Processo nº 5003928-58.2025.4.04.7206
ID: 330203284
Tribunal: TRF4
Órgão: 2° Núcleo de Justiça 4.0 - SC
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5003928-58.2025.4.04.7206
Data de Disponibilização:
21/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DANIELA CARMO DO AMARAL
OAB/SC XXXXXX
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PROCEDIMENTO COMUM Nº 5003928-58.2025.4.04.7206/SC
AUTOR
: MARINA SOMAVILLA FEVERSANI
ADVOGADO(A)
: DANIELA CARMO DO AMARAL (OAB SC033848)
DESPACHO/DECISÃO
1.
Trata-se de ação de obrigação de fazer …
PROCEDIMENTO COMUM Nº 5003928-58.2025.4.04.7206/SC
AUTOR
: MARINA SOMAVILLA FEVERSANI
ADVOGADO(A)
: DANIELA CARMO DO AMARAL (OAB SC033848)
DESPACHO/DECISÃO
1.
Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c pedido de tutela de urgência em que a parte autora pretende a concessão do(s) medicamento(s) descrito(s) na petição inicial, onde consta ainda o relato de seu quadro clínico e as razões para o ajuizamento da ação.
Requereu AJG.
O parecer técnico foi apresentado pelo NatJus/SC.
Decido.
2.
Nos termos do art. 300 do CPC:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1 o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
De acordo com o diploma processual, para concessão da tutela de urgência, o magistrado, ao apreciar tal pedido, deve fazê-lo em nível de cognição sumária, sendo que os requisitos para a concessão delas são
(i)
o juízo de probabilidade e
(ii)
perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
No que tange à probabilidade do direito, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema 106 de Recurso Repetitivo (REsp 1657156/RJ), fixou a seguinte tese:
A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:
(i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento,
assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS
;
(ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
(iii) existência de registro na ANVISA do medicamento. (grifei em sublinhado)
Ainda, o Supremo Tribunal Federal julgou o mérito do Tema 1.161 de repercussão geral ((RE 1165959) e reafirmou o entendimento firmado no Tema 500 de repercussão geral (RE 657.718), estabelecendo o
"dever do Estado de fornecer medicamento que, embora não possua registro na ANVISA, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária"
(Tribunal Pleno, Min. Rel. Marco Aurélio, j. 08/07/2021).
Sob outro viés, cumpre destacar que o direito à saúde, como qualquer outro, não é absoluto. A concretização desse direito fundamental envolve um complexo conflito entre as limitações orçamentárias do Estado, a necessidade de universalização na melhor medida possível dos procedimentos disponibilizados pelo sistema público de saúde e a necessidade do cidadão, por vezes inadiável, de acesso a determinado tratamento.
Ante a exigência de compatibilização entre as políticas públicas na área da saúde e a necessidade de tutela judicial nos casos de omissão estatal, surgem fundados questionamentos a respeito dos limites da atuação do Poder Judiciário a fim de garanti-lo.
Tal discussão deve ter como ponto de partida o reconhecimento de que a concretização do direito universal à saúde deve ocorrer principalmente por intermédio de políticas públicas, conforme prevê de forma expressa o art. 196 da CF, a serem estabelecidas no âmbito de gestão do SUS, a partir de critérios técnico-científicos quanto à sua eficácia, assim como econômicos quanto à sua possibilidade de custeio.
Nesse contexto, foi criada pela Lei n. 12.401/2011 a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde – Conitec, que dispõe sobre a assistência terapêutica e a incorporação de tecnologia em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde.
A Comissão, assistida pelo Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde - DGITS, tem por objetivo assessorar o Ministério da Saúde - MS nas atribuições relativas à incorporação, exclusão ou alteração de tecnologias em saúde pelo SUS, bem como na constituição ou alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica.
Qualquer incorporação, exclusão ou alteração de medicamentos pelo SUS é efetuada mediante a instauração de processo administrativo, tratando-se, portanto, de ferramenta definidora de políticas públicas.
O custeio de tratamento médico por parte do Poder Público deve ser realizado dentro de diretrizes que permitam proporcionar o mais eficaz tratamento ao maior número de pessoas, o que torna imprescindível a observância de imperativos como o da economicidade na seleção, aquisição e dispensa de tratamentos.
A intervenção do Judiciário a fim de obrigar o Poder Público a fornecer determinado tratamento deve, assim, ocorrer de forma limitada, visando sobretudo à concretização do acesso universal aos tratamentos oferecidos pela rede pública ou a fim de corrigir ilegalidades, omissões ou equívocos nas decisões tomadas pelos órgão gestores desse sistema, garantindo-se, por um lado, a manutenção de equilíbrio do sistema único e, de outro, impedindo que eventual atuação omissiva ou falha do Estado implique em negação a direito fundamental do cidadão.
Não havendo evidências reais e suficientes que demonstrem erro do Poder Público na não inclusão do medicamento para fornecimento geral e universal à população e não existindo evidência científica suficiente da real superioridade do medicamento, em linhas gerais, não é cabível a dispensação do fármaco demandado judicialmente.
Nesta linha, oportuno o destaque de que em 19/09/2024, foi publicado o julgamento de mérito do Tema n. 1.234, no Supremo Tribunal Federal, onde restaram estabelecidos critérios para análise judicial do ato administrativo de indeferimento de medicamento pelo SUS:
IV – Análise judicial do ato administrativo de indeferimento de medicamento pelo SUS.
4) Sob pena de nulidade do ato jurisdicional (art. 489, § 1º, V e VI, c/c art. 927, III, § 1º, ambos do CPC), o Poder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo da não incorporação pela Conitec e da negativa de fornecimento na via administrativa, tal como acordado entre os Entes Federativos em autocomposição no Supremo Tribunal Federal.
4.1) No exercício do controle de legalidade, o Poder Judiciário não pode substituir a vontade do administrador, mas tão somente verificar se o ato administrativo específico daquele caso concreto está em conformidade com as balizas presentes na Constituição Federal, na legislação de regência e na política pública no SUS.
4.2) A análise jurisdicional do ato administrativo que indefere o fornecimento de medicamento não incorporado restringe-se ao exame da regularidade do procedimento e da legalidade do ato de não incorporação e do ato administrativo questionado, à luz do controle de legalidade e da teoria dos motivos determinantes, não sendo possível incursão no mérito administrativo, ressalvada a cognição do ato administrativo discricionário, o qual se vincula à existência, à veracidade e à legitimidade dos motivos apontados como fundamentos para a sua adoção, a sujeitar o ente público aos seus termos.
4.3) Tratando-se de medicamento não incorporado, é do autor da ação o ônus de demonstrar, com fundamento na Medicina Baseada em Evidências, a segurança e a eficácia do fármaco, bem como a inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS.
4.4) Conforme decisão da STA 175-AgR, não basta a simples alegação de necessidade do medicamento, mesmo que acompanhada de relatório médico, sendo necessária a demonstração de que a opinião do profissional encontra respaldo em evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados, revisão sistemática ou meta-análise.
E em 30/09/2024, houve a publicação do julgamento do mérito do Tema 6, em que o Supremo Tribunal Federal acrescentou critérios para a análise judicial de concessão de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado ao SUS, ao portador de doença grave que não possui condições financeiras para comprá-lo:
1.
A ausência de inclusão de medicamento nas listas de dispensação do Sistema Único de Saúde - SUS (RENAME, RESME, REMUME, entre outras) impede, como regra geral, o fornecimento do fármaco por decisão judicial, independentemente do custo.
2.
É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação:
(a)
negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item ‘4’ do Tema 1.234 da repercussão geral;
(b)
ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei nº 8.080/1990 e no Decreto nº 7.646/2011;
(c)
impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas;
(d)
comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise;
(e)
imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo médico fundamentado, descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e
(f)
incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento.
3.
Sob pena de nulidade da decisão judicial, nos termos do artigo 489, § 1º, incisos V e VI, e artigo 927, inciso III, § 1º, ambos do Código de Processo Civil, o Poder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente:
(a)
analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo de não incorporação pela Conitec ou da negativa de fornecimento da via administrativa, à luz das circunstâncias do caso concreto e da legislação de regência, especialmente a política pública do SUS, não sendo possível a incursão no mérito do ato administrativo;
(b)
aferir a presença dos requisitos de dispensação do medicamento, previstos no item 2, a partir da prévia consulta ao Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NATJUS), sempre que disponível na respectiva jurisdição, ou a entes ou pessoas com expertise técnica na área, não podendo fundamentar a sua decisão unicamente em prescrição, relatório ou laudo médico juntado aos autos pelo autor da ação; e
(c)
no caso de deferimento judicial do fármaco, oficiar aos órgãos competentes para avaliarem a possibilidade de sua incorporação no âmbito do SUS”.
Fixadas as premissas, passo à análise do caso concreto.
Caso Concreto
De acordo com documentos acostados aos autos, a parte autora apresenta diagnóstico de Doença de Crohn (CID 10 K50). Neste cenário, foi indicado o uso de Ustequinumabe (Stelara) 130mg (dose de ataque), e dose manutenção de 90mg (
evento 1, DOC11
, p.2).
O caso foi analisado pelo NATJus/SC, com nota técnica favorável à concessão da tecnologia (
evento 12, NOTATEC1
):
Tecnologia: USTEQUINUMABE
Conclusão Justificada: Favorável
Conclusão: CONSIDERANDO-SE o diagnóstico de doença de Crohn desde de 2016 com acometimentro do íleo terminal, segundo dados de relatório médico detalhado anexado aos autos na página 42 datado de 27/02/2025. CONSIDERANDO-SE o tratamento com azatioprina e associação com infliximabe de 2017 a 2023, sendo otimizado no último ano; evoluindo com tuberculose pleural psoríase paradoxal sendo suspenso o infliximabe. CONSIDERANDO-SE o exame de colonoscopia anexado aos autos na página 44 e 45 datada de 17/04/2025 e comprobatória de doença Crohn em atividade. CONSIDERANDO-SE que o tratamento visa à melhora clínica dos sintomas, com controle da doença e de suas manifestações, ou seja, sua remissão clínica, além da utilização de fármacos Página 3 de 5 com melhor perfil de segurança. CONSIIDERANDO-SE a contraindicação a continuidasde do tratamento com droga anti-TNF devido ao passado de tuberculose e psoríase paradoxal. CONSIDERANDO-SE a disponibilidade do ustequinumabe no âmbito do SUS para o tratamento da Doença de Crohn e o perfil de segurança da medicação pleiteada frente ao infliximabe. CONSIDERANDO-SE que há evidência na literatura médico-científica de que a terapia com ustequinumabe pode beneficiar pacientes com Doença de Crohn refratária ou com contraindicação às opções terapêuticas já disponíveis no SUS, inclusive drogas anti-TNF como o infliximabe já utilizados pela paciente.
CONCLUI-SE que HÁ elementos técnicos suficientes para indicar o uso de USTEQUINUMABE no caso em questão em caráter de urgência.
Há evidências científicas? Sim
Justifica-se a alegação de urgência, conforme definição de Urgência e Emergência do CFM? Sim
Válido destacar que a CONITEC recentemente recomendou a incorporação do Ustequinumabe para o tratamento de pacientes com doença de Crohn ativa moderada a grave no PCDT da doença, sendo a tecnologia incorporada ao SUS por meio da Portaria SECTICS/MS nº 1, de 22 de janeiro de 2024
1
:
PORTARIA SECTICS/MS Nº 1, DE 22 DE JANEIRO DE 2024
Torna pública a decisão de incorporar, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, o ustequinumabe para o tratamento de pacientes com doença de Crohn ativa moderada a grave, conforme Protocolo Clínico do Ministério da Saúde.
Ref.: 25000.062446/2023-53.
O SECRETÁRIO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO E DO COMPLEXO ECONÔMICO-INDUSTRIAL DA SAÚDE - SUBSTITUTO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, no uso das atribuições que lhe conferem a alínea "c" do inciso I do art. 32 do Decreto nº 11.798, de 28 de novembro de 2023, e tendo em vista o disposto nos arts. 20 e 23 do Decreto nº 7.646, de 21 de dezembro de 2011, resolve:
Art. 1º Incorporar, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, o ustequinumabe para o tratamento de pacientes com doença de Crohn ativa moderada a grave, conforme Protocolo Clínico do Ministério da Saúde.
Art. 2º Conforme determina o art. 25 do Decreto nº 7.646, 21 de dezembro de 2011, as áreas técnicas terão o prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias para efetivar a oferta no SUS.
Art. 3º O relatório de recomendação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde -Conitec sobre essa tecnologia estará disponível no endereço eletrônico: https://www.gov.br/conitec/pt-br.
Art. 4º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
LEANDRO PINHEIRO SAFATLE
As informações financeiras revelam que a renda da parte é insuficiente para o custeio da tecnologia (
evento 1, CHEQ6
), frente ao valor do medicamento
A negativa administrativa de dispensação da tecnologia pleiteada restou devidamente comprovada.
Destaco que os requisitos do Tema 106 do STJ seriam até mesmo dispensáveis no caso concreto, já que o pedido diz respeito a tecnologia com recomendação favorável à incorporação, exatamente para o quadro clínico apresentado pela parte autora.
Portanto, ilegal a negativa, pois na contramão da própria escolha do Administrador ao definir as políticas de saúde neste aspecto.
Demonstrados, portanto, os requisitos exigidos pelo art. 300 do CPC, o deferimento da tutela antecipatória é a medida que se impõe.
Coeficiente de adequação de preços para compra de medicamento adquirido por força de ordem judicial
O Coeficiente de Adequação de Preços – CAP, estabelecido na Resolução CMED nº 4, de 18 de dezembro de 2006, é um desconto mínimo obrigatório, atualizado anualmente, que deve ser aplicado sempre que forem realizadas vendas de medicamentos, constantes do rol divulgado pela CMED e nas compras de todos os medicamentos por força de decisão judicial, destinadas aos entes da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, independentemente de constarem da relação de produtos cujos preços serão a ele submetidos.
O CAP será aplicado sobre o Preço Fábrica - PF e resultará no Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG).
De acordo com a Resolução n. 3, de 02 de março de 2011, o Coeficiente de Adequação de Preços (CAP) deve ser aplicado pelas distribuidoras, empresas produtoras de medicamentos, representantes, postos de medicamentos, unidades volantes, farmácias e drogarias, aos produtos definidos no art. 2º da Resolução, inclusive aos produtos comprados por força de decisão judicial, sempre que realizarem vendas destinadas a entes da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Importante destacar que recentemente a Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região, nos autos do processo SEI nº 0000926-45.2024.4.04.8001, com base na Recomendação nº 146 de 28/11/2023 do Conselho Nacional de Justiça, formulou recomendação aos juízes para que incluam nas decisões que deferem aquisições judiciais de medicamentos com o uso de recursos públicos a obrigatoriedade da aplicação do CAP e PMVG, mencionando que " a obrigatoriedade do CAP foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no RMS 28.487/DF, reforçando a constitucionalidade do desconto como fator de ajuste de preços;".
Vale dizer que o STF, no julgamento do Tema 1234, sedimentou a importância da matéria, ao utilizar o PMVG como parâmetro para fins de análise da competência, bem como ao estabelecer que na determinação judicial de fornecimento de medicamento o magistrado deverá estabelecer que o valor de venda do medicamento seja limitado ao preço com desconto, proposto no processo de incorporação na Conitec (se for o caso, considerando o venire contra factum proprium/tu quoque e observado o índice de reajuste anual de preço de medicamentos definido pela CMED), ou valor já praticado pelo ente em compra pública, aquele que seja identificado como menor valor, tal como previsto na parte final do art. 9º na Recomendação 146, de 28.11.2023, do CNJ. Sob nenhuma hipótese, consignou o STF, poderá haver pagamento judicial às pessoas físicas/jurídicas referenciadas em valor superior ao teto do PMVG, devendo ser operacionalizado pela serventia judicial junto ao fabricante ou distribuidor.
A respeito do preço de eventual aquisição do medicamento na rede privada, à vista da presente decisão, deverá o fornecedor ser informado de que se trata de aquisição por ordem judicial, com recursos públicos, a fim de que seja aplicado o Coeficiente de Adequação de Preços (CAP) previsto na Resolução n. 3, de 2011, da CMED.
No momento da solicitação dos orçamentos, caberá à própria parte exequente apresentar cópia da presente decisão (que é assinada digitalmente e pode ser conferida no link que a acompanha) diretamente às empresas fornecedoras (drogarias, distribuidoras, laboratórios etc.).
Autorizo que cópia(s) desta decisão/despacho sirva(m) de OFÍCIO para as empresas fornecedoras (drogarias, distribuidoras, laboratórios etc.).
Eventual recusa do fornecedor na aplicação do CAP deverá ser comprovada nos autos pela parte exequente, o que poderá ensejar a representação às autoridades competentes para a aplicação das sanções previstas na Lei n. 10.
Dispensa de prova pericial
As informações técnicas que fundamentaram o deferimento da tutela de urgência (NATJUS) estão amparadas em estudos médico-científicos de alta credibilidade acerca das opções farmacológicas mais atuais, sem deixar de lado a relação custo-efetividade do medicamento pleiteado em relação aqueles fornecidos pelo SUS, configurando prova técnica simplificada substitutiva de perícia, nos moldes do art. 464, § 3º, do CPC.
Nesses termos, desde já fica dispensada a produção da prova pericial, sem prejuízo de eventual reexame, caso as circunstâncias dos autos assim determinem.
Condicionantes
Visando preservar a organização e a segurança na dispensação da tecnologia pleiteada, fixo as seguintes condicionantes:
a) Renovação trimestral da receita médica e respectiva apresentação no local de retirada dos medicamentos;
b)
Apresentação trimestral de relatório atualizado do médico prescritor acerca do estado clínico do(a) paciente, com informações detalhadas sobre o progresso do tratamento, incluindo melhorias, estabilizações ou deteriorações no estado de saúde, assim como qualquer mudança relevante no plano terapêutico (cf. Tema 1234 do STF, item 5.4);
c) Apresentação de dados atualizados do paciente e de seu advogado à Gerência de Saúde responsável pela entrega dos medicamentos, como endereço residencial e/ou profissional, endereço eletrônico, e telefone;
d) Acondicionamento do(s) fármaco(s) recebido(s) em conformidade com as informações e especificações do laboratório fabricante;
e) Comunicação imediata (prazo de 48 horas) ao responsável pela dispensação/ministração do(s) medicamento(s) acerca da ocorrência de suspensão/interrupção do tratamento, com devolução dos fármacos excedentes ou não utilizados;
f) Exclusividade de administração de medicamento oncológico, se for o caso, ao CACON/UNACON responsável pelo tratamento do enfermo.
O ente público réu fica autorizado a suspender o fornecimento da tecnologia acaso omitidas, injustificadamente, quaisquer informações dentre as estabelecidas acima.
Direcionamento da Obrigação
Em recente decisão no âmbito do Tema 1.234, o STF firmou a seguinte tese no tocante aos medicamentos incorporados:
VI. MEDICAMENTOS INCORPORADOS
6) Em relação aos medicamentos incorporados, conforme conceituação estabelecida no âmbito da Comissão Especial e constante do Anexo I, os Entes concordam em seguir o fluxo administrativo e judicial detalhado no Anexo I, inclusive em relação à competência judicial para apreciação das demandas e forma de ressarcimento entre os Entes, quando devido.
6.1) A(o) magistrada(o) deverá determinar o fornecimento em face de qual ente público deve prestá-lo (União, Estado, Distrito Federal ou Município), nas hipóteses previstas no próprio fluxo acordado pelos Entes Federativos, integrantes do presente acórdão.
Em consulta ao elenco de medicamentos do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica, verifica-se que o fármaco Ustequinumabe integra o Grupo 1A
1
.
Deste modo, a responsabilidade pelo financiamento e pela aquisição é da União, cabendo às Secretarias de Saúde dos Estados, o armazenamento e a distribuição, conforme disposto no item 4.1), alínea a), do Resumo de Fluxo Aprovados na Comissão Especial constante no voto do julgamento do Tema nº 1.234:
4.1) Medicamento incorporado: deverá ser observada a atribuição de responsabilidade definidas em autocomposição nesta Corte, dividida por medicamentos incluídos no Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF), Componente Básico da Assistência Farmacêutica (CBAF) ou Componente Estratégico da Assistência Farmacêutica (CESAF), da seguinte forma, em regra:
(...)
a) Grupo 1A do CEAF
: Competência da Justiça Federal e responsabilidade de custeio total da União, com posterior ressarcimento integral aos demais entes federativos que tenham suportado o ônus financeiro no processo, salvo se tratar de ato atribuído aos Estados na programação, distribuição ou dispensação;
Assim sendo, o cumprimento da obrigação, inclusive em sede de tutela de urgência, deve ocorrer nos seguintes moldes: a União deverá financiar e adquirir o(s) medicamento(s), devendo ajustar administrativamente com o Estado de Santa Catarina para que este promova a entrega do(s) fármaco(s) na Secretaria Regional de Saúde mais próxima da residência da parte autora, sem prejuízo do redirecionamento no caso de descumprimento.
Destaco que tal forma de cumprimento não pretende eximir totalmente os demais réus da obrigação de fazer, mas apenas determinar a forma inicial de cumprimento da decisão, observando o quanto decidido no Tema 1234 pelo STF. Assim, havendo descumprimento por parte da União, os demais réus poderão ser intimados para dar cumprimento ao determinado na decisão, uma vez que reconhecida a existência de solidariedade entre eles. Dessa forma, também se sujeitarão às penalidades já estabelecidas ou às que vierem a ser oportunamente determinadas.
Neste caso, o Estado de Santa Catarina deverá obter o ressarcimento interfederativo da medicação cuja aquisição e o fornecimento foi obrigado a realizar no curso da demanda, conforme previsto no item 3 do Tema 1234.
3.
Ante o exposto,
DEFIRO
o pedido de tutela provisória de urgência
e determino aos requeridos que, nos termos da fundamentação, forneçam à parte autora, de forma gratuita, o medicamento
Ustequinumabe
, conforme receituário médico que acompanha a petição inicial.
3.1.
Defiro ainda o pedido de gratuidade de justiça. Anote-se.
4.
Intime-se a parte autora
para, no prazo de 05 dias, informar os dados de sua conta bancária, bem como os dados da(s) conta(s) do(s) fornecedor(es) do(s) tratamento(s) (farmácia, hospital) para futuro depósito. Em demandas de tratamento oncológico, de alto custo, ou em caso de tecnologia que depende de aplicação ambulatorial, o depósito deverá ser feito preferencialmente direto à instituição prestadora do serviço.
5.
Intime-se a União
(responsável financeira) para, no prazo de 15 dias, providenciar o depósito da quantia necessária para 6 meses de tratamento, diretamente à unidade hospitalar responsável administrativamente pela ministração do medicamento, sob pena multa consolidada no valor correspondente ao custo aproximado de 3 (três) meses do tratamento pleiteado, a ser revertida em favor da parte autora, nos termos do artigo 297, parágrafo único, c/c o §1º do artigo 536, ambos do novo Código de Processo Civil.
5.1.
Sem prejuízo, expeça-se ofício ao Secretário Executivo do Ministério da Saúde para que, no prazo de 15 dias, promova o cumprimento da ordem de depósito do valor necessário à aquisição do fármaco, conforme orçamentos que acompanham a petição inicial, ou indique conta para sequestro judicial, sob pena de multa de 10% sobre o valor da causa (CPC, art. 77, §§ 1º e 2º).
Cópia desta decisão servirá de
ofício
e deverá ser encaminhado com
urgência
através de mensagem eletrônica com aviso de recebimento.
6.
Não cumprida a ordem de entrega ou depósito pela União ou Ministério da Saúde
, no prazo anteriormente fixado, sem prejuízo da incidência da multa já fixada, determino a realização das seguintes medidas:
6.1.
Intime-se o Estado de Santa Catarina para, no prazo de 15 dias, providenciar a entrega do medicamento ou depósito do valor equivalente, em quantia necessária para 6 meses de tratamento, sob pena multa consolidada no valor correspondente ao custo aproximado de 3 (três) meses do tratamento pleiteado, a ser revertida em favor da parte autora, nos termos do artigo 297, parágrafo único, c/c o §1º do artigo 536, ambos do novo Código de Processo Civil.
6.2.
Sem prejuízo, expeça-se ofício ao Secretário Estadual da Saúde para que, no prazo de 15 dias, promova o cumprimento das ordens de entrega ou depósito determinadas acima, ou indique conta para sequestro judicial, sob pena de multa de 10% sobre o valor da causa (CPC, art. 77, §§ 1º e 2º).
Cópia desta decisão servirá de
ofício
e deverá ser encaminhado com
urgência
através de mensagem eletrônica com aviso de recebimento.
7.
O fornecimento do(s) medicamento(s) deverá ser prestado com observância às seguintes determinações:
a) o medicamento deverá ser fornecido
in natura
(quando possível) ou mediante direcionamento dos recursos diretamente ao responsável administrativo/hospitalar pela dispensação/ministração do medicamento, na quantia necessária a sua aquisição;
b) caso a aquisição do(s) medicamento(s) seja feita pela entidade hospitalar, esta deverá prestar contas mediante a apresentação da(s) respectiva(s) nota(s) fiscal(is), optando-se pelo menor preço disponível no mercado e pelo método mais célere de aquisição, tendo em vista a urgência do caso; e
c) quando da aquisição do(s) medicamentos(s) deverá ser observada a aplicação do Coeficiente de Adequação de Preços (CAP) atualmente vigente, conforme exposto na fundamentação.
d) a indústria farmacêutica distribuidora deverá cumprir a ordem de entrega do medicamento no prazo máximo de 72 horas a partir do recebimento do pedido pela unidade hospitalar, sob pena de multa de 20% sobre o valor da causa, nos termos do art. 77, §§ 1º e 2º, do CPC.
8.
Intime-se as partes, com indicação de urgência em relação à União e ao Estado de Santa Catarina.
9.
Intime-se a parte autora, a fim de não tumultuar o andamento destes autos de conhecimento, que eventual notícia de descumprimento da obrigação pelos réus deve ser autuada em apartado (utilizando-se para tanto as classes "petição" ou "procedimento do juizado especial cível" - em razão de o sistema processual não permitir ao advogado, atualmente, a distribuição de cumprimento provisório de sentença por dependência a processos de competência do JEF), de forma autônoma e distribuída por dependência aos presentes autos, acompanhada de receita médica atualizada e três orçamentos atualizados que indiquem o valor e a quantidade de medicamento(s)/insumo(s) necessário(s) para 3 (três) meses de tratamento, com a aplicação do Coeficiente de Adequação de Preços (CAP), assim como dos dados bancários para eventual transferência de valores, caso a medida deferida venha ser efetivada por depósito judicial.
10.
Citem-se os réus para apresentar resposta, no prazo de 30 dias, e indicação das provas que pretendem produzir, justificando a sua finalidade.
11.
Após a contestação, dê-se vista à autora para réplica, no prazo de quinze dias, e indicação das provas que pretende produzir, justificando a sua finalidade.
12.
Decorridos os prazos, retornem conclusos para julgamento, salvo necessidade de maior dilação probatória.
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