabilidade civil. Prestação de serviços. Energia elétrica. Ação regressiva movida pela seguradora. Danos elétricos indenizados ao segurado. Responsabilidade objetiva da prestadora de serviço público. Danos e nexo causal evidenciados. Desnecessidade de prova pericial. Excludente de responsabilidade. Ausência. Compete à concessionária de energia elétrica adotar as medidas de segurança e proteção necessárias para evitar a oscilação da corrente elétrica em caso de descargas atmosféricas, por se tratar de evento previsível, cuja ocorrência não caracteriza força maior. Risco da atividade desenvolvida pela concessionária, o qual não pode ser transferido ao consumidor. Dever indenizatório configurado. Recurso não provido. Arbitramento de honorários sucumbenciais recursais.” (TJSP: AC 1010479-09.2019.8.26.0248, j. 06.05.2020, rel. Cesar Lacerda) [grifou-se] “Ação regressiva de ressarcimento. Oscilação de energia que danificou os equipamentos eletrônicos do segurado - Aplicabilidade da teoria da responsabilidade civil objetiva, de assunção de risco administrativo, dada à qualidade de prestadora de serviço público da ré - Exegese no art. 37, § 6º, da Constituição Federal c.c. art. 14 do CDC - Oscilação de voltagem, sobrecarga e queda de energia e descargas elétricas (raio) - Eventos previsíveis que não configuram força maior ou caso fortuito, por se inserir no risco da atividade lucrativa explorada pela concessionária, possuindo meios de controlar a oscilação na tensão. Precedentes. Demais questões mantidas conforme r. sentença pelos seus fundamentos Recurso não provido.” (TJSP: Apelação 1083923-39.2016.8.26.0100, Relator (a): Roberto Mac Cracken, Órgão Julgador: 22a Câmara de Direito Privado, Foro Central Cível - 10a Vara Cível, Data do Julgamento: 10/08/2017, Data de Registro: 22/08/2017) [grifou-se] “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. CURTO CIRCUITO. FIOS DE ALTA TENSÃO. INCÊNDIO EM RESIDÊNCIA. NEXO CAUSAL COMPROVADO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO. RECURSO IMPROVIDO. 1. A apelante, como fornecedora de serviço essencial, responde objetivamente pelos danos causados, não havendo necessidade de se perquirir sobre sua culpa, nos termos dos arts. 37, § 6º da CF e 14 do CDC. 2. No caso dos autos, restou comprovado o nexo causal entre os danos morais suportados pelo autor e a falha do serviço prestado pela ré, consistente na ocorrência de curto circuito decorrente da atitude omissiva da concessionária pela manutenção dos postes de energia elétrica e o evento danoso, representando evidente risco de dano a terceiros. 3. O valor arbitrado a título de danos morais deve observar, além do caráter reparatório da lesão sofrida, o escopo educativo e punitivo da indenização, de modo que a condenação sirva de desestímulo ao causador do ilícito a reiterar a prática lesiva, sem que haja, por outro lado, enriquecimento sem causa por parte da vítima, razões pelas quais deve ser mantido o seu quantum em R$ 15.000,00 (quinze mil reais). 4. Recurso conhecido e improvido.” (TJMA - AC: 00042593120148100022 MA 0500952017, Relator: ANGELA MARIA MORAES SALAZAR, Data de Julgamento: 18/10/2018, PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 25/10/2018) [grifou-se] ACIDENTE COM DESCARGA DE ENERGIA ELÉTRICA. FALECIMENTO DE MARIDO E PAI DOS APELADOS. DANO MATERIAL E MORAL DEVIDO. APELO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Responsabilidade objetiva da empresa prestadora do serviço de Energia elétrica. 2. Comprovado que a morte se deu pela descarga de energia elétrica de um fio caído de propriedade da Apelante, decorre daí a indenização ser devida. 3. Apelação improvida.” (TJMA - AC: 350632005 MA, Relator: NELMA SARNEY COSTA, Data de Julgamento: 03/05/2006, SANTA LUZIA) [grifou-se] APELAÇÃO CÍVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. QUEDA DE FIO DE ENERGIA ELÉTRICA DE POSTE, QUE ATINGIU A AUTORA AO SAIR DO VEÍCULO QUE CONDUZIA. LESÃO CORPORAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. MANUTENÇÃO. Por força do disposto no artigo 37, Parágrafo 6º, da CRFB, a responsabilidade das concessionárias de serviço público é objetiva e a vítima do evento danoso, ainda que não esteja usufruindo do serviço, será protegida pelo ordenamento jurídico, eis que consumidor por equiparação. Inteligência do artigo 17 do CDC. Autora que conseguiu comprovar os fatos Constitutivos do seu Direito, a teor do artigo 373, inciso I, do CPC. Falha na prestação do serviço da Ré. Danos Morais, Estéticos e Lucros Cessantes comprovados. Verbas Indenizatórias fixadas de acordo com os Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade, além dos parâmetros adotados por esta Corte. [...]” (TJRJ - APL: 00301653520118190068 RIO DE JANEIRO RIO DAS OSTRAS 2 VARA, Relator: REGINA LUCIA PASSOS, Data de Julgamento: 30/11/2016, VIGÉSIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL CONSUMIDOR, Data de Publicação: 02/12/2016) [grifou-se] APELAÇÃO - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - ENERGIA ELÉTRICA - MOTOCICLISTA ACIDENTADO EM RAZÃO DE QUEDA DE CABO DA REDE DE ENERGIA - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - CONFIRMAÇÃO. 1. Cerceamento de defesa - Preliminar sem consistência, por não esclarecer que fatos teria o suscitante interesse em demonstrar - Fatos descritos na peça de defesa, ademais, sem o condão de afastar a responsabilidade da ré. 2. Responsabilidade civil – Sem significado a alegação de ter o rompimento do cabo derivado da queda de galho de árvore em dia de fortes chuvas - Responsabilidade objetiva da concessionária de serviços públicos, seja nos termos do art. 37, § 69, da CF, seja do art. 14 do CDC - Fortuito não caracterizado - Reconhecimento da excludente que reclamaria descrição e demonstração de catástrofe natural, algo cujos resultados não pudessem ser evitados com o emprego de boa estrutura de serviços, de boa técnica - Quadro dos autos, além disso, sugerindo falha dos serviços, por provável falta de poda regular das árvores adjacentes à rede – Traumas oriundos do acidente, conquanto leves os ferimentos, bastantes para a caracterização de dano moral - Indenização bem fixada. Preliminar afastada; apelação desprovida.” (TJSP: Apelação 9177375-59.2005.8.26.0000; Relator (a): Ricardo Pessoa de Mello Belli; Comarca: Araraquara; Órgão Julgador: 25ª Câmara de Direito Privado; Data do Julgamento: 17/11/2009; Data de Registro: 03/12/2009.) [grifou-se] Responsabilidade civil objetiva da concessionária de energia elétrica - Acidente ocorrido com quem limpava vegetação rasteira na chácara cm que trabalhava e foi atingido por fio de alta tensão - Hipótese em que não se provou a culpa exclusiva da vítima – Laudo elaborado no local do acidente que, ademais, comprova a culpa da ré, embora essa culpa não necessitasse ser demonstrada no caso concreto - Cerceamento de defesa inexistente - Danos morais e estéticos fixados, por maioria, em quantias equivalentes a 50 (cinquenta) salários mínimos para cada um deles, de acordo com voto declarado do 3" Desembargador - Voto vencido do Relator Sorteado - Apelação provida em parte.” (TJSP: Apelação Com Revisão N/A; Relator (a): Romeu Ricupero; Órgão Julgador: 36ª Câmara de Direito Privado; Data do Julgamento: 14/08/2008) [grifou-se] Imperioso salientar que é em decorrência desta atividade potencialmente lesiva que advém a responsabilidade de reparação, em estrito atendimento à teoria do risco. Em outras palavras, “[...] a responsabilidade desloca-se da noção de culpa para a ideia de risco” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil: doutrina, jurisprudência. 5ª ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 309). A esse respeito, Hely Lopes Meirelles esclarece que: “A teoria do risco administrativo faz surgir a obrigação de indenizar o dano do só ato lesivo e injusto causado à vítima pela Administração. Não se exige qualquer falta do serviço público, nem culpa de seus agentes. Basta a lesão, sem o concurso do lesado. Na teoria da culpa administrativa, exige-se a falta do serviço; na teoria do risco administrativo exige-se, apenas o fato do serviço. Naquela, a culpa é presumida da falta administrativa: nesta, é inferida do fato lesivo da Administração. Aqui não se cogita da culpa da Administração ou de seus agentes, bastando que a vítima demonstre o fato danoso e injusto ocasionado por ação ou omissão do Poder Público. Tal teoria, como o nome está a indicar, baseia-se no risco que a atividade pública gera para os administrados e na possibilidade de acarretar dano a certos membros da comunidade, impondo-lhes um ônus não suportado pelos demais. Para compensar essa desigualdade individual, criada pela própria Administração, todos os outros componentes da coletividade devem concorrer para a reparação do dano, através do erário, representado pela Fazenda Pública. O risco e a solidariedade social são, pois, os suportes desta doutrina, que, por sua objetividade e partilha dos encargos, conduz à mais perfeita justiça distributiva, razão pela qual tem merecido o acolhimento dos Estados modernos, inclusive o Brasil, que consagrou pela primeira vez no art. 194, da CF de 1946.” (Direito Administrativo Brasileiro, 23ª ed. Malheiros: São Paulo, 1998, p. 532). [grifou-se] Dessarte, tratando-se de responsabilidade objetiva fulcrada na teoria do risco administrativo, como é cediço, a parte demandada tem que demonstrar, para se eximir da responsabilidade civil de indenizar, alguma circunstância que rompa o nexo de causalidade, tal qual força maior, fato exclusivo da vítima ou fato exclusivo e doloso de terceiro. Também é facultado à Ré demonstrar alguma circunstância que atenue a responsabilidade civil, como a prova de concorrência de causas. Esse mesmo entendimento, aliás, foi inserto no Código de Defesa do Consumidor, consoante lição de Sérgio Cavalieri Filho, segundo o qual: “Mesmo na responsabilidade objetiva não será demais repetir é indispensável o nexo causal. Esta é a regra universal, quase absoluta, só excepcionada nos raros casos em que a responsabilidade é fundada no risco integral, o que não ocorre no dispositivo em exame. Inexistindo relação e causa e efeito, ocorre a exoneração da responsabilidade. Indaga-se, então: quando o empresário poderá afastar seu dever de indenizar pelo fato do produto ou do serviço? Tal como no Código do Consumidor, a principal exclusão de responsabilidade do empresário será a inexistência de defeito. Se o produto ou serviço não tem defeito não haverá relação de causalidade entre o dano e a atividade empresarial. O dano terá decorrido de outra causa não imputável ao fornecedor de serviço ou fabricante do produto. Mas se defeito existir, e dele decorrer o dano, não poderá o empresário alegar imprevisibilidade, nem a inevitabilidade, para se eximir do dever de indenizar. Teremos o chamado fortuito interno, que não afasta a responsabilidade do empresário. Entende-se por fortuito interno o fato imprevisível e, por isso, inevitável ocorrido no momento da fabricação do produto. Não exclui a responsabilidade do fornecedor, porque faz parte da sua atividade, liga-se aos riscos do empreendimento, submetendo-se à noção geral de defeito de concepção do produto ou de formulação do serviço. Vale dizer, se o defeito ocorreu antes da introdução do produto no mercado de consumo não importa saber o motivo que determinou o defeito; o fornecedor é sempre responsável pelas suas consequências, ainda que decorrente de fato imprevisível e inevitável. O mesmo já não ocorre com o fortuito externo, assim entendido aquele fato que não guarda relação de causalidade com a atividade do fornecedor, absolutamente estranho ao produto ou serviço, via de regra ocorrido em momento posterior ao da sua fabricação ou formulação. Em caso tal nem se pode falar em defeito do produto, o que, a rigor, já estaria abrangido pela primeira excludente examinada inexistência de defeito.” (Sérgio Cavalieri Filho, na obra Programa de Responsabilidade Civil, 10 ed., Atlas, p. 71) [grifou-se] Fixadas essas premissas, é necessário saber se a causa eficiente dos danos causados relatados pela parte autora decorreram de fortuito interno ou externo, ou, ainda, se presente na espécie outra causa excludente do nexo de causalidade como a força maior ou a culpa exclusiva do consumidor. No caso sub judice, sugere a parte ré, com os quesitos e manifestações deduzidas acerca da prova técnica, que: a) o incêndio foi causado por "acontecimento natural"/ caso fortuito (queda de árvore por rajada de vento), aplicando-se ao caso o art. 393, do Código Civil; b) não é da empresa ré a responsabilidade pela poda das árvores próximas à rede elétrica em área rural; c) não houve solicitação de atuação da empresa ré antes da ocorrência dos fatos, para poda de árvores (ID 80075193, pág. 02); d) o incêndio ocorreu por conduta do próprio autor, ao desconsiderar a faixa de domínio decorrente da servidão administrativa para passagem da rede elétrica (ID 80075193, pág. 19). Menciona a NBR 15688/2012, itens 5.5 e 5.6, segundo a qual as redes de distribuição de energia elétrica em áreas rurais devem ter faixa de segurança de no mínimo 15m (7,5m para cada lado), e que é proibida a manutenção, na faixa de segurança apontada, de "árvores de grande porte" (literalidade da norma: "[...] permitindo-se apenas o plantio de culturas rasteiras e vedando-se a construção de edificações e assemelhados na referida faixa"); e) inexistência de Plano de Controle de Incêndio/ inexistência de aceiros - responsabilidade exclusiva e/ou concorrente do autor, com base na aplicação do preceito "duty to mitigate the loss" (ID 80075193, pág. 22). Ao fim, afirma que o autor não comprovou a extensão dos danos materiais alegados, fundamentando os valores apontados a título de indenização de pastagem e cerca em laudo de avaliação particular e unilateral (ID 77351568), apresentado anexo à inicial, sem correlação das informações apontadas com elementos de prova que os justifiquem. Ocorre que, ao revés do que pretende, as alegações vertidas não têm o condão de romper com o nexo etiológico e eximi-la da responsabilidade. No que se refere aos itens "a" e "b", nota-se que a queda de árvore ocasionada por rajada de vento, apesar de se tratar de evento natural, é evento previsível, e cujo resultado poderia ter sido evitado caso a concessionária ré tivesse realizado a poda preventiva no local (ou mesmo derrubada/supressão da vegetação indicada), para manutenção da segurança local. A responsabilidade da concessionária ré é, nesse caso e como alhures explanado, objetiva. Inaplicável, portanto, o art. 393 do CC. Quanto ao item "c", alega a parte autora que diversas solicitações de poda foram realizadas, anteriormente à ocorrência do incêndio, porém que o autor não tinha o cuidado de anotar os números de protocolo, por não imaginar o que aconteceria. Menciona o nome de ANDREIA DE OLIVEIRA JORGE, que teria ligado na data de 23/07/2021 (código único 21/1203647-1) para solicitar a necessária manutenção com poda das árvores (ID 80990722, pág. 02). Independentemente do pedido anterior à ocorrência dos fatos, a poda preventiva é obrigação da concessionária, o que é já pacificado, e cuja responsabilidade não se exime a concessionária pela existência ou não de solicitação prévia. Nesse sentido: APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – INCÊNDIO EM ÁREA RURAL – CURTO CIRCUITO NA REDE ELÉTRICA – EVENTO CAUSADO PELA FALTA DE PODA DE ÁRVORE EM SERVIDÃO ADMINISTRATIVA – RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA – DEVER INDENIZATÓRIO PARA REPARAÇÃO DAS PERDAS AMARGADAS PELO PROPRIETÁRIO – DANOS MATERIAIS – QUEIMA DE PLANTAÇÃO DE EUCALIPTO ATESTADA EM PROVA PERICIAL – DANOS MORAIS – EVIDENCIADOS – VERBA MANTIDA – ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA – INAPLICABILIDADE DA TAXA SELIC – RECURSO DA RÉ DESPROVIDO E RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDO. As concessionárias de serviço público, como é caso das fornecedoras de energia elétrica, à luz do art. 37, § 6.º, da Constituição Republicana, estão investidas de responsabilidade objetiva, devendo indenizar os danos causados a terceiros, decorrentes do exercício da atividade que lhe é concedida . É de responsabilidade das concessionárias, a manutenção da rede de energia elétrica, inclusive, promoção da poda das árvores próximas aos fios de tensão, conforme se extrai da inteligência do art. 31, da Lei n.º 8.987/95 . Constando do laudo pericial que o incêndio que atingiu a propriedade do autor teve origem em curto circuito, decorrente de contato de árvore situada na servidão administrativa, onde situada a rede de transmissão, fica evidente o dever indenizatório da concessionária, quanto aos danos decorrentes de sua omissão. A quantificação do dano moral deve observar os critérios de razoabilidade, tomando por base as condições econômicas daquele que pratica o ato ilícito, bem assim daquele que o sofreu, o grau da ofensa e as consequências suportadas pelo ofendido, para que a reparação não constitua fonte de enriquecimento indevido daquele que se viu ofendido, fazendo-se necessário, no caso, estabelecer-se uma correta proporcionalidade entre causa e efeito, como decidido. É inaplicável, nas demandas de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos materiais e compensação por danos morais, a taxa Selic, uma vez que esta não substitui a taxa legal de juros de mora e o IGP-M/FGV, que, por ser vinculado à inflação, é o índice monetário que melhor reflete as variações de preço na economia, mantendo o poder de compra da moeda. (TJ-MS - Apelação Cível: 08142927520228120001 Campo Grande, Relator.: Des . Marcelo Câmara Rasslan, Data de Julgamento: 02/10/2024, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 07/10/2024). Ademais, o grupo Energisa e seus colaboradores têm direitos legais de acesso a terras privadas e públicas para o manejo de vegetação que interfere na rede elétrica, conforme previsto no Decreto Federal nº. 24.643/1934, artigo 151. Já em relação à tese indicada ao item "d", nota-se que a norma em nenhum momento menciona expressamente a proibição de plantio de árvores na dita área de segurança. Apesar de ser possível inferir que tais árvores não deveriam existir na área de servidão (eucaliptos), nota-se pelas fotos tiradas do local que elas se encontram do lado de fora da cerca da propriedade do autor, e a concessionária poderia ter proibido o seu plantio e mesmo retirado a vegetação. O autor, a esse respeito, alega inclusive que não plantou as árvores indicadas, que supostamente já existiam quando da aquisição da propriedade rural (ID 80990722, pág. 20). No mais, a vegetação mantida no local pelo autor no lado de dentro da cerca é rasteira, consistente em pastagens para a criação de bovinos. Também não há qualquer indicação de que o autor tenha construído, na faixa de segurança mencionada, edificações ou assemelhados (ID 80990722, pág. 03). Demais disso, a prova pericial (Laudo elaborado por Engenheiro Agrônomo - ID 107937166, pág. 02) demonstrou que a causa determinante dos incêndios ocasionados na propriedade do autor, de fato, foram as descargas elétricas emitidas sobre a vegetação, após o rompimento dos cabos da rede elétrica de alta tensão, veja-se: [...] “QUESITO 14. Pode o Sr. Perito afirmar, com base nas respostas dadas aos quesitos anteriores, qual a causa do incêndio? Resposta: SIM. Agente ígneo provocado por fagulhas lançadas por fechamento de curto-circuito ocasionado pelo rompimento de cabo energizado ao tocar o solo. A presença de materiais altamente combustíveis (palhada de pastagens) intensificou as chamas provocando o sinistro. A resposta a esse quesito foi baseada nos dados obtidos a campo, onde foi constatado os seguintes pontos: i. A presença de cicatrizes de fogo nos palanques da cerca divisória frontal da propriedade, fotos IMG_0117 e 0114; Num. 104028619 - Pág. 34; ii. As manchas regulares de fogo, delimitadas em círculos amarelos nas fotos colacionadas aos autos e replicadas no laudo em comento, indicativas do efeito “chicote” do cabo sobre o solo. “Foto dos autos – Doc. id Num. 77351577 - Pág. 4.” e Num. 104028619 - Pág. 35; iii. A evolução histórica na área, com base em imagens de satélite em datas próximas ao sinistro, demonstrando os “Focos de Queimadas” e a mancha provocada pelo fogo nas pastagens, indicando o inicio das chamas na área frontal ao lote do requerente, espalhando-se pela área. Carta Imagens 01, 02 e 4, Num. 104028619 - Pág. 22, 26, 28 e 40. Deveras, reforçando essa conclusão, as imagens anexadas à exordial (ID 77351568), corroboradas pelo Parecer Técnico coligido (ID 77351569), confirmam a narrativa autoral. Assim, não havendo a ocorrência de fortuito externo ou força maior, nem mesmo prova de culpa exclusiva do consumidor, a pretensão deduzida encontra amparo na responsabilidade objetiva, em decorrência do risco da atividade desenvolvida pela parte ré que, por oscilação de tensão possa vir a causa danos a consumidores. De ver, portanto, que o pedido deve ser julgado procedente, por força da teoria do risco, não tendo a parte ré afastado o ônus processual que lhe incumbia, previsto no inciso II do artigo 373 do CPC. Diante do exposto, bem delineado o nexo de causalidade entre os danos sofridos pelo consumidor e a conduta atribuível à requerida, restou cabalmente configurada a responsabilidade desta pelo evento danoso, impondo-lhe o dever de indenizar a parte autora pelos prejuízos experimentados. Do dano moral: Com efeito, os danos morais são incontestes, relevando-se implícitos na própria ofensa, não havendo dúvidas do sofrimento suportado pela parte autora. Deveras, a descarga elétrica causou danificou pastagens e cercas da propriedade da parte autora, o que confirma o abalo moral e sofrimento emocional suportado. Em casos semelhantes, colhe-se da jurisprudência: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ROMPIMENTO DE CABO DE ENERGIA ELÉTRICA. INCÊNDIO EM IMÓVEL RURAL. DESTRUIÇÃO DE PASTAGENS. NEXO CAUSAL COMPROVADO. DANOS MATERIAIS. OBSERVADOS. DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO COMPORTÁVEL. 1. Verifica-se que há sim provas suficientes de que o incêndio ocorrido no imóvel de propriedade do recorrido se deu em função do serviço prestado pela requerida/apelante no dia do sinistro na propriedade vizinha, vez que comprovado que seus agentes estiveram no local, bem como o rompimento de cabo elétrico, conforme assim apontou o laudo pericial da Polícia Científica do Estado de Goiás, dando ensejo ao curto circuito, e, de consequência, ao incêndio. 2. Em relação ao dano material, verifica-se dos autos que houve a destruição de parte da vegetação em áreas consideradas de APPS e ainda de 27 hectares com pastagem formada para o consumo de duzentos animais semoventes, bem como de cercas de arame (laudo da Polícia Científica do Estado de Goiás). Assim, conforme exposto neste mesmo instrumento, os custos para aluguel de pastos para os semoventes, mão de obra e material e de reforma de pastagens e de construção de arames, vem ao encontro do pedido de reparação pretendido. 3. Quanto ao dano moral propriamente dito, dúvidas não há acerca dos dissabores sofridos pelo autor, ante aos inúmeros danos havidos em sua propriedade rural, em razão o incêndio ocorrido. Logo, em observando a estrutura econômica da empresa apelante, a gravidade do dano e os efeitos gerados, e, ainda, as peculiaridades do caso concreto, o valor arbitrado na sentença objurgada de R$ 10.000,00 (dez mil reais) cumpre a finalidade que lhe foi atribuída, atendendo aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, sem causar o enriquecimento indevido do apelado. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJGO - 53943687020178090113, Relator: DESEMBARGADOR ALAN SEBASTIÃO DE SENA CONCEIÇÃO - (DESEMBARGADOR), 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 11/03/2022) [grifou-se] “APELAÇÃO CÍVEL. Ação indenizatória. Incêndio. Queda de fio de alta-tensão. Nexo de causalidade. Comprovação. Concessionária de energia elétrica. Responsabilidade objetiva. Dano material. Configuração. Danos morais. Ocorrência. Valor. Manutenção. Recurso não provido. Tratando-se de alegação de defeito na prestação de serviço público, a responsabilidade civil é objetiva nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, competindo à fornecedora provar a ocorrência de alguma causa excludente dessa responsabilidade. É devida indenização por danos materiais pela queima de pastagem e cerca, decorrente de incêndio causado por rompimento de fio de energia de alta-tensão e o conjunto probatório demonstra o prejuízo experimentado pelo autor. Analisando o caso concreto e verificado que o incêndio, devastou grande área de pastagem necessários ao sustento familiar, está configurado abalo emocional passível de indenização por danos morais em favor do proprietário, mantendo-se o quantum arbitrado, observados os critérios de proporcionalidade e razoabilidade. (TJRO - AC: 70069860620218220007, Relator: Des. Alexandre Miguel, Data de Julgamento: 05/06/2023) [grifou-se] Apelação. Ação de indenização. Queda de poste e fio de alta-tensão. Morte de rebanho bovino. Dano material. Comprovação. A concessionária de energia responde objetivamente pela falha na prestação do serviço público que causa prejuízos materiais decorrentes da queda de um poste sem manutenção e o rompimento de um cabo de alta-tensão, utilizado para o fornecimento de energia elétrica na propriedade do consumidor, e compete a ela provar a ocorrência de alguma causa excludente dessa responsabilidade. Sentença mantida. (TJRO - AC 70055653620218220021, Relator: Des. Rowilson Teixeira, Data de Julgamento: 02/05/2023) “CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. A concessionária de serviço público encarregada do fornecimento de energia elétrica tem a obrigação de zelar pela perfeita manutenção de seus equipamentos e rede; deixando de fazê-lo, responde pelos danos daí resultantes. Recurso especial não conhecido.” (STJ - REsp 712231/CE, Rel. Min. Ari Pargendler, 3ª Turma, DJ 04.06.2007) [grifou-se] No tocante à fixação do valor para a reparação dos danos morais, deve-se levar em consideração a repercussão/extensão do dano causado (CC, art. 944), a intensidade do sofrimento da vítima, o grau de reprovabilidade da conduta, a função pedagógica do dano moral, a capacidade socioeconômica das partes e o princípio da proporcionalidade, tudo de forma a desestimular condutas semelhantes. Por outro lado, a indenização não pode ser fonte de enriquecimento indevido. Por esses motivos elencados, e diante das peculiaridades do presente caso, bem como atento a jurisprudência em casos análogos, a verba há de ser fixada no patamar de R$10.000,00 (dez mil reais), estabelecendo-se, desta maneira, um critério de razoabilidade, tendente a reconhecer e condenar o infrator a pagar valor que não importe enriquecimento sem causa, para aquele que suporta o dano e que sirva de reprimenda ao autor do ato lesivo, a fim desestimular a reiteração da prática danosa. Do dano material: Por fim, pede a parte autora, ainda, o ressarcimento do valor de R$335.835,00 (trezentos e trinta e cinco mil, oitocentos e trinta e cinco reais), referente às despesas com reparos da cerca e recuperação das pastagens (R$ 298.085,00), arrendamento de pastagens (R$ 30.000,00), diárias com trabalhadores para apagar o fogo (R$ 3.750,00), elaboração de laudo de avaliação de imóvel rural (R$ 3.000,00) e parecer técnico de incêndio florestal (R$ 1.000,00). É evidente que o incêndio lhe causou prejuízos, seja para que fosse combatido o incêndio, bem como mantida a atividade exercida na área rural (pecuária) e, ainda, pela necessidade de reconstrução das cercas e dos pastos, parcialmente destruídos quando do incêndio em questão. Todavia, em que pese os danos materiais tenham sido detalhados pelo Parecer Técnico e Laudo Pericial, que apontaram as perdas e danos (ID 77351568 e ID 104028619), não consta dos Autos todas as notas fiscais e/ou recibos necessários para comprovar a aquisição de produtos e serviços nos valores apontados, seja pelo próprio autor, seja pelo Parecer Técnico (R$ 298.085,00) e/ou Laudo Pericial (R$ 377.021,27). Vale lembrar que não houve, no decorrer da demanda, a inversão do ônus probatório, em que pese a responsabilidade objetiva atribuída à concessionária (ID 90770699). Desta feita, caberia ao autor a comprovação dos danos alegados, em especial o dano material. Em comparação dos valores apresentados pelo laudo pericial e pelo pedido inicial, baseado em parecer técnico e outros documentos, temos: Item Pedido inicial Laudo Pericial Reparos da cerca R$ 66.875,20 R$ 78.640,80 Recuperação das pastagens R$ 231.210,00 R$ 231.315,51 Arrendamento de pastagens R$ 30.000,00 R$ 67.064,96 Diárias com trabalhadores para apagar o fogo R$ 3.750,00 - Elaboração de laudo de avaliação de imóvel rural R$ 3.000,00 - Parecer técnico de incêndio florestal R$ 1.000,00 - Preliminarmente, aponto que o valor elencado em laudo pericial implicaria em decisão ultra petita, na medida em que excede o pedido inicial do autor, tanto como valor global quanto por item avaliado, estando portanto fora de cogitação a título de condenação da requerida. Não é outro o entendimento da jurisprudência pátria: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE, COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA, CUMULADA COM RESCISÃO DE CONTRATO DE ARRENDAMENTO COM PERDAS E DANOS. CONTRATO DE ARRENDAMENTO RURAL. DESCUMPRIMENTO DO ARRENDADOR . RESCISÃO CONTRATUAL. DANOS MATERIAIS NA MODALIDADE LUCROS CESSANTES. VALOR A SER APURADO EM SEDE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. DECISÃO ULTRA PETITA. PRINCÍPIO DA ADSTRIÇÃO. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AO VALOR DADO A CAUSA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS . 1. De acordo com o Princípio da Adstrição, a prestação jurisdicional deve corresponder exatamente ao pedido, não podendo o juízo conceder mais do que foi objeto da pretensão da parte autora. 2. Sendo arbitrado danos materiais, na modalidade lucros cessantes, a serem apurados em sede de liquidação de sentença, necessário se faz a sua limitação ao valor atribuído a causa, em observância ao Princípio da Adstrição, de modo a evitar o deferimento de pedido condenatório em montante superior àquele formulado na petição inicial . 3. Ante o parcial provimento do recurso, deixa-se de majorar a verba de sucumbência fixada na instância originária, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA (TJ-GO - Apelação Cível: 50924552320218090102 MARA ROSA, Relator.: Des(a). Hamilton Gomes Carneiro, Mara Rosa - 1ª Vara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ de 29/01/2024). CONTRATOS. CEF. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. SENTENÇA EXTRA PETITA PARCIALMENTE ANULADA . DANO MATERIAL COMPROVADO. LIMITAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO AO PEDIDO INICIAL. DANO MORAL NÃO COMPROVADO. 1 . Nulidade parcial da sentença, no ponto em que condena a CEF ao pagamento de indenização por dano material em valor superior ao pedido inicial. 2. Danos materiais apurados em regular perícia judicial. 3 . Fixação da responsabilidade da CEF pelos danos materiais, pela violação de suas atribuições de garantir pela integridade e boas condições de habitabilidade do imóvel. 4. Limitação do valor da indenização por danos materiais ao valor apontado no pedido inicial. 5 . Não comprovação da ocorrência de dano moral, por não terem os vícios de construção se constituído em óbice à habitabilidade do imóvel. 6. Recurso da CEF a que se dá parcial provimento (TRF-3 - RecInoCiv: 00045346720214036325, Relator.: Juiz Federal JOAO CARLOS CABRELON DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 06/09/2023, 13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, Data de Publicação: DJEN DATA: 18/09/2023). No mais, é cediço que para reparação pelos danos patrimoniais, faz-se necessário a efetiva comprovação da ação ou omissão voluntária do indivíduo, negligência ou imprudência (art.186, do Código Civil). Assim, tendo em conta que houve a comprovação parcial das despesas realizadas, não há como compelir a requerida à reparação pelos danos não comprovados. Nesse sentido: EMENTA DIREITO CIVIL. RECURSOS DE APELAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. INCÊNDIO EM PROPRIEDADE RURAL . RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. REPARAÇÃO PATRIMONIAL. PEDIDO DE RESSARCIMENTO INTEGRAL. INVIABILIDADE . COMPROVAÇÃO PARCIAL DE VALORES DESPENDIDOS. DANOS MORAIS. MAJORAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS . SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE AFASTADA. PRECEDENTES. RECURSO DA RÉ, NÃO PROVIDO. APELO DO AUTOR, PARCIALMENTE PROVIMENTO . I. CASO EM EXAME 1. Recursos de apelação interpostos, visando à reforma da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos de indenização por danos materiais e morais decorrentes de incêndio em propriedade rural. A sentença condenou a concessionária ao pagamento de R$ 58 .597,90 por danos materiais e R$ 8.000,00 por danos morais, além de custas e honorários advocatícios. O autor busca a complementação do valor dos danos materiais, a majoração dos danos morais e o afastamento da suspensão da exigibilidade dos honorários advocatícios. A ré Energisa, por sua vez, contesta a responsabilidade, o nexo causal e os valores indenizatórios [...]. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10220701920228110041, Relator.: SERLY MARCONDES ALVES, Data de Julgamento: 29/01/2025, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 01/02/2025). Das pastagens: Requereu o valor de R$ 231.210,00 a título de recuperação das pastagens. No laudo pericial, o profissional apontou que efetuou os cálculos considerando a "[...] qualidade da área impactada, descrita como Pastagens Mecanizadas (39,2118ha)" (ID 104028619, p. 39). Entretanto, não foi apresentada comprovação da mecanização da área, seja em período anterior ou posterior ao incêndio. Ademais, as fotos apresentadas de período posterior à ocorrência demonstram a existência da vegetação (pastagem) "ainda em recuperação". Ou seja, em um processo de recomposição natural, sem replantio. Note-se que antigamente, o fogo era muito utilizado para recuperar o potencial de rebrota das forrageiras, bem como para controlar as rebrotas de plantas invasoras nas áreas, coforme mencionado pela EMBRAPA (disponível em: EMBRAPA. Agricultura de baixo carbono: tecnologias e estratégias de implantação. Cap. 4. Disponível em: ) . Desta feita, a pastagem poderia se recompor naturalmente, ainda que não ao mesmo nível se comparado à utilização de sementes e adubação, em um período de aproximadamente 45 a 60 dias, a depender das circunstâncias climáticas, de solo, etc. (BABROSA, Rodrigo Amorim. Manejo e cuidados no primeiro manejo. Disponível em: ). Há que se considerar, entretanto, que os fatos ocorreram em plena seca no estado de Rondônia, ao final de agosto/2021, sendo necessário a retomada das chuvas (mês de novembro em diante) para o início da recuperação efetiva da vegetação, que avançaria até o início do ano seguinte. Nesse sentido ainda (disponível em: EMBRAPA. Agricultura de baixo carbono: tecnologias e estratégias de implantação. Cap. 4. Disponível em: ): O fogo é usado principalmente para recuperar o potencial de rebrota da forrageira e, também, para controlar as rebrotas de plantas invasoras na área. Antigamente, essa recomendação informação, especialmente nos locais mais longínquos. Assim, sem saber sobre quais seriam as melhores recomendações para que essa prática não fosse utilizada, o fogo era a única alternativa. [...] Muito embora para algumas espécies de capins, como o gênero Andropogon, a rebrota ocorra mesmo na ausência de chuvas, os pecuaristas que adotam essa prática não conseguem perceber os efeitos nocivos. Queimas frequentes prejudicam as plantas forrageiras por esgotarem as reservas das raízes e da base do caule, diminuindo o vigor de rebrota (p. 121-122). É evidente, portanto, que existe uma rebrota que ocorre naturalmente, ainda que reste prejudicado o solo por conta dos efeitos da queimada, e seja preciso fazer algum replantio em lugares pontuais da pastagem. Desta feita, não há como presumir que houve mecanização, adubação e novo plantio em toda a área pelo autor, tal qual requerido a título de indenização. Não havendo a consecução de tais dispêndios, também não há uma causa concreta que leve à obrigação de indenizar, neste ponto. No caso dos Autos, o único comprovante de desembolso apresentado pelo autor foi o que segue: R$ 7.500,00 (ID 77351576, pág. 05) - 32 horas de serviço de trator com gradeamento, aterro e "empurrar pau com fogo para longe da pastagem". Assim, considerando que o autor não coligiu qualquer outro comprovante de desembolso com a inicial, consistente em notas fiscais para aquisição de insumos, por exemplo (sementes, adubo, etc.), não há como prosperar a alegação de que teria desembolsado determinada quantia com a recomposição da área, que ao que tudo indica se regenerou naturalmente. Aponto que o processo foi distribuído em 24/05/2022, já passados 09 meses dos fatos objeto de discussão. Ressalto que a parte autora apresentou documentos novos em petição de ID 100015290, com notas fiscais de aquisição de calcário (para correção da acidez do solo) e adubo/ fertilizante, além de herbicidas (Garlon e Trueno XP), utilizados em tese na recuperação da pastagem e, conforme o próprio autor, utilizados "[...] para uma área maior que a atingida pelo fogo", sem especificar qual seria a quantidade de produtos utilizados especificamente na área queimada. Tais comprovantes datam de março, abril, maio, junho, setembro e outubro/2023, ou seja, mais de um ano e meio após a ocorrência dos fatos discurtidos nos presentes Autos, de modo que não há como reconhecer que os gastos indicados guardam relação direta com a queima de parte da área do autor. Dois dos recibos datam de março e abril/2022 (fertilizantes - ID 100015292, pág. 02 e 03 - valores de R$ 128.000,00 e R$ 64.000,00, totalizando R$ 192.000,00), o que coincide com o período de chuva na região após tempo suficiente para a recomposição natural e/ou replantio do pasto, de modo que poderia ser reconhecida a relação entre o dispêndio com o dano sofrido na área. Nota-se, entretanto, que os documentos não podem ser considerados documentos novos, posto que juntados aos Autos apenas na data de 18/12/2023, entretanto, já existentes desde antes do protocolo da incial, que se deu em 24/05/2022. Tratam-se, portanto, de comprovantes "velhos", que deveriam ter sido juntados com a inicial e não o foram, precluindo o direito autoral de fazê-lo (art. 435, CPC). Desta feita, defiro o pedido tão somente na medida do quanto comprovado com a inicial, equivalente a R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais). Da cerca: Pleiteou o valor de R$ 66.875,20 a título de cercas novas (insumos e mão de obra). De outro modo, em relação aos danos causados nas cercas das pastagens, embora não tenha a parte autora angariado notas fiscais comprovando eventual desembolso, inequívoca a existência desses prejuízo, conforme narrativa apontada em Laudo Pericial de ID 104028619, pág. 44; substituições estas que já haviam sido realizadas quando da vistoria in loco realizada pelo perito. Desta feita, reconheço o valor estimado pelo perito como devido, a título de indenização pelas cercas refeitas, em R$ 78.640,80 (setenta e oito mil, seiscentos e quarenta reais e oitenta centavos), que limito para o valor apresentado com o pedido inicial, qual seja, R$ 66.875,20 (sessenta e seis mil, oitocentos e setenta e cinco reais e vinte centavos). Do arrendamento de pastagens Requereu o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais). Apesar do contrato de arrendamento juntado, para o período de 01 ano, há que se destacar que, nem mesmo se o pasto fosse replantado mecanicamente seria necessário a espera de 01 ano para sua reutilização. Isso porque "[...] o tempo de formação [da pastagem Braquiaria Brizatha, mesma espécie que já existia na propriedade do autor, conf. ID 77351568, pág. 05] gira em torno de 90 a 120 dias após germinação" (Brachiaria Brizantha cv. Marandú). Desta feita, considerando-se o início da época de chuvas na região de Rondônia para novembro de cada ano, e que o evento danoso ocorreu ao final de agosto/2021, o período ideal para replantio e bom desenvolvimento da espécie seria até meados de março/2022. Ou seja, um total de 07 meses de arrendamento (do final de agosto/2021 a meados de março/2022, quando o plantio realizado em época de chuva - novembro/2021 - já estaria apto à reutilização/ pastagem pelo gado), do total de 12 meses de contrato firmado entre o autor e terceiro. O contrato de arrendamento foi firmado em 25/07/2021, pelo período de 12 meses, para a utilização por até 100 cabeças de gado, e sendo a mão de obra por conta do autor (arrendatário), pelo valor global de R$ 30.000,00 (trinta mil reais). O comprovante de pagamento foi apresentado ao ID 77351573. As Guias de Trânsito Animal comprovam o transporte de 100 cabeças de gado da propriedade do autor à área arrendada, no mês de agosto/2021. Apesar de o contrato ter sido firmado em momento anterior ao incêndio (já que o incêndio data de 23/08/2021, e o contrato de arrendamento foi firmado em 25/07/21), fato é que o autor foi privado da utilização de parte considerável de sua terra, e isso basta para gerar a obrigação de indenizar, que fixo em R$ 17.500,00 (dezessete mil e quinhentos reais), equivalente a 07 meses do arrendamento firmado. Por fim, aponto que os custos com deslocamento e custos indiretos para manutenção dos bovinos, apesar de descritos em laudo pericial (ID 104028619, pág. 43), não compuseram o pedido inicial do autor, de modo que sequer cabe a análise. Das diárias com trabalhadores para apagar o fogo Requereu o valor de R$ 3.750,00. Relativamente à mão de obra para apagar o fogo, o autor comprovou os seguintes valores, por meio da apresentação de recibos de pagamento: R$ 750,00 (ID 77351576, pág. 01); R$ 750,00 (ID 77351576, pág. 02 e 04 - recibos idênticos); R$ 750,00 (ID 77351576, pág. 03); Total: R$ 2.250,00 Pelo exposto, defiro o pedido na medida do quanto comprovado nos Autos, ou seja, R$ 2.250,00 (dois mil, duzentos e cinquenta reais). Da elaboração de laudo de avaliação de imóvel rural e parecer técnico de incêndio florestal Requereu o valor de R$ 4.000,00, devidamente comprovado, na forma que segue: RECIBO LAUDO DE AVALIAÇÃO - R$ 3.000,00 - ID 77351578, pág. 01; PARECER TÉCNICO DE INCÊNDIO FLORESTAL - R$ 1.000,00 - ID 77351581, pág. 01 e 02. Devido, portanto, o ressarcimento do valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), visto que a documentação indicada foi essencial ao deslinde do feito, e comprovação dos direitos do autor. Esclareço, ainda, que é entendimento assente de nossa jurisprudência que o órgão judicial, para expressar a sua convicção, não precisa aduzir comentário sobre todos os argumentos levantados pelas partes. Sua fundamentação pode ser sucinta, pronunciando-se acerca do motivo que, por si só, achou suficiente para a composição do litígio, cumprindo-se os termos do artigo 489 do CPC, não infringindo o disposto no §1º, inciso IV, do aludido artigo. No mesmo sentido: “O juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para fundamentar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por elas e tampouco a responder um a um todos os seus argumentos” (STJ - 1ª Turma, AI 169.073 SPAgRg, Rel. Min. José Delgado, j. 4.6.98, negaram provimento, v. u., DJU 17.8.98). O Código de Processo Civil previu que o julgador deve exercer o convencimento motivado e fundamentado, mantendo o entendimento de que nem todas as questões suscitadas pelas partes precisam ser enfrentadas, salvo se estiverem aptas para infirmar a conclusão do julgado. Prejudicadas ou irrelevantes as demais questões dos autos. ANTE O EXPOSTO, e considerando tudo que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais deduzidos por EVERSON PEREIRA DOS SANTOS em desfavor de ENERGISA RONDONIA - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A, o que faço para: a) CONDENAR a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais, fixada em R$10.000,00 (dez mil reais), com juros de mora de 1% ao mês, incidentes desde a data do evento danoso (art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ), sem prejuízo da correção monetária, esta calculada a partir da data da prolação desta sentença (Súmula 362 do STJ); b) CONDENAR a parte ré a restituir os danos materiais amargados pela parte autora, no importe de R$98.125,20 (noventa e oito mil, cento e vinte e cinco reais e vinte centavos), incidindo juros de mora de 1% ao mês, a contar do evento danoso (art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ), bem como correção monetária, a contar também do efetivo desembolso (Súmula 43 do STJ). Para fins de correção monetária, deverá ser utilizada a Tabela Prática deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia (INPC). Custas na forma da lei, pela parte ré. Pelo princípio da causalidade, condeno a parte ré, ainda, ao pagamento das despesas processuais e honorários de advogado, os quais fixo em 10% do valor da condenação, com fulcro no artigo 85, § 2º, do CPC. Por fim, de modo a evitar o ajuizamento de embargos de declaração, registre-se que, ficam preteridas as demais alegações, por incompatíveis com a linha de raciocínio adotada, observando que o pedido foi apreciado e rejeitado nos limites em que foi formulado. Por consectário lógico, ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 1026, § 2º, do Código de Processo Civil. Na hipótese de interposição de apelação, tendo em vista a nova sistemática estabelecida pelo CPC que extinguiu o juízo de admissibilidade a ser exercido pelo Juízo “a quo” (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão, intime-se a parte contrária para que ofereça resposta no prazo de 15 (quinze) dias. Havendo recurso adesivo, também deve ser intimada a parte contrária para oferecer contrarrazões. Caso nada seja requerido, após o trânsito em julgado desta, observadas as formalidades legais, dê-se baixa e arquivem-se os autos com as anotações de estilo. Sentença registrada. Publique-se. Intimem-se. SERVIRÁ A PRESENTE SENTENÇA COMO OFÍCIO/ MANDADO DE INTIMAÇÃO/NOTIFICAÇÃO E/OU CARTA PRECATÓRIA. Ariquemes, 9 de julho de 2025 MARCUS VINICIUS DOS SANTOS DE OLIVEIRA Juiz de Direito
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